NÃO SOU EU UMA MULHER? Ananda Sandes
Ora erva, hera, brota frutos como a primavera Arou, plantou, cozinhou, plantou, limpou pocilgas com porcos fora Forma física atravessada pela dor e a fraqueza da mente do homem, [enfim Ninguém se iguala a força, fora da forca, da mulher preta que tem a si E o que falar do açoite? De dia, de tarde, de noite Das crianças que pariu, da pátria que os vendeu Inaudível choro não permitido do útero Pólvora da cristandade que a feriu na contramão: Fé que ampara ao mesmo tempo que desacata! Não sou eu uma mulher? De onde, então, veio o menino Jesus interino Se não pelo útero da transa de Maria consigo Já que Deus não pôde ouvi-la, apesar de onipresente? Ainda assim, não sou eu uma mulher? Até Eva, nada de tola, preferiu a encruzilhada que Deus não criou E criada por Deus, decidiu não ser sua criada Pôs sozinha o mundo de cabeça pra baixo Podendo ela mesma colocá-lo no lugar Mas… não sou eu uma mulher? Obra irmã-prima da natureza Em descuido “humanístico” das verdades incertas É rio, é mar, é terra, que mesmo poluída Se regenera ao ponto de nunca ser só pedra 36