Cena 8 – o bicho-fera
Eu cresci sem nenhum receio, sem nenhum desbrio. Me apanhei um menino sem medo, medo foi coisa que nunca tive, nem do escuro, nem de assombração, nem de mula sem cabeça, nem de lobisomem. Nem da fome. Não tive medo nem do tempo... E foi justo o tempo que foi meu professor e como mestre-mor me incutiu o medo. Medo do sem-fim, medo das profundezas de mim mesmo, medo de não poder acreditar em mais nada... E só uma vez eu senti o medo lambujando o meu couro. Foi no trespassar de uma madrugada que escutei pela primeira vez um ronco abafado, que num se respirava nem esguinchava bruto. (Ruídos. Relinchos. Cascos.) Oxi. Quem vem lá? Que barulho é esse? (Ruídos) Um bicho? Uma fera? Era menos um relincho
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A TRAVESSIA DO GRÃO PROFUNDO.indd 43
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