Revista CDM Digital #32

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revista corpo da matéria CURSO DE

Além das fronteiras

Reportagens retratam o cotidiano na Região Metropolitana de Curitiba

JORNALISMO PUCPR
ano 12 - edição 32 outubro de 2014

Corpo da matéria

Ano 12 - Edição 31 - Setembro de 2014 Revista Laboratório do Curso de Jornalismo PUCPR

Pontifícia Universidade Católica do Paraná R. Imaculada Conceição, 1115 Prado Velho, Curitiba PR

REITOR

Waldemiro Gremski

DECANA DA ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES Eliane C. Francisco Maffezzolli

COORDENADOR DO CURSO DE JORNALISMO Julius Nunes

COORDENADOR EDITORIAL Julius Nunes

COORDENADOR DE REDAÇÃO/JORNALISTA RESPONSÁVEL Paulo Camargo (DRT-PR 2569)

COORDENADOR DE PROJETO GRÁFICO Rafael Andrade

MONITORIA Carolina Mildemberger

Alunos - 6º Período Jornalismo PUCPR

Amanda Louise Mitt Schause Satuf Silva, Ana Beatriz Villas Bôas Maruch, Ana Luiza Ferreira de Souza, Beatriz Chaves Pacheco, Bruna Carvalho da Silva, Bruna Mazanek, Carolina Andrade Chab, Carolina Silva Mildemberger, Caroline Martins Stédile, Fernanda Novaes Buffa, Fernando Burigo Guimarães Back, Gabriela Carolina Miranda de Oliveira, Getulio Xavier de Almeida Filho, Guilherme Osinski, Gustavo Lavorato Justino da Silva, Helem Caroline Barros, Helena Comninos, Isadora Teresa Carvalho, Jhenifer Wendy dos Santos Valentim, Jheniffer de Andrade, Jordan Marciano, Karla Letícia Tumelero Fernandes, Laura Umada Espada, Lucas Aquino de Oliveira, Lucas Prestes das Chagas, Manuella Costa Pires, Marcela Oliveira de Carvalho, Maria Fernanda Moretti Schneider, Mariana Dorneles Papi, Mayara Michelli Nascimento, Melvin Gavinho Quaresma, Rafaela Oliveira, Raíssa Gomes da Silva Ribeiro, Renata Nicolli Rodrigues, Sil via Yumiko Tokutsune, Thiana July Perusso, Vinicius Cordeiro da Silva, Vinicius Savaris Rech, Fernanda Brunken, Lydia Christina Brunato de Camargo, Alana Freiberger, Alessandro Pinheiro da Silva, Amanda Bedide Zanao, Amanda Luiza de Souza, André Gessi Rogal Wuicik, Beatriz Theiss Evaristo Hubert, Bianca Caroline Fragoso de Lima, Bruna Catache, Carolina Cristina Ferreira Rodelli, Guilherme Roberto Liça, Isabel Maria dos San tos, Isabella Santos Lanave, Jessica Mayara Cereja Dias, Jordana Figueiredo Machado, Juliana dos Reis Antunes da Silva, Katiucy Binhara Pinto, Lara Berbes de Farias, Mariana Therezio da Silva, Mario Spaki, Roberta Costa Gonçalves de Almeida, Rodrigo Soares Dornelles Pereira, Stacy Barbosa da Silva, Stephani Mantovani Diedrich, Hellen Crisley Ribaski

Imagem de capa: Melvin Quaresma - 6ºP Jornalismo

2 Revista CDM Jornalismo PUCPR

Os donos da rua 4

Dançar para não dançar 14

Quem vive de lixo? 20 Nas mãos do destino 24

Jogo dos trilhos 26 Uma longa novela na Lapa 30

HISTÓRIA

Um cenário histórico 34

COMPORTAMENTO

mora onde?

doce

Jornalismo PUCPR Revista CDM 3 CIDADES
Você
40 Lar
lar 44 ECONOMIA A tranquilidade mora perto de Curitiba 48 Comunidade é transformada com ações sociais 52 ESPORTE Pinguins sobre rodas 56 Jogada transformadora 60 Na trilha da aventura 62

Os donos da RUA

Todos os dias centenas de animais são abandonados nas ruas do Brasil. Fomos até Pinhais - PR, conhecer a cidade que tem um número de cachorros igual à metade da sua população

Texto: Caroline Stédile e Melvin Quaresma

Edição: Getulio Xavier e Thiana Perusso

Fotos: Melvin Quaresma

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Poucos recursos

A Secretaria do Meio Ambiente surgiu no muní cipio recentemente. Antes inexistente, encontrou a necessidade de criar uma área mais específica para tratar exclusivamente dos casos de aban dono e maus tratos a animais. Porém, a medida não surtiu grandes efeitos. A falta de recursos e as finanças sempre apertadas dificultam muito a ação para melhorar a situação. Segundo Isabela, a verba mensal que é repassada é insuficiente para todas as medidas que a secretaria considera necessárias para, pelo menos, chegar próximo de uma solução.

Soluções

Entre diversas pausas na conversa para atender telefonemas de denúncia, Solange apresentou o plano que considera eficiente. “O mais impor

tante é a conscientização dos proprietários de animais. As pessoas acreditam que recolher os animais e tentar cuidar é uma boa solução[...]. Cuidar de 30 ou 50 cães em casa não ajuda a eliminar o problema e é até perigoso para a saúde dos cães, que não têm espaço e boas condições.

[...] Não teríamos espaço para recolher e cuidar de todos os cães abandonados. Fazemos cartilhas para conscientizar as crianças também, porque muitos adultos ignoram o que tentamos passar. Então, tentamos fazer com que as crianças levem o aprendizado para o lar”, contou Solange. Outro ponto importante levantado foi a desmiti ficação da ideia de que o problema são os animais abandonados. Segundo as veterinárias, os cães abandonados correspondem a apenas 3% dos animais que circulam pelas ruas de Pinhais. O maior problema são os casos de cachorros “se mi-domiciliados”, que, além de corresponderem ao maior porcentual, também são os que mais

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Cachorros sem lar próximo à movimentada rua Jacob Macanhan, em Pinhais - PR

se reproduzem, uma vez que cães abandona dos dificilmente entram no cio devido à má nutrição. Os “semi-domiciliados” são aqueles cães que têm um lar, mas contam com livre acesso às ruas – e acabam por se reproduzir e se misturar com os animais que de fato não contam com um lugar para morar. Esse é um dos problemas em que a castração pode ser uma boa solução. A secretaria conseguiu firmar uma parceria com a Universidade Federal do Paraná e 50 operações mensais de castração são realizadas – um número ainda muito baixo em relação à imensa quantidade de cães que necessitam do procedimento.

Outras ajudas

Dona Ivete Wachtel é costureira e apaixonada por seus animais de estimação. Cuida de nove gatos, um deles já foi adotado cego. Além de dois cachorros que vivem com ela e o marido, Claudinei Francisco, o casal cuida também dos animais que ficam na rua na frente da sua casa. “O que me da dó são os bichos ficarem na rua. Já tentei ligar para a prefeitura, mas tem fila de espera de um ano pra castrar e, além disso, não podem fazer nada. Imagina quantas crias elas vão ter nesse período”, conta ela.

Ela explica que a ação nem sempre é vista com bons olhos por aqueles que circulam pela rua. Mas que se tivesse o espaço adequado, abrigaria

Claudinei e Ivete cuidam de sete cães e dão lar a nove gatos que resgataram das ruas

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“A pior doença é o egoísmo do ser humano.”

todos os cães em sua própria casa. “Os vizinhos querem que eu pare de dar co mida para os cachorros para eles irem embora, mas daí eu pergunto se eles conseguem viver sem comida. E o amor ao próximo? [...] Eu não tenho coragem de comer e deixar o bicho sem comer. As pessoas ficam preocupadas com a calçada e com o jardim, pra mim eles nunca passaram doença nenhuma, só amor! A pior doença que tem é o egoísmo do ser humano.” Patinhas Pinhais é um grupo formado no Facebook que reúne pessoas que se preocupam com a situação dos animais em Pinhais e mais de 2 mil membros já se uniram por essa causa, inclusive Dona Ivete. Mais do que participar ativamente na internet, compartilhando conte údo, algumas dessas pessoas recolhem animais da rua e lutam por melhorias para os bichinhos na cidade de Pinhais. “Geralmente, nós parti cipamos de audiência pública e é a

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Tânia, Jaqueline e Suellen cuidam de Pingo
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chance que temos para falar. Levamos nossas revindicações, como a criação de um conselho para cobrar ações da prefeitura para os animais da cidade de forma oficial. Eles estão resistindo um pouco, mas vamos continuar insistindo”, contou Jaqueline Lourenço Gomes, que é uma das integrantes mais ativas do grupo. Ela abriga em sua própria casa 31 cachorros que recolheu das ruas, o mais recente foi o Pingo. O cãozinho foi atropelado e ficou vagando pela cidade com as patas traseiras quebradas por aproximadamente um mês. Com a ajuda de Jaqueline, ele ganhou rodinhas adaptadas e hoje consegue se locomover. “Esses animais que estão na via pública na verdade são res ponsabilidade da prefeitura e nós queremos realmente que eles se responsabilizem”, diz ela Tania Ferreira também participa do grupo e acredita que a rede social ajudou a melhorar o trabalho das cuidadoras de animais. “Antigamente, cada um fazia o seu trabalho isolada mente, mas com a rede social, nós juntamos forças. Quem tem um medicamento que não usa pode dar pra outro dono que está precisan do no momento, nos ajudamos com doação de

ração, transporte e outras coisas.” Suellen Fonseca levou o amor pelos animais um pouco mais a sério, transformando em sua profissão. A veterinária abriga dez cães e dez gatos, muitos deles encontrados na rua. “Infelizmente, não podemos abraçar o mundo inteiro sozinhos e não podemos recolher todos os animais de rua. Mesmo tendo bastante pessoas ligadas à causa animal, tem um constante abandono de animais aqui em Pinhais. Eu mesma já presenciei vários cachorros abandonados dentro de caixas ou até mesmo jogados dentro de portões com cachorros maiores para que eles fossem devorados.”

Para evitar que mais animais acabem na rua, o grupo organiza feiras de adoção. Os donos dos cães se inscrevem através das redes sociais e levam seus animais até o local da feira. Algumas exigências são feitas para que seja justo com quem está adotando o bichinho. O animal deve estar castrado, vacinado e em boas condições. Após uma entrevista, o novo dono pode levar o animal para casa e receber visitas regulares do antigo dono para verificação do estado que está o animal.

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30 milhões de animais abandonados no Brasil. 250 vezes a população de Pinhais.

