TCC arqurbuvv A MATÉRIA DE QUE É FEITO O TEMPO: CASA-MUSEU MUNIZ FREIRE, MUSEU CAPIXABA DA 1ª REPÚBL

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UNIVERSIDADE VILA VELHA ARQUITETURA E URBANISMO

LUIZA DOS SANTOS PESSÔA

A MATÉRIA DE QUE É FEITO O TEMPO: CASA-MUSEU MUNIZ FREIRE, MUSEU CAPIXABA DA 1ª REPÚBLICA (1889 – 1930)

VITÓRIA 2021


A MATÉRIA DE QUE É FEITO O TEMPO: CASA-MUSEU MUNIZ FREIRE, MUSEU CAPIXABA DA 1ª REPÚBLICA (1889 – 1930)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado a Universidade Vila Velha como pré-requisito do Curso de Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Vila Velha. Orientador: Me. Luiz Marcello Gomes Ribeiro

VITÓRIA 2021



AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus, que meu deu sabedoria e força para superar as dificuldades e por ter me permitido alcançar esse objetivo. À minha mãe, que nos momentos mais desafiadores me deu suporte para realização deste trabalho e finalização da graduação. E em especial, ao Professor Me. Luiz Marcello Ribeiro, que não mediu esforços para me orientar e acompanhar, disponibilizando seu tempo, material e conhecimento para o êxito deste trabalho.

Agradeço também, a todos que estiveram comigo contribuindo para esse fechamento de ciclo, meus colegas, familiares e corpo docente.


RESUMO Esta pesquisa aborda a problemática do abandono e degradação do Centro Histórico de Vitória, Espírito Santo, com ênfase no imóvel de interesse de preservação "Casa de Muniz Freire", caracterizado por ser o único edifício neoclássico remanescente na Cidade Alta. Perpassa pelos aspectos materiais e tipológicos da construção histórica, como marco de seu tempo, assim como, pela história e memória do personagem Muniz Freire, antigo residente da propriedade e importante figura na política do estado. Discorre também, a respeito das transformações ocorridas na Cidade Alta, abordando e relacionando os períodos políticos vivenciados pela cidade, com as tipologias arquitetônica das épocas, versando também os avanços tecnológicos sofridos pelas técnicas construtivas das mesmas. Analisa ainda, a importância da requalificação em escala urbana, assim como em edifícios de interesse de preservação, destacando a inserção de usos museológicos, especificamente da Casa-Museu. Concluindo com a proposta de projeto de requalificação de uso da Casa Muniz Freire, transformando-a na Casa-Museu Muniz Freire, Museu Capixaba da Primeira República (1889 – 1930).

Palavras-chave: Casa-museu; Centro Histórico; Interesse de Preservação; Requalificação; Primeira República.


ABSTRACT This research addresses the issue of abandonment and degradation of the Historic Center of Vitória, Espírito Santo, with emphasis on the property of preservation interest "Casa de Muniz Freire", characterized as the only remaining neoclassical building in Cidade Alta. It permeates through the material and typological aspects of the historical construction, as a landmark of its time, as well as through the history and memory of the character Muniz Freire, former resident of the property and an important figure in state politics. It also discusses the transformations that took place in the Cidade Alta, approaching and relating the political periods experienced by the city, with the architectural typologies of the times, also dealing with the technological advances suffered by their construction techniques. It also analyzes the importance of upgrading on an urban scale, as well as in buildings of interest to preservation, highlighting the inclusion of museological uses, specifically the Casa-Museum. Concluding with the proposal for a project to requalify the use of the Casa Muniz Freire, transforming it into the Muniz Freire House-Museum, Museu Capixaba da Primeira República (1889 – 1930).

Keywords:

House-museum;

Requalification; First Republic.

Historic

center;

Preservation

Interest;


LISTA DE FIGURAS Figura 1: Retrato de José Melo de Carvalho Muniz Freire ................................................... 15 Figura 2: Retrato de Colatina Soares de Azevedo ............................................................... 16 Figura 3: Projeto de um Novo Arrabalde, por Saturnino de Brito. ........................................ 19 Figura 4: Reprografia colorida do Theatro Melpômene, 1906 .............................................. 20 Figura 5: Retrato de Jerônimo de Souza Monteiro .............................................................. 22 Figura 6: Avenida Central (atual Rio Branco) no Rio de Janeiro, inaugurada em 1904 idealizada por Pereira Passos na Reforma Urbana. ............................................................ 23 Figura 7: Avenida Jerônimo Monteiro com os trilhos onde passavam os bondes elétricos .. 24 Figura 8: Vista do Parque Moscoso em Vitória, ES ............................................................. 25 Figura 9: Moradias populares executadas pela Caixa Beneficente no entorno do Parque Moscoso. ............................................................................................................................ 25 Figura 10: Capela Santa Luzia, em Vitória - ES. ................................................................. 26 Figura 11: Igreja São Gonçalo em Vitória, ES ..................................................................... 27 Figura 12: Convento São Francisco, em Vitória - ES........................................................... 29 Figura 13: Capela Nossa Senhora das Neves em Vitória - ES. ........................................... 29 Figura 14: Cidade colonial, Macau, na China ...................................................................... 30 Figura 15: Sobrados da Rua José Marcelino em Vitória, ES ............................................... 31 Figura 16: Casa nº 55 na Rua Muniz Freire em Vitória, ES ................................................. 32 Figura 17: Antigo Palácio da Justiça, neoclássico perdido na Cidade Alta de Vitória .......... 34 Figura 18: Imóvel n° 2 no antigo Largo de Santa Luzia, Casa de Muniz Freire, depois Colégio São Vicente de Paulo. ............................................................................................ 34 Figura 19: Edifício Neoclássico em frente ao Parque Moscoso em Vitória, ES.................... 35 Figura 20: Edifício Neoclássico em frente ao Parque Moscoso em Vitória, ES.................... 35 Figura 21: Teatro Carlos Gomes em Vitória, ES.................................................................. 37 Figura 22: Arquivo Público Espirito Santense...................................................................... 37 Figura 23: Antigo Congresso Estadual e Assembleia Legislativa, atualmente Palácio da Cultura Sônia Cabral ........................................................................................................... 38 Figura 24: Palácio Anchieta em Vitória, ES ......................................................................... 38 Figura 25: Mercado Capixaba em Vitória, ES...................................................................... 39 Figura 26: Catedral Metropolitana de Vitória ....................................................................... 40 Figura 27: Associação dos Funcionários Públicos do ES .................................................... 42 Figura 28: Vista da Praça João Clímaco em direção à Rua Pedro Palácios ........................ 45 Figura 29: Casa Muniz Freire atualmente............................................................................ 47 Figura 30: Desabamento na Rua Sete de Setembro, Centro de Vitória ............................... 48 Figura 31: Escadaria Maria Ortiz no Centro de Vitória......................................................... 49 Figura 32: Edifício da Alfândega na Avenida Jerônimo Monteiro. ........................................ 52 Figura 33: Palacete Jognell na Praça Oito .......................................................................... 52 Figura 34: Antiga Faculdade de Filosofia - FAFI.................................................................. 53 Figura 35: Rua Pedro Palácios - Sobrados Coloniais. ......................................................... 54 Figura 36: Rua da Alfândega - Neoclássico ...................................................................... 54 Figura 37: Sede da Fazenda Fortaleza em Alegre, ES........................................................ 56 Figura 38: Esquema da produção e assentamento do tijolo de adobe................................. 57 Figura 39: Estação Ferroviária de Matilde, Alfredo Chaves, ES .......................................... 57 Figura 40: Esquema de assentamento do tijolo cerâmico. .................................................. 58


Figura 41: Detalhe de cantaria da porta prinicipal da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, Goiania, GO, 1834 .................................................................................................. 58 Figura 42: Casa erguida por taipa de mão, com esquadrias e armação do telhado em madeira. .............................................................................................................................. 59 Figura 43:Esquema de execução da taipa de mão. ............................................................. 59 Figura 44: Arquitetura de Ferro na Antiga Estação Ferroviária do Recife, Atual Museu de Trem ................................................................................................................................... 60 Figura 45: Balcões de Madeira, Figura 46: Peitoris de Alvenaria, ................. 61 Figura 47: Fachadas em azulejo português em São Luís, MA ............................................. 62 Figura 48: Interior do período eclético – Palacete Leão Junior - Curitiba ............................. 62 Figura 49: Cozinha da casa de Rui Barbosa. ...................................................................... 63 Figura 50: Telhas planas de cerâmica, importadas de Marselha, França. ........................... 63 Figura 51: Anúncio dos serviços de advocacia de Muniz Freire publicado nos classificados. ........................................................................................................................................... 67 Figura 52: Mapa de imóveis vazios no Centro de Vitória ..................................................... 75 Figura 53: Museu Angewandte Kunst em Frankfurt, Alemanha ........................................... 80 Figura 54: Pinacoteca de São Paulo, SP ............................................................................ 80 Figura 55: Museu Casa de Portinari em Brodowski, SP ...................................................... 83 Figura 56: Museu Casa Benjamin Constant no Rio de Janeiro, RJ ..................................... 85 Figura 57: Casa Museu Ema Klabin em São Paulo, SP ...................................................... 87 Figura 58: Planta esquemática destacando o grau de conservação dos pisos existentes térreo .................................................................................................................................. 90 Figura 59: Planta esquemática destacando o grau de conservação dos pisos existentes pavimento superior ............................................................................................................. 90 Figura 60: Interior da Casa Muniz Freire. ............................................................................ 91 Figura 61: Interior da Casa Muniz Freire. ............................................................................ 91 Figura 62: Interior da Casa Muniz Freire após ocupações. ................................................. 92 Figura 63: Interior da Casa Muniz Freire após ocupações. ................................................. 92 Figura 64: Pátio descoberto à direita da Casa Muniz Freire. ............................................... 93 Figura 65: Pátio descoberto na entrada da Casa Muniz Freire. ........................................... 93 Figura 66: Esquema de Mapeamento de Danos da Fachada principal Casa Muniz Freire. 94 Figura 67: Fachada principal Casa Muniz Freire. ................................................................ 94 Figura 68: Esquema de Mapeamento de Danos da Fachada lateral Casa Muniz Freire...... 95 Figura 69: Fachada lateral e muro externo da Casa Muniz Freire. ...................................... 95 Figura 70: Muro externo da Casa Muniz Freire. .................................................................. 96 Figura 71: Sala de Jantar, Museu Casa Barbosa, Jaguarão, RS ......................................... 99 Figura 72: Sala de Jantar, Casa Museu Benjamin Constant, Rio de Janeiro, RJ ............... 100 Figura 73: Gabinete/Biblioteca da Casa de Oliveira Vianna, Niterói, RJ ............................ 100 Figura 74: Esquema suposto de setorização da Casa Muniz Freire no Século XIX - Térreo. ......................................................................................................................................... 101 Figura 75: Esquema suposto de setorização da Casa Muniz Freire no Século XIX Pavimento Superior .......................................................................................................... 101 Figura 76: Quadro Conceito “Moodboard”................................................................................... 102 Figura 77: Setorização em Bolhas do Pavimento Térreo................................................... 106 Figura 78: Setorização em Bolhas Pavimento Superior..................................................... 107 Figura 79: Planta de Demolição e Construção Pavimento Térreo ..................................... 108 Figura 80: Planta de Demolição e Construção Pavimento Superior .................................. 108 Figura 81: Planta Baixa Pavimento Térreo ........................................................................ 110


Figura 82: Planta Baixa Pavimento Superior ..................................................................... 110 Figura 83: Corte Transversal AA ....................................................................................... 111 Figura 84: Corte Longitudinal BB ...................................................................................... 111 Figura 85: Fachada Frontal Casa-Museu Muniz Freire...................................................... 114 Figura 86: Fachada Lateral Casa-Museu Muniz Freire. ..................................................... 114 Figura 87: Jardim interno .................................................................................................. 115 Figura 88: Sala de exposição 1 (antigo gabinete) ............................................................. 116 Figura 89: Sala de exposição 4 (antiga cozinha). .............................................................. 116 Figura 91: Sala de Exposição 10 (antigo salão social) ...................................................... 117 Figura 92: Espaço Galeria e Loja. ..................................................................................... 118 Figura 93: Fachada e área pública. ................................................................................... 118


SUMÁRIO

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INTRODUÇÃO .................................................................................................. 11

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CIDADE ALTA, DA PRIMEIRA REPÚBLICA AOS DIAS DE HOJE ................ 15

2.1 2.2 2.3 2.4 2.5

JOSÉ DE MELO MUNIZ FREIRE E A PRIMEIRA REPÚBLICA ......................... 15 JERÔNIMO DE SOUZA MONTEIRO E AS RENOVAÇÕES URBANAS ............ 22 TIPOLOGIAS ARQUITETÔNICAS NA CIDADE ALTA ....................................... 26 AS INCONSISTÊNCIAS NOS ANOS 1970 ........................................................ 43 DEGRADAÇÃO E ABANDONO ......................................................................... 46

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A TRANSIÇÃO DO NEOCLÁSSICO PARA O ECLETISMO ............................ 51

3.1 NEOCLASSICISMO X ECLETISMO E O IMPERIO X REPÚBLICA ................... 51 3.2 MUDANÇAS NAS TÉCNICAS CONSTRUTIVAS............................................... 54 3.3 LARGO DE SANTA LUZIA Nº 02, A CASA DE MUNIZ FREIRE.......................... 64 3.3.1 Os irmãos Barbosa Leão e Colégio São Vicente de Paulo 68 4

NOVOS TEMPOS, ANTIGOS USOS ................................................................ 72

4.1 A REQUALIFICAÇÃO DOS CENTROS HISTÓRICOS ...................................... 72 4.2 A REQUALIFICAÇÃO DE USO EM IMÓVEIS DE INTERESSE DE PRESERVAÇÃO ...................................................................................................... 75 4.3 MUSEUS COMO ALAVANCA DE DESENVOLVIMENTO EM ÁREAS DE INTERESSE DE PRESERVAÇÃO ........................................................................... 77 4.4 CASAS MUSEU - ESTUDOS DE CASO ............................................................ 82 4.4.1 A Casa de Portinari em Brodowski 83 4.4.2 A Casa de Benjamin Constant no Rio de Janeiro 84 4.4.3 A Fundação Ema Klabin – Casa-Museu em São Paulo 86 5

PROJETO DE REQUALIFICAÇÃO DA CASA-MUSEU MUNIZ FREIRE ......... 89

5.1 MAPEAMENTO DE DANOS ............................................................................... 89 5.2 UM PRÓLOGO SOBRE A CASA BRASILEIRA NA PRIMEIRA REPÚBLICA..... 97 5.3 CONCEITO PARA O PROJETO ....................................................................... 102 5.4 O PROJETO ..................................................................................................... 103 5.4.1. Implantação 103 5.4.2 Setorização 104 5.4.3 A Intervenção 108 5.4.4 Materialidade do Projeto 113 5.4.5 Proposta Cromática 113 5.4.6 Perspectivas 115 6

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 119

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REFERÊNCIAS ............................................................................................... 121

APÊNDICE A - PLANTA DE DEMOLIÇÃO E CONSTRUÇÃO PAV. TÉRREO


APÊNDICE B - PLANTA DE DEMOLIÇÃO E CONSTRUÇÃO PAV. SUPERIOR APÊNDICE C - PLANTA BAIXA PAVIMENTO TÉRREO APÊNDICE D - PLANTA BAIXA PAVIMENTO SUPERIOR APÊNCIDE E - CORTES AA E BB ANEXO A - PLANTA BAIXA CASA MUNIZ FREIRE TÉRREO - SEDEC ANEXO B - PLANTA BAIXA CASA MUNIZ FREIRE PAV SUPERIOR - SEDEC ANEXO C - PLANTA DE COBERTURA CASA MUNIZ FREIRE - SEDEC ANEXO D - CORTE AA CASA MUNIZ FREIRE - SEDEC ANEXO E - CORTE CC CASA MUNIZ FREIRE - SEDEC ANEXO F - CORTES BB E DD CASA MUNIZ FREIRE - SEDEC ANEXO G - FACHADAS CASA MUNIZ FREIRE - SEDEC


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INTRODUÇÃO As cidades monótonas, inertes, contêm, na verdade, as sementes de sua própria destruição e um pouco mais. Mas as cidades vivas, diversificadas e intensas contêm as sementes de sua própria regeneração, com energia de sobra para os problemas e as necessidades de fora delas (JACOBS, 2014, p. 499).

Desde o século XX, os centros urbanos no Brasil, em sua maioria, deram início a um processo de degradação e abandono devido, na maioria dos casos, pelo espraiamento urbano (CORREA, 1995). Na cidade de Vitória, não foi diferente, no final dos anos 1970, a atenção e investimentos por parte do governo e empresas privadas foram direcionadas para novas regiões e em novos polos em crescimento da cidade, assim, o Centro Histórico sofre com o esvaziamento, abandono, e dá início ao seu processo de degradação (BOTELHO, 2015).

O Centro Histórico pertencente à capital espírito-santense, abriga rico e diversificado acervo de construções históricas e de interesse de preservação, que na atualidade, infelizmente não se encontram em seu melhor estado de conservação. Esta pesquisa destaca um dos edifícios que se localiza nesse contexto, “Casa de Muniz Freire'', antiga residência do ilustre governador e posteriormente Colégio São Vicente de Paulo. Além de um estudo que dedicado à história capixaba e a figura histórica de Muniz Freire, o trabalho perpassa pelos aspectos materiais da construção, como marco do seu tempo, e uma futura proposta de requalificação de uso para o edifício.

Os imóveis que hoje formam o Centro Histórico de Vitória, pontualmente aqueles da Cidade Alta e mesmo os de maior densidade histórica, apresentam em comum a grande problemática do abandono e o estado de conservação degradado. Torna-se necessária a recuperação dos respectivos edifícios, de forma que sejam resgatados em seus valores materiais e imateriais, respeitando-se antigas técnicas construtivas relacionadas à materialidade do bem. A requalificação do edifício “Casa de Muniz Freire” completa a pesquisa


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uma vez que sua intervenção de restauração perpassa a necessidade de um uso adequado para o imóvel. Importantes edifícios que se encontram nesta lamentável condição de degradação, como o Arquivo Público Estadual, o Forte São João, o Hotel Majestic e a própria Casa Muniz Freire, pertencentes ao Centro Histórico de Vitória, carregam uma arquitetura histórica e de interesse de preservação que contribuem para o crescimento sociocultural da cidade. Promovendo o devido destaque às tipologias arquitetônicas históricas, o centro tem a possibilidade de romper com o processo de abandono e espraiamento urbano, trazendo um resgate ao passado e ressignificando os espaços com usos que são coerentes para uma cidade contemporânea mais humanizada, portanto, mais saudável para os dias atuais.

Como objetivo do trabalho, dispõe-se o enaltecimento e a valorização do Centro Histórico de Vitória, na atualidade e seu papel agregador na identidade local. Aborda reflexões da arquitetura histórica e sua recuperação no momento presente, discutindo os conceitos de restauro e requalificação, as especificidades das construções de diferentes épocas, e a materialidade do bem ligada a tipologia arquitetônica. Apresenta também o reconhecimento e importância das técnicas construtivas tradicionais para a restauração de edifícios históricos como agentes de requalificação das áreas centrais, bem como seus novos possíveis usos que agregam contemporaneidade ao local, ao contrário do estado de abandono e insegurança que vivem na atualidade. Especificamente objetiva-se a requalificação do edifício “Casa de Muniz Freire”, com a proposta de um novo uso, contribuindo para uma cidade e centro urbano mais saudável e menos abandonado. Assim como restauro do mesmo edifício, respeitando sua materialidade e as características históricas e patrimoniais, perpetuando uma arquitetura que reflete a história em seus diferentes momentos e passagens do desenvolvimento da sociedade local.

Partiu-se de uma ampla pesquisa bibliográfica, utilizando livros, artigos científicos e arquivos digitais públicos, para fundamentação teórica acerca da história do Espírito Santo e da cidade de Vitória, da materialidade em


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construções históricas, abandono e recuperação dos centros urbanos, assim como sobre restauro e requalificação. A fundamentação está centrada nos seguintes autores.

