tais imaginários desde o século XIX – fantasias de sultões, odaliscas e chineses já eram comercializadas, na Rua do Ouvidor, na época do Segundo Império). A Índia, seguindo a rota da seda, é retratada enquanto esplendoroso reino de riquezas – e seguramente o conjunto formado pelas fantasias e alegorias dos dois primeiros setores do desfile da Imperatriz Leopoldinense do carnaval (campeão) do ano 2000 (um dedicado às pedras preciosas; o outro, às especiarias e aos tecidos) é das mais belas e detalhistas criações plásticas que já passaram pelo Sambódromo do Rio.329 Ainda neste subtema, deve-se inserir o grande destaque dado à Tailândia, no desfile estaciano de 1987. Rosa Magalhães, que disse, no depoimento ao MIS, ter extraído a ideia do enredo sobre o sapoti das memórias de uma viagem ao antigo reino do Sião, na Indochina, levou à Marquês de Sapucaí, ao lado de Lícia Lacerda, reproduções primorosas de templos e divindades tailandeses. Quando o samba de enredo de 87 foi “reeditado” pela escola, em 2007, num desfile assinado por Paulo Menezes, os mesmos signos se fizeram presentes – sem, no entanto, o impacto originalmente causado na apresentação de 20 anos antes.
V. 1. 3 – Vive la France! Proporcionalmente, numa análise comparativa com China, Índia e países ou regiões do Oriente Médio, a França é quase onipresente na obra de Rosa Magalhães – a começar pelo enredo de 2017 da São Clemente, Onisuáquimalipanse. A autora narrou, na Sapucaí, a curiosa história que levou à construção do Palácio de Versailles, no reinado de Louis XIV. Vencedor do prêmio de melhor enredo, segundo o júri do Estandarte de Ouro, trata-se de uma narrativa linear e bastante coesa: a autora não conta a história do reinado do “Rei Sol” nem apresenta qualquer visão alegórica do esplendor de Versailles (a única referência direta ao palácio é uma pequena maquete giratória, na última alegoria). O foco do enredo é o projeto, a construção e a inauguração do Château de Vaux-le-Vicomte, tudo Ver: GAY, Peter. Schnitzler’s century: the making of middle-class culture – 1815-1914. Nova York/Londres: W.W. Norton & Company, 2002. 329 Curiosamente, China e Índia voltariam a cruzar a Passarela do Samba, em 2018: os países foram os temas dos enredos do Império Serrano (O Império do Samba na Rota da China, de Fábio Ricardo) e da Mocidade Independente de Padre Miguel (Namastê... a estrela que habita em mim saúda a que existe em você!, de Alexandre Louzada). Ambas as apresentações pecaram no que tange à criatividade e às ousadias narrativas: o que viu, na escola que abriu (Império Serrano) e na escola que fechou (Mocidade) a primeira noite de desfiles do Grupo Especial, no domingo, foi uma sucessão de clichês e fórmulas requentadas – uma dose de orientalismo que faria Said escrever uma lauda.
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