Trinta crianças, entre 4 e 12 anos, chegavam em fila indiana no Hospital Veterinário da UFPR para uma visita. A empolgação tinha um quê a mais. E não era à toa. Eram os vete rinários mirins, estudantes que participaram de um concurso em suas escolas e venceram os prêmios de melhor redação sobre o aban dono de animais. O concurso foi uma das ações promovidas por Isabela e Solange para a conscientização das crianças sobre o tema e a recompensa para quem produzisse as redações vencedoras era a visita ao hospital. “Amei muito o passeio. Meu texto foi sobre como não devemos abandonar os animais, porque eles também têm sentimentos”, contou Eduarda Moragino, que aos 9 anos de idade

dizia estar completamente decidida sobre o que fazer no futuro. Assim como praticamente todos os outros estudantes, quer se tornar veterinária.

A maior curiosidade dos pequenos era pelos animais de maior porte e os selvagens, e muito impressionou a coragem com que a grande maioria encarou a “cornsnake” – uma peque na cobra de estimação que se recuperava nas dependências do hospital.

Lucas Henrique, de 9 anos, contou sobre a sua vontade de ter uma cobra enquanto observava a tudo com muita curiosidade. “Eu não tenho medo e até queria ter uma cobra, mas minha mãe não gosta muito da ideia. Já expliquei que algumas nem têm veneno, mas ela não quer mesmo”.

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Crianças brincam com Onix, bode do hospital veterinário da UFPR
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Crianças
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Cavalo recolhido em Pinhais sofre com a reação alérgica de um ataque de abelhas Cavalos em perigo

“Tá dizendo que o cavalo não levanta e o dono dá chutes e grita para o bicho levantar”, relatou Isabela depois de ter atendido a uma ligação. Enquanto se preparava para sair e verificar a situação, as ligações se repetiram por mais duas vezes para denunciar o mesmo caso. A absoluta calma para resolver o problema demonstrava que a situação não era nenhuma novidade. Assim, descobrimos que os casos envolvendo cavalos também são muito frequentes. Em bairros como o Weissópolis, é comum que esses animais circulem livremente e atrapalhem as vias. Os casos são inúmeros e tão preocu pantes quanto as ocorrências com os cães.

Animais de grande porte soltos pela cidade são um perigo eminente para a população e para o trânsito. Uma solução prática que vem sendo aplicada é a utilização de chips eletrônicos nos equinos do município. “A gente diz que a colocação dos chips serve reencontrar o cavalo caso percam e coisas assim, mas, na verdade, é uma maneira de encontrarmos os proprietários em casos de abandono e puní-los.[...] Os carro ceiros não gostam da gente porque dizem que somos ‘ladras’ de cavalos. Mas só recolhemos quando as condições de desleixo no cuidado são verificadas por mim, que tenho a autorização para fazer o recolhimento desses animais.”

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DANÇAR PARA NÃO DANÇAR

Além do tratamento clínico, dependentes de drogas em Mandirituba encontram na dança africana incentivo para abandonar o vício

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utilização de drogas, legais e ilegais, tem se tornado um forte problema dentro das famílias brasileiras, refletindo na sociedade em questões de segurança, saúde e educação. Diversas políticas públicas já foram criadas para sanar o problema, mas ainda assim as estatísti cas continuam assustando. O alcoolismo atinge mais de 10% da população brasileira, número que representa cerca de 20 milhões de pessoas. Nas Américas, a cada 100 mil mortes, 12,2 po deriam ser evitadas se não houvesse consumo de álcool, de acordo com a pesquisa realizada pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). As doenças causadas pelo álcool, como diabetes, cirrose, hipertensão arterial e câncer, são res ponsáveis por 30% das internações em hospitais gerais e 50% em hospitais psiquiátricos. Além do tratamento clínico, atualmente a intervenção social, feita por meio de ONGs e demais insti

tuições, buscam reestruturar a parte psicológica do paciente. Inserção no mercado de trabalho, suporte psicológico, grupos de apoio e mais acesso à cultura têm se tornado alternativas para quem busca fugir do vício.

As dificuldades ocasionadas pela dependência de drogas, assim como o tratamento, acabam fragilizando o ambiente familiar e muitas vezes prejudicando a recuperação do paciente.

Diorlei Santos, 24, não suportou os problemas de alcoolismo da mãe e, aos 9 anos de idade, saiu de casa e passou a viver sozinho nas ruas de Curitiba, tornando-se dependente de crack –uma substância que, segundo a pesquisa reali zada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), atinge cerca de 370 mil de brasileiros. Entre esses, 40% vivem nas ruas. Tentando reverter o crescimento da utiliza ção de drogas, diversas instituições realizam

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trabalhos de recuperação e prevenção, muitas vezes com o serviço gratuito e desvinculado das políticas estipuladas pelo governo. É o caso da Chácara Meninos de 4 Pinheiros, localizada no município de Mandirituba, Região Metropo litana de Curitiba. A fundação é uma das mais importantes iniciativas da América Latina em prol da infância e da adolescência. Desde 1991, o local abriga crianças e adolescentes em situa ção de vulnerabilidade social, auxiliando no seu desenvolvimento através de diversas atividades pedagógicas.

Arte como recomeço

Aos 11 anos de idade, Diorlei passou a ser um dos jovens apoiados pela Chácara Meninos 4 Pinheiros. Mas foi apenas depois de três anos de luta para se manter longe das ruas e das drogas, que ele começou a morar definitivamente na chácara.Trabalhou por cinco anos como educador na fundação, mas foi em 2007 que um convite abriu para ele um caminho de novas possibilidades e motivações: a dança africana. Indicado por uma colega, que também traba lhava na chácara, topou participar do concurso Beleza dos Palmares. Com apenas quatro meses de ensaio, conquistou o terceiro lugar na com petição, o que rendeu a ele um novo convite. Atualmente, o jovem dá aulas para turmas particulares de dança, o que se tornou uma forma de recomeço, afastando de vez o crack da vida de Diorlei.

Em um teatro de Mandirituba, um grupo de meninas já ensaiava sob a supervisão de Ade lina Barcelos, que além de responsável pelas aulas, também foi a responsável pelo convite que apresentou Diorlei à dança africana. Com o nome de Olodum Bayê, que logo se tornaria Alabí, ele uniu os meninos da chácara com as

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meninas de Mandirituba em um só grupo. Além de dança africana, passou a ensinar tam bém percussão e, principalmente, a importância da valorização da cultura negra.

A intenção do grupo, segundo Diorlei, é “ajudar por meio da cultura afro-brasileira, da percussão e através da dança a conhecer e se envolver em outro mundo”. Para o educador, a valorização da cultura é essencial para conhecer a história do povo brasileiro. “Querendo ou não, a cultura afro-brasileira relata a história do nosso país. A cultura afro-brasileira que ergueu esse Brasil”, defende.

Contra turno

Samuel César dor Reis é um dos mais jovens integrantes do grupo. Tem apenas 12 anos e a certeza de que quer seguir o caminho da arte. “Eu me imagino dando aula de dança.” Depois que sai da aula, Samuel participa de diversos projetos no contra-turno, mas acha que faltam atividades mais interessantes para as crianças e adolescentes ocuparem seu tempo livre. Para a estudante de Pedagogia Isis Machado, de 21 anos, que também faz parte do grupo Alabí, as atividades de contra-turno precisam interessar os jovens para ter um bom resultado. “É isso, uma coisa que distraia eles e que eles gostem.” Os projetos sociais, além de ocupar a criança e o jovem nos momentos em que ele estaria vulnerável a situações de risco, possibilitam um desenvolvimento em todas as áreas. No caso da dança, além desenvolver habilidades específi cas, também trabalha valores como responsa bilidade, integridade, cooperação e leitura de mundo que a criança vai ter. “Porque a partir do momento em que ela se percebe importante naquele contexto, ela passa a valorizar tudo que acontece entorno dela. [...] A respeitar o am

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biente, a respeitar o outro, a lidar com situações de conflito e a criar oportunidades de resolver esse conflito atendendo aos princípios mínimos da solidariedade, da confiança, da dignidade”, explica a pedagoga Mirian Celia Castellain. De acordo com Mirian, para que uma ação tenha sucesso, é preciso levar em consideração três aspectos. O primeiro é entender o contex to, a realidade da criança. Segundo, o que essa atividade vai trazer de ganho para ela e porque vai ser importante para sua vida e seu desenvol vimento. E o terceiro é como essa criança vai estar e como lidar com ela ao sair do projeto. “Porque não adianta você pensar em um proje to, desculpe o termo, só para tapar buraco, que venha atender aquele momento e não pense no futuro”, disse a pedagoga. Quando esses três aspectos estão bem definidos, a aceitação se torna maior e a resistência por parte das crianças e jovens diminui. “A criança tem que participar do projeto porque ela quer estar lá e não porque ela tem de estar lá. A gente chama isso de motivação. Ninguém motiva ninguém, a motivação é interna.” Além de Mandirituba, onde mantém o grupo Alabí e continua sempre presente na Chácara Meninos de 4 Pinheiros, Diorlei dá aula de dan ça africana e percussão em Quatro Barras e na Vila Capanema, no projeto Passos da Criança. A iniciativa é voltada para crianças em situação de risco. “A criançada lá é ‘zica’, mas são gente boa. Você tem que saber chegar e saber sair”, afirma o educador.

Sobre o grupo, conta que “Alabí significa nas cido para vencer e nós vamos chegar lá”. Para Fernando, que trabalha na Chácara, Diorlei “conseguiu virar o jogo e dar a volta por cima e hoje ele é um exemplo de superação pros meni nos e para a sociedade”.

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QUEM VIVE DE LIXO?

Famílias transformam resíduos recicláveis em fonte de renda

Não é difícil encontrar, espalhados pelas ruas de Curitiba e da Região Metropolitana, milhares de catadores de lixo. São pessoas que, informalmente, trabalham na coleta e na separação correta dos resídu os recicláveis produzidos todos os dias na região. Essas famílias dependem do lixo para sobreviver, e dele fazem sua renda mensal.

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Gabriela Oliveira, Helem Barros, Raíssa Ribeiro crédito: Reprodução

Segundo dados da Prefeitura de Curitiba, atualmente a cidade produz diariamente 1,8 toneladas de lixo, um quilo de resíduos por cada morador da cidade. O que é gerado pela população de Curitiba e Região Metropolitana é depositado, hoje em dia, no Centro de Ge renciamento de Resíduos Iguaçu (CGR Igua çu), no município de Fazenda Rio Grande.

O CGR Iguaçu está localizado em uma área de 2,6 milhões de metros quadrados, mas apenas 382 mil são utilizados para compactação e armazenamento do lixo. O restante do terreno é utilizado como área ambiental. O Centro de Gerenciamento tem capacidade para 2,4 mil toneladas por dia e os resíduos descarregados no local são cobertos com 70 centímetros de terra, todos os dias, para evitar o mau cheiro.