Kanan (2008) e Gonzaga (2006), que dissertam a respeito da materialidade em construções históricas brasileiras. A primeira trata da conservação de argamassas, revestimentos à base de cal e acabamentos, com o propósito de aperfeiçoar os processos de intervenção em edifícios patrimoniais. O segundo, se aprofunda no estudo da materialidade da madeira como matéria-prima nobre nos edifícios históricos brasileiros.

Com relação a temática de requalificação, Peixoto (2009) e Tavares (2008), abordam as caraterísticas e impactos dos processos de requalificação e intervenção em um panorama urbano, assim como Botelho (2005), que em especial, direciona suas considerações à requalificação urbana na cidade de Vitória.

Em referência ao restauro e a requalificação de edifícios, Giovanni Carbonara se aprofunda e debate qual o papel do arquiteto restaurador diante de uma intervenção, e disserta sobre esses conceitos. A respeito desse mesmo tema, foi realizado também um estudo sobre as cartas patrimoniais, em especial a Carta de Veneza (ICOMOS, 1964), onde se apresentam as diretrizes sobre conservação e restauração.

Outros autores estudados foram: José Teixeira de Oliveira e Thais Helena Moreira, que se estendem sobre a história do estado do Espírito Santo e da cidade de Vitória, tratando da modernização e avanços urbanos, assim como as mudanças políticas em solo espírito-santense; Jane Jacobs, a respeito de cidades vivas, interessantes e a contribuição para uma cidade mais saudável; e Tarcísio Botelho que aborda a problemática do abandono e a requalificação urbana, em especial do centro histórico de Vitória.

A metodologia de pesquisa, além da pesquisa bibliográfica sobre os temas, como citado, abrange uma pesquisa mais específica com a utilização de


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registros oficiais públicos, tais como plantas, fotos e documentos, a respeito do edifício de interesse de preservação “Casa de Muniz Freire”. Cabe aqui ressaltar ainda, o contexto histórico em que essa pesquisa se desenvolveu, período de pandemia do Covid-19 e isolamento social, em função disso, bem como o estado insalubre da edificação, não foi possível realizar a pesquisa in loco que tanto se estimava.


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2 2.1

CIDADE ALTA, DA PRIMEIRA REPÚBLICA AOS DIAS DE HOJE JOSÉ DE MELO MUNIZ FREIRE E A PRIMEIRA REPÚBLICA

Durante o período imperial, no Espírito Santo, na época, Província do Espírito Santo, surge um importante personagem para a política e história do estado: José de Melo Carvalho Muniz Freire (Figura 1), popularmente chamado de Muniz Freire, era advogado e jornalista, e desenvolveu extensa carreira na política capixaba. Figura 1: Retrato de José Melo de Carvalho Muniz Freire

Fonte: Galeria de Retratos do Palácio Anchieta – Vitória. Cópia Giovanni Mesquita.

Desde o seu nascimento, Muniz Freire residiu com sua família no imóvel de nº 2 no antigo Largo de Santa Luzia, objeto de estudo desta pesquisa, provavelmente construído por seu pai Manoel Feliciano Moniz Freire, já que o mesmo era engenheiro (O ESPÍRITO-SANTENSE, 1876. apud RIBEIRO, 2021).


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Após a morte do pai, em 1877, o jovem de 16 anos inicia o curso da Faculdade de Direito do Recife, e em 1881, conclui o bacharelado na Faculdade de Direito de São Paulo, onde também, se casou com a paulista Colatina Soares de Azevedo (Figura2), com quem teve 10 filhos (SALETTO, 1997, apud RIBEIRO, 2021). Figura 2: Retrato de Colatina Soares de Azevedo

Fonte: Diário Digital Capixaba.

Ao voltar para Vitória, em 1882, além de abrir um escritório de advocacia com seu colega Afonso Cláudio de Freitas Rosa, fundou um dos principais jornais existentes em Vitória naquele período. O periódico, tinha como nome “A Província do Espírito Santo”, era de edição diária com tiragem de mais de 1.500 exemplares, este, fundado em parceria com Cleto Nunes Pereira. Com a chegada da República em 1889, o jornal passa a se chamar “Diário do Espírito Santo” e depois “Estado do Espírito Santo” (OLIVEIRA, 2008, p.416).

Seu início na política ocorre após sua filiação ao Partido Liberal, sendo eleito a vereador e deputado provincial, cargo este que não chegou a assumir devido à Proclamação da República.


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Após a proclamação da República no Brasil, em 15 de novembro de 1889, Afonso Cláudio é nomeado ao cargo de Presidente de Estado (atual cargo de Governador), este, devido a problemas de saúde, não exerce a administração do estado como o esperado, passando o cargo a Constante Gomes Sodré (OLIVEIRA, 2008).

Como afirma Oliveira (2008), Constante Sodré realiza os primeiros feitos marcantes para o estado, dentre eles, decreta a Constituição provisória estadual (vinte de junho de 1891), que permaneceu em vigor até a promulgação da que foi elaborada pelo Congresso. O projeto de Constituição foi elaborado pela seguinte comissão, nomeada pelo governador do Estado: Muniz Freire, Horta de Araújo, José Horácio, Barcímio Barreto e Manoel Augusto da Silveira (informação devida a Adelfo Monjardim) (OLIVEIRA, 2008, p.429).

Em 1890, de acordo com Moreira (2008), ocorreu um encontro do Partido Republicano na cidade de Vitória. O evento resultou na subdivisão do partido em dois principais. O primeiro, chamado de União Republicana EspíritoSantense, se formou com os antigos líderes do Partido Conservador do Partido Liberal, Barão de Monjardim e Aristides Freire.

E em contraponto, aqueles que eram fiéis ao situacionismo e conservadores uniram-se formando o Partido Republicano Construtor, dirigido por Muniz Freire (OLIVEIRA, 2008).

O início da república no Espírito Santo foi intenso e caótico, marcado por grande instabilidade política: Querendo dar uma ideia do que foi a agitação durante os primeiros governos republicanos no Espírito Santo, José Cândido salientou que, em 1890 e 91, passaram pelo Governo do Estado onze pessoas (OLIVEIRA, 2008, p. 434, apud NORONHA SANTOS, Floriano, 205).

O governo que antecedeu o de Muniz Freire, é comandado por Antônio Aguirre, que sob pressão popular, abandonou o governo, que passou a ser exercido pela Junta Governativa, um triunvirato composto por Inácio Henrique de


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Gouveia, Graciano dos Santos Neves e Galdino Teixeira Lins de Barros Loreto (OLIVEIRA 2008).

O primeiro governo de Muniz Freire como Presidente do Estado ocorreu de 1892 a 1896. A nova constituição foi promulgada no mesmo dia da eleição. As principais diretrizes do seu programa de governo eram direcionadas a construção de vias-férreas e o povoamento do solo. Para materializar os projetos, era necessário atrair capital, que assim fez, realizando favores especiais (OLIVEIRA, 2008).

A contratação da vinda de vinte mil imigrantes italianos para a lavoura foi outra ação marcante de seu governo. Porém, segundo Moreira (2008), os imigrantes encontraram nas terras capixabas precárias condições de trabalho e transporte, falta de assistência médica e escolar, alojamentos precários e localização dos terrenos isolada. Assim, o cônsul italiano divulgou um relatório, afirmando que o governo não cumpria as garantias que constavam no decreto estadual “Lei da Imigração”, fazendo com que a Itália interrompesse o fluxo migratório para o estado em 1895.

Também durante este mandato, o governador capixaba efetua o primeiro empréstimo externo com a França, no valor de 17.500.000 francos franceses, que tinha como destino as obras da estrada de ferro Sul do Espírito Santo. Três anos depois, o primeiro trecho foi inaugurado, este, conectava o porto das Argolas e a então vila de Viana (MOREIRA, 2008).

Como aponta Oliveira (2008), a exportação de café, em 1893, ascendeu mais de 20 milhões de quilos, a maior até então. Dessa forma, o então Presidente Muniz Freire, diante dos acontecimentos, se expressa de forma animadora: O Estado, que até os últimos dias que antecederam à Constituição republicana, era arrolado nas estatísticas oficiais como um fardo da Nação, revelando rapidamente o seu cabedal de riqueza e de vida própria, sopesando sem constrangimento algum os grandes ônus da nova situação política, apresenta um orçamento cinco vezes maior que o da antiga Província (OLIVEIRA, 2008, p. 435).


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Apesar dos avanços na área de transporte, a capital Vitória, se encontrava em condições higiênicas precárias e ainda guardava seu aspecto colonial, portanto Muniz Freire delegou o saneamento da cidade e o projeto do novo arrabalde a Saturnino de Brito, engenheiro que projetou uma construção cinco vezes maior em área que a capital até então (Figura 3) (OLIVEIRA, 2008). Figura 3: Projeto de um Novo Arrabalde, por Saturnino de Brito.

Fonte: Francisco R. Saturnino de Brito (1943, v. V, est. II, p.58).

O projeto seguia os princípios positivistas dos republicanos e segundo Moreira (2008, p. 84), o impacto causado pela proposta, a respeito da setorização urbana, ecoa até o momento atual: “[...] o novo arrabalde implicava uma separação física e simbólica, sendo de certa forma o precursor das comunidades fechadas de hoje”.

O presidente de estado era considerado por muitos como progressista e dentro de seu projeto de modernização da cidade foram realizadas: obras de ligação do Cais do Imperador com a Rua da Alfândega, pondo em comunicação direta todas as vias da orla marítima; instalação de engenho central em Itapemirim e fábricas de tecido em Vila Velha e Benevente; reorganização da Escola Normal; e a inauguração do teatro Melpômene (Figura 4), no largo da conceição, atual praça Costa Pereira.


20 Figura 4: Reprografia colorida do Theatro Melpômene, 1906.

Fonte: Coleções Especiais da Biblioteca Central da UFES, Acervo Fotográfico (Mário Aristides Freire, p.20, Foto 297).

Inaugurado em vinte e um de maio de 1896, o Teatro Melpômene, um dos principais cartões postais da época, foi construído todo em madeira pinho de Riga. Com a ascensão do cinema em nível mundial, o teatro passa por adaptações e funciona como cineteatro. “O aspecto era belíssimo e, internamente, satisfazia perfeitamente, com belas decorações e ótimas instalações” (DANTAS, 2017). As galerias e camarotes repousavam em colunas de ferro. Cobertura de telhas francesas. No estilo neo-renascentista, sua lotação era de 1.200 lugares. O edifício ocupava um papel de destaque na cidade, porém, durante uma sessão de cinema, um incêndio se inicia no teatro, instaurando o caos para o público. Após o episódio, o edifício foi interditado e em 1925 foi desmontado (OLIVEIRA, 2008).

O mandato de Muniz Freire, terminou com o estado extremamente endividado, porém com uma surpreendentemente popularidade positiva para o Presidente de Estado.

Graciano dos Santos Neves foi o sucessor de Muniz Freire como Governador. Em 1896, recebeu o Estado em situação problemática, o café vivenciava uma grande queda de preço, afligindo o comércio e a economia capixaba (OLIVEIRA, 2008). O novo presidente suspendeu as obras que seu antecessor


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havia planejado, com exceção do projeto da viação férrea. Graciano renunciou em seguida e o governo passou pelas mãos de Constante Sodré e José Marcelino Pessoa de Vasconcelos até as eleições de 1900 (OLIVEIRA, 2008).

Entre os anos de 1896 e 1900, Muniz Freire viaja à Paris, como representante do governo do estado do Espírito Santo, com o objetivo de negociar o empréstimo realizado em seu governo, e também adquirir fundos para a finalização da construção da Estrada de Ferro Sul do estado. Já que a conexão da capital Vitória com a cidade de Cachoeiro de Itapemirim, proposta pela Estrada de Ferro, era de grande importância econômica, pois a cidade de Cachoeiro se destacava na região polarizada produtora de café.

Em 1900, o segundo mandato de Muniz Freire tem início. O estado continua em uma séria crise cafeeira e entra em um período de seca. Com o colapso econômico, acaba tendo que solicitar moratória aos credores estrangeiros (OLIVEIRA, 2008).

Apesar disso, o projeto de estradas de ferro continua, e as obras para conectar Vitória e Diamantina por via férrea começam (MOREIRA, 2008). Muniz Freire queixava-se a respeito da situação do estado, que o impedia de empreender qualquer obra pública: Os Estados brasileiros que têm a sua fortuna pública fundada em um valor que, de ano a ano, mais se afunda, e para o qual nenhuma salvação parece próxima, como é atualmente a lavoura do café [...] (Mensagem apresentada ao Congresso Legislativo na abertura da terceira sessão da quarta legislatura pelo presidente do Estado, em vinte e dois de setembro de 1903. Vitória – 1903) (OLIVEIRA, 2008, p. 462).

Ao deixar a presidência do estado do Espírito Santo, em 1904, assume o cargo de Senador no Rio de Janeiro, na época sede da República do Brasil, e permanece nessa função até ser derrotado nas eleições de 1915.


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2.2

JERÔNIMO DE SOUZA MONTEIRO E AS RENOVAÇÕES URBANAS

Em 1908, começa o mandato de quatro anos de Jerônimo de Souza Monteiro (1870-1933) (Figura 5) como Presidente de Estado. Nascido em Cachoeiro de Itapemirim, estudou Direito em São Paulo, onde conheceu e casou-se, em 1897, com Cecília Bastos, com quem teve oito filhos (NOVAES, 2017). Figura 5: Retrato de Jerônimo de Souza Monteiro

Fonte: Galeria de Retratos do Palácio Anchieta – Vitória. Cópia Giovanni Mesquita

Após formado em Direito, inspirado pelas projeções de Muniz Freire, ingressa na política. Em 1895, elegeu-se Deputado Estadual, cujo êxito do mandato o projetou para em 1897 ser eleito como Deputado Federal (NOVAES, 2017).

Após o mandato, advogou em Cachoeiro até 1903, e após esse período se mudou com a família para o município Santa Rita de Passa Quatro, no estado de São Paulo, onde continuou advogando. Nesta cidade atuou também como jornalista e redator da “União Municipal”.

Durante o governo de Henrique Coutinho (1904-1908), Dr. Jerônimo Monteiro era constantemente requisitado para solucionar problemas financeiros que o estado enfrentava:


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Recorreu, então, mais uma vez, o Cel. Henrique Coutinho ao Dr. Jerônimo e encarregou-o de providências para solucionar as dificuldades mediante uma operação que liquidasse a dívida do Banco do Brasil, e a alienação da Estrada de Ferro Sul do Espírito Santo a alguma empresa poderosa (NOVAES, 2017, p.74).

Em 1908, Jerônimo venceu as eleições para Presidente de Estado do Espírito Santo, sendo ele muito querido pelos cidadãos. “Não foi uma eleição, alguém o afirmou: sim, uma verdadeira consagração popular!” (NOVAES, 2017, p.97).

O quadriênio (1908-1912), que apesar de receber a primeira greve operária e manifestações populares, foi marcado de forma positiva pelas melhorias urbanísticas no Espírito Santo. Chamado de “doutor modernizador”, Jerônimo foi influenciado pela reforma urbana carioca (Figura 6) realizada por Pereira Passos, e encabeçou o plano de urbanização que empreendeu no estado, com ênfase na capital Vitória (MOREIRA, 2008, p. 90). Figura 6: Avenida Central (atual Rio Branco) no Rio de Janeiro, inaugurada em 1904 idealizada por Pereira Passos na Reforma Urbana.

Fonte: Foto Augusto Malta. Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro. s.d.


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Segundo Moreira (2008), o início da modernização do estado, dá-se com a criação da Prefeitura Municipal de Vitória. Juntamente com o prefeito, Ceciliano Abel de Almeida, Jerônimo executou melhorias como nivelamentos e calçamento das principais vias capixabas, como também a construção e reformas das escadarias que realizam a conexão entre Cidade Alta e Cidade Baixa.

Dentre os grandes feitos do Presidente do Estado estão: a abertura de novas ruas e estradas; serviços de água, esgoto e luz foram consolidados; a implantação do sistema de bondes elétricos (Figura 7); incentivo à produção agrícola; melhoria na indústria pecuária; desenvolvimento do ensino público; criação da Vila Moscoso e Parque Moscoso (Figura 8); e construção da usina de açúcar de Paineiras, na época considerada a melhor do Brasil (OLIVEIRA, 2008). Figura 7: Avenida Jerônimo Monteiro com os trilhos onde passavam os bondes elétricos.

Fonte: IJSN. s.d.


25 Figura 8: Vista do Parque Moscoso em Vitória, ES.

Fonte: IJSN. s.d.

Quanto aos edifícios públicos, Oliveira (2008) ressalta: a reconstrução do antigo Colégio de Jesuítas, que com a intervenção se tornou, verdadeiramente, Palácio do Governo; a construção do atual Hospital da Misericórdia; e a criação da Caixa Beneficente Jerônimo Monteiro, que proporcionava a construção de moradias para o funcionalismo público (Figura 9). Figura 9: Moradias populares executadas pela Caixa Beneficente no entorno do Parque Moscoso.

Fonte: Arquivo Público Espírito Santense. s.d.


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Diferente de Muniz Freire, Jerônimo Monteiro desenvolveu seu programa de obras sem solicitar empréstimos, além disso, conseguiu de forma exemplar abater as dívidas de seus antecessores (OLIVEIRA, 2008). 2.3

TIPOLOGIAS ARQUITETÔNICAS NA CIDADE ALTA

As primeiras construções na Vila da Vitória surgem no meado de século XVI, com a ocupação da Sede da capitania na antiga Ilha de Santo Antônio. Localizadas na Cidade Alta, as primeiras edificações que se tem registro mais firmes foram as igrejas coloniais, em especial a Capela Santa Luzia e a Igreja São Gonçalo, que foram as únicas daquele período (dentre cerca de sete igrejas existentes) que permaneceram conservadas na Cidade Alta de Vitória (RIBEIRO, 2018).

A Capela Santa Luzia (Figura 10), considerada a edificação mais antiga da cidade, foi construída no século XVI, como uma capela particular dentro dos limites da propriedade rural de Duarte Lemos, segundo donatário da Capitania do Espírito Santo. Erguida sobre uma formação rochosa, a Capela é a única com ainda com características da arquitetura religiosa rural de matriz lusobrasileira do período colonial, na Cidade Alta de Vitória. Em 1943 foi restaurada pelo profissional autodidata André Carloni, e após o restauro foi tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Nos dias de hoje, a Capela funciona apenas para visitação, atraindo visitantes por sua história e arquitetura (SANTOS, 2014). Figura 10: Capela Santa Luzia, em Vitória - ES.

Fonte: IPHAN, s.d.


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Quanto às características tipológicas da Capela Santa Luzia, Ribeiro (2018) pontua: [...] a Capela caracteriza-se por um frontão arrematado por volutas e torre sineira única, quase da altura da nave da capela. Encontra-se geminada a uma construção moderna, resultando em um edifício com apenas três fachadas, sendo a lateral cega (RIBEIRO, 2018).

A Igreja São Gonçalo (Figura 11), provavelmente erguida em 1707, se caracteriza como o segundo conjunto mais antigo remanescente do colonialismo (RIBEIRO, 2018). Erguida pela Irmandade de Nossa Senhora do Amparo e da Boa Morte, inicialmente configurada como uma capela, levava o nome da própria irmandade, e posteriormente, em 1766, passou a ser chamada pelo nome do santo à que foi consagrada, São Gonçalo (SANTOS, 2014). Figura 11: Igreja São Gonçalo em Vitória, ES.

Fonte: IPHAN.

Conhecida como igreja dos casamentos duradouros, a Igreja São Gonçalo, segundo Ribeiro (2018), apresenta fundações diretas e estrutura em alvenaria


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de pedra, argamassada com cal e areia, sua principal fachada dispõe de janelas para o coro assegurada por grades de madeira, e portada almofadada, com quadro de madeira e verga em arco abatido. A portada, é coroada por um frontão composto de volutas e pináculos, que emolduram o óculo circular, e o mesmo, se encontra fechado com caixilho de madeira e vidro.

No ano de 1929, a igreja passou por reformas e recebeu imagens de santos, que como afirma Santos (2014), “são consideradas as mais belas e preciosas do Estado”. Deste modo, em 1948, o IPHAN realiza o tombamento da igreja como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, e junto dele as imagens dos santos que compõem o acervo sacro. A igreja, que foi erguida em localidade privilegiada, possuía vista para o mar, porém, com a modernização da cidade, demolições dos sobrados e construção de altos edifícios, acabou rodeada de edificações perdendo sua posição privilegiada frente a uma imensidão de prédios.

