IV. 3 – O céu não é o limite
Rio de Janeiro, 25 de novembro de 2017. Atrás de um portão de ferro pintado de verde, na Rua Prefeito Júlio de Moraes Coutinho, lado par da Avenida Brasil, nas proximidades do castelo mourisco da Fiocruz, encontra-se o “barracão de alegorias” da Acadêmicos do Cubango. Espaço grande, dividido em espaços menores: a “garagem” dos carros alegóricos, com o desafiador limite de pouco mais de 4 metros de altura (na Passarela do Samba, podem chegar a 13), o almoxarifado de aviamentos e pedrarias, um galpão para guardar esculturas compradas ou recebidas enquanto doação de outras escolas, um salão com bancadas, para a feitura dos adereços das alegorias (no segundo andar do almoxarifado de aviamentos), o almoxarifado de tecidos, uma pequenina cozinha e a sala de reuniões de diretores e carnavalescos, com três mesas de trabalho, alguns armários cheios de troféus e papeis envelhecidos, um banheirinho sem luz, uma cristaleira colonial danificada pelas chuvas (doação de uma diretora). Todos estes espaços circundam um terreno a céu aberto, onde esculturas abandonadas ardem sob o sol de 40 graus, calangos correm, assustados com o fluxo de pessoas, automóveis de dirigentes de escolas do Grupo de Avaliação (o antigo Grupo D, no qual estreei como carnavalesco, na Mocidade Unida do Santa Marta, em 2013) se revezam na tarefa de entupir os porta-malas e os bancos traseiros com restos de fantasias recebidas pela Cubango da Unidos de Vila Isabel – e repassadas sem custo algum, uma vez que descartadas. No mesmo terreno a céu aberto, o abre-alas em construção é movimentado pelos ferreiros João e Cristiano, membros da equipe de Hélcio Paim. Os mastros da Nau dos Insensatos sobem pela primeira vez: complexa estrutura de tubos metálicos, roldanas, talhas e correntes. Eu observo as formas vazadas do navio, o esqueleto, antes da madeira e de qualquer decoração (imagem 86). Os ossos do carro alegórico em contraste com o céu azul, sem um fiapo de nuvem, apenas o sol, maçarico, e o voo circular de urubus, anunciando carniça nova. Observo as formas vazadas do navio e penso que no enredo da Acadêmicos do Sossego para o carnaval de 2015 havia travessias transatlânticas: a vinda de navios do Porto de Banana, em Angola, trazendo mudas de bananeiras e corpos escravizados; e o retorno das embarcações, levando o brasileiro ananás ibá-cachi à região do Senegal – tudo retirado de Câmara Cascudo. Optamos, no entanto, por não fazer o carro alegórico (no Grupo B, à época, era permitida a apresentação de apenas um carro alegórico, costumeiramente o abre-alas) em forma de barco, inclusive pelas questões 211