E&M_Edição 90_Novembro 2025 • Moeda Electrónica - Quanto Vale o Novo Dinheiro?
CONFERÊNCIA DO CLIMA
MOÇAMBIQUE QUER ACESSO JUSTO AOS FUNDOS
CLIMÁTICOS NA COP30 EM BELÉM, NO BRASIL
TRIBUTAÇÃO DO GÁS
ESPECIALISTA EM FISCALIDADE DEFENDE URGÊNCIA NA DIGITALIZAÇÃO PARA TRAVAR PERDAS
REDES SOCIAIS
NÚMERO DE UTILIZADORES CRESCE, MAS A EXCLUSÃO DIGITAL AINDA É UMA REALIDADE
Os telemóveis já estão no centro da inclusão financeira, inovação e novas formas de dinamizar a economia. A E&M analisa toda a transformação a que se assiste e antecipa cenários futuros
22 NAÇÃO
22 Moeda electrónica. De simples transacções a plataformas de grande impacto, o mobile money impulsionou o comércio e a inclusão financeira. Mas estará o mercado preparado para todo o seu potencial?
28 Transformação. Um estudo revela como a moeda electrónica está a mudar vidas nas comunidades rurais, criando confiança e novas oportunidades económicas e sociais no sul de Moçambique
30 Ligações digitais. Da banca ao streaming, a moeda electrónica ganha nova vida ao integrar-se com sites e apps. A revolução Open API está a ligar programadores, negócios e inclusão financeira
12 ESG
OIL&GAS
OPINIÃO
20 David Gonçalves, EY Partner Technology Consulting
Financiamento climático. Na COP30, Moçambique procura mostrar que é parte da solução climática, não apenas uma vítima. O maior desafio é tornar acessíveis os fundos prometidos
14 SUSTENTABILIDADE
Conferência da biodiversidade. O Governo e organizações de conservação defendem o envolvimento das comunidades como chave para uma preservação eficaz e sustentável dos ecossistemas marinhos
18 CONTEÚDO LOCAL
54
58
Coral Norte. Empreendimento vai colocar o País como 3.º maior produtor africano. Saiba como 56
68
Ensino técnico. Como as parcerias entre empresas, instituições e escolas fortalecem o ensino técnico em Moçambique, valorizando competências práticas e oportunidades profissionais
MACRO
Oil & Gas. Falta de transparência e reconciliação fiscal ameaçam as receitas do gás natural em Moçambique. Especialistas defendem a digitalização urgente de serviços da Autoridade Tributária
44 Dinheiro digital no mundo. Como o mobile money e carteiras digitais estão a movimentar triliões e a moldar a inclusão financeira, os negócios e o futuro da economia global SHAPERS
Nobel da economia 2025. As teorias de Joel Mokyr, Philippe Aghion e Peter Howitt foram distinguidas por provar que a inovação é o motor do progresso. Como aplicar estas lições num país como Moçambique?
MERCADO & FINANÇAS
Redes sociais. Com 3,7 milhões de utilizadores e 89% da população offline, a exclusão digital permanece elevada num país em que o acesso à Internet ainda é um privilégio
CEO TALKS
Simon Karikari. O CEO da Vodacom Moçambique quer garantir 95% de cobertura até 2030 e consolidar a transformação da operadora numa empresa tecnológica que acelera a digitalização do País
42 Iñaki Aldasoro, Jon Frost e Vatsala Shreeti, Bank for International Settlements
66 João Gomes, Partner@ BlueBiz
72 Diego Marconatto, Professor da Fundação
Dom Cabral
POWERED BY
48 BCX
50 Absa Bank Moçambique
60 PLMJ Colab Moçambique - NMP
Advogados
74 Standard Bank Moçambique
SECÇÕES
3 Sumário
6 Editorial
8 Radar
10 Números em Conta
52 Radar África
78 Panorama
81
ÓCIO
82 Escape Entre a Zâmbia e o Zimbabué, as Cataratas Vitória revelam-se um destino que combina natureza, história e adrenalina. 84 Ao Volante da terceira geração do Mazda CX-5, com um novo design KODO, motor híbrido e conectividade avançada 85 Adega Vinhos fortificados da África do Sul, inspirados em castas portuguesas 86 Moçambicanos na diáspora De Moçambique para o mundo, Nélia Mazula assina patentes premiadas em engenharia digital 88 Agenda Tudo o que não pode perder neste mês de Novembro
90 A Fechar TotalEnergies impõe condições para retomar o projecto Coral Sul, mas Governo defende cautela e negociações
Celso Chambisso
Editor Executivo da Economia & Mercado
Uma Revolução Silenciosa
Amoeda electrónica e as carteiras móveis deixaram de ser uma curiosidade tecnológica para se afirmarem como um dos motores centrais da transformação económica global. O que começou como uma solução prática para pagamentos simples em mercados emergentes tornou-se numa infra-estrutura capaz de redesenhar a forma como cidadãos, empresas e Governos interagem com o dinheiro. Hoje, os números falam por si: mais de 2,1 mil milhões de contas de mobile money estão registadas em todo o mundo, das quais 1,1 mil milhões em África, representando 53% do total global. O volume transaccionado ultrapassou 1,68 biliões de dólares em 2024, com o continente africano a responder pelos impressionantes 65% desse valor, segundo a Global System for Mobile Communications Association (GSMA).
A cibersegurança será um campo de batalha inevitável, à medida que as fraudes digitais se transformam
Na área de negócios, a revolução é disruptiva. Os bancos tradicionais, pressionados pelo avanço das fintechs e das big techs, já não podem encarar as carteiras móveis apenas como canais acessórios. Hoje, representam plataformas de fidelização, espaços para oferecer crédito, seguros e investimentos. Nas regiões com baixa penetração bancária, as operadoras de telecomunicações assumiram a dianteira, transformando números de telefone em contas. O caso emblemático do M-Pesa, no Quénia, tornou-se modelo para mais de 400 milhões de utilizadores africanos que movimentam cerca de 1,1 bilião de dólares por ano em moeda electrónica.
Mas não são apenas bancos e operadoras a disputar terreno. As gigantes tecnológicas — Apple, Google, Amazon, Alipay ou WeChat Pay – estão a construir verdadeiras “super-apps”, integrando comércio, transportes, saúde ou entretenimento. A sua ambição é clara: capturar dados de consumo e transformar informação em novos modelos de negócio. As fintechs, por sua vez, multiplicam-se em nichos específicos, com soluções de microcrédito, pagamentos internacionais e criptomoedas, atraindo milhares de milhões de dólares em capital de risco. Em 2022, só estas startups angariaram mais de 22 mil milhões de dólares, confirmando o papel de laboratórios de inovação que assumem no sector. A avaliar pelo percurso, o futuro mostra-se promissor, mas não se escreve apenas com promessas. Persistem desafios sérios. A cibersegurança será um campo de batalha inevitável, à medida que as fraudes digitais se transformam. A exclusão digital continua a ser um obstáculo: milhões de pessoas sem Internet ou smartphones correm o risco de ficar à margem desta nova economia. Nesta edição, a E&M traz um retrato da evolução e impacto da moeda electrónica e das carteiras móveis nas suas várias faces em Moçambique, África e no mundo. Mas há uma questão inquietante que fica por responder: à medida que o dinheiro físico se torna excepção e o digital ganha terreno, estaremos a assistir a um futuro mais inclusivo e democrático ou à construção de novas muralhas digitais que separarão ainda mais os que podem dos que ficam para trás?
As transações financeiras entre Moçambique e o estrangeiro – pessoais ou de empresas, com cartões ou por outroas vias – ganharam novo fôlego. Depois de quase três anos sob “vigilância reforçada”, o País foi oficialmente retirado, por votação unânime, da lista cinzenta do Grupo de Acção Financeira Internacional (GAFI/FATF) durante a plenária de Outubro de 2025. A decisão assinala um reconhecimento internacional de progressos na luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, mas também abre uma nova fase: o País terá de consolidar reformas.
Em termos práticos, sair da lista reduz a percepção de risco por parte de bancos correspondentes e investidores, diminui a probabilidade de medidas de mitigação excessivas (como a suspensão de serviços de bancos estrangeiros) e pode aliviar o custo e a complexidade de operações transfronteiriças. Analistas esperam melhorias nas condições de financiamento externo, maior facilidade para exportadores e importadores acederem a linhas de crédito e um ambiente mais atractivo para o investimento directo estrangeiro (IDE). Contudo, estes efeitos costumam materializar-se gradualmente, dependendo da perceção de estabilidade regulatória e da capacidade das instituições financeiras locais de transformar normas em práticas robustas.
O reconhecimento do GAFI inclui uma nota prática: é preciso continuar a melhorar a sinalização de ris-
cos e a supervisão de sectores vulneráveis (como imobiliário, comércio transfronteiriço e remessas transnacionais). A institucionalização de práticas anti-corrupção, a eficiência judicial para processar crimes financeiros e a capacidade de recuperar activos ilícitos estão entre os pontos que, se negligenciados, podem recolocar o País na lista.
Moçambique entrou para a “lista cinzenta” a 22 de Outubro de 2022, após uma avaliação que identificou lacunas estratégicas no sistema nacional de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.
A inclusão implicou acompanhamento intensivo do GAFI, exigindo um conjunto de medidas e um plano de acção. Três anos depois, o país conseguiu demonstrar progressos suficientes para sair da monitorização reforçada.
Entre os pilares do processo estão a aprovação da nova lei de prevenção de branqueamento (Lei n.º 14/2023) e normas complementares que fortaleceram a identificação de beneficiários efectivos, agravaram sanções e criaram instrumentos para maior responsabilização administrativa e criminal. O Banco de Moçambique e a Unidade de Informação Financeira (UIF) receberam orientações e recursos adicionais para a vigilância e partilha de informação, enquanto a supervisão das entidades financeiras e não financeiras foi reforçada com novos requisitos de reporte e conformidade.
Crescimento Governo prevê recuperação do crescimento económico em 2026
O Governo prevê um crescimento económico de 3,2% em 2026, segundo a proposta de Orçamento do Estado (OE), que estima o PIB em 1,6 bilião de meticais (23,5 mil milhões de dólares). Este nível de crescimento está acima dos 2,9 % previstos para 2025 e 2,2 % de 2024.
A inflação, segundo o documento, deverá fixar-se em 3,7%, abaixo dos 7% estimados para 2025, e as reservas internacionais cobrirão 4,4 meses de importações. Já o comércio externo deverá manter-se deficitário, com as exportações a subirem para 8,4 mil milhões de dólares e as importações para 9,5 mil milhões. O OE prevê despesas equivalentes a 32% do PIB, receitas a 28% e o défice fiscal de 6% a ser financiado através de donativos e do endividamento público.
Segundo Amílcar Tivane, secretário de Estado do Tesouro, as prioridades serão consolidar as contas públicas e criar margem para investimento produtivo, procurando equilíbrio entre rigor fiscal e crescimento. O Executivo prevê controlar a massa salarial e conter a dívida, canalizando 94% do orçamento para o funcionamento do Estado e encargos.
Energia HCB prevê aumentar potência em 90 megawatts após modernização da central sul
A Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) vai aumentar em 90 megawatts (MW) a sua potência total após a modernização da central sul, elevando a capacidade instalada de 2075 MW para 2165 MW.
Segundo o presidente do Conselho de Administração, Tomás Matola, o projecto visa reforçar a eficiência e fiabilidade da produção de energia, integrando o plano “CAPEX Vital 10 Anos”. A segunda fase da reabilitação, designada RS2, será conduzida pela empresa austríaca Andritz Hydro e deverá prolongar a vida útil da central por mais de 45 anos.
A HCB, detida em 85% pela Companhia Eléctrica do Zambeze e 7,5 % pela REN, prevê ainda construir a central norte de 1245 MW e uma central solar de 400 MW em Tete, para diversificar a matriz energética e reduzir a dependência hídrica. O projecto RS2 reforçará a sustentabilidade energética, consolidando a posição da HCB como um dos principais produtores de electricidade da África Austral.
Os 30 Maiores Exportadores do Mundo
Num contexto global de desaceleração económica e tensões geopolíticas, o comércio internacional continua a ser um dos principais indicadores da força produtiva e competitiva das nações. De acordo com dados recentes da Organização Mundial do Comércio (OMC), a China manteve-se na liderança absoluta das exportações globais em 2024, representando 14,6% de todas as vendas de bens no mundo.
Apesar das restrições comerciais impostas pelos EUA, Pequim tem vindo a
Total do Top 30: 20,3 biliões de dólares (USD)
Unidos
fortalecer as suas ligações económicas com África, o Sudeste Asiático e a Europa, consolidando o seu estatuto como principal potência exportadora mundial. Enquanto isso, os EUA seguem uma estratégia de maior auto-suficiência e reindustrialização interna, numa tentativa de reduzir a dependência das cadeias de abastecimento externas.
Outros países asiáticos continuam a ganhar relevância no panorama global. O Vietname e Hong Kong (RAE) registaram crescimentos de dois dígitos, reflec-
tindo a crescente diversificação das cadeias de produção e o papel da região na indústria tecnológica e de manufactura. A França também surpreendeu com um desempenho sólido, demonstrando resiliência e capacidade de adaptação no sector exportador europeu.
Em contrapartida, a Austrália registou a maior contracção nas exportações, afectada pela volatilidade dos preços das matérias-primas e pela diminuição da procura em alguns dos seus principais mercados.
Alemanha
COP30: o Desafio de Aceder Aos Fundos Aprovados
Moçambique está entre os países mais expostos às alterações climáticas e quer fazer-se ouvir na COP30. Mas como se constroem as estratégias para a cimeira anual do clima? Quais os principais desafios no acesso ao financiamento climático?
Texto Nário Sixpene • Fotografia D.R.