As duas igrejas presentes na Cidade Alta de Vitória, diferente das arquiteturas religiosas barrocas encontradas no Rio de Janeiro e na Bahia, que se caracterizam por rica ornamentação e trabalhos de cantaria lavrada, apresentam um estilo barroco simplificado, com destaque para suas fachadas lisas caiadas de branco, portas, janelas e óculos com molduras em argamassa ou madeira, e frontões curvos (RIBEIRO, 2018).

Outro representante da arquitetura sacra colonial na Cidade Alta do Centro Histórico de Vitória é o Convento de São Francisco (Figura 12). Inaugurado em 1537, o Convento possuía além da igreja, o claustro e a capela, no século XIX, o convento foi perdendo sua função inicial, e seu espaço é utilizado para diversas atividades, como escola elementar e enfermaria para tratar das epidemias da época (SANTOS, 2017).


29 Figura 12: Convento São Francisco, em Vitória - ES.

Fonte: IPHAN.

Hoje,

os

remanescentes

arquitetônicos

do

Convento,

após

muitas

intervenções, funcionam como sede da Cúria Metropolitana, sendo pouco visitado por apenas abrigar atividades administrativas da Igreja Católica. O conjunto passou por algumas reformas e restauros nas últimas décadas. Anexo ao Convento, há a Capela Nossa Senhora das Neves (Figura 13), também com características coloniais, a Capela em forma de cruz também recebeu diferentes usos, sendo o mais primitivo o de capela mortuária. Figura 13: Capela Nossa Senhora das Neves em Vitória - ES.

Fonte: IPHAN.


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Quanto à arquitetura civil no período colonial, podemos destacar a adesão das tradições ibéricas seculares nas construções, estas, foram influenciadas pela arquitetura medieval e regidas pelas Cartas Régias. Assim, a paisagem urbana capixaba se configurava nos mesmos padrões de diferentes localidades colonizadas também pelos portugueses, como Macau na China (Figura 14), ou Luanda em Angola (RIBEIRO, 2018). Figura 14: Cidade colonial, Macau, na China.

Fonte: Planta de Macau in BOCARRO, António. Livro das Plantas de todas as fortalezas, cidades e povoações do Estado da Índia Oriental. 1635.

As características destes edifícios “tradicionais” portugueses, se davam nas paredes caiadas de branco, nas janelas quadradas ou retangulares com molduras de madeira ou pedra, vergas (retas ou arqueadas) acima de portas de janelas, e telhas de barro formando os telhados com beirais.

Ao longo das décadas, a arquitetura colonial, com suas respectivas características, que era conhecida no século XVI, foi se transformando. A maior mudança, se deu na segunda metade do século XVII, com o reformismo pombalino, com ele foram introduzidas as portas-balcão, junto de grades de ferro, e nos andares superiores dos sobrados dos mais abastados, os ornamentos trabalhados em estuque.


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Posteriormente, a partir das modernizações e reformas urbanas iniciadas pelo governo de Jerônimo Monteiro, em 1912, e até os anos 1970, as construções características do período colonial foram sendo demolidas com a finalidade de dar espaço a edifícios mais modernos. Desse modo, apenas dois sobrados (Figura 15) peculiares à arquitetura civil de matriz luso-brasileira permanecem na cidade de Vitória atualmente, os dois, geminados, se localizam na Rua José Marcelino, números 197 e 203/205, ao fundo da Catedral Metropolitana (IPHAN). Figura 15: Sobrados da Rua José Marcelino em Vitória, ES.

Fonte: Autora, 2021.

Os respectivos sobrados, foram tombados pelo IPHAN em 1967, e hoje, um deles abriga a sede daquele instituto. As edificações apresentam registros históricos de 1875, e foram construídas com o objetivo de serem utilizadas como residência ou abrigarem uso misto. Em 2014 e 2016 foram realizadas obras de restauro e ampliação nas mesmas.


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Ainda sobre essas duas construções, Ribeiro (2018) destaca “Embora não possuam monumentalidade, os dois sobrados foram tombados por sua historicidade, isto é, por serem os últimos vestígios das antigas edificações de Vitória”.

Como representação urbana do período colonial, a Rua Muniz Freire, uma das primeiras ruas capixabas, se destaca como digna representante do período. Típica rua-corredor, ou seja, casas geminadas dos dois lados e alinhadas pela divisa frontal, abrigou por décadas treze imóveis intercalados por três terrenos vazios. Os imóveis carregam grande apelo histórico, e chegaram a ser tombados pelo Governo Estadual. Contudo, apesar do tombamento e da qualidade da arquitetura urbana existente, em novembro de 1983, por meio de uma determinação de uma instituição pública estadual, três dos cinco imóveis tombados foram demolidos.

Um importante sobrevivente das demolições, foi a edificação de número 55 (Figura 16), "considerada um de seus vestígios mais preciosos” (RIBEIRO, 2018). E outros remanescentes, porém já descaracterizados são o Casarão Cerqueira Lima e a Casa de Muniz Freire, mais adiante, objeto desta pesquisa. Figura 16: Casa nº 55 na Rua Muniz Freire em Vitória, ES.

Fonte: Autora, 2021.


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Na terceira década do século XIX, inicia o Período Imperial no Brasil. Contudo, a transformação da cidade do período colonial para as condições do império, foi tênue; o traçado colonial não sofreu grandes mudanças, porém o porto se fortaleceu como centro das atividades econômicas da província.

Nesse período o neoclassicismo ascendia no Brasil, marcado pela presença da corte, como um estilo recorrente. Como destacado por Ribeiro (2018), para ser classificado como neoclássico o edifício precisava conter duas características basilares: telhado com platibanda (telhado sem beiral e ocultado por mureta de alvenaria), e portas em forma de púlpito ou balcões no pavimento superior sob vergas em arco.

Por esta razão, o estilo era encontrado em uma diversidade de edifícios como fazendas, igrejas, palácios e moradias simples. E muitos dos edifícios existentes, com características do período colonial, passaram por pequenas reformas para adequação ao novo estilo.

As construções em que moravam as pessoas mais abastadas, apresentavam maior riqueza em seus detalhes, nessas casas era comum os frontões triangulares, adornos sobre as platibandas e os arcos e colunas de pedra.

Em Vitória, as construções neoclássicas, em sua maioria, se concentravam nas áreas mais baixas do centro da cidade, como armazéns e edifícios comerciais, mas na Cidade Alta destacavam-se a antiga sede dos correios e o palácio da justiça (Figura 17). Com as adaptações e demolições do século XX, apenas um sobrevivente característico neoclássico restou na Cidade Alta: a Casa de Muniz Freire (Figura 18), objeto desta pesquisa, que apesar de seu estado de degradação, constitui uma importante representação do estilo e de sua época na capital capixaba.


34 Figura 17: Antigo Palácio da Justiça, neoclássico perdido na Cidade Alta de Vitória.

Fonte: Memória Capixaba, s.d.

Figura 18: Imóvel n° 2 no antigo Largo de Santa Luzia, Casa de Muniz Freire, depois Colégio São Vicente de Paulo.

Fonte:Memória Capixaba, c.a. 1914.


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Outras marcantes edificações deste período são os edifícios localizados no entorno do Parque Moscoso (Figuras 19 e 20). Figura 19: Edifício Neoclássico em frente ao Parque Moscoso em Vitória, ES.

Fonte: Google Street View.

Figura 20: Edifício Neoclássico em frente ao Parque Moscoso em Vitória, ES.

Fonte: Google Street View.


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Logo após o período imperial no Brasil, tem início o período da Primeira República ou República Velha, este, é marcado pela ascensão do estilo eclético em detrimento ao neoclassicismo bastante identificado com o deposto império.

Do ano de 1889 a 1930, a política, no Espírito Santo, foi descrita por grande instabilidade, com a passagem de muitos presidentes de estado em um curto período de tempo. Na economia, a produção cafeeira manteve seu destaque e os portos permaneciam como núcleo das principais atividades econômicas (MOREIRA, 2008).

Neste decorrer, aconteceram diversas transformações na cidade de Vitória: o projeto de Saturnino de Brito para o Novo Arrabalde e o aumento da mancha urbana da capital; a inauguração de pontes que conectam a ilha ao continente; o início da circulação dos bondes elétricos pela cidade; e o carnaval já era uma tradição que movimentava e alegrava a população (MOREIRA, 2008).

No século XX, as vias se urbanizaram e edifícios importantes surgiram, o Teatro Carlos Gomes (Figura 21), na Praça Costa Pereira, que segundo Thais Helena Moreira (2008), era já conhecido como “endereço das artes e das solenidades”; a Santa Casa da Misericórdia, o Arquivo Público Espírito Santense (Figura 22), o Palácio Sonia Cabral, antigo Palácio Domingos Martins (Figura 23), ocupando o local da antiga Igreja da Misericórdia, e o Mercado Capixaba foram outros marcantes edifícios com características ecléticas. Nesse período foram inaugurados o Parque Moscoso - que funcionou até 1908 como “lixão” a céu aberto - e seu bucólico traçado de jardim romântico, moda inglesa.


37 Figura 21: Teatro Carlos Gomes em Vitória, ES.

Fonte: IJSN.s.d.

Figura 22: Arquivo Público Espirito Santense.

Fonte: APEES, s.d.


38 Figura 23: Antigo Congresso Estadual e Assembleia Legislativa, atualmente Palácio da Cultura Sônia Cabral

Fonte: Autora, 2021.

O Palácio Anchieta (Figura 24), adquiriu sua feição eclética mediante a reforma e embelezamento do arcabouço histórico da arquitetura colonial do antigo Colégio de São Tiago, ou Colégio dos Jesuítas. O colégio foi construído originalmente em 1587, sendo reformado no governo de Jerônimo Monteiro (1908-1912) e nos anos 1940, recebeu o nome oficial de Palácio Anchieta, sendo tombado pelo Conselho Estadual de Cultura em 1983 (OLIVEIRA, 2008). Figura 24: Palácio Anchieta em Vitória, ES.

Fonte: IJSN. s.d.


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Os edifícios citados acima, apresentam em comum não só época de construção, como também o estilo arquitetônico, denominado estilo eclético. Como apontado por Ribeiro (2018) “No ecletismo, qualquer referência estética pode ser apropriada e usada em um edifício”. O movimento surgiu na Europa, refletindo o fim da submissão da burguesia com a nobreza. Anteriormente, os mais afortunados ditavam regras e tradições, diferente do momento em questão, onde a população podia livremente escolher suas referências arquitetônicas e misturá-las.

Outra edificação marcante deste período é o Mercado Capixaba (Figura 25). Projetado pelo arquiteto Joseph Pitilick, com dois pavimentos, apresentava em sua fachada faixas lisas com molduras retangulares, relevos na platibanda, rusticações no reboco, e centralizado com o edifício o frontão junto do brasão do Estado do Espírito Santo, caracterizando o edifício como público. O mercado era um núcleo das atividades da época, sempre com muito movimento de pessoas e mercadorias (HERMANNY, 2009). Figura 25: Mercado Capixaba em Vitória, ES.

Fonte: Ipatrimonio – Google Street View.


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Nos anos 1970, com a construção do mercado da Vila Rubim, o Mercado Capixaba foi sendo desocupado e abandonado. Alguns diferentes usos foram propostos e ocuparam a edificação, porém após um incêndio em 2002, o mercado se encontrou mais uma vez abandonado (HERMANNY, 2009).

Em Vitória, o neoclassicismo foi rapidamente substituído por edifícios ecléticos variados. Outra característica importante que contribuiu para a popularidade e crescimento do estilo foi a utilização de técnicas construtivas mais rápidas e baratas do que as tradicionais. Para reproduzir cúpulas, colunatas, mansardas e torreões, eram erguidas estruturas de aço, revestidas de argamassas industriais imitando granito e mármore. O concreto armado era utilizado para a construção de catedrais neogóticas, e as estátuas e colunas eram feitas de cimento ou ferro mediante o uso de maquinário mecânico e a vapor (RIBEIRO, 2018).

A Catedral Metropolitana de Vitória (Figura 26) é também uma representante deste período. Construída inicialmente no século XVI, sob o nome de Igreja Nossa Senhora da Vitória, a igreja passou por diversas reformas até o ano de 1918, quando foi totalmente demolida e substituída pela atual construção de caráter neogótico (SANTOS, 2014). Figura 26: Catedral Metropolitana de Vitória.

Fonte: Ipatrimonio. s.d.


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A reconstrução da Catedral, comandada pelo profissional autodidata André Carloni, apresenta estilo neogótico em cruz latina e duas torres sineiras. As obras permearam por décadas, sendo sua conclusão no final dos anos 1960 e seu tombamento pelo Conselho Estadual da Cultura em 1984 (SANTOS, 2014).

No Brasil e na cidade de Vitória, as modernizações após a Primeira República (1889-1930) não cessaram, e em 1930, João Punaro Bley assume o governo como interventor (1930-1943). Como dito por DE PAULA FILHO (2017) “A arquitetura se transformou em um instrumento da ideologia política autoritária”, ou seja, no Brasil, o Estado Novo utilizava da monumentalidade e serenidade dos edifícios públicos para representar a presença do governo.

Nesse período, o Art Déco foi muito utilizado, principalmente em edifícios públicos institucionais, principalmente por sua funcionalidade, eficiência e economia, além de sua estética europeia, originada na França. O termo “Art Déco" surgiu em 1925 na Exposition Internationale des Arts Décoratifs et Industriels Moderne (tradução livre do francês como “Exposição Internacional de Artes Decorativas e Industriais Modernas”), porém só nos anos 1960 que foi designada para caracterizar tais produções. Ainda sobre a nomenclatura, Farias (2019), aponta: Alguns autores entendem (entendiam) que os termos protomoderno e art déco referem-se a mesma arquitetura; outros, entretanto, distinguem as construções protomodernas que “deslocam” a ornamentação das fachadas para a volumetria, configurando composições compostas. (FARIAS, 2019, p.4)

As características do estilo englobam o uso de formas geométricas puras, simetria e ritmo constante, hierarquização dos elementos de esquadrias e coroamento, valorização dos acessos e portarias, e revestimentos bem definidos, destacados por seus contrastes. A arquitetura civil se apossou das mesmas formas do Art Déco encontradas nos edifícios públicos institucionais, e apesar de algumas descaracterizações, contribuíam para um visual em harmonia (DE PAULA FILHO, 2017).


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O uso do concreto armado, típico do estilo, colaborou para a verticalização da cidade. Assim, foram construídos os edifícios mais altos até então, como menciona Moreira (2008): [...] em 1940, foi concluído o edifício Antenor Guimarães, ao pé da escadaria São Diogo, de seis andares, por alguns anos a construção mais alta de Vitória. (MOREIRA apud HEES, 2008, p.111)

O governo interventor de Bley, mesmo em crise econômica, realizou grandes investimentos na área de saúde e educação, e executou um grande número de obras, tidas como necessárias para a implementação de políticas do Estado Novo. (MOREIRA, 2008, p.108). Assim, o Art Déco na arquitetura capixaba simbolizava a modernização e progresso da sociedade, refletindo a mensagem política do Estado Novo.

Os edifícios Art Déco ainda existentes no Centro de Vitória são a Associação dos Funcionários Públicos do Espírito Santo (Figura 27); a antiga Câmara Municipal; o Centro de Saúde de Vitória; o antigo Colégio do Carmo; a Sede dos Correios; e muitos outros de uso comercial e residencial, espalhados pela área central, no entanto bastante descaracterizados. Figura 27: Associação dos Funcionários Públicos do ES.

Fonte: A Gazeta Online.


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2.4

AS INCONSISTÊNCIAS NOS ANOS 1970

A década de 1970 encontra-se inserida no período do Regime Militar no Brasil. Nessa época, o Espírito Santo teve quatro governadores biônicos, sendo eles escolhidos pelo Governo Federal, Christiano Dias Lopes Filho (1967-1971), Artur Carlos Gerhardt dos Santos (1971-1974), Élcio Álvares (1975-1978), e Eurico Rezende (1979-1983).

No respectivo período, o estado passava por grave crise econômica, gerada principalmente pela erradicação dos cafezais, resultando em um processo de êxodo rural. Assim, a região da Grande Vitória se deparou com um grande crescimento urbano e populacional desordenado, e como consequência do aumento da população, os serviços públicos se mostraram insuficientes para atender a demanda; e problemas como a degradação ambiental, desemprego e favelização se intensificaram (MOREIRA, 2008).

Com o objetivo de amenizar a crise econômica estadual, foram estabelecidos incentivos fiscais com a criação do FUNRES (Fundo de Recuperação Econômica do Espírito Santo), GERES (Grupo Executivo de Recuperação Econômica), BANDES (Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo) e FUNDAP (Fundo para o Desenvolvimento de Atividades Portuárias), atraindo dessa forma, investimentos industriais, resultando em grandes projetos, como o complexo portuário.

Tal complexo, abrigava o recém-inaugurado Porto de Tubarão, e foi um grande responsável pelo desenvolvimento do bairro de Jardim Camburi (MOREIRA, 2008). Além de Jardim Camburi, durante os seguintes anos, outros bairros avançaram em desenvolvimento como Jardim da Penha, Mata da Praia e Goiabeiras. A cidade finalizou também obras de aterramento em diversas áreas, como Praia do Canto, Praia do Suá e Santa Helena. Bairros novos surgiram, como as ocupações dos manguezais que resultaram nos bairros São Pedro I, II, III, IV, e V. As Ilhas do Boi e do Frade foram inseridas no tecido urbano capixaba (PMV, 2016).


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No decorrer das décadas seguintes, além da Universidade Federal do Espírito Santo ganhar novos edifícios em Goiabeiras, foram realizadas as obras da Segunda Ponte (Ponte do Príncipe), a nova Rodoviária, a Terceira Ponte, Projetos Habitacionais, o Aeroporto, a CEASA (Central de Abastecimento S.A.), ampliação de vias, e a implantação do Sistema Aquaviário (MOREIRA, 2008).

Paralelo ao crescimento populacional e urbano desordenado na cidade de Vitória, o Centro da cidade, bairro já consolidado, sofreu maior adensamento, contribuindo para a intensificação do processo de verticalização da região. Por todo o bairro, incluindo a Cidade Alta, muitos edifícios baixos com características históricas consideráveis foram demolidos para dar espaço às novas e verticalizadas edificações.

Durante os anos 1970 e início dos anos 1980, o Centro de Vitória, apesar de não abrigar novas edificações de rico valor arquitetônico, continuava como polo adensador, e concentrava as principais atividades econômicas, institucionais e culturais da cidade.

Quanto às tipologias construtivas desse período, é notável a não existência de uma unidade estilística nas construções erguidas. O Centro Histórico de Vitória se estabeleceu como um acervo de edifícios históricos com uma variedade de tipologias (arquitetura colonial, neoclássica, eclética e art déco), que representam as diferentes épocas vividas na área.

Dessa forma, as novas edificações construídas no bairro, continham influência de diferentes novos estilos, como o brutalismo paulista e exemplares da escola carioca do modernismo, porém a execução dos mesmos era marcada pela adaptação estilística às características culturais e geográficas locais.

Neste período, surge na Cidade Alta de Vitória edifícios que vieram colaborar para a individualização do espaço urbano e para a sensação de insegurança tão presentes na região atualmente. Alguns exemplares na Cidade Alta


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marcam a degradação da área seja pela sua monofuncionalidade, seja pelo aspecto estético austero e pouco convidativo.

Na Praça João Clímaco (Figura 28) é notável a disparidade entre os edifícios históricos de baixo gabarito e os mais recentes e verticalizados. Sendo a maior concentração deles na Rua Pedro Palácios, os altos edifícios desencadeiam em um sombreamento excessivo, que somado a falta de escala humana e térreo ativo, geram a sensação de insegurança para os cidadãos e contribuem para uma cidade de vitalidade comprometida. Figura 28: Vista da Praça João Clímaco em direção à Rua Pedro Palácios.

Fonte: Google Street View.

Além disso, essas novas construções, que não se preocupam em criar uma conexão com a identidade local, acabam por esconder e encobrir os visuais da baía, morros e da paisagem cultural, dificultando a valorização dos edifícios históricos remanescentes.


