CONTEÚDO LOCAL
Quem Deve Proteger o Conteúdo Local? Cabo Delgado sente-se excluída das oportunidades da indústria do gás a favor de outras províncias. Este facto, por si, revela o quão controversa é a noção do significado do Conteúdo Local e ficou patente no mais recente workshop realizado pelo Programa +Emprego na cidade de Pemba. Qual é a fronteira entre o “local” e o “nacional”? Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R
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maior parte dos jovens, quase 80%, está desempregada. As ofertas de emprego que aparecem são, geralmente, a favor dos que vêm de fora de Cabo Delgado, principalmente do Sul do País. O que é suposto ser feito para desfazer esta diferença de oportunidades?”. Apesar de a pergunta incidir sobre o emprego reflecte o sentimento de parte dos jovens e empresários de Cabo Delgado sobre o Conteúdo Local, e foi feita pela secretária-executiva da Câmara de Comércio de Moçambique – Delegação de Cabo Delgado – Lizette Almeida, no calor do debate sobre “Pequenas Empresas, Grandes Negócios: O Papel da Cooperação Empresarial na Obtenção de Novos Contratos e Criação de Emprego”, que teve lugar a 7 de Junho na cidade Pemba. Organizado pelo Programa +Emprego, em parceria com o Instituto de Formação Profissional e Estudos Laborais Alberto Cassimo (IFPELAC), a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) e a Media4Development, o workshop “Pequenas empresas, grandes negócios: O papel da Cooperação Empresarial na obtenção de novos contratos e criação de emprego”; procurou abrir caminhos para que cidadãos e empresas disponham de melhores ferramentas para gerar desenvolvimento numa província rica em recursos naturais. Mas, quando foi a vez de falar sobre “como potenciar o Conteúdo Local”, sobressaíram divergências que carecem de aprofundamento e esclarecimentos, quando ainda não existe um instrumento legal orientador. Cabo Delgado vs resto do País? Não deverá ser esse o caminho a seguir Enquanto a noção que se tem do Conteúdo Local, grosso modo, incide sobre a protecção de empresas nacio-
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nais, em Cabo Delgado a percepção é diferente. As empresas esperavam por uma atenção ainda mais focada dentro da província, em concorrência com a de outras províncias, sobretudo da capital, Maputo. Fica a ideia, no terreno, de que do ponto de vista das empresas de Cabo Delgado, não há diferença entre uma empresa estrangeira e uma nacional baseada fora da província quando se trata da busca por oportunidades da indústria do gás. “A maior inquietação que sentimos é que as empresas que prestam serviços às multinacionais são de fora de Cabo Delgado. Há diferenças de oportunidade. A nossa empresa, com toda a documentação requerida e a seguir todos os critérios necessários para obter a certificação de qualidade, não consegue contrato com as multinacionais porque ainda não está certificada, de facto. Por isso assistimos a muitas empresas de fora a preencherem o espaço que poderia ser nosso”, diz à E&M, Júlio Namburete, director administrativo da JC Service, empresa que actua na área da manutenção de sistemas de frio, com sede em Cabo Delgado. “Quem acaba passando à frente é quem vem de fora. Nós, os locais, ficamos sem actividade ou acabamos por ser subcontratados pelas empresas que vêm de fora”, realçou, referindo-se às empresas concorrentes nacionais. Em alguns casos, prossegue, “as empresas contratadas até estão registadas em Cabo Delgado, mas pertencem a estrangeiros”, e isso, em última análise, diz, “beneficia as economias de onde vêm os seus proprietários”. Apesar de ser uma posição que se considera válida, é preciso não perder de vista que a protecção do interesse nacional não inutiliza, por completo, o contributo que as empresas estrangeiras podem dar ao desenvolvimento, no-
meadamente através do pagamento de impostos e do emprego. Desnível a diminuir Durante o debate, várias vozes de representantes de empresas e de instituições levantaram-se em protesto relativamente ao desnível do acesso às oportunidades entre as empresas de Cabo Delgado e as do resto do País. Mas Anifa Megji, administradora do Grupo Saidou, empresa que opera na área de transporte e logística, entende que já passou o tempo em que as empresas estavam em desvantagem, porque houve um forte movimento das próprias multinacionais de procurarem serviços de empresas locais. “Essa iniciativa criou condições para que todas as empresas de Cabo Delgado, independentemente da dimensão, incluindo até os vendedores informais, tivessem a oportunidade www.economiaemercado.co.mz | Julho 2022