TCC arqurbuvv Neurociência Aplicada ao Espaço Religioso

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Neurociência Aplicada ao

2022
Victória Christina Simões Pinheiro Universidade Vila Velha

A Neurociência Aplicada ao Espaço Religioso

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Vila Velha, como pré requisito para a obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora: Dra. Melissa Ramos da Silva Oliveira.

Universidade Vila Velha Arquitetura e Urbanismo
Vila
2022
Velha

A arquitetura A arquitetura deve falar de seu tempo e deve falar de seu tempo e

lugar, porém anseia por lugar, porém anseia por atemporalidade. atemporalidade.

-Frank Gehry Frank Gehry

Dedico este trabalho aos meus pais, Dedico este trabalho aos meus pais, por me ensinarem que aquilo que por me ensinarem que aquilo que podemos sonhar, podemos podemos sonhar, podemos concretizar. concretizar.

Agradecimentos Agradecimentos

Antes de tudo, agradeço a Deus mais esta conquista e por, principalmente, não me fazer desistir durante a jornada. Pois Ele sempre me lembrava, a todo momento, que a caminhada não seria fácil, mas ao final a vista é recompensadora.

Agradeço também aos meus pais, pois são a voz de Deus aqui na Terra. São aqueles que me deram a vida, me criaram e sempre incentivaram a trilhar o meu sonho na arquitetura. Além disso, me ensinaram que as dificuldades nos tornam mais fortes e sábios.

Minha gratidão e admiração à minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Melissa do Ramos da Silva Oliveira, pela instrução na produção deste trabalho. Seu auxílio não foi apenas no quesito de conteúdo, mas no encorajamento em desenvolver um trabalho de um tema, à princípio, tão complexo.

Meus agradecimentos a administração da Catedral Metropolitana de Vitória, em particular à coordenadora Alessandra, por conceder acesso a documentos e informações; e ao segurança Hélio dos Santos, que atendeu prontamente ao passeio pela igreja. Além disso, meus cumprimentos ao Antônio Carlos, funcionário do IPHAN, por colaborar com diversos materiais de pesquisa para o desenvolvimento deste trabalho.

INTRODUÇÃO......................................................................................................................................................... 01 CAPÍTULO 1 – Considerações teóricas.................................................................................................................05 1.1 Neurociência aplicada ao espaço religioso............................................................................................................................. 05 1.2 Espaço sagrado e espaço espiritual........................................................................................................................................... 06 1.3 Mente e consciência...................................................................................................................................................................... 07 1.4 Visão na arquitetura religiosa..................................................................................................................................................... 08 1.4.1 Simetria............................................................................................................................................................................... 08 1.4.2 Harmonia............................................................................................................................................................................ 09 CAPÍTULO 2 – Memória, emoção e sentimentos............................................................................................... 11 2.1 Formação das memórias............................................................................................................................................................... 11 2.2 Armazenamento.............................................................................................................................................................................. 12 2.3 Evocação............................................................................................................................................................................................ 15 2.4 Emoções............................................................................................................................................................................................ 16 2.4.1 Emoções primárias........................................................................................................................................................... 17 2.4.2 Emoções secundárias..................................................................................................................................................... 17 2.4.3 Emoções de fundo........................................................................................................................................................... 18 2.5 Sentimentos..................................................................................................................................................................................... 18 Sumário Sumário
CAPÍTULO 3 – A visão............................................................................................................................................ 20 3.1 Como funciona a visão?................................................................................................................................................................. 20 3.1.1 Íris e pupila......................................................................................................................................................................... 21 3.1.2 Córnea e retina.................................................................................................................................................................. 21 3.2 Voxels no cérebro e expressão de edifícios............................................................................................................................. 22 CAPÍTULO 4 – Eye-tracking.................................................................................................................................... 24 4.1 Como funciona?............................................................................................................................................................................... 24 4.1.1 Mapas de calor.................................................................................................................................................................... 25 4.1.2 Gaze plot............................................................................................................................................................................... 25 4.1.3 Área de interesse (AOI)...................................................................................................................................................... 26 4.2 Estudos ao redor o mundo.......................................................................................................................................................... 26 CAPÍTULO 5 – Estudo de caso................................................................................................................................29 5.1 Capela Thorncrown.......................................................................................................................................................................... 29 5.1.1 Estrutura............................................................................................................................................................................. 30 5.1.2 Análise neurocientífica.................................................................................................................................................... 32 5.2 Estudos com o eye tracker na Catedral de Notre Dame de Reims..................................................................................... 32 5.2.1 O experimento parte 1................................................................................................................................................. 33 5.2.2 O experimento parte 2................................................................................................................................................. 34 5.2.3 Resultados.......................................................................................................................................................................... 35
CAPÍTULO 6 – A arquitetura religiosa..................................................................................................................39 6.1 O início............................................................................................................................................................................................... 39 6.1.1 Cenáculo................................................................................................................................................................................ 40 6.1.2 Catacumbas.......................................................................................................................................................................... 40 6.1.3 Igreja Paleo cristã................................................................................................................................................................ 41 6.2 O Espaço sagrado após o século IV........................................................................................................................................... 41 6.3 As igrejas românicas e góticas..................................................................................................................................................... 44 6.4 Igrejas renascentistas e barrocas............................................................................................................................................... 47 6.4.1 O Concílio de Trento.......................................................................................................................................................... 48 6.5 O Concílio Vaticano II...................................................................................................................................................................... 48 6.5.1 O evento................................................................................................................................................................................ 49 CAPÍTULO 7 – Objeto de estudo prático..............................................................................................................52 7.1 Introdução..........................................................................................................................................................................................52 7.1.1 A influência religiosa........................................................................................................................................................... 53 7.1.2 Transformações................................................................................................................................................................... 55 7.2 História da catedral........................................................................................................................................................................ 55 7.2.1 O bispado e as mudanças..............................................................................................;................................................. 57 7.2.2 As obras................................................................................................................................................................................. 58 7.2.3 Restauro................................................................................................................................................................................ 59 7.3 A arquitetura.................................................................................................................................................................................... 61 7.3.1 O interior da igreja............................................................................................................................................................... 68 7.4 A percepção dos usuários............................................................................................................................................................ 71 7.4.1 Pesquisa de campo etapa 1.......................................................................................................................................... 71
7.4.2 Pesquisa de campo etapa 2....................................................................................................................................... 72 7.4.3 Resultados...........................................................................................................................................................................73 CAPÍTULO 8 - Metodologia....................................................................................................................................78 8.1 Preparação........................................................................................................................................................................................78 8.1.1 Elemento de estudo............................................................................................................................................................78 8.1.2 A modelagem........................................................................................................................................................................79 8.1.3 Análise solar..........................................................................................................................................................................79 8.1.4 Público alvo...........................................................................................................................................................................88 8.2 Experimentação...............................................................................................................................................................................89 8.2.1 Testagem com o eye tracker..............................................................................................................................................89 8.2.2 Preparação............................................................................................................................................................................89 8.2.3 Pós teste................................................................................................................................................................................90 CAPÍTULO 9 - Resultados e discussões................................................................................................................93 9.1 A luz no espaço religioso: percepção no ambiente sagrado criado por meio dos vitrais.............................................93 9.2 A altura e a verticalidade nos espaços religiosos..................................................................................................................105 9.3 A memória autobiográfica: lembranças, religiosidade e norteador de preferências espaciais.................................106 9.4 Templos religiosos como ambientes restauradores e homeodinâmicos.......................................................................107 Considerações finais............................................................................................................................................110 Referências bibliográficas...................................................................................................................................112

Índice de Figuras Índice de Figuras

Figura 01 Tipologias de memórias................................................................................................................................................. 13

Figura 02 Representação do hipocampo..................................................................................................................................... 14

Figura 03 Fluxo visual........................................................................................................................................................................ .20

Figura 04 – Anatomia do olho humano ........................................................................................................................................... 21

Figura 05 Capela Thorncrown........................................................................................................................................................... 29

Figura 06 Capela Thorncrown (internamente).............................................................................................................................. 30

Figura 07 Luminárias da capela ..................................................................................................................................................... 31

Figura 08 Capela durante a noite................................................................................................................................................... 31

Figura 09 Catedral Notre Dame de Reims................................................................................................................................... 31

Figura 10 Simulações no interior da Capela Notre Dame de Reims..................................................................................... 34

Figura 11 Mapa de AOI...................................................................................................................................................................... 36

Figura 12 O Cenáculo de Jerusalém............................................................................................................................................... 40

Figura 13 As Catacumbas de Roma............................................................................................................................................... 41

Figura 14 Exemplo de Basílica Cristã em planta......................................................................................................................... 43

Figura 15 Fachada da Basílica de Saint Sernin, em Toulouse, na França..............................................................................44

Figura 16 Igreja Ortodoxa Antioquina da Anunciação da Mãe de Deus/SP........................................................................ 45

Figura 17 Fachada da Catedral de Saint Denis........................................................................................................................... 46

Figura 18 Fachada da Catedral Notre Dame de Paris............................................................................................................... 47

Figura 19 Papa Paulo VI e Enrico Dante durante o Concílio Vaticano II................................................................................ 50

Figura 20 Gravura com representação da baía em 1624......................................................................................................... 52

Figura 21 Planta da Villa da Victória............................................................................................................................................... 54

Figura 22 Baía de Vitória................................................................................................................................................................... 56

Figura 23 Imagem de Nossa Senhora da Vitoria........................................................................................................................ 57

Figura 24 Fachada da Catedral ainda em construção............................................................................................................... 58

Figura 25 Cripta da Catedral............................................................................................................................................................ 59

Figura 26 Antes e depois do restauro do telhado...................................................................................................................... 60

Figura 27 Antes e depois do restauro do altar............................................................................................................................ 62

Figura 28 Planta da Catedral Metropolitana de Vitória............................................................................................................. 63

Figura 29 Fachada da Catedral Metropolitana de Vitória......................................................................................................... 64

Figura 30 Estrutura da Catedral em concreto armado e tijolos cerâmicos..........................................................................65

Figura 31 Planta de localização dos vitrais................................................................................................................................... 66

Figura 32 Mosaico com fotos dos vitrais....................................................................................................................................... 67

Figura 33 Nártex da Catedral Metropolitana de Vitória............................................................................................................ 68

Figura 34 Imagem do Sagrado Coração de Jesus....................................................................................................................... 69

Figura 35 Relicário.............................................................................................................................................................................. 69

Figura 36 Nave da Catedral (vista do coro da igreja)................................................................................................................. 70

Figura 37 Relatório gráfico do resultado do questionário.........................................................................................................74

Figura 38 Comparação entre modelagem e foto.........................................................................................................................80

Figura 39 Análise solar (fachada posterior)...................................................................................................................................81

Figura 40 Incidência solar na abside Catedral atual (pós restauração) às 09:00.................................................................82

Figura 41 Incidência solar na abside Catedral atual (pós restauração) às 14:00.................................................................83

Figura 42 Incidência solar na abside Catedral atual (pós restauração) às 17:00.................................................................84

Figura 43 Incidência solar na abside Catedral atual (pré restauração) às 09:00.................................................................85

Figura 44 Incidência solar na abside Catedral atual (pré restauração) às 14:00.................................................................86

Figura 45 Incidência solar na abside Catedral atual (pré restauração) às 17:00.................................................................87

Figura 46 Aparelho eye tracker Pupil Core...................................................................................................................................... 90

Figura 47 Representação do posicionamento do voluntário....................................................................................................90

Figura 48 Infográfico com os mapas de calor do grupo B (voluntários 1 e 2)..................................................................... 94

Figura 49 Infográfico com os mapas de calor do grupo B (voluntários 3 e 4)..................................................................... 95

Figura 50 Infográfico com os mapas de calor do grupo B (voluntário 5).............................................................................. 96

Figura 51 Depoimentos dos voluntários do grupo B................................................................................................................. 97

Figura 52 Infográfico (percepção do grupo A)............................................................................................................................. 99

Figura 53 Infográfico (percepção do grupo B)............................................................................................................................100

Figura 54 Infográfico com os mapas de calor do grupo A (voluntários 1 e 2)....................................................................102

Figura 55 Infográfico com os mapas de calor do grupo A (voluntários 3 e 4)....................................................................103

Figura 56 Infográfico com os mapas de calor do grupo A (voluntário 5)............................................................................ 104

Figura 57 Exemplo de lembranças relatadas pelo grupo A)...................................................................................................106

Resumo Resumo

Os templos católicos abrigam muito mais do que a congregação e seus serviços religiosos. Muito além do que uma questão de fé, os templos da igreja católica proporcionam uma experiência sensorial que impacta a psiqué humana. A arquitetura dentro das igrejas católicas e seus detalhes estão relacionados com a percepção do usuário, sendo assim, se tornando elementos que despertam foco e atenção. A Catedral Metropolitana de Vitória, na cidade de Vitória/ES, está conectada não apenas com o povo por meio da religião, mas também pelas memórias evocadas e emoções despertadas com sua arquitetura. A partir disso, o presente trabalho relaciona neurociência e a arquitetura religiosa do espaço supracitado. Sendo assim, objetiva se entender, através da neurociência aplicada à arquitetura e do rastreamento ocular (por meio do dispositivo eye tracker), como o espaço religioso é capaz de impactar na percepção do usuário, podendo estimular respostas emocionais e criação de novas memórias. A metodologia adotada investiga a percepção afetiva por meio de entrevistas semiestruturadas e questionário on line com usuários do espaço, relacionando com o estudo de diversos autores da neurociência aplicada a arquitetura religiosa. Foram feitas duas modelagens da Catedral: atual e antiga, a partir das memórias evocadas. A investigação dos elementos de foco foi feita com o uso do aparelho de rastreamento ocular sobre a modelagem. Os resultados evidenciaram que a igreja não está apenas conectada com o público através da religião, mas também por meio das memórias e relações afetivas, que é fortificada por meio de elementos arquitetônicos presentes no espaço religioso.

Palavras-chave: arquitetura religiosa, neurociência aplicada à arquitetura, Catedral Metropolitana de Vitória, percepção afetiva sensorial

Lista de Siglas Lista de Siglas

AOI Áreas de Interesse

IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

Introdução Introdução

As mesmas paredes que já ouviram súplicas, sons de sinos e salmos entoados são as mesmas da construção de uma história regida por crença, fé e poder. A igreja católica, além de fonte de esperança para milhares de pessoas, se constitui como um império, onde seus templos e os relatos contam mais sobre a história do que os livros.

“Quando a fé, particularmente celebrada na li turgia, encontra a arte, cria se uma profunda sintonia porque podem e querem falar de Deus, tornando visível o invisível”, uma vez falou o Papa Bento XVI (2009). O templo católico, ao longo da história, vem mudando a configuração de seus espaços sagrados e, juntamente com cada nova roupagem, a reação e percepção de seus fiéis também se altera.

Excedendo a pura fé, a experiência do usuário dentro do espaço religioso percorre por aspectos ligados a psiqué humana mais do se imagina. Pallasmaa (2013) afirma que os edifícios, além de

colocarem um abrigo sobre nossas cabeças, também abrigam nossas mentes e memórias. Definida como o processo pelo qual adquirimos, conservamos e evocamos alguma informação, a memória é grande fonte de dados e, sobretudo, de identidade de uma comunidade (LENT, 2008). Além disso, não apenas as reações emocionais, mas também o contexto, o próprio lugar, são essenciais para a formação de uma nova lembrança (LENT, 2008).

Uma religião se perpetua através de tradições e de memórias, que são evocadas através de narrativas contatas entre seus membros. A evocação (ou recall) é a forma que se acessa uma informação que foi armazenada, para utilizá-la na cognição e na emoção, ou através do comportamento (LENT, 2008). A arquitetura e os bens materiais são fundamentais para o processo de recall, podendo ser peças chaves para histórias que não encontramos nos livros.

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Neste contexto, o objetivo desta pesquisa consis te em entender, através de conceitos da neurociência aplicada à arquitetura, os elementos que despertam a atenção do usuário em espaços religiosos e desencadeiam respostas emocionais e evocam memórias . Assim, busca-se desvendar a percepção afetiva do espaço religioso da Catedral Metropolitana de Vitória, advinda da apreensão daquilo que os usuários vivenciaram e evocaram, bem como suas modificações. Vale ressaltar que tal espaço foi escolhido devido sua importância histórica para a cidade de Vitória e pelo seu simbolismo de fé. Como método, esta é uma pesquisa aplicada, qualitativa, que utiliza a coleta de narrativas, a simulação digital e o rastreamento ocular. O trabalho buscou, primeiramente, uma pesquisa bibliográfica e documental a respeito da neurociência e do espaço religioso, em especial sobre a catedral estudada. Logo após, realizou se um levantamento fotográfico da Catedral Metropolitana de Vitória, e buscou se a documentação gráfica das plantas da igreja. Para a investigação das memórias e emoções dos usuários, foi feita: (a) uma pesquisa quantitativa, por meio de um questionário feito na plataforma Google Forms,

distríbuído de forma randômica online; (b) uma pesquisa qualitativa, com quatro entrevistas abertas e semiestruturadas, de aproximadamente 20 minutos.

Através dos estudos da memória afetiva do pú blico, se fez necessário o estudo de duas épocas distintas da igreja, antes e após a restauração. Para tal fato, utilizou se de modelagens tridimensionais, feitas digitalmente, das duas épocas da igreja. Na fase de investigação de elementos de atenção do público, realizou se o rastreamento ocular com o aparelho eye tracker, a partir das simulações digitais supracitadas.