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2.5

DEGRADAÇÃO E ABANDONO

Os centros urbanos, se configuram originalmente como núcleo das atividades das cidades, abrigando grande fluxo de pessoas, automóveis, mercadorias e serviços. Assim, o Centro de Vitória, até os anos 1970, se apresentou como um espaço repleto de vitalidade urbana. Até aquele momento, o governo do Estado do Espírito Santo ainda priorizava o bairro com a maior parte de seus investimentos (BOTELHO, 2005).

Porém, nos anos subsequentes, com o demasiado crescimento populacional, o Centro apresentou uma saturação funcional, fazendo com que o governo expandisse tanto a malha urbana, quanto seus investimentos para outros bairros da cidade de Vitória. Em função destas ações e da especulação imobiliária, a cidade passou por um processo de descentralização, fazendo com que a importância do Centro fosse dissipada.

A população não encontrava mais funcionalidade, nem segurança no bairro, e a classe de maior poder aquisitivo se deslocou para bairros como Praia do Canto, Jardim da Penha, Mata da Praia e Ilhas do Boi e do Frade. Como consequência, com a população se transferindo para bairros adjacentes, o Centro de Vitória passou por um processo de abandono e desvalorização.

Enquanto o Centro da cidade se encontrava em desvalorização, um novo bairro, oriundo de aterros situado na zona leste da cidade, a Enseada do Suá, ganhava maior destaque com seu adensamento. O bairro começa a receber os principais edifícios empresariais e institucionais públicos do estado a partir de 1987.

Já na década de 1980, houve uma tentativa do poder municipal de revitalizar o Centro, através de investimentos, e assim, retornar com as atividades culturais, institucionais públicas e projetos de valorização do patrimônio histórico (BOTELHO, 2005). Infelizmente, a proposta não se concretizou, fazendo com que principalmente os edifícios institucionais públicos se


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consolidassem cada vez mais na Enseada do Suá, tornando o respectivo bairro uma importante nova centralidade.

Atualmente, o Centro Histórico de Vitória se encontra em grande estado de abandono e degradação. Segundo A Gazeta (2020), cerca de 230 edifícios se encontram vazios dentro do bairro, estes vazios urbanos só contribuem para uma cidade com menos vitalidade, menos pessoas nas ruas, e assim, ruas mais perigosas. O objeto de estudo desta pesquisa, a “Casa de Muniz Freire”, se configura como um destes imóveis que se encontram vazios. Além disso, o imóvel que já foi ocupado por moradores de rua e dependentes químicos, hoje encontrase lacrado, abandonado, degradado e sem uso (Figura 29). Figura 29: Casa Muniz Freire atualmente.

Fonte: Autora, 2021.

Além dos edifícios vazios e abandonados, outro sério problema encontrado em imóveis no Centro, são as condições estruturais precárias de muitos edifícios


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antigos. Adversidades como esta, podem causar o desabamento de imóveis, como já ocorreu algumas vezes, sendo a última delas um desabamento em janeiro de 2020 na rua Sete de Setembro (Figura 30). Figura 30: Desabamento na Rua Sete de Setembro, Centro de Vitória.

Fonte: A Gazeta, 2020.

As escadarias que conectam a Cidade Alta a Cidade Baixa (Figura 31), apresentam valor histórico e foram reformadas inúmeras vezes, em 2020, receberam pintura, troca de piso, guarda-corpos e novas luminárias (GAZETA). Ainda assim, além do processo de degradação das mesmas ocorrer rápido, devido as vandalizações e mau uso, as escadas se localizam em lugares de segurança precária, tornando-se passagens perigosas e não convidativas.


49 Figura 31: Escadaria Maria Ortiz no Centro de Vitória.

Fonte: Site PMV s.d.

Muitos dos edifícios que se encontram abandonados no Centro de Vitória, são edifícios de alta densidade histórica e de grande apelo arquitetônico, estes têm potencial grande para possíveis restaurações e/ou requalificações, e assim valorizar não só a edificação, mas também a região em que se encontram. Um exemplo é o Forte São João, construção de 1592, originalmente era utilizada como forte militar, já abrigou diferentes usos, como cassino, sede do Clube de Regatas Saldanha da Gama, atualmente sem uso e pertencendo a Prefeitura de Vitória.

Outros edifícios abandonados acabaram sofrendo ocupações por parte de famílias em situação precária e moradores de rua, muitas vezes dependentes químicos, como a própria Casa de Muniz Freire, objeto desta pesquisa e o Hotel Majestic, ambos na Cidade Alta, contribuindo assim, para tornar essa região da cidade mais isolada e não convidativa à convivência de sociedade local, bem como à fruição do usuário pedestre.

Assim, percebe-se no Centro Histórico de Vitória, notadamente sua Cidade Alta, grande potencial para requalificação de sua vocação, tornando-o um polo cultural na cidade. Os edifícios de grande valor histórico existentes, que se


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apresentam abandonados, podem adquirir usos dinâmicos para atrair maior movimento dos cidadãos capixabas pelas ruas do centro, assim como, criar oportunidades para o desenvolvimento do turismo. Além disso, os edifícios apresentam distintas arquiteturas que restauradas e adaptadas em seus usos podem contribuir para perpetuar a história da cidade e da arquitetura no local.


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3 3.1

A TRANSIÇÃO DO NEOCLÁSSICO PARA O ECLETISMO NEOCLASSICISMO X ECLETISMO E O IMPERIO X REPÚBLICA

Como apresentado no capítulo anterior, o Período Imperial (1822-1889) é marcado pela ascensão do estilo neoclássico nas novas construções. O estilo neoclássico veio com a Família Real, importado da Europa, e passou a ser implantando em novos edifícios erguidos na Província do Espírito Santo.

Esta tipologia, é caracterizada pelos telhados com platibanda, portas em forma de púlpito ou balcões e ornamentos como colunatas e frontão. Passou a ser reproduzida em igrejas, fazendas, armazéns, palácios e residências mais simples, sendo que muitos dos edifícios coloniais existentes foram adaptados para se adequar ao padrão neoclássico.

Em 1889, além das diversas mudanças políticas que vieram com a proclamação da República, surgem no Brasil, mudanças tecnológicas, quanto a materialidade e técnicas construtivas, como consequência da Segunda Revolução Industrial que acontecia na Europa, Japão e Estados Unidos, impactando o mundo todo.

Como uma evolução estética ao neoclassicismo, o estilo eclético surge com a instalação da República no Brasil, dominando os novos empreendimentos. Na tentativa de “apagar” a imagem e presença do Império, a República é responsável pela demolição de quase todos os edifícios neoclássicos existentes em Vitória.

Assim, edifícios importantes como a o Edifício da Alfândega (Figura 32) e o Palacete Jognell (Figura 33) foram ecletizados e posteriormente demolidos dando lugar a novas estruturas modernas. Vale destacar que o único edifício neoclássico sobrevivente à essas demolições na Cidade Alta é a “Casa de Muniz Freire”, tornando-se rara e de importância histórica para a cidade.


52 Figura 32: Edifício da Alfândega na Avenida Jerônimo Monteiro.

Fonte: IJSN.

Figura 33: Palacete Jognell na Praça Oito.

Fonte: Memória Capixaba, s.d..


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No ecletismo, diferente do que vivenciavam durante o Império com o neoclassicismo, os cidadãos podiam erguer edifícios mesclando e combinando diferentes referências arquitetônicas de diferentes épocas e estilos.

Com as modernizações ocorridas durante o período Republicano, as técnicas construtivas foram aprimoradas e novos materiais surgiram, como o ferro, tijolo e argamassa de cimento. Assim, os estilos arquitetônicos do passado, que eram difíceis, complexos e demorados para serem executados, passaram a ser mesclados e reproduzidos com maior rapidez, facilidade e eficiência devido as modernizações construtivas. Obtendo um resultado final igual ou melhor às suas referências, utilizando diferentes materiais e nova tecnologia.

Destacados no capítulo anterior, alguns edifícios ecléticos importantes no Centro Histórico de Vitória são o Palácio Anchieta e o Edifício da FAFI, antiga Faculdade de Filosofia (Figura 34). Figura 34: Antiga Faculdade de Filosofia - FAFI.

Fonte: Memória Capixaba, s.d.


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3.2

MUDANÇAS NAS TÉCNICAS CONSTRUTIVAS

“As Mudanças socioeconômicas e tecnológicas ocorridas durante a segunda metade do século XIX implicaram no Brasil, em profundas transformações nos modos de habitar e construir” (REIS FILHO, 2000, p.156).

A partir da afirmação do autor Nestor Goulart Reis Filho, inferimos que, as mudanças em relação à arquitetura, constituem, em geral, no aperfeiçoamento técnico dos edifícios e incorporação das mais recentes tecnologias da sociedade industrial. Essas e outras transformações, foram impulsionadas pela Segunda Revolução Industrial, que acontecia nesse período na Europa, mas que influenciou e impactou não só os países europeus, mas como o resto do mundo, desencadeando uma Revolução Industrial também no Brasil (REIS FILHO, 2000).

Nesse período, com a transição de Colônia para Império no Brasil, a burguesia adquire mais liberdade em suas escolhas, assim, é responsável pela maior parte das construções e pela utilização de uma arquitetura mais atualizada e tecnicamente mais elaborada, sempre em sintonia com os padrões europeus daquela época, caracterizada como uma arquitetura tipicamente urbana (Figuras 35 e 36) (REIS FILHO, 2000).

Figura 35: Rua Pedro Palácios - Sobrados Coloniais.

Figura 36: Rua da Alfândega Neoclássico

Fonte: Memória Capixaba, s.d.

Fonte: Memória Capixaba, s.d.

Durante centenas de anos, um dos materiais mais utilizados e importantes na construção de alvenarias foi a cal. No Brasil, desde a colonização, a cal de


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conchas marinhas foi muito utilizada tanto como argamassa como revestimentos em construções por todo o país. (KANAN, 2008, p.15). A NBR 13529 (ABNT, 1995) define a argamassa para revestimento como sendo “uma mistura homogênea de agregado(s) miúdo(s), aglomerante(s) inorgânico(s) e água, contendo ou não aditivos ou adições, com propriedades de aderência e endurecimento”.

A argamassa de cal, se apresenta como uma argamassa de muita plasticidade, harmonizando muito bem com as alvenarias tradicionais, sendo muito adequada para obras de restauração, conservação e manutenção. O material também apresenta boa permeabilidade, porosidade, resistência mecânica e durabilidade, assim, envelhece sem gerar dano, protegem a estrutura de agressões e processos de deterioração e ainda geram um efeito único no acabamento de rebocos e pinturas a base de cal. Outras vantagens são suas características atóxicas, utilizam temperaturas mais baixas de consumo, fazendo da cal, um material não poluente e mais ecológico na produção (KANAN, 2008).

Em Vitória, no início do século XX, o português José Lemos de Miranda, que residia na Praia do Canto, instalou uma das primeiras caieiras (fábricas tradicionais de cal) do estado, chamada de Boa Esperança, influenciando o nome do bairro, atual Ilha das Caieiras. A fábrica funcionou por cerca de quatro décadas, e a matéria-prima da produção de cal eram as ostras catadas naquela mesma região. O processo de produção foi trazido de Portugal, e as ostras, depois de terem sido catadas e lavadas, eram expostas ao calor nos fornos por três dias, após esse período eram retiradas dos fornos, e ainda quentes eram jogadas em um piso liso para serem transformadas em cal (IJSN).

Contudo, com as transformações provenientes da industrialização mundial e o surgimento do cimento na Inglaterra, as argamassas tradicionais entraram em declínio (KANAN, 2008). Assim, os meios tradicionais de produção da cal, incluindo a caieira Boa Esperança, tiveram suas atividades encerradas e foram gradativamente desaparecendo.


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A substituição da argamassa de cal pela argamassa de cimento se deu principalmente pelas facilidades que o cimento trouxe ao mercado. O cimento apresenta alta durabilidade, rigidez e endurece rapidamente. Porém, diferente da cal, em relação a conservação de estruturas, construídas com sistemas tradicionais, se mostra incompatível e pode provocar danos a tais estruturas (KANAN, 2008).

Anteriormente às modernizações, além da cal, eram muito comuns os edifícios utilizarem pedra, adobe e madeira nas construções (Figura 37 e 38), contudo, com as novas tecnologias construtivas, esses materiais foram sendo menos utilizados dando espaço a utilização do tijolo, ferro, e, como já apontado, o cimento (Figura 39 e 40). Figura 37: Sede da Fazenda Fortaleza em Alegre, ES.

Fonte: Barbosa e Neto Bochetti, 2010.


57 Figura 38: Esquema da produção e assentamento do tijolo de adobe.

Fonte: Coisas da Arquitetura. Disponível em <coisasdaarquitetura.wordpress.com/2010/09/06/tecnicas-construtivas-do-periodo-coloniali/>. Acesso em 03/out de 2021.

Figura 39: Estação Ferroviária de Matilde, Alfredo Chaves, ES.

Fonte: Google, 2016.


58 Figura 40: Esquema de assentamento do tijolo cerâmico.

Fonte: Google, 2016.

Por outro lado, segundo Gonzaga (2006), o material mais nobre da construção tradicional brasileira é a madeira, se diferenciando dos países europeus, onde se alcançou o auge da expressividade artística com os trabalhos de cantaria. No Brasil, os trabalhos de maior expressão artística relacionada à materialidade do edifício são os trabalhos em madeira nas Igrejas barrocas (Figura 41), chamados pelo autor de “palácios do período colonial”. O material estava presente em esculturas em altares, nas forrações de parede e tetos, portas, soalhos, balaustradas e na armação dos extensos telhados. Figura 41: Detalhe de cantaria da porta prinicipal da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, Goiania, GO, 1834.

Fonte: Vitruvius, 2005. Disponível em<vitruvius.com.br/revistas/read/drops/13.065/465>. Acesso em 03/out de 2021.


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A madeira também estava presente em construções mais humildes das cidades brasileiras, nas casas erguidas em taipa de mão, também conhecidas como pau a pique, portas, janelas, e armação de telhados (Figura 42 e 43) (GONZAGA, 2006, p.11). Figura 42: Casa erguida por taipa de mão, com esquadrias e armação do telhado em madeira.

Fonte: Google, 2016.

Figura 43:Esquema de execução da taipa de mão.

Fonte: História das Artes. Disponível em <historiadasartes.com/sala-dosprofessores/construindo-com-taipa-de-mao-e-de-pilao>. Acesso em 03/out de 2021.

Na mesma onda de evolução das argamassas, com o uso do cimento, o ferro foi uma matéria prima que entrou em ascensão durante o século XIX, forjado


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ou fundido, destinava-se para diferentes etapas e setores da construção. Compreendiam desde peças estruturais como vigas e colunas (Figura 44), até recursos secundários de acabamento, como ornamentos de jardim, chafarizes, grades, escadas, ferragens de janela e portas, canos, peças de banheiro e fogões. Assim como na Europa, o material não era considerado nobre, portanto, não podendo ficar à mostra em vigas e estruturas (REIS FILHO, 2000). Figura 44: Arquitetura de Ferro na Antiga Estação Ferroviária do Recife, Atual Museu de Trem.

Fonte: OxeRecife, 2018.

No fim do século XIX, com a ascensão do estilo eclético, como apresentado no capítulo anterior, os arquitetos e engenheiros dominaram as técnicas construtivas, a fim de replicar os mais variados estilos históricos, porém de forma mais rápida e utilizando diferentes matérias primas. A arquitetura de fins, como chamada por Reis Filho, alcançou um refinado nível técnico, atendendo às mais complexas estruturas e acabamentos propostos (REIS FILHO, 2000).

Nessa época as paredes, erguidas de alvenaria de tijolo e cal, foram padronizadas quanto à largura, as paredes que tinham cerca de sessenta centímetros, foram reduzidas a menos da metade para serem utilizadas em


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ambientes internos. Essa padronização levou ao aperfeiçoamento de enquadramento e vedação de vãos, permitindo assim a produção mecanizada de portas e janelas (REIS FILHO, 2000).

Com acesso mais democrático a diferentes materiais como madeira aparelhada, vidros e ferragens de melhor qualidade, que eram importados a preços reduzidos, os construtores passaram a utilizar um detalhamento mais minucioso e tecnicamente mais elaborado nas construções. Muitos dos balcões existentes nas fachadas dos edifícios coloniais (Figura 45), deram lugar às janelas com peitoril de alvenaria (Figura 46), e as casas mais refinadas recebiam revestimento de lambris de madeira na parte interior, com desenhos combinando com os das guarnições. Figura 45: Balcões de Madeira,

Figura 46: Peitoris de Alvenaria,

Sobrado Colonial.

Teatro Carlos Gomes.

Fonte: IPHAN.

Fonte: iPatrimonio.

Ainda nas fachadas, quando não eram de tijolos aparentes, as paredes eram revestidas com massa, por motivos decorativos, e em alguns casos utilizavam os azulejos (Figura 47), também para decorar, seguindo a tradição cultural herdada dos portugueses. Eram comuns os vidros decorados com motivos florais, vidraças externas, cortinas de rendas com desenhos semelhantes, vidros coloridos, e as venezianas nos dormitórios.


62 Figura 47: Fachadas em azulejo português em São Luís, MA.

Fonte: Conexão Decor, 2017.Disponível em <conexaodecor.com/2017/06/os-azulejos-desao-luis-ou-sao-luiz-dos-azuleijos>. Acesso em 03/Out de 2021. .

Já no interior das casas os revestimentos de massa eram quase sempre cobertos por papéis colados (Figura 48), e os azulejos e ladrilhos hidráulicos (Figura 49) eram escolhidos para compor banheiros e cozinhas. Os pisos passaram a ser construídos com tábuas de junção “macho e fêmea”, vedando de uma melhor forma que os antigos pisos elaborados com madeiras trabalhadas de forma artesanal. Figura 48: Interior do período eclético – Palacete Leão Junior - Curitiba.

Fonte: Arquivo Flavio Ortholan, 2016.


63 Figura 49: Cozinha da casa de Rui Barbosa.

Fonte: Casas Senhoriais Rio-Lisboa, s.d. Ref: MALTA,Marize;MENDONÇA,Isabel M. G. (org.). Casas senhoriais Rio-Lisboa e seus interiores. Rio de Janeiro: EBA-UFRJ, Lisboa:IHA -FSCH-UNL, 2013-2014.

Nas coberturas, as antigas telhas de capa e canal produzidas artesanalmente foram substituídas pelas lâminas de ardósia ou telhas de barro importadas de Marselha. A utilização de telhas importadas da Europa (Figura 50), implicava no aumento de inclinação das coberturas e contribuía para mudar as soluções plásticas tradicionais. A aparência nórdica que alcançavam, significava para a época o mesmo que mecanização e civilização. Já as coberturas de metal eram utilizadas principalmente para cúpulas e estruturas de maiores proporções (REIS FILHO, 2000). Figura 50: Telhas planas de cerâmica, importadas de Marselha, França.

Fonte: Museu das Telhas, 2018.


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O edifício Casa de Muniz Freire, na Cidade Alta em Vitória, foi construído originalmente no estilo neoclássico, no terceiro quartil do século XIX (c.a. 18501875), portanto, antes das modernizações construtivas. A análise do imóvel, sua arquitetura e demais características construtivas será realizada com maiores detalhes no tópico seguinte. Sendo elas suposições baseadas nos dados das plantas, cortes, fachadas e imagens disponibilizados pela SEDEC (Secretaria de Desenvolvimento da Cidade e Habitação) e no contexto construtivo histórico em que o edifício se insere, já que não foi possível avaliar o imóvel in loco. 3.3

LARGO DE SANTA LUZIA Nº 02, A CASA DE MUNIZ FREIRE

Situada no endereço histórico do Largo de Santa Luzia, n° 02, o imóvel que serviu de residência, por muitos anos, à família Moniz Freire, não apresenta documentação primária que possa datar com precisão sua construção. Todavia, identificam-se características que indicam que sua construção, provavelmente, ocorreu durante as últimas décadas do século XIX, ou melhor dizendo, a partir de 1870. Sabe-se, contudo, por meio de periódicos de época, que o imóvel já existia em 1876 (RIBEIRO, 2021).

Analisando as plantas baixas, fachadas e fotos, disponibilizadas pela Prefeitura Municipal de Vitória - ES, observa-se o vocabulário arquitetônico impresso e transmitido pela construção.

