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Cotidiano

COTIDIANO

Mariana Brandão Gonçalves Pereira

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Eu tô cheia de ódio! E como não? Meu cabelo é ignição Minha pele é ignição Meu corpo é ignição Eu vou topando com pessoas, Mundos, gestos E todos me dizem NÃO!

Eu tô cheia de ódio! Tentam nos boicotar Tiram meu caderno Minha história Minha fé Querem me silenciar

Mas como calar voz trêmula Cansada! Matam meu corpo Esfolam minha alma Como se existir fosse nada

Tô é cansada Parece que não tenho direito algum Vivo na casa sem telha Entre gente sem teto Sem dinheiro nenhum

Que mal dá pra comer Que mal dá pra alimentar meus filhos

Que mal dá pra pagar os remédios Mas dá lá no posto! Aquele num vou! Atendente me olha torto!

Então arranja um trabalho Onde? Pra me transformar Novamente em escravizada Tô é cansada!

Tô cheia de ódio De fome (de justiça) De sede (de justiça) De qualquer coisa que seja mais que migalha Pior! O resto de nada

E ainda vem vocês Contar a nossa história E expor em quadros nossa dor Como se fosse sua vitória! Como se fosse compadecido do nosso sangue chicoteado Contar nossa história com olhar esganiçado

Nos tiram os livros Pra roubar novamente nosso bem-dizer Às vezes penso seria melhor não viver Que lidar com tanta angústia e afins Onde eu, que vivo Sou calada, forçada E os claros Que nos chicoteavam Representam nossa trajetória

Com cordas e troncos Sem cores, sem novos pontos

Só eu posso dizer sobre o que sinto Sobreviver ou sofrer!

Eu não sou só dor Mas só querem me desenhar assim! Eu sou música, fé, cores, proteção, ancestralidade, conhecimento, origem! Me deram o papel de margem Eu sou mais que isso Eu tenho direito de ser.

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