OBJETIVOS OBJETIVO PRINCIPAL

Identificar os elementos de foco e atenção, que despertam memórias e emoções, no interior da Catedral Metropolitana de Vitória, a partir do rastreamento ocular realizado a partir dos modelos tridimensionais, que representam o edifício antes e depois do restauro.

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OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Para alcançar o objetivo proposto, serão desenvolvidas ações específicas, visando:

A partir da neurociência, compreender os mecanismos de memórias, emoções e sentimentos;

Elucidar o espaço religioso, suas características e evolução ao longo da história. Correlacionar esses dois conceitos;

Estudar o aparelho de rastreamento ocular e o processo de aquisição de informações através da visão;

Estudar a Catedral Metropolitana de Vitória e sua evolução histórica;

Propor uma simulação tridimensional da igreja em duas épocas distintas, a fim de comparar os elementos de foco e atenção nas diferentes versões.

Realizar o rastreamento ocular do projeto com o auxílio do aparelho eye tracker.

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Capítulo

Capítulo

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Capítulo 1 - Considerações teóricas Capítulo 1 - Considerações teóricas

"[...] eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do Inferno não prevalecerão contra ela” (Mt., 16:18). Aquilo que uma vez foi um versículo bíblico, tornou se a promessa da construção de um império, cercado em fé e simbologias. E em imensos templos reside o pensamento de inúmeros fiéis, que através de suas percepções afetivas e sensoriais, ajudam na construção de um espaço que inspira fé e devoção.

Este capítulo objetiva a demonstração de como a neurociência e a religião estão correlacionadas, o tema central deste trabalho.

1.1 Neurociência aplicada ao espaço religioso

Enquanto seres expressivos, a humanidade tende a criar suas marcas no tempo para abrigar ideias e pensamentos, como pinturas, músicas, literatura. Entretanto, não devemos nos esquecer da entidade que fornece abrigo a essas mentes: a arquitetura.

Desde abrigos catacumbários à majestosas catedrais, a história se esculpiu não apenas em estilos, mas também em crenças. Afinal, “conhecemos e lembramos quem somos como seres históricos por meio de nossos cenários construídos” (PALLASMA, 2013, p. 10).

Ao adentrar em um templo religioso, somos inundados com experiências sensoriais que nos induzem a reações emocionais curiosas e distintas. Eberhard (2009) descreve em sua obra, The Brain Landscape, sua experiência na Abadia de Bath, no Reino Unido. Segundo ele, o som dos passos no piso de pedra; a música tocada no órgão; o sussurro dos visitantes; a aspereza da pedra antes mesmo de ser tocada; e até mesmo o odor de incenso criam uma atmosfera quase tangível de admiração e reflexão. As grandes catedrais europeias causam essa reação emocional, especialmente naqueles que as visitam pela primeira vez (EBERHARD, 2009). Além disso, outros lugares no mundo destinados a adoração

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também induzem ao respeito e reverência (EBERHARD, 2009). Enfatizamos essa constatação a partir da citação de Christopher Egan (apud EBERHARD, 2009, p. 110):

A arquitetura nos move. Pode nos confortar ou nos intimidar; pode nos iluminar ou mistificar; pode trazer alegria ou rasgar nossos corações. A arquitetura nos move ao tocar três camadas de memória. Através do espaço primordial, pode tocar nosso núcleo emocional mais profundo; evocando memórias sombrias do útero, da caverna, da floresta e da luz. Pode recordar memórias da cultura, ou nosso lugar no mundo histórico. As memórias pessoais adicionam sobreposições de significados subjetivos, pois os edifícios estão associados a eventos em nossas vidas.

1.2 Espaço sagrado e espaço espiritual

O conceito de sagrado aplicado a arquitetura, porventura, pode ser elusivo (EBERHARD, 2009). Podemos dizer, efetivamente, que a religiosidade é considerada uma “das práticas culturais mais antigas experienciadas nos grupos sociais. Ela imprime no

espaço marcas simbólicas dominantes e permanentes” (ROSENDAHL, 2014, p. 4).

Para essa constatação, faz se necessário definir dois conceitos importantes:

Local espiritual: criado para algum propósito religioso. Nesse caso, o local é espiritual por criação, e não depende da experiência sensorial do visitante (EBERHARD, 2009).

Local sagrado: lugares (incluindo os espirituais) que evocam uma experiência transcendental no usuário, como uma conexão com algo “maior” do que ele mesmo (EBERHARD, 2009).

Neste trabalho, especificamente, abordaremos o estudo de “locais sagrados” e seus impactos na mente das pessoas.

Os espaços religiosos remontam não apenas um símbolo de esperança, mas a coragem e desejo dos construtores de alcançarem os céus. Catedrais, esplendorosas e magistrais, se espalharam pela Europa na Idade Média, uma época que a devoção se assemelhava ao poder, e estes se depositavam sobre paredes de pedra e vitrais.

John Eberhard, em sua obra, narra o que expe

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renciou em sua visita na Catedral Nacional de Washington, D.C. A arquitetura suntuosa despertou modificações na sua paisagem corporal. Entretanto, para compreendê las, é necessário saber, primeiramente, o que se passa dentro do cérebro de quem vive a situação, para então ser externalizado.

1.3 Mente e consciência

Definir o que é mente se torna quase tão desa fiador quanto definir crenças religiosas. Ambos são intocáveis e intangíveis, porém extremamente poderosos. Descartes (apud EBERHARD, 2009) determina mente sendo um fenômeno. Entretanto, será aqui adotada a explicação de Eberhard, que define mente como “um elemento, ou complexo de elementos, de um indivíduo que sente, percebe, deseja e, especialmente, raciocina” (EBERHARD, 2009, p. 51).

Partindo do princípio que toda mente é ocupada por uma consciência, vamos procurar entender este fenômeno. O tópico sempre foi debatido pela ciência, porém uma definição certeira nunca foi encontrada (EBERHARD, 2000). Há filósofos que recusam a existência de uma abordagem epistemológica em

torno do assunto, dizendo que não há nada além de circuitarias cerebrais ocupando o cérebro – ou nada que vale a pena ser discutido (EBERHARD, 2009). Entretanto, há aqueles, como René Descartes e William James, que afirmam que consciência é sinônimo de “pensamento”, por exemplo (EBERHARD, 2009). Entretanto, pretende se utilizar a abordagem de António Damásio (2015), que aponta que a consciência humana pode ser a função biológica que nos permite perceber quando sentimos tristeza ou alegria, vergonha ou orgulho. É o elemento chave para que reconheçamos os impulsos que nos torna humanos, como rir diante de uma comédia, ou chorar diante da perda de um ente querido (DAMÁSIO, 2015).

Eberhard (2009) ainda afirma que a consciência define a forma que se experencia a arquitetura. Para exemplificar, imaginem adentrar a Catedral Nacional de Washington, D.C: imediatamente, após passar pela porta, ocorrem interações no nosso cérebro que conecta a experiência vivida no momento com aquelas de outras visitas no mesmo lugar ou em locais similares (EBERHARD, 2009). "Os grupos neuronais ativados por sua experiência constroem,

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assim, uma cena dos objetos que você está vendo, ouvindo, tocando e talvez cheirando, distribuídos pelas redes que ligam o tálamo e o córtex o sistema tálamocortical” (EBERHARD, 2009, p. 52). Essa conexão foi chamada de consciência primária (EBERHARD, 2009).

Há aqueles que se atentem aos vitrais, outros se concentram nos sons das canções e, ainda, há quem tem sua atenção roubada por cheiro do incensos. Em um espaço permeado com detalhes, cada indivíduo terá sua atenção direcionada a um determinado elemento. Isso depende do “sistema de valores”, um sistema estabelecido durante eventos passados que o cérebro considerou como importante serem lembrados pode ser por um som alto, um flash de luz ou até uma resposta emocional (EBERHARD, 2009). A memória de curto prazo, envolvida em ajudar a estabelecer a consciência primária, incorpora as memórias do passado, numa espécie de partida rápida, com as imagens formadas no momento presente (EBERHARD, 2009). Por essa razão, algumas lembranças parecem ser tão vívidas e reais. Esse fenômeno é conhecido como "presente lembrado". Com essa relação estabelecida, a mente

constrói uma relação de passado e presente única para cada indivíduo, uma viagem através do tempo especial e singular para cada um (EBERHARD, 2009).

O mecanismo pelo qual nosso cérebro fornece continuidade em nossas vidas vincular memórias a percepções presentes e usar nosso sistema de valor único para atribuir prioridades – é o que Edelman e Tononi chamam de consciência de ordem superior. (EBERHARD, 2009, p. 53)

1.4

Visão na arquitetura religiosa

Goethe (BRADA apud LEMOS, 2007, p. 31), escri tor alemão, certa vez definiu a arquitetura como sendo “música petrificada”. Sua definição, embora poética, não poderia ser mais precisa. Da mesma forma que um músico organiza os compassos e o ritmo de uma melodia, o arquiteto combina cores, formas e traços para criar uma obra que desperte experiências emocionais no usuário.

1.4.1

Simetria

Christopher Tyler (2000 apud EBERHARD, 2009) afirma que simetria é uma propriedade visual

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humana importante, pois ajuda a diferenciar organismos vivos de objetos inanimados, quando identificamos a orientação da face e a direção da atenção (EBERHARD, 2009). O pesquisador sugere que a simetria é um princípio essencial dos objetos de projeto (EBERHARD, 2009).

1.4.2 Harmonia

Prosseguindo com a comparação, harmonia no campo musical se trata da combinação de notas, de maneira ordenada, que geram sons que equilibram entre si (SCHMIDT, 2021). Na arquitetura, harmonia é entendida como uma organização de elementos consistente, ordenada e prazerosa (EBERHARD, 2009), Um elemento bastante presente na arquitetura religiosa são as famosas rosáceas. “São uma sinfonia de luz e ilustração do amor de Deus, radiando de todos os lados” (DW Documentary, 2021). Da mesma forma que Deus uma vez ordenou: Que haja a luz! (Gên., 1:3), as igrejas incorporaram seus mandamentos e espelharam Seu poder através dos grandes vitrais.

De volta para o debate, a harmonia presente nas rosáceas “são geradas pela proporção áurea e são

simétricas tanto na horizontal quanto na vertical. Parece provável que se responda positivamente às harmonias deste design porque estamos programados para a 'média dourada'" (EBERHARD, 2009, p. 92). Realmente, há de se considerar o fato que a média dourada foi amplamente utilizada na arquitetura em eras passadas e, segundo Eberhard (2009) o cérebro, biologicamente, está programado para responder à tais proporções.

Adiante, o estudo a respeito do cérebro frente a monumentalidade da arquitetura, a fim de entender a mente por trás da arte.

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Capítulo 2 Capítulo 2

Capítulo 2 - Memória, emoção e sentimentos Capítulo 2 - Memória, emoção e sentimentos

“O tempo não passa de memórias sendo escritas”, certa vez disse o romancista Vladimir Nabokov (NABOKOV apud CROUCH, 2019, p. 11). A história do mundo está consolidada sobre as lembranças escritas através do tempo. Ao pensarmos em uma escala maior, enxergamos as memórias de grandes nações, que fundamentam a base da sua cultura, crenças e costumes. Lent (2008) afirma, em Neurociência da Mente e do Comportamento, que a identidade dos povos reside em lembranças compartilhadas.

Através deste fato, podemos construir o passado da igreja católica ao longo dos séculos. Desde soturnas catacumbas até majestosas catedrais, o mundo carrega as lembranças da igreja católica e suas influências. Para o entendimento de como isso funciona, faz se necessário adentrarmos, primeiramente, na mente daquele que é influenciado e analisar: o que é uma memória?

2.1 Formação das memórias

Memória se refere ao “processo mediante o qual adquirimos, formamos, conservamos e evocamos informação” (LENT, 2008, p. 242). Acontece quando algum evento é absorvido do ambiente para os sistemas neurais, por meio dos cinco sentidos. “Por evento, entendemos qualquer coisa memorizável: um objeto, um som, um acontecimento, um pensamento, uma emoção, uma sequência de movimentos” (LENT, 2010, p. 646 647). Tendemos a pensar que criamos memórias a partir do que apenas nos cerca, porém isto é um equívoco. Roberto Lent (2010) afirma que os eventos podem advir tanto do mundo exterior, e serem coletados através dos sentidos; ou podem surgir dentro do “mundo interior” de cada indivíduo, em uma realidade criada apenas pela própria mente. Durante esta entrada de informações, ocorre uma espécie de seleção. Os eventos são múltiplos e complexos, fazendo com que o sistema de memória

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apenas armazene aspectos mais relevantes, carregados de significados e, principalmente, de carga emocional (LENT, 2010). É vital ressaltar que elementos como estado emocional e o contexto da situação influenciam na aquisição e na evocação das memórias (LENT, 2010). Para ilustrar, se uma pessoa ouvir uma história em um dia que estiver triste, essa história será gravada de tal forma que será lembrada facilmente, principalmente se o indivíduo estiver experenciando essa emoção novamente (PERGHER et al., 2006 apud OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020).

2.2 Armazenamento

Após adquiridas, é chegado o momento de o cérebro decidir a destinação das informações que foram coletadas. Sendo assim, há grupos de memórias que podem ser destacadas.

Como um primeiro estágio, existem as memórias de trabalho. São responsáveis por manter as informações vivas na mente, enquanto é percebida ou processada (OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020). Em seguida, há dois grandes grupos de memórias:

a) Memórias declarativas: Lent (2008) afirma que as memórias explícitas – ou declarativas – são aquelas que temos acesso consciente e sabemos da sua existência. Ainda segundo este pesquisador, essa tipologia se subdivide em outros dois tópicos: Memórias episódicas: são aquelas que “contêm informação acerca da nossa própria vida” (LENT, 2008, p. 246). Neste caso, existem informações mais precisas, como data, local ou com quem se estava etc. Essa tipologia abarca lembranças de um evento, por exemplo. Memórias semânticas: ao contrário das memórias episódicas, as semânticas contêm informações do ambiente e o conhecimento da sua veracidade, porém não há precisão de como foram adquiridas (OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020; LENT, 2008). Como exemplo, podemos tomar a data do descobrimento do Brasil: sabe se quando foi, porém não há certeza de onde veio essa informação.

b) Memórias procedimentais: estas “contêm informação à qual não temos acesso consciente, tal como o conhecimento de um procedimento automá

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tico” (LENT, 2008, p. 246). As memórias procedimentais abarcam os hábitos e costumes. Muitas lembranças são adquiridas mediante a associação de um estímulo com outro ou, ainda, com uma resposta (LENT, 2008). A repetição do estímulo suprime a necessidade de orientação e isso se denomina habituação (LENT, 2008).

As tipologias de memórias podem ser vistas de forma simplificada no esquema abaixo (Figura 01):

memória, podemos nos indagar: por que persistem lembranças, com detalhes, de um evento ocorrido há anos, mas não é possível, por vezes, lembrar do nome de alguém que se conheceu no dia anterior? Esse fenômeno acontece pois, além de classificação por conteúdo, a mente também classifica as memórias por duração. Primeiramente, temos as memórias de curta duração, que duram de 30 minutos a 6 horas. Essas são responsáveis pela recordação de eventos recentes e imediatos, como o tempo necessário para anotar um telefone (OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020). As memórias de longo prazo, por sua vez, podem habitar as mentes por anos, ou até permanentemente, transformando se, inclusive, em partes dos traços de personalidade (OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020). Por esta razão, sem medo de exagerar, Lent (2008) afirma que os seres humanos são o produto das próprias lembranças.

No aprofundamento dos estudos sobre a

Agora que sabemos que todos possuem uma ba se de dados de memórias permanentes, nos questionamos: como uma memória de curto prazo se torna uma memória de longo prazo? Em um processo chamado de consolidação, é possível entendermos como ocorre a transmutação de uma memória de

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curto prazo em uma memória de longo prazo. Tal fato acontece por meio de uma área do cérebro chamada hipocampo (Figura 02), uma formação pequena e curva, que é peça fundamental na formação, organização e armazenamento de novas memórias (TEMÍSTOCLES, 2000-2022).

Figura 02 Representação do Hipocampo

incapazes de formar novas (IAMARINO, 2015). “O que o hipocampo faz não é gravar uma cena, como o HD do seu computador. Na verdade, ele liga as regiões da parte mais desenvolvida do nosso cérebro, o neocórtex, que precisam ser associadas naquela memória.” (IAMARINO, 2015)

Este longo processo é demorado, levando de 6 a 8 horas, por isso que ocorre durante o sono (IAMARINO, 2015). Estudos sugerem que, quando dormimos após aprendermos algo, lembra se melhor do assunto no dia seguinte (TEMÍSTOCLES, 2000 2022).

Fonte: OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020, p. 105

Por essa razão, pacientes que sofreram danos no hipocampo, como Henry Molaison, sofrem de amnésia anterógrada, uma condição que em que o indivíduo mantém as memórias antigas, porém são

Outro instrumento atuante nessa orquestra neurológica é a amígdala. Essa estrutura do cérebro é fundamental para a “ligação entre informações sensoriais e respostas comportamentais e fisiológicas humanas, especialmente para estímulos que sinalizam perigo” (OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020, p. 105). Além dessas funções, tal estrutura aparenta ser responsável na modulação (tornando mais fácil ou mais difícil) as memórias serem consolidadas em situações de alerta emocional (LENT, 2008 apud OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020).