Identificam-se poucas pilastras no entorno da edificação, deduzindo então que as paredes mais espessas existentes consistem em paredes estruturais. O imóvel apresenta telhado encoberto por platibanda, ou seja, escondido por alvenaria com calhas que impedem que o beiral de telhas jogue suas águas diretamente sobre a rua. A maior parte do edifício é coberto por telhas cerâmicas do tipo francesa, sustentadas por uma estrutura de madeira que conta com tesouras, terças, caibros e ripas. Suas fachadas apresentam simetria e ritmo regular, marcadas por pilastras com capitéis de inspiração Dórica, e detalhes em estuque nos frisos e nas molduras das esquadrias. Estas características a respeito das coberturas com platibandas, espessura das


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paredes, e fachadas somadas à existência das janelas de púlpitos e balcões em ferro, localizados no pavimento superior, condizem com as características do estilo neoclássico e com as construções que eram executadas no final do século XIX.

Entretanto, ao longo do século XX, o edifício passou por mudanças de uso, sofrendo reformas e recebendo novas divisões e construções anexas. Essas, apresentam paredes mais finas, provavelmente com blocos cerâmicos furados, coberturas com telhas onduladas de fibrocimento e transparentes suportadas por estrutura metálica, e cobertura do tipo toldo em lona na escada principal existente próximo ao acesso.

Quanto à espacialidade e volumetria da edificação, é notável o eixo central que divide a planta baixa do edifício ao meio, além disso, apesar de algumas exceções, as salas são distribuídas de forma que apresentam tamanhos similares e proporcionais. O conjunto ocupa o lote por completo, sem afastamento frontal, e seu muro faz limite com o passeio do pedestre.

O imóvel está composto por dois volumes principais com dois pavimentos cada, unidos por uma escada. O primeiro volume, mais à frente do lote, se caracteriza como a construção original, mais antiga. O segundo volume, fruto de reformas realizadas em 1993, apresenta um ginásio no nível térreo, salas e um jirau no pavimento superior, localizado aos fundos do lote. O conjunto edificado apresenta atualmente quatro escadas, além da já citada - unindo os dois volumes - existe uma situada no jirau, uma principal próxima à entrada, e uma coluna de escadas próxima ao muro lateral direito, que se apresenta como um volume cilíndrico robusto e marcante.

Atualmente, o imóvel apresenta uma variedade quanto a espessura das paredes. As alvenarias internas, presentes na edificação histórica, em sua maioria são encontradas com sessenta centímetros e no pavimento superior são encontradas algumas com trinta e cinco centímetros de espessura. Há ainda algumas paredes de quinze centímetros, localizadas dividindo ambientes internos do prédio histórico e compondo as novas edificações, que


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provavelmente foram construídas na referida reforma. Os muros possuem vinte centímetros de largura, com exceção do muro frontal, com cinquenta centímetros que abriga os portões de ferro. As paredes mais espessas do imóvel, com sessenta centímetros de espessura, se localizam no centro dele, criando uma espécie de eixo e dividindo-o pela metade.

A partir da análise das elevações do edifício, consegue-se perceber características a respeito de suas proporções e fenestrações. No térreo do edifício, existem dois pátios descobertos. Sendo um deles menor, na entrada, logo ao lado da escada principal, formando um espaço vazio junto à fachada frontal, bem como, outro maior na lateral direita do edifício. Os pátios contam com vegetação, espaço livre e bancos de pedra fixos ao piso.

O imóvel apresenta pouca largura, cerca de 7,5 metros e extensa profundidade, com 35 metros; característica herdada da tipologia do lote colonial, origem do parcelamento histórico da Cidade Alta. Desta forma, configura-se um edifício longo e estreito, apresentando muitas aberturas por meio de janelas, sendo elas de madeira com parte em veneziana e parte em vidro. Além disso, a presença dos espaços abertos contribui para a entrada de luz natural em todos os demais ambientes.

No entorno do imóvel encontram-se edifícios de gabarito acima de 12 pavimentos, bem como outros históricos, tais como: a Capela Santa Luzia, o hospital AFPES, o Fórum, uma padaria, e demais edifícios de usos mistos, residências e escritórios de advocacia. A antiga casa recebe destaque por estar situada em um gaveto com grande visibilidade e, ao mesmo tempo, movimento de veículos. Ao seu lado encontra-se a Loja Maçônica União e Progresso,

que

ocupa

outro

imóvel

de

origem

histórica,

porém

descaracterizado.

Quanto a materialidade do imóvel, sobrepondo-se informações encontradas em plantas, elevações e fotos com o contexto de construção do imóvel, podese supor que esta tenha sido erguida em seu sistema construtivo primitivo com o uso de alvenarias mistas de pedra e tijolos maciços de barro queimado;


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contudo, carecendo de prospecções murarias não possíveis de realizar neste estudo.

As esquadrias e portas em madeira possuem qualidades em sua execução, já assinaladas pela produção de uma carpintaria mais especializada, com o uso de rebaixos, venezianas, pinázios e almofadas em madeira. Frisos e ornamentos em estuque delimitam os pavimentos e emolduram as esquadrias complementadas pela presença dos balcões sacados em ferro forjado.

A histórica casa, provavelmente construída pelo pai do ex-governador, o engenheiro militar e político Manoel Feliciano Moniz Freire, já era existente no ano de 1876, já que se faz presente no “inventário de bens deixados aos orphãos” após a morte do engenheiro. (O ESPÍRITO-SANTENSE, 1876. apud RIBEIRO, 2021).

Quando Muniz Freire tinha por volta de quinze anos, junto de seus irmãos, sob a tutoria de seu avô homônimo, o imóvel foi colocado para locação, recebendo assim um terço da renda. Desta forma, o imóvel permaneceu por muitos anos com a função de residência.

No ano de 1882, Muniz Freire, que finalizava seu bacharelado em direito em São Paulo, volta a Vitória e passa a ocupar novamente a Casa do Largo de Santa Luzia, nº 02, estabelecendo ali também seu escritório de advocacia (Figura 51) (PROVINCIA DO ESPIRITO SANTO, 1888. apud RIBEIRO, 2021). Figura 51: Anúncio dos serviços de advocacia de Muniz Freire publicado nos classificados.

Fonte: Província do Espírito Santo


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Entre 1892 e 1896, Muniz Freire desempenhou seu primeiro mandato como Presidente do Estado. Durante os anos de 1896 a 1910 é incerta a ocupação de Muniz e sua família no imóvel já que este viajou para fora do país e assumiu cargos em outros estados. De 1900 a 1904, Muniz assumiu pela segunda vez o cargo de Presidente do Estado do Espírito Santo, sendo que não há registros se voltou a morar na residência ou residiu no palácio do governo (O COMÉRCIO DO ESPIRITO-SANTO, 1910. apud RIBEIRO, 2021).

Em 1910, periódicos da época indicam que o imóvel do Largo de Santa Luzia nº 02 estava ocupado pelo Gymnasio Espírito-santense, dirigido pelo padre Luiz Köster. (O COMMERCIO DO ESPÍRITO-SANTO, 1910. apud RIBEIRO, 2021).

Em 1914, o Gymnasio Espírito-santense foi transferido para os fundos da Igreja de São Tiago - atual Palácio Anchieta, ordenado pelo Governador Marcondes Alvez de Souza (1912-1915) (ESPÍRITO SANTO, 1914. apud RIBEIRO, 2021). 3.3.1

Os irmãos Barbosa Leão e Colégio São Vicente de Paulo

Segundo a PMV, no início do século XX, em 1913, foi fundado o Ginásio São Vicente de Paulo, pelos proprietários irmãos Aristóbulo, Kosciuszko e Miguel Barbosa Leão, como a primeira escola particular situada na capital. Os mesmos assumiram os cargos, respectivamente, de diretor, vice-diretor e secretário (PMV, 2013).

Como afirma Ribeiro (2021): Não existem fontes primárias nas quais se possa embasar a afirmação de que o Ginásio São Vicente de Paulo tenha vindo ocupar o imóvel a partir de então. No entanto, a tradição historiográfica local indica o ano de 1913 [tendo sido comemorado oficialmente pela PMV seu centenário em 2013] como início da operação do Ginásio São Vicente de Paulo.

Em 1971, o professor e diretor Aristóbulo Barbosa Leão, doou todo acervo do estabelecimento de ensino, correspondência e objetos pessoais à Prefeitura


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de Vitória, fazendo com que a escola se tornasse Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) São Vicente de Paulo (PMV, 2013).

A escola ocupou por 93 anos o antigo imóvel do então Presidente de Estado Muniz Freire, sendo que em 1993, recebeu obras de restauro e construção de um edifício anexo com quadra/pátio coberta. Em 2006, devido a problemas estruturais, a escola foi transferida para o antigo Colégio do Carmo, onde se encontra até a presente data.

Durante os anos seguintes, o edifício foi objeto de projetos da prefeitura para abrigar atividades culturais e cursos associados à Escola Técnica Municipal de Teatro, Dança e Música (FAFI), no entanto, estes nunca saíram do papel. Posteriormente veio o abandono contínuo e o edifício foi ocupado por moradores de rua e dependentes químicos. A vizinhança sustenta a informação de que esses foram os responsáveis pela vandalização e maior depredação do edifício, além disso, furtando todos os objetos de valor existentes (A GAZETA, 2018).

Como relatado em reportagens de jornais (CBN; A GAZETA, 2018), o imóvel foi invadido e ocupado por 20 famílias que diziam não ter onde morar e nem condições de pagar aluguel. Essas famílias vieram do bairro Piedade, fugindo da crescente violência da região e também de outra ocupação: a do edifício do Hotel Majestic1 também na Cidade Alta. O Hotel Majestic foi ocupado por famílias sem-teto também em 2018. Estas tiveram que sair do local por interferência judicial, onde foi autorizado o uso de força policial para a desocupação caso as famílias se negassem a deixar o local.

Como relatado pela A Gazeta (2018), os novos ocupantes da antiga Escola São Vicente, encontraram o edifício em condições precárias, com forro de 1

O Hotel Majestic foi ocupado por famílias sem-teto também em 2018. Estas tiveram que sair do local por interferência judicial, onde foi autorizado o uso de força policial para a desocupação caso as famílias se negassem a deixar o local.


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madeira destruído e ameaçando cair junto com fiação e lâmpadas, portas e janelas instáveis, paredes quebradas e mofadas, entulho e cacos de vidro espalhados pelo piso, telhas que demonstram não cumprir mais seu papel de conter chuvas, em resumo, um espaço sem a mínima segurança para abrigar moradores.

As famílias entrevistadas relataram que para ter acesso a energia elétrica, realizam ligações clandestinas. Não obstante, apontam como o maior problema enfrentado no local, a falta de água, tendo que sair do imóvel para obter esse recurso indispensável.

Com todas as adversidades encontradas, ainda assim, as famílias ocupantes se mostravam esperançosas em permanecer no local. As reportagens já citadas, mostram os novos moradores limpando as antigas salas de aula e ocupando-as com seus pertences.

Na época, a prefeitura comunicou que tinha o objetivo de criar um cronograma de desocupação de forma pacífica, e colocou à disposição das famílias os serviços do CRAS (Centros de Referência de Assistência Social). Atualmente, o imóvel não se encontra ocupado, mas sim abandonado e trancado com cadeados, ainda em estado crítico de precariedade e degradação.

Observamos assim que a Casa de Muniz Freire, antigo Colégio São Vicente de Paulo, além de carregar uma rica história, abrigou diferentes usos em diferentes épocas, bem como personagens importantes na sociedade capixaba do limiar do século XIX/XX. Com seus quase 150 anos de existência, apresenta uma importante materialidade arquitetônica, sendo ela a única remanescente do estilo arquitetônico histórico neoclássico existente na Cidade Alta.

Dessa forma, a construção apresenta densidade histórica suficiente para constar como um ativo meio de propagação de cultura e história no Centro Histórico da cidade de Vitória, podendo contribuir para um lugar mais dinâmico e saudável, justificando-se sua preservação e revitalização.


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Em razão da sua importância histórica e sócio-cultural, hoje, de acordo com o Plano Diretor Urbano da cidade de Vitória, a edificação se enquadra no grau de preservação integral secundária (GP2), portanto, deve ser objeto de restauração total no seu exterior, e restauração total ou adaptação às atividades no seu interior, desde que não prejudiquem o exterior (PDU Vitória, 2019).


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4 4.1

NOVOS TEMPOS, ANTIGOS USOS A REQUALIFICAÇÃO DOS CENTROS HISTÓRICOS

Os centros históricos representam, tradicionalmente, o núcleo mais antigo das cidades, onde se concentraram ou concentram as principais atividades econômicas, políticas e sociais daquele espaço urbano. Assim, as cidades se tornam um reflexo da identidade da comunidade que ali vive, representados seja no espaço público, na arquitetura, ou nas transformações urbanas ocorridas com o desenvolvimento e modernizações (TAVARES, 2008).

Como tratado no capítulo dois desta pesquisa, a partir da década de 1970, os centros urbanos no Brasil entraram em um processo de abandono, desvalorização e degradação. Em resposta a essa problemática, as intervenções urbanas surgem com a necessidade de se atribuir novos usos a espaços que apresentam funcionalidade obsoleta. Espera-se que estas intervenções além de proporcionar a renovação da infraestrutura na cidade, sem deixar de lado a valorização do espaço público, promovam diretamente uma melhoria na condição de vida da população (TAVARES, 2008).

Para Peixoto (2009), a requalificação urbana vem a solucionar as problemáticas geradas pela: [...] a evolução das economias urbanas, marcada pela expulsão das indústrias do sector secundário para as margens das cidades; pela tendência para a policentralidade e a perda de vitalidade dos antigos centros urbanos [...]; pela consolidação de um mercado urbano do lazer construído à volta da ideia de espaço público e do consumo visual; e pela emergência de um cenário de concorrência e de competitividade entre cidades que adensa a importância de factores representacionais e imagéticos, assim como de intervenções urbanísticas e arquitectónicas que concretizam no espaço símbolos de afirmação e de identificação das cidades (PEIXOTO, 2009, p. 41).

As requalificações urbanas, tal como o manifesta a “Carta de Lisboa sobre a Reabilitação Urbana Integrada”, documento extraído durante o “Primeiro Encontro Luso-Brasileiro de Reabilitação Urbana”, em Lisboa, 1995, (CARTA DE LISBOA, 1995) corresponde às “operações destinadas a tornar a dar uma


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atividade adaptada a esse local e no contexto atual”, sendo empregada essencialmente a edifícios que apresentam funcionalidade habitacional.

O documento define e conceitua diversos termos da esfera da intervenção urbana e infere na importante contribuição que a Reabilitação Integrada, englobando os conceitos de renovação, revitalização, requalificação, restauro, reconstrução, conservação e manutenção, apresenta para a preservação e vivificação do patrimônio cultural, abrangendo questões sociais e salvaguarda da identidade local (CARTA DE LISBOA, 1995).

Comparando o termo em questão, requalificação urbana, com a reabilitação urbana, Peixoto (2009), conclui que enquanto a reabilitação urbana se dirige sobretudo ao edificado, fundamentalmente no que apresenta função residencial, a requalificação urbana dirige-se ao seu entorno e ao espaço público, ou, nas operações urbanas de larga escala, à reconversão funcional de um dado espaço. A intervenção que é frequentemente “apelidada de uma política de centralidade urbana”, apresenta como objetivo a reintrodução de “qualidades urbanas de acessibilidade e centralidade a uma determinada área” (PEIXOTO, 2009).

No Brasil, as principais situações de intervenção em centros históricos de grandes cidades são marcadas pela presença do poder público, em especial no financiamento das intervenções. Em Vitória não foi diferente, o poder público, como afirma Botelho (2005), foi “o grande condutor de todo o processo”.

Durante o governo de Paulo Hartung (1993-1996), se iniciou a elaboração do documento que foi mais tarde publicado “Vitória do Futuro: Plano Estratégico da Cidade, 1996-2010”, no qual trata do tema da revitalização no centro da cidade (BOTELHO apud Prefeitura Municipal de Vitória, 2005).

A proposta de revitalização do centro de Vitória consistia na valorização por meio da manutenção de áreas preservadas e tratamento do patrimônio histórico, cultural e natural, possibilitando o surgimento de novos vínculos dos


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moradores com a cidade. Assim, o patrimônio histórico se tornou o elemento central na redefinição dos usos, fazendo com que o centro abraçasse a identidade cultural da cidade (BOTELHO, 2005).

Em 2003 era possível perceber os resultados do processo de revitalização recebido pela cidade. Fachadas de edifícios ao longo da Avenida Jerônimo Monteiro se encontravam recuperadas, assim como o Museu de Arte do Espírito Santo, edifícios e equipamentos públicos na Praça Costa Pereira, o Palácio Anchieta e suas escadarias, o Parque Moscoso, e o Mercado da Vila Rubim (BOTELHO, 2005).

Posteriormente, a Prefeitura Municipal de Vitória se empenhou na implantação do “Programa Morar no Centro”, que, de acordo com a prefeitura consiste em uma: [...] revitalização da área central de Vitória, dando função social a edifícios abandonados ou mal aproveitados, fazendo deles uma ferramenta para diminuir o déficit habitacional da capital. O Morar no Centro é um dos projetos que compõem o Programa de Revitalização do Centro, que busca resgatar o Centro Vitória como espaço de cultura, história, lazer, negócios e moradia para sua população por meio de ações integradas (GUIA DE SERVIÇOS, PMV).

Esse projeto, como afirma Botelho (2005), diferente de muitos processos de revitalização de centros urbanos ocorridos em diferentes cidades pelo mundo, pois, aparenta encaminhar-se na direção contrária aos processos de gentrificação.

Desse modo, os processos de revitalização pelos quais o Centro de Vitória passou, em meados dos anos de 1990, se destacaram pela valorização da área e proteção do patrimônio histórico ali existente, sendo ainda complementado pela implantação do Projeto Visitar, trazendo também um olhar turístico aos monumentos já conhecidos pela população.

Contudo, na atualidade, apesar das iniciativas propostas e comunicadas pelo governo, ações de intervenção não foram efetivamente implementadas. Assim, nota-se que o abandono e a degradação ainda persistem em grande número na região.


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Moradores do Centro ainda reclamam da falta de segurança gerada por ruas escuras e não movimentadas, que é agravada pela presença dos imóveis inutilizados, abandonados e degradados. Segundo reportagens (GAZETA, 2020), existem 127 imóveis vazios no Centro de Vitória (Figura 46), sendo muitos destes, de grande densidade histórica e arquitetônica. Figura 52: Mapa de imóveis vazios no Centro de Vitória.

Fonte: A Gazeta – Google Maps.

Deve-se destacar que as intervenções urbanas necessitam estar aliadas às intervenções no edificado, sendo que neste há espaço para propostas de moradia, mas também de propagação de cultura, arte e entretenimento. 4.2

A REQUALIFICAÇÃO DE USO EM IMÓVEIS DE INTERESSE DE PRESERVAÇÃO

“O uso possibilita a integração e a participação do património na vida contemporânea e garante a sua existência no futuro” (DELGADO apud Guia Técnico de Reabilitação Habitacional, 2008). Como já citado anteriormente, a requalificação do edificado, carece de abranger diversidade quanto ao uso, para assim, colaborar com as intervenções no panorama urbano, resultando em harmonia e vitalidade para a região.


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O Centro Histórico de Vitória abriga grande quantidade de imóveis de interesse de preservação, sendo alguns deles de grande densidade histórica, em grande parte desocupados, abandonados e degradados, nos quais o objeto de estudo desta pesquisa “Casa de Muniz Freire” se enquadra. É necessário que as requalificações do edificado estejam alinhadas às comunidades em que estão inseridas, já que não adianta realizar investimentos em uma intervenção que não se alia às pessoas que vão ali morar, trabalhar ou consumir. Tarcísio Botelho (2005) aponta essa importância de considerar a forma que os moradores e outros usuários da região se relacionam, se apropriam e ressignificam esses espaços que fazem parte do seu cotidiano e, mesmo, de suas memórias. Além de estar em consoante com os cidadãos, futuros usufruidores da edificação, o projeto de intervenção deve se atentar e “escutar” o monumento edificado, de forma, a compreender os limites da ação perante ao edifício, em busca do equilíbrio entre o pré-existente e o novo (NAHAS apud CARBONARA, 2017). Esses limites derivam da consciência e compreensão adquiridas a partir do conhecimento a fundo sobre o monumento, seu reconhecimento como obra de arte, juízo crítico de seus valores artísticos, históricos e simbólicos e garantia de sua transmissão às gerações futuras (NAHAS apud CARBONARA, 2017).