Márcia Mariano, de 33 anos, e sua mãe, Iracema Lopes, 59, vivem da coleta de ma teriais recicláveis há dez anos e enfrentam as dificuldades da informalidade do serviço. “O trabalho é cansativo, dá para comprar algumas coisas, mas pagar contas não dá”, afirma Mar cia. Mãe e filha fazem parte da Associação de Catadores de Material Reciclável Ilha, localizada em Almirante Tamandaré, onde os catado res podem guardar e fazer a separação do lixo. Cada catador tem a sua baia, um espaço para armazenar o que é coletado. Claudete da Silva, 42 anos, conta que gosta do trabalho. “Eu adoro trabalhar aqui na associação reciclando o lixo. É um lugar tranquilo e eu tenho vários amigos.” Claudete também comenta sobre a falta de reconhecimento da profissão: “O nosso trabalho é como qualquer outro e merece ser valorizado.”

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Iracema Lopes, ve na reciclagem do lixo sua forma de sustento. crédito: Gabriela Oliveira

Quais os impactos de um aterro para a população?

A comunidade que se encontra ao redor de ater ros sanitários pode acabar sofrendo fortes consequências. Para o professor Carlos Mello Garcia, o impacto do aterro no meio ambiente depende da qualidade de gestão do projeto. “Se o aterro for mal feito, é um veneno para a comunidade ao redor. Se for bem operado, não traz nenhum problema para a sociedade, que pode habitar a região próxima sem preocupações”, explica.

O antigo aterro da Caximba, que antes era o destino do lixo de Curitiba e RMC, está passando por um monitoramento, além do trabalho de revitalização da área. O centro de gerenciamento de resíduos foi projetado para ter uma vida útil de 20 anos, mas permaneceu 30 anos em atividade. “O aterro da Caximba causou maus odores, o chorume era jogado nos rios, além de haver proliferação de ratos, inse tos e aracnídeos, prejudicando e incomodando fortemente a comunidade ao redor”, afirma o professor.

Garcia acredita que o CGR Iguaçu, que é admi nistrado por uma empresa privada, ao contrário do antigo, tem uma boa organização e não ofe rece riscos para a comunidade. Procurada pela equipe da CDM, a empresa Estre Ambiental, que gerencial o CGR Iguaçu, não se manifestou até o fechamento desta edição.

Legislação

Os catadores de material reciclável são ampa rados por uma lei que instituiu a Política Na cional de Resíduos Sólidos, a Lei 12.305/10, que garante a inserção das associações no trabalho de coleta seletiva de lixo. Menciona, também, o conceito de gerenciamento e gestão dos resíduos sólidos, meios eficazes para a coleta, transporte, tratamento e destinação final ambientalmente adequada.

Para o professor e doutor Carlos Mello Garcia, do Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), há um debate com relação a esse modelo não oficial de coleta. “O trabalho executado pelos catadores acabou por se transformar numa peça fundamental no processo de reciclagem. Deve-se valorizar o trabalho deles e buscar uma condição humana sustentável”, aponta Garcia.

No cenário atual, Curitiba e a Região Metro politana executam o trabalho da reciclagem com quase 20% de todo o lixo recolhido. “Outros 20% são realizados pelos catadores. Daí, você vê a importância deles: quanto mais eles fizeram sua reciclagem, menos teremos de volume e, consequentemente, pagaremos menos pelo espaço desse lixo, na Fazenda Rio Grande”, explica o engenheiro ambiental.

Segundo Garcia, o jeito que o trabalho é feito não é correto. “É desumano, não podemos escravizar as pessoas. Numa sociedade que se preze, deveria-se pensar melhor sobre em como incorporá-los no processo de trabalho, sem tirar sua liberdade”, reconhece.

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COLABORADORES

O trabalho de coleta e separação do material reciclável feito pelos catadores informais mui tas vezes acaba se tornando exaustivo. Ainda assim, a separação do lixo ainda é insuficien te, e prejudica o trabalho dentro dos aterros.

Separar o lixo orgânico do reciclável dentro de casa é uma boa iniciativa para colaborar com o meio ambiente. Felizmente, existem pessoas, como Cleuza Santos e sua família, em Fazenda Rio Grande, que não deixam de contribuir com o trabalho dos catadores. “Aqui em casa, é lei separar o lixo, além de ajudar o pessoal que precisa, estamos fazendo

crédito: Gabriela Oliveira

O material reciclado é vendido para empre sas especia lizadas.

um bem para o meio ambiente. Não custa nada separar”, explica. A separação do lixo acaba tomando bastante tempo de trabalho dos catadores informais. A ação dentro das re sidências contribui para melhorar as condições de trabalho de quem vive disso.

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Nas mãos do destino

Os haitianos deixaram seu país em busca de uma nova oportunidade no Brasil

Edras Occeius está há um ano e oito meses no país

Bianca Caroline Carolina Rodelli Juliana Reis Mariana Therezio
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Bianca Caroline

Eles têm entre 20 e 40 anos e vieram ao Brasil em busca de emprego e de uma vida melhor, tendo de deixar para trás a família e uma bagagem de histórias. A estima tiva é de que que 2 mil haitianos vivam hoje em Curitiba e Região Metropolitana, concen trando-se, a maior parte, em Pinhais e São José dos Pinhais. Com a expressão de cansaço após mais um dia de trabalho, Edras Occeius, de 32 anos, saiu do país caribenho há um ano e oito meses, deixando mãe e esposa, em busca de uma vida. “Saí para trabalhar no Brasil. Eu trabalhava na República Dominicana, como pedreiro, e deixei minha família lá. Gostaria de trazê-la, mas falta dinheiro e todo mês tenho que mandar dinhei ro para lá”, afirma. Deixar os cinco filhos e a esposa foi a dura decisão tomada por Michelet Trisme, 38 anos, que sofre com a saudade, o frio e com a adaptação no país. “Deixei meus cinco filhos e esposa no Haiti e queria que viessem para cá, mas não tenho dinheiro. O trabalho não paga bem e faz muito frio. Sinto muita falta da minha fa mília”, conta o haitiano que trabalha em uma vidraçaria no bairro Vila Hauer, em Curitiba, desde abril de 2014.

denciamos uma acolhida, hospitalidade”, explica. Quanto à maior dificuldade relatada pelos imigrantes que chegam diariamente à Pastoral, Agler afirma que a adaptação com a língua é o fator que mais acaba os prejudicando em vá rios aspectos. “A maior dificuldade é o idioma. Poucos chegaram aqui com conhecimento da língua espanhola e fica mais fácil. Já aqueles que falam o crioulo e o francês é mais difícil. Sem a língua, eles não tem trabalho, pois mui tas empresas para contratar, exigem o dominio do idioma”, conclui.

Laurette Bernardin, 33 anos, é outro exemplo

“O trabalho não paga bem e faz muito frio. Sinto falta da família” -

Michelet Trisme, imigrante haitiano

Como forma de ajudá-los a encontrar uma oportunidade, a Pastoral do Migrante, serviço da Igreja Católica, busca um acompanhamen to de pessoas em estado de vulnerabilidade, como os haitianos que chegam à cidade. O trabalho é coordenado pelo padre haitiano Agler Cherizier, de 33 anos. “Damos suporte à pessoa, tanto na questão da documentação quanto da orientação para o trabalho. Provi

de superação dos desafios da imigração, quan do deixou o Haiti com as duas filhas, há qua tro anos, para estudar na Universidade Federal do Paraná. Ao chegar ao Brasil, encontrou o preconceito e hoje é presidente da Associação dos Haitianos de Curitiba e Região Metro politana. “Fiquei um pouco chateada com as palavras das pessoas que interpretam mal os imigrantes, acham coisas erradas. Nosso trabalho para ajudar os imigrantes em recente chegada ao Brasil é na procura de trabalho, aulas de português, casa para alugar e outros.” Diariamente, cerca de 50 haitianos procuram ajuda em toda Curitiba e Região Metropoli tana, com dificuldades no idioma, adaptação ao clima e enfrentando o preconceito. Muitos deles ficam presos ao medo que sentem e não encontram a realização que procuram.

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Jogo dos trilhos

Moradores de área de risco enfrentam diariamente o perigo do tráfego de trens nas portas de suas casas

As linhas ferroviárias que cruzam o Paraná rendem paisagens particulares. Em Almi rante Tamandaré, o trem passa quatro vezes ao dia e desperta a atenção de centenas de pesso as. Com o convívio diário, os moradores já se acostumaram com o barulho e o tremor provo cado pela passagem dos vagões, apesar de alguns ainda levarem sustos de vez em quando. Dos 103.204 habitantes da cidade (Censo IBGE 2014), centenas enfrentam as dificuldades na moradia de risco ao redor dos trilhos. O problema já tem mais de 15 anos e nenhuma solução prevista, nem pela América Latina Logística (ALL), nem pela prefeitura, tampou co pelo Ministério Público. Enquanto isso, as rachaduras, os acidentes e o perigo de ter um trem passando na porta de casa continuam fa zendo disso um jogo no qual o morador sempre sai perdendo.

Angelita Moraes da Silveira, 47, mora na Vila Grécia, bairro de Almirante Tamandaré, há mais de 11 anos e já se adaptou à rotina do trem. O primeiro sinal dos vagões vem às 4 ho ras da manhã. “O som atrapalhava. No início, eu até levantava da cama, mas hoje nem vejo o trem passar”, conta. Com ela, mora seu marido, suas duas filhas e sua neta recém-nascida. Ange lita considera o bairro tranquilo, mas diz que se mudaria se pudesse.

INÍCIO

Em 1985 chegaram

primeiros moradores

redor dos trilhos. Hoje, centenas de pes soas continuam vivendo nessas áreas de risco. (avance 5 casas)

“O som atrapalhava, no início eu da cama, mas hoje nem vejo o trem Angelita Moraes da Silveira, 47, mora cia há mais de 11 anos e já se adaptou trem. (avance 5 casas)

Já Ivonei José Ribeiro, 42, morador da região há cinco anos, ainda não se adaptou ao local. Ele e seus filhos acordam assustados quase toda noite. Além disso, sua casa apresenta rachadu ras por causa da pressão do peso dos vagões. “Cada vez que o trem passa vai trincando tudo, e a gente vai remendando”, reclama. Por estar próxima a um barranco, a impressão é que a casa vai se dividir em duas partes. Quando questionado sobre uma possível mudança do local, Ivonei diz que só sairia se tivesse outras opções de moradia ou auxílio. E, apesar das ca racterísticas da região serem de invasão, garante que comprou o lote e “tem o terreno registrado em cartório”.