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Este mecanismo apresenta dois lados. O lado positivo é que, mesmo as lembranças tenham se perdido ou sido prejudicadas, ainda guardamos informações comportamentais de situações estressantes ou desagradáveis, servindo como uma espécie de “proteção”. Entretanto, é exatamente pelo fato de não haver as lembranças que podemos experenciar respostas cognitivas/comportamentais automáticas, pode se desencadear o surgimento de patologias mentais (LENT, 2008 apud OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020).

2.3 Evocação

Sabe quando escutamos uma música e nos lembramos de um momento da nossa vida? Ou quando sentimos o aroma de alguma comida que nos resgata alguma memória de infância? Enquanto seres acumuladores de memórias, os indivíduos são capazes de trazê las de à tona em um processo denominado evocação, isto é, quando há um reconhecimento de algum aspecto pelo nosso cérebro (OLIVEIRA; BITTENCOURT; PINHEIRO, 2020). Segundo Pinheiro (2021), através de certos estímulos,

ao se evocar uma lembrança, os neurônios são capazes de converter sinais bioquímicos em elétricos, o que a consciência interpreta como parte do mundo real novamente. Assim, as emoções e a ansiedade presentes durante a evocação podem influenciar o processo. Entretanto, diferentemente do que acontece durante a sua formação, não é relacionado a modulação (LENT, 2008).

Vale ressaltar que o cérebro, assim como qual quer outro órgão, preza pela própria saúde. Por essa razão, a mente criou um mecanismo de segurança, em que as lembranças, após repetidas evocações, acabam sendo extintas (LENT, 2008). Isso previne um acúmulo de lembranças detalhadas desagradáveis. Afinal, não se deseja de experenciar a mesma realidade de Sólomon Shereshevsky, um jornalista russo que possuía um caso raro de hipermnésia, uma condição que lhe dava a habilidade de se lembrar, com detalhes, de praticamente todos os eventos de sua vida, inclusive os mais desagradáveis (PINHEIRO, 2021).

Entretanto, devemos atentar para o fato que a extinção da memória não significa seu desaparecimento. De acordo com Lent (2008), as

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as lembranças podem retornar, com um estímulo específico, um gatilho. O pesquisador afirma que esse conjunto de lembranças latentes desempenham algum papel na formação da nossa personalidade (LENT, 2008). Antes de Lent postular suas ideias, Freud já estudava a teoria que o mesmo chamou de repressão de lembranças, ou seja, a existência de uma força ativa na mente que tenta, constantemente, abafar o material desagradável e prejudicial de emergirem para a consciência (TIRABOSHI, 2000 2022).

2.4 Emoções

Todos possuímos aquela lembrança que nos desperta uma alegria, ou aquela música que marejam nossos olhos. É inevitável a conexão existente entre memórias e emoções. E, para entender o outro lado desta moeda, devemos definir: o que são as emoções?

Por exemplo, em uma situação de perigo, o cé rebro começa a liberar diversos comandos para o corpo, automaticamente: o sangue é redirecionado para os grandes músculos, preparando para uma possível luta ou fuga; a visão fica focada e alerta, não

permitindo desconcentração; os batimentos cardíacos se aceleram, dentre outros (CALABREZ, 2017). Essa orquestra de respostas automatizadas se configura no que se chama de emoção.

As emoções, segundo Lent (2008), são resultado da ativação de uma complexa e elaborada rede neural, cujo acionamento desencadeia um repertório variado de respostas físicas e comportamentais.

Do ponto de vista biológico, a emoção pode ser definida como um conjunto de reações químicas e neurais subjacentes à organização de certas respostas comportamentais básicas e necessárias à sobrevivência dos animais. (LENT, 2008, p. 254)

Esse mecanismo foi desenvolvido e aprimorado ao longo da evolução para a própria sobrevivência, uma possibilidade do nosso organismo agir de maneira imediata (CALABREZ, 2017). Isso significa, consequentemente, que não existe controle sobre as respostas emocionais.

De acordo com Calabrez (2017), emoções estão sempre ligadas a estímulos, podendo estes serem

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externos coletados através dos sentidos ou internos – podendo surgir no interior em nossa mente, como memórias ou ideias. Além disso, o mesmo pesquisador afirma que emoções estão ligadas também a uma escala de valência:

·Valência positiva: nos induzem a comportamento de aproximação. Quando algo nos faz sentir bem, tendemos a nos aproximar, inconscientemente (CALABREZ, 2017).

·Valência negativa: acontece quando algo provoca sensações desagradáveis e nos levam a comportamento de afastamento (CALABREZ, 2017).

Antes de entrarmos nas tipologias, é importante ressaltar outro fato com relação às emoções: elas são, predominantemente, inconscientes. Sendo configuradas como respostas automáticas, ocorrem abaixo da linha da consciência, sendo parte do comportamento instintivo (CALABREZ, 2017).

Com esse fato pré determinado, podemos aden trar nos estudos das emoções que, assim como as memórias, também são categorizadas. São elas: (a) emoções primárias; (b) emoções secundárias; (c) emoções de fundo.

2.4.1

Emoções primárias

Em Emotions Revealed (2003), o psicólogo Paul Ekman, conta de sua viagem, realizada em 1967, para conhecer os Fore, uma tribo que vivia isolada na Nova Guiné. O objetivo dos seus estudos era provar a existência de emoções inatas aos seres humanos, utilizando aqueles que não tinham nenhum contato com a influência midiática. Sua pesquisa foi um sucesso e os resultados se mostraram extraordinários.

Ekman identificou seis emoções como sendo universais, inatas à toda espécie humana: alegria, tristeza, medo, nojo, raiva e surpresa (LENT, 2008). Isso significa dizer que essas emoções possuem padrões de expressão especialmente, faciais que são semelhantes em todas as culturas, indicando uma natureza hereditária (LENT, 2008).

2.4.2 Emoções secundárias

Essa tipologia, por sua vez, é mais complexa e influenciada pelo contexto em que estão inseridas, estando atreladas a fatores socioculturais (LENT, 2008). "Culpa e vergonha são exemplos de emoções que variam amplamente de acordo com a cultura,

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com a experiência prévia e com a época em que o indivíduo está inserido”, afirma Lent (2008, p. 254).

2.4.3 Emoções de fundo

O terceiro e último tipo está relacionado com o nosso bem-estar ou mal-estar, calma ou tensão (LENT, 2008). Como podemos imaginar, essa tipologia possui sinais mais sutis, com estímulos geralmente internos. Mesmo que o papel principal das emoções de fundo seja desempenhado pelas nossas vísceras, podemos perceber alterações musculoesqueléticas no usuário, como no caso de uma postura mais curvada daquele que está cansado (LENT, 2008).

Diante dessas informações, há quem considere que ao vivenciar uma situação de perigo, como aquela exemplificada anteriormente, está ciente que sentirá medo. A partir de tal constatação, podemos apontar que o usuário não se encontra diante de uma emoção, mas de um sentimento.

2.5 Sentimentos

Damásio (2012, p. 19), neurocientista português, afirma que “o sentimento é a vista momentânea de uma parte da paisagem corporal”. Sendo assim, sentimento se configura como a percepção consciente e parcial das emoções (CALABREZ, 2017). Fazemos aqui o uso do termo “parcial” pois não é possível constatar as mudanças fisiológicas despertadas por uma emoção em sua totalidade (CALABREZ, 2017).

A distinção ocorre por duas razões: (a) as circuitarias cerebrais que controlam as emoções são diferentes daquelas que comandam os sentimentos; (b) é possível que uma emoção não transmute para um sentimento (CALABREZ, 2017). Podemos experenciar uma emoção, juntamente com suas mudanças fisiológicas, e não nos darmos conta.

Dentre todos os sentidos capazes de carregar informações, que desencadeiam emoções, a visão torna se o principal canal de contato entre o usuário e a arquitetura. Em conjunto com os outros sentidos, nossos olhos são capazes de nos contemplar com cenas que ficaram marcadas em nossas memórias. O próximo capítulo tem como intuito o estudo, pela perspectiva da literatura médica, da visão.

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Capítulo 3 Capítulo 3

Capítulo 3 - A visão Capítulo 3 - A visão

Além do nosso sistema de percepção afetiva, não podemos nos esquecer do principal elemento que nos permite absorver toda a arquitetura religiosa e seu resplendor, através das cores e da luz: a visão. Como parte da metodologia deste trabalho envolve um aparelho que permite a investigação dos elementos visuais, que será elaborado mais adiante, é hora de adentrarmos no sistema visual.

3.1 Como funciona a visão?

Podemos dizer, de forma simplificada, que a visão é concentrada, basicamente, no “trajeto percorrido pelos raios de luz que formam as imagens, da parte frontal do globo ocular (córnea) e até a parte posterior (retina), de onde serão direcionados para o cérebro” (Donato Hospital dos Olhos, 2021).

Há dois amplos fluxos de projeções que entram pelos olhos, que consistem no fluxo ventral e o fluxo dorsal (Figura 03). No fluxo ventral são reunidas as informações relacionadas às características duradouras dos objetos, como tamanho, forma, a cor

e o brilho (EBERHARD, 2009). Essa parte permite percepções relacionadas a um período maior de tempo, isto é, uma base de conhecimento sobre o mundo que nos circunda (EBERHARD, 2009). O fluxo dorsal, por sua vez, fornece “informações a cada momento sobre a localização e disposição dos objetos, permitindo o controle visual de pessoas habilidosas” (EBERHARD, 2009, p. 97).

Figura 03 Fluxo visual

Fonte: EBERHARD, 2009.

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O olho humano, por mais complexo, que aparen ta, é uma grande esfera oca, formada por córnea, íris, cristalino e retina (Figura 04). Assim como uma janela em um cômodo, esse órgão é responsável pelo controle e recepção da luz (JULLY, 2000 2022).

Figura 04 Anatomia do Olho Humano

Entretanto, vale retomar o conceito visto anteriormente: o estado emocional também é capaz de alterar o tamanho da pupila. O sistema nervoso autônomo desencadeia diversas reações involuntárias durante as emoções, tais como medo e excitação e, pesquisas sugerem, que a dilatação da pupila está relacionada a respostas involuntárias de atração (BRITO, 2020).

3.1.2 Córnea e retina

Após a entrada de luz através da íris, a luz é desviada do seu caminho pelo cristalino e chega até a retina. O cristalino constitui como uma lente modificável, que regula sua espessura para focar os raios de luz na retina, e o cérebro converte esses impulsos elétricos em uma imagem, que necessita de ser invertida (JULLY, 2000 2022).

3.1.1 Íris e pupila

Quando há luz em um espaço e alguma imagem é captada pelo nosso sistema visual, “a íris regula a quantidade de luz que entra no olho através do tamanho da pupila” (JULLY, 2000 2022). Sendo assim, a pupila altera seu tamanho conforme as condições do ambiente que o organismo se encontra.

Quando a luz chega à retina, os fotorreceptores, células especializadas, convertem o impulso luminoso em um estímulo elétrico (JUNIOR, 2000 2022). Vale ressaltar que os olhos são apenas parte do processo de percepção visual, pois não veem nada se não houver um estímulo no córtex visual. Esses sinais recebidos pelos gânglios, estruturas associadas às

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Fonte: Hospital dos Olhos de Sergipe, 2021

retinas, são transmitidos para a parte posterior do cérebro: o córtex visual (EBERHARD, 2009). Uma vez que a imagem é recebida, é nessa área cerebral que ela será montada. Eberhard (2009, p. 99 100) nos informa que “a percepção de um objeto não ocorre até que a mente reúna as memórias necessárias associadas a tais objetos. O reconhecimento não ocorre até que a mente localize a memória que dá sentido ao que está sendo percebido”.

3.2 Voxels no cérebro e expressão de edifícios

Com uma série de experimentações, os estudio sos Epstein e Kanwisher et al. (1999 apud EBERHARD, 2009) demonstraram que uma área do cérebro, denominada giro para hipocampal (ou PPA), é mais significantemente ativa quando os sujeitos visualizam cenas complexas, como salas, paisagens e ruas, do que quando visualizamos objetos ou rostos (EBERHARD, 2009).

E, além disso, esse fluxo de atividades nessa área é maior quando um indivíduo está visualizando uma nova cena, em contraste com algo já familiar. Isto significa que o PPA não está relacionado com as nossas memórias (EBERHARD, 2009). Essa área

cerebral, por conseguinte, parece ser a área cerebral onde são codificadas as informações a respeito de layout e aparência dos locais (EBERHARD, 2009).

Estudos mostraram que a formação de voxels¹ usados para o reconhecimento de um lugar é formado ao longo do desenvolvimento do cérebro, como se os neurônios fossem gradualmente codificamos em frente ao resultado de uma experiência acumulada (EBERHARD, 2009).

Com o avanço nos estudos da visão, atualmente é possível rastrear, por meio de dispositivos tecnológicos, os elementos que captam nossa atenção No capítulo 4 veremos o estudo de um

¹Voxels constituem "milhares de pequenos volumes de neurônios que são importantes em estudos de imagens cerebrais [...]" (EBERHARD, 2009, p. 224).

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Capítulo 4
4
Capítulo

Capítulo 4 - Eye-tracking Capítulo 4 - Eye-tracking

A explanação do capítulo anterior serve de base para este, em que estaremos explorando sobre o aparelho eye tracker, uma tecnologia que está adentrando e revolucionando o mundo da arquitetura. Um dispositivo inicialmente criado para as áreas de marketing e propaganda, agora está se tornando objeto de estudo e auxílio em várias pesquisas do ambiente arquitetônico.

Com relação ao fato de que a visão e os processos cognitivos associados a ela ocorrem quase sempre e em todos os lugares, os estudos de rastreamento ocular têm se tornado cada vez mais parte de estudos de muitas áreas da vida. Eles são recomendados para uso em áreas como gestão, publicidade tradicional e online, ergonomia do sistema de tecnologia da informação (TI), interação homem-máquina, sistemas de gestão da informação, medicina e psicologia, educação, esportes, entretenimento e militares. Estudos so-

sobre a percepção da arte e da arquitetura passaram a utiliza-los também. (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020, p. 12)

A utilização do eye tracking (rastreamento ocular) neste novo campo de estudos abriu portas para novas possibilidades no âmbito em pesquisas na arquitetura.

4.1 Como funciona?

O rastreamento ocular começou sua trajetória auxiliando nas pesquisas, com uma aplicação metodológica mais ampla, na segunda metade do século XX, juntamente com disciplinas acadêmicas como psicologia, ciência cognitiva ou interações humano computador (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020).

O final do século passado foi testemunho do surgimento de ferramentas que permitiram a fabricação de pequenos dispositivos móveis, além da criação de aplicativos para computação de dados (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020).

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Atualmente, os estudos do campo video oculográficos são essencialmente baseados no uso de um sistema de câmeras gravadoras posicionadas perto dos olhos do voluntário (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020). Durante os testes, a câmera capta o movimento dos olhos do indivíduo e sua transmissão de vídeo é armazenada em um computador, para ser analisada por meio de um software específico e especializado (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020). A partir disto, as informações extraídas deste estudo são extraordinárias. Uma medição típica com o rastreamento ocular permite extrair dois tipos de informações primordiais:

Fixações: constituem os pontos que o sujeito olhou. “As informações visuais são coletadas durante a fixação. Saber para onde o sujeito olha (os locais em que fixam os olhos) ajuda a identificar o que notaram” (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020, p. 5). Sacadas: são os movimentos realizados pelos olhos de um ponto de fixação a outro. Durante o tempo da sacada (20 a 40 milissegundos), o cérebro não registra nenhuma informação visual, o que gera apenas um gráfico por linhas que co

nectam os pontos (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020).

As formas gráficas utilizadas para representar esses dois aspectos são: mapas de calor, gráficos de olhar (gaze plot) e análises de área de interesse.

4.1.1 Mapas de calor

Os mapas de calor permitem determinar, essencialmente, qual elemento atraiu a atenção do voluntário. Em termos gráficos, é gerado um mapa com os pontos em que o indivíduo focou seus olhos por mais tempo: um tempo de fixação mais longo é marcado por cores quentes, enquanto tempos de fixação mais curtos são demonstrados através de cores frias (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020). Locais sem nenhuma cor denotam fragmentos da cena completamente ignorados pelo sujeito (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020).

4.1.2 Gaze Plot

A segunda etapa dessa apresentação é o gaze plot, que indica uma sequência de pontos em que os indivíduos fixaram seu olhar enquanto observavam uma cena. São utilizados círculos para representarem cada ponto de olhar: quanto maior o diâmetro do cír

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culo, mais tempo o voluntário gastou olhando para um determinado ponto (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020). Além disso, dentro de cada círculo há um número, representando o caminho que o olhar do voluntário percorreu na imagem (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020).

4.1.3 Área de interesse (AOI)

4.2 Estudos ao redor do mundo

As pesquisas relacionadas ao eye tracking tem se espalhado de forma intensa por grupos de pesquisa em diversos países, como Alemanha, Estados Unidos, Bélgica e Polônia. As equipes de pesquisa de referência, incluem, por exemplo: Cap. Lebrun; A. Sussman; W. Crolius; G. van der Linde, do Institute for Human Centered Design, em Boston, dentre outros (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020).

Tempo até encontrar a primeira fixação ajuda os pesquisadores a entender quanto tempo demora para os sujeitos encontrarem a primeira área que lhes despertem algum interesse. Tempo total de todas as fixações O número de pessoas/voluntários que fixaram em determinada área. Número de revisitas para uma área, sendo de um indivíduo ou todos

Nessa representação é possível distinguir um grande número de olhares que dizem respeito a cada área da tela. Analisando as áreas de interesse é possível ver, por exemplo: Kuÿnierz e Krupa (2020) afirmam que a principal vantagem dos estudos sobre eye tracking envolve estudar objetivamente a percepção dos usuários.

