O homem que não merecia ter as mãos Ana Paula Milani
S
eja bem-vindo, meu amor, a um mundo de verdades. As minhas verdades. Ou as verdades que a maioria das mulheres que já acordaram teriam a dizer. Como sempre, meu querido,
sem gramatiquices, porque sei muito bem quando não é hora pra isso. As verdades, meu anjo, são ditas no calor das ironias e dos coloquialismos. Ah! E também são ditas depois de umas taças de vinho num início de noite de chuva. Pois a verdade é que eu sei que aquele soco numa porta de vidro é um soco que tu erraste da cara dela. E ela não teve coragem de contar a ninguém, porque sabia que, se abrisse a boca, na próxima vez, tu socarias pra acertar. Eu também sei que tu usas do discursinho de atrair a mulher independente para uma noite de sexo fácil, mediante o argumento imbecil de que a mulher independente tem a obrigação da liberdade sexual irrestrita e deve satisfazer tuas vontades, mas eu também sei que homens do teu calibre não mereceriam sequer ter as duas mãos para se satisfazerem sozinhos, que dirá a honraria de usar essas duas mãos imundas para tocar numa mulher. (Já dizia Drummond: “Minha mão está suja / Preciso cortá-la / Não adianta lavar”) Eu também sei que te escondes das mulheres independentes porque tens medo de não suportar a vontade de entrar em contato com elas (hoje em dia, se chama bloquear). Porque gostarias de ter o nosso apreço. Gostarias de ter o nosso desejo. Eu sei disso. E te entendo. Somos insuportá-
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