Em Vitória, o patrimônio edificado de seu Centro Histórico se configura como elemento central na requalificação e reabilitação de usos da área, uma vez que os edifícios históricos e de interesse de preservação colaboram com seus diferenciais que podem garantir a transformação da área degradada em um lugar cuja a identidade cultural seja valorizada (BOTELHO, 2005). Sabe-se da fundamental importância da reabilitação de moradias nas áreas centrais. Inúmeros teóricos e estudos de casos comprovam essa questão. Contudo, a requalificação dos imóveis no Centro de Vitória necessita de ir além da moradia. De acordo com a densidade histórica dos edifícios, ou mesmo sua “vocação tipológica”, pode-se implementar usos e atividades que agreguem


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“valores culturais” à essa área central; afinal além de morar, é necessário que as pessoas vivam o lugar, possam trabalhar, aprender, se divertir e identificar. Espaços comerciais, de lazer, e entretenimento, por meio da arte e cultura, configuram-se como âncoras responsáveis por agregar movimento, consumo e novos públicos, além dos moradores, alimentando assim a ideia de uma intervenção bem sucedida em uma área histórica. Dentro dessas inúmeras possibilidades de uso agregadores culturais, destacamos aqui o museu; equipamento que funciona como difusor de cultura, educação, lazer, arte e conhecimento para a sociedade. Dessa forma, desenvolve-se a seguir a reflexão acerca da importância dos museus como elementos agregadores de valor nas intervenções urbanas em áreas de interesse de preservação. 4.3

MUSEUS COMO ALAVANCA DE DESENVOLVIMENTO EM ÁREAS DE INTERESSE DE PRESERVAÇÃO

Os museus, conforme compreendido por Chagas e Storino (2014), são: [...] práticas sociais, antros de relação e dispositivos de narração que se constroem por meio de espacialidades, temporalidades, imagens, informações, vivências e convivências tratadas, em simultâneo, como bens, representações e manifestações culturais (CHAGAS, STORINO, 2014, p. 74).

Estes apresentam importante papel nas estratégias de preservação das cidades históricas, essas, que assim como os museus, se configuram como local de memória, esquecimento, poder e resistência (CHAGAS, STORINO, 2014).

O espaço da cidade, representa um lugar vivo e espelho da sociedade que o utiliza, portanto, cada cidade e espaço possui uma dinâmica singular, e em constante transformação. Deste modo, não se torna clara a distinção entre o material e o imaterial


78 [...] o que dá sentido à pedra do calçamento do beco ou ao monumento da praça está na ordem do encontro entre o material e o imaterial; são camadas de valores, significados e funções, são acúmulos de experiências de sentido e de percepções espaciais e temporais (CHAGAS, STORINO, 2014, p. 75).

Compreende-se que as cidades são compostas por suas materialidades, concretudes e corporeidades, da mesma forma que se apresentam como fluidas, carregam vida e movimento, são imateriais, incorpóreas e poéticas (CHAGAS, STORINO, 2014).

Nesse contexto, a criação de espaços museológicos, museus e centros culturais acompanham e compreendem a expressividade artística e histórica da sociedade que vivencia aquele espaço, contribuindo para a poética da cidade, porém, determinando e estabelecendo locais físicos e materiais destinados à produção e/ou exposição (GUIMARAES, IWATA, 2001).

De acordo com Maria Ignez Franco (2014), às exposições, que até pouco tempo, ofereciam respostas prontas para um público passivo, que teria que apenas ler, ouvir, ver e aprender, como um movimento de mão única, tornaramse cada vez mais obsoletas. A globalização e a ascensão das mídias sociais foram alguns dos fatores que contribuíram para essa transformação e nova fase dos museus. Apresentando uma linguagem múltipla e plural, os espaços museológicos estão se tornando cada vez mais espaços de troca, compartilhamento, reflexão e inovação, mantendo um diálogo com os cidadãos (FRANCO, 2014).

Os museus contemporâneos apresentam o desafio da continuidade de um diálogo criativo. Diálogo esse, que abrange e relaciona os pontos de vista social, ambiental e histórico, com o meio em que estão inseridos. O desafio, se refere sobretudo à capacidade e necessidade dos museus serem permeáveis e orgânicos, em sintonia com os diferentes ritmos e tempos da cidade, assim como, com a dinâmica da vida social urbana, seus diferentes cidadãos, usos e percursos (CHAGAS, STORINO, 2014).


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Chagas e Storino (2014), refletem a respeito da importância do encontro entre a cidade e os cidadãos, os encadeamentos entre o passado e o presente, as tradições e as inovações, as festas e o cotidiano. Assim, percebe-se que o lugar da memória e das produções artísticas é o museu e a cidade, mas também é nos relacionamentos, festas, e no imaginário dos cidadãos.

Desse modo, as condições em que se observam o nascimento de novos espaços museológicos, se encontram principalmente na relação destes com a cidade e sua paisagem urbana; como no caso dos museus implantados durante os chamados processos ou operações de diferentes intervenções urbanas. Se o que se pretende com essas iniciativas é dar nova dinâmica a espaços antes considerados degradados e problemáticos, sobre diversos aspectos, cabe a reflexão sobre o papel desempenhado por essas instituições nesses processos (RIBEIRO, 2021).

Ao longo do tempo, precisamente nos anos 1990, as ações de intervenção urbana em áreas degradadas tornaram-se uma política urbana, uma estratégia articulada e global, fomentando diferentes modos de intervenção com o intuito de ordenar o espaço e devolver aos centros urbanos históricos seu papel hegemônico perdido. Tais operações passam a ser utilizadas para reforçar uma determinada imagem da cidade que passa a ser pensada não mais como local de produção, mas como produto de consumo, uma mercadoria, isso se deve principalmente ao desenvolvimento da comunicação e da propaganda. São introduzidas técnicas de planejamento estratégico associadas ao marketing urbano, que é potencializado principalmente devido à contribuição de uma arquitetura do espetáculo na qual tem se construído obras monumentais, por arquitetos de renome; os famosos “starchitects”.

Observa-se no Brasil e no mundo, no final do século XX e início do atual, o desenvolvimento de diversas propostas e projetos de requalificação urbana, tais como Frankfurt [Deutches Architektur, Museum Angewandte Kunst (Figura 53), Weltkulturen Museum, Deutsches Filminstitut & Filmmuseum...]; Bilbao [Guggenheim Bilbao Museoa, Bilboko Arte Ederren Museoa, Museu Marítimo Ria de Bilbao...]; Berlim [Museum Insel, “Ilha de Museus” com vários tipos],


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Lisboa [Novo Museu dos Coches, Centro Cultural de Belém, Museu de Arte Contemporânea do Chiado, B-MAD Museu Art Déco...] São Paulo [Museu da Língua Portuguesa, Pinacoteca do Estado de São Paulo (Figura 54), Sala São Paulo de Concertos...] Nos casos citados, é clara a presença marcante dos novos museus como alavancas do processo de requalificação, que envolve novos usos e, consequentemente, novos públicos para o lugar (RIBEIRO, 2021). Figura 53: Museu Angewandte Kunst em Frankfurt, Alemanha.

Fonte: Site do Angewandte Kunst Museum.

Figura 54: Pinacoteca de São Paulo, SP

. Fonte: Secretaria de Cultura de São Paulo.


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Desse modo, pode-se concluir que o denominado patrimônio material é constituído de imaterialidades e que o denominado patrimônio imaterial não sobrevive sem a âncora das materialidades (CHAGAS, STORINO, 2014) que constituem lugares de memória nos Centros Históricos sob intervenção.

Quando utilizados como âncoras do processo de intervenção urbana, os museus tendem a definir uma espacialidade que lhes assegura uma irradiação sobre seu entorno. Dessa forma a instalação de um museu pode atrair atividades comerciais, bares, restaurantes, livrarias e outros equipamentos culturais, acabando por gerar uma espécie de “território cultural”. Esse efeito pode surgir espontaneamente a partir de pessoas ou de grupos informais de produtores culturais que transformam o local em uma alternativa cultural, ou pode ser introduzido, através de investidores privados que objetivam atrair determinado segmento de consumidores e novos habitantes, ou ainda através de um planejamento estatal com intenção de fomentar a chamada economia criativa (RIBEIRO, 2021).

Segundo Marcello Ribeiro (2021): Quando utilizados como catalisadores em meio aos processos de intervenção urbana em Centros Históricos, os museus apresentam a potencialidade de proporcionar uma ampliação dos benefícios sociais resultantes de tais iniciativas, desde que estejam em consonância com a cultura e a vocação da comunidade do território no qual se inserem (RIBEIRO, 2021, pg.04).

Nesse contexto, surge a casa-museu, denominada por diferentes autores também de museu-casa ou casa histórica, existe na cidade e na sociedade enquanto um edifício de caráter histórico somado à sua memória, usos e personagens.

As casas-museus surgem como desdobramento dos Museus Históricos, pela classificação de museus de Alonso Fernández (2006), tendo em vista que “todos os museus cujas coleções foram concebidas e apresentadas dentro de uma perspectiva histórica podem ser incluídos nesta categoria” (FERNANDEZ apud AFONSO, 2015).


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Segundo Micheli Afonso (2015), a Casa-Museu Consiste num refúgio doméstico que expõe um recorte de determinada época, projeta a memória de um personagem social, evidencia uma coleção de valor inestimável, retrata a vida doméstica de determinado grupo, satisfaz a curiosidade dos visitantes em observar um aspecto de uma intimidade, entre outros (AFONSO, 2015, p. 09).

Para uma casa que já é museu ser considerada de fato uma Casa-Museu, há de se analisar o modo como ela interage com a memória do(s) personagem(ns) que ali já viveram, e como expõe essa memória e história para a sociedade atual. Além disto, o ideal é a máxima preservação quanto a configuração do imóvel, deixada pelos personagens históricos, e caso esta possibilidade esteja prejudicada, há de voltar as pesquisas para melhor compreensão dos cenários de convívio que ali existiram (AFONSO, 2015).

A partir dessa perspectiva, a Casa-Museu não consiste em ser apenas um objeto arquitetônico, nem mesmo apenas um objeto cultural, mas torna-se uma âncora de conteúdo, de grande valor representativo (AFONSO, 2015). Constatando assim, que cada museu, por menor que seja, apresenta o potencial e a função de tornar-se emblemático, mobilizador e transformador, contribuindo e impactando socialmente, economicamente e culturalmente na sociedade. 4.4

CASAS MUSEU - ESTUDOS DE CASO

Os estudos de caso em análise, a seguir, permitem uma melhor compreensão de papel da Casa Museu em diferentes localidades, ao mesmo tempo que permitem o comparativo entre os casos, ainda por ser efetuado na continuidade da pesquisa, com o objetivo de identificar diretrizes para o projeto de Requalificação para a Casa de Muniz Freire.


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4.4.1 A Casa de Portinari em Brodowski Situado em Brodowski, no interior do Estado de São Paulo, o Museu Casa de Portinari (Figura 55) abre as portas da antiga residência do pintor Candido Portinari (1903-1962), que ali nasceu e cresceu. Figura 55: Museu Casa de Portinari em Brodowski, SP.

Fonte: Site Museu Casa de Portinari

De arquitetura marcada pela simplicidade típica do interior, o conjunto é composto por uma casa principal e anexos, incluindo uma capela.

Em 1968, a casa foi tombada pelo IPHAN, e no ano seguinte, já foi desapropriada e adquirida pelo Governo do Estado de São Paulo. No ano de 1970, foi tombado pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Património Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo), e em março do mesmo ano, com esforços da família, unidos ao município e ao estado, o museu foi inaugurado.

A casa expõe grande acervo de obras do artista consagrado, algumas delas pintadas nas próprias paredes da casa como murais de afresco. Apresenta também, antigos móveis e objetos pessoais do artista e da família que ali viveu,


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preservando e comunicando a história daqueles personagens, com destaque para a produção artística de Portinari. Observa-se que o museu atinge seu objetivo de transmitir a memória de Portinari, de sua família e memórias do passado da cidade de Brodowski, além disso, o museu se preocupa em atualizar ações e incorporar novas iniciativas, se comprometendo em promover acesso intelectual a todos, sem criar barreiras sociais e culturais.

A instituição incorporou ao longo dos anos uma série de ações de acessibilidade.

Os

textos

explicativos

existentes

na

exposição

são

disponibilizados também em Braile, há a disponibilidade de audioguia, DVD em Libras, acessos adaptados para pessoas com mobilidade reduzida, assim como vagas destinadas a estes, maquete tátil com a arquitetura do museu, réplicas táteis de obras bi e tridimensionais, réplicas táteis de móveis e ambientes. Há também, desde os anos 1980, visitas para público “especial”, onde o museu recebe pacientes de hospitais psiquiátricos, alunos de escolas “especiais”, dependentes químicos, entre outros.

Inspirados pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, elaborados pela Organização das Nações Unidas, a casa Portinari apresenta também iniciativas verdes, ações quanto à sustentabilidade. Criou-se o Projeto Museu Verde, que além de apresentar um viveiro de mudas e projeto de compostagem, a instituição realiza o plantio de mudas de árvores por todo o município de Brodowski e compreende o selo Carbon Free, a respeito da compensação de gases de efeito estufa. 4.4.2 A Casa de Benjamin Constant no Rio de Janeiro A casa (Figura 56), que foi habitada por Benjamin Constant de 1889 até seu falecimento, em 1891, consiste em uma chácara em meio a cidade do Rio de Janeiro. Com características neoclássicas, a casa apresenta 520 m² de área construída com planta baixa em “U”, formando um pátio interno. Abriga também, um jardim densamente arborizado, com vista para a baía de Guanabara. O conjunto abrange um anexo, que originalmente deveria ser uma


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cocheira ou casa de serviçais, mas que em 1905, após a filha de Benjamin, Bernardina Constant se casar, foi reformado e ampliado para receber o casal. Figura 56: Museu Casa Benjamin Constant no Rio de Janeiro, RJ.

Fonte: Site Museu Benjamin Constant.

A casa foi adquirida e protegida pelo governo após o falecimento de Benjamin, em 1891: O Governo federal adquirirá para a Nação a casa em que faleceu o Doutor Benjamin Constant Botelho de Magalhães e nela mandará colocar uma lápide em homenagem à memória do grande patriota – o fundador da República. (Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, Disposições Transitórias, Artigo 8º, 24 de fevereiro de 1891)”.

Em 1958, o bisneto de Benjamin, General Pery Constant Beviláqua, solicitou ao SPHAN uma intervenção no imóvel, que se encontrava em estado precário. Assim, depois de análises, a casa foi tombada como patrimônio histórico nacional.

Em 1982, a casa, já tombada, foi transformada em museu, reconstituindo os ambientes familiares e contexto em que viveu o “Fundador da República”, expondo móveis, objetos, livros, documentos e fotografias do arquivo pessoal


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de Benjamin Constant e sua família, retratando não só o cotidiano familiar mas também o contexto político do país.

Em seu plano Museológico (2020), é apontado o compromisso que a instituição tem com a universalização do acesso e uso do museu, preservação do patrimônio, ética e sustentabilidade ambiental. O Museu encarrega-se do papel de representar a “Primeira Casa da República”, preservando e divulgando a vida e obra de Benjamin Constant, promovendo o pensamento crítico a respeito do Império e da República, em questões políticas, sociais e culturais, por meio de seu acervo, ações educativas, ações de comunicação, e uso sustentável do seu Parque, que integra a Área de Preservação Ambiental (APA) de Santa Teresa. 4.4.3 A Fundação Ema Klabin – Casa-Museu em São Paulo

Idealizada por Ema Klabin para abrigar sua coleção de arte e artigos valiosos, a casa (Figura 57), inaugurada em 1961, não apresenta um estilo arquitetônico definido, já que mistura elementos clássicos, como os arcos plenos nas portas e janelas, com elementos modernos, em especial nos materiais e acabamentos utilizados. Frequentada por importantes personalidades da época, o terreno de quase 4000 m², localiza-se na rua Portugal, Jardim Europa, na capital do Estado de São Paulo, e recebe a construção de cerca de 900 m².


87 Figura 57: Casa Museu Ema Klabin em São Paulo, SP.

Fonte: Site Casa Museu Ema Klabin.

A fundação foi oficialmente registrada em 1978, como Fundação Cultural Ema Gordon Klabin, modificando seu uso de residência para museu aberto à visitação pública. Hoje, consiste em uma instituição sem fins lucrativos, de utilidade pública federal, com propósito de promover e divulgar atividades de caráter cultural, artístico e científico.

O Museu, além de expor coleções de arte, móveis e objetos pessoais de Klabin, apresenta como missão salvaguardar, estudar e divulgar a residência e memória de sua patrona, destaca a atuação da Família Klabin-Lafer no processo de urbanização da cidade de São Paulo e no desenvolvimento econômico e industrial do país.

Atualmente, a Casa Ema Klabin, objetiva a execução de atividades culturais, educacionais e sociais, produzindo diálogo e reflexão com o público de forma dinâmica e inclusiva, sendo que as práticas e ações da instituição estão sempre em análise e estudo para permanecerem relevantes e atualizadas para a sociedade atual.

Observa-se que nos três estudos de caso apresentados, além de honrar com o compromisso de representar e compartilhar a história e memória dos


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personagens que ali viveram, há o cuidado em reavaliar e atualizar ações implantadas dentro de cada instituição. As casas-museu analisadas se responsabilizam por perdurar um diálogo com a sociedade em que são inseridas, gerando e oferecendo projetos que contribuem para a comunidade nos âmbitos sociais, culturais, educacionais e ambientais.

Portanto, a Casa Muniz Freire, última representante da arquitetura neoclássica na Cidade Alta, e que detém grande participação na história capixaba, apresenta o potencial de contribuir com o Centro Histórico de Vitória e sociedade, representando a memória da construção histórica, assim como, dos personagens que viveram e utilizaram o local, podendo propagar ações culturais e educativas, contribuindo para a vitalidade da Cidade Alta.

Do ponto de vista arquitetônico e operacional estes estudos deverão ainda ser objeto de futuras análises comparativas com intuito de apropriar soluções que venham corroborar com o projeto de requalificação para a Casa-Museu Muniz Freire – Museu Capixaba da 1ª República (1889 – 1930).


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PROJETO DE REQUALIFICAÇÃO DA CASA-MUSEU MUNIZ FREIRE

Baseado na análise e pesquisas já citadas neste trabalho, compreende-se o carecimento de um projeto de requalificação de uso para o imóvel Casa Muniz Freire visando a transformação do mesmo em uma Casa-Museu. Para tanto, serão efetuados diagnósticos e estudos com o objetivo de propor uma ambientação funcional, que resgate a historicidade do monumento e o conecte com os visitantes e seu entorno. 5.1 MAPEAMENTO DE DANOS A Casa Muniz Freire, segundo a análise e indicação de grau de conservação dado pela SEDEC/PMV (Bom, Regular e Péssimo), datada de 2006, se encontra em estado regular de conservação. Contudo, considerando as reportagens dos jornais A Gazeta e CBN Vitória, realizadas em 2018, que abordam as invasões, saqueamentos e depredações que o edifício sofreu nos últimos anos, pode-se pressupor que o imóvel apresenta hoje, um estado de conservação em grau inferior ao que consta na análise de 2006.

A partir do projeto desenvolvido em 2006 para o imóvel, obtido junto à SEDEC, analisa-se que os pisos, em granilite polido, na cor natural, não constituem matéria original do imóvel histórico, tendo sido adaptação corrente do período de ocupação como escola, ao longo do século XX. Conforme o documento da SEDEC estes se encontram bem preservados. Da mesma forma, o piso da quadra existente, também é do tipo moldado em loco com o uso de granilite. Já os pisos das áreas molhadas (banheiros, cozinha, área de serviço) e dos corredores se encontram em estado de conservação regular, sendo estes pisos de cerâmica, cimentado liso, ladrilho hidráulico e blocos de concreto intertravados (Figura 58 e 59). Também, nesses casos, não se observa nenhuma qualidade construtiva no material de forma que não se pode afirmar sua originalidade ou estado primitivo no imóvel histórico.