“A ação da empresa de posse, o dores se retirem determinado. um oficial de realizar a relocação tadas”. Assessoria (avance 5 casas) Você chegou (não importa avance, do jogo 25 casas)

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“Cada vez que o trem passa vai trin cando tudo, e a gente vai remendando”. Ivonei José Ribeiro, 42, mora na Vila Grécia há 5 anos e ainda não se adap tou à rotina do trem. (avance 5 casas)

até levantava trem passar”. mora na Vila Gré adaptou à rotina do

“A área de rede ferroviária é o menor dos problemas de invasão no município, já que não é de domínio da administração municipal. A prioridade são as áreas de preservação, alagamento e encosta”. Leonel Siqueira, Secretário de Planejamento de Almirante Tamandaré. (avance 5 casas) empresa é pedir reintegração que determina que os mora retirem do local até um prazo determinado. A medida é feita através de de Justiça e cabe à prefeitura relocação das pessoas afe Assessoria de imprensa da ALL. casas) chegou ao fim! importa quantas casas você avance, sempre voltará ao início jogo que já dura 15 anos. Volte casas)

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O secretário de Planejamento de Almirante Ta mandaré, Leonel Siqueira, trabalha há mais de um ano na prefeitura e diz que não há solução prevista para o problema. Segundo Siqueira, os recursos da União destinados ao município não cobrem os custos de relocação dos moradores da região dos trens. “A área de rede ferroviária é o menor dos problemas”, conta o secretário sobre as áreas invadidas. A parte dos trilhos, que pertence ao governo federal, não é de domínio da administração municipal e a prioridade de mudança vai para as áreas de preservação, alaga mento e encosta. Siqueira também afirmou que não há contato com a ALL, empresa que tem o domínio atual sobre a área, e que os ofícios enviados à concessionária ainda não foram respondidos.

A ALL recebeu a concessão para a área fer roviária em 1997 e, desde então, lida com diversas regiões de ocupação irregular. A ação da empresa a esse tipo de causa é pedir reintegração de posse, o que determina que os moradores se retirem do local até um pra zo determinado. A medida é feita através de um oficial de Justiça e, segundo a concessionária, cabe à Prefeitura realizar a relocação dos das pessoas afetadas para outra área.

Menino caminha pelos trilhos (fig. 1)

Ao lado, os moradores: Angelita Moraes da Silveira e sua filha Thayná (há mais de 11 anos morando na Vila Grécia, já se acos tumaram); e Ivonei José Ribeiro que tem constantes rachaduras em sua casa (há cinco anos na Vila Grécia).

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Fotos: Pedro Giulliano

A Vila Grécia é uma das maiores áre as de mora dia de risco ao redor dos tri lhos de trem em Almirante Tamandaré.

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Fotos: Pedro Giulliano

Uma longa novela na Lapa

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UUma novela que vem tendo cenas do primeiro capítulo reprisadas há mais de seis anos. O cenário é a cidade his tórica da Lapa, a 60 quilômetros de Curiti ba, e o protagonista desse drama é o Parque Estadual do Monge. Todos os anos, turistas do Brasil e do mun do desembarcavam na cidade, que até hoje tem um apelo turístico e religioso muito marcante, para conhecer os museus, pra ticar esportes e, principalmente, conhecer o Parque Estadual do Monge, que é uma Unidade de Conservação Ambiental. Em 2008, o parque foi fechado para uma revitalização que, em princípio, seria simples, com duração de um ano, e traria mais conforto e segurança aos usuários do parque, protegeria a fauna e a flora locais e movimentaria a economia da cidade graças ao maior número de turistas. O Instituto Ambiental do Paraná (IAP) propôs um projeto de revitalização que inclui, entre outras medidas, um centro de visitantes, trilhas sinalizadas, espaço para meditação e a recuperação da vegeta ção nativa – removendo árvores exóticas e investindo o dinheiro da venda destas em espécies locais e na infraestrutura turística. O objetivo de eliminar as espécies invasoras e recompor os campos originais, de acor do com o jornal Gazeta do Povo, não foi alcançado. Isso porque o equivalente a 640 caminhões de toras de pinus e eucalipto foram comprados por uma madeireira por R$ 3,5 milhões em 2010, mas esse montante de dinheiro não foi reinvestido na revitalização do parque.

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Foto Katiucy Binhara

Segundo Maria do Rocio Lacerda, chefe do Departamento de Unidades de Conservação do IAP, o esforço na revitalização do parque vem se dando desde 2008 porque os procedi mentos no estado do Paraná são demorados.

“O atraso se deu devido a procedimentos licitatórios que estão sob a responsabilidade da SEIL/PRED (Paraná Edificações), que foi criada pelo atual governo para realizar as obras. Infelizmente, alguns procedimentos no estado são morosos e temos que nos submeter aos prazos que nos são dados pelas empresas responsáveis pela execução das obras”, afirma. Maria do Rocio revela que, agora, as obras estão em andamento, mas que podem ser prorrogadas devido a uma solicitação da atual empresa responsável. “Os trabalhos estão em andamento, com prazo previsto de finalização para setembro, porém a empresa construtora solicitou um termo aditivo de prazo”, diz. Maria justifica que, apesar dos atrasos, as melhorias para o parque serão inúmeras. “Elas passam pela revitalização total da infraestrutura pré existente, até a regularização de áreas den tro do perímetro do parque para que possamos estabelecer atividades de recomposição am biental e a restauração de 90 hectares de áreas previamente ocupadas por reflorestamentos, atualmente em processo de regeneração natural com espécies nativas e típicas dos ambientes existentes nesta Unidade de Conservação.”

Ainda de acordo com a chefe do Departa mento de Unidades de Conservação do IAP, existe a possibilidade de implementação de ações de educação ambiental no parque. “Após a finalização das obras e alocação de pessoal capacitado para a gestão dos espaços, podere mos implementar ações, tais como o Programa Parque Escola já implantado em 15 Parques

Estaduais do Paraná, além de pesquisa cien tífica com a disponibilização de alojamento e espaço para trabalho científico.”

As denúncias de desvio de dinheiro e o atra so nas obras são alguns dos fatores que vêm prejudicando a economia local. Para o diretor municipal de Turismo, Sérgio Vinicius de Souza Junior, a revitalização do parque teve impactos negativos. “A obra demorou seis anos e, nesse período, o turismo do município foi completamente afetado”, avalia.

Ele esclarece que a população terá a reabertura de um espaço antes muito utilizado por ela e por visitantes do mundo inteiro, mas ainda restam dúvidas sobre a eficácia das obras e se elas vão justificar esses anos de atraso e a perda irreparável de renda para os comerciantes. “Resta saber se depois de tantos anos nesse

Foto Katiucy Binhara

Entrada Parque Estadual do Monge

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estado de descaso, atraso e indiferença, o local voltará a ter o fluxo de visitantes, que inclui turistas e moradores, que tinha antes do início da intervenção.”

Rodrigo Stica, voluntário do parque, conta que, antes do início das obras, chegavam à ci dade, nos fins de semana, em média 30 ônibus trazendo fiéis de todos os lugares. “Os turistas passavam o dia, gerando uma renda signifi cativa para o município. Quando resolveram fechar o parque para a revitalização, começa ram os problemas, que vão desde o atraso nas obras, escândalos com desvio de dinheiro e da madeira retirada do parque, proibição de visi tas e da prática de esportes radicais, tais como rapel e vôo livre”, comenta. Stica considera a situação como um todo cons trangedora para a cidade. “Em qualquer lugar do Brasil, quando algum lapeano se identifica, as pessoas perguntam como estão as obras no parque do Monge. Diante da falta de respos tas, o que resta é a vergonha.” A atual empresa responsável pelas obras, a

Valor Construtora e Serviços Ambientais Ltda., foi contratada em 2013. No edital, o inicio das obras deveria acontecer no dia 10 de janeiro deste ano. No entanto, o recomeço das obras se iniciou em 06 de Fevereiro. A reporta gem da CDM entrar em contato com a Valor Construtora e Serviços Ambientais Ltda., mas não obteve resposta.

Paulo Ricardo Amaral, vendedor e-commerce, nasceu na Lapa, e relata que aparentemente o número de fiéis diminuiu após o início das obras. “O Parque do Monge é um local muito bonito e uma das principais atrações da cidade. Por causa da reforma, e por incompetência ad ministrativa, acredito que não se atraem mais vários peregrinos ao local como antes. Uma pena.”

Ricardo Vieira, graduando em Engenharia Civil, também é lapeano e fala que além de não poder aproveitar todas as opções dentro do parque, a maior perda é a redução do número de turistas que movimentavam a economia da cidade. “O parque é um lugar bonito e ótimo para passar o dia, pois é tranquilo e repleto de belezas naturais. É o maior atrativo turístico, e esses atrasos nas obras representam perdas econômicas para os comerciantes, pois diminui drasticamente o fluxo de visitantes.”

O prazo para a conclusão das obras e entrega do parque, está chegando. Será que cabem mais algumas surpresas nesse roteiro? Aguarde mos as cenas dos próximos capítulos.

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Foto Katiucy Binhara Obras Parque Estadual do Monge

histórico Um cenário

A Lapa preserva um passado de disputas políticas e pessoais. Embora sua história não seja muito conhecida pela população em geral, sua lembrança ainda está presente em seus monumentos e na memória dos lapeanos.

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Ana Beatriz Villas Boas, Ana Luiza Souza, Bruna Mazanek e Lucas Prestes das Chagas

maragatos, gaúchos insatisfeitos com o gover no centralizado, precursores da revolução.

Em meio a essa rivalidade, durante 26 dias, os 639 combatentes em prol da república – mili tares e também voluntários lapeanos, que fo ram recrutados pelo coronel Joaquim Rezende Correia de Lacerda – lutaram, sob o comando do coronel Antônio Gomes Carneiro na ten tativa de conter uma força de 3 mil homens armados, que buscavam a revolução. “A divisão entre as facções perdurou até pouco tempo. Apesar de não serem famílias inteiras, algumas pessoas permanecem com as posições políticas da época”, conta Márcio Assad, pes quisador apaixonado pela história da Lapa. Ele ainda compara a divisão das opiniões políticas como se fosse a briga entre Montecchios e Capuletos, aproximando o ocorrido da peça teatral Romeu e Julieta, de William Shakespeare. Helenita Prevedello, jornalista e assessora da prefeitura da cidade por 12 anos, fala dos potenciais da Lapa e a repercussão de sua

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Maria José

Weinhardt

história: “O próprio Cerco e o movimento tropeiro viraram um legado cultural e potencial legado turístico para a cidade”. Movimento tropeiro

Foi através da compra e venda de gado e do comércio tropeiro que se deu início às insta lações e ao povoamento dos caminhos do Pa raná. Era um comércio rico e intenso, já que a principal atividade da época era a minera ção, não havendo produção agrícola, nem de gado. Sendo assim, ficavam dependentes de outros estados para esse fim. Com isso, o Sul promoveu a criação de “criadouros”, que supriram as necessidades alimentícias e de transporte, um negócio altamente rentável,

fazendo com que o Paraná tivesse um impulso significativo no início de sua história.