ACOP30, 30.ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, terá lugar este mês em Belém, capital do Pará, às portas da Amazónia, no Brasil. Cresce a expectativa sobre o desenrolar das negociações que podem moldar o futuro ambiental do planeta. Para o público, é muitas vezes difícil compreender o processo: quem decide, como se articulam as posições nacionais e de que forma os compromissos são alcançados.
Moçambique é um dos países mais vulneráveis aos impactos das alterações climáticas. Ciclones, cheias e secas prolongadas fazem parte das características do território, mas têm-se sucedido a uma frequência cada vez maior, ameaçando vidas, meios de subsistência e infra-estruturas essenciais.
Neste contexto, a participação activa do País nas negociações internacionais sobre clima é considerada estratégica. Para compreender melhor como funcionam estes processos, a E&M conversou com Vânia Gonçalo Nhauando, licenciada em Ecologia e Conservação da Biodiversidade Terrestre pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM), que prossegue um mestrado em Geodesenvolvimento Costeiro e Azul na Universidade Pedagógica (UP), com enfoque na governação oceânica. É membro fundadora da Plataforma Juvenil para a Repa-
ração Climática e participante em várias Conferências das Partes (COP).
“Tenho-me dedicado à justiça climática e à capacitação de jovens para intervirem nos processos de decisão. Para mim, participar nas negociações não é apenas estar presente: é assegurar que a nossa geração é ouvida quando se definem compromissos que moldarão o nosso futuro”, afirmou.
Preparação: o que se passa antes da conferência?
Vânia Gonçalo explica que o processo de negociação começa muito antes da abertura oficial da COP. “Meses antes da conferência, realizam-se reuniões preparatórias em Bona, Alemanha, sede da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, e em fóruns regionais. Cada país elabora posições nacionais com base em prioridades de mitigação, adaptação e financiamento”, explicou.
No caso de Moçambique, a articulação faz-se em dois planos: interno e regional. “No plano interno, o Governo organiza as pré-COP, que são espaços de construção de consenso. O Executivo convida Ministérios, sociedade civil e parceiros para debater e chegar a uma posição comum que será defendida na conferência”. O Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres (INGD) está presente e participa na formulação dos consensos nacionais.
“As responsabilidades históricas de emissão não desaparecem. Para que a justiça climática se materialize, é necessário que os contributos financeiros sejam adicionais, previsíveis e acessíveis”
“É também nesses fóruns que a juventude tem a oportunidade de apresentar propostas”, disse.
Ao nível regional, Moçambique participa no Grupo Africano de Negociadores e em coligações como o G77+China. “A articulação regional é essencial para fortalecer a voz do continente e para termos maior peso nas mesas de negociação”, sublinhou.
A experiência nas COP
A activista já participou nas cimeiras do clima realizadas em Sharm el-Sheikh, Egipto (2022), Dubai (2023) e Azerbaijão (2024). “Quando estamos na COP, estamos lá como parte da delegação do Governo, porque as negociações são conduzidas pelo Executivo. Recebemos credenciais oficiais e trabalhamos em coordenação com a delegação nacional”, contou.
Cada parágrafo dos textos “é discutido, palavra a palavra. Nada fica decidido sem consenso. É por isso que muitas sessões duram até de madrugada.”
Questionada sobre as estratégias do País na mesa de negociação, Vânia Gonçalo destaca a aposta no financiamento e valorização dos ecossistemas nacionais. “Moçambique tem ecossistemas que são essenciais para a mitigação global. Precisamos de mostrar que somos parte da solução, não apenas vítimas”, afirmou.
Entre as prioridades, apontou o acesso a financiamento climático, a transferência de tecnologia e a capacitação institucional. “Necessitamos de recursos para implementar medidas de adaptação que sejam sustentáveis. Mas não basta o financiamento: é preciso que os critérios de acesso sejam ajustados à nossa capacidade institucional”, frisou. Vânia Gonçalo enfatiza a necessidade de melhorar a narrativa sobre Moçambique no foro internacional. “Devemos mostrar, não só a nossa vulnerabili-
VÂNIA GONÇALO NHAUANDO
Activista Ambiental
dade, mas também a nossa contribuição para a mitigação global” das emissões de gases com efeito de estufa. Ou seja, a riqueza natural ainda preservada no País é mais relevante que a poluição lançada na atmosfera. “Isso ajuda a transformar a narrativa de um país passivo para um país activo na agenda climática”, diz.
Parte da estratégia passa pela produção de dados nacionais robustos, estudos de caso sobre iniciativas locais e uma estratégia de comunicação que valorize resultados. “Os dados são a nossa moeda. Com dados credíveis, conseguimos negociar melhor e atrair parceiros adequados”, disse.
Disponibilização de fundos e barreiras para acesso Nas últimas COP, um dos pontos de maior debate foi a promessa de os países considerados “desenvolvidos” ou “com responsabilidade histórica” mobilizarem 300 mil milhões de dólares anuais para apoiar países em desenvolvimento, até 2035. Para a bióloga, esse valor está muito abaixo das necessidades reais: “Só para recuperar dos efeitos de um grande ciclone já são necessários investimentos enormes. Se a prioridade for também construir resiliência permanente, o montante acordado não é suficiente.”
Segundo a activista, existe uma diferença de narrativas entre países desenvolvidos e em desenvolvimento: “Enquanto os primeiros entendem que o
compromisso é um avanço, os outros defendem que é um valor que não cobre as necessidades reais. Para nós, a urgência é clara e o montante é manifestamente pequeno face aos danos.”
Mesmo quando o financiamento existe, Moçambique enfrenta dificuldades em aceder aos fundos. “Muitas vezes somos priorizados, mas não conseguimos aceder, porque os requisitos de elegibilidade e os arranjos institucionais não estão alinhados com a nossa realidade. Fala-se de organismos especializados para gerir fundos, mas a criação desses organismos também implica tempo e capacidades que podem faltar”, disse, destacando: “Os critérios para a obtenção de financiamento entre países são robustos e muitas das vezes não são totalmente adequados à nossa capacidade institucional. É como se nós não tivéssemos como chegar àquele fundo que, apesar de tudo, temos prioridade para receber.”
Na opinião de Vânia Gonçalo, “é contraproducente dizer que há fundos disponíveis e depois não termos condições para aceder. Precisamos de mecanismos que facilitem a absorção do financiamento de forma transparente e eficaz.”
Transparência e inclusão são factores cruciais
Outro tema que a activista destaca é a necessidade de garantir transparência na utilização dos fundos. “Transparência não pode ser apenas uma palavra bo-
nita: é uma condição para atrair mais recursos e confiança. Quando os cidadãos vêem relatórios claros sobre a aplicação do dinheiro, a aceitação social dos projectos aumenta”, defendeu.
Vânia Gonçalo acrescenta que a justiça climática deve integrar também uma perspectiva de género e incluir comunidades marginalizadas: “As mulheres, particularmente nas zonas rurais e costeiras, são frequentemente as primeiras afectadas e têm um papel essencial nas estratégias de adaptação. E as comunidades deslocadas ou pescadores artesanais não podem continuar excluídos das mesas de decisão.”
Do internacional ao local Para a especialista em assuntos climáticos, é fundamental que as decisões tomadas nas COP sejam traduzidas em acções no terreno. “Não basta assinar compromissos se não houver mecanismos que traduzam essas promessas em acção. Precisamos de projectos que criem emprego e protejam ecossistemas. Isso passa por programar intervenções que batem à porta das comunidades e que são auditáveis”, afirmou.
Entre as medidas práticas, destacou a necessidade de reforçar sistemas de alerta precoce, infra-estruturas costeiras, programas de restauração de mangais e implantação de pequenas instalações e equipamentos comunitários.
Um dos eixos do trabalho da Plataforma Juvenil para a Reparação Climática é a formação de jovens que possam “dialogar com ministros, técnicos e doadores. A nossa ambição é que os jovens não sejam apenas espectadores, mas negociadores informados e proactivos”, explicou. Assim, será possível passar dos planos internacionais para acções locais.
A activista considera ainda essencial a criação de carreiras verdes no País. “A juventude precisa de caminhos profissionais no âmbito da transição climática: técnicos de resiliência, engenheiros costeiros, técnicos de energias renováveis. Sem oportunidades concretas, corremos o risco de perder capital humano para o exterior”, alertou.
“As responsabilidades históricas de emissão não desaparecem. Para que a justiça climática se materialize, é necessário que os contributos financeiros sejam adicionais, previsíveis e acessíveis.”
A activista relembra compromissos anteriores, como os 100 mil milhões acordados em décadas anteriores e pergunta: “Onde estão os resultados concretos? É preciso garantir que os fundos são entregues e que as condições de acesso não se transformem em barreira.”
Não há Conservação Que Resulte Sem Envolver as Comunidades
O Governo e as organizações de conservação defenderam, durante a Conferência da Biodiversidade, a necessidade de incluir as comunidades no processo de preservação marinha, através da combinação de benefícios económicos e uma educação ambiental “mais forte e contínua”
Abiodiversidade marinha no País enfrenta ameaças que comprometem a sustentabilidade. Por exemplo, quando se olha para a sobrepesca e para a pesca ilegal, que reduzem drasticamente as populações de espécies comerciais e colocam em risco o equilíbrio natural. Por outro lado, a poluição costeira, resultante de resíduos sólidos, descargas industriais e esgotos urbanos, degrada habitats sensíveis como os mangais e os recifes de coral. E as alterações climáticas intensificam fenómenos extremos, como ciclones e a subida do nível do mar, destruindo comunidades e ecossistemas que fazem parte da própria identidade da costa.
A sustentabilidade e a preservação ambiental tornaram-se pilares centrais nas agendas internacionais de empresas, governos e organizações de desenvolvimento. No entanto, especialistas alertam que há um actor que não pode ser deixado de fora desse esforço: as comunidades costeiras. A sua participação activa é vista como condição indispensável para o sucesso das políticas de
conservação marinha em Moçambique. Esta ideia foi amplamente sublinhada durante a 3.ª Conferência da Biodiversidade Marinha (CBM), realizada em setembro, na cidade da Beira.
Comunidades costeiras no centro da agenda Milagre Nuvunga, directora executiva da Fundação Micaia, critica o afastamento
DANIEL CHAPO Presidente da República
“Estamos aqui para reafirmar o envolvimento do nosso Governo na protecção e preservação da biodiversidade marinha, promovendo soluções que gerem emprego, sobretudo para a juventude, e que reforcem a resiliência das nossas comunidades costeiras.”
O ENCONTRO ANUAL DE UMA PLATAFORMA DE DEBATE PELA BIODIVERSIDADE
A Conferência da Biodiversidade Marinha é um evento ou plataforma que junta utilizadores e gestores da biodiversidade marinha no País numa periodicidade anual. A iniciativa, organizada pela Fundação para a Conservação da Biodiversidade (Biofund), teve início em 2023. Visa promover a capacitação multissectorial em técnicas e procedimentos para a protecção, restauração e conservação
dos ecossistemas costeiros e marinhos, incrementando a resiliência aos impactos das alterações climáticas no País. O evento tem como principal objectivo divulgar a importância da biodiversidade costeira e marinha através da partilha de conhecimento, bem como criar sinergias entre diversos intervenientes que actuam nesta esfera, incluindo as acções a decorrer no País ligadas aos recursos estuarinos, costeiros e marinhos.
das populações locais, como tem acontecido nalguns projectos. “As comunidades dependem da terra e dos recursos naturais, mas muitas vezes são chamadas apenas para obedecer a regras que limitam o uso desses recursos, sem lhes oferecer alternativas.”
A responsável defendeu a criação de cadeias de valor que transformem a biodiversidade em rendimento. “Temos a experiência da Mozambique Honey Company, que exporta mel para a Europa e para os Estados Unidos, envolvendo directamente os produtores como accionistas. Este modelo pode ser adaptado ao mar, garantindo que a conservação se traduza em melhoria de vida para as famílias”, afirmou.
Na ocasião, o sector privado destacou alternativas económicas. Bruno de Oliveira, director-geral da Selt Marine Mozambique, disse que “as comunidades costeiras dependem quase exclusivamente da pesca” e que é urgente diversificar. “O cultivo de algas marinhas já provou ser uma alternativa viável. Trabalhamos sobretudo com mulheres, que assim conseguem a sua própria fonte de rendimento, sem depender apenas da pesca dos maridos. Com maior apoio do Estado e das organizações não-governamentais, Moçambique pode até superar a Tanzânia, que já tem uma indústria consolidada”, afirmou.
No campo da restauração, Jorge Mafuca, coordenador da Blue Forest, sublinhou que “sem garantir o direito legal das comunidades sobre as suas terras, não é possível falar de conservação eficaz.” O responsável revelou que a sua organização está a restaurar 30 mil hectares de mangal em Sofala e Zambézia, dentro de um projecto que cobre 155 mil hectares no total. “A chave é criar comités de gestão locais e dar poder às comunidades. Só assim é possível assegurar resultados duradouros”, explicou.
A
conservação será efectiva quando a comunidade for
incluída, destacaram os oradores
Conhecimento científico e saberes tradicionais
A conferência também abriu espaço para o diálogo entre saberes tradicionais e inovação científica. O vereador do município da Beira, Getúlio Manhique, apresentou a experiência dos “workshops de sonho”, encontros participativos que integram o conhecimento das comunidades no planeamento urbano. “Conseguimos envolver a população para que apresente a situação da sua comunidade, em vez de esperar só pelos técnicos do município”, afirmou.