Uma das razões para esse método ser ampla mente utilizado é que o rastreamento ocular e a percepção visual estão amplamente conectados. A psicologia estabelece que o processo de percepção visual está enraizado em dois níveis de percepção: o primeiro, ocorre após a fase de percepção sensorial (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020). Segundo Kuÿnierz e Krupa (2020, p. 4), “a recepção sensorial que a precede é equiparada ao processo inicial de coleta passiva de informações, durante o qual a entrada é detectada em receptores (‘queimados’ nos fotorreceptores de retina)”. Após o processo de recepção, inicia se o processamento da informação. Na etapa da percepção visual, por sua vez, já é possível indicar o que chamamos de detectores de propriedades, isto é,

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neurônios que reagem, de forma seletiva, a linhas com uma orientação espacial específica ou ao contorno do rosto humano (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020).

O segundo estágio deste processo, considerado racional, envolve a interpretação de dados sensoriais usando “sugestões contextuais, atitude e conhecimento previamente adquirido. A percepção envolve atividades como discriminação, reconhecimento, orientação ou categorização perceptiva” (KUŸNIERZ e KRUPA, 2020, p. 4). Esse processo está presente durante o estágio da consciência de ordem superior, já explanado neste trabalho.

Essas pesquisas foram focadas, principalmente, em três aspectos principais: o uso do eye tracking em si; acoplado ao aparelho fixo ou móvel; o uso de eye tracking em combinação com outros dispositivos e métodos de pesquisa.

A seguir, veremos os estudos de caso que usufruíram da neurociência e do rastreamento ocular como forma de metodologia para desenvolvimento de projeto ou estudo de locais existentes a partir de simulações.

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5
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Capítulo
Capítulo

Capítulo 5 - Estudos de Caso Capítulo 5 - Estudos de Caso

O interesse pela forma que as igrejas são fontes de emoções que transcendem a simples fé católica não é recente. Projetos embasados em estudos nos gatilhos arquitetônicos já foram desenvolvidos e simulações dentro de espaços sagrados foram aplicadas, procurando entender como modificações podem afetar na experiência do usuário. A seguir, veremos dois estudos de caso que deram embasamento para o desenvolvimento deste trabalho.

5.1 Capela Thorncrown

A capela Thorncrown (Figura 5) é um excelente exemplo de como um design pode impactar as mentes. Uma construção de vidro no meio de uma floresta, convidando o usuário à reflexão e introspecção.

Sua história se inicia em 1971, com Jim Reed, um senhor nativo do Arkansas, Estados Unidos, que comprou uma propriedade em Eureka Springs, esperando ter um refúgio para passar a aposentadoria (EBERHARD, 2009a; GALLOWAY, 2000 2022). Entretanto, Jim Reed percebeu que aquela área era bastante frequentada por turistas, por conta de sua beleza, o que o levou a mudar de ideia. Sendo

Figura 05 Capela Thorncrown Fonte: GALLOWAY, 2000 2022
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assim, Reed chamou seu amigo arquiteto, Fay Jones, para projetar a “capela”. Sobre a oportunidade, Fay Jones disse:

Eu vi uma oportunidade aqui de criar Arquitetura com “A” maiúsculo. A distinção que estou fazendo é que nem toda construção é arquitetura, assim como nem toda escrita é literatura ou poesia, mesmo que a escrita, a gramática e a sintaxe estejam corretas. Há algo na arquitetura que toca as pessoas de um jeito especial e eu espero fazer isso com essa capela. (FAY JONES apud EBERHARD, 2009a, p. 3)

Figura 06 Capela Thorncrown (internamente)

5.1.1 Estrutura

“Com mais de 425 janelas de vidro e uma estru tura de colunas e treliças repetitivas, a capela vertical é como uma ‘floresta dentro de uma floresta’", conta Galloway (2000 2022) para o Archdaily (Figura 06).

Fonte: GALLOWAY, 2000 2022

A capela possui 14,6 metros de altura; 18,2 me tros de comprimento; e, somente, 7,3 metros de largura (GALLOWAY, 2000 2022). A claraboia central permite que porções generosas de luz entrem e se espalhem pelo seu interior. Luminárias (Figura 07) personalizadas foram instaladas em cada um dos pilares e são refletidas pelo vidro durante a noite, criando um caminho de luz pela floresta (Figura 08) (GALLOWAY, 2000 2022).

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Figura 07 Luminárias da capela

Figura 08 Capela durante a noite

A estrutura impressionou ao ponto que o Institu to Americano dos Arquitetos a escolheu como quarta estrutura com o design mais impressionante do século XX (EBERHARD, 2009a).

Para o arquiteto, o processo de construção era tão importante quanto o produto final, pois o mesmo se preocupou de não apenas contratar jovens arquitetos, mas também contratar jovens artesãos locais, como pedreiros e carpinteiros (GALLOWAY, 2000 2022).

Fonte: GALLOWAY, 2000 2022 Fonte: GALLOWAY, 2000 2022
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5.1.2 Análise neurocientífica

Segundo Eberhard (2009a), há diversas explicações para o motivo dos indivíduos se sentirem confortáveis e reflexivos nessa capela.

O senso de respeito é, em partes, influenciado, quando existe um espaço amplo acima da cabeça do usuário, que não é visível até movermos os olhos, ou até a cabeça, para cima. Semir Zeki (apud EBERHARD, 2009a) afirma que mover os olhos para cima, a fim de contemplar o teto da igreja, nos traz a noção de algo “etéreo”.

A sensibilidade do núcleo supraquiasmático à luz influencia o estado de alerta, de forma que o cérebro acha estimulante e queira experenciar mais o lugar.

O próprio silêncio e quietude da natureza já provê um ambiente tranquilo para a experiência do córtex auditivo, nos induzindo a um estado de relaxamento.

5.2 Estudos com eye-tracker na Catedral de Notre-Dame de Reims

O estudo com o eye tracking em ambientes reli

giosos não é algo inédito. Fikus, Rusnak e Szewezyk (2018) realizaram um estudo com catedrais francesas que erguidas do final do século XII até início do século XIV, por se tratar de um grupo mais homogêneo (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018). Após isso, dentro desse grupo, foram selecionados alguns templos, pois os mesmos consistiam em naves tripartite e possuíam um cinturão de pilares. A Catedral de Notre Dame de Reims (Fig. 9) foi selecionada para testagens com um eye tracker estacionário. Figura 09 Catedral Notre Dame de Reims

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Fonte: Paris City Vision (2000 2022)

A teoria defendida pelos pesquisadores era que “um aumento no comprimento de uma catedral torna mais fácil ler seu ritmo interior. A elevação da nave deve suscitar mais interesse em estudar o ritmo dentro da abóboda.” (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018, p. 2)

O maior desafio dessa pesquisa foi postular algo desse tipo usando uma apresentação estática, em uma experiência que geralmente é obtida através do caminhar de um indivíduo no interior de um espaço religioso (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018).

É obvio que os elementos arquitetônicos geralmente são lidos em movimento. Isto também se aplica a espaços em que o movimento de todo o corpo é de alguma forma limitado, porque, mesmo assim, a leitura de estímulos está relacionada a uma mudança de perspectiva que, por sua vez, está conectada com movimentos da cabeça. (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018, p. 4)

Para desenvolver um método de pesquisa apropriado, a equipe utilizou inicialmente um rastreador ocular estático do tipo mais simples, para não haver erros no estágio da interpretação eficiente.

O tempo de teste máximo foi determinado, para que dados possam ser obtidos de forma mais precisa (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018)

Todo o experimento foi realizado na Faculdade de Arquitetura da Universidade de Ciência e Tecnologia de Wroclaw, em parceria com o ArcHist Scientific Club, do Departamento de História da Arquitetura, Arte e Tecnologia. Os alunos pesquisadores, liderados por Piotr Chmielewski, pediam aos transeuntes para participar do experimento (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018).

5.2.1 O experimento parte 1

Os voluntários eram conduzidos até o interior de algumas igrejas góticas, previamente selecionadas pela equipe, de olhos vendados. Eram conduzidos até o final da nave, de modo que se posicionassem de frente para o presbitério. Após isso, os alunos pediram para o grupo retirar as vendas e olhar para o interior monumental de cada igreja (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018). A primeira reação destes foi registrada e analisada para determinar o momento que os observadores moviam as cabeças. Foi um total de 72 voluntários analisando e expe

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renciando 6 catedrais diferentes. A análise demonstrou a Fikus, Rusnak e Szewezyk (2018) que a maioria dos voluntários tiveram uma variação de 0 a 8,6s desde o momento em que retiravam as vendas até moverem as cabeças em direção ao alto.

5.2.2 O experimento parte 2

Como continuação dos estudos, a Catedral de Reims foi modelada em um software digital e 5 propostas de modificações em seu interior foram feitas (Figura 10). “A visualização de ilustrações deve ser um processo livre de preconceitos decorrentes de educação especializada, portanto seus participantes não poderiam ser arquitetos, historiadores de arte ou restauradores”, afirmou Fikus, Rusnak e Szewezyk (2018, p. 5). Durante o tal experimento, nenhum dos participantes pôde comparar as ilustrações, pois todos os dias eram exigidas um conjunto de 10 ilustrações aleatórias, feitas pelo programa Experiment Center SMI.

Figura 10 Simulações no interior da Catedral de Notre Dame de Reims

Fonte: FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018, p. 6

Foram realizadas um total de 142 gravações, porém apenas 125 foram aproveitadas para os resultados, devido a:

Problemas na calibração; Visão defeituosa; Excesso de maquiagem; Revestimento antirreflexo muito forte dos óculos; Pálpebras fortemente caídas;

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Devido à aleatoriedade do processo, a distribui ção de participantes que visualizaram cada imagem foi desequilibrada. Sendo assim, a distribuição ficou:

Imagem A: 23 participantes;

Imagem B: 23 participantes;

Imagem C: 31 participantes; Imagem D: 26 participantes; Imagem E: 22 participantes;

Os dados coletados foram analisados no progra ma BeGazeSMI.

5.2.3 Resultados

A leitura do espaço arquitetônico modelado ocorre em 4 planos: piso, paredes laterais e abóboda. Os resultados das primeiras análises mostraram, de acordo com as expectativas dos pesquisadores, que o piso que não havia detalhes rítmicos não seria um lugar voluntariamente visto (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018). Em uma média de 8s, o tempo gasto pelos participantes analisando o piso foi de 2 a 4%. O interesse maior dos participantes se concentrou na profundidade do ambiente, pois os movimentos do globo ocular dos observadores estavam familiarizados com ela (FIKUS; RUSNAK;

SZEWEZYK, 2018). O mapa de AOI (Figura 09) demonstrou o próximo ponto de fixação estava nos pilares e na abóboda, que também resgatavam essa sensação de profundidade (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018).

Para comprovar o grau de interesse em ler a profundidade do espaço, três mapas que mostravam cronologicamente o método de familiarização com cada participante foram feitos. O primeiro mostrou sequências de movimentos para a familiarização com a abóboda; o segundo se concentrava nas zonas dos pilares e o terceiro estava em ambos os lados da nave (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018).

Uma surpresa encontrada pelos pesquisadores no modelo E da Figura 07 é o menor interesse pela profundidade da igreja. Os autores contam que “muito provavelmente, a partir de um certo tempo, o alongamento da perspectiva cresça devido ao seu tamanho e concentração de estímulos. Uma perspectiva curta forte torna difícil destacar componentes individuais da composição.” (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018, p. 10).

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Figura 11 Mapa de AOI

Fonte: FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018, p. 7

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Assim como o aumento das naves nas catedrais francesas, a pesquisa visual sobre seus arranjos também cresceu e, assim como o alongamento da nave, houve um maior interesse pelo seu comprimento (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018). Porém, o aumento do interesse não segue o aumento da distância entre o presbitério e o observador (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018). Durante o alongamento, os participantes moviam mais seus olhos entre ambos os lados (esquerdo/direito) do que no eixo da igreja (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018).

Por fim, encerram seu estudo afirmando que os pesquisadores de história da arte devem usar novas ferramentas neuronais em suas pesquisas, incluindo rastreadores oculares (FIKUS; RUSNAK; SZEWEZYK, 2018).

Assim como o último estudo mencionado, este trabalho foca no desenvolvimento de simulações a partir do estudo de um espaço religioso. Fonte de diversos simbolismos e história, os templos católicos são carregados de significados e, consequentemente, emoções e memórias. Entretanto, é importante explanar a história das igrejas católicas e como ela é capaz de influenciar na percepção dos usuários.

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Capítulo 6 - A arquitetura religiosa Capítulo 6 - A arquitetura religiosa

Ao mencionar a expressão “igreja católica”, o imaginário popular vagueia para as épocas mais esplendorosas e luxuosas da história, como as cruzadas e as grandes catedrais. Porém, assim como todo grande império, o início dessa narrativa acontece de forma humilde. Neste capítulo, abordaremos os acontecimentos da história do catolicismo, deste a época das catacumbas aos dias atuais.

6.1 O início

Este trabalho parte da premissa que o início da história bíblica se deu com Abraão, um habitante da Mesopotâmia, e culminou na encarnação do Messias, um símbolo da Aliança entre Deus e a humanidade (BRANDÃO, 2011). Por isso, desde altares erguidos pelos patriarcas até a elaboração da tenda que abrigou a Arca da Aliança, encontramos elementos como símbolos, objetos e gestos que perpetuam até hoje na história católica (BRANDÃO, 2011).

Pelos textos, podemos ver que os Patriarcas tinham necessidade de manter aberto o canal de comunicação com Deus, que se manifestava em seus sonhos. Por isso, levantavam altares e marcos em lugares especiais, para poderem continuar encontrando-se com Deus. (MACHADO, 2007, p. 14)

Com o rei Davi, ocorreu o translado da Arca para a “Terra Prometida”, Jerusalém, e a constituição dos primeiros ministérios litúrgicos (BRANDÃO, 2011). O monarca tem a ideia de construir um templo que serviria como morada de Deus, porém Salomão foi aquele que ergueu o chamado Templo de Jerusalém (MACHADO, 2007). Entretanto, a construção do templo foi marcada por objetivos políticos, simbolizando uma forma de fortalecer a política centralizadora de Salomão (MACHADO, 2007). Mesmo com estes fins políticos, a construção servia como ponto de coesão e símbolo da luta do povo e, nesse contexto, Jesus nasce e é criado (MACHADO, 2007).

Com a morte e ressurreição do Salvador, a

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comunidade cristã percebeu que o verdadeiro templo de Deus consistia em uma assembleia reunida, então passaram a encontrar se nas próprias casas (MACHADO, 2007). “Após Pentecostes², o número de crentes aumentava rapidamente, primeiramente os judeus- cristãos, depois os judeus da diáspora, os helenistas e os cristãos advindos do paganismo”, afirma Brandão (2011, p. 19). Os fiéis se reuniam em sinagogas, casas dos fiéis e nas catacumbas, onde repartiam o pão, oravam e proclamavam a Palavra (BRANDÃO, 2011).

6.1.1 Cenáculo

Segundo o que conta a tradição, o cenáculo (Figura 12) teria sido o local onde Jesus celebrou a última ceia com seus discípulos (BRANDÃO, 2011). Um local que consiste basicamente em um grande salão de festas, como retratado nas as Sagradas Escrituras. ²Pentecostes simboliza a terceira maior festa do cristianismo, onde é celebrado a vinda do Espírito Santo sobre cerca de 120 pessoas: os Apóstolos, Maria, outras mulheres e os discípulos (MEUSER, 2020).

Figura 12 O Cenáculo de Jerusalém

6.1.2 Catacumbas

As catacumbas (Figura 13) são antigos cemitérios subterrâneos e eram usados como locais de celebração da Eucaristia, durante o segundo e quinto século da Era Cristã, devido à perseguição do Império Romano (BRANDÃO, 2011).

Fonte: Unitur (2000 2022)
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Figura 13 Catacumba de Priscila, em Roma

6.2 O Espaço sagrado após o século IV

No período de 300 a 800 d.C., o centro do mundo era Roma e, naturalmente, os primeiros missionários do cristianismo, como S. Paulo e S. Pedro, chegaram até a cidade em suas viagens (MANSELL, 1980). O número de convertidos ao cristianismo crescia exponencialmente e foi colocado em pé de igualdade com outras religiões do império pelo Édito de Milão³ e proclamado a religião oficial do império até 326 d.C (MANSELL, 1980).

Foi concedido aos cristãos exprimirem-se com plena liberdade, tornando a arte um canal privilegiado de manifestação da fé.

6.1.3 Igreja paleo cristã

Esta época, por sua vez, contou com uma organização mais estruturada e bem fundamentada da igreja em função da liturgia (BRANDÃO, 2011). A sede do bispo era posicionada ao fundo, na abside; o ambão junto ao coro dos ministros; o altar no centro e a assembleia ao redor (BRANDÃO, 2011) Na frente da porta principal estava a fonte batismal, como sinal de purificação (BRANDÃO, 2011).

Por outro, começaram a despontar majestosas basílicas, nas quais os cânones arquitetônicos do antigo paganismo eram assumidos e reajustados às exigências do novo culto. (carta do Papa João Paulo II aos artistas, 1999 apud BRANDÃO, 2011, p. 23).