A Lapa nasceu do Caminho das Tropas, bem como outras cidades paranaenses, a exem plo de Ponta Grossa e Castro. Essas cidades surgiram da ocupação de novos lugarejos, de pequenos povoados ou vilas, mas que passaram a ter vida própria.

A alimentação desses viajantes também fez história. Um dos pratos típicos é o “arroz tropeiro”, feito com o cereal e charque. Tam bém faziam virado de feijão na panela de ferro.

São uma mistura das gastronomias gaúcha e mineira.

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O tropeirismo foi um movimento tão forte história
Silveira, herdeira de memórias da história lapeana

que tornou-se uma cultura, uma profissão, passada de pai para filho, desde seu auge, para não deixar morrer a história tão preservada na cidade.

Aniversário de sangue

Em 2014, o episódio que marcou para sem pre a história da Lapa no território nacional completa 120 anos. Ao contrário do que se encontra nos livros sobre revoluções políticas pacíficas no Brasil, o Cerco da Lapa levou con sigo cerca de 10 mil vidas, porém, esse número torna-se irrisório em relação às inúmeras mor tes que ocorreram e continuariam acontecendo nos anos seguintes.

A expectativa e realidade relacionada ao cenário político brasileiro da época destruíram

Lapa “Apenas quatro letrinhas enfeitando o nosso mapa perceberam na entrelinha que estou falando da Lapa.

Festejamos pois, a data da cidade Centenária na grandeza que retrata nossa Lapa Legendária.

O Lapeano é bom e ordeiro modesto, culto, valente Honesto e bravo guerreiro Trabalhador excelente! ” Alexandre Weinhardt Silveira

O engenho artesanal de mate é uma das atividades econômicas mais tradicionais da Lapa

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famílias inteiras. Pica-paus e maragatos, lega listas e federalistas, construíram a história da Lapa a preço de vidas durante o Cerco. Hoje, a cidade guarda a memória de seus he róis, ícones da Revolução Federalista de 1894, no Panteão dos Heróis, monumento construí do em 1944 para homenagear os soldados das forças republicanas, guardado pela Guarda de Honra do Exército Brasileiro.

“É uma cidade que respira história”, afirma Márcio Assad, quando se refere à Lapa. Os prédios e construções de época trazem todo o perfil de um município que usa o turismo como uma das suas fontes de renda, mas não com a força potencial econômica de que ele

é capaz. “Vivemos num país que não com preende muito bem o turismo. Não há mais uma secretaria específica no estado do Paraná, sendo que o turismo necessita que todas as outras áreas estejam em um bom andamento para ele funcionar, como saúde e segurança”, ressalta Assad.

Vários pontos tornam a cidade um lugar úni co: 23,41 hectares de construções históricas; a única Câmara de Vereadores no Paraná que está em funcionamento em seu prédio original; o terceiro teatro mais antigo do país, o Theatro São João, com estilo neoclássico e influência elisabetana; e a única cidade do Paraná onde se encontra a Congada, manifestação folclórica dos descendentes de escravos negros.

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A Casa Lacerda mantém preservado o cotidiano de uma das famílias mais importantes da cidade
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Fotos: Ana Luiza Souza

Você mora onde?

Pessoas que vivem em municípios da Região Metropolitana de Curitiba enfrentam preconceitos em seu dia a dia

crédito: Silvia Tokutsune
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Carolina Silva Mildemberger, Mayara Nascimento, Silvia Yumiko Tokutsune e Vinicius Cordeiro

AGrande Curitiba é formada pela cidade em si, mais 29 municípios localizados ao seu redor. Apesar de serem cidades muito menores se comparadas à capital, são tão importantes quanto ela para alimentar a economia e o mercado de trabalho da região.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE), a taxa anual de crescimento da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) é de 3,02%, maior que a média dos demais centros urbanos do país, que é de 1,53%. Na estimativa feita na primeira década deste sécu lo, são 3.168.980 habitantes distribuídos em uma área de 15.419 km². Em 2008, o Produto Interno Bruto (PIB) da região foi de R$ 74,8 bilhões, o que representou aproximadamente 42% do total do estado.

Segundo Bueno, o espaço urbano foi fragmentado. Assim, a elite e a classe média se con centraram no centro da cidade, enquanto os trabalhadores e as pessoas com menor qualificação profissional ficaram ao redor.

A vida nas bordas

Rodrigo de Araujo Krieck, 22, é estudante de Direito e mora em Pinhais há três anos. Esco lheu trabalhar por lá também, devido ao fácil acesso. “Não tenho nenhum tipo de dificulda de na minha locomoção. Até pelo contrário: os acessos são rápidos e o trânsito flui”, ele relata.

Apesar de todos esses números, é muito comum de se ver preconceitos com relação à Região Metropolitana, e consequentemente, com seus moradores. Mas por que será que isso acontece? Segundo o professor de Ciên cias Sociais de PUCPR César Bueno, é uma questão de classe. “A gente poderia dizer que o centro de Curitiba tem medo da periferia, isso não há dúvida. Foi criada uma situação, um estigma, em que as questões de violência e os diferentes, os desordeiros, de um modo geral, estão preferencialmente localizados na periferia e não no centro da cidade.”

Rodrigo conta que nunca teve contato com o preconceito propriamente dito, mas que brincadeiras a respeito do nível de criminali dade da cidade e o fato de ser longe de tudo são corriqueiras. “Acho que tudo isso é uma falsa impressão causada pela mídia, que sempre coloca tudo de ruim em volta da Região Metropolitana, quando na verdade se tem isso em todo lugar. Por fim, eu moro em Pinhais há três anos e gosto muito. Tudo que preciso tenho aqui”, conclui.

Gabriel Eloi morou em Curitiba com os pais até os 10 anos, quando foram para São José dos Pinhais por questões financeiras. Após concluir o ensino médio em um colégio es tadual e arranjar um emprego em Curitiba, a mobilidade na capital foi o grande problema. “A locomoção não é difícil, mas é mais demo

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rada. O que dentro do centro de Curitiba iria levar de dez a 15 minutos, para mim demora cerca de 40 minutos, uma hora. Acordava mais cedo, precisava de mais de uma passagem.”

Hoje, aos 23 anos, o jornalista comprova que existe um preconceito e relata situações que já presenciou. “Na faculdade, eu ouvia piadas como ‘Você não mora, se esconde’. A minha casa é legal pra fazer churrasco, mas, quem vai querer ir até lá? Eu já vi gente da Região Metropolitana que sofre por causa disso, porque as pessoas acham que por você morar longe, não é bom o suficiente.”

O estudante também enxerga um tipo de receio em relação à condição social das pessoas. “Grande parte desse receio, além de ser por onde a pessoa mora, também é pelo jeito que ela se veste. Conheço pessoas que sofreram por preconceito ao entrar em uma loja.Os vende dores analisam o vestuário e já olham torto.”

eu ouvia piadas como ‘Você não

Guadalupe

Já Wesley Machado, 18 anos, não se vê longe de Colombo, mesmo tendo o trabalho de pegar mais de um ônibus e fazer uma via gem mais longa. “Quando eu vou para a facul dade, demoro cerca de uma hora, vou para Curitiba às 6 horas da manhã e pego dois ônibus”, relata.

Gabriel e Wesley têm algo em comum. Os dois fazem parte do grupo de 70 mil pessoas que passam diariamente pelo Terminal Guadalupe, localizado na Rua João Negrão, no centro da da capital paranaense. O terminal é a principal ligação entre Curitiba e a Região Metropoli tana. Nela, cerca de 50 linhas intermunicipais funcionam para transportar as pessoas na ida e na volta de suas casas.

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“Na faculdade,
mora, se esconde’.” - Gabriel Eloi, jornalista.
Cerca de 70 mil pessoas passam todos os dias pelo Terminal Guadalupe. crédito: Vinicius Cordeiro

GUADALUPE

PRÓXIMA

PARADA...

Nesse ponto de transição entre residência e trabalho, o mínimo que as pessoas esperam é segurança. Porém, esse não é o caso. Para Wesley, o terminal facilita e não precisa de uma expansão, mas tem seus defeitos. “O terminal é grande o bastante para suprir a de manda de transporte. O grande problema é a falta de segurança. Muitos assaltos acontecem. Existem muitos usuários de drogas também. É complicado”, revela.

Por outro lado, Gabriel planeja trabalhos pes soais no local. “Tenho vontade de morar aqui perto por um tempo e produzir um documen tário contando a história e a importância do Guadalupe. Diversos tipos de pessoas passam aqui e, claro, muitas pessoas se sustentam desse comércio.Dariam boas histórias.”

voltarem todos os dias. Ele conta que já está acostumado com as brincadeiras ligadas ao lugar onde ele mora, e que sempre leva na esportiva. “Uma vez, no meu primeiro ano estudando em Curitiba, me envolvi numa discussão com um pia, e umas das primeiras coisas que ele me xingou foi de ‘roceiro do in terior’. No caso das brincadeiras, já são tantas que nem lembro mais. A melhor que eu ouvi talvez tenha sido quando um amigo perguntou se já tinham inventado o fogo aqui em Rio Branco.”

A administradora Heloísa Taborda vê como o principal motivo desse preconceito a questão geográfica. Devido ao fato de Curitiba ser o “centro” dessas outras cidade, cria-se uma impressão de dependência da parte delas em relação à capital. “Acredito que os curitibanos têm preconceito com a Regiao Metropolitana devido a reduzida infraestrutara dessas cida des, uma vez que se formaram em volta de um grande centro que atendia às suas necessidades e com o passar do tempo tornaram-se mais independentes, apesar de muitos apenas residir lá e manter o emprego em Curitiba”, explica.

Guilherme Stresser, 22, é estudante de Edu cação Física, mora em Rio Branco do Sul e confirma a teoria de que o preconceito parte da falta de conhecimento. Segundo ele, o prejulgamento existe por parte dos curitibanos, que geralmente não conhece muito a RMC e se espanta pelo fato de pessoas de lá virem e

Vale lembrar que, apesar de todas essas ques tões, cada uma das cidades que cercam a capital tem sua independência e importância, e apesar de todas as questões históricas e geográ ficas que envolvem Curitiba e sua região me tropolitana, são pedaços que, juntos, formam o que é hoje a Grande Curitiba.