O investigador Raimundo Alberto Mulhaisse lembrou que “as comunidades costeiras usam o calendário lunar para prever marés e épocas de abundância de espécies” e que tabus religiosos acabam por restringir a pesca em determinadas áreas, funcionando como mecanismos tradicionais de conservação. Paralelamente, durante o evento, foram apresentadas propostas inovadoras pela comunidade científica. Yathima Oraibo Abdul defendeu a aquacultura sustentável, mostrando resultados de um projecto de cultivo de caranguejo do mangal em Cabo Delgado com taxa de sobrevivência de 95%. Scheila Condelaque apresentou uma iniciativa que converte resíduos plásticos recolhidos em praias e mangais em filamentos para impressão 3D. “O lixo marinho pode e deve
Cerca de 1,2 a 1,4 milhão de pessoas vivem dentro ou na periferia de áreas protegidas, em Moçambique, dependendo directamente dos recursos naturais que a conservação pretende proteger, criando um potencial conflito permanente
ser transformado em matéria-prima. Cada garrafa desperdiçada é uma oportunidade de inovação perdida”, frisou.
Educação ambiental e mudança de comportamentos
Um dos temas recorrentes foi a necessidade de reforçar a literacia oceânica, sobretudo nas escolas. Augusto Nhampossa, da Associação Natura Moçambique, alertou que “há escolas situadas junto de mangais e recifes de coral onde nunca se organizou uma visita de campo. Como podemos esperar que as futuras gerações defendam aquilo que nunca tiveram oportunidade de conhecer?”, questionou, defendendo a necessidade de criar iniciativas que exponham crianças aos locais de conservação.
Débora Catena, consultora da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), acrescentou que “medidas impostas de fora raramente funcionam”. “É essencial envolver as comunidades na identificação dos problemas e na construção das soluções”, porque, segundo a especialista, quando os pescadores percebem que métodos destrutivos reduzem o seu rendimento futuro estão mais dispostos a mudar de comportamento.
Na ocasião, os jovens marcaram presença com a apresentação de iniciativas criativas de sensibilização. A investigadora Líria Luís Mário Artur destacou que “a música revelou-se uma ponte entre a ciência e a cultura, facilitando a compreensão e a valorização do mangal entre os mais novos.” Nélia Tomo, responsável pelo projecto Eco-Acção, em Maputo, provou que “as crianças não são apenas beneficiárias, mas protagonistas da conservação. São futuros líderes ambientais em formação.”
Desafios estruturais permanecem Eugénio Manhiça, da Autoridade Nacional de Áreas de Conservação (ANAC), identificou a insuficiência de quadros especializados como o primeiro “grande obstáculo”. “Apesar de termos um número considerável de técnicos para áreas terrestres, na componente marinha, a insuficiência de técnicos qualificados e especializados é um grande desafio”, afirmou. O profissional alertou para uma crise iminente de capacidade: “Dentro de cinco anos, a maior parte dos nossos quadros experientes vão sair do sistema devido à idade de reforma. É um desafio encontrar uma plataforma para reter este conhecimento e garantir a continuidade.” Além disso, a falta de conhecimento e adopção de tecnologias eficientes para monitorizar a vasta
A inclusão económica é pertinente para salvaguardar locais de conservação
rede de áreas de conservação foi outro ponto crítico sublinhado.
Como mudar o cenário? O financiamento foi apontado como um dos desafios na área da conservação. Eugénio Manhiça citou um estudo de 2014 que estimou as necessidades de financiamento do sistema nacional em 803 milhões de meticais (12,5 milhões de dólares) por ano, um valor largamente dependente de fundos externos. O custo de gestão por quilómetro quadrado foi estimado entre 15 968 meticais a 19 161 meticais (250 a 300 dólares). “Temos uma rede que requer recursos financeiros enormes para a gestão”, explicou, salientando que a maioria dos fundos ainda provém do Orçamento do Estado, bem como de financiamento externo, e pouco da exploração de fontes inovadoras e sustentáveis de receita.
A pressão socioeconómica sobre as áreas protegidas também mereceu des-
taque. Eugénio Manhiça indicou que cerca de 1,2 a 1,4 milhão de pessoas vivem dentro ou na periferia destas áreas em Moçambique, dependendo directamente dos recursos naturais que a conservação pretende proteger, criando um potencial conflito permanente.
Seguir bons exemplos com resultados
Em contraponto, Sean Nazeralli, da Biofund, apresentou três oportunidades de financiamento a diferentes níveis. Primeiro, a nível comunitário, propôs a criação de empresas comunitárias que explorem de forma sustentável e lucrativa recursos como peixe, carvão ou produtos florestais não madeireiros, dando às comunidades a propriedade, gestão e benefício desses recursos. Segundo, a nível das áreas de conservação, defendeu a expansão dos modelos de co-gestão, como os bem-sucedidos exem-
Sean Nazeralli, da Biofund, defendeu a expansão dos modelos de co-gestão, como os bem-sucedidos exemplos dos Parques Nacionais da Gorongosa e do Bazaruto, que atraem financiamento das empresas
AUGUSTO
NHAMPOSSA
Associação Natura Moçambique
“Há escolas situadas junto de mangais e recifes de coral onde nunca se organizou uma visita de campo. Como podemos esperar que as futuras gerações defendam aquilo que nunca tiveram oportunidade de conhecer?”
EUGÉNIO MANHIÇA
Autoridade Nacional de Áreas de Conservação
“Dentro de cinco anos, a maior parte dos nossos quadros experientes vão sair do sistema devido à idade de reforma. É um desafio encontrar uma plataforma para reter este conhecimento e garantir a continuidade.”
plos dos Parques Nacionais da Gorongosa e do Bazaruto, que atraem financiamento e conhecimento técnico do sector privado, aliviando o encargo do Estado. Terceiro, a nível nacional, sugeriu explorar mecanismos de “troca de dívida por natureza” (designados “debt-for-nature swaps”).
Estas foram muitas das soluções apresentadas por diversos intervenientes durante o evento e que convergem com a ideia de se incluir as comunidades no processo de conservação da biodiversidade, através de incentivos económicos com uma educação acirrada.
O Presidente da República, Daniel Chapo, presidiu à sessão de abertura e sublinhou que Moçambique é “uma nação oceânica que precisa de gerir os seus recursos marinhos de forma sustentável e de valorizar o capital natural como pilar da economia azul.”
Daniel Chapo reafirmou ainda os compromissos internacionais assumidos pelo País, incluindo a meta de proteger 30% da terra e do mar, através da criação de reservas ambientais, até 2030. “Estamos aqui para reafirmar o envolvimento do nosso Governo na protecção e preservação da biodiversidade marinha, promovendo soluções que gerem emprego, sobretudo para a juventude, e que reforcem a resiliência das nossas comunidades costeiras”, declarou.
Instituições Unem-se para Reforçar Papel do Ensino Técnico
Várias entidades juntaram-se na assinatura de memorandos que visam recrutar mais jovens para o ensino técnico e profissional. O impulso teve como pano de fundo a primeira edição das Olimpíadas de Soldadura: está lançada uma iniciativa para promover o “saber fazer” através da formação técnica
Texto
Germano Ndlovo • Fotografia DR
Várias entidades juntaram-se para assinar memorandos de entendimento que visam dar um impulso extra à promoção do ensino técnico no País. A empresa moçambicana Talento, a Associação Industrial de Moçambique (Aimo), a Associação de Conteúdo Local de Moçambique (ACLM), o Instituto Industrial e Comercial de Matola (IICM) e o banco Absa uniram esforços com o objectivo de “consolidar a formação técnica, criar oportunidades de emprego e posicionar o talento local no cenário nacional e internacional.”
“É imperativo desmistificar o ensino técnico e profissional, elevando-o ao nível que merece e mostrando aos jovens que esse caminho pode e deve ser a sua primeira escolha”, destacou Frederico Silva, CEO da Talento, à E&M. Como exemplo prático do que as diferentes entidades podem fazer juntas, surgiram as Olimpíadas de Soldadura. A iniciativa é dirigida a estudantes, formadores, profissionais e empresas, numa celebração do ensino técnico e profissional. O evento, cuja primeira edição decorreu em Setembro, serve de plataforma para reunir formandos e empregadores, facilitar estágios e incentivar a integração profissional, num momento
em que o País se prepara para desafios industriais de grande escala.
No total, 21 participantes colocaram as suas competências à prova em processos de soldadura de diferentes níveis de especialização. Além da competição prática, o evento contou também com uma feira de talentos, um espaço dedicado à promoção de iniciativas de escolas e empresas ligadas ao sector.
“Desmistificar o ensino técnico-profissional”
Na abertura da cerimónia de entrega de prémios, Frederico Silva, CEO da Talento, destacou que as Olimpíadas foram criadas para promover o “saber fazer” e posicionar a formação técnica como a primeira escolha dos jovens.
Aquele responsável explicou que a iniciativa não se limita a ser um concurso, mas inclui uma plataforma digital de localização de talentos, que manterá a ligação entre estudantes e empresas, e uma série digital inspirada em formatos televisivos, com o objectivo de atrair e inspirar mais jovens através das redes sociais.
Para Arne Gibbs, director-geral da ExxonMobil Mozambique, a competição faz parte de um esforço maior para pre-
“As Olimpíadas foram criadas para promover o ‘saber fazer’ e posicionar a formação técnica como primeira escolha dos jovens”, Frederico Silva, CEO da Talento
parar o País para um futuro com actividades ligadas ao gás natural e à transição energética “Estamos a preparar-nos hoje para os desafios de amanhã. Os jovens moçambicanos precisam de estar prontos quando os grandes projectos forem iniciados”, referiu.
Tânia Oliveira, directora de Marketing e Relações Corporativas do Absa, destacou o impacto social da promoção do ensino técnico: “O nosso apoio reforça o nosso compromisso com a valorização da formação profissional e a promoção da empregabilidade, em linha com a nossa estratégia de cidadania corporativa.”
Vencedores da competição e inspiração feminina
Na categoria Formadores/Profissionais, os vencedores foram Ingerino Sitoe, Jorge Nhachengo e António Manjate, que receberam cheques do Absa e kits completos para apoiar as suas actividades.
Entre os formandos, destacaram-se Lúcia Uamusse, Flora Chau e António Muchanga. Flora Chau recebeu também o Prémio Mulher Inspiradora, uma distinção especial pela sua carreira na área da soldadura, reforçando a importância da participação feminina num sec-
tor tradicionalmente dominado pelos homens. Numa entrevista à E&M, Chau descreveu a sua experiência como “única e muito enriquecedora. Tive a oportunidade de colocar em prática os conhecimentos adquiridos no IICM, num ambiente altamente exigente. O maior desafio foi gerir a pressão do tempo e manter a concentração para garantir a qualidade em cada soldadura, sabendo que estava a ser avaliado por especialistas e comparado com colegas talentosos.”
Sobre a sua conquista, pouco usual, tendo em conta as disparidades de género ainda existentes na sociedade moçambicana, a jovem afirmou ter sido “uma grande honra e motivação” para continuar a crescer como soldadora. “É o reconhecimento do esforço e dedicação ao longo da minha formação. Acredito que estas Olimpíadas me ajudaram a valorizar ainda mais a profissão, mostrando que é uma carreira com futuro, essencial para o desenvolvimento industrial, e que merece maior reconhecimento social e profissional.”
Uma competição exigente
Jorge Nhachengo, formador, destacou as exigências técnicas e emocionais da com-
FREDERICO SILVA CEO da Talento
petição. “Entre os maiores desafios estavam a pressão, a necessidade de precisão e qualidade em cada detalhe e as expectativas externas.” Para Nhachengo, a vitória tem um significado que vai além do reconhecimento individual: “As Olimpíadas são um farol de excelência, ajudando a atrair jovens talentos e a criar uma forte comunidade técnica que pode ter um impacto real no mercado de trabalho.”
António Muchanga, estudante, considerou a experiência como “fantástica”. “Tive a oportunidade de aplicar os conhecimentos que já possuía e ganhar ainda mais experiência”, referiu. Para ele, a vitória teve um sabor ainda mais especial por ser estudante. “Ainda não tenho experiência profissional”, referiu, e a distinção dá-lhe “mais confiança para enfrentar o mercado de trabalho.”
Muchanga acredita que as Olimpíadas ajudam a valorizar a profissão de soldador, muitas vezes vista como informal. “O objectivo do evento é promover a soldadura como uma profissão séria e necessária, que merece respeito.” Sobre o futuro, foi claro nos seus planos: “Quero estabelecer-me na minha profissão, praticá-la continuamente, para não perder as minhas competências, e usar o
Vinte e um participantes demonstraram o seu talento em soldadura, competindo em diferentes níveis de especialização
prémio que recebi como uma forma de abrir portas no sector.”
Compromissos para o futuro
O presidente da AIMO, Paulo Chibanga, considerou que as Olimpíadas “colocam Moçambique no cenário internacional e fortalecem a competitividade da indústria. As competências técnicas em soldadura aplicam-se a sectores como construção, energia e manufactura.”
A primeira edição das Olimpíadas de Soldadura foi realizada em parceria com o Instituto Industrial e Comercial da Matola (IICM) e contou com o apoio financeiro da associação empresarial alemã e provedora de formação profissional KH Warendorf, bem como com o patrocínio da ExxonMobil Mozambique, do porto de Maputo, da empresa de engenharia e construção FPB, da Field Ready – que actua na capacitação de jovens para o mercado de trabalho – e da TRI-M e Ascending.
Estiveram ainda envolvidos, enquanto parceiro estratégico, o banco Absa e os parceiros institucionais AIMO, ACLM, Moz Youth Foundation, Contact, ATITTUDE, WhireLab, Wine Lovers, MHM e IdeiaLab. A iniciativa contou também com o apoio da Viewpoint.