As primeiras igrejas edificadas para os cristãos,

³Com o Édito de Milão, de 313 d.C., o imperador Constantino, que havia se convertido ao cristianismo, reconheceu a liberdade do culto da religião, até a mesma se tornar a religião oficial do império, após o final do século IV (BRANDÃO, 2011).

Fonte: Embarque na Viagem (2020)
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sendo denominadas de basílicas, não foram construídas especialmente para eles, pois elas já existiam (MACHADO, 2007). Na região da Pérsia, a sala de audiência do rei chamava se basileus (MACHADO, 2007) e, em Roma, as basílicas eram utilizadas para reuniões cívicas, tribunais de justiça e negociações entre mercadores e banqueiros (MACHADO, 2007).

Inicialmente, poucas adaptações foram feitas, como a abside ajustou se à cátedra do bispo e o banco dos presbíteros; a mesa da Palavra foi posicionada no início da nave e a mesa da Eucaristia variava de posição de acordo com a região (MACHADO, 2007).

As primeiras basílicas edificadas para os cristãos bebiam da fonte de elementos da arquitetura de casas romanas e das basílicas civis, mencionadas anteriormente. Da casa romana, utilizaram o atrium, precedido sempre de um pátio ou pórtico; e da basílica civil adotavam a forma retangular e o telhado alto, além das vastas dimensões (BRANDÃO, 2011).

“Mas o que diferenciava da basílica civil a Basílica Cristã é que esta é recortada por naves paralelas,

constituídas mediante pórticos interiores, enquanto aquela é uma simples sala retangular” (BRANDÃO, 2011, p. 23). As Basílicas Cristãs eram tripartidas em vestíbulo, nave e abside (Figura 14).

Vestíbulo (ou nártex) pórtico exterior destinado a separar a igreja da agitação das ruas de Roma (MACHADO, 2007). Nave Do pórtico, três entradas permitiam acesso ao interior da edificação: a porta do meio era destinada aos clérigos; as portas laterais eram para o povo, sendo que pelo lado direito passavam os homens e, pelo esquerdo, as mulheres (MACHADO, 2007). Abside também chamado de Santuário, é o lugar sagrado onde realiza se o divino sacrifício (MACHADO, 2007). Segundo Machado (2007, p. 24), “os assentos dos sacerdotes ficavam em redor da abside, e ao fundo o trono do bispo, que era no degrau mais elevado. Sentado neste trono, o bispo que presidia via por cima do altar e tinha plana visão da assembleia.”

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Figura 14 Santo Apolinário em Classe, Ravena, Itália Exemplo de Basílica Cristã em planta

Fonte: MANSELL, 1980, p. 36

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6.3 As igrejas românicas e góticas

Assim como a própria história, a arquitetura religiosa se molda, transforma e adapta conforme as exigências litúrgicas e teológicas. “No período iniciado no século V e conhecido como Idade Média, a vida social e econômica deslocou-se da cidade para o campo”, conta Proença (2009, p. 62).

No século VII, a cultura greco romana estava ape nas presente nas escolas voltadas para a formação do clero (PROENÇA, 2009). Com a coroação de Magno como imperador do Ocidente, um intenso desenvolvimento cultural ascendeu e o poder real e papal se fundiram, tornando Carlos o protetor da cristandade (PROENÇA, 2009).

Com a morte de Magno, as atividades intelectuais ficaram centralizadas nos mosteiros e atividades como arquitetura, pintura, escultura e ilustração se expandiram e especializaram (PROENÇA, 2009)

Além disso, a partir do século VIII, várias mudan ças ocorreram nas formas de culto e devoção (MACHADO, 2007). As orações privadas se multiplicaram, a comunhão sacramental foi reduzida e as práticas de adoração à Mãe de Deus, santos e Santíssima Trindade aumentaram no catolicismo.

Durante os séculos XI e XII, temos as igrejas românicas, cuja a estrutura bebia da fonte das fortalezas romanas, recebendo, inclusive, o nome de fortalezas de Deus (PROENÇA, 2009). Consistiam em templos com a utilização de abóbodas, pilares maciços, paredes mais espessas e poucas aberturas, como podemos ver na Figura 15.

Figura 15 Fachada da Basílica de Saint Sernin, em Toulouse, na França

Fonte: ALTMAN, 2013

A celebração da Palavra é feita em latim, então somente o clero participa e entende; a mesa da

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Palavra desaparece e é substituída por uma estante ou posicionada bem alta, onde é necessária uma escada para alcançá la (MACHADO, 2007). O sacerdote reza de costas para a assembleia, voltado para o altar, que agora está posicionado no fundo da abside; e a cadeira dos bispos e as cadeiras dos presbíteros passam para a lateral (MACHADO, 2007). Além disso, uma parede, chamada iconostasis (BRANDÃO, 2011), foi construída entre a nave o presbitério, afim de proteger os celebrantes do frio, pois passavam horas rezando no interior das igrejas (MACHADO, 2007). Podemos ver um exemplo ainda remanescente de tal estrutura na Igreja Ortodoxa Antioquina da Anunciação da Mãe de Deus, em São Paulo, ilustrado na Figura 16. Percebe se assim que eram tempos em que a religião era somente privilégio do clero, enquanto os fiéis se contentavam em admirar a beleza das igrejas, onde os adornos se transformaram em entretenimento para aqueles que não mais participavam da liturgia.

Figura 16 Vista interna da Igreja Ortodoxa Antioquina da Anunciação da Mãe de Deus/SP

A partir de 1300, a Europa passa por intensas mudanças políticas, econômicas, religiosas e sociais (MACHADO, 2007). Com uma economia fundamentada em comércio, a vida social deslocou se do campo para as cidades e uma nova classe social surgiu: a burguesia urbana (PROENÇA, 2009). A cidade tornou se novamente o local em que as pessoas trocavam informações e, consequentemente, o centro renovador de artes e conhecimento (PROENÇA, 2009).

Fonte: MENDES, 2014
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No começo do século XII, a arte românica ainda era presente no cenário das cidades, porém mudanças afloraram no espaço religioso dando lugar a uma profunda revolução na arquitetura, principalmente na arte de projetar (PROENÇA, 2009). Sendo chamada desdenhosamente de gótico pelos estudiosos no século XVI, esse novo estilo arquitetônico surgiu na França por volta de 1140, quando foi construída a abadia de Saint Denis (PROENÇA, 2009), como vemos na Figura 17.

A principal diferença a se destacar do estilo româ nico para o gótico é, à primeira vista, sua fachada: enquanto as igrejas românicas apresentam um único portal, a igreja gótica apresenta três, que conduzem, por sua vez, a três naves no interior do espaço religioso. Outro elemento sempre lembrado deste estilo são as rosáceas, presente em quase todas as igrejas erguidas entre os séculos XII e XIV (PROENÇA, 2009).

Figura 17 Fachada da Catedral de Saint Denis

Fonte: FIEDERER, 2000 2022

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Além disso, características deste período, as abóbodas de nervuras e os arcos ogivais, formam sua estrutura (PROENÇA, 2009). Por fim, o elemento estético mais lembrado neste estilo, quando se fala em o termo arquitetura gótica, são seus vitrais. Com a substituição das paredes sólidas e robustas do estilo românico, houve a combinação de pequenas áreas de parede com grandes áreas preenchidas por vidros coloridos, chamados vitrais (PROENÇA, 2009).

Uma das igrejas mais emblemáticas desde perío do é a Catedral de Notre Dame de Paris (Figura 18), que teve seu início no final do século XII (MANSELL, 1980), uma joia no coração da Ilha de la Cité. Com a construção ordenada pelo rei Louis VII, um dos líderes da Segunda Cruzada, Notre Dame nasceu como um símbolo não apenas religioso, mas como a crescente importância da cidade de Paris como centro econômico e social da França (STRUCK, 2019 apud OLIVEIRA; PINHEIRO, 2019).

6.4 Igrejas renascentistas e barrocas

Avançando um pouco no tempo, chegamos a 1420, em Florença, na Itália, onde um movimento novo tomava forma: o Renascimento. Embora a palavra renascimento não fosse empregada naquela época para definir o movimento cultural, podemos dizer que muitos intelectuais desse período expressaram um desejo de fazer renascer, reviver ou recuperar elementos da cultura greco-romana. (COTRIM, 2012, p. 207)

Figura 18 Fachada da Catedral Notre Dame de Paris Fonte: Casa Vogue, 2019
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O Renascimento não foi um simples retorno à Antiguidade, como podemos ver ainda o forte fundo religioso marcado nas obras deste período (COTRIM, 2012). Entretanto, ocorre uma renovação no tratamento de algumas questões por um viés mais humanista (COTRIM, 2012). Nessa concepção, o homem substitui Deus como medida de todas as coisas (MACHADO, 2007). Sendo assim, o ser humano se torna a medida universal, incluindo na arquitetura.

A igreja deste período é menos espiritualizada, com um equilíbrio marcado em linhas horizontais e verticais, além de fachadas mais “humanas” (MACHADO, 2007).

Anos mais tarde, no século XVII, em contraposição ao estilo humanista, a Igreja Católica reagiu com um novo movimento, surgido na Itália: o Barroco. Consistiu em um movimento político e internacional, mas que não se deu de forma homogênea ao redor do mundo (reVisão, 2019). Grandes transformações estavam acontecendo nessa época, como as Grandes Navegações e o Movimento Protestante (reVisão, 2019). Sendo assim, a Igreja Católica viu seu poder, em um curto espaço de tempo, ser desafiado.

Como forma de resolver essa questão, a Alta Cúpula da Igreja Católica, à mando do próprio Papa Paulo III, convocou o Concílio de Trento, em 1546, que durou até 1563. (reVisão, 2019). Foi a partir desde momento que nasceu o movimento da Contrarreforma, e o Barroco foi a estética escolhida para a "propaganda" deste período (reVisão, 2019).

6.4.1 O Concílio de Trento

O Concílio definiu que o altar vai para o fundo e o presbitério ocupará toda a abside (BRANDÃO, 2011).

A iconostasis é eliminada e os bancos são direcionados para o presbitério (BRANDÃO, 2011).

Além disso, há a presença de altares laterais com imagens de santos e o coro é posicionado no mezanino da igreja. Nesse momento da história, havia uma supervalorização de elementos devocionais e estéticos, seguindo o gosto do estilo Barroco (BRANDÃO, 2011).

6.5 O Concílio do Vaticano II

Avançando mais alguns anos da história, em direção a janeiro de 1959. Nesse período, o papa regente João XXIII anunciou a decisão de convocar um

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novo Concílio (COUTINHO, 2022). Mediante um mundo que estava em plena industrialização e movimentos anticlerical e ateísta em ascensão, o Pontífice enxergou a necessidade de um diálogo maior entre a religião e o mundo moderno (MACHADO, 2007). Aos arquitetos, ele disse: “Introduzam nas igrejas a sensibilidade, a serenidade e o calor de vossas casas” (MACHADO, 2007, p. 25). Como no início dessa história, retornou se o discurso de “Casa da Igreja” ou domus ecclesiae (MACHADO, 2007). Após o anúncio, deu se início a fase antepreparatória (1959 1960) do Concílio, em que o Papa fez o convite para indicar os principais assuntos e problemas que o Concílio deveria tratar (COUTINHO, 2022). O apelo foi atendido e cerca de 2000 pareceres chegaram ao Vaticano, vindo de todas as partes do mundo (COUTINHO, 2022).

6.5.1 O evento

O Concílio aconteceu, de fato, em 11 de Outubro de 1962, uma data que estaria marcada na história do catolicismo como um dia de mudanças dentro do espaço da igreja. Compareceram 2800 bispos do mundo inteiro, juntamente com outros observadores

ortodoxos e protestantes (BRANDÃO, 2011). Composto de quatro sessões, entre 11 de Outubro de 1962 a 8 de Dezembro de 1965, foram examinados e revistos todos os aspectos da vida da Igreja. O Papa João XXIII faleceu entre a 1ª e 2ª sessões do Concílio, porém esse fato não impediu a realização do evento (COUTINHO, 2022). Em seu lugar, assumiu o arcebispo de Milão, que tomou o nome de Paulo VI e deu sequência ao evento (COUTINHO, 2022). O documento central desta reunião importante foi o decreto sobre a Igreja, a Constituição Lumen Gentium, o qual colocou como centro, novamente, o povo de Deus, valorizando a participação dos leigos na vida da Igreja, uma vez mais (BRANDÃO, 2011). Outro documento produzido foi o Gaudium et Spes, a Constituição Pastoral da Igreja no Mundo Moderno (BRANDÃO, 2011). Ambos os documentos “foram atos grandiosos de reorientação teológica, que redesenharam os parâmetros da teologia católica”, como diz Brandão (2011, p. 29).

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Figura 19 Papa Paulo VI e Enrico Dante durante o Concílio Vaticano II

celebração da palavra (BRANDÃO, 2011). Um simples ato, porém que proporcionou a maior participação dos leigos nas celebrações.

Tomando como base o estudo dos templos católicos e sua evolução ao longo da história, é possível agora adentrarmos, no capítulo seguinte, no estudo do local escolhido para estudo: a Catedral Metropolitana de Vitória.

Entretanto, o decreto mais memorável deste dia foi o Sacrosanctum Concilium, no qual uma série de princípios foram postos em pauta, como a introdução da língua vernácula isto é, do próprio país na

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Fonte: WOLLEH apud COUTINHO, 2022

Capítulo

Capítulo

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Capítulo 7 - Objeto de estudo prático Capítulo 7 - Objeto de estudo prático

A Catedral Metropolitana de Vitória é uma das construções mais marcantes da capital, sofrendo grande influência naqueles que a frequentam e se encantam com sua beleza. Inspirada na estética do neogótico, a igreja foi escolhida como objeto de estudo deste trabalho e será apresentada neste capítulo.

7.1 Introdução

A Villa da Victória (Figura 20) nasceu honrando seu nome, por conta uma batalha vencida pelos portugueses contra os índios Goitacazes, em 1551 (IBGE, 2017). É uma das mais antigas povoações brasileiras e, além disso, juntamente com a Villa Velha do Espírito Santo, atual município de Vila Velha, destacou se no início do processo de colonização portuguesa (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 9). Em uma localização privilegiada, no platô de uma encosta que acabava no mar, a vila conheceu sua ascensão com a chegada da Ordem Jesuíta, que desembarcou nessas terras em 1551 e, logo depois,

iniciou a construção da Matriz de Nossa Senhora da Vitória. Figura 20 Gravura com representação da baía em 1624

Fonte: (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 9)

Como duas edificações fortemente associadas ao início da ocupação da cidade, o Palácio Anchieta antigo conjunto da Igreja de São Tiago e Colégio de São Maurício mais a Catedral Metropolitana de

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da no mesmo local da antiga matriz. memória o período colonial (FILHO; S; COSTA, 2010).

7.1.1 A influência religiosa

O livro A Catedral Metropolitana de Vitória diz que “o poder religioso e a força da catequização jesuítica foram os principais responsáveis pela manutenção da ‘ordem pública’ e pela constituição e de um espaço urbano minimamente ‘organizado’” (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 10). Os jesuítas tiveram um papel importantíssimo na alfabetização e estruturação de uma espécie de tribunal da época, que foi batizado de Confraria da Caridade (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010), sendo uma das primeiras irmandades brasileiras (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

A ilha de Duarte de Lemos, fidalgo amigo de Vas co Fernandes Coutinho, possuía uma topografia que dificultava a ocupação e definia os espaços nobres, que eram ocupados pelo poder religioso (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Há de se considerar que até o início da República, religião e Estados eram dois aspectos que estavam entrelaçados e se confundiam. Fato este que pode ser comprovado

visto que as igrejas matrizes também funcionavam como cartórios de registro civil e as irmandades serem responsáveis por enterros e assistência social (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

Após os jesuítas, vieram os franciscanos e os carmelitas, que se instalaram no estado. Isto significava que três ordens religiosas participavam da vida social da vila, promovendo cursos, ajudando projetos filantropos e cuidando de enfermos (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Com isso, três complexos arquitetônicos religiosos se distribuíram no sítio histórico da cidade, respeitando seus respectivos espaços. A “Planta da Villa da Victoria” (Figura 21), desenhada por José Antônio Caldas, em 1767, demonstra isso.

