Vozes da modernidade: A lírica de Adoniran Barbosa como ponto de encontro do samba e da crônica

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174 foi a dos mestres-de-obras italianos e portugueses, dos arquitetos de inspiração neoclássica, floral e colonial, em camadas sucessivas. São Paulo dos palacetes franco-libaneses do Ipiranga, das vilas uniformes do Brás , das casas meio francesas de Higienópolis, da salada da Avenida Paulista. São Paulo da 25 de Março dos sírios , da Caetano Pinto dos espanhóis, da Rapaziada do Brás (CANDIDO, 2002, p. 142).

Ao mesmo tempo em que essa fora a cidade que conhecera, também foi a cidade que viu ao longo de sua vida desaparecer, sendo sua obra pontuada pela melancolia decorrente da desintegração urbana. Logo, não deixa de ser curioso que em “Acende o Candieiro” Adoniran remeta à figura do terreiro, remanescente de uma São Paulo que não é a sua. Uma São Paulo negra, tão bem simbolizada pela Irmandade da Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, cujo monumento foi destruído para dar lugar à nova cidade. Faz-se representativo que o ensaio proposto também seja convertido em simbólico da resistência cultural enraizada em uma herança em defensiva para com o anseio destrutivo e desagregador da modernidade urbana. 4.5.2. No morro da casa verde Som e silêncio são considerados em “No morro da casa verde” conforme o jogo de dualidades presente em parte do cancioneiro do compositor, servindo de base ao diálogo entre a música e a lírica, característico do desenvolvimento da metalinguagem na canção. A canção, gravada para o disco de 1975, começa por um fraseado de violão sutil, que quebra o silêncio que precede a canção. Se sucedendo assim ao ritmo suave do pandeiro e a um fraseado de metais, tão lento quanto o do violão anterior. Assim é dado espaço ao canto de Adoniran, que incrementa a voz rouca um cantar arrastado, sussurrante. Silêncio, é madrugada No Morro da Casa Verde A raça dorme em paz. E lá em baixo, Meus colegas de maloca Quando começa a sambá Não para mais. (Silêncio!) Valdir, vai buscar o tambor. Laercio, traz o agogô. Que o samba na Casa Verde infezou. (Silêncio!) (ADONIRAN BARBOSA, 2003).


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