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23 min Terminal
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Terminal Campina Grande do Sul Terminal Colombo Terminal Afonso Pena Terminal Quatro Barras 1h31 1h22 54 min 51 min
Terminal Araucária
Pinhais
min
crédito: Carolina Mildemberger

doce

Situado na Região Metropolitana de Curitiba, o Lar Mãe Maria acolhe crianças e adolescentes necessitadas de amparo e proteção, com o objetivo de reinseri-o na socidade Por Beatriz Pacheco, Gustavo Lavorato, Jhenifer Valetim, Laura Espada e Mariana Papi

Manifestar o rosto materno e pro vidente de Deus aos pequeninos do Reino. Essa é a missão das Irmãs Beneditinas da Divina Providência. No início do ano 2000, o sonho de construir um lar para acolher crianças e adolescentes, que seriam encaminhadas pela Vara da Infância e Juventude, começou a ser concretizado.

O primeiro passo foi achar um terreno ade quado, que deveria ser próximo a escolas, postos de saúde e meios de transporte. O local escolhido foi São José dos Pinhais, no bairro Borda do Campo, Região Metropolitana de Curitiba. Depois de dois anos de preparo, no dia 2 de março de 2002, o lar foi inaugurado

e funciona até hoje, abrigando mais de 30 crianças e adolescentes.

COTIDIANO

Ao contrário das expectativas do grupo, o Lar Mãe Maria que encontramos foi construído em uma chácara que abrigava cinco casas lares, com pais e mães sociais para fornecer amparo a crianças carentes.

Quem nos recebeu foi a coordenadora do pro jeto, irmã Narcisa, que nos contou que o lar é mantido graças a um convênio com o município de São José dos Pinhais e às doações mensais. “O estado ajuda apenas em projetos esporádicos. Mas não existe uma verba destinada à manutenção do lar vinda do estado,

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LARLAR
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apenas do município. Na verdade, a função de fazer esse trabalho que nós desempenhamos é do governo. A entidade entra como parceira e presta esse serviço, mas claro, para nós, vai muito além”, explica.

O acaso de marcarmos a data de nossa visita no mesmo dia em que um grupo de volun tários desenvolveria atividades, durante todo aquele dia, viria nos ajudar a entender melhor a realidade daqueles que conhecemos.

po grande e diversificado. “Aqui, a gente recebe crianças de todos os jeitos, algumas vêm descon fiadas, a contragosto e outras, pelo o que já pas saram, vêm com muitos problemas psicológicos e até diagnósticos psiquiátricos”, relata a mãe.

“As crianças têm identidade aqui, respeitamos a individualidade delas. Não faltam colaboradores”.

Em meio às atividades, conversamos com Leia Cristina de Campos, que é mãe social há nove meses. Ela, que têm dois filhos, agora é mãe de 11 “São como se fossem meus”. Durante a conversa, Leia reforçou a normalidade de sua rotina como dona de casa. No entanto, existem dificuldades para controlar um gru

Junto com seu marido, Elias Gomes Barbosa, que também se tornou pai social, Leia conta sobre o desafio de li dar com uma jovem com crises con vulsivas, uma filha com transtorno de personalidade bipolar e uma terceira com dependência química. Para ser admitido no lar, Barbosa explica que passou por entrevistas com psicólogos e com a irmã Narcisa. “Eu não estava trabalhando e aqui nós não pagamos luz, água, comemos com as crianças, ou seja, é um benefício para nós também. Ajudamos eles e também somos ajudados. É gratificante”, afirma.

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Hoje, Elias está desempregado e se recupera de uma cirurgia. “Agora tenho mais tempo para ficar em casa e ajudar minha mulher”, finaliza.

VIDA NA INSTITUIÇÃO

Além das crianças que nos contagiaram com alegria ao chegar na chácara, o lar também dispõe de espaço e atenção para as mais velhas. As adolescentes – todas meninas, já que o lar permite a estada de meninos até os 12 anos –podem ficar até completarem 18 anos. Cintia Moreira da Silva, 18, é uma delas. A jovem, que já passou por outras duas instituições, vive no lar há três anos e conta como foi difícil en contrar um lugar que a fizesse feliz. “A primei ra vez que fui parar em uma institui ção eu tinha 12 anos. Algumas vezes, eu voltei a morar com a minha família, só que nunca dava certo porque minha mãe é bipolar e muito violen ta. Na última institui ção pela qual passei, cheguei a apanhar das outras meninas, porque sempre fui a menor”, conta.

De acordo com Cintia, os jovens recebem apoio do lar em todos os sentidos, desde material escolar até cursos externos. A jovem contou que trabalha como menor aprendiz em uma empresa parceira do Lar Mãe Maria e que ganhou de uma madrinha um curso de inglês. Além dela, outras adolescentes são beneficiadas com cursos dados por seus padrinhos.

“Pra gente, isso aqui é nossa família. Pra

mim, eles são meus pais. Eu digo que é como se a minha mãe social tivesse me ‘jogado fora’ na maternidade e eu voltei pra ela. A gente se dá muito bem, ela é meu chão”, revela a adolescente.

O LAR Mesmo com a ajuda permanente de grupos vo luntários e empresas parceiras, o Lar mantém um quadro de funcionários. “Nós temos um quadro de funcionários contratados. São dois psicólogos, duas assistentes sociais, uma pe dagoga, uma educadora, uma fonoaudióloga. Esses profissionais são pagos pela instituição”, explica a coordenadora do projeto. A reveren da explicou ainda que esse quadro de funcio nários é o exigido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e tanto o município quan to a rede de proteção fazem fiscalizações constantes.

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Segundo a religiosa, os especialistas são impres cindíveis para o desenvolvimento das crianças, uma vez que elas chegam com muitas debili dades ao lar. “Às vezes recebemos adolescentes semianalfabetas, que foram muito negligencia das. Temos crianças de 3 anos que não falam, porque foram abandonadas e não receberam estímulo nenhum. Essas são as carências que a instituição tenta suprir”, afirma.

A coordenadora explica que dificilmente a criança chega ao lar com o desenvolvimento pleno para sua idade e, na maioria das ve zes, apresentam lacunas, como problemas de aprendizagem e problemas de saúde.

Irmã Narcisa ainda afirma que a organização

e a seriedade do lar é o diferencial na hora de conseguir parceiros. “As pessoas chegam aqui e notam que as crianças são bem cuidadas, e sempre se oferecem para ajudar. As crianças têm identidade aqui, respeitamos a individualidade delas. Não faltam colaboradores”, conta. Irmã Narcisa explica ainda que, desde o início, em presas se disponibilizaram a apoiar o projeto, e até hoje, recebem essa ajuda, pretendo conseguir mais doações e investimentos de empreendimen tos particulares.

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Ilustração: Mariana Papi

A tranquilidade

mora perto de Curitiba

A busca por um lar, onde a calmaria ganha destaque, pode estar na Região Metropolitana.

Oeterno caminho da procura ideal de um imóvel pode ser guiado de várias formas. A grande Curitiba, contando com a região metropolitana, abriga uma população

de mais de 3,1 milhões de habitantes segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E, sendo assim, esse todo precisa de um lar.

Crédito: Marcela Carvalho

Alugueis de curitiba e Região Me tropolitana não são tão diferentes.

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Helena Comninos, Isadora M. Domingues, Marcela Carvalho e Maria Fernanda Schneider

Levando-se em conta que a Região Metro politana de Curitiba pode estar em uma das opções de busca, os mais de 20 municípios mostram um mercado imobiliário inconstante e inflacionário. De acordo com a Associa ção dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário do Paraná (Ademi/PR),os preços subiram 24% em um ano para os imóveis de um dormitório. Segundo o economista Ivan Gambus, o merca do imobiliário demora a se ajustar e os preços raramente diminuem. “Uma possibilidade é que os preços continuem a subir por causa dos novos tipos de imóveis comercializados, como os vendidos dentro do projeto Minha Casa Minha Vida. Um segmento paralelo ao dos grandes imóveis, cujas dimensões são expressi vas na região metropolitana de Curitiba.” Ao contrário do que todos imaginam, Pedro Castelhano da Comec Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba (Comec) mostra que nem sempre é mais caro morar na capital paranaense. “O custo de vida nos municípios mais próximos de Curitiba, que seriam o nú

cleo urbano central que fazem fronteira direta com a capital (Pinhais, São José dos Pinhais, Fazenda Rio Grande, Araucária e Campo Lar go), são caríssimos de se morar muito mais do que na capital.”

A escolha Segundo a Pesquisas Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), 51,3% da população é natural das regiões metropolitanas. Mas quem tem maior influência econômica nesses muní cipios são os não nativos, que têm 54,4% de participação em atividades econômicas nessas cidades.

De acordo com pesquisa feita pela revista CDM, as pessoas que escolheram residir nas regiões metropolitanas de Curitiba, mostram -se fiéis e satisfeitas com suas escolhas. Esses moradores apreciam o silêncio que o espaço proporciona e a tranquilidade que é morar fora de uma metrópole.

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“O que é bom também é que tudo é mais tranquilo. O meu bairro tem aquele aspecto mais aconchegante de vila.”-
Jessica Cintra, moradora de Colombo

Depoimentos

Moradores da Região Metropolitana de Curitiba falam sobre os pontos positivos e negativos de viver fora da Capital. Co lombo, Pinhais, São José dos Pinhais, Campo Magro e Campo Largo foram as regiões selecionadas.

Mora em uma Chácara e aprova a escolha da mãe por uma rotina com mais tranquilidade “Eu moro em uma chácara. As chances de eu ter a vida que eu tenho em Curitiba são míni mas. Gosto do fato de ter natureza, seguran ça e calmaria no meu dia a dia. Eu não escolhi morar aqui e entendo a escolha da minha mãe em alguns aspectos. Mas, para mim, a distância sempre é um problema.”

“Morar na região por sua tranquilidade e economia. “Eu já pensei em morar na capi tal, mas o custo de vida é maior. Ai, a gente preferiu ficar aqui em Campo Largo mes mo, tendo uma comodidade melhor.”

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Pamela Ferreira Alvez Amanda Pereira Curitiba Campo Magro Campo Largo

Jéssica Cintra

A escolha da Região Metropolitana se deu pela pro ximidade que teria com sua família e a tranquilida de que o lugar tem. “Quando meus pais se casaram, eles optaram por comprar uma casa mais próxima das minhas avós, que moram uma em frente da outra. Então, eu gosto de viver aqui porque a minha família está perto de mim. O que é bom, também, é que tudo é mais tranquilo e o meu bairro tem aque le aspecto mais aconchegante de vila.”

Thomas Bellute

Caroline Stédile

Sempre morou em Pinhas e acredita na segurança do seu bairro. “O benefício é que a região que eu moro é bem segura, mas o ruim é que fica longe do centro e eu dependo de ônibus, o que é ruim.”