90 Figura 58: Planta esquemática destacando o grau de conservação dos pisos existentes térreo.

Fonte: Elaborado pela Autora sobre documentação SEDEC de 2006.

Figura 59: Planta esquemática destacando o grau de conservação dos pisos existentes pavimento superior.

Fonte: Elaborado pela Autora sobre documentação SEDES de 2006.

A respeito das paredes e tetos, todos os espaços do edifício, segundo documentos da SEDEC, apresentam grau de conservação regular. Sendo as paredes, rebocadas e emassadas com pintura do tipo PVA, na cor azul céu, e rodapés de granito cinza andorinha (Figuras C e D); revestidos com cerâmica 0,20 x 0,30m até a altura de 1,06m; revestidos com azulejo 0,15 x 0,15m até o teto ou azulejo até a altura de 1,50m e, restante, com alvenarias rebocadas e pintadas com tinta PVA. Os tetos encontram-se com pintura do tipo PVA, na cor branca, com forros de madeira pintados com tinta do tipo esmalte ou forros de gesso, emassados e pintados com tinta PVA.


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Novamente não se observa nenhum caráter qualitativo nos materiais observados e percebe-se que estes se tratam de intervenções espúrias ao longo do século XX, quando o imóvel veio sendo utilizado como escola. Figura 60: Interior da Casa Muniz Freire.

Fonte: Google Maps, fev. 2020.

Figura 61: Interior da Casa Muniz Freire.

Fonte: Google Maps, fev. 2020.

Como exceção, no térreo, os espaços de cantina e depósito apresentam, conforme documento da SEDEC, estado péssimo de conservação nos pisos, paredes e tetos, sendo os pisos de granilite polido cor natural e cimentado liso, respectivamente. A cantina possui paredes revestidas com azulejo até 1,50 m e o restante pintado com tinta PVA sobre o reboco, enquanto o depósito, também pintado, possui rodapé em granito cinza andorinha. O teto dos dois espaços é pintado com tinta PVA sobre forro de gesso.

Como anteriormente destacado, esse registro é anterior aos danos sofridos com os anos de abandono e invasões ocorridas e noticiadas na mídia de forma geral. Após depredações e ocupações indevidas sofridas pelo edifício, observa-se que muitas partes dos forros de madeira se encontram destruídas e ameaçam cair juntamente com a fiação e os equipamentos de iluminação. Além disso, foi relatado, a existência de paredes quebradas e mofadas, esquadrias instáveis, apodrecidas e telhas quebradas ou ausentes (Figura 62 e 63) (A GAZETA, 2018).


92 Figura 62: Interior da Casa Muniz Freire após ocupações.

Fonte: TV Gazeta, 2018.

Figura 63: Interior da Casa Muniz Freire após ocupações.

Fonte: TV Gazeta, 2018.

Nas áreas descobertas do edifício (Figuras 64 e 65), observa-se que além da pavimentação externa danificada, os vãos de acesso ao edifício encontram-se bloqueados por tijolos, e as áreas verdes existentes encontram-se abandonadas, degradadas e sem cuidados paisagísticos.


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Figura 64: Pátio descoberto à direita da Casa Muniz Freire.

Figura 65: Pátio descoberto na entrada da Casa Muniz Freire.

Fonte: Google Maps, fev. 2020.

Fonte: Google Maps, fev. 2020.

Por observação simples, as fachadas da Casa Muniz Freire encontram-se em estado de conservação precário. Na fachada principal (Figuras 66 e 67), as paredes externas estão com pintura desgastada, descascada e sujas, com marcas de umidade, vegetação infiltrada na alvenaria, pichações e desagregação do material, bem como, muitos dos ornamentos em estuque avariados. As esquadrias em madeira e vidro se encontram apodrecidas e quebradas. Apesar disso, as grades e balcões de ferro se encontram íntegros e bem preservados aparentemente, porém, com oxidações superficiais e perdas na parte superior do peitoril de madeira, ausente.


94 Figura 66: Esquema de Mapeamento de Danos da Fachada principal Casa Muniz Freire.

Fonte: Autora, 2021.

Figura 67: Fachada principal Casa Muniz Freire.

Fonte: Autora, 2021.


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Na fachada lateral, similar a fachada frontal, pode-se perceber o desgaste da pintura, esquadrias quebradas, detalhes de frisos e cercaduras em estuque danificados e vãos de esquadrias fechados com tijolos (Figuras 68 e 69). Os muros externos apresentam, além da pintura desgastada, muitas pichações (Figura 70), além do gradil oxidado. Em todos os vãos do pavimento térreo observa-se o uso de grades de ferro em um padrão moderno e, ainda, alguns vãos emparedados conforme pode-se observar no mapeamento das fachadas. Figura 68: Esquema de Mapeamento de Danos da Fachada lateral Casa Muniz Freire.

Fonte: Autora, 2021.

Figura 69: Fachada lateral e muro externo da Casa Muniz Freire.

Fonte: Google Maps, 2021.


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Figura 70: Muro externo da Casa Muniz Freire.

Fonte: Google Maps, 2021.

Mediante estas observações, pautadas no material disponibilizado pela SEDEC, bem como, fotos encontradas na internet, notícias de jornal e observação externa simples do edifício; conclui-se que este encontra-se em estado

precário

de

conservação,

fazendo-se

necessária,

além

da

implementação de um projeto de requalificação, um amplo estudo de intervenção restaurativa sobre o arcabouço histórico da edificação, avaliando a permanência e adequação de soluções e materiais espúrios ao bem patrimonial; adaptando seu interior ao novo uso, revelando qualidades perdidas com o passar do tempo e ausência de manutenções e conservações preventivas; respeitando-se a historicidade do edifício, dada a importância de sua memória histórica como a única remanescente do período neoclássico na Cidade Alta e uma das poucas ainda existentes no Centro Histórico de Vitória.

A proposta de intervenção restaurativa para as fachadas históricas do edifício, necessita tratar os diversos danos já citados e mapeados anteriormente. Dentre eles, os de maior destaque negativo são as lacunas dos detalhes em estuque, a descamação e marcas de sujidade na pintura, e o gradil de ferro nas janelas e portas do pavimento térreo, que descaracterizam o edifício neoclássico. Possivelmente, mediante ensaios e prospecções parietais, será possível a detecção de intervenções cimentícias que podem ainda estar


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causando os problemas observado, vez que, à data de construção do imóvel, este não contava com o uso desse material.

O projeto de requalificação do edifício e o projeto restaurativo da fachada a seguir englobam a importância histórica do imóvel, preservando e realçando as poucas partes originais do edifício que restaram. Durante as últimas décadas, o edifício recebeu novos elementos, que além de descaracterizá-lo enquanto imóvel histórico neoclássico, possuem baixa qualidade em sua materialidade. Sendo assim, estes elementos, tais como pisos, paredes, forros, grades, entre outros, serão objetos de descarte na proposta de intervenção. 5.2

UM PRÓLOGO SOBRE A CASA BRASILEIRA NA PRIMEIRA REPÚBLICA

Ao momento dessa pesquisa e desenvolvimento do estudo para intervenção, não foram encontrados documentos ou iconografia da Casa Muniz Freire que permitissem sua compreensão espacial enquanto imóvel de moradia. À falta de documentação e informação suficientes a respeito da disposição e configuração original dos cômodos visando a adoção de um partido que atenda a museologia proposta, partiu-se para um estudo imersivo na configuração tradicional da Casa Brasileira no período de estudo. Desse modo foi realizada uma ampla pesquisa acerca das casas brasileiras deste mesmo período (final do século XIX e início do século XX), para que, assim, seja feita, por aproximação, uma reconfiguração de espaços aproximada de sua distribuição original, visando corroborar com a intervenção que possa se coordenar com a linha de curadoria prevista para os temas de ambientação museográfica.

Segundo o antropólogo Gilberto Freyre (2003) em sua obra seminal, Casa Grande e Senzala, a casa de residência é “uma das mais significativas expressões da cultura brasileira” (FREYRE, 2003). Diversos autores como Gilberto Freyre (2003), Robert Burford (1823), Maria Graham (1824), Louis Léger Vauthier (1975) e Daniel Kidder (1980), tiveram como objeto de análise e estudo a casa brasileira, suas transformações e sua relação com a sociedade.


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Freyre destaca que a evolução da arquitetura e espaços de moradia no Brasil, se deu tanto pelas influências culturais quanto do meio em que está inserida. Segundo o autor, o tipo de casa estava relacionado aos materiais construtivos, ao entorno e ao morador, assim, a distribuição interna dos cômodos se moldava não só em função do seu uso, mas também por hábitos e costumes dos moradores, evidenciando as relações sociais e familiares. Para o autor, a casa “constitui um conjunto de valores, mitos, tradições, símbolos, social e regionalmente dispersos” (FREYRE, 2003).

Autores como Vauthier (1975) e Burford (1823), analisaram e detalharam, ao seus tempos, os espaços internos que compunham as casas de famílias mais abastadas do século XIX, influenciadas pelo processo de "re-europeização" das cidades e sociedade na época.

Em sua obra, Casa de Residência no Brasil, Vauthier descreve como eram distribuídos os espaços internos das casas do Rio de Janeiro e São Paulo. Segundo ele, as residências dispunham de uma sala na frente, outra nos fundos, entre elas uma ou duas alcovas fechadas com portas envidraçadas; conectando as salas, um corredor extenso, de onde iniciava a escada e para onde se direcionavam cubículos sem iluminação (VAUTHIER, 1975).

Já Burford, sobre as casas para as classes mais altas, de dois ou três pavimentos, discorre que

costumam ter um espaço aberto na frente, com grandes portas duplas; um amplo lance de escadas conduz ao andar superior, constituído pela sala ou saleta, lindamente pintada e ornamentada em dourado, com portas duplas que dão para os dormitórios, além da varanda, onde em geral a família faz as refeições e recebe visitas durante o dia, as partes baixas são ocupadas por serviçais, escravos, animais e para fins domésticos. (BURFORD, 1823).

Corroborando com os relatos dos autores citados sobre as casas brasileiras do século XIX e XX, destacam-se, a seguir, casas brasileiras que se tornaram


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casas-museu, preservando e expondo os modos de morar e viver dos personagens históricos que ali viveram.

O Museu Dr. Carlos Barbosa Gonçalves, antiga residência do médico e político sul-rio-grandense no final do século XIX e início do século XX, localizado em Jaguarão, Rio Grande do Sul, apresenta alta preservação dos cômodos, mobiliários e objetos pessoais da família que ali residiu. O casarão de estilo eclético, datado de 1886, apresenta a maior parte de seus cômodos preservados e ambientados, como o solário, sala de almoço, quarto de empregados, vestíbulo de serviço, casa de banhos, cozinha, dois quartos de solteiro, quarto de casal, quarto principal, gabinete/biblioteca, sala de espera, sala de visitas, quarto de visitas, sala de música, vestíbulo social, sala de jantar, louceiro, circulação, jardim e fonte (Figura 71). Figura 71: Sala de Jantar, Museu Casa Barbosa, Jaguarão, RS.

Fonte: Carlos Vilian Caetano.

A Casa Museu Benjamin Constant, já analisada nesta pesquisa, localizada no Rio de Janeiro, habitada pelo engenheiro militar e político Benjamin Constant Botelho de Magalhães em 1889, hoje representa a “Primeira Casa da República”. O conjunto apresenta os cômodos: vestíbulo, sala de visitas, três quartos de solteiro, cozinha, casa de banhos, gabinete/escritório, sala de almoço, quarto principal, sala de jantar, vestíbulo de serviços, varanda, circulação, jardim e gazebo (Figura 72).


100 Figura 72: Sala de Jantar, Casa Museu Benjamin Constant, Rio de Janeiro, RJ.

Fonte: IPHAN, S/D

A Casa de Oliveira Vianna, construída em 1911 em Niterói, foi residência do sociólogo Francisco José de Oliveira Vianna, e hoje funciona como centro de pesquisas de Ciências Sociais. Apesar do novo uso atribuído à edificação, há ambientes conservados com acervo original, onde ficam expostos mobiliário, pinturas, porcelanas, cristais e objetos pessoais do antigo residente. O imóvel conta com os ambientes de varanda, vestíbulo, sala de visitas, sala de jantar, gabinete/biblioteca, dois quartos de solteiros, cozinha, casa de banhos, quarto principal, circulação, jardim e fonte (Figura 73). Figura 73: Gabinete/Biblioteca da Casa de Oliveira Vianna, Niterói, RJ.

Fonte:Pensando Museus. Disponível em <https://pensandomuseus.files.wordpress.com/2009/11/oliveiraviana.jpg>.


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Baseado nas obras e análises dos autores, a respeito das casas brasileiras e modos de morar nos séculos XIX e XX, na configuração das casas-museus citadas e análise dos documentos e plantas disponibilizadas pela SEDEC, pode-se atribuir uma setorização e divisão de cômodos à Casa Muniz Freire que se supõe aproximar-se de uma configuração inicial (Figura 74 e 75). Ressalta-se que essa atribuição visa única e exclusivamente a identificar e determinar um circuito expositivo, a partir da museologia proposta e seus temas de curadoria a seguir. Figura 74: Esquema suposto de setorização da Casa Muniz Freire no Século XIX - Térreo.

Fonte: Autora, 2021.

Figura 75: Esquema suposto de setorização da Casa Muniz Freire no Século XIX Pavimento Superior.

Fonte: Autora, 2021.


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5.3 CONCEITO PARA O PROJETO

O projeto para uma Casa-Museu na atualidade procura unir os conceitos tecnológico-interativo com o conceito de “cápsula do tempo”, destacando a dualidade entre o antigo-histórico e o novo que aproxima e forma novos públicos. Desse modo, as formas existentes do edifício histórico, junto com seu possível acervo e história expostos, serão integrados com novos materiais, como o vidro e o aço, assim como, faz-se presente o uso da tecnologia, para complementar e expor a curadoria do museu (Figura 76).

Em que pese a importância das etapas de prospecções parietais durante as obras; as cores pensadas para o projeto remetem às cores primordiais da arquitetura na primeira república, assim sendo o Amarelo-ocre nas alvenarias externas, Verde-floresta nas esquadrias com caixilharia e venezianas, branco ou marfim nas molduras, cercaduras, frisos e ornamentos se unem aos tons de cinza das pedras na escada externa e o preto ou verde nos gradis e ferros da varanda, sendo complementadas, ainda, com o verde da vegetação e o branco que virá através de novos materiais a serem propostos no anexo. Figura 76: Quadro Conceito “Moodboard”.

Fonte: Autora, 2021.


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5.4 O PROJETO

O projeto da Casa-Museu Muniz Freire, Museu Capixaba da 1ª República, parte do princípio de valorizar o edifício histórico, enquanto bem de valor para a sociedade, em consonância com a reforma de seu anexo que completa o conjunto edificado e dá suporte aos novos espaços e novo uso proposto. 5.4.1. Implantação A Casa-Museu, situada na cidade Cidade Alta, no Centro Histórico de Vitória, fica em um grande cruzamento entre as ruas Dr. José Benjamin Costa, Rua São Francisco, Rua Francisco Araújo e Rua José Marcelino. A edificação encontra-se em um lote com desnível, sendo o ponto mais alto na R. Dr. José Benjamin Costa e o ponto mais baixo na R. Francisco Araújo.

Assim, foi apresentado um acesso por rampa e escada para o novo espaço público aberto, proposto como praça de convivência, mantendo o nivelamento da casa histórica pré-existente.

O edifício anexo, também objeto de intervenção, apresenta um nível menor do que o da casa histórica, portanto são conectados também por degraus e rampa acessível conforme a norma NBR9050/2015.

O conjunto edificado apresenta dois acessos, sendo o principal frontal, de acesso aos visitantes, e um acesso posterior para atender o setor de serviços.

O entorno da Casa-Museu apresenta edifícios comerciais e de serviços que impactam diretamente no movimento de carros e pedestres da região, como o Fórum Muniz Freire, escritórios de advocacia e a Associação dos Funcionários Públicos do Espírito Santo, além deles, apresenta um eixo visual privilegiado para a Capela Santa Luzia.


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Deste modo, o projeto de intervenção da Casa Muniz Freire foi pensado de forma a resgatar um diálogo entre a cidade, os cidadãos e o edifício, tornando os espaços acessíveis, confortáveis e convidativos a todos. 5.4.2 Setorização A setorização e os fluxos do edifício foram pensados de forma a criar um circuito expositivo que fosse funcional e de acordo com a estrutura da casa histórica, resgatando, nesse novo momento, possíveis fluxos que um dia a edificação já dispôs, facilitando, assim, o entendimento da história que é apresentada pelo edifício, agora como uma casa-museu. A respeito do anexo, os espaços foram dispostos de forma a realçar os espaços livres e amplos, possibilitando fluxos mais livres e espontâneos.

Os espaços expositivos foram propostos de forma que o acervo fixo da casamuseu ocupasse os cômodos da casa histórica, conectando e criando uma ponte entre o conteúdo exposto e o cômodo em que estão inseridos.

A linha de curadoria escolhida para a Casa Museu em questão, abrange as formas de viver e morar durante a 1ª República, destacando o personagem histórico, Muniz Freire, antigo morador, e associando os espaços da casa histórica com a sociedade dos séculos XIX/XX.

Desta forma, chegou-se a seguinte linha de curadoria: Sala 1 (Antigo Gabinete): Linha do tempo - A 1ª República no Espírito Santo e Muniz Freire na História Capixaba. No primeiro espaço expositivo da Casamuseu, propõe-se contextualizar aos visitantes o que acontecia no Espírito Santo durante a 1ª República, assim como, apresentar a história de Muniz Freire, importante personagem daquele momento.

Sala 2 (Antiga Biblioteca): O que se fala, o que se lê, instrução e profissões. No ambiente que poderia ter sido a antiga biblioteca da casa histórica, deverá ilustrar e ambientar os visitantes sobre profissões, informações jornalísticas, conteúdos e notícias de relevância da época.


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Sala 3 (Antigo Quarto de Arrumação): Modos de viver, Modos de morar. Esta sala abordará, os costumes dos moradores e como se relacionavam com a casa no dia a dia.

Sala 4 (Antiga Cozinha): A Casa Capixaba na 1ª República e a Casa Muniz Freire. A, supostamente, antiga cozinha, foi escolhida para tratar do tema da Casa Capixaba, como eram as construções na 1ª República, materiais e técnicas construtivas utilizadas para erguer as edificações, bem como o enquadramento da Casa Muniz Freire em relação às edificações da época.

Sala 5 (Antigo Espaço dos Serviçais e Armazém): Vitória, Transformações Urbanas na Primeira República. Aqui, trata-se da cidade de Vitória e as grandes transformações urbanas que ocorreram na época da 1ª República.

Sala 6 (Antigo Solário/Sala de Almoço): Questões de Gênero, a Mulher na 1ª República e Dona Colatina Soares de Azevedo. Esta sala, aborda a vivência de ser mulher na 1ª República, seus desafios e conquistas, dando destaque a Dona Colatina, esposa de Muniz Freire, que também habitou a Casa.

Sala 7 (Antigo Quarto Principal e Casa de Banho): Histórias de Alcovas. Fazendo-se uma conexão com o que provavelmente seria o quarto principal e casa de banho da residência, estarão expostas curiosidades e costumes a respeito da intimidade das pessoas no século XIX.

Sala 8 (Antiga Sala de Jantar): Cotidiano Doméstico, Comer e Conviver. Esta sala abarca informações sobre o convívio à mesa, como eram os banquetes, jantares, da família e junto a convidados.

Sala 9 (Antiga Sala de Música): Música, Teatro e Arte na 1ª República. No que supostamente seria a antiga sala de música, expõe-se os acontecimentos do cenário artístico da época, abrangendo a música, teatro, artes plásticas e outros.


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Sala 10 (Antigo Salão): Famílias e Vida Social. No último e maior cômodo da casa, provavelmente antigo salão, voltado para fachada principal, face à rua, estão as informações acerca da vida social, bailes e famílias de destaque na sociedade da época.

Circulação: O Colégio São Vicente de Paulo e a Casa Muniz Freire no Século XX. As paredes da circulação foram designadas para abrigar e contar um pouco da história da residência a partir do momento em que se tornou Colégio São Vicente de Paulo, que ocupou a casa por 93 anos.