Arne Gibbs, director-geral da ExxonMobil (segundo da esquerda), diz que a competição prepara Moçambique para o futuro do gás
Centros de Dados e Soberania Digital – um Balanço Cada Vez Mais Difícil (I)
David Gonçalves • EY Partner Technology Consulting
Para contexto dos leitores, iniciei a escrita deste artigo no meio dos EUA, dentro de um avião, a mais de 25 mil pés de altitude, e onde, ao contrário do que seria imaginável há pouco tempo, tenho acesso total a conteúdos digitais seja através de um serviço de Internet bastante estável, seja através de uma plataforma de streaming disponibilizada pela companhia aérea em que viajo.
Apesar do interesse pessoal e profissional que tenho no tema, decidi procurar uma fonte de inspiração ficcionada que me ajude a dar o pontapé de saída e, já agora, a tornar a minha viagem até ao destino mais curta. Como tal, acedi à tal plataforma de streaming e rapidamente dei por mim a ver a mais recente odisseia de Missão Impossível.
Naturalmente, não posso deixar de confessar que sou um grande fã das mais variadas cenas de acção que o actor protagoniza sem qualquer duplo em todos os filmes da saga, mas, neste caso, pedindo já perdão ao leitor por qualquer spoiler, o argumento do filme centra-se (de forma ficcionada, claro) em questões muito actuais e ligadas ao tópico em discussão: utilização de inteligência artificial, acesso indevido a dados e sistemas e um centro de dados hiper resiliente e limitadamente conectado à rede, que serve de salvação à destruição do mundo.
de desenvolvimento acelerados e inovação contínua.
Flexibilidade: acesso a aplicações e dados a partir de qualquer lugar, a qualquer hora, facilitando modelos de trabalho remoto e colaboração global.
Confiabilidade: alta disponibilidade garantida por centros de dados redundantes, com mecanismos eficazes de backup e recuperação de desastres.
Desempenho: infra-estrutura sempre actualizada e optimizada, oferecendo desempenho superior de TI com actualizações e melhorias automáticas constantes.
Eficiência de custos: redução de custos operacionais e de manutenção de hardware, graças ao modelo de pagamento conforme o consumo e a utilização.
Esta realidade é validada por diferentes estudos, como um, da Gartner, que indica que, até final deste ano, 85% das organizações mundiais terão integrado serviços cloud nas suas actividades essenciais, reflectindo o reconhecimento geral das vantagens.
“As empresas e Governos que entendem as vantagens e abraçam a transformação utilizando a cloud tendem a ser mais eficientes e ágeis na adaptação às mudanças do mercado e a capturar vantagens do ponto de vista macroeconómico”
Actualmente, já não existem dúvidas de que os centros de dados e as plataformas de cloud tornaram-se numa espinha dorsal invisível das empresas modernas. O que antes era uma opção tecnológica, hoje tornou-se uma ferramenta fulcral que viabiliza serviços digitais, permite às organizações iniciarem ou escalarem de forma flexível, assim como oferecer ciclos de desenvolvimento de aplicações e serviços com uma velocidade sem precedentes. Para os directores de sistemas de informação e líderes digitais, a cloud tem sido sinónimo de:
Rapidez: soluções e infra-estruturas inteiras podem ser redesenhadas em semanas em vez de anos.
Escalabilidade: possibilidade de expandir ou reduzir capacidade de computação conforme as necessidades, sem interrupções ou desperdícios de recursos.
Agilidade: respostas rápidas às exigências do mercado, permitindo ciclos
Mas no contexto actual (de transformação global, com reconfiguração geopolítica), estes tópicos já não são apenas uma prioridade de agenda para directores de sistemas de informação ou administradores responsáveis, mas sim para um conjunto mais alargado de intervenientes, desde líderes organizacionais a Governos.
A agilidade continua a ser um vector, mas já não basta. Governos, reguladores e cidadãos levantam questões cada vez mais incisivas sobre soberania e dependência digital: quem controla a infra-estrutura que aloja dados críticos? Onde é que a informação está armazenada? Que legislação rege o seu acesso?
Numa era em que as disputas geopolíticas se estendem ao ciberespaço e em que a privacidade é uma exigência central dos consumidores, estas questões não são teóricas, mas determinam decisões reais de investimento, influenciam onde são construídos os grandes de centros de dados e moldam a própria arquitectura da Internet global.
Este artigo pretende explorar brevemente um dos desafios mais complexos da era digital: a convergência entre centros de dados (datacenters), computação à distância (cloud computing) e sobera-
Os centros de dados são a representação física da cloud: universos de informação cabem nestes corredores
nia de dados. A transformação digital e a cloud são hoje dois conceitos indissociáveis num contexto de economia global. Os centros de dados são a representação física da cloud. O que antes eram simples salas de servidores, hoje representam ecossistemas tecnológicos sofisticados e interligados, centros de processamentos que suportam uma vasta gama de serviços (desde aplicações de consumo até muitas outras).
Trata-se de uma infra-estrutura crítica para empresas e Governos, com resiliência robusta pela sua capacidade de alojamento e armazenamento em múltiplas localizações. São, cada vez mais, autênticas fornalhas de processamento de algoritmos de inteligência artificial que requerem capacidades de processamento muito elevadas.
Existem estimativas para todos os gostos quanto ao valor do mercado global de centros de dados. A mais recente, da Grand View Research, atribui-lhe aproximadamente 384 mil milhões de USD e uma perspectiva de crescimento até 652 mil milhões até 2030. Se olharmos para outras estimativas ligadas às necessidades de investimento no sector, geradas pelo crescimento exponencial da inteligência artificial, as estima-
tivas sobem consideravelmente e agregam, além de hardware, outras necessidades como a infra-estrutura de produção eléctrica.
Fazendo um paralelismo do conceito com o sector industrial, os datacenters e a cloud representam um conjunto de fábricas que se encontram interligadas por uma cadeia logística que deve ser resiliente. Aprofundando simplificadamente esta analogia, a afinidade torna-se ainda mais engraçada. Vejamos:
No sector industrial, transformamos matéria-prima em produtos, e a competitividade e eficiência dependem de linhas de produção e/ou transformação e de uma logística fabril que devem maximizar o OEE ou Overall Equipmement Effectiveness (disponibilidade x desempenho x qualidade), e de uma cadeia logística de entrega bem orquestrada e preparada para entregar a tempo e horas o produto no destino e fornecer informação sobre necessidades futuras. Olhando para os datacenters e cloud, o que temos é um OEE digital, sendo que a disponibilidade se mede em uptime/SLA (tempo de actividade/acordo de nível de serviço) das regiões e serviços, no desempenho na entrega de informação, no tempo de treino de IA, la-
tência e a qualidade nos erros ou falhas em aplicações, redes, etc. A logística fabril é representada por arquitecturas de energia e rede que são exigidas para alimentar todas as unidades de processamento e armazenamento, e o transporte e tempo de espera são representados pela latência entre regiões/ zonas.
Poderíamos continuar a adicionar similaridades, mas indo ao encontro do fundamental, tal como na industrialização, a adopção de cloud computing é mais do que uma decisão tecnológica, é um imperativo estratégico para a competitividade empresarial e nacional. As empresas e Governos que entendem as vantagens e abraçam a transformação utilizando a cloud tendem a ser mais eficientes e ágeis na adaptação às mudanças do mercado e a capturar vantagens do ponto de vista macroeconómico.
No entanto, conforme já referido, apesar das muitas vantagens que advêm da utilização da cloud, cada vez mais emergem preocupações de soberania digital, tanto pela exigência do ponto de vista de cibersegurança e da preocupação crescente dos cidadãos sobre o tratamento dos seus dados, como, principalmente, pelo contexto geopolítico actual. (Continua na próxima edição).
De Simples Transacções a Plataformas de Grande Impacto
Há muito que a moeda electrónica (mobile money) deixou de servir apenas para facilitar transferências. Gradualmente, as operadoras móveis criaram plataformas multifuncionais capazes de incluir financeiramente milhões de cidadãos, educar, ligar serviços e impulsionar a economia local. Em Moçambique, iniciativas recentes mostram como soluções inovadoras adicionam funcionalidades até para uso empresarial, garantindo eficiência nas transacções e promovendo literacia financeira. Para onde caminham estas ferramentas, cada vez mais omnipresentes?
Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R.
O FUTURO DA MOEDA ELECTRÓNICA
No coração do mercado grossista do Zimpeto, arredores da cidade de Maputo, entre bancas de tomate, cebola e frango vivo, as conversas já não se limitam a preços ou a pechinchas. “Aqui quase ninguém anda com dinheiro vivo. O M-Pesa e o e-Mola é que resolvem”, diz Teresa Alberto, comerciante de hortaliças, numa alusão às plataformas de moeda electrónica (mobile money) das operadoras Vodacom e Movitel.
Ela testemunha um hábito cada vez mais consolidado: os pagamentos via número de telemóvel, ou seja, mesmo que seja um dos mais simples, com teclas numéricas. “Antes, o cliente pedia troco e perdíamos tempo. Agora, basta digitar o número e pronto. Rápido e seguro”, completou a comerciante. É tão fácil como saber (ou ter à mão) os códigos USSD: sequências de asteriscos (*), cardinais (#) e números, que se intercalam com os valores a pagar e código do comerciante.
O cenário repete-se no Xipamanine, onde vendedores de roupa usada confirmam que as transacções digitais tornaram-se regra. O fluxo de dinheiro em espécie é cada vez menor, o que significa maior segurança. “Já não temos medo de assaltos, como antes”, afirma Luís Carlos, comerciante de calçado.
A moeda electrónica tornou-se omnipresente e já não se resume a simples transacções. Ao longo dos últimos anos, estas plataformas evoluíram, incorporando serviços que incluem pagamentos de contas de água e energia, recargas de telecomunicações, compras em supermercados, até opções de poupança, microcrédito e seguros. Este alargamento do leque de serviços mostra que as plataformas móveis procuram ocupar um espaço cada vez mais central no quotidiano dos moçambicanos, ainda que a adesão a algumas das funcionalidades continue desigual e marcada por desconfianças e barreiras culturais.
Seguros que ninguém conhece
Se os pagamentos digitais são amplamente aceites e já fazem parte da rotina de comerciantes e clientes, outros serviços oferecidos pelas plataformas móveis de moeda electrónica continuam a ser quase desconhecidos ou encarados com desconfiança. O caso mais evidente é o dos seguros, apresentados como uma inovação, mas que parecem não dialogar com o imaginário da maioria dos utilizadores.
“Seguro de funeral? Nunca ouvi falar”, reage, surpreso, Manuel Mucave-
Se os pagamentos digitais são amplamente aceites e já fazem parte da rotina de comerciantes e clientes, outros serviços continuam desconhecidos
le, jovem cliente que procurava calçado. Outros até já ouviram falar, mas não se sentem motivados a aderir. As razões variam: desconfiança, falta de clareza nas condições, outras prioridades financeiras e crenças culturais. “Aqui, quem pensa muito em funerais atrai azar. Prefiro usar o dinheiro para viver o dia-a-dia”, comenta Manuel Mucavele.
O dilema do Xitique digital
Outro serviço que ainda não convenceu o mercado é o “Xitique digital”. Apesar das vantagens em termos de segurança e gestão transparente dos fundos, a prática comum continua a ser a organização em grupos presenciais. “Xitique é confiança. Nós juntamos, fazemos a festa e entregamos o valor. No telefone, parece frio demais”, explica Alfredo Langa, comerciante de especiarias no Zimpeto.
Microcrédito: inclusão ou medo da dívida?
No campo do microcrédito, a realidade apresenta paradoxos que revelam as fragilidades da literacia financeira no mercado informal. Um agente de moeda electrónica confirma que muitos clientes optam por transacções no e-Mola para evitar débitos automáticos no M-Pesa. “Eles já pediram empréstimos no M-Pesa, agora têm medo de, quando receberem dinheiro, o sistema desconte logo as prestações em dívida”, expli-
Os custos da interoperabilidade são uma reclamação recorrente
ca Jorge Manjate, agente de moeda electrónica. Na prática, a vantagem do microcrédito oferecido pelo M-Pesa parece tornar-se num obstáculo: será que a instituição que concede crédito perde clientela para a concorrente que não oferece este serviço?
O cenário levanta dúvidas sobre a preparação financeira dos utilizadores e expõe o risco de financiar população com baixa capacidade de gestão de crédito. Para muitos, a ideia de ter acesso imediato a dinheiro é atractiva, mas a disciplina para reembolsar é quase inexistente.
Custos que afastam
Os custos da interoperabilidade entre plataformas de moeda electrónica e bancos é uma reclamação recorrente. A ideia de integrar o sistema parece boa, mas pesa no bolso dos utilizadores. “Pagar 30 meticais só para transferir dinheiro para o banco é insustentável”, protesta Fátima Lino, vendedora de carvão no Xipamani-
ne. Para pequenos comerciantes que lidam com margens apertadas, cada taxa é sentida como um obstáculo. Muitos preferem manter o dinheiro no telemóvel.
As plataformas estão a ouvir o mercado?
As histórias recolhidas nos mercados do Zimpeto e Xipamanine mostram que se, por um lado, as plataformas móveis respondem a necessidades práticas do comércio diário — pagamentos rápidos, segurança e conveniência —, por outro, há uma lacuna clara entre o que é oferecido e o que o mercado realmente absorve. Serviços como seguros e “xitiques” (poupança) digitais ainda não ganharam tracção porque parece não substituírem realidades culturais e sociais dos utilizadores.
Seja no Zimpeto ou no Xipamanine, a conclusão é clara: a adesão massiva ao mobile money é um facto, mas falta alinhar alguns aspectos com a vida dos utilizadores.
dados revelam uma expansão simultânea da base de utilizadores e da rede de distribuição, reforçando o dinamismo do sector. O volume e o valor das transacções das instituições de moeda electrónica também apresentam um crescimento contínuo
Carteiras Móveis em Moçambique: o Futuro já Está na Palma da Mão!
