Luiza Varanda
emprestada era de uma velha senhora rica. Dois dias depois, meu filho nasceu e a tia Mônica insistia em dar meu bebê. Naquele mesmo dia
Dora, Dora
Candinho olhou todas as suas notas de escravos fugidos, para ver se conseguia alguma quantia. Não achou
Depois de dolorosos meses no orfanato,
nada que o ajudasse e ficou muito triste. Lembrou do
Dora com a ajuda dos meninos do tra-
tempo que morou no albergue.
piche foi capaz de fugir. Pedro Bala, que
Não tinha mais o que fazer, eu e Candinho decidimos
junto com os garotos pensou no plano
levar a criança. Meu bebê dormiu e meu marido levou
para salvá-la, não foi capaz de executá-
ele embora.
-lo, já que se encontrava muito doente
Num dos becos que andava, Candinho acabou avis-
depois de ser exposto às condições
tando um vulto de uma mulher. Percebeu que era
tortuosas no tempo em que viveu no
uma escrava fugida, a Arminda. Nisso, ele entrou numa farmácia e pediu ao farmacêutico que cuidasse
reformatório.
da criança que ele já viria buscá-la.
Dora chegava no trapiche quase sem conseguir
Candinho não pensou duas vezes, foi atrás da mulher
conter a ansiedade que transbordava dentro de si. Via de longe, Pedro Bala no fundo do trapiche.
e a pegou pelos braços. Foi arrastando a escrava pela
Aumentava a velocidade dos passos, e correu em
rua, em direção à rua da Alfândega, onde morava o
sua direção. Ela parou, frente a frente com Pedro. O
senhor da escrava.
rapaz se encontrava fraco, magro, pálido, quase sem
Chegando lá, Candinho entregou a escrava que foi
vida. Pedro Bala sentia a dor da morte arder pelo
reconhecida pelo senhor, e esse o gratificou com duas
corpo, mal conseguia andar. Mesmo assim, estava
notas de cinquenta mil-réis.
feliz por rever Dora, feliz como nunca estivera antes.
Ele voltou à farmácia, para buscar seu filho. Ao chegar
Não continha o sorriso que contagiava Sem-Pernas,
não o viu. Ficou desesperado, mas o farmacêutico
Pirulito e Professor.
disse que ele estava com sua família. Candinho pegou
O brilho nos olhos de Dora, ao reencontrar seu
seu filho de volta e foi para casa com os cem mil-réis
marido, quase iluminava o trapiche. Estava feliz. Os
no bolso.
dois se abraçaram, e Dora percebia nos olhos de Pedro uma dor sem fim, uma necessidade de paz. Um desejo de descanso, e de liberdade. Liberdade da dor. Ela sabe. Pedro já sentia dor nas pernas, e logo se sentou no chão, ao lado de Dora. Ele não conseguia se mover,
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