A partir deste percurso da linha de curadoria, definiu-se uma setorização (Figura 77 e 78), onde o acervo e exposições são abrigados pelos cômodos do edifício histórico, compostos também pelo jardim frontal, edifício anexo e espaço público proposto. Figura 77: Setorização em Bolhas do Pavimento Térreo.

Fonte: Autora, 2021.


107 Figura 78: Setorização em Bolhas Pavimento Superior.

Fonte: Autora, 2021.

Previu-se ainda, um espaço expositivo para receber exposições temporárias e outros eventos de caráter cultural, situado no edifício anexo.

Ainda no edifício histórico, definiu-se uma área para entrada principal com bilheteria, guarda volumes e jardim. Na área do pátio do antigo Colégio São Vicente, foi proposto um espaço público aberto, para melhor aproveitamento do espaço, integração com a rua, pedestres e visuais para o monumento histórico Capela Santa Luzia.

No edifício anexo, propõe-se um espaço de galeria, que receberá exposições temporárias e eventos culturais, assim como, uma loja para o museu, banheiros para os visitantes, auditório e espaço de serviços.

No pavimento superior deste bloco, encontra-se a parte administrativa, pensada para abrigar uma sala de reuniões, estações de trabalho para coordenações administrativa e técnica, serviço educativo, e museologia, laboratório de restauro e banheiros.


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5.4.3 A Intervenção A partir da setorização, realizou-se a proposta de demolição e construção (Figuras 79 e 80), para atender às novas necessidades dessa mudança de uso, transformando a Casa Muniz Freire em uma casa-museu. Figura 79: Planta de Demolição e Construção Pavimento Térreo.

Fonte: Autora, 2021.

Figura 80: Planta de Demolição e Construção Pavimento Superior.

Fonte: Autora, 2021.


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Para restituir o edifício histórico, foram demolidas muitas das paredes internas existentes, construídas no século XX, enquanto a casa abrigava o Colégio São Vicente de Paulo. Da mesma forma, as esquadrias foram transferidas de lugar a fim de restituir o alinhamento histórico de portas e janelas com as ventilações cruzadas a partir das fachadas.

No edifício anexo, também foram demolidas paredes internas, já que essas não serviam para o novo uso e divisão interna proposta. No pavimento superior, as paredes internas foram demolidas para dar lugar a um ambiente amplo e integrado.

Os muros externos foram demolidos com o objetivo de integrar o edifício com as ruas do Centro Histórico de Vitória, assim, o antigo pátio aberto do colégio São Vicente de Paulo torna-se uma praça aberta como espaço público da Cidade Alta.

Entre as salas de exposição, localizadas no edifício histórico, abriu-se vãos para criar uma conexão interna entre os ambientes, de forma independente do corredor externo, a fim de tornar o percurso da exposição mais funcional (Figura 81 e 82).


110 Figura 81: Planta Baixa Pavimento Térreo.

Fonte: Autora, 2021.

Figura 82: Planta Baixa Pavimento Superior.

Fonte: Autora, 2021.

Os espaços internos da casa histórica foram designados para as exposições do acervo fixo, que ambientam e apresentam um pouco da história da 1ª República, de Muniz Freire e da Casa Capixaba. A conexão vertical entre os dois pavimentos se dá pela nova escada proposta, que apresenta formato escultural, e se destaca por sua materialidade divergente da materialidade histórica dos cômodos.


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A edificação histórica conta com três circulações verticais sendo elas uma escada já existente, na varanda, uma escada nova e um elevador. A fim de preservar o “casco histórico” do edifício, propõe-se que a estrutura da nova escada e o fechamento em alvenaria que recebe o elevador não encostem nas paredes históricas pré-existentes. Esta diretriz de projeto possibilita a aplicação do princípio da reversibilidade, presente nos documentos que regem as boas práticas do restauro (Figura 83 e 84). Figura 83: Corte Transversal AA.

Fonte: Autora, 2021.

Figura 84: Corte Longitudinal BB.

Fonte: Autora, 2021.


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Logo na entrada da Casa-Museu, no jardim da casa, há um novo volume proposto, edificado como um equipamento independente, que apresenta a função de guarda volumes e bilheteria do museu. Assim como os novos volumes de escada e elevador, com o intuito de preservação do imóvel histórico, o volume proposto no jardim, não entra em contato com os muros e alvenarias pré-existentes. Em todos os novos volumes propostos para compor a casa histórica, utilizam-se de materiais e técnicas construtivas modernas, a fim de resgatar o conceito de dualidade entre o novo e o histórico.

Ao sair do circuito do edifício histórico, o visitante é conduzido para o edifício anexo onde se situa a galeria. Lá estão reunidos espaços de descanso, loja do museu, banheiros, e espaços para receber exposições temporárias. A área dá acesso também a um auditório, com capacidade para 60 pessoas, que foi pensado para a realização de palestras, cursos, visitas escolares, entre outros. Possui ainda, um acesso de serviços, para a área de vestiários e copa restrita aos funcionários.

No edifício anexo há cinco circulações verticais, uma escada e um elevador para o pavimento superior, degraus e rampa acessível conectando o edifício histórico com a galeria e uma escada de acesso externo para a área de serviços.

No pavimento superior do anexo, encontra-se a parte administrativa, que foi desenvolvida

em

conceito

aberto.

Apresenta

estações

de

trabalho

(coordenação administrativa, coordenação técnica, equipe do educativo, e equipe da museologia), um espaço de copa, banheiros, uma sala de restauro e uma sala de reunião. As duas salas propostas apresentam fechamento em vidro, fazendo correlação com o conceito de integração dos ambientes, sem perder a privacidade, com a opção de manter esses espaços reservados por meio de persianas embutidas.

O espaço público, foi proposto para atender tanto aos visitantes na saída da casa-museu, quanto aos cidadãos, pedestres e moradores dos arredores. Com uma cafeteria, mesas, bancos e vegetação, o espaço se torna um agradável


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ambiente de estar na cidade Alta, e ainda conta com visuais para a Capela Santa Luzia, a igreja mais antiga de Vitória e de importância arquitetônica para a cidade. 5.4.4 Materialidade do Projeto Em concordância com o conceito do projeto de intervenção já apresentado, os materiais propostos para o compor o edifício histórico restaurado são contrastantes.

Os materiais existentes na fachada do edifício histórico, serão restituídos em sua integridade física visando a conservação dos mesmos. Será necessária a restauração das esquadrias danificadas, e a instalação de novas peças para substituir as faltantes a fim de restituir a estética neoclássica da Casa Muniz Freire.

Para interligar os espaços do edifício histórico com os novos espaços do anexo, propôs-se portas e fechamento em vidro, para que além de não criar falso histórico, representasse o contraste e a dualidade entre as duas edificações. Com o mesmo intuito, para as novas edificações situadas no jardim da casa histórica, no espaço de uso público e o mobiliário para esta mesma área, foram escolhidos materiais de cunho moderno, como o aço corten, vidro e revestimento ripado horizontal em madeira clara.

Apesar da dualidade proposta no projeto, deve-se regular a utilização dos novos materiais e comunicação visual das novas construções, para que não haja materiais de dimensões e cores exacerbadas, retirando o foco do imóvel histórico. 5.4.5 Proposta Cromática Mediante estudo cromático da arquitetura desenvolvida no limiar do século XIX/XX, propõe-se o uso de uma nova cor, diferente do azul claro utilizado nas últimas décadas quando a casa foi ocupada pelo colégio. As fachadas em


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amarelo-ocre, esquadrias em verde-floresta e frisos e ornamentos em branco, foram escolhidas em consonância com as origens neoclássicas do monumento e com o contexto histórico em que foi construído e seu novo uso representando o período da 1ª República (Figura 85 e 86). Figura 85: Fachada Frontal Casa-Museu Muniz Freire.

Fonte: Autora, 2021.

Figura 86: Fachada Lateral Casa-Museu Muniz Freire.

Fonte: Autora, 2021.

Essa mudança faz-se necessária para preservar e valorizar as principais características do edifício histórico, com o propósito de destacá-lo enquanto monumento histórico na Cidade Alta no Centro Histórico de Vitória.


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5.4.6 Perspectivas Logo na entrada da Casa-Museu Muniz Freire, se encontra o jardim interno do imóvel, onde foi situado o quiosque de bilheteria e guarda-volumes, proposto em aço corten. O jardim foi pensado para que além de servir de espaço de descanso e estar, pudesse exemplificar como eram utilizados os jardins no século XIX, resgatando espécies de plantas aromáticas como a canela e o cravo, e flores como a rosa. Após a passagem pelo jardim e bilheteria, o visitante ingressa na casa histórica para dar início a exposição (Figura 87). Figura 87: Jardim interno.

Fonte: Autora, 2021.

O início da exposição, o visitante encontrará, além de informações sobre Muniz Freie e o contexto da 1ª República, exemplo exposto de como eram ambientados os gabinetes/bibliotecas de uma casa tradicional brasileira no século XIX. As salas de exposição foram pensadas para receber piso novo amadeirado, e forro em gesso branco, sendo os elementos de iluminação escolhidos, os spots direcionáveis com lâmpada LED, e perfis de LED embutidos no forro de gesso, também na cor branca para criar uma homogeneidade no teto dos ambientes e não roubar a atenção do conteúdo exposto (Figura 88).


116 Figura 88: Sala de exposição 1 (antigo gabinete).

Fonte: Autora, 2021.

A quarta sala de exposição, receberá um novo e importante elemento construtivo, a escada que dá acesso ao pavimento superior. Sua materialidade em aço e vidro contrasta com o edifício histórico em que se situa, resgatando o conceito do projeto de dualidade entre os tempos. A escada torna-se um elemento visual importante no ambiente e é complementado pelas obras expostas em seu arredor (Figura 89). Figura 89: Sala de exposição 4 (antiga cozinha).

Fonte: Autora, 2021.


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Na última sala de exposição, encontram-se espaços antigos em exposição, que representam os ambientes de salão social do século XIX. Além dos espaços antigos, os visitantes encontram equipamentos interativos, como a mesa touchscreen interativa, onde podem adquirir conhecimento de uma forma mais descontraída e diferente da convencional (Figura 91). Figura 90: Sala de Exposição 10 (antigo salão social).

Fonte: Autora, 2021.

Anexo a casa histórica, se situa a galeria, planejada para receber exposições temporárias, loja do museu, espaços de descanso, assim como, acesso aos banheiros e auditório.

Por se encontrar em um nível abaixo do da casa histórica, o acesso a galeria se dá por meio de degraus e rampa acessível. Os materiais escolhidos, em consonância com o resto do projeto, foram o piso em madeira, o vidro, e o aço corten.


118 Figura 91: Espaço Galeria e Loja.

Fonte: Autora, 2021.

Saindo da Casa-Museu, o visitante encontra uma área pública, praça de convivência, onde há uma cafeteria, mesas e cadeiras, bancos e vegetação. O espaço além de contemplar visuais privilegiados para a Capela Santa Luzia, compõe a arquitetura da Casa-Museu Muniz Freire e contribui para a vitalidade da região (Figura 93). Figura 92: Fachada e área pública.

Fonte: Autora, 2021.


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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entende-se aqui a relevância da única remanescente construção neoclássica situada na Cidade Alta em Vitória, a Casa Muniz Freire, assim como, o potencial de transformá-la em uma Casa-Museu, honrando a contribuição do personagem e antigo morador Muniz Freire, na história capixaba alinhados ao contexto da 1ª República, a construção e sua memória.

O imóvel, objeto desta pesquisa, foi compreendido como degradado, abandonado e em estado precário, sendo imprescindível a transformação do mesmo em uma Casa-Museu, resgatando e valorizando sua importante arquitetura, materialidade, história e representatividade arquitetônica.

O museu, em específico a casa-museu, foi definido como novo uso para a Casa Muniz Freire, já que foram entendidos como um espaço material de valor para a cidade e para a sociedade, criando uma interseção entre cidadãos e construção, permeando as esferas da memória, educação e cultura, colaborando para uma melhor vivência na região.

Os objetivos dessa pesquisa, foram alcançados mesmo com as dificuldades encontradas para diagnosticar o estado atual do edifício, dado que, além do mesmo encontrar-se em estado insalubre, nos encontramos em ano de pandemia da Covid-19, limitando assim os acessos in loco. Da mesma forma, embora tenha sido realizada uma ampla pesquisa, não foram encontrados fotos, informações e documentos históricos que pudessem ilustrar fielmente como era disposta a construção original.

Percebe-se após a realização desse trabalho, a importância do resgate de edificações como a Casa Muniz Freire, como forma de perpetuar para as próximas gerações um pouco da história, cultura, materialidade e arquitetura de uma sociedade e geração. A proposta da Casa-Museu Muniz Freire, Museu Capixaba da 1ª República, possibilitará esse resgate, assim como, contribuir


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para a vitalidade da região onde está inserida e fortalecer a relação do cidadão com o edificado e com os espaços públicos.


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REFERÊNCIAS

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SO BE

SOB E DE SCE

SOBE

SOBE

LEGENDA PAREDE A CONSTRUIR PAREDE A DEMOLIR


DESCE

DESCE

LEGENDA PAREDE A CONSTRUIR PAREDE A DEMOLIR


SOBE

SOBE

SOB E

DESCE

SOBE

SOBE


DESCE

DESCE

DESCE



B

D SERVIÇO 45,42 m2

A

A

DESPENSA/ DEPÓSITO 15,34m2

1

2

3

4

5

6

7

8

COZINHA 25,89m2

9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21

CIRCULAÇÃO 11,08 m2

S S

CIRCULAÇÃO 11,08 m2

WC 1,91 m2

WC 2,21 m2

SALA 11,08 m2

C

SALA 34,41 m2

WC 2,05 m2

SALA 18,24 m2 HALL 2,47 m2

SALA 40,05 m2

H=100 11 10 12 13

SALA 4,71 m2

7 1

SALA 8,36 m2

2

3

4

6 5

14 DESCE

C

9 8 7 6 5

D

S 1

2 3

4 5

PLANTA BAIXA - JIRAU

6

D 20 19 18

Planta Baixa - Térreo

ELABORADO POR:

CONVENÇÕES:

B

Planta Baixa - Lance Intermediário da Escada

17 16 15 14 13

2 3

4 5

6

7

8

9

10 11 12

RESP. TÉCNICO:

ESCALA ORIGINAL ESCALA GRÁFICA Horizontal Vertical DATA

IMPRESSO EM

Projetos Executivos de Arquitetura e Complementares de Engenharia - Contrato 202/06

REVITALIZAÇÃO DA ESCOLA SÃO VICENTE DE PAULO

LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO PLANTA - PRESERVAÇÃO - TERRÉO

04/09


B D

WC MASC. 1,82 m2

A

WC 1,37 m2

SALA 21,21 m2

WC FEM. 3,05 m2 1

2

3

4

5

6

7

8

9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21

CIRCULAÇÃO 26,07 m2

S

CIRCULAÇÃO 16,57 m2

SALA 51,84 m2

SALA 51,17 m2 SALA 44,10 m2

C C

20 19 18

17 16 15 14

D 30 21

22 23 24 25 26 27 28 27

29

D

Planta Baixa - Pav. Superior

B

ELABORADO POR:

CONVENÇÕES:

RESP. TÉCNICO:

ESCALA ORIGINAL ESCALA GRÁFICA Horizontal Vertical DATA

IMPRESSO EM

Projetos Executivos de Arquitetura e Complementares de Engenharia - Contrato 202/06

REVITALIZAÇÃO DA ESCOLA SÃO VICENTE DE PAULO

LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO PLANTA - PRESERVAÇÃO - SUPERIOR

05/09


B D

A

A

C C

B

D

Planta DE COBERTURA ELABORADO POR:

CONVENÇÕES:

RESP. TÉCNICO:

ESCALA ORIGINAL ESCALA GRÁFICA Horizontal Vertical DATA

IMPRESSO EM

Projetos Executivos de Arquitetura e Complementares de Engenharia - Contrato 202/06

REVITALIZAÇÃO DA ESCOLA SÃO VICENTE DE PAULO

LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO PLANTA DE COBERTURA

03/09


Corte AA

ELABORADO POR:

CONVENÇÕES:

RESP. TÉCNICO:

ESCALA ORIGINAL ESCALA GRÁFICA Horizontal Vertical DATA

IMPRESSO EM

Projetos Executivos de Arquitetura e Complementares de Engenharia - Contrato 202/06

REVITALIZAÇÃO DA ESCOLA SÃO VICENTE DE PAULO

LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO CORTE AA

06/09


Corte CC

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RESP. TÉCNICO:

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IMPRESSO EM

Projetos Executivos de Arquitetura e Complementares de Engenharia - Contrato 202/06

REVITALIZAÇÃO DA ESCOLA SÃO VICENTE DE PAULO

LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO CORTE CC

07/09


Corte BB Corte DD

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RESP. TÉCNICO:

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Projetos Executivos de Arquitetura e Complementares de Engenharia - Contrato 202/06

REVITALIZAÇÃO DA ESCOLA SÃO VICENTE DE PAULO

LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO CORTE BB - CORTE DD

08/09


Fachada Principal

Fachada Lateral

ELABORADO POR:

CONVENÇÕES:

RESP. TÉCNICO:

ESCALA ORIGINAL ESCALA GRÁFICA Horizontal Vertical DATA

IMPRESSO EM

Projetos Executivos de Arquitetura e Complementares de Engenharia - Contrato 202/06

REVITALIZAÇÃO DA ESCOLA SÃO VICENTE DE PAULO

LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO CORTE BB - CORTE DD

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Articles inside

Figura 91: Sala de Exposição 10 (antigo salão social

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Figura 87: Jardim interno

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Figura 78: Setorização em Bolhas Pavimento Superior

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page 108

Figura 76: Quadro Conceito “Moodboard”

5min
pages 103-106

Figura 77: Setorização em Bolhas do Pavimento Térreo

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page 107

Figura 75: Esquema suposto de setorização da Casa Muniz Freire no Século XIX - Pavimento Superior

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Figura 70: Muro externo da Casa Muniz Freire

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pages 97-99

Figura 71: Sala de Jantar, Museu Casa Barbosa, Jaguarão, RS

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Figura 57: Casa Museu Ema Klabin em São Paulo, SP Figura 58: Planta esquemática destacando o grau de conservação dos pisos existentes -

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pages 88-90

Figura 56: Museu Casa Benjamin Constant no Rio de Janeiro, RJ

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pages 86-87

Figura 55: Museu Casa de Portinari em Brodowski, SP

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pages 84-85

Trem

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Figura 31: Escadaria Maria Ortiz no Centro de Vitória

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pages 50-52

Figura 52: Mapa de imóveis vazios no Centro de Vitória

6min
pages 76-80

Figura 30: Desabamento na Rua Sete de Setembro, Centro de Vitória

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Figura 37: Sede da Fazenda Fortaleza em Alegre, ES

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Figura 34: Antiga Faculdade de Filosofia - FAFI

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Figura 29: Casa Muniz Freire atualmente

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Figura 28: Vista da Praça João Clímaco em direção à Rua Pedro Palácios

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pages 46-47

Figura 26: Catedral Metropolitana de Vitória

2min
pages 41-42

Figura 15: Sobrados da Rua José Marcelino em Vitória, ES

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Figura 25: Mercado Capixaba em Vitória, ES

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Figura 14: Cidade colonial, Macau, na China

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page 31

Figura 16: Casa nº 55 na Rua Muniz Freire em Vitória, ES

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pages 33-34

Figura 27: Associação dos Funcionários Públicos do ES

3min
pages 43-45

Figura 11: Igreja São Gonçalo em Vitória, ES

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pages 28-29

Figura 3: Projeto de um Novo Arrabalde, por Saturnino de Brito

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Figura 6: Avenida Central (atual Rio Branco) no Rio de Janeiro, inaugurada em 1904 idealizada por Pereira Passos na Reforma Urbana

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Figura 1: Retrato de José Melo de Carvalho Muniz Freire

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Figura 10: Capela Santa Luzia, em Vitória - ES

1min
page 27

Figura 2: Retrato de Colatina Soares de Azevedo

3min
pages 17-19

Figura 5: Retrato de Jerônimo de Souza Monteiro

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Figura 4: Reprografia colorida do Theatro Melpômene, 1906

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pages 21-22

Figura 7: Avenida Jerônimo Monteiro com os trilhos onde passavam os bondes elétricos

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