Durante décadas, o sistema financeiro moçambicano foi comparável a grandes navios, estáveis, sólidos e necessários para o transporte da economia nacional. Mas tal como esses navios não chegam às margens mais remotas, também os bancos tradicionais não alcançavam milhões de moçambicanos afastados do sistema formal. Foi então que surgiram as pequenas embarcações, as carteiras móveis, navegando com agilidade onde antes só havia exclusão.
Hoje, essas “embarcações digitais” não são apenas auxiliares do sistema bancário: são o novo motor da economia de proximidade. O dinheiro deixou de ser uma abstracção guardada entre paredes para se tornar num fluxo vivo e móvel, que circula entre mercados, bairros e aldeias, movendo a economia real.
Como qualquer revolução, esta também traz desafios. O crescimento das carteiras móveis exige novos mecanismos de controlo e prevenção de branqueamento de capitais, sem que isso limite a inovação
A verdadeira transformação das carteiras móveis não é apenas tecnológica, ela é cultural e comportamental. Num país em que o tempo é um recurso escasso, a conveniência tornou-se no novo sinónimo de confiança. Abrir uma conta bancária continua a exigir documentos, deslocações e paciência. Para abrir uma carteira móvel, por outro lado, basta um telemóvel e um bilhete de identidade. Esse acesso imediato criou um novo padrão de expectativa: o cliente quer soluções que cabem na palma da mão.
Mesmo quem já possui conta bancária migra para o digital, atraído pela simplicidade, rapidez e ausência de barreiras. O cliente moderno não quer apenas guardar dinheiro; quer movimentá-lo, enviá-lo, utilizá-lo. E é neste ponto que as carteiras móveis deixaram de ser apenas ferramentas de inclusão para se tornarem no centro do novo ecossistema financeiro moçambicano.
Segundo o Banco de Moçambique, o número de agentes de carteiras móveis atingiu 351 921 no primeiro trimestre de 2025, o que representa 1817 agentes e 110 contas de moeda electrónica por ca-
da 100 mil adultos, uma cobertura que já alcança todos os 154 distritos do País.
Em 2019, havia apenas 350 agentes por 100 mil adultos. Hoje, esse número multiplicou-se por cinco, com um crescimento médio anual superior a 30%. Os principais protagonistas são o mKesh (Tmcel), o M-Pesa (Vodacom) e o e-Mola (Movitel). Este último movimentou, só no primeiro trimestre, mais de 822,8 mil milhões de meticais e 1,38 mil milhões de transacções.
Estes números não são apenas estatísticas: são o reflexo de um modelo económico mais próximo das pessoas, no qual o dinheiro circula de forma descentralizada e eficiente. Durante anos, falou-se em “inclusão financeira” como o grande objectivo. Hoje, o que vivemos é mais do que inclusão, é uma redefinição estrutural do sistema financeiro.
A economia moçambicana está a migrar de uma estrutura hierárquica e concentrada para um ecossistema dinâmico, participativo e tecnologicamente integrado. As carteiras móveis são o ponto de contacto entre o cidadão e a economia digital: permitem pagar serviços, enviar dinheiro à família, recarregar crédito e gerir micro transacções diárias. Essa agilidade é o que dá nova vida à economia informal e reforça o poder de consumo. O dinheiro digital é o meio natural da economia moderna.
Como qualquer revolução, esta também traz desafios. O crescimento das carteiras móveis exige novos mecanismos de controlo e prevenção de branqueamento de capitais, sem que isso limite a inovação. A resposta regulatória precisa de ser estratégica e equilibrada para proteger, sem travar, e precisa de supervisionar, sem asfixiar. A experiência internacional demonstra que a integração é melhor do que a restrição. E é precisamente neste ponto que surge o papel de parceiros especializados como a CTJ Consultoria para apoiar instituições, reguladores e fintechs a encontrarem o ponto de equilíbrio entre crescimento e conformidade.
O dinheiro digital é o meio natural da economia moderna
Na CTJ, acompanhamos de perto esta evolução. Trabalhamos com instituições financeiras, operadoras de telecomunicações e fintechs, ajudando-as a transformar inovação em valor sustentável.
Apoiamos desde o onboarding digital e análise regulatória até à integração de inteligência artificial e modelação de risco, garantindo que a tecnologia é usada de forma segura, eficiente e alinhada
com o quadro regulatório. Porque acreditamos que o futuro financeiro de Moçambique será digital, inclusivo e colaborativo, e que o sucesso virá das organizações que melhor compreenderem e anteciparem essa mudança.
As carteiras móveis provaram que o sistema financeiro não precisa de ser lento para ser seguro, nem burocrático para ser legítimo. Elas representam a democratização do acesso, a humani-
zação da tecnologia e o fortalecimento da economia real. O que começou como um serviço alternativo tornou-se a espinha dorsal de uma nova economia moçambicana, ágil, acessível e conectada. O futuro pertence a quem souber navegar com leveza. Enquanto os grandes navios mantêm o rumo, serão as pequenas embarcações que continuarão a chegar primeiro a cada nova margem. Vamos navegar?
Histórias de Impacto Real: um Estudo Sobre o Sul do País
O crescimento dos serviços financeiros móveis em África tem transformado a vida de milhões de pessoas, especialmente em áreas rurais com difícil acesso aos bancos tradicionais. Um estudo feito no sul de Moçambique mostra como a mudança se processa
Qual o impacto real do crescimento da moeda electrónica? Em que histórias reais se traduzem os números da expansão desta tecnologia? Há um estudo que faz luz sobre o que se passa no terreno. Inspirada pelo sucesso da introdução do M-Pesa, no Quénia, em 2007, uma equipa de investigadores liderada por Cátia Batista, professora catedrática de Economia na Nova School of Business and Economics, em Lisboa, e directora científica do centro de investigação NovaAfrica, realizou, no período de 2010 a 2013, um trabalho sobre a implementação destes serviços no País. A investigação incidiu nas zonas rurais das províncias de Maputo, Gaza e Inhambane. Com o título “Is Mobile Money Changing Rural Africa? Evidence from a Field Experiment” (“Estará o Dinheiro Móvel a Mudar a África Rural? Provas de uma Experiência no Terreno”), a pesquisa revelou como o uso de moeda electrónica mudou o dia-a-dia das comunidades.
Tendo em conta que se tratavam de serviços desconhecidos, Cátia Batista começa por apontar o acesso dado a localidades isoladas e a confiança por parte da população, como factores que faci-
litaram a implementação de um serviço que podia parecer complicado. Na altura, a Mkesh, plataforma de moeda electrónica da operadora estatal Mcel, era a única que oferecia este tipo de serviços no País, e foram necessárias várias estratégias para conquistar a comunidade.
A confiança numa nova rede de segurança financeira “A confiança é o factor mais importante para introduzir uma inovação tecnológica, especialmente financeira. Nós trabalhávamos com as autoridades locais, tínhamos uma equipa que visitava a aldeia e havia sempre encontros com toda a comunidade. Foram necessários vários processos para que esta adopção acontecesse. E, de facto, foi um sucesso”, explica à E&M. Segundo a autora, apesar de ter sido um serviço novo, no prazo de um ano, cerca de 70% da população já tinha aderido aos serviços de mobile money, destacando o seu impacto em momentos de choques negativos, como as inundações de 2013. O serviço permitia a transferência rápida de recursos, ajudava as famílias afectadas a evitar fome e apoiava a compra de medicamentos. Além disso, auxiliou as famílias que passavam por dificuldades, como a perda de emprego ou a falta de recursos para realizar funerais.
“Mesmo em contextos remotos, os serviços não só são usados, como transformam vidas, promovendo maior segurança alimentar, saúde e educação”
O estudo trouxe à tona o papel das remessas como uma rede de segurança financeira noutros contextos. “Surpreendentemente, o serviço não foi utilizado para aumentar investimentos agrícolas ou a criação de novos negócios rurais, como nós esperávamos. Em vez disso, muitas pessoas passaram a migrar para a cidade em busca de melhores empregos, usando a moeda electrónica para enviar dinheiro para as famílias no campo." Essa verba, por sua vez, também trouxe benefícios. Por exemplo, “também foi direccionada para investimentos na educação das crianças, como compra de livros e uniformes, destacando-se um efeito positivo no desenvolvimento humano”, salienta.
Há um contraste claro entre vilas rurais, pequenas e isoladas, e mercados dinâmicos nas zonas urbanas. De acordo com Cátia Batista, o serviço financeiro móvel tem maior fluidez nas cidades, onde há mais movimento e procura, com volume de transacções suficiente para os agentes móveis suportarem a sua actividade. “Os agentes nos mercados da cidade já em 2015 funcionavam bem: eles ficavam no local o dia todo e esse serviço mostrou ser um negócio sustentável."
Nas zonas rurais, não se geram negócios suficientes para sustentar agentes financeiros locais a tempo inteiro e estes
Texto Ana Mangana • Fotografia D.R.
servem mais como um complemento ao comércio já existente.
Esta evolução do ecossistema financeiro parece também esbater as desigualdades de género. A autora menciona um trabalho que está a ser desenvolvido nos mercados de Maputo e Matola, maior malha urbana do País. Ao introduzir os serviços de moeda electrónica, principalmente numa intervenção com mulheres empreendedoras, estas conquistaram vários benefícios. “Puderam guardar o dinheiro do negócio, separado das finanças pessoais, ganhando mais autonomia."
Entraves no acesso à Internet travam evolução
Questionada sobre as perspectivas para estes serviços nos próximos dez anos, Cátia Batista considera que o serviço de moeda electrónica já está amadurecido, mesmo quando não há acesso à Internet, porque oferece uma ampla gama de serviços através da rede móvel tradicional. Porém, aponta o acesso a serviços de dados como o maior desafio para que continue a haver inovação.
“Quando há acesso, surgem novos serviços além da carteira móvel. Contudo, nos trabalhos que faço, tanto em áreas rurais quanto urbanas, incluindo Maputo, vejo muitas pessoas que ainda não têm condições de usar dados móveis." A au-
EXPERIÊNCIA MOSTRA QUE RISCO COMPENSA
Muitas empresas tecnológicas evitam investir nas zonas rurais por receio de que os serviços não sejam utilizados, algo que já aconteceu em vários países. No entanto, explica Cátia Batista, a experiência mostra que, quando há investimento em levar os serviços às pessoas, criar relações locais, construir confiança e oferecer apoio ao cliente, os resultados são muito positivos. As comunidades passam a ter melhor acesso a alimentos, medicamentos, educação para as crianças e novas oportunidades económicas.
Segundo a autora do estudo, Cátia Batista, apesar de ter sido um serviço novo, cerca de 70% da população já tinha aderido aos serviços no prazo de um ano
tora conta que, entre 1200 pequenos empresários e vendedores de mercado nas cidades de Maputo e Matola, uma grande parte não usa Internet porque não tem aparelhos adequados ou não pode pagar pelos carregamentos. “Enquanto o uso da Internet não se tornar acessível, as pessoas não conseguirão usufruir de serviços financeiros digitais que estão disponíveis para quem usa smartphones e pode pagar pelos dados."
Assim, a grande revolução, para a pesquisadora, será tornar a Internet mais acessível, começando pelas cidades e alcançando, depois, as zonas rurais. “Tecnologias mais avançadas, como blockchain e inteligência artificial, estão muito além do alcance de uma grande parte da população em Moçambique e noutros países da África Subsaariana, devido à falta de acesso à Internet. Quando essa barreira for superada, a inovação tecnológica poderá finalmente chegar a quem mais precisa”, acrescenta. Cátia Batista acredita que para as empresas e startups interessadas em inovar no mercado rural, as lições são claras: é essencial investir para criar confiança local, oferecer suporte e facilitar a adopção. “Com isso, mesmo em contextos remotos, os serviços não só são usados, como transformam vidas, promovendo maior segurança alimentar, saúde e educação”, conclui.
Um Meio de Pagamento Cada Vez Mais Integrado Com Sites e APPS
Programadores e webdesigners escrevem cada vez mais código para integrar as plataformas de moeda electrónica em sites e aplicações: saltam da palma da mão para o ecrã, tanto pagam a fruta da banca como as subscrições de streaming. A E&M foi a uma sala de engenharia perceber como se faz esta mudança
Texto Celso Chambisso • Fotografia
D.R.
Oque antes eram simplesmente plataformas de mobile money (moeda electrónica) tornaram-se verdadeiros motores de inovação. Hoje, são capazes de integrar funcionalidades que suportam negócios e promovem maior competitividade e desenvolvimento económico. Em África, há muito interesse na iniciativa Open API, que permite que os programadores informáticos e empresas testem ideias, criando soluções que, no final, permitem lançar serviços financeiros com rapidez e segurança. Em Moçambique, ferramentas como esta têm o potencial de transformar pequenas iniciativas em soluções de grande alcance, impulsionando inclusão financeira e desenvolvimento económico.
A era da transformação com as API
Uma API (sigla de Application Programming Interface) é um conjunto de regras para estruturar dados que permi-
te a dois programas comunicarem entre si. Ou seja, uma API é como uma ponte que possibilita que diferentes aplicações troquem informações e trabalhem em conjunto, sem precisarem de saber como cada uma é feita por dentro (podem ser baseadas em linguagens de programação diferentes, mas a informação que trocam, via Internet, tem uma estrutura uniformizada). Por exemplo, se souber como é que uma API de pagamentos online recebe dados (valor, dados do cartão bancário, identificação do portador), posso programar a API de uma loja online para estruturar a informação recebida dos clientes dessa maneira e processar uma compra. Mesmo que essa loja use um software diferente.