Nasceu em São José dos Pinhais e preza pelo am biente tranquilo em que foi criado. “Eu moro em um lugar tranquilo e quieto. Sempre brinquei na rua e andei de bicicleta. Um dos aspectos ruins é que eu sempre tive de acordar mais cedo que todas as pes soas que eu conheço para ir para a escola, médico e essas coisas.”

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Curitiba Colombo Pinhais São José dos Pinhais

Comunidade é transformada com ações sociais

Municípios da grande Curitiba ganham novo ar graças ao trabalho das Redes de Desenvolvimento Local, originadas pelo Serviço Social da In dústria (Sesi). Trabalhos de cunho social inserem jovens e adultos em inúmeras atividades e lhes apresentam novas perspectivas de vida.

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Fotos: Mario Spaki

Ogrande aumento populacional tem gerado um leque de situações a serem analisadas em nosso país. No campo econômi co, a geração de novos empregos é um fator de risco devido às exigências do mercado de trabalho. Com base nestes dados, percebe-se a neces sidade de criação de fontes de renda que possam inserir cidadãos de diversas faixas etárias, que mesmo sem quali ficação profissional, possam garantir o sustento diário de seus familiares. Foi pensando nisso que surgiu a Rede de Desenvolvimento Local, criada pelo Serviço Social da Indústria (Sesi) no início de 2007. De lá pra cá, esse projeto vem modificando bairros e municípios de toda Curitiba, en sinando o cidadão de cada localidade uma relação de democracia e ação social para com o seu próximo, compartilhando um novo siste ma de administração da região em que se vive. Os representantes e colaboradores da rede de desenvolvimento local são formados por jovens universitários que atuam nessas localidades em busca do enriquecimento social, profissional e acadêmico. A inserção da população no trabalho de de-

senvolvimento local garante a construção de um novo cidadão, dotado a partir de agora de responsabilidades sobre o bairro em que resi de, incentivando-o a ser protagonista de sua história cotidiana. Segundo a assesso ria de imprensa do Serviço Social da Indústria (Sesi), o objetivo das Redes de Desenvolvimento Local é incentivar os moradores de cada localidade a atuar positivamente em sua comunidade, destacando que o intuito do trabalho realizado é trazer o protagonismo do cidadão.

Pelos furos dos blo quetes são passados os cabos

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“Criar este tijolo sex tavado com pneus usados(...) foi a possi bilidade que encontrei de criar algo que pudesse dar oportunida de a pessoas que não saibam ler ou escrever.” – Elias Saade, líder comunitário do bairro Boqueirão.

Material Reciclável X Emprego

A ação de um homem pode mudar o dia a dia de muitas famílias e livrá-las do maior problema do século: as drogas. Essas são as palavras pronunciadas por Elias Saade, líder comunitário da região do bairro Boqueirão, em Curitiba.

Disposto a escrever uma nova história aos mo radores de sua localidade, Saade desenvolveu projetos que podem gerar novos empregos e dar oportunidades a jovens e adultos de ingres sar no mercado de trabalho e sem necessidade de que eles saiam da comodidade de suas casas. Idealizador de blocos de pneus usados em for mato sextavado semelhante à um favo de mel, o líder comunitário diz que “criar este tijolo

sextavado com pneus usados, juntando areia e cimento na composição, foi a possibilidade que encontrei de criar algo que pudesse dar oportunidade a pessoas que não saibam ler ou escrever, e que queiram garantir o sustento de seus familiares trabalhando em casa.”

Os blocos de origem reciclável desenvolvidos por Saade podem ser usados em construções de casas, barracões e calçadas, pois sáo bastante resistentes, assim como os blocos tradicionais. Porém, seu custo ainda está fora dos padrões do mercado. “Para o meu projeto seguir em frente preciso de recursos financeiros para homologar a ideia. Após esse processo, rapi damente famílias poderão trabalhar com a produção dos blocos de pneus e garantirão um meio de renda eficaz, sem que precisem ficar longe de sua família para trabalhar”, finaliza o líder comunitário.

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Tijolos artesanais são criados a partir de pneus usados
“Para continuar esse projeto pre ciso de recursos financeiros para homologar a ideia.” – Elias Saade, líder comunitário do Boqueirão.

Voluntário em ação

O enfermeiro Bruno Melo é um cidadão um tanto aplicado Ligado à saúde, à igreja, à família e às ações sociais, o rapaz atualmen te desempenha seu trabalho no Centro de Desenvolvimento Co munitário Vila Amélia, localizado em Pinhais, Regiáo Metropolitana de Curitiba. Mesmo com tantas atribuições em seu dia a dia, ele dá prioridade ao seu trabalho no âmbito social, e diz que “dá tem po pra tudo. É preciso de organização e ter em mente as prioridades, ai sempre há um tempo pra pensar no próximo. E acredito que o que faço é pouco, queria fazer mais.”

assim um maior número de adeptos em novas atividades.

Antes de começar o trabalho na região de Pinhais, Melo e sua equipe realizaram uma pesquisa na comunidade, avaliando a perspec

– Bruno Melo membro do Centro de Desenvolvimento Comunitário Vila Amélia.

Inserido no Centro de Desenvolvimento Co munitário, organizado pela Igreja Batista Vida Nova, Melo e colegas desenvolvem projetos na área de inclusão digital, cultura e trabalhos artesanais. Para ele, a inserção da comunidade em atividades de iniciativa popular e social é fundamental para a mobilização da população, aprimorando nos cidadãos a função do coletivo, podendo com isso gerar melhorias na loca lidade em que vivem. Melo ainda relata que “o que as pessoas precisam são de oportunidades, e é por isso que sonhamos e trabalhamos por um mundo mais justo e solidário.” Além disso, Melo busca ajudar as pessoas as pessoas necessitadas mudando a visão que cada um tem do seu cotidiano, mostrando que é possível melhorar muito o ambiente em que se vive com pequenas atitudes, ganhando

tiva situacional de jovens e adultos e os motivos de estarem acomodados ou desmotivados a mudar o ambiente em que vivem. Ele ainda conta que, “na pesquisa que realizamos na comunidade, encontramos um jovem brincan do de pipa na rua. Ele já estava em idade para trabalhar, mais estava ali, como alguém sem nenhuma perspectiva. Em uma das perguntas, questionei se ele tinha o sonho de realizar uma faculdade, e ele disse que isso não era pra ele.” Com muita força de vontade e fé, o enfer meiro ressalta que “A parte mais gratificante é saber que com poucos recursos podemos gerar impactos muito positivos; é ver alguém acredi tando que pode sim chegar lá, que seus sonhos podem ser alcançados, que não esta fadado a repetir a historia dos seus pais, da sua comunidade. Temos muitas limitações, temos muitos sonhos, mas, às vezes, poucos recursos finan ceiros, e, por isso, muitos ficam engavetados. Em meio a pouco recursos financeiros, temos muitos recursos humanos”, finaliza Melo.

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“O que as pessoas precisam são de oportunidades, e é por isso que sonhamos e traba lhamos por um mundo mais justo e solidário.”

Pinguins sobre rodas

Time de paratletas de Pinhais encontra no basquete uma forma de se relacionar nova realidade

Um time de basquete para cadeirantes, em Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, chama a atenção. Com belas histórias para contar, os paratletas do Pinguins do Sul ultrapassam as dificuldades do esporte. A equipe, que surgiu em novembro de 2004, por meio de uma comissão organizado ra composta por deficientes físicos de Pinhais, já vai completar dez anos de garra e superação. O principal objetivo do time, que inicialmente

era incentivar as pessoas com deficiência física a sair de casa, tornou-se algo maior, e hoje eles almejam competir em campeonatos estaduais, nacionais e mundiais.

Histórias comoventes e de superação, como a do paratleta João Carlos Caldas, são frequentes nesse esporte. “Fiquei deficiente aos 4 anos por erro médico, e luto contra olhares que me discriminam antes mesmo de me conhecer. Procurei o esporte para melhorar como pessoa

O time, apesar das dificulda des, não deixa de lado o tra balho duro e o bom humor.

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Por Renata Nicolli e Thaynna de Melo. Fotos: Lydia Camargo

e também aperfeiçoar meu aspecto físico”, conta o armador e ala do Pinguins do Sul, que há 23 anos encontrou no esporte um meio de extra vasar e até de quebrar paradigmas, tendo assim condições de encontrar uma nova forma de viver e de se relacionar com a nova realidade. A Federação Paranaense de Basquete em Cadei ras de Rodas (FPRBR), que é a responsável por cuidar de todos os times, surgiu em 2006, com o objetivo de fortalecer e oficializar as equipes que já atuavam na modalidade, dando-lhes assim mais credibilidade e oportunidade de buscarem recursos em outras esferas, bem como junto a iniciativa privada, além da inclusão do deficiente físico por meio do esporte. Porém, foi em 2013 que o processo tomou mais força com a eleição de um novo presidente.

a resposta é clara: o primeiro passo é o jogador se reconhecer como pessoa produtiva, ressalta Benhur.

O meia armador do Pinguins e vice-presidente da FPRBR, Nivaldo Menin, explica que a fede ração surgiu quando o Paradesporto ainda estava tomando um novo rumo, pois muitos clubes e pessoas estavam se aproximando desse meio. “O

- Nivaldo Menin, jogador dos Pinguins.

Benhur Chiconato de 51 anos, atual presi dente da FPRBR, é técnico e atleta veterano de basquete convencional, e demonstra muita disposição quando o assunto é mudança, para a melhor, é claro! Dentre os desafios que vê pela frente ele conta os principais. “Fazer com que as equipes tenham uma postura mais séria e menos festiva ao participar do campeonato, fazendo com que nossos campeonatos sejam mais competitivos, projetando assim o basquete em cadeira de rodas do Paraná para todo o Brasil.” Quando questionado sobre os principais desafios que um cadeirante enfrenta no esporte,

número de pessoas com deficiência na cidade fez com que houvesse um crescimento e uma neces sidade de criar uma associação voltada à prática do esporte. Tínhamos muitos interessados, além, é claro, do apoio da prefeitura e empresas priva das. O nosso compromisso sempre é e sempre vai ser o de desenvolver a modalidade esportiva e trazer novos atletas, descobrir pessoas com deficiência que ainda não perceberam como a vida é bela”, explica.

Além de todo o entusiasmo presente na vida de Nivaldo, também existe uma história de muita superação, obstáculos e paciência

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“Encontrei no esporte, um caminho mais fácil para minha reabilitação física, social e profissional.”

“Sou paraplégico devido a um acidente de carro, há quase 30 anos. Encontrei no esporte um caminho mais fácil para a minha reabilitação física, social e profissional.” Jogador de basquete há 20 anos, o meia armador gosta de esporte desde criança, e afirma com alegria que isso lhe proporciona prazer e gratidão. “Além de ser um complemento da minha fisiote rapia, para que eu possa adquirir mais força nos membros superiores, o efeito principal do esporte na minha vida é a retomada da auto estima e o desenvolvimento de novas habilida des, tirando a melhora na qualidade de vida”, completa o entusiasta.

