Brasil, Brazil, Breazail: utopias antropofágicas de Rosa Magalhães

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Sul (chimarrão, churrasco, Festa da Uva, imigrantes europeus, diademas de flores, araucárias e gralha azul), a carnavalesca optou por um recorte literário, passeando por Os Três Mosqueteiros e Memórias de Garibaldi. Sem dúvidas, uma escolha acertada.

VI. 1. 3 – No coração da floresta Rosa Magalhães nunca apresentou, na Passarela do Samba, uma narrativa amazônica, o que é interessante. Há, no carnaval carioca, uma linha de enredos baseados em lendas da Amazônia (o quase homônimo Lendas e Mistérios da Amazônia, concebido por Clóvis Bornay para a Portela, em 1970, é o exemplo máximo), figurando o espaço geográfico banhado pelos afluentes do Rio-Mar enquanto manancial mitopoético para carnavalescos de diferentes épocas.355 A Beija-Flor de Nilópolis visitou a Amazônia muitas vezes, ganhando dois campeonatos (1998 e 2004) com enredos de matriz cabocla. A própria Imperatriz Leopoldinense navegou por águas amazônicas, em 1985: o enredo Adolã, a Cidade-Mistério, desenvolvido por José Félix e Arlindo Rodrigues, tratou de mitos marajoaras. No enredo mangueirense de 2014, no entanto, havia um trecho dedicado às festas ocorridas “no coração da floresta”. O Festival de Parintins mereceu uma sequência de alas e um carro alegórico, intitulado O ritual da pajelança na festa do boi de Parintins e apresentado, no Livro Abre-Alas, como uma “dramatização teatral comovente”. A carnavalesca utilizou a figura do Pajé (imagem 104), um dos “itens”356 avaliados pelos julgadores do Festival, para sintetizar o universo ritual de Parintins. No enredo, o pajé é descrito como um “poderoso curandeiro e temido feiticeiro que domina a cena da pajelança enquanto os bois dançam e a plateia vibra.”357 A linguagem plástica do setor muito dizia da estética do festival, marcada pelo uso maciço de penas sintéticas, cores 355

O mais recente exemplo é o enredo de 2018 da Unidos de Padre Miguel, escola de samba da Zona Oeste carioca que se apresentou no sábado de carnaval, na Série A. A narrativa, assinada por Daniel Targueta e visualmente desenvolvida por João Vítor Araújo, ganhou o título Eldorado Submerso: delírio TupiParintintin e propunha, ao menos no plano da narratividade escrita, diálogos com Órfãos do Eldorado, de Milton Hatoum O que se viu, no desfile (que terminou vice-campeão do Grupo de Acesso), foi uma sucessão de lendas e mitos amazônicos, para tudo terminar no Festival Folclórico de Parintins. 356 Ao todo, o júri do Festival atribui notas a 21 itens (comparáveis aos “quesitos” avaliados nos desfiles das escolas de samba). Sobre o evento, ver: BARBIERI, Ricardo José. Etnografia da Galera do Caprichoso: simbolismo e sociabilidade entre jovens no festival de Parintins. In: Textos Escolhidos de Cultura e Arte Populares (TECAP – UERJ), v.10, n. 1, maio 2013. 357 Justificativa do quinto carro alegórico da Estação Primeira de Mangueira, no carnaval de 2014, encontrada no Livro Abre-Alas daquele ano. Disponível para consulta no Centro de Memória do Carnaval – LIESA.

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VIII – Referências bibliográficas

18min
pages 324-336

VII – Conclusão – Utopias antropofágicas

48min
pages 293-323

IX – Anexos

6min
pages 337-342

VI.2.3 –A carne é fraca, é isso aí

6min
pages 285-288

VI.2.4 – Onisuáquisólamento

6min
pages 289-292

VI.2.1-Pirão de areia e sopa de vento

4min
pages 281-282

VI.2.2-Pirataria S/A

2min
pages 283-284

VI. 2 – O panelaço brasileiro

2min
pages 279-280

VI.1.7- O carnaval nosso de cada ano

16min
pages 269-278

VI.1.6 – A folia de cocar

3min
pages 267-268

VI.1.3 – No coração da floresta

2min
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VI.1.5 – O medievo de lá pra cá

4min
pages 265-266

VI.1.1- O sertão que não é só lamento e a mítica Bahia

8min
pages 254-258

VI.1.2 – No balanço da expedição

1min
page 259

VI.1.4 – Pianópolis – Rua do Ouvidor

8min
pages 261-264

V.1.12- Tutti-multinacional

4min
pages 247-250

V.1.11 – Toda a América Pré-Colombiana foi saqueada em suas riquezas

1min
page 246

V.1.10 – Tambor africano, solo feiticeiro

5min
pages 243-245

V.1.9 – Nobreza holandesa

1min
page 242

V.1.8 – Fado tropical

1min
page 241

V.1.7 – Nesse feitiço tem castanhola

2min
pages 239-240

III. 3 – As distopias e o pop-nostalgia

24min
pages 169-181

V.1.4 – Folias geladas

5min
pages 235-237

V.1.3 – Vive la France

12min
pages 229-234

IV. 3 – O céu não é o limite

22min
pages 211-221

V.1.2 – Orientalismos

4min
pages 227-228

IV. 2 - Diários de navegação

31min
pages 187-210

V.1. 1 – Os mitos que enlaçam antigas tradições

2min
page 226

III. 2 – De luta, esperança, amor e paz

19min
pages 157-168

II. 4. 2 - Utopias e heterotopias: Michel Foucault, navegador

23min
pages 122-132

II. 3. 3 – Pau-Brasil

21min
pages 98-108

II. 4. 3 – O heterotópico Carnaval Carioca: invocando Mário de Andrade

22min
pages 133-144

II. 2. 3 – Breazail: metanarrativa metálica

16min
pages 74-80

I – Por mares nunca dantes navegados

1hr
pages 17-43

II. 3. 2 – Cabo Frio, o cenário do clímax

19min
pages 88-97

II. 2. 2 – Uma ilha chamada Brasil?

13min
pages 67-73
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