A E&M ouviu Evans Meyo, especialista do M-Pesa África na área de redes sociais, análise de dados e ligação de marcas a plataformas online. Segundo explicou, a Open API é uma iniciativa digital aberta. Basta que o utilizador se inscreva e tem acesso a documentação, exemplos e um URL (endereço) próprio para
A expectativa é que Moçambique siga a mesma trajectória, permitindo que soluções locais de e-commerce, transportes, entretenimento ou educação digital cresçam com o suporte de integrações rápidas e seguras
começar a testar e criar aplicações. Qualquer programador, empreendedor ou organização pode registar-se, aceder aos princípios que permitem interligar diferentes API e começar a construir soluções, sem depender de processos burocráticos e sem perder tempo.
Integrações domésticas e internacionais
Evans Meyo esclarece que a Open API oferece dois grandes tipos de integra-
A ideia é fortalecer o comércio digital no continente
ção: doméstica e internacional. No contexto doméstico, os exemplos de criações vão desde sites de e-commerce locais a soluções de negócio, pagamento de serviços e transferências entre empresas ou entre clientes e organizações. Também é possível programar modelos de subscrição, o que abre espaço para actividades associadas a pagamentos regulares como serviços de streaming ou de telecomunicações. No plano internacional (cross-border), a Open API
facilita a ligação de utilizadores em Moçambique a serviços e plataformas globais. Isso pode significar, por exemplo, automatizar pagamentos de subscrições, receber rendimentos de conteúdos produzidos para o TikTok ou efectuar transacções comerciais entre países africanos. A ideia é fortalecer o comércio digital no continente, permitindo que um produtor moçambicano, por exemplo, consiga receber pagamentos de clientes a partir de
UMA SOLUÇÃO PARA A
INCLUSÃO POR VOZ
Um dos grupos vencedores, do Instituto Superior de Ciências e Tecnologia de Moçambique (Isctem), criou um sistema de auto-atendimento que guia os utilizadores através de voz, permitindo operar na língua local ou noutro idioma da preferência do utilizador.
A solução visa ultrapassar barreiras de literacia, lembrando que mais de 50% da população adulta apresenta um baixo nível de alfabetização e há muitas pessoas que não dominam a língua portuguesa. Este serviço também é vantajoso para quem esteja a conduzir, sem comprometer a atenção e a segurança. A funcionalidade foi demonstrada numa associação a serviços financeiros , como a abertura de uma conta, através de smartphones.
O processo de implementação foi dividido em três etapas: configuração e instalação da aplicação, teste com grupos de 5 a 10 mil utilizadores, análise de desempenho e experiência dos utilizadores. Com este mecanismo, espera-se que as aplicações tenham mais utilizadores, com maior inclusão financeira e instruções acessíveis para todos.
M-LODA, PARA RESOLVER A FALTA DE LIQUIDEZ
Um grupo da Universidade do Zambeze (UniZambeze) criou um serviço designado por M-Loda. Trata-se de uma solução digital desenhada para apoiar os agentes M-Pesa quando não tiverem dinheiro em numerário (notas ou moedas) ou saldo electrónico. Esta ferramenta cria uma rede de utilizadores parceiros que podem fornecer liquidez rápida, através de um sistema de emparelhamento. Quando um agente solicita recursos, os utilizadores próximos recebem a notificação e podem depois confirmar a transacção. A solução inclui uma aplicação móvel para simplificar o processo. Os objectivos incluem aumentar o volume de transacções, a satisfação do cliente e a receita dos agentes, ao mesmo tempo que se promove inclusão financeira contínua e confiável. Riscos como o branqueamento de capitais e segurança em transacções físicas são mitigados com limites de transacções. O M-Loda representa uma resposta prática à frustração dos clientes e à perda de rendimento dos agentes.
LOCALIZAR AGENTES E EDUCAR, COMO SE FOSSE UM JOGO
Foi também criado um serviço chamado “Procura já”, por estudantes da Universidade Eduardo Mondlane (UEM). Este projecto integra um mapa interactivo e códigos por telefone (USSD) que permitem localizar agentes M-Pesa mais próximos, mesmo sem acesso à Internet. Além disso, a solução funciona como se fosse um jogo e usa IA para educação financeira.
A funcionalidade permite, por exemplo, que a IA faça questionários lúdicos baseados nas transacções diárias do utilizador, promovendo uma aprendizagem prática sobre custos e gestão de finanças pessoais. A solução contempla regras de segurança, como horários de operação de agentes e desactivação opcional da localização.
O efeito esperado inclui maior inclusão financeira em áreas remotas, maior educação financeira e capacitação digital. Estima-se que 25% de pessoas analfabetas possam aderir ao serviço, adicionando um potencial de 1,35 milhão e utilizadores à rede M-Pesa.
qualquer ponto do continente, de forma instantânea.
Escalabilidade e inclusão financeira
Ainda de acordo com Meyo, actualmente, a plataforma conta já com a adesão de mais de 65 milhões de utilizadores em diferentes mercados, criando um ecossistema onde pequenas e médias empresas (PME) podem crescer sem barreiras geográficas. Também oferece um hub que liga prestadores de serviços de pagamento, empresas tecnológicas e agregadores de sistemas financeiros. Assim, um programador moçambicano pode, por exemplo, integrar a sua aplicação com dezenas de organizações, tanto no País como no estrangeiro, porque usam a mesma estrutura de dados, ao seguirem os princípios da Open API.
Sandbox e ambiente de testes
Um dos elementos interessantes neste tipo de ambientes é a sandbox (literalmente, “caixa de areia”, para experiências) ou ambiente de simulação. Permite que os programadores testem as suas aplicações em condições idênticas às do mercado real, replicando parâme-
Uma base comum de programação garante melhor interoperabilidade
tros específicos de cada país. Por exemplo, se Moçambique exige dez parâmetros para uma transacção e a Tanzânia exige 15, o sistema permite simular ambos os cenários antes da entrada em produção do software ou aplicação. Este modelo não só reduz custos de desenvolvimento, como encurta o tempo de colocação no mercado. Enquanto integrações tradicionais podem levar meses, a Open API, por exemplo, possibilita chegar a soluções em apenas duas semanas.
Documentação e suporte técnico Para garantir clareza e rapidez, a Open API disponibiliza documentação detalhada sobre cada tipo de transacção – seja C2B (Cliente para Empresa), B2B (Empresa para Empresa), B2C (Empresa para Cliente) ou débito directo. Outro ponto sublinhado por Evans Meyo é que muitas organizações querem integrar soluções digitais, mas não sabem onde encontrar programadores qualificados. Para resolver esta lacuna, a Open API disponibiliza um mercado interno, no qual as empresas podem identificar e contratar programadores. Isto abre novas oportunidades para jovens talentos moçambicanos, que pas-
Uma
API (sigla de Application Programming Interface) é um conjunto de regras para estruturar dados que permite a dois programas comunicarem entre si.
É uma ponte que possibilita que diferentes aplicações troquem informações e trabalhem em conjunto
O FUTURO DA MOEDA ELECTRÓNICA 2025-2035
De meios de pagamento a plataformas financeiras completas, com API abertas, IA e novos serviços
Panorama regulatório
Regras mais rígidas com monitorização de transacções por IA, integração de moedas digitais de bancos centrais e com finanças descentralizadas.
Inovações tecnológicas
Avanços em segurança baseada em blockchain, autenticação biométrica e assistentes financeiros em IA.
Expansão do mercado
Carteiras digitais integradas, finanças descentralizadas, pagamentos vinculados à identidade digital e gestão de despesas impulsionada por IA.
sam a ter acesso directo a clientes e podem rentabilizar as suas aplicações.
O especialista destaca que a aposta nas aplicações móveis, reforçada por ferramentas como a Open API, não é apenas uma questão tecnológica. Representa uma oportunidade de transformação social e económica. Defende que ao criar soluções acessíveis, escaláveis e rápidas, pode-se fomentar o empreendedorismo local, abrir espaço para mulheres e jovens programadores e acelerar a inovação no continente. Moçambique, com a sua crescente adesão a serviços digitais, posiciona-se como um terreno fértil para esta revolução.
Um exemplo real: o M-Pesa
Daraja do Quénia
Um dos exemplos mais emblemáticos da aplicação da iniciativa Open API em África é o M-Pesa Daraja, lançado no Quénia. Ao usar uma estrutura de dados predefinida (seguindo os princípios Open API), os programadores podem integrar o serviço Daraja nos seus websites, aplicações móveis e sistemas de negócios para receberem pagamentos de moeda electrónica. Graças a esta API, milhares de PME conseguiram digi-
Tendências da segurança
Adopção em larga escala de modelos de segurança zero-trust (confiança zero), detecção de fraude por IA e pagamentos móveis seguros via blockchain.
Tendências do Consumidor
Crescimento de super-apps, coaching financeiro via IA e transacções digitais internacionais fluídas e sem barreiras.
Concorrência
Ascensão das carteiras de finanças descentralizadas, startups de bancos digitais com IA e carteiras compatíveis com moedas digitais de bancos centrais.
MOEDA ELECTRÓNICA EM CRESCIMENTO ACELERADO
Prevê-se que o valor do mercado global cresça 11 vezes em apenas dez anos. Em
talizar os seus serviços de cobrança e pagamento. Por exemplo:
• Startups de mobilidade integram o Daraja para permitir que passageiros paguem viagens directamente pelo M-Pesa dentro da própria aplicação.
• Plataformas de e-commerce utilizam a API para automatizar a confirmação de pagamentos, reduzindo erros e aumentando a confiança dos clientes.
• Organizações Não-Governamentais (ONG) passaram a receber doações internacionais com liquidação quase imediata.
Hoje, o Daraja tem mais de 110 mil programadores registados e serve de modelo para a expansão de Open API noutros mercados africanos. A expectativa é que Moçambique siga a mesma trajectória, permitindo que soluções locais de e-commerce, transportes, entretenimento ou educação digital cresçam com o suporte de integrações rápidas e seguras de novas funcionalidades.
A tendência estende-se para funções básicas
Ao apresentar as novas soluções, Izdin Gafar, director-executivo dos serviços FONTE Future Market Insights
Diferentes operadores competem no mercado moçambicano
“Todos os dias, milhares de transacções falham porque os clientes não dispõem de saldo suficiente.” Um novo projecto tenta dar resposta a esta situação, ilustrando a agilidade da moeda electrónica para resolver imprevistos
financeiros da Vodacom M-Pesa, começa por lembrar que Moçambique enfrenta uma realidade dura: “Todos os dias, milhares de transacções falham porque os clientes não dispõem de saldo suficiente. Famílias ficam às escuras por não conseguirem comprar energia, estudantes vêem os seus estudos comprometidos por falta de megabytes e comerciantes perdem oportunidades de venda porque os pagamentos não se concretizam.”
Para ilustrar, Gafar contou o caso de Marta, uma cliente fictícia que foi ao mercado comprar alimentos e, no momento de pagar, não tinha saldo (para aceder à plataforma de moeda electrónica), nem moedas na carteira. “Situações como esta repetem-se milhares de vezes: faltam 2,5 meticais para uma compra, 50 meticais para carregar gás ou 70 meticais para liquidar a factura da água. Pequenas insuficiências comprometem consumos básicos e afectam famílias ou negócios”, exemplificou.
Foi neste tipo de contexto que nasceu a ideia do serviço Txova M-Pesa, lançado recentemente, em parceria com o ban-
co FNB e a empresa tecnológica Kuunda, responsável pela gestão de risco e qualificação dos clientes.
De acordo com Gafar, o Txova M-Pesa é o primeiro produto deste género, disponibilizado através de uma instituição de moeda electrónica. A funcionalidade é simples: no momento em que a transacção falha, o sistema apresenta ao cliente a opção de completar a operação com recurso ao crédito. O valor é pré-aprovado, imediato e pode ser de apenas um metical, o que garante inclusão até para necessidades de muito baixo valor.
O futuro também conta com os estudantes
Um concurso anualmente organizado pela Vodafone M-Pesa, em parceria com as instituições de inclusão financeira FSDMoç, FinTech.MZ e GSMA Finckathon, tem revelado um grande potencial de envolvimento de estudantes do ensino superior no desenvolvimento dos serviços financeiros móveis. Na sua terceira edição, este ano, três grupos de estudantes revelaram novas aplicações para serviços com resultados expressivos.
QUAIS
SÃO AS INSTITUIÇÕES DE MOEDA ELECTRÓNICA (IME)?
As instituições de moeda electrónica (IME) revolucionaram o sistema financeiro moçambicano nos últimos dez anos. Serviços como M-Pesa (Vodacom), mKesh (Tmcel) e e-Mola (Movitel) permitiram levar serviços financeiros a zonas sem cobertura bancária, reduzindo a distância geográfica e os custos de acesso.
Segundo dados recentes do Banco de Moçambique, o País contava com cerca de 23 milhões de contas de IME até Junho de 2025, contra pouco mais de 6,2 milhões de contas bancárias. Isto significa que a moeda electrónica supera largamente os bancos em penetração, cobrindo mais de 95% da população adulta com algum tipo de acesso financeiro digital.
Todas cumprem funções fundamentais de inclusão financeira: transacções digitais básicas como transferências entre utilizadores, pagamentos de serviços, recargas, envio e recepção de fundos e recurso a agentes de IME. Também beneficiam da interoperabilidade (graças à regulação e iniciativas do Banco de Moçambique) entre si e com alguns bancos, o que facilita a movimentação de valores. Contudo, não há anúncios públicos recentes feitos pelas plataformas mKesh ou e-Mola sobre inovações, como expansão de serviços de crédito, seguros integrados ou uso de tecnologias emergentes (por exemplo, biometria ou IA). As declarações públicas destas marcas tendem a focar-se na melhoria da cobertura, facilidade de utilização, custos ou tarifas.