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Figura 21 Planta da Villa da Victoria

Fonte: FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 11

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7.1.2 Transformações

Avançando um pouco além na história, nos governos de Muniz Freire (1892 1896 e 1900 1904), Jerônimo Monteiro (1908 1912) e Florentino Avidos (1924 1928); diversos avanços permearam a cidade. Aterros sobre o mar e os manguezais; aparelhamento do porto e alargamento das vias eram vistos em toda parte da Villa de Victoria (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Por volta desta época, também, a antiga Igreja Matriz foi demolida, em 1918, e cedeu espaço para a atual Catedral Metropolitana de Vitória, inspirada na beleza da catedral gótica alemã de Colônia (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

7.2 História da catedral

Se há alguma fácil referência arquitetônica na Cidade Alta, esta, sem dúvida, é a Catedral Metropolitana. Sem querer desmerecer os demais monumentos que compõem a cena no Centro Histórico de Vitória, ela é uma das atrações principais. Com sua história de certa forma iniciada em 1551, no corpo de outra igreja, a Catedral chama a atenção por sua imponência e beleza inspiradas no estilo gótico. Levou cinco décadas para ser

erguida, moldurada por vitrais majestosos que caracterizam a maior e mais recente edificação católica do Centro Histórico da capital. (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 24)

Antes da imponente igreja que coroa o Centro Histórico de Vitória atualmente, existia outra construção em seu lugar. A Matriz de Nossa Senhora da Vitória, por mais significativa que tenha sido sua presença, possui poucos registros guardados pelo tempo (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

Paralelamente a construção da Villa da Victoria, a Capela de Nossa Senhora da Vitória foi construída, segundos alguns historiadores, entre 1550 e 1552 (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). A Capela localizava se em um platô mais plano entre o mar e o maciço central (Figura 22), com um largo à sua frente, um cenário comum nas igrejas coloniais (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Formava, juntamente a ela, um conjunto com o Colégio dos Jesuítas/Igreja de São Tiago e a Igreja de Nossa Senhora da Misericórdia (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

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Figura 22 Baía de Vitória

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Fonte: FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 27

A história nos diz que o nome Nossa Senhora da Vitória foi escolhido devido ao triunfo dos portugueses sobre os indígenas durante a ocupação da ilha (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Sendo assim, consagrou se a capela e a cidade à Santa Portuguesa da Vitória, tornando a então, a padroeira da Vila. 7.2.1 O bispado e as mudanças

Dois bispos anteriores puderam testemunhar a Capela Nossa Senhora da Vitória, entretanto o terceiro bispo do Espírito Santo, D. Benedito Paula Alves de Souza (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

O sacerdote não se identificou com a simplicidade da igreja e, no dia 6 de julho de 1918, foi noticiada sua demolição (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). A obra também refletia o desejo governamental de modernização da capital.

Com a empreitada, muitos objetos antigos da antiga matriz desapareceram, incluindo a imagem da padroeira Nossa Senhora da Vitória (Figura 23)

Figura 23 Imagem de Nossa Senhora da Vitória

Fonte: FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 34

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começou a ser erguida (Figura 24) em e paradas e retomadas, a obra se o início de 1970, quando foi declarada concluída pelo D. João Batista da Motta e Albuquerque (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

A missão da construção ficou, inicialmente, a car go do engenheiro Henrique de Novaes, em parceria com o padre José Ludwin e o paisagista Paulo Motta (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

No dia 12 de Setembro de 1937 foram inaugu radas as obras internas e o coro da igreja, com a presença de João Punaro Bley, que doou os vitrais da porta para vento (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). “Cerca de dois anos depois, após obras de nivelamento e algumas melhorias, o antigo Largo da Matriz passou a denominar se Praça Domingos Martins. A lei municipal nº 235, de dezembro de 1951, alterou o para Praça Dom Luiz Scortegagna, em homenagem ao grande incentivador das obras da Catedral” (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 36), que atualmente encontra se sepultado na cripta da igreja, juntamente com outros dois bispos (Figura 25).

Figura 24 Fachada da Catedral ainda em construção

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Fonte: (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010, p. 35)

gura 25 Cripta da Catedral

7.2.3 Restauro

A pedra fundamental da torre central, de acordo com o projeto original, foi lançada em 29 de Setembro de 1945, porém, após o paisagista Paulo Motta ter abandonado as obras, o construtor André Carloni assumiu o projeto e o alterou (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Sendo assim, o novo projeto contava com duas torres laterais, inspirado na Catedral alemã de Colônia (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

Adiante, serão apresentadas fotografias do interior da igreja como se encontra atualmente, porém nem sempre foi daquela forma. Em 2011, o templo foi fechado para uma obra de restauro de grandes proporções, principalmente para a renovação do telhado e das calhas (Governo do Espírito Santo, 2015), conforme pode ser visto na Figura 26. “O trabalho previu a restauração total do telhado da igreja, que estava bastante danificado, com infiltrações generalizadas” (Assessoria de Imprensa Vale, 2017) e as telhas e calhas foram substituídas, pois estavam tão danificadas a ponto de permitirem a entrada de água em dias de chuva intensos (Assessoria de Imprensa Vale, 2017). Esse restauro foi um grande passo, pois foi o primeiro desde a intervenção de menor porte, realizada na década de 70 (Assessoria de Imprensa Vale, 2017).

Fonte: Autora (2022)
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Figura 26 Antes e depois do restauro do telhado

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Fonte: Autora (2022) e Augural Arquitetura & Restauro (2010)

Em 2013, novos vitrais para o altar foram confeccionados e posicionados (Figura 27), assim como a limpeza e sistema de automatização do badalar dos sinos.

Nessa mesma imagem, podemos ver a próxima fase da empreitada, que foi realizada em 2014. Realizou se a grande obra de restauro, que teve como foco o resgaste histórico dos tons originais do edifício, além de novas instalações elétricas e restaurações das portas (Governo do Espírito Santo, 2015). A cor original das paredes foi resgatada por meio de prospecções estratigráficas (processo de raspagem das diversas camadas de tinta) e as cruzes, que marcam a Via Sacra, foram novamente folheadas a outro, resgatando a sua cor original (TULLIUS, 2017). Vale ressaltar que esta obra não apenas foi com o intuito de recuperar a estrutura e a arquitetura do edifício, mas também obedecer às recomendações feitas no Concílio Vaticano II: [...] o trabalho desenvolvido na Catedral de Vitória atendeu às exigências da adequação litúrgica do edifício sagrado, em vista do espírito e das normas da reforma litúrgica suscitada e promovida pelo Concílio Vaticano II. Todos os ele-

mentos da parte interna da Igreja e nas nas fachadas foram recuperados, valorizados e permanecem como conjunto iconográfico, cujo simbolismo convidam o público a admirar e a refletir sobre os mistérios da fé. (TULLIUS, 2017)

Sendo assim, Tullius (2017) afirma que a "arqui tetura da Catedral restaurada não é só um elemento que enche os olhos de beleza, mas que, lidos à luz da fé, transformam num verdadeiro itinerário espiritual [...]”. Retomando o que foi discutido em capítulos anteriores, o restauro de um espaço sagrado ultrapassa as fronteiras de mera recuperação de matéria e se estende até o fortalecimento da fé de toda uma comunidade.

7.3 A arquitetura

Segundo Filho, Andrade, Costa e Reis (2010, p. 54), “a igreja possui a planta em forma de cruz latina (Figura 28), voltada para o oriente, onde se encontra Jerusalém, a Terra Santa, e uma nave ampla com cinco acessos: um principal e quatro laterais”.

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Figura 27 Antes e depois do restauro do altar

Fonte: Autora (2022) e Espírito Santo (2009)

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Figura 28 Planta da Catedral

Fonte: Autora (2022) e Augural Arquitetura e Restauro (2010)

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4m 8m 16m

Figura 29 Fachada da Catedral Metropolitana de Vitória

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Fonte: Autora (2022)

Sua arquitetura é, evidentemente, inspirada no estilo gótico (Figura 29), adotado por várias construções religiosas brasileiras, especialmente durante a primeira república (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

Sua fundação é em pedra, com a estrutura principal da edificação em concreto armado nos setores portantes (com colunas altas e finas, nas abóbodas internas de arcos cruzados), à maneira das catedrais góticas (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Apenas as torres possuem vinte e oito pilares de concreto armado e as paredes são preenchidas por tijolos cerâmicos maciços (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Ao lado, uma imagem (Figura 30) de dentro do telhado, acima das abódodas da Catedral, mostrando a estrutura de concreto e as paredes de tijolos cerâmicos.

Os vitrais são, sem dúvidas, os elementos mais notados e admirados da construção. Os originais são de autoria de Cesar Alexandre e seu filho, Gastão Formenti. Essas peças artísticas foram executadas no Atelier Formenti A Arte do Vitral, criado no início do século XX (LIMA, 2009).

Figura 30 Estrutura da Catedral em concreto armado e tijolos cerâmicos

Fonte: Autora (2022)

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Figura 31 Planta de localização dos vitrais

Fonte: Autora (2022)

4

A imagem da planta baixa de localização dos vitrais foi retirada do livro A Catedral Metropolitana de Vitória, de Filho; Andrade; Reis e Costa (2010). A lista com os nomes dos vitrais foi feita pela autora (2022), pois a mesma que foi apresentada no livro estava desatualizada

66
4

Figura 32 Mosaico com fotos dos vitrais

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Fonte: Autora (2022)

7.3.1 O interior da igreja

Ao passar pela porta, abaixo do coro, encontramos o espaço de transição conhecido como nártex (Figura 33), uma área originalmente criada nas igrejas e basílicas paleocristãs, que serve como um local intermediário entre exterior e interior (LEITE, 2012).

Figura 33 Nártex da Catedral Metropolitana de Vitória

Uma curiosidade sobre esse espaço é que seu propósito original se destinava a abrigar os penitentes, catecúmenos, pecadores e loucos privados da Eucaristia (LEITE, 2012), porém, atualmente, é um espaço que permite ao usuário entrar em um estado reflexivo e de constrição para a missa. À esquerda, temos a imagem do Sagrado Cora ção de Jesus (Figura 34) e ao lado se encontrava o relicário, que agora se abriga na cripta, que contém um osso do antebraço da religiosa Cleusa Carolina R. Coelho (Figura 35), uma missionária agostiniana (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

Fonte: Autora (2022)

Em seguida, temos uma nave única, com uma cobertura formada por abóbodas (Figura 36) sobre arcos ogivais ou nervuras, todas em concreto armado, iluminada pelos vitrais (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). O altar mor era separado por uma cerca baixa, que ficava onde hoje se encontram as escadas para o altar e havia uma cerca que separava o transepto do resto da nave (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010). Nesse espaço, ficavam as cadeiras de pessoas influentes, que eram separados da população (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010).

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Figura 34 Imagem do Sagrado Coração de Jesus

Figura 35 Relicário

Fonte: Autora (2022)
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Fonte: Autora (2022)

Figura 36 Nave da Catedral (vista do coro da igreja)

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Fonte: Autora (2022)

Por conta de sua importância histórica e cultural, a igreja foi tombada pelo Conselho Estadual de Cultura, em maio de 1984 (FILHO; ANDRADE; REIS; COSTA, 2010) e atualmente é um dos marcos do Centro Histórico de Vitória.

7.4 A percepção dos usuários

Como qualquer outra obra de arte, a Catedral Metropolitana desperta reações emocionais nas pessoas, mesmo naquelas que não são religiosas. Afinal, seus adornos são destinados aos olhos de todos e suas paredes guardam as lembranças de quem a contemplou.

Como uma forma de coleta de informações a respeito da percepção afetiva e sensorial da igreja, foi realizada uma pesquisa de campo, dividida em duas etapas, a saber: 7.4.1 Pesquisa de campo etapa 1

A primeira fase destinava se a uma coleta de da dos quantitativa, realizando um questionário on line, através da plataforma Google Forms, onde 70 voluntários, entre 18 a 74 anos, responderam perguntas relacionadas a suas lembranças e a suas percepções afetivas.

As fases questionário foram: 1. 2. 3. 4.

Identificação: o voluntário foi informado da política de privacidade, garantindo o anonimato de quem respondesse o questionário, e forneceu dados pessoais, como nome completo; local de residência; idade e designação religiosa. Relação com a Catedral: nessa fase, o voluntário informou qual a finalidade que visita o local e a frequência de uso.

Percepção: a partir daqui, o indivíduo era questionado sobre suas sensações no espaço; o que agrada ou desagrada; e elementos que reconhece como importante.

5.

Emoções: seguindo, o entrevistado, primeiramente, demonstra a emoção que experencia ao adentrar a igreja e, adiante, observa duas fotografias: uma da nave e outra do vitral de Santa Cecília. A tarefa requisita é descrever o que sente ao olhar as duas imagens. Memórias: nessa última etapa, o indivíduo é requisitado que descreva alguma lembrança que sente no interior da igreja.

A realização do questionário foi de suma importância para um entendimento geral da percepção da população capixaba a resp it d igreja.

71

7.4.2

Pesquisa de campo etapa 2

A segunda fase da pesquisa seguiu uma linha mais refinada e intimista. A proposta era buscar percepções através das memórias evocadas sobre a Catedral e possíveis dados da história do ambiente estudado que, porventura, existissem. A maneira ideal para conseguir evocar essas memórias foi através de entrevistas.

Optou se pelo formato de entrevistas abertas e semiestruturadas, com perguntas que pudessem estimular o despertar de lembranças de curto e longo prazo com relação a Catedral de Vitória. Izquierdo (1989) afirma que as memórias são consolidadas durante e depois de uma experiência, podendo ter novos valores atribuídos a elas durante o processo de evocação (recall). Sendo assim, com o processo de entrevista foi possível, também, a identificação de reações e respostas emocionais dos voluntários. A pesquisa se realizou com 4 voluntários que possuem alguma relação com a igreja estudada:

Uma leiga;

Um segurança da Catedral; Uma ex secretária da igreja; Uma ministra da Eucaristia e membro do conselho clerical;

As entrevistas duraram de 5 a 20 minutos, sendo três realizadas de forma presencial e uma realizada por telefone, por falta de oportunidade de encontro.

As entrevistas foram gravadas, com autorização prévia concedida pelos voluntários.

Foram relatados emoções predominantes, lembranças, aspectos que os agradavam e que os despertavam afeição. Mesmo com a presença de perguntas norteadoras, foi se estimulado a livre expressão dos voluntários, seguindo o método utilizado por Frías e Jofré (2020). Os autores bebem da metodologia etnográfica, onde há uma “interação situada no tempo e no espaço em que o pesquisador solicita informações de outro sujeito, o informante” (FRÍAS; JOFRÉ, 2020, p. 7). Além disso, para corroborar na justificativa dessa escolha de metodologia, temos Boni e Quaresma (2005, p. 6), que contam que as entrevistas permitem que “o informante retome sua vida de forma retrospectiva”.

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Suas percepções foram determinantes para estabelecer que as pessoas enxergam o templo de Nossa Senhora das Vitórias muito mais do que apenas um patrimônio ou uma construção imponente. Elas a veem como um espaço de acolhimento e calmaria.

7.4. Resultados

Uma obra que foi descrita como sendo “majes tosa” (M.O., mulher, 50 54 anos), também pode ser “linda, pacífica” (A.J., mulher, 18 24 anos)? Um lugar que combina, harmoniosamente, sentimentos de medo pela sua majestade, mas fornece “paz espiritual” (M.D., mulher, 65 69 anos).

O resultado da pesquisa quantitativa mostrou que a Catedral desperta uma série de sentimentos em quem a adentra, desde medo e ansiedade, a calmaria e paz de espírito. O resultado do questionário foi sintetizado em um relatório gráfico (Figura, 37), que reuniu as principais informações pessoais dos voluntários, já listadas anteriormente; e os principais elementos lembrados pelos mesmos como importantes para a arquitetura da Igreja.

As entrevistas, por sua vez, foram o coração da metodologia de pesquisa. Apresentaram uma dicotomia inerente à construção, onde o mesmo espaço pode tirar o fôlego e ainda, fornecer tranquilidade.

Em grande parte, os voluntários descreveram o lugar como um refúgio para aqueles que buscam acolhimento. “É um lugar que ele te acolhe, é como se fosse um colo.” (L.C., mulher, 49 anos). Essa sensação demonstrou se ser causada, primeiramente, pelo significado que a igreja carrega. Quando indagados sobre qual a parte favorita do lugar, M.M (mulher, 88 anos), respondeu que “em primeiro lugar, o Santíssimo. Pois Ele é o Rei de tudo. Aquele que pode nos salvar”. A presença divina no espaço é inevitável. “Aqui, na verdade, é um lugar espiritual. É um lugar onde as pessoas vêm buscar a paz, a alegria, as bençãos do Senhor”, relata H. S. (homem, 56 anos).

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Figura 37 Relatório gráfico do resultado do questionário

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Além disso, as memórias de M. M. revelaram que a fé enraizada no espaço a ajudaram em um período difícill. “Isso marcou muito minha vida e me ajudou muito, pois foi num período que eu fiquei viúva”, relata M. M (mulher, 88 anos).

Segundamente, a sensação de acolhimento e paz são evidenciadas pelos elementos arquitetônicos do lugar. M.D., (mulher, 67 anos) conta que esse sentimento, em sua perspectiva, está ligado aos “vitrais e aquela capela do Santíssimo. É uma capela simples, aconchegante, e ela tem uma espiritualidade muito grande. A mistagogia daquela capela, do lado daquele altar, é como se fosse uma continuidade.” De fato, os vitrais foram fortemente relatados tanto nas entrevistas, quanto nos questionários. “Os vitrais eles chamam muito a atenção, pois eles têm toda a história da salvação. Só os vitrais já dão uma catequese muito grande.” Além disso, a magnitude da igreja cria uma dicotomia de sentir um acolhimento diante de um espaço esplendoroso. “Você se sente assim, tão pequeno diante de toda a magnitude, de todos os detalhes de cada cantinho externo dela”, conta L. C. (mulher, 49 anos).

Outro aspecto interessante demonstrado pelas entrevistas foi propensão a aproximação do presbitério por aqueles que entram na igreja. Trazendo estas respostas para o campo da neurociência, Eberhard (2009) nos conta de uma experiência, onde aqueles que adentravam a Igreja Cristã do Norte experimenta a sensação de algo que os chama, estejam ou não aproximando se do templo em um ato de adoração. L. C. (mulher, 49 anos), nos relata que “assim que você adentra a igreja, parece que você vai se desmanchando, se deixando levar pelo ambiente e pela atmosfera [...]”.

Houve aqueles que relataram surpresa e “ampli tude da nave que nos leva ao altar e a imagem de Nossa Senhora da Vitória no fundo”, como a voluntária S. S. (mulher, 65 69 anos) informa. Essa percepção de amplitude e expansão pode ser explicado por Eberhard (2009, p. 133), que afirma que “a percepção afetiva de um espaço pequeno (o nártex), conforme registrado no córtex frontal, é estimulada ao se mover para um espaço subitamente muito maior (a nave). Essa estimulação produz a sensação de expansão (ou admiração).”

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Em suma, é praticamente improvável distinguir um espaço sagrado de seu significado, porém é possível estudar seus efeitos. Sabe se que o cérebro tem duas funções primárias: automanutenção e autotranscedência (EBERHARD, 2009). Essas duas funções são desempenhadas ao longo da vida, e a Newberg, D’Aquili e Rause (2001 apud EBERHARD, 2009) sugerem que a religião é uma excelente ferramenta, pois ajuda o cérebro a desempenhar essas funções. Sendo assim, o ambiente religioso tem papel fundamental no estímulo de automanutenção e autotranscedência, através de sua própria arquitetura.

76

Capítulo 8 Capítulo 8

Capítulo 8 - Metodologia Capítulo 8 - Metodologia

Alan Menken (2016), no musical O Corcunda de Notre Dame, descreve as sensações que a cigana, Esmeralda, presenciou ao entrar na Catedral de Notre Dame como: "[...] cada janela, cada pilar e arco pareciam preenche la de luz. A luz de Notre Dame" (MENKEN, 2016).

Machado (2007) descreve que a iluminação de uma igreja pode contribuir de maneira positiva ou negativa no desenvolvimento da liturgia e, consequentemente, para a experiência do usuário. A luminosidade que adentra pelos vitrais é um contribuinte para o despertar de atenção e emoções em seu interior.

Sendo assim, a metodologia consistiu em diversas etapas, a saber: 1. 2.

Preparação: onde realizou se a coleta de dados relevantes para a fase prática; Experimentação: na qual, realizou se a coleta de dados através da experimentação com o aparelho apresentado no Capítulo 4 Eye tracking.

3.

Compilação e análise de dados: etapa responsável pela organização e análise dos dados obtidos, a serem discorridos no Capítulo 9 Resultados e Discussões.

8.1 Preparação

Na fase de preparação, definiu se o recorte da pesquisa: delimitação do tópico a ser estudado e confecção de materiais para a realização da etapa prática do estudo.

8.1.1 Elemento de estudo

Ao final do capítulo 7, notamos que, dentre os elementos destacados pelo público usuário da Catedral, os vitrais da abside são veementemente lembrados e exaltados. Outro aspecto memorável das entrevistas deve se a comparação entre o edifício estudado, antes e após o restauro (ver tópico 7.2.3, p. 58). Através da relevância dos vitrais e da comparação entre as duas épocas da igreja, definiuse o objeto de estudo: optou se por experimentações

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com rastreamento ocular, a partir de simulações de luminosidade na abside da Catedral Metropolitana de Vitória, antes e após o restauro.

8.1.2 A modelagem

Para alcançar uma comparação fiel das duas fases do templo estudado, a melhor opção foi realizar as simulações da incidência solar a partir de uma modelagem tridimensional da Catedral em software. A partir das plantas baixas, fornecidas pela Secult Secretaria da Cultura, levantadas pela empresa responsável pelo restauro em 2011, Augural Arquitetura, foi possível realizar a modelagem 3D. Outra fonte utilizada foi o levantamento fotográfico da Catedral atual realizado pela autora e fotos levantadas pelo escritório da Augural Arquitetura para a realização do restauro. A partir desses dados, realizou se a modelagem 3D e, posteriormente, a renderização. Pequenos ajustes de adequação, como padronagem de piso e vitrais, foram necessários, sem perder o foco do estudo. Segue, na Figura 38, a comparação entre a fotografia e a modelagem.

8.1.3 Análise solar

Para a análise mais precisa da incidência de luz no interior da Catedral, inicialmente, precisava se estudar o comportamento da trajetória solar na fachada posterior da igreja. Tal estudo foi realizado a partir de análise de Cartas Solares, com o auxílio dos softwares Sol AR e Sketch Up. O produto da análise foi demonstrado na Figura 39. A partir da observações da incidência solar no edifício, em conjunto com seu entorno, foi se possível determinar o próximo passo da investigação: os melhores horários e épocas para realizar as simulações.

Como foco da investigação está no impacto da luminosidade na abside da igreja, optou se por horários e estações com boa incidência de luz natural.

Sendo assim, o recorte de testagem foi determinado: simulações de incidência solar no interior da igreja, às 09h00, 14h00 e 17h00, no dia 22/12 (solstício de verão).

As imagens geradas na análise da incidência solar estão nas figuras 40 a 45.

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Figura 38 Comparação entre modelagem e foto

Fonte: Autora (2022)

(A) Representação da Catedral atualmente modelada tridimensionalmente no software Sketch Up (B) Nave da Catedral Metropolitana de Vitória
Foto: Autora, 2022 (C) Representação da Catedral antes do restauro de 2011 modelada tridimensionalmente no software Sketch Up (D) Nave da Catedral Metropolitana de Vitória pré restauro
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Foto: Espírito Santo (Estado), 2009

Figura 39 Análise solar (fachada posterior)

Fonte: Autora (2022)

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Figura 40 Incidência solar na abside Catedral atual (pós restauração) às 09:00

Fonte: Autora (2022)

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Figura 41 Incidência solar na abside Catedral atual (pós restauração) às 14:00

Fonte: Autora (2022)

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Figura 42 Incidência solar na abside Catedral atual (pós restauração) às 17:00

Fonte: Autora (2022)

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Figura 43 Incidência solar na abside Catedral atual (pré restauração) às 09:00

Fonte: Autora (2022)

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Figura 44 Incidência solar na abside Catedral atual (pré restauração) às 14:00

Fonte: Autora (2022)

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Figura 45 Incidência solar na abside Catedral atual (pré restauração) às 17:00

Fonte: Autora (2022)

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8.1.4 Público alvo Diferentes épocas trazem diferentes

perspectivas.

A história da Catedral permeia a memória de muitos usuários, por isso, optou se por uma abordagem metodológica que contemplasse obrigatoriamente usuários da igreja, que a frequentaram em momentos distintos. A etapa de Pesquisa de Campo (ver item 7.4, pg. 70), realizada com voluntários por meio de questionários, identificou dois tipos de memórias: as memórias de curto e as de longo de prazo. A análise dos questionários evidenciou que as memórias de curto prazo relacionam se à usuários que frequentam a igreja em um período recente. E as memórias de longo prazo foram evocadas por usuários que frequentam a igreja há um período mais longínquo e, muitas delas, vinculadas à lembranças da igreja antes da reforma/restauro, que determina suas características arquitetônicas atuais. Desse modo, identificou se dois grupos de voluntários, buscando alcançar uma exatidão mensurativa:

Grupo A: formado por pessoas que possuiam lembranças da Catedral em sua forma antes do restauro Grupo B: este, por sua vez, abarcava indivíduos

com lembranças da igreja em sua forma atual, pós restauro.

A distinção permitiu uma comparação não ape nas na diferenciação da incidência solar no interior do templo religioso, mas também das visões de memória afetiva de seu público alvo. Pollak (1992) destaca o poder seletivo da memória, pois através de processos cognitivos, o cérebro registra informações olfativas, sonoras, táteis, visuais e gustativas. Através de um processo conhecido como recall ou evocação (DAMÁSIO, 2011), o cérebro é capaz de trazer à tona não apenas dados coletados pelos cinco sentidos, mas resgatar emoções experienciadas no espaço.

Procurando atingir tais objetivos, definiu se o seguinte parâmetro: cada público seria destinado a um teste específico. O grupo A fez o teste com imagens da Catedral antes do seu restauro e, o grupo B, por sua vez, realizou o teste com a igreja após o seu restauro.

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8.2 Experimentação

Com os detalhes definidos, a parte prática do estudo foi realizada. Dez voluntários, sendo cinco voluntários em cada grupo, participaram do experimento, que foi conduzido pela autora do trabalho e por uma pesquisadora assistente.

8.2.1 Testagem com o eye tracker

Com as análises da trajetória solar feitas e os parâmetros de testagem definidos, é chegada a hora de realizar o experimento com o aparelho eye tracker (ver capítulo 4). Dez voluntários participaram, sendo:

a) Grupo A: Cinco voluntários (todas mulheres, com idade nas faixas de 50 54 a 70 74 anos).

b) Grupo B: Cinco voluntários (quatro mulheres e um homem, com idades nas faixas de 18 24 a 25 29 anos).

Vale ressaltar que não houve necessidade da realização de pré teste com o equipamento, devido ao conhecimento prévio da autora do trabalho, que já vem realizando testagens com o eye tracker em projetos de Iniciação Científica anteriores. A autora auxiliou, inclusive, em pesquisas de mestrado que envolveram o dispositivo, como da arquiteta Maria

Augusta Bittencourt, intitulada Neurociência Aplicada ao Espaço Urbano: Forma Urbana e a Percepção Espacial e Afetiva do Eixo da Reta da Penha.

8.2.2 Preparação

Os voluntários, primeiramente , foram instruídos a assinarem um Termo de Consentimento e Livre Esclarecimento (TCLE), autorizando a participação no experimento e uso de imagem, pois o experimento foi fotografado por pesquisadores do grupo Arquitetura, Cidade e Patrimônio, da Universidade Vila Velha.

Logo após, os indivíduos foram conduzidos até a mesa onde seria realizado o mapeamento ocular.

O aparelho de rastreamento ocular utilizado foi o Pupil Core, da marca Pupil Labs, conforme Figura 46.

Este dispositivo, em específico, possui três câmeras: duas, ajustáveis, voltadas para os olhos do voluntário, focando, individualmente, nos globos oculares; e uma, centralizada, direcionada para a tela do computador, registrando aquilo que o indivíduo enxerga.

As imagens foram projetadas em um notebook de tela 15.6 polegadas (medida diagonal = 39,5cm) e os voluntários posicionaram se a 70cm do aparelho (conforme Figura 47).

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Após o eye tracker ser devidamente calibrado, a autora do trabalho e a pesquisadora assistente explicaram o procedimento, para que o voluntário pudesse se sentir confortável ao realizar.

Figura 46 Aparelho eye tracker Pupil Core

8.2.3 Pós teste

Como é abordado por Rusnak e Szewczyk (2018, p. 30), os dados obtidos com o eye tracker não revelam se o participante olhou determinado objeto porque o agradou ou desagradou. "É por isso que para obter interpretações mais complexas é necessário completar o experimento com questionário cuidadosamente elaborado [...]" (RUSNAK; SZEWCZYK, 2018, p. 30).

Fonte: Pupil Labs, 2000 2022

Figura 47 Representação do posicionamento do voluntário

Sendo assim, a última etapa do experimento consistia em responder um questionário simples. Além de informações pessoais dos voluntários, o questionário conteve perguntas como:

"Descreva suas lembranças na Catedral Metropolitana de Vitória."

70cm

Fonte: Autora, 2022

"Qual sua percepção com relação a luminosidade nas imagens que viu?" "Qual o sentimento que a luminosidade da Catedral nesse contexto te desperta?" "Descreva as imagens que você observou utilizando o equipamento Eye tracking em 3 palavras."

"O que te chamou atenção na Imagem X?" "Ao olhar essa imagem X, você sente uma sensação positiva, negativa ou neutra? E porquê?"

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Tais questionamentos permitiram uma avaliação mais aprofundada com relação a percepção dos usuários e informações relevantes que foram armazenadas na memória, revelando dados que o rastreamento ocular não foi capaz de informar.

Além disso, retomando a metodologia explanada de Frías e Jofré (2020), Boni e Quaresma (2005) ver página 71 foi optado por realizar uma entrevista com o usuário. As perguntas do questionário, relacionadas a percepção, foram lidas em voz alta, pela autora do trabalho ou pelo pesquisador assistente, e o mesmo redigia a resposta dita pelo voluntário, enquanto um gravador a armazenava em áudio. É importante ressaltar que foi solicitado ao usuário a autorização prévia da gravação.

Após o experimento ser concluído, os resultados da pesquisa foram sintetizados na forma de infográficos e, posteriormente, analisados na terceira fase descrita na metodologia: compilação e análise de dados, explanada no capítulo seguinte.

91

Capítulo 9 Capítulo

9

Capítulo 9 - Resultados e discussões Capítulo 9 - Resultados e discussões

A análise qualitativa identificou quatro aspectos a respeito da percepção dos usuários. O primeiro foi relacionado à importância da presença da luz no espaço religioso. O segundo aspecto abarca a percepção da altura da igreja, frente a ausência de vitrais que trazem iluminação no presbitério. O terceiro ponto, por sua vez, relaciona se às “memórias autobiográficas” (DAMÁSIO, 2011), que esteve presentes durante o experimento. Finalmente, o quarto aspecto investiga a igreja como um ambiente restaurador e homeodinâmico.

9.1 A luz no espaço religioso: percepção no ambiente sagrado criado por meio dos vitrais Paula (2013, p. 4) ressalta que “a luz é importante enquanto elemento arquitetônico, uma vez que a percepção do espaço edificado é dependente da relação que a mesma estabelece com a estrutura, o espaço e suas características [...].” O ser humano, naturalmente, tem a vida ligada à luz. Millet (1996.

apud PAULA, 2013) nos diz que a luz é um elemento primário e a mesma se faz necessária para . criação do espaço, assim como para sua percepção.

A luz não pode ser tratada como um elemento a parte do projeto arquitetônico, mas como uma nuance da arquitetura. Tem o poder de realçar volumes, evidenciar texturas, conduzir o olhar, influenciar a percepção do espaço edificado e transmitir uma mensagem. (PAULA, 2013, p. 2)

Zanon, Naufel & Nascimento (2020) destaca que tal elemento se estende além do sentir visual, a luz se conecta à percepção tátil e a sentimos em todo o corpo. Vale ressaltar que “experiências visuais, auditivas, olfativas e gustativas também se configuram como experiências táteis” (ZANON; NAUFEL; NASCIMENTO, 2020, 63).

Primeiramente, analisemos os resultados do grupo B, que realizou o teste com a Catedral após ser restaurada (Figuras 47 a 49)

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Figura 48 Infográfico com os mapas de calor do grupo B (voluntários 1 e 2)

Fonte: Autora (2022)

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Figura 49 Infográfico com os mapas de calor do grupo B (voluntários 3 e 4)

Fonte: Autora (2022)

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Figura 50 Infográfico com os mapas de calor do grupo B (voluntário 5)

Fonte: Autora (2022)

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Nos infográficos apresentados, que relacionam os mapas de calor, gerados a partir do rastreamento ocular (consultar tópico 4.1.1, p. 24) do grupo B, nota se:

No horário de 09h00: concentração das manchas de calor no vitral central (posicionado atrás da imagem de N. Sr.ª da Vitória). Três dos cinco voluntários focaram a atenção, diretamente, no vitral central e na área do presbitério. Fato este atribui se à presença de luz natural nessas áreas. No horário de 14h00: nessa imagem, os mapas de calor focaram nos vitrais laterais, porém ainda com os olhares buscando a esquadria iluminada central.

No horário de 17h00: estas imagens, por sua vez, evidenciaram o efeito fascinante da luz. Três dos cinco voluntários buscaram a área iluminada dos bancos (lado direito) e, além disso, a mancha de calor expandiu se na maioria dos mapas. Tal fato revela uma forte evidência do efeito da luz em atrair a atenção do usuário.

A pesquisa evidenciou a importância da luz transpassada pelos vitrais, no ambiente religioso, não apenas através dos mapas de calor, mas também

através dos relatos dos voluntários. No grupo B, a percepção da luminosidade como um elemento agradável foi expressiva (Figura 48).

Figura 51 Depoimentos dos voluntários do grupo B

Qual o sentimento que a luminosidade da Catedral nesse contexto te desperta?

A.B. (mulher, 18-24 anos) Um sentimento bom, agradável. Aconchegante, diria.

H.S. (homem, 18-24 anos) Um sentimento espiritual, de um lugar seguro e harmonioso.

J.R. (mulher, 18-24 anos) “Acolhimento, talvez. Aquela sensação de que está tudo bem.”

Fonte: Autora (2022)

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Como podemos ver, a concentração de atenção nos mapas de calor em áreas iluminadas pela luz natural foram justificadas a partir dos relatos dos voluntários. Zuanon, Naufel & Nascimento (2020, p. 63) destacam que: Dentre outros elementos projeturais, a luz se destaca como condicionante da atmosfera, da ambiência de um lugar e, consequentemente, das emoções e dos sentimentos suscitados por tal: alegria, tristeza, sofrimento, êxtase, euforia, tranquilidade etc.

Por essa razão, respostas como “[...] aproximação com o divino” (K.K., mulher, 25 29 anos) também se destacaram nas entrevistas. Coutagne (2016 apud SOTERO, 2021) afirma que o vitral eclesial desenvolve uma função fundamental: simbolizar a luz de Deus no espaço sagrado. O autor ainda complementa sua visão ao informar que a principal contribuição do vitral é permitir o usuário, crente ou não, de vislumbrar a presença de uma força superior (SOTERO, 2021)

Se olharmos para os relatos dos voluntários do grupo A, por sua vez, veremos o impacto da falta da luz provida pelos vitrais da ábise. Ao serem indagados

sobre o sentimento que a luminosidade da igreja neste contexto específico, houve respostas como: “Depois que fecharam os vitrais, escureceu mais ainda. [...]. Os vitrais trazem mais claridade, que entra pela janela e dá um efeito bonito.” (M.L.D., mulher, 60 64 anos).

