Brasil, Brazil, Breazail: utopias antropofágicas de Rosa Magalhães

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I - Por mares nunca dantes navegados...

«Mas cá onde mais se alarga, ali tereis Parte também, co’o pau vermelho nota; De Santa Cruz o nome lhe poreis; Descobri-la-á a primeira vossa frota. Luís de Camões – Os Lusíadas (Canto X, 140)

* Nice, 2 de fevereiro de 2017. Dia da Rainha do Mar, Mãe de todos os peixes. Não há areia na praia, mas pedras. Noite fria, água congelante. Do outro lado do Mediterrâneo, a Argélia e a Tunísia, de onde partiram os dromedários para a primeira expedição científica brasileira – as minhas memórias de 1995, o jegue escondido na história. De falta de mandinga o carnaval não morre? É fato que inúmeras escolas de samba, inclusive das ditas “grandes”, do Grupo Especial do Rio de Janeiro, estão vendo as suas alas de Baianas (obrigatórias desde o regulamento de 1933, uma vez que sintetizam a matriz espiritual do samba, o legado de Ciata) esvaziadas progressivamente devido ao avanço das igrejas neopentecostais e da conversão que não tolera os terreiros (as origens das “quadras” de ensaios), demonizando os saberes afro-ameríndios que enredam o tecido cultural em que as agremiações sambistas se veem amarradas desde os míticos nascimentos, num tempo de chão de estrelas, cabrochas, barracões de zinco – idílios que alimento, porque não vivi. Apesar das ameaças, felizmente, os mais elaborados despachos oferecidos a Exus e Pombagiras continuam a disputar espaço, na encruzilhada entre as ruas Carlos Xavier e Henrique Braga, Oswaldo Cruz e Madureira, em frente à entrada do pavilhão onde mais de 30 escolas de samba dos grupos “menores”, que desfilam na Estrada Intendente Magalhães, muito longe da Sapucaí, constroem os seus carros alegóricos (que, via de regra, são feitos com sobras de carnavais passados, doações da Cidade do Samba – do lixo que se faz o “luxo”, à la Joãosinho Trinta). São tantas e tão fartas as oferendas, garrafas, taças, alguidares, que a visão da encruzilhada antecipa uma visão carnavalesca: carros alegóricos multicoloridos (com destaque para o vermelho) enfileirados na concentração (imagem 1). Admirador que também sou de Pedro Arcanjo, faço coro a Caetano Veloso e me entendo enquanto “ateu que vê milagres” – Jorge Amado, afinal, sabia das coisas. Acredito, e bem, nas mandingas das esquinas do mundo. Na cidade de João do Rio, Lima Barreto e Machado de Assis, a conexão com o carnaval 17


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VIII – Referências bibliográficas

18min
pages 324-336

VII – Conclusão – Utopias antropofágicas

48min
pages 293-323

IX – Anexos

6min
pages 337-342

VI.2.3 –A carne é fraca, é isso aí

6min
pages 285-288

VI.2.4 – Onisuáquisólamento

6min
pages 289-292

VI.2.1-Pirão de areia e sopa de vento

4min
pages 281-282

VI.2.2-Pirataria S/A

2min
pages 283-284

VI. 2 – O panelaço brasileiro

2min
pages 279-280

VI.1.7- O carnaval nosso de cada ano

16min
pages 269-278

VI.1.6 – A folia de cocar

3min
pages 267-268

VI.1.3 – No coração da floresta

2min
page 260

VI.1.5 – O medievo de lá pra cá

4min
pages 265-266

VI.1.1- O sertão que não é só lamento e a mítica Bahia

8min
pages 254-258

VI.1.2 – No balanço da expedição

1min
page 259

VI.1.4 – Pianópolis – Rua do Ouvidor

8min
pages 261-264

V.1.12- Tutti-multinacional

4min
pages 247-250

V.1.11 – Toda a América Pré-Colombiana foi saqueada em suas riquezas

1min
page 246

V.1.10 – Tambor africano, solo feiticeiro

5min
pages 243-245

V.1.9 – Nobreza holandesa

1min
page 242

V.1.8 – Fado tropical

1min
page 241

V.1.7 – Nesse feitiço tem castanhola

2min
pages 239-240

III. 3 – As distopias e o pop-nostalgia

24min
pages 169-181

V.1.4 – Folias geladas

5min
pages 235-237

V.1.3 – Vive la France

12min
pages 229-234

IV. 3 – O céu não é o limite

22min
pages 211-221

V.1.2 – Orientalismos

4min
pages 227-228

IV. 2 - Diários de navegação

31min
pages 187-210

V.1. 1 – Os mitos que enlaçam antigas tradições

2min
page 226

III. 2 – De luta, esperança, amor e paz

19min
pages 157-168

II. 4. 2 - Utopias e heterotopias: Michel Foucault, navegador

23min
pages 122-132

II. 3. 3 – Pau-Brasil

21min
pages 98-108

II. 4. 3 – O heterotópico Carnaval Carioca: invocando Mário de Andrade

22min
pages 133-144

II. 2. 3 – Breazail: metanarrativa metálica

16min
pages 74-80

I – Por mares nunca dantes navegados

1hr
pages 17-43

II. 3. 2 – Cabo Frio, o cenário do clímax

19min
pages 88-97

II. 2. 2 – Uma ilha chamada Brasil?

13min
pages 67-73
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