Memorial da Criação de Quando Acordar a Cidade Rejane Arruda
I. Uma Questão Inicial
Eu já acompanhava o Grupo de Teatro do Instituto Luis Braille do Espírito Santo através de outros projetos: Estagios Supervisionados de Lena Signorelli e Sabrina Paula Sabino, minhas alunas na UVV, com a apresentação de um espetáculo enquadrado como programa de auditório, constituído a partir de Jogos Teatrais; e o projeto de extensão da UVV Vi ver Teatro Sensorial com Deficientes Audiovisuais, que gerou um trabalho performativo dirigido em pesquisa de TCC por minha na época aluna Julia Del Fiume. Quando cheguei, a espectativa dos atores era a profissionalização. Falei que toda trajetória artística é construída de modo singular e eles, como quaisquer artistas videntes, passariam pela questão de como consolidar um estilo e marca próprios a partir de uma cadeia de processos desafiadores. E que eu me propunha a toma-los como parceiros e co-autores, aproveitando as singularidades como um “a mais” (sinal de mais) no espetáculo que iríamos criar; percebendo suas potencias e evidenciando-as. A preocupação de alguns era que eu “adaptasse para cegos”. Acostumados desde a infância com isto, queriam ser tratados “normalmente”. Expliquei que não os trataria como portadores de algo em falta, mas como singularidade, extraindo, do coletivo, o que mais poderia ser potente, para que uma poética cênica acontecesse e eles tivessem orgulho de suas produções – como faço com todos os outros elencos. Foi com este princípio que criamos o espetáculo Quando Acordar a Cidade – que estreou no Teatro da UFES em treze de agosto de 2019. Extremamente sonoro, o espetáculo traz andarilhos chegando a uma cidade adormecida para acordá-la. Com função metafórica, esta pequena sinopse enquadra uma série de fragmentos: narrativas de vida, híbridas e inventadas, apresentações de si através de objetos antigos, canções, dramatizações, brincadeiras da cultura popular, números de plateia onde a performatividade impera, citações da “época do rádio” e da História do Brasil.
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