“Queremos Garantir 95% de Cobertura de Rede Até 2030”
De operadora de telecomunicações a empresa tecnológica: esta é a jornada que a Vodacom está a percorrer em Moçambique. À frente da operação, Simon Karikari, CEO da Vodacom Moçambique, traça um horizonte ambicioso: 95% de cobertura de rede até 2030, soluções digitais adaptadas à realidade moçambicana e capacitação de jovens para liderar a transformação tecnológica do País
Texto Pedro Cativelos • Fotografia Mariano Silva & D.R.
AVodacom está a apostar fortemente na transformação digital do País, com investimentos de 25 milhões de dólares em centros de dados e novos serviços cloud. Em entrevista à E&M, o director-geral da empresa, Simon Karikari, defende que o Governo deve liderar a digitalização dos serviços públicos, tornando-a numa prioridade nacional para acelerar o desenvolvimento, mas revela que apesar de ser uma instituição privada, a Vodacom associa-se à causa e traça uma meta ambiciosa: assegurar 95% de cobertura de rede no País e reforçar a infra-estrutura partilhada entre operadoras. A aposta na capacitação tecnológica de jovens e startups é outro eixo estratégico, dentro da lógica de busca de “soluções criadas por moçambicanos e para moçambicanos."
A digitalização surge, hoje, como um elemento transversal a sectores estratégicos como o turismo, as infraestruturas, a logística, o petróleo e o gás. Sem uma base digital sólida, há o risco de muito deste potencial ficar comprometido. Qual o papel de empresas como a Vodacom nesta transformação digital?
É um papel absolutamente crucial. Vivemos num mundo em que a transformação
digital é determinante para o desenvolvimento dos países. É encorajador ver que o Governo elegeu este tema como prioridade estratégica. Mas é preciso ir além da intenção e acelerar este processo, pois abre portas para mais crescimento.
Um bom exemplo é o M-Pesa. Graças à digitalização, conseguimos dar acesso a serviços financeiros a mais de oito milhões de pessoas que, antes, estavam excluídas do sistema bancário formal. Isto mostra o impacto transformador da tecnologia quando colocada no centro dos serviços.
Mas para que esta mudança tenha efeitos profundos, é necessário um compromisso firme do Governo em incorporar a digitalização em todos os seus processos: digitalizar serviços públicos, permitir pagamentos electrónicos, usar soluções tecnológicas em todas as interacções com o cidadão. Só assim será possível garantir uma transformação real e abrangente. É preciso garantir que existe um sistema de identificação fiável, que os pagamentos do Estado são digitais, que as repartições públicas estão todas digitalizadas e interligadas na mesma plataforma. E o Governo tem de assumir a liderança. Muitos países africanos já fizeram esta transição e estão a crescer de forma acelerada. É preciso começar agora, para colher os benefícios daqui a três ou quatro anos.
"Investimos 25 milhões de dólares em centros de dados. . Independentemente de serem utilizados de imediato ou a médio prazo, avançámos. Temos uma boa parceria para lançar este serviço"
Como vê a criação do novo Ministério dedicado à área digital, liderado pelo ministro Américo Muchanga, que é reconhecido pela sua ligação às tecnologias?
É um passo na direcção certa. Ter um Ministério autónomo e focado nesta agenda é crucial. Contudo, a transformação digital é complexa e exige começar já a implementar projectos concretos, construídos sobre os alicerces existentes, em vez de reinventar tudo.
Um dos pontos-chave é a criação de um sistema nacional de identidade digital, que permita ao Estado oferecer serviços de forma segura e fiável. Outro é o estabelecimento de uma plataforma de pagamentos electrónicos do Governo, para que empresas e cidadãos possam realizar transacções digitais com o Executivo. Por fim, é essencial expandir a conectividade em todo o País.
Hoje, cerca de 70% do território dispõe de rede de transmissão adequada, mas ainda há 30% por cobrir. A meta de “Internet para todos até 2030” é ambiciosa e só será possível através de parcerias público-privadas robustas. Se o Governo se concentrar nestes três pilares (identidade digital, pagamentos electrónicos e conectividade universal) criará as bases para uma digitalização plena e sustentável.
Há dez anos, falaríamos apenas de Internet e telecomunicações. Hoje, uma empresa como a Vodacom é também uma firma tecnológica, com centros de dados e soluções digitais. Apesar das mudanças na estratégia de actuação, a sociedade ainda vê a Vodacom apenas
telecomunicações e das finanças. Bacharel em Contabilidade pela University of Botswana e membro da Association of Chartered Certified Accountants (ACCA), construiu a sua carreira entre África e o Reino Unido, onde passou por empresas como UKSH e Phones4u, exercendo funções executivas na área financeira.
Em 2014, ingressou no Grupo Millicom Tigo, inicialmente como director financeiro para a região africana, sendo posteriormente promovido a CFO da Tigo Tanzânia e, em 2017, a CEO da mesma operadora. Em 2025, assumiu a direcção-geral da Vodacom Moçambique.
SIMON KARIKARI
CEO da Vodacom Moçambique
como uma operadora de telecomunicações?
Sim, este é um dos desafios. Historicamente, as pessoas associam-nos aos serviços de chamadas e dados e é natural que esta seja uma imagem resistente ainda. Mas também é verdade que, como empresa, ainda estamos a começar a comunicar de forma mais eficaz toda a variedade de soluções tecnológicas que hoje criamos e oferecemos. Isto significa também ajustarmos a nossa narrativa para a nossa realidade actual. Esta é uma prioridade minha e da minha equipa mudar esta percepção e mostrar que a Vodacom é muito mais do que um provedor de voz e Internet: é o parceiro nacional de digitalização.
Além do M-Pesa, a Vodacom desenvolve serviços de nicho, que ainda não atingiram a mesma dimensão, pois são mais direccionados para empresas e organizações. Embora o M-Pesa tenha 8,5 milhões de clientes e seja reconhecido como um provedor de serviços financeiros, a percepção pública sobre os outros serviços que oferecemos ainda não se alterou.
Que iniciativas é que a Vodacom está a desenvolver para mostrar a transformação de operadora de telecomunicações para empresa de tecnologia em Moçambique?
A nossa estratégia para nos tornarmos uma empresa de tecnologia começou hásensivelmente dezanos. Estamos a investir para alcançar este objectivo e queremos desenvolver serviços que o público use no dia-a-dia. Consideramos importante por exemplo a parceria com o Governo em plataformas digitais como o e-Citizen.
Trata-se de uma plataforma digital que liga a identidade do cidadão aos seus pagamentos e a todos os serviços do Estado, e que deve ser acessível por aplicação móvel. Através do e-Citizen, os cidadãos podem solicitar diversos serviços governamentais num só local, como o registo civil, o pagamento da segurança social ou a emissão de licenças. Queremos criar respostas que podem ser alcançadas na ponta dos dedos dos moçambicanos para simplificar a forma que acedem aos serviços públicos e não so! Estamos a operacionalizar o conceito internet das coisas e replicar algo semelhante ao que existe na Estónia, nos Emiratos Árabes Unidos ou no Quénia, e desta forma mudar a forma como as pessoas vêem a empresa.
Qual é a visão da Vodacom para o futuro do M-Pesa em Moçambique
"Um dos maiores obstáculos para startups é o custo de servidores e a impossibilidade de armazenar determinados tipos de dados fora do País. Com o nosso centro de dados e os serviços de cloud que estamos a lançar, vamos criar capacidade local"
e o seu papel na inclusão financeira e na digitalização de serviços?
O M-Pesa é uma plataforma digital que integra serviços para apoiar pequenos negócios, seguradoras e prestadores de crédito. Queremos complementar o que existe em termos de acesso seguro ao dinheiro e digitalizar os serviços associados, tornando-os acessíveis a um maior número de pessoas. Por exemplo, um florista pode usar a nossa base de clientes para expandir o seu negócio, e no sector de seguros trabalhamos com bancos para oferecer micro-seguros digitais.
Apesar de Moçambique não ter uma infra-estrutura de suporte estável como a dos países ocidentais, o nosso trabalho é entusiasmante, porque nos desafia diariamente a encontrar soluções para
Os centros de dados são um recurso vital, mas tudo depende da sua localização
resolver problemas operacionais, desde cortes de fibra até a falhas de energia. O nosso objectivo é garantir que os clientes estão sempre satisfeitos. Temos a capacidade e desejamos trazer para Moçambique soluções que já foram testadas noutros mercados, alicerçando nas lições de sucesso dos outros para planearmos o nosso futuro como país.
Já existe colaboração activa com o Governo para este projecto ou é apenas uma ideia?
Já estamos em conversações com o Governo. Partilhámos um blueprint (plano detalhado) sobre como o sistema poderia ser implementado e, naturalmente, terá de seguir o processo formal de contratação do Executivo. Mas o plano está desenhado.
A Vodacom tem experiência em modelos e-Citizen noutros países?
Sim. Já implementámos sistemas semelhantes no Quénia e no Egipto, que são mercados de grande dimensão para a Vodacom. Queremos trazer esta experiência para Moçambique e, em coordenação com o Governo, ir digitalizando os serviços gradualmente, um por um, utilizando os wireframes que já desenvolvemos noutros países para acelerar o processo.
O investimento em Afungi e em toda a região Norte tem um carácter estratégico para viabilizar os grandes projectos de gás no País?
Vemos o sector de petróleo e gás como estratégico para o País. Há cerca de oito anos começámos a investir em fibra óp-
DE OPERADORA A EMPRESA TECNOLÓGICA
Há dez anos, a Vodacom falava apenas de Internet e telecomunicações. Hoje, assume-se como uma firma tecnológica –um parceiro nacional de digitalização.Aqui estão algumas marcas desta transformação:
M-PESA
Mais do que uma carteira móvel, tornou-se uma solução digital que revolucionou o acesso a serviços financeiros, incluindo milhões de pessoas antes excluídas do sistema bancário.
MYMUZE
Plataforma que permite aos artistas locais partilhar música digitalmente, adaptando-se ao fim da era dos CD e criando novas oportunidades para a indústria criativa.
EASTERN SCHOOLS
Projecto de educação digital que oferece conteúdos online em ambiente seguro, permitindo que estudantes moçambicanos acedam a materiais de qualidade.
tica na região e instalámos uma estação de ancoragem de cabos submarinos em Nacala, província de Nampula, garantindo redundância e conectividade directa com a Europa e as Américas. Mesmo durante a insurgência, em que perdemos cerca de 53 torres, fomos os primeiros a repor a rede. Hoje temos fibra até Pundanhar, perto da fronteira com a Tanzânia, e conectividade transfronteiriça que garante resiliência adicional. Também somos responsáveis pela rede privada das plataformas de LNG flutuante.
Tendo um ano e meio de mandato restante neste cargo, quais são as suas prioridades?
A primeira prioridade é a cobertura de rede. Quero garantir a construção da base necessária para atingir 95% de co-
"Queremos capacitar mais engenheiros e profissionais de tecnologias de informação moçambicanos, para que as soluções tecnológicas sejam criadas no País"
bertura de rede ao País. Entretanto, reconheço que a infra-estrutura existente no país pode ser optimizada Em Maputo, por exemplo, há locais com três torres – uma de cada operadora - na mesma zona, o que para mim poderia ser evitado através da partilha de torres entre as operadoras. Assim, haveria investimento para instalar torres em áreas onde ainda não existem.
A partilha de infra-estruturas (torres ou fibra) precisa de ser expandida. Criámos uma empresa de torres para construir novas estruturas e convidar os concorrentes a partilhá-las. Isto reduz custos e permite levar o serviço a mais pessoas a preços mais acessíveis. Outra prioridade é desenvolver serviços de cloud. Um dos maiores obstáculos para startups é o custo de servidores e a impossibilidade de armazenar determinados tipos de dados fora do País devido às leis de protecção de dados. Com o nosso centro de dados e os serviços de cloud que estamos a lançar, vamos criar capacidade local para estas empresas crescerem.
Por fim, é fundamental investir na capacitação digital. Queremos formar mais
engenheiros e técnicos profissionais de tecnologias de informação moçambicanos, para que as soluções tecnológicas sejam criadas no País e para o País. Isto está associado ao nosso programa TechStart, que visa formar um milhão de pessoas em toda a África, através de uma plataforma online com cursos gratuitos.
Moçambique tem jovens que se destacam internacionalmente em programação e tecnologia. Vocês apoiam este talento?
Sim. Temos iniciativas como o Hackfest e o programa Puxap, que apoiam startups tecnológicas e ajudam a integrá-las nas nossas plataformas. No entanto, precisamos de escalar estas iniciativas. Notamos que muitas pessoas que formamos acabam por ir trabalhar para outras empresas mostrando que estes talentos são necessários Por isso, temos de formar um pool de talentos para este pais e a Vodacom esta aberta para o efeito.
De há alguns anos a esta parte, Moçambique enfrenta uma sucessão de desafios políticos,
sociais e até económicos. A Vodacom ainda vê potencial de crescimento perante os diferentes tipos de adversidades?
A economia de Moçambique cresceu menos do que o esperado. Mesmo assim, acredito no seu potencial único, que resulta de vários factores. Um deles é a população jovem (65% dos moçambicanos têm menos de 25 anos). Para o sector das telecomunicações, isto representa uma geração de futuros consumidores, essencial para o desenvolvimento económico.
Outro factor importante são as vastas reservas de gás natural. Moçambique é um dos países com as maiores reservas do mundo e o Governo está comprometido com a sua exploração sustentável.
A extensa linha costeira, uma das maiores da África Austral, também representa um potencial para os serviços portuários, para a logística e para o turismo. O sector agrícola, com terras férteis, pode, igualmente, desempenhar um papel na segurança alimentar regional.
Apesar dos recentes desafios, estou confiante num futuro promissor. Mas é essencial reforçar a governação, garantir a responsabilização, atrair investimento e melhorar o ambiente de negócios. É também crucial investir na educação, para que a juventude se torne um recurso estratégico. Nos próximos cinco anos, prevejo um crescimento transformador, impulsionado pelo gás, pelo petróleo e pela expansão do sector digital, com as telecomunicações a desempenharem um papel central.
