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Gabriela Burza Barbera Sem pai nem mãe

Gabriela Burza Barbera

Sem pai nem mãe

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Eu estava grávida. A criança que eu e Candinho tanto queríamos finalmente viria. Esperei meu marido chegar em casa e contei a notícia para ele, que a recebeu com grande felicidade. Logo em seguida, contamos à tia Mônica que ficou desorientada. Ela pensava que não conseguiríamos cuidar da criança, mas eu sabia que iríamos.

— Deus nos há de ajudar, titia. Comecei a trabalhar com mais vontade, tendo que fazer as costuras encomendadas e o enxoval do meu filho, além de medir fraldas. Tia Mônica ajudava, mas com má vontade, sempre reclamando do ofício de Cândido, que não estava rendendo muito dinheiro. Candinho ficou bravo quando descobriu o que tia Mônica falou e discutiu com ela, dizendo que minha tia nunca tinha ficado um dia sem comer. Além disso, insistiu que nós seríamos perfeitamente capazes de cuidar de nosso filho e que logo tudo melhoraria no seu ofício.

Os dias que se seguiram não foram muito bons. A porção de comida estava ficando escassa e as dívidas de Candinho estavam aumentando. Eu praticamente não tinha tempo de cuidar da roupa do meu marido, pois a necessidade de fazer costuras para fora era muito maior. Todo dia, eu terminava muito cansada com as costas doendo, e no dia seguinte quase não tinha força para levantar da cama. Podia ver pela expressão no rosto de Cândido quando ele chegava em casa que não tinha conseguido nenhum dinheiro. Mas ele não parava. Logo depois de jantar, saía de novo em busca de um escravo fugido. As coisas continuaram a não melhorar. Tia Mônica dizia que Cândido precisava achar outro ofício, um que garantisse dinheiro. Ele já teve muitas oportunidades de conseguir algum trabalho melhor, mas não se manteve em nenhum deles.

Conforme o tempo ia passando, eu podia sentir minha barriga crescendo, o bebê ficando cada vez mais pesado e a quantidade de comida diminuindo. Candinho mal parava em casa e, quando voltava, o dinheiro ainda era muito pouco. O que iríamos fazer? Faltavam poucos meses para nosso filho nascer e mal conseguíamos nos manter. O desespero tomou conta de meu corpo conforme pensava no que poderia acontecer com nosso bebê se continuássemos desse jeito. Será que ele sobreviveria? Mais um mês tinha se passado, o que significava que o bebê poderia nascer a qualquer momento. Fui até a cadeira que estava perto dos meus materiais de costura e ao me abaixar para pegá-los senti uma coisa molhada descendo pelas minhas pernas. O bebê estava vindo. Tia Mônica veio correndo e me levou para o quarto, deitando-me na cama. Logo em seguida, chamou algumas mulheres da vizinhança para ajudar com o parto. Depois de um tempo, finalmente peguei meu filho no colo e minha alegria não poderia ser maior ao ver que era um menino. Ah! Candinho ficaria tão feliz com

aquilo. A criança era um menino, exatamente o sexo que queríamos. Ouvi o barulho da porta de casa e sabia que era o Cândido. Chamei-o e ele apareceu no quarto logo em seguida. O sorriso no rosto do meu marido só aumentou, principalmente quando mostrei a ele o menino. Mas minha felicidade foi, aos poucos, diminuindo quando as perguntas e preocupações que tive durante a gravidez me atingiram novamente.

Duas semanas se passaram, com muita agitação. Cândido estava ficando ainda mais tempo fora de casa em busca de escravos fugidos, mas sem sucesso. Um dia, durante o jantar, a tia Mônica nos aconselhou a levar nosso filho para a Roda dos Enjeitados, mas a ideia não foi bem recebida por meu marido, rejeitando-a na hora.

— Titia não fala por mal, Candinho - disse, na tentativa de fazê-lo se acalmar.

— Por mal? - replicou tia Mônica - Por mal ou por bem, seja o que for, digo que é o melhor que vocês podem fazer. Vocês devem tudo.

Não era mentira. As coisas estavam muito difíceis em casa e… Meus pensamentos foram interrompidos por uma batida na porta. Era o dono da casa.

— Venho pelos aluguéis vencidos. Não posso mais esperar. Eles devem ser pagos dentro de cinco dias ou todos vocês irão dormir na rua.

Ao dizer isso, o homem saiu, e, logo em seguida, Candinho também. Fui para nosso quarto e me preparei para dormir. Ao sentar na cama, o pânico me atingiu e pensei no conselho da tia Mônica. Mandar meu filho para a Roda dos Enjeitados. Como eu poderia fazer tal coisa? Como poderia abrir mão do meu filho? Mas será que ele viveria melhor lá, já que nem casa nós tínhamos?

Os cinco dias acabaram. Estávamos nos preparando para sair da casa. Não sabia o que iríamos fazer quando saíssemos daqui, mas tia Mônica nos surpreendeu, contando que tinha arrumado um lugar para ficarmos, e me senti totalmente grata à minha tia por isso. Ao chegar no lugar, arrumamos nossas poucas coisas no espaço, e descansamos.

Passadas algumas horas, o bebê começou a chorar e isso fez com que tia Mônica, novamente, nos dissesse para mandar o menino para a Roda dos Enjeitados. Daquela vez, como nenhuma outra solução tinha aparecido, Candinho concordou. Ele me pediu para amamentar nosso filho, e percebi que era a última vez que iria segurá-lo no colo. Quando terminei, ele pegou o menino no colo e saiu, fazendo-me entender que eu nunca mais veria meu filho. Sem força para mais nada, me encostei na poltrona e dormi com um sono agitado.

Não sei por quanto tempo fiquei daquele jeito, acordando somente com o barulho da porta sendo aberta. Alívio percorreu meu corpo quando vi Candinho entrando com nosso filho no colo e dinheiro na mão. Não prestei atenção na história que ele contou, somente na sensação de ter o meu filho nos braços novamente.