Para corroborar com o estudo, observemos os dois infográficos seguintes, produzidos a partir da pergunta: “Ao olhar essa imagem X, você sente uma sensação positiva, negativa ou neutra? E porquê?".

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Figura 52 Infográfico (percepção do grupo A)

Fonte: Autora (2022)

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Figura 53 Infográfico (percepção do grupo B)

Fonte: Autora (2022)

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No infográfico relativo ao grupo B (Figura 49), nota-se:

No horário das 09h00: Como visto, a maioria dos voluntários mostraram uma avaliação positiva do espaço. Dentre os motivos relatados, estavam “positiva, pois o ambiente é iluminado [...]” (H.S., homem, 18 24 anos); “positiva, pela questão do acolhimento.” (J.R., mulher, 18 24 anos); e “positiva, pois está mais claro.” (K.K., mulher, 25 29 anos)

No horário das 14h00: Onde não há nenhum destaque na luz, 60% do público relatou um sentimento de neutralidade frente a imagem apresentada. Houve depoimentos como: “Neutra, pois não há influência da luz, não há nada se destacando”; “Neutra, pois ela está mais escura”. No horário das 17h00: Todos os voluntários disseram sentir uma sensação positivia ao observar a última imagem. Dentre as explanações, estavam: “Positiva, pois ela mostra a igreja com mais luz.” (H.S., homem, 18 24 anos); “Positiva, pois a luz incidindo na igreja lembra a aproximação com o divino” (K.K., mulher, 25 29 anos).

No infográfico que relaciona as resposta para a mesma pergunta, no grupo A (Figura 50), temos:

Nas imagens dos horários de 09h00 e 14h00: em ambas, o público relatou 60% de sensação positiva e 40% de neutralidade. Dentre os relatos que explicasse tal fenômeno, um deles informou que “[...] não há nenhum impacto que causa emoção” (M.L.D., mulher, 60 64 anos).

Na imagem de 17h00: Assim como no grupo anterior, a avaliação positiva foi unânime. Nos depoimentos: “Positivíssima, por conta da luz. Deu vida. Realçou a beleza da igreja.” (M.D., mulher, 50 54 anos); “Positiva, pois a luz cria uma beleza e chama atenção.” (M.L.D., mulher, 60 64 anos).

Instrumento de projeto, construtora de intenções e agente da percepção, os experimentos sugerem que a luminosidade no espaço religioso é capaz de alterar a percepção dos usuários.

A seguir, voltemos a análise para o grupo A, que realizou o teste com a igreja antes do restauro. Seguindo a lógica aplicada para o primeiro grupo, analisemos, primeiramente, os infográficos (Figuras 51 a 53) contendo os mapas de calor deste grupo.

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Figura 54 Infográfico com os mapas de calor do grupo A (voluntários 1 e 2)

Fonte: Autora (2022)

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Figura 55 Infográfico com os mapas de calor do grupo A (voluntários 3 e 4)

Fonte: Autora (2022)

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Figura 56 Infográfico com os mapas de calor do grupo A (voluntário 5)

Fonte: Autora (2022)

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9.2 A altura e a verticalidade nos espaços religiosos

Se existe um elemento presente em grandes e emblemáticos templos católicos, é a altura. Em tempos de Idade Média, a altura das igrejas significava um estreitamento espacial com o próprio Deus. Analisando agora os resultados obtidos pelo gru po que analisou a Catedral Metropolitana de Vitória pré restauro, veremos o impacto da arquitetura, frente à ausência de vitrais na ábise da igreja. Através desse estudo, outro aspecto arquitetônico se destacou: a altura da igreja. Através do infográfico dos mapas de calor do grupo A (Figura 51 a 53), ressalta se:

No horário de 09h00: o olhar de três dos cinco voluntários se voltaram para as paredes laterais do transepto, buscando os elementos decorativos. Nota se que os dois voluntários restantes se voltaram para o centro da ábise e para a cúpula, acima da imagem de N. Sr.ª da Vitória.

No horário de 14h00: este por sua vez, foi marcado

por um resultado semelhante. A atenção se focou nas paredes do transepto e em direção ao alto. No horário de 17h00: esta simulação demonstrou uma diferença. Quatro dos cinco voluntários voltaram o olhar para o centro e em direção a luz advinda do vitral da fachada frontal. Podemos notar tal constatação através da mudança do foco de atenção e/ou aumento das manchas de calor. A inexistência dos vitrais nessa versão do edifício conduziu os olhares dos participantes para pontos mais altos da igreja e elementos decorativos. Retomando os estudos de caso do Capítulo 5, especificamente a Capela Thorncrown (ver tópico, 5.1), relembramos o que foi apresentado. O primeiro aspecto ressaltado por Eberhard (2009a) foi as dimensções do espaço: 14,6m de altura, 18,2m de comprimento e apenas 7,3m de largura. Devido a sua nave estreita e altura considerável, o visitante instintivamente olha para o alto. Se voltarmos para a página 31, item 5.1.2, retomamos o conceito que o senso de respeito é influenciado quando há um amplo espaço acima da cabeça, que não é possível de visualizar se não mover os olhos, ou até a cabeça, para o alto. Como já explanado, Zeki (apud

105

EBERHARD, 2009a) ressalta que direcionar o olhar em direção ao alto, nos traz sensação de um elemento “etéreo”.

9.3 A memória autobiográfica: lembranças, religiosidade e norteador de preferências espaciais

Complementando o que foi explanado no capítu lo 2 (ver p. 11), Damásio (2015) nos apresenta um quarto tipo de memória: memória autobiográfica. De acordo com o autor, essas lembranças estão ligadas aos registros de experiências passadas, isto é, a história individual e particular de cada indivíduo. Vejamos exemplos na Figura 54. Dessa forma, o que difere essa tipologia das demais é o fato de ser “[...] um agregado de registros dispositivos sobre quem temos sido fisicamente e quem em geral temos sido na esfera comportamental, juntamente com registros sobre o que planejamos ser no futuro” (DAMÁSIO, 2015, p. 337).

Figura 57 Exemplo de lembranças relatadas pelo grupo A)

Quais são as suas lembranças da Catedral Metropolitana?

(L. C., 50-54 anos) “Lembro que eu sempre gostei de assistir as missas lá onde faz o braço da cruz, porque ali você tem uma visão boa do presbitério e porque ali dá pra ter uma visão melhor de toda a nave."

(M. D., 65-69 anos) “Eu tenho lembranças antigas e novas. As antigas, quando eu era criança, uma vez por mês meu pai levava a gente pra participar de uma missa e depois brincar na pracinha. Era muito gostoso. Ficava torcendo pra chegar o domingo e ir na Catedral.”

(M. D., mulher, 60- 64anos) “Lembranças que eu tenho quando minhas irmãs casaram. Eu fui batizada na Catedral.”

Fonte: Autora (2022)

Através das imagens apresentadas ao público do grupo A, foi possível despertar um fenômeno da evocação (consultar tópico 2.3, p. 15). Lima (2010 apud PAULA, 2013) conta que a percepção é um ato refinado, que recorre à nossa memória.

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"A atividade cerebral se utiliza de sutis classifi cações e comparações, tomando uma série de decisões até que os dados armazenados através dos sentidos se convertem em uma percepção consciente do espaço edificado" (PAULA, 2013, p. 21). Além disso, o estado emocional do indivíduo afeta sua percepção, assim como seus valores e experiência (PAULA, 2013). Sendo assim, suponha se que a preferência pela igreja em seu “estado original” deve se ao fato da mesma despertar sentimentos de “saudade” (E.S., mulher, 70 74 anos) e por ter feito parte da história dos usuários.

Eu gostava dela antes. A luz que incide sobre o presbitério hoje é bonita, mas eu prefiro como era antes. Eu lembro da Catedral amarelinha, é o que me traz memórias gostosas. Memórias boas. (L. C., mulher, 50-54 anos)

Relembrando, Lent (2008, p. 245) afirma que as emoções experienciadas, o contexto da cena e a mistura dos dois influenciam o processo de evocação.

9.4 Templos religiosos como ambientes restauradores e homeodinâmicos

Seja por conta da própria fé, pela história ou pela arquitetura em si. Os templos religiosos, especificamente os católicos para esse trabalho, buscam criar uma atmosfera que induz introspecção e reflexão. Sendo assim, acaba se por projetar um ambiente homeodinâmico, isto é, que induz sensações positivas no usuário.

A homeostasia refere se a regulação da vida, envolvendo “parâmetros acompanhados da coordenação de respostas adequadas para minimizar qualquer distúrbio” (SILVERTHORN, 2003, p. 169). Este processo, constantemente se transformando, almeja equilíbrio e bem estar para o usuário, e se estende para âmbitos espaciais, sociais e culturais. Alinhado com essa perspectiva, temos o conceito de “ambientes e produtos homeodinâmicos”, cunhado pelos cofundadores da rede de pesquisa transdisciplinar DASMIND Design, Art, Space and Mind, da Universidade de Campinas. Tal conceito refere se aos ambientes e produtos que contribuem para alcançar o equilíbrio homeodinâmico e, conse

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quentemente, à saúde (ZUANON; FERREIRA; MONTEIRO, 2020a).

Aplicando no trabalho em questão, as entrevistas evidenciaram que a igreja se caracteriza como tranquilizadora e restauradora. Felippe (2015 apud SILVEIRA; FELIPPE, 2019) defende a existência de espaço capaz de promover alterações fisiológicas positivas. Como visto no depoimento, a Catedral não apenas foi apreendida pelo público como um ambiente religioso, mas como um espaço que promove descanso e recuperação frente ao estresse cotidiano dos usuários. “A partir do momento em que as pessoas apresentam fadigas mentais, mobilizadas por alterações frente à emendas cotidianas, elas necessitam de recuperação.” (SILVEIRA; FELIPPE, 2019, p. 11)

Na obra Ambientes Restauradores: conceitos e pesquisas em contextos de saúde, Silveira & Felippe (2019) defendem que, segundo a Teoria da Restauração da Atenção, é preciso considerar quatro propriedades indispensáveis para um ambiente ser classificado como restaurador (SILVEIRA; FELIPPE, 2019, p. 11, 12):

1. 2. 3.

Afastamento (being away): está relacionado ao indivíduo estar longe de situações e contextos do cotidiano exaustantes, de modo a descansar a atenção. Podemos relacionar ao fato do público buscar a igreja como um refúgio. “Eu sempre gosto de passar lá e entrar, eu acho que é um momento de calmaria nessa vida da gente. [...]” (L.C., mulher, 50 54 anos).

Fascinação (fascination): aspecto que possibilita um tipo de atenção que não há necessidade de esforço. Como foi apresentado, diversos elementos contribuem para a fascinação com o ambiente religioso em questão, como “sua belissíma arquitetura, os vitrais, os detalhes minuciosos, suas esculturas” (E. G., mulher, 35 39 anos).

Extensão (extent): essa qualidade se refere a capacidade de tempo e sustentação em dois âmbitos: a) o primeiro se refere ao que olhar ou fazer; b) este, por sua vez, se refere a “experiência ser suficientemente ordenada e organizada para evitar a impressão de caos” (GRESSLER, 2014; KAPLAN, 1995 apud SILVEIRA; FELIPPE, 2019, p. 11). Dialogando com o conceito de fascinação, a

108

extensão leva ao público a querer permanecer e sustentar o olhar por tempo considerável. “E você entrar e ficar admirando a igreja num momento que não há missas ou celebrações, a imponência daquele lugar [...] Você conversa com Deus [...].” (L. C., mulher, 50-54 anos)

homeostase em um corpo vivo” (DAMÁSIO, 2018, p.

32). Baseado nas respostas apresentadas, é notório o poder restaurador e tranquilizante da igreja, capaz de influenciar positivamente a percepção de ambos os grupos estudados.

Compatibilidade (compatibility): De acordo com Silveira & Felippe (2019, p. 12), “ a compatibilidade envolve aspectos cognitivos e emocionais do indivíduo no processo de escolha do ambiente [...]”. Isto é, o ambiente conversa com aspectos subjetivos do indivíduo, suas experiências anteriores, e cria uma compatibilidade pessoa espaço. Trazendo para este trabalho, nota se que as memórias autobiográficas do público no interior da Catedral Metropolitana de Vitória formaram um vínculo emocional, que confere compatibilidade entre o público estudado e a igreja.

4. Damásio (2018) afirma que a homeostase sociocultural trata se de um fenômeno cultural desenvolvido por mentes conscientes, aliados com sentimentos, definidos nessa obra como “experiências subjetivas do estado momentâneo de

109

Considerações finais Considerações finais

A humanidade é movida pela sua fé. Por vezes, o desejo de aproximar se do divino é o combustível para seguir adiante. O que iniciou se com pregações em catacumbas solidificou se na história como um império de simbolismos e edifícios majestosos. “A beleza é a harmonia entre a forma e o conteúdo, entre o objeto e a razão de seu ser, entre a voz e a palavra, entre o silêncio e a paz que são sinais de sabedoria… um complemento do bem e da verdade” afirma Pastro (1999, p. 33).

O espaço religioso não apenas é um lugar onde a fé se manifesta, mas um ponto de encontro de experiências sensoriais e afetivas nascem, nos conectando pela fé e pelos vínculos afetivos. Desde a experiência de Eberhard até o estudo conduzido na Catedral Metropolitana de Vitória, o público se identifica com o ambiente, tornando um espaço sagrado e único para cada indivíduo.

O capítulo da história da igreja católica nos ilus trou o poder da arquitetura como reflexo da trajetória

da fé, além da configuração arquitetônica como indutora de sensações. Vimos, através da Capela Thorncrown, por exemplo, que a arquitetura religiosa é capaz de instigar o comportamento de devoção pelo simples ato de projetar vislumbrando tal objetivo. Característica esta que foi e vem sendo utilizada no interior dos templos desde os tempos remotos.

Com essa bagagem de conteúdos estabelecida, o questionamento sobre os elementos responsáveis pelo sentimento de conexão com o divino surgiu. A teoria foi aplicada em um dos templos católicos mais importantes do estado, a Catedral Metropolitana de Vitória. Através de investigação quantitativa e qualitativa, observou se elementos que ajudam a estabelecer, inconscientemente, a conexão entre humano e divino dentro do espaço. Os estudos mostraram a importância dos vitrais como peça fundamental. Por eles, vem a luz que os fiéis, em estudo, consideram parte indispensável da Catedral.

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“Eu sou a luz do mundo” (João 8:12). Buscando espelhar a essência divina, onde a presença da luz significa a presença do próprio Deus.

Aliando tecnologia e história, mediante a utiliza ção do equipamento eye tracker, foi possível fazer essa mensuração da importância dos vitrais na catedral de forma prática. Os resultados mostraram três principais aspectos: a) a presença da luz transpassada pelos vitrais é essencial na atmosfera de introspecção e reflexão; b) a altura das igrejas é um fator indutor de respeito e atrai a atenção do público quando a luz está ausente; c) o próprio espaço religioso é um ambiente restaurador e indutor de homeostasia para o usuário.

O estudo a respeito da neurociência aplicada ao espaço religioso possui um próspero campo para crescimento. Futuras pesquisas abarcando esta temática favorecerão a criação de espaços de reflexão e introspecção melhor projetados, seguindo as diretrizes da neurociência. Portanto, ao analisar a pesquisa realizada, é possível concluir que os objetivos deste Trabalho de Conclusão de Curso foram alcançados, abrindo portas para novas linhas de estudo a serem construídas no futuro.

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Referências bibliográficas

8min
pages 127-133

Considerações finais

2min
pages 125-126

9.4 Templos religiosos como ambientes restauradores e homeodinâmicos

4min
pages 122-124

9.2 A altura e a verticalidade nos espaços religiosos

1min
page 120

Figura 53 - Infográfico (percepção do grupo B

1min
pages 115-116

Figura 51 - Depoimentos dos voluntários do grupo B

2min
pages 112-113

8.1.4 Público-alvo

1min
page 103

Figura 38 - Comparação entre modelagem e foto

1min
page 95

7.4.2 Pesquisa de campo – etapa 2

1min
page 87

Figura 37 – Relatório gráfico do resultado do questionário

2min
pages 89-92

7.4.3 Resultados

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page 88

Figura 31 – Planta de localização dos vitrais

1min
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7.3 A arquitetura

1min
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Figura 30 – Estrutura da Catedral em concreto armado e tijolos cerâmicos

1min
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7.1.1 A influência religiosa

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6.5.1 O evento

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Figura 17 – Fachada da Catedral de Saint-Denis

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page 61

Figura 19 – Papa Paulo VI e Enrico Dante durante o Concílio Vaticano II

1min
pages 65-66

Figura 16 – Igreja Ortodoxa Antioquina da Anunciação da Mãe de Deus/SP

1min
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5.2.3 Resultados

1min
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3.2 Voxels no cérebro e expressão de edifícios

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5.2.1 O experimento – parte 1

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2.4 Emoções

1min
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INTRODUÇÃO

3min
pages 16-19

1.4.2 Harmonia

1min
pages 24-25

2.2 Armazenamento

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Figura 02 – Representação do hipocampo

1min
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1.2 Espaço sagrado e espaço espiritual

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Figura 01 – Tipologias de memórias

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1.3 Mente e consciência

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2.3 Evocação

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