O CEO da Vodacom Moçambique destaca a aposta na formação do talento local
Iñaki Aldasoro, Jon Frost & Vatsala Shreeti • Bank for International Settlements para
o IMF Blog
Ainovação digital começa, muitas vezes, com uma ideia radical. Pode ser uma nova forma de armazenar e processar informação, um novo modelo de negócio ou um novo serviço. Mas a ideia é apenas o início: perceber os benefícios da inovação exige trabalho árduo, investimento q. b. e adopção por parte dos utilizadores.
A inovação disruptiva tem sido a palavra de ordem no sector financeiro na última década. Surgiram novas empresas de tecnologia financeira (fintechs), as grandes plataformas digitais (big techs) estão a oferecer serviços de pagamento e crédito, os criptoactivos e as stablecoins estão a crescer em valor e muitas instituições estão a adoptar a inteligência artificial. Cada uma delas está a desafiar os intermediários financeiros tradicionais, como os bancos, as companhias de seguros e os gestores de activos, e os serviços que prestam (Ben Naceur et al., 2023).
As inovações digitais podem complementar e substituir os serviços no sistema financeiro tradicional. Muitos serviços parecem oferecer uma alternativa sólida aos intermediários e serviços existentes a curto prazo. Mas, a médio prazo, complementam frequentemente os serviços existentes, conduzindo a uma concorrência ainda maior e a um sistema financeiro mais diversificado. Ainda assim, as inovações nem sempre conduzem aos melhores resultados por si só: as coisas podem correr mal, e correm frequentemente. Aproveitar os benefícios da inovação digital exige, muitas vezes, políticas públicas com visão de futuro
Disrupção nos pagamentos
Os pagamentos são a porta de entrada para os serviços financeiros. Para os particulares, uma conta à ordem é, normalmente, um pré-requisito para aceder ao crédito, contratar um seguro ou começar a poupar e investir. Para os caloiros
Inovação Financeira: o Retrato de Uma Década
do sistema financeiro, como as fintechs e as big techs, é comum começar por lidar com pagamentos e depois ramificar para outras áreas das finanças.
Na última década, a forma como pagamos mudou drasticamente, com os chamados sistemas de pagamento rápido ou instantâneo a arrancarem em muitos países, especialmente nos mercados emergentes (ver gráfico). Permitem transferências em tempo real (ou quase em tempo real) entre utilizadores finais (Frost et al., 2024). Pagamentos rápidos, 24 horas por dia, 7 dias por semana, são
“Novas ideias radicais são necessárias, mas podem não ser suficientes. São também necessárias infra-estruturas, regulamentação sólida e experimentação”
fornecidos por fintechs, big techs e bancos existentes. Utilizam aplicações para smartphones e códigos de resposta rápida (QR), operando até em telefones de tecnologia mais simples. De um modo geral, permitem que as empresas disruptivas prestem serviços que concorrem directamente com as tradicionais.
Os casos de sucesso mais conhecidos provêm de infra-estruturas públicas, como sistemas operados ou supervisionados por bancos centrais. No Brasil, por exemplo, o banco central lançou o seu sistema de pagamento rápido Pix em Novembro de 2020. Actualmente,
mais de 90% dos adultos brasileiros utilizam o serviço para pagamentos diários no retalho, como alimentação ou viagens, e até para pagamentos recorrentes, como contas de serviços públicos. Na Índia, a Interface Unificada de Pagamentos (UPI) — operada pela Corporação Nacional de Pagamentos da Índia e regulada pelo banco central — promove serviços de bancos tradicionais, fintechs e big techs numa única plataforma. Sucessos semelhantes incluem o PromptPay da Tailândia, que é gerido de forma privada, mas com um papel fundamental para o banco central, e o SINPE Móvil da Costa Rica, operado também pelo respectivo banco central.
Estas infra-estruturas públicas bem-sucedidas contrastam com a situação em muitas economias, onde existem múltiplos sistemas de pagamento rápido do sector privado, inacessíveis aos utilizadores de outras instituições financeiras. Por exemplo, nos EUA, alguém que utiliza apenas o Venmo não pode pagar a quem utiliza apenas o Zelle. Estes “jardins amuralhados”, como se designam na gíria, têm surgido também na China, com carteiras concorrentes como a Alipay e a WeChat Pay, e no Peru, onde as carteiras Yape e Plin competem pelos utilizadores (ver Aurazo e Gasmi 2024). No caso da China e do Peru, a intervenção política foi necessária para tornar os sistemas de pagamento interoperáveis. Muitas vezes, o que começa como um substituto (fintechs e grandes empresas tecnológicas) pode complementar os serviços existentes que operam no mesmo mercado. Os utilizadores obtêm pagamentos mais baratos e mais rápidos, o que também pode apoiar a resiliência financeira e promover um maior crescimento económico. Os disruptores — e as políticas públicas — ajudam a melhorar o sistema, a servir novos clientes, a oferecer novos serviços no mesmo mercado e a pressionar as empresas tradicionais a melhorar as suas ofertas.
Uma metamorfose do crédito digital
Além dos pagamentos, surge a necessidade de contrair empréstimos. As empresas precisam de crédito para fazer investimentos produtivos, e as pessoas precisam dele para comprar uma casa, um carro ou pagar a educação. Nos primeiros tempos da revolução das fintech, parecia que as novas plataformas de empréstimo poderiam acabar por substituir muitas funções dos bancos. O crowdlending e outras novas plataformas de crédito cresceram rapidamente, utilizando frequentemente dados alternativos para a pontuação de crédito e ligando os mutuários e os credores em processos digitais simplificados. Isto foi logo ofuscado por novos empréstimos de grandes fornecedores de tecnologia, como os empréstimos comerciais da Amazon nos EUA e da Alibaba na China. O volume de crédito para grandes empresas tecnológicas cresceu rapidamente (Cornelli et al., 2023).
Estas novas plataformas reduziram as lacunas nos mercados de crédito e aumentaram a inclusão financeira. Na Argentina, por exemplo, o Mercado Pago interveio para apoiar os pequenos comerciantes rejeitados pelos bancos. Na China, o crédito das grandes empresas tecnológicas tem sido menos sensível aos preços dos imóveis do que o crédito bancário, reduzindo potencialmente a im-
portância das garantias. Nos EUA, as fintechs que financiam pequenas empresas têm como alvo áreas com elevado desemprego e falências, onde os bancos são menos propensos a emprestar. No geral, o impacto das fintechs e das grandes empresas tecnológicas varia amplamente de país para país.
Mas os bancos continuam em alta, competindo agora com um novo conjunto de intermediários. Mudaram os seus modelos de negócio para se parecerem mais com plataformas e utilizarem dados alternativos. Por outro lado, muitos concorrentes, como a Revolut do Reino Unido e o Nubank do Brasil, obtiveram licenças e tornaram-se bancos.
Criptomoedas e DeFi
Enquanto as grandes empresas tecnológicas desafiam as instituições financeiras tradicionais no seu próprio jogo, os criptoactivos e as finanças descentralizadas (DeFi) prometem reinventar as finanças, com base na confiança nos códigos e não nas instituições. A adopção global de criptomoedas está novamente em ascensão, apesar do seu longo historial de volatilidade, principalmente para fins de investimento especulativo, mas também graças ao apoio político a estes activos, nalguns países. As stablecoins, que ligam o seu valor às moedas fiduciárias que as criptomoedas supostamente desafiavam, sur-
giram como uma alternativa. As maiores stablecoins são emitidas por entidades centralizadas que detêm activos como letras do Tesouro dos EUA e depósitos bancários para as suportar. Mas mesmo com estes novos intermediários e com a crescente presença de stablecoins, o sector cripto continua repleto de riscos, incluindo fraudes generalizadas, burlas, branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.
As criptomoedas e as stablecoins oferecem um vislumbre de funcionalidades que podem ter uma aplicabilidade mais ampla. Por exemplo, a programabilidade e a tokenização poderiam melhorar as funções existentes e permitir novas funções dentro do sistema monetário, com base nos bancos centrais, no núcleo e na interacção dos bancos comerciais com os clientes. Nos pagamentos internacionais, por exemplo, a tokenização poderia voltar a ligar o sistema bancário correspondente, permitindo mensagens, reconciliação e transferência de activos numa única acção. Novas funções, como a liquidação simultânea (“atómica”) e a gestão melhorada das garantias, poderão melhorar drasticamente o funcionamento dos mercados de capitais. Estas funções poderão lançar as bases para um futuro sistema financeiro tokenizado.
Políticas públicas para orientar a inovação
A ascensão dos pagamentos digitais
O volume de transacções de pagamentos rápidos tem crescido rapidamente, especialmente nos mercados emergentes.
(número de transacções per capita)
Estas inovações radicais mudaram significativamente o sistema financeiro na última década. As políticas públicas com visão de futuro permitiram alguns dos maiores e mais importantes avanços.
A inovação pode ser inebriante, mas há que estar atento: estão a surgir riscos importantes a partir da inovação, que podem corroer a estabilidade financeira. Por exemplo, os choques no sector das criptomoedas podem alastrar para o sistema financeiro tradicional, representando, potencialmente, até riscos para o mercado de obrigações do Tesouro dos EUA (ver Ahmed e Aldasoro 2025).
Para aproveitar o potencial da inovação e mitigar os riscos, novas ideias radicais são necessárias, mas podem não ser suficientes. São também necessárias infra-estruturas públicas, uma regulamentação sólida e experimentação prática nos sectores público e privado para gerar novos conhecimentos e informar o investimento privado e as políticas públicas. Por último, os sectores público e privado precisam de se coordenar para direccionar as tecnologias digitais para aplicações que beneficiem verdadeiramente as pessoas e as empresas e estabeleçam uma base sólida para a prosperidade.
FONTE Banco de Pagamentos Internacionais, estatísticas do Redbook do CPMI; Frost e outros (2024); Fundo Monetário Internacional; Corporação Nacional de Pagamentos da Índia; Banco Mundial; e bancos centrais.
Tailândia
Brasil
O Futuro dos Pagamentos Já Começou. O que Esperar?
Seja através de moeda electrónica (mobile money) ou carteiras móveis (digital wallets), as ferramentas digitais das finanças pessoais deixaram de ser uma tendência emergente para se tornarem num dos principais motores da economia digital. Eis o retrato global.
Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R.
Segundo o relatório da GSMA (State of the Industry Report on Mobile Money 2025, relativo a dados do último ano), existem hoje mais de 2,1 mil milhões de contas registadas em mobile money no mundo, das quais aproximadamente 1,1 mil milhões em África — ou seja cerca de 53% do total global. Em termos de valor das transacções, o mercado mundial ultrapassou os US$ 1,68 biliões em 2024, com África a responder por cerca de US$ 1,105 biliões, o que equivale a aproximadamente 65% do valor global. Em volume de transacções, registaram-se cerca de 108 biliões de operações, em 2024, no mundo inteiro, das quais 81,8 biliões em África — ou seja, aproximadamente 74% das transacções globais.
A nível global, estudos do sector de carteiras digitais (digital wallets, ou seja, vai além do mobile money tradicional) estimam que o número de utilizadores poderá atingir 4,8 mil milhões até 2025, ou seja, mais de metade da população mundial. Em termos regionais, a região da Ásia-Pacífico lidera com cerca de 20% do total de contas registadas, seguida de África e América Latina — regiões com taxas de crescimento mais aceleradas. A Europa e a América do Norte apresentam níveis de penetração elevados (50% a 65%), mas crescimento mais moderado.
Mobile money permite enviar, receber e guardar dinheiro através do telemóvel, mesmo sem conta bancária, usando redes de agentes físicos — é a realidade mais conhecida e comum em Moçambique, com
os serviços M-Pesa, e-Mola e mKesh, associados às operadoras móveis. Já as carteiras digitais (digital wallets) estão ligadas a bancos ou cartões e servem para pagamentos online ou por aproximação. O mobile money é mais comum em países com baixa bancarização, como os africanos. As carteiras digitais predominam em economias desenvolvidas e no comércio electrónico.
De uma forma ou de outra, o mapa mundial mostra contrastes claros: enquanto a China já consolidou um duopólio (há apenas duas empresas que dominam a oferta) através da Alipay e WeChat Pay, com mais de 90% dos pagamentos móveis, a Índia criou um modelo estatal interoperável, o UPI, que em poucos anos passou a movimentar mais de 15% do PIB nacional.
Os diferentes modelos de negócio
As carteiras móveis, mais do que meros instrumentos de pagamento, apresentam-se como portas de entrada em ecossistemas digitais que cruzam finanças, consumo e outros serviços. Os bancos, por exemplo, utilizam-nas não apenas para facilitar transacções, mas sobretudo como ferramentas de fidelização e integração de produtos como crédito, seguros e investimento. De acordo com o World Payments Report 2023, da Capgemini (empresa multinacional francesa de consultoria, tecnologia e transformação de negócios), mais de 70% das instituições bancárias consideram este canal uma prioridade estratégica para inovação. Nas regiões com baixa penetração bancária, o protagonismo pertence às
Em África, mais de 400 milhões de pessoas utilizam serviços como o M-pesa, movimentando 1,1 bilião de dólares por ano, segundo a Global System for Mobile
operadoras de telecomunicações e ao mobile money. O caso mais emblemático é o do M-Pesa, no Quénia, que revolucionou o conceito de conta financeira ao transformá-la num simples número de telemóvel. Esta lógica expandiu-se a todo o continente africano e a quase todas as operadoras móveis.
Já as Big Techs – como Apple, Google, Amazon, Alipay e WeChat Pay – seguem uma lógica diferente: o foco não está apