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CONTEÚDO LOCAL
Quem Deve Proteger o Conteúdo Local?
Cabo Delgado sente-se excluída das oportunidades da indústria do gás a favor de outras províncias. Este facto, por si, revela o quão controversa é a noção do significado do Conteúdo Local e ficou patente no mais recente workshop realizado pelo Programa +Emprego na cidade de Pemba. Qual é a fronteira entre o “local” e o “nacional”?
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Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R
“A maior parte dos jovens, quase 80%, está desempregada. As ofertas de emprego que aparecem são, geralmente, a favor dos que vêm de fora de Cabo Delgado, principalmente do Sul do País.
O que é suposto ser feito para desfazer esta diferença de oportunidades?”. Apesar de a pergunta incidir sobre o emprego reflecte o sentimento de parte dos jovens e empresários de Cabo Delgado sobre o Conteúdo Local, e foi feita pela secretária-executiva da Câmara de Comércio de Moçambique – Delegação de Cabo Delgado – Lizette Almeida, no calor do debate sobre “Pequenas Empresas, Grandes Negócios: O Papel da Cooperação Empresarial na Obtenção de Novos Contratos e Criação de Emprego”, que teve lugar a 7 de Junho na cidade Pemba.
Organizado pelo Programa +Emprego, em parceria com o Instituto de Formação Profissional e Estudos Laborais Alberto Cassimo (IFPELAC), a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) e a Media4Development, o workshop “Pequenas empresas, grandes negócios: O papel da Cooperação Empresarial na obtenção de novos contratos e criação de emprego”; procurou abrir caminhos para que cidadãos e empresas disponham de melhores ferramentas para gerar desenvolvimento numa província rica em recursos naturais.
Mas, quando foi a vez de falar sobre “como potenciar o Conteúdo Local”, sobressaíram divergências que carecem de aprofundamento e esclarecimentos, quando ainda não existe um instrumento legal orientador.
Cabo Delgado vs resto do País? Não deverá ser esse o caminho a seguir
Enquanto a noção que se tem do Conteúdo Local, grosso modo, incide sobre a protecção de empresas nacionais, em Cabo Delgado a percepção é diferente. As empresas esperavam por uma atenção ainda mais focada dentro da província, em concorrência com a de outras províncias, sobretudo da capital, Maputo.
Fica a ideia, no terreno, de que do ponto de vista das empresas de Cabo Delgado, não há diferença entre uma empresa estrangeira e uma nacional baseada fora da província quando se trata da busca por oportunidades da indústria do gás. “A maior inquietação que sentimos é que as empresas que prestam serviços às multinacionais são de fora de Cabo Delgado. Há diferenças de oportunidade.
A nossa empresa, com toda a documentação requerida e a seguir todos os critérios necessários para obter a certificação de qualidade, não consegue contrato com as multinacionais porque ainda não está certificada, de facto. Por isso assistimos a muitas empresas de fora a preencherem o espaço que poderia ser nosso”, diz à E&M, Júlio Namburete, director administrativo da JC Service, empresa que actua na área da manutenção de sistemas de frio, com sede em Cabo Delgado.
“Quem acaba passando à frente é quem vem de fora. Nós, os locais, ficamos sem actividade ou acabamos por ser subcontratados pelas empresas que vêm de fora”, realçou, referindo-se às empresas concorrentes nacionais. Em alguns casos, prossegue, “as empresas contratadas até estão registadas em Cabo Delgado, mas pertencem a estrangeiros”, e isso, em última análise, diz, “beneficia as economias de onde vêm os seus proprietários”.
Apesar de ser uma posição que se considera válida, é preciso não perder de vista que a protecção do interesse nacional não inutiliza, por completo, o contributo que as empresas estrangeiras podem dar ao desenvolvimento, nomeadamente através do pagamento de impostos e do emprego.
Desnível a diminuir
Durante o debate, várias vozes de representantes de empresas e de instituições levantaram-se em protesto relativamente ao desnível do acesso às oportunidades entre as empresas de Cabo Delgado e as do resto do País.
Mas Anifa Megji, administradora do Grupo Saidou, empresa que opera na área de transporte e logística, entende que já passou o tempo em que as empresas estavam em desvantagem, porque houve um forte movimento das próprias multinacionais de procurarem serviços de empresas locais.
“Essa iniciativa criou condições para que todas as empresas de Cabo Delgado, independentemente da dimensão, incluindo até os vendedores informais, tivessem a oportunidade de começar a vender os seus produtos e serviços aos grandes projectos”.

Os incentivos às empresas só são efectivos se estiverem assentes numa mentalidade receptiva a todos os que vierem dar competitividade local
O Conteúdo Local foi concebido e orientado para a vertente do interesse nacional. Ou seja, o “local” a que se faz menção está mais para o “nacional” do que para a região geográfica em que existem, de facto, os recursos naturais. A partir daí, todas as empresas nacionais são consideradas como estando em pé de igualdade, independentemente da localização.
Então, o que determinará o seu sucesso ou fracasso será a capacidade criada para servir aos grandes projectos. Mas será assim que se deve interpretar esta questão? Ou será necessário elaborar regras específicas para catapultar as empresas de Cabo Delgado, resultando numa espécie de “Conteúdo Local-Local”? João Gomes, partner da Jason Moçambique e da Bluebiz, e um dos oradores principais do evento, rebateu, no entanto, alguns dos protestos dos empresários de Cabo Delgado. Começou por revelar que “os sistemas de incentivos públicos que têm apostado em dinamizar territórios falham, porque não são os territórios que se estimulam, e sim as ideias, iniciativas e projectos”.
Para João Gomes, o que se deve incentivar é o poder do empreendedor, que é o motor da iniciativa privada. “Nunca se escondam atrás dos territórios para encontrar qualquer vantagem competitiva. Isso será extremamente prejudicial, como a história já mostra”, alerta o especialista.
Ao contrário disso, segundo João Gomes, “quando se está em territórios com características deprimidas em termos económico-financeiros (como eventualmente é a província de Cabo Delgado), os incentivos às empresas só são efectivos se estiverem assentes na criação de uma mentalidade receptiva a todos os que vierem, desde que isso signifique de facto, um ganho de competitividade local e nacional”, argumentou.
Falta informação privilegiada
Sobre esta questão, Samo Dique, economista da CTA que participou no workshop, reconhece que as empresas de todo o País, mas principalmente as de Cabo Delgado enfrentam a falta de acesso a informação privilegiada e dificuldades impostas pela língua inglesa, que é a utilizada no lançamento dos concursos, para poderem participar na prestação de serviços às multinacionais.

“É um problema a ter em conta porque as empresas, em muitos casos, não percebem o que está escrito. O caderno de encargos, por exemplo, está em inglês e mesmo as empresas que têm capacidade técnica suficiente para abraçar as oportunidades da área do gás não têm, inúmeras vezes, pessoal com domínio o idioma”, explica.
À E&M, o economista admitiu, entretanto, que, nos últimos tempos, esta situação tende a melhorar visto que há uma tendência de as grandes empresas publicarem os concursos nos jornais em duas línguas: inglês e português.
Por isso, Samo Dique acredita que o investimento no acesso à informação será um grande passo. “Por exemplo, é possível resolver isto contratando jovens cuja tarefa seja, exclusivamente, consultar jornais e todos veículos de conteúdos informativos que tenham interesse para a sua empresa, para manterem a direcção da empresa informada. É um investimento que, bem aproveitado, pode gerar grandes benefícios”, sugeriu. Além disso, “o sector privado e o Executivo devem assumir a tarefa de sensibilizar os grandes projectos a difundirem mais as oportunidades de negócios”.
O economista avança como exemplo este seminário realizado pelo +Emprego, ou alguns que a TotalEnergies também tem realizado nesse sentido, e que, na sua opinião, deve ser replicado cada vez mais.
Certificação e instabilidade: os desafios a ultrapassar
Um exemplo dos problemas que as empresas enfrentam em Cado Delgado foi trazido pelo representante do Grupo Saidou, que opera na área de transportes e logística desde 2020.
De acordo com a respectiva administradora, Anifa Megji, antes mesmo de conseguir a certificação de qualidade, a firma chegou a conseguir um contrato com a Total.
“Antes dos ataques dos insurgentes já nos estávamos a posicionar de forma decisiva no mercado.
Tínhamos alguns contratos que nos permitiriam prestar serviços na área de transporte de produtos secos e congelados para Afungi e Palma. Mas, depois de os ataques começarem a tornar-se cada vez mais graves, a situação mudou drasticamente. O negócio ficou fraco porque a maior parte dos projectos de gás pararam os trabalhos e, entre os poucos que mantêm a sua presença, reduziram em grande medida a procura pelos nossos serviços”, explica Anifa Megji.
Os ataques também vieram interromper o processo de certificação do Grupo Saidou, que já estava em curso, e que são essenciais para se manterem a trabalhar com os grandes projectos que, mais tarde ou mais cedo, irão tomar o seu lugar no desenvolvimento económico da província e dos seus agentes.
No fim do workshop, onde também se procedeu à assinatura do Memorando de Entendimento entre o IFPELAC - Instituto de Formação Profissional e Estudos Laborais Alberto Cassimo e a CTA, no domínio da Capacitação das PME de Cabo Delgado, fica a ideia da importância da criação de competências como um dos factores mais determinantes no desenvolvimento de estratégias de subcontratação no sector do gás natural em Cabo Delgado, criando-se oportunidades únicas para as empresas e recursos humanos locais com a inserção dos trabalhadores nas oportunidades geradas pelos investimentos no sector do gás natural, podendo resultar ainda em bem-estar e em justiça social para as comunidades locais e para a província enquanto um todo.


Mara Rupia Lopes • Associada da MDR Advogados
A Evolução das Life Sciences e Próximos Passos para Moçambique no Sector
Em meio à pandemia do covid-19, o sector das life sciences tem desempenhado um papel fundamental na criação daquele que é o “novo normal”. Para lidar com a pandemia, vimos a união entre prestadores tradicionais, outrora concorrentes, para acelerar a pesquisa e desenvolver a geração de vacinas mais rápida da História. Governos, sistemas de saúde, investidores, farmácias e organizações sem fins lucrativos continuam agora a trabalhar em colaboração para fornecer uma ampla distribuição e administração por todo mundo.
Com a introdução de um “novo normal” social, no pós-pandemia, a digitalização vem ampliando o horizonte de novas possibilidades no sector das life sciences: ambientes de trabalho redefinido, mudança na prestação de cuidados de saúde e colaborações inovadoras são alguns exemplos que podem ser apontados e têm vindo a impulsionar uma mudança sem precedentes no sector, grandemente apoiada nos avanços tecnológicos. Vejamos.
1. Digitalização acelerada: novas formas de atendimento, novos papéis e MedTech
Com a ajuda de ferramentas de saúde digital, o atendimento virtual mudou fundamentalmente o acesso à assistência médica, com as teleconsultas a serem uma realidade cada vez mais presente e criando uma experiência de atendimento aprimorada. Mais: a digitalização no sector das life sciences gerou também um aumento de novos sistemas de ponto de atendimento, um fácil acesso a atendimento clínico em casa, configurações de farmácias digitais e vacinações em farmácias. No geral, um acesso mais fácil e eficiente aos cuidados de saúde.
Com todo este contexto, o financiamento arrecadado por empresas de saúde digital atingiu um recorde global de US$ 21,6 biliões em 20201 – um aumento de 103% em relação a 2019. E é expectável que os stakeholders continuem a investir e a financiar novas soluções em saúde digital nos próximos anos. Espera-se que os sistemas de saúde continuem a fazer investimentos, e um modelo híbrido virtual e presencial será, provavelmente, a norma pós-pandemia. Por outro lado, a colaboração contínua entre Governos, indústria e grandes empresas financiará, provavelmente, tecnologias inovadoras para doenças generalizadas com base nos modelos mais desenvolvidos durante a pandemia.
2. Pesquisa e desenvolvimento: novos tipos de colaborações e ensaios clínicos reformulados
Tem sido amplamente defendido que a pandemia do covid-19 acelerou a transformação digital do sector farmacêutico em vários anos. Por exemplo, embora a média do sector para o desenvolvimento e revisão de um novo medicamento seja de 8,2 anos, as duas primeiras vacinas contra o covid-19 foram desenvolvidas, testadas e autorizadas em menos de um ano.
Como resultado, as empresas encontram-se agora num estágio de reavaliação dos seus processos e desafio em busca de maior eficiência, designadamente através de parcerias e soluções inovadoras. De entre estas, podemos destacar novos designs de testes virtuais e monitoramento remoto por meio de telemedicina e assistência médica móvel, que permitem maior envolvimento do paciente e melhoram a diversidade de testes clínicos para obter insights mais valiosos, ou a utilização de Inteligência Artificial e restantes novas tecnologias por parte das empresas biofarmacêuticas para inovar em ensaios clínicos.
3. O papel do regulador
Ainda no contexto da pandemia do covid-19, as autoridades regulatórias dos vários países acabaram tendo que acelerar os seus processos de aprovação, especialmente de vacinas. Esta nova abordagem daquela ferramenta regulatória,

As ferramentas digitais estão a mudar a forma de abordar o trabalho em várias áreas
juntamente com outras, tais como autorizações de comercialização aceleradas e programas de uso compassivo, permitiram (pode-se até dizer que forçaram) desenvolver um novo ambiente colaborativo entre as agências reguladoras e a indústria.
Neste novo ambiente regulatório, novas estratégias e tecnologias podem ajudar as empresas e organizações a navegar, permitindo comprimir cronogramas e acelerar insights. A flexibilização das regulamentações durante a pandemia aumentou a adopção da telemedicina em muitos países, mas as políticas regulatórias pós-covid serão essenciais para a aceitação e desenvolvimento permanentes no sector das life sciences.
Próximos passos para Moçambique Moçambique, tal como os restantes países africanos, tem agora uma oportunidade para dar um salto no desenvolvimento, aproveitando-se da próxima onda de desenvolvimento tecnológico, incluindo biotecnologia e nanotecnologia. Enquanto retardatário, Moçambique não precisa voltar a testar e reproduzir o que já foi produzido por outros países. Ainda assim, há que investir na criação de condições propícias para a adopção e implementação da tecnologia e know-how.
Olhando agora para os três aspectos anteriormente abordados, salta à vista que Moçambique precisa actualizar o seu enquadramento regulatório de modo a permitir o desenvolvimento e acompanhamento das tendências mundiais.
Por exemplo, quando se fala de digitalização e MedTech, notamos que Moçambique não tem um quadro regulamentar aplicável aos dispositivos médicos e software como dispositivo médico: • Por um lado, a Lei n.º 12/2017, de 14 de Janeiro, regula as actividades de produção, investigação, importação, exportação, distribuição, armazenamento, transporte, comercialização ou distribuição de medicamentos, vacinas, produtos biológicos, ou produtos de saúde para uso humano. Neste contexto, a
Lei 12/2017 define produto de saúde como «todos os artigos médicos e substâncias usados nos cuidados curativos, paliativos, nutritivos, sanitários e estéticos que influem directa ou indirectamente no bem-estar do indivíduo».
• Sucede que tal definição é ampla e pouco clara. Parece ter o potencial de abranger os produtos normalmente conhecidos como dispositivos médicos, mas não oferece uma margem de certeza jurídica confortável. Também no sector dos ensaios clínicos sobre produtos de saúde, sujeitos a autorização prévia nos termos da Lei 12/2017, está actualmente previsto que o Conselho de Ministros deve aprovar regulamentos sobre a condução de ensaios clínicos. No entanto, na nossa investigação não encontramos quaisquer regulamentos adicionais relacionados com ensaios clínicos, quer aprovados pelo Conselho de Ministros ou por qualquer outra autoridade competente.
Ora, este tipo de incerteza dificulta a criação de mercados regionais e a própria integração de Moçambique no mercado mundial, pelo que se impõem reformas significativas no quadro regulamentar.
1Segundo informação disponibilizada pela PwC, “Global Top Health Industry Issues 2021” - disponível para consulta em https://www.pwc.com/ gthii2021 .
A celebrar 13 anos no mercado, Carlos Parreira, CEO da agência criativa Brand Lovers, conta à E&M de que se fez o percurso à frente da agência que um dia idealizou “embora ainda falte muito para lá chegar”, e de como esta, até pela natureza do próprio negócio em que actua, mudou e foi sendo mudada pelas grandes tendências evolutivas do País, e do mundo, ao longo de mais de uma década
Texto Pedro Cativelos • Fotografia Mariano Silva
O que é, hoje, a Brand Lovers no mercado das agências de publicidade ou criativas no País?
É uma agência 360˚ totalmente moçambicana, que abriu em 2009 quando cheguei a Moçambique. Comecei a viajar de Portugal, na altura com o objectivo de ver se havia espaço para uma agência criativa, e comecei a sentir que havia aqui o enquadramento e o negócio que procurava, nomeadamente nas áreas do design e do branding, segmentos que ainda estavam por desenvolver na sua plenitude. Havia muita publicidade nos meios tradicionais, mas a perspectiva da web ainda estava muito crua. E no entanto, havia algumas empresas que começavam a ter curiosidade em ter presença no online. Quando me apercebi disso, pensei que havia aqui um mercado para se trabalhar nestas áreas e foi assim que começámos a dar os primeiros passos.
De então para cá, e se pensarmos no que é a comunicação no digital nas suas múltiplas dimensões, muito se alterou. No vosso caso, isso fez também com que, dessa ideia original do início da década, muito se tenha mudado no negócio. É assim?
Sim, sem dúvida. Repare, os nossos primeiros clientes foram a KPMG, em que começámos a fazer aquele projecto das “100 maiores empresas de Moçambique” ao nível de paginação das revistas e a parte do branding, aí ainda numa visão mais convencional do negócio. Mas, à medida que iam entrando novos clientes, fomos crescendo com as suas necessidades e com as nossas ideias. Depois começámos por fazer activação de marca para a Mcel, e outras, nas áreas da educação; no sector informal também (que aqui tem muito peso), ao nível de produtos de higiene e alimentares, por exemplo. Por essa altura, o digital e especialmente a gestão de redes sociais começou a ganhar um peso específico na nossa actividade.
Essa será a grande mudança da comunicação das marcas nos últimos dez anos, no mundo, como no País. Concorda?
Há várias mudanças nos últimos anos, mas essa é decisiva, sem dúvida. No nosso caso, já hoje, e a nível de recursos, esse é o maior departamento que temos. Tem sido interessante acompanhar e fazer parte do desenvolvimento deste mercado em Moçambique.
As pessoas e as marcas, antes, preocupavam-se apenas com o seu website e eu tentava explicar-lhes, muitas vezes, que o site não é mais do que uma loja, e quando se tem uma loja num shopping, por exemplo, tem de pagar a renda, ter staff, ter os produtos bem posicionados e dar o seu negócio a conhecer, para atrair clientes para lá.
Desenvolvemos, nessa altura, vários websites e, por via desse awareness que faz parte da visão inicial do que pretendíamos que fosse a empresa, e que está espelhado no próprio nome, também a estratégia de marca digital por detrás desses produtos.
Aí começámos a integrar e a ter uma visão mais 360˚ sobre o mercado digital, a trabalhar os clientes a nível de social media e a gerar resultados para os seus negócios. Depois, o mercado da gestão digital, especialmente com a questão das redes sociais e a importância e tracção que adquiriram, tornou-se incontornável e um novo segmento foi crescendo e desenvolvendo-se ao longo deste tempo. Primeiramente, havia, e ainda há, uma cultura de que fazer um post é algo banal, não existia a cultura de como é que ele deve ser feito e qual o seu objectivo estratégico enquanto ferramenta de comunicação. Claro que isso foi mudando, mas ainda estamos nesse processo.
Hoje, esta é, porventura ‘a’ tendência do mercado nacional e, diria, mais que isso, é uma certeza que se acentuou ainda mais com a pandemia.
Para quem quer comunicar algo, num mundo em que as pessoas já não absorvem informação nos meios tradicionais, em que escolhem o que querem ver, em que seleccionam os seus conteúdos, isso é um grande desafio para as marcas e um ainda maior para as agências.

Como é que, na perspectiva de uma agência que trabalha a imagem de marcas e o seu posicionamento, muitas delas associadas a consumo, foi vivido o período da pandemia que, em larga medida, restringiu o contacto entre pessoas e afectou o próprio consumo?
Verdade, sim, mas também é um facto que, no ano passado, crescemos

em volume e em valor de facturação. E gosto de pensar que isso aconteceu porque apostámos na altura certa em recursos humanos mais qualificados, temos tido profissionais que vêm de fora para dar formação aos nossos quadros e isso faz a diferença nas alturas de crise, como a que vivemos durante a pandemia. Basicamente, com um grande problema, vieram várias oportunidades de sermos melhores e mais criativos, mas a base, a nossa pelo menos, passa sempre por estarmos preparados para dar uma resposta de qualidade, de acordo com as várias circunstâncias, mesmo aquelas inesperadas como foi a que o covid-19 nos colocou.
Todo este caminho que me está a descrever advém da própria evolução socioeconómica e, muitas vezes, colocam-se desafios sobre como compatibilizar isso com a realidade nacional, nos seus múltiplos contextos próprios. É esse o maior desafio?
A nível interno sim, mas eu diria que o desafio... mais desafiante, passo a redundância, são os recursos humanos. Este mercado é muito volátil, a questão financeira é demasiado marcada e, por vezes, é o único factor decisor.
Aconteceu-nos isso no início, porque nos reconheciam qualidade, acho, e as agências chamadas grandes iam-nos buscar os nossos melhores profissionais.
Portanto, o nosso desafio foi, com o tempo, sermos mais do que apenas uma empresa e mais uma marca para a nossa equipa, o que nos ajudou um pouco a reter talentos, embora continue a existir esse factor.
Fora da empresa, e em relação ao mercado, essa adaptação das linguagens e das trends mais recentes da publicidade e da gestão de marcas às especificidades do mercado foi, também ela, e continua a ser, um grande desafio – tentar fazer passar aos departamentos de marketing, aos CEO, aos boards de direcção, um determinado tipo de visão para a qual não estariam tão despertos, por ser nova até lá fora. Mas esse é um desafio que acaba por ser estimulante.
Isso leva-me a uma questão que se debateu na pandemia e, imagino, em todas as grandes empresas em que a comunicação é vista como custo e não como investimento. Deparou-se certamente com isso. Terá havido mudanças nestes 13 anos que leva à frente da agência?
O factor particular da pandemia fez com que isso acontecesse drasticamente. Antes, os budget eram sempre desvalorizados em alturas de crise.
O investimento em imagem, marketing, comunicação nem sempre é imediato como as activações de marca, em que somos fortes também. Estas, sim, são claramente acções que incidem sobre a venda e têm um efeito mais dinâmico. Mas existe, por vezes, alguma confusão entre o que se pretende de determinada campanha, que pode ser aumento de vendas, ganhos de notoriedade ou simplesmente criação de awareness, e aí o efeito na venda é menos observável no imediato. Mas se o trabalho for bem feito dá resultados mais à frente, diluídos no tempo.
Creio que isto acontece por, nestas alturas de turbulência económica, os departamentos comerciais estarem sob tensão e terem de mostrar resultados, entrando por vezes em conflito com os departamentos de marketing. Creio que isto é uma cultura que acontece em muitas empresas, mesmo nas grandes.
Qual é, na sua opinião, o grande desafio do mercado moçambicano da comunicação e do marketing nos próximos tempos?
Olhando para dentro da nossa estrutura, a estratégia prevê crescimento a nível de volume e uma aposta forte na especialização. Neste momento, a necessidade que tenho, enquanto gestor, é de agarrar a equipa que tenho, dar-lhes oportunidades de crescer na empresa.
Se pensar para fora, analisando o mercado, acho, como dizia anteriormente, o desafio que todos teremos pela frente passa por acompanharmos no mercado interno a enorme evolução tecnológica e de abordagem aos diferentes targets que se está a fazer lá fora.

Caprazine Hunguana • Responsável pelos Serviços de Execução na Tesouraria do Absa Bank Moçambique
Desde muito cedo, após a viragem para a economia de mercado e a adopção de um enquadramento político, económico e jurídico-legal mais favorável ao investimento privado, assistiu-se a uma atracção de elevados volumes de Investmento Directo Estrangeiro (IDE) para o País.
Alguns desses investimentos foram estruturantes para a economia, como é o caso da Mozal e da Vale, que impactaram significativamente a estrutura da Balança de Pagamentos através do elevado peso das exportações do alumínio e do carvão. Moçambique apresentou um forte crescimento económico no início da década anterior, com um crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB) médio de 7,0% entre 2010 e 2015 contra uma média de 2,4% entre 2016 e 2020.
O rápido crescimento do sector mineiro, juntamente com a exploração e descoberta de vastas reservas de gás natural, contribuíram para este forte crescimento. O rápido aumento no IDE para a o carvão e gás natural foi também acompanhado por maiores investimentos em grandes projectos de infra-estruturas.
Segundo o Boletim da Balança de Pagamentos para 2021, publicado pelo Banco de Moçambique (BM), o crescimento do IDE nos últimos cinco anos foi influenciado, em grande medida, pelo aumento do influxo de capitais dos grandes projectos, que esteve associado a projectos da indústria extractiva relacionado, por um lado, à prospecção e pesquisa de hidrocarbonetos na Bacia do Rovuma e, por outro, à revitalização da indústria do carvão.
Ainda de acordo com o mesmo boletim, o fluxo das empresas não perten-
Perspectivas do IDE para Moçambique – Desafios e Oportunidades
centes à categoria dos grandes projectos, mostrou, ao longo do período em análise, um comportamento oscilatório, caracterizado por aumentos e decréscimos não compatíveis com a trajectória dos grandes projectos. Parte significativa dos investimentos realizados por empresas não pertencentes aos grandes projectos visavam responder às solicitações daqueles empreendimentos do IDE na componente de transporte e logística.
Ou seja, verificou-se um importante influxo do IDE, em 2019, para o sector de transporte e logística relacionado com as respostas aos danos causados pelos ciclones Idai e Kenneth.
Num contexto em que o País importa muitos mais bens e serviços do que aqueles que exporta, a Conta Corrente é deficitária e o financiamento desse défice vem sendo assegurado pelo IDE, principalmente depois da retirada do apoio directo ao Orçamento Geral do Estado (OGE) pelos doadores após a descoberta das dívidas não declaradas em 2016.
A maior parte desse IDE está associado a grandes projectos e estes grandes projectos têm um valor significativo em relação ao PIB, chegando a atingir níveis superiores a um terço deste, conforme ilustra o gráfico a seguir.
Pode-se depreender, deste gráfico, que o rácio IDE/PIB é um indicador económico prospectivo do crescimento da economia moçambicana, tendo o PIB seguido a tendência do rácio IDE/


O gás é, a par do carvão mineral, o maior determinante para a captação de IDE
PIB com um atraso de cerca de um ano. Em 2021, o IDE registou uma acentuada recuperação para níveis pré-pandemia, atingindo os USD 5,10 biliões e foi principalmente impulsionada por investimentos em mega-projectos relacionados com obras de operação e manutenção na mina de carvão de Moatize e pelo desenvolvimento dos projectos de Gás Natural Liquefeito (GNL) da Total e Coral-Sul.
Dados do primeiro trimestre de 2022 mostram um aumento de 37% em relação ao período homólogo de 2021, situando-se em USD 1,39 biliões. Espera-se que esta tendência se mantenha, a médio e longo prazo, e que continue a ser sustentada pelos investimentos no sector de hidrocarbonetos, sem descurar o impacto negativo que as acções terrorristas têm na decisão de retoma do projecto da TotalEnergies e na decisão final de investimento da Exxon Mobil.
Não obstante, a situação de segurança no Norte do País e a actual situação geo-política decorrente do conflito na Ucránia apresentam-se como uma oportunidade para uma maior exploração dos recursos energéticos de que Moçambique dispõe, uma vez que se tornou evidente que grande parte dos países importadores desses recursos precisam de diversificar as suas fontes como forma de reduzirem a sua dependência para níveis estrategicamente aceitáveis.
A capacidade do País para promover com celeridade novos projectos de investimento no sector e relançar projectos já existentes é um enorme desafio para o aproveitamento dessa oportunidade. Outros desafios que devem ser priorizados incluem: (i) a redução de barreiras comerciais com vista a promover o investimento em sectores como o da agricultura, que tem um peso de um quinto do PIB, mas cuja produção se encontra muito longe de satisfazer o consumo interno; (ii) promoção de Zonas Económicas Especiais, incluindo Zonas de Comércio Livre, que garantam importantes fluxos de investimento e que assegurem o desenvolvimento da indústria local e criem emprego; (iii) gestão das políticas fiscal e monetária que promovam a redução do custo de fazer negócio em Moçambique, com destaque para reformas que melhorem a classificação do País de “extremamente especulativa” para a de “grau de investimento” e um ambiente de taxas de juro baixas que permitam aos operadores económicos um melhor acesso ao mercado da dívida; (iv) adopção de medidas arrojadas para dinamizar o negócio através da Bolsa de Valores, dando a oportunidade aos nacionais de aplicar as suas poupanças em investimentos com perfil de risco/retorno diferente dos depósitos bancários e às empresas de terem alternativas de financiamento diferentes do endividamento bancário; (v) redução da carga administrativa aplicável às startups; (vi) utilização dos títulos de uso e aproveitamento de terra como colateral; (vii) combate cerrado à corrupção em todos os sectores; e (viii) aprovação de uma lei de conteúdo local que encontre um equilíbrio entre os interesses dos moçambicanos e os dos investidores estrangeiros nos mega- projectos.
No que diz respeito às finanças públicas, a retoma do apoio do FMI e dos doadores ao OGE estão já a proporcionar um alívio, mas é ainda mais importante que o País saia rapidamente da situação de dependência do apoio externo.
As perspectivas de crescimento económico de Moçambique permanecem estreitamente ligadas aos seus desenvolvimentos no GNL, e a economia manter-se-á fortemente dependente do comércio de commodities.
O IDE no sector de GNL irá acelerar o crescimento económico para os níveis anteriores a 2016 nos próximos anos, mas há a necessidade de garantir que o País atraia investimentos para outros sectores importantes da economia de forma a imunizá-la dos frequentes choques nos preços dos commodities.