O primeiro campeonato oficial do Pinguins do Sul foi em 2010, junto a mais dez outras equipes em Ponta Grossa, na Região Central do Paraná. Como o crescimento e fomento da modalidade foi grande, a Federação Paranaen se de Basquete em Cadeira de Rodas resolveu oficializar a equipe, que naquele momento deixou de ser apenas uma incentivadora do esporte, passando a entrar na disputa oficial com outros times nos campeonatos. Hoje, a Pinguins do Sul está entre as cinco melhores equipes de basquete sobre rodas do Paraná.

Os jogadores têm uma rotina de três treinos por semana, e quando estão fora das quadras, continuam atuando em prol da divulgação do esporte por meio da organização de campanhas e eventos. “O dinheiro arrecadado pela equipe vem através do apoio da Prefeitura Municipal de Pinhais e empresas privadas. O time é quem faz as campanhas no comércio e em amistosos e, apesar de já termos ficado um bom tempo treinando em uma quadra sem cobertura, em péssimas condições, nós nunca desistimos”, afirma Caldas.

O time, apesar das dificuldades, não deixa de lado o trabalho duro e o bom humor.

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O Início

A adaptação do Basquetebol para o jogo em cadeira de rodas aconteceu após a Segunda Guerra Mundial, quando ex-soldados do Exército americano, se reuniram em uma quadra de um hospital de reabilitação e começaram a jogar. O esporte é um dos poucos presentes em todos os jogos paraolímpicos.

Como funciona

Entenda os princípios básicos do esporte

Essa é a área de arremessos de lances livres.

Essa é a linha de 3 pontos. Como as cestas regulares no basquete valem 2 pon tos, o jogador que acertar o alvo de trás desta linha, garante 3 pontos para a sua equipe.

Cadeiras motorizadas, pneus pretos e freios são proibidos. O árbitro sempre irá conferir se to dos os integrantes estão dentro das normas.

Regras

O basquetebol de cadeira de rodas é muito pare cido com o tradicional. Porém, algumas modifi cações que levam em consideração a cadeira de rodas, a mecânica da sua locomoção e a necessi dade de se jogar sentado, precisam ser feitas. Os jogadores podem usar almofadas no assento, faixas e suportes que o ajudem a se fixar na cadeira ou manter as pernas juntas.

A bola geralmente apresenta 74,9 cm de circunferência e pesa cerca de 623 g

O principal objetivo da partida é marcar o maior número de cestas possíveis.

Até 1930 as bolas de bas quete eram maiores. Elas tinham 81,2 centímetros de circunferência e pesavam 652 gramas

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Jogada transformadora

Por meio das práticas esportivas, jovens portadores de deficiência deixam suas dificuldades fora de foco e se tornam verdadeiros atletas

esporte
Amanda Bedide Guilherme Liça Hellen Ribaski crédito: freeimages

Oesporte é uma ferramenta que pode mudar vidas. Prova disso é o trabalho realizado pelo Instituto Reagir, que acumula histórias e exemplos de superação e força. Por meio das atividades esportivas, crianças e jovens portadores de deficiência encon tram no projeto uma maneira de superar dificuldades. Localizado em Pinhais, o instituto, que tem como objetivo auxiliar na reabilitação e na inserção social, se tornou um polo de atletas paraolímpicos. De acordo com a presidente do instituto, Neide Araujo, a ideia inicial era usar o esporte para a inclusão. No entanto, com o destaque de muitos jovens na natação, o projeto cresceu, e logo começou a formar atletas. “Muitos meninos se destacaram, e os pais perceberam isso. Decidimos, então, buscar recursos e criar uma associação para que eles pudes sem participar de competições, e assim surgiu o Instituto Reagir”, relata Neide.

As conquistas não demoraram a vir. Com determinação e força, os paratletas já partici param de competições, conquistaram meda lhas, e hoje são destaques na modalidade de natação. Bruno Araujo, de 20 anos, é filho da Neide, e participa há anos do projeto. “Vejo no esporte e nas competições a chance de viver novos desafios. Isso é emocionante”, comenta. “Eles são atletas. Não se deve rotulá-los ou

tratá-los como incapazes, mas fortalecer suas potencialidades”, enfatiza Neide.

Segundo a presidente do instituto, apesar de existir políticas inclusivas, são poucos os pro jetos esportivos voltados para os deficientes. “Esse jovem atleta precisa evoluir, ir além de suas limitações. Isso é superação”, comenta.

Os desafios proporcio nados pelo esporte fazem com que Bruno se dedique cada vez mais às competições

O próximo passo é aumentar o instituto e oferecer novas modalidades. Com o apoio da prefeitura e em parceria com a Universi dade Federal do Paraná (UFPR), está sendo montado um espaço de paracanoagem. “O remo proporciona uma sensação de liberda de. Com a ajuda de empresários e da prefei tura de Pinhais, vamos conseguir oferecer aos nossos alunos um esporte que tem um alto custo”, finaliza Neide.

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“Vejo no esporte e nas competições a chance de viver novos desafios.”Bruno Araujo, participante do projeto
crédito: divulgação

Na trilha da

aventura

esporte
Pontos turísticos na região metropolitana de Curitiba viram cenários para práticas radicais
André Wuicik Alessandro Pinheiro Lara Farias Rodrigo Dornelles

Curitiba e sua região metropolitana oferecem uma paisagem de contrastes. Nos municípios que rodeiam a capi tal, como Piraquara, Tijucas do Sul e Quatro Barras, existem diversas belezas naturais, que além do visual de cartão-postal, proporcionam aos turistas e moradores boas opções de diversão.

Montanhas acessíveis, como o morro do Anhagava, e longas trilhas, como o Caminho do Itupava, por exemplo, são alguns dos lugares que atraem quem deseja explorar a natureza a pé e, principalmente, superar limites praticando ativi dades de aventura ao lado de casa. Surgindo do boca a boca entre amigos, os roteiros de aventura na Região Metropolitana de Curitiba geralmente são explorados por entusiastas amadores, que marcam encontros nos locais para começarem as atividades por conta própria. Felipe Melo, professor de Historia, é um exemplo de aficionado autodidata que levou adiante o gosto por esses passeios. “Conheci os roteiros de natureza aqui perto de Curitiba, estimulado por amigos, tanto por ser uma pratica saudável como, também, um passeio divertido. Levei adiante esse gosto, e já guiei alunos que queriam conhecer lugares históricos, como o caminho do Itupava, que começa em Quatro Barras e termina em Morretes”, explica.

escaladas em morros de Quatro Barras, e hoje arrisca tentativas mais ousadas, como saltos de bungee jumping, em São José dos Pinhais. “Gosto dessas atividades porque não têm aquele clima de competição exagerada. O contato com a natureza e a adrenalina fazem você se superar e se sentir livre de tudo, vivendo intensamente”, diz.

E existem ainda os que usam desse presente

“As principais atividades acontecem em Piraquara,

Campo Magro e Tijucas do Sul”. - Juliander Dziura, dono da Aventura Curitiba.

da natureza para realizar performances de alto nível, a exemplo de Gabriel Hamilko, pro dutor do Globo Esporte Paraná, que pratica corridas em morros e trilhas de Piraquara. “Desde cedo, fiz roteiros de aventura. Meu fa vorito era o Caminho do Itupava, mas come cei a aumentar a pegada no decorrer dos anos. Hoje gosto de correr no roteiro do Morro da Palha, em Piraquara, e cronometrar meus melhores tempos na escalada em montanhas, como do Anhangava e Marumbi”, explica.

Quando a brincadeira se torna negocio

Um dos atrativos é a sensação de adrenalina e o contato com a natureza que as modalidades proporcionam, cativando os praticantes. A fotógrafa Tarsis Voloschen começou com

Apesar do aspecto underground ser o principal motor do turismo de aventura pelos arredores de Curitiba, a profissionalização do tema tem sido articulada nos últimos anos.

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Juliander Dziura, antes mais um dos típicos aventureiros amadores, criou em 2012 uma agência de turismo do gênero, a Aventura Curitiba. “Montávamos grupos para fazer aventuras. Começou como uma brincadeira entre amigos, que foram chamando outras pes soas, e assim por diante. Terminava a atividade e logo nós pensávamos em fazer outro no mês seguinte. Só que ficou perigoso: aventura exige segurança. Precisamos tomar um caminho pro fissional, e eu e mais dois amigos montamos a empresa, investindo em treinamento, estrutura e segurança”, comenta. E para não gerar ciúmes nos vizinhos dos curitibanos, Dziura faz questão de deixar claro: “Brincamos aqui na empresa que o nome é Aventura Curitiba, mas a maior parte do que fazemos é fora da capital, já que as principais atividades acontecem em Piraquara, Campo Magro e Tijucas do Sul. Seja ela trilha, bungee jumping, rapel, etc. As mais procuradas são as trilhas e a escalada dos morros.”

Divulgação Aventura Curitiba

Segurança e precauções

Junto com a facilidade de acesso às localidades em que as atividades ocorrem, cuidados com a segurança devem ser levados em conta. É, por exemplo, recomendável realizar exames físicos e consultar um medico que aprove o envolvi mento nessas práticas.

Para Juliander Dziura, a acessibilidade aos roteiros não implica em falta de precaução. “Existem restrições, pois o nosso público é formado por pessoas que nunca fizeram qual quer atividade radical. Em práticas nas quais é preciso ter experiência, nós conversamos, ex plicamos tudo direito, e é assinado um termo de responsabilidade”, comenta. Em relação à infraestrutura, Dziura reclama. “A conservação dos pontos turísticos está bem desleixada. O governo não investe. Existem também os donos das fazendas, por exemplo, no entorno do Pico Paraná, que cobram um valor absurdo para as pessoas fazerem as ativi

O contato com a natureza é uma das principais atrações para o público.

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dades. Tem até lei contra a cobrança, mas eles não a cumprem. Há desrespeito para manter a infraestrutura de uma trilha, há pouca sinaliza ção no local”, diz. Na visão dos participantes, a falta de segurança gera receio, já que ações criminosas em trilhas afastadas da cidade dificilmente são coibi

das pela polícia. “A segurança é outro ponto preocupante. Quase nunca vemos a policia por lá e assaltos têm sido cada vez mais comuns. Então, é recomendável andar em grupo e com alguém que já conheça bem o percurso”, explica Felipe Melo.

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Famosos pontos turísticos da RMC, como o Caminho do Itupava, sáo procurados pro grupos de aventura e agências de turismo. Divulgação Aventura Curitiba

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Revista CDM Digital #32 by eba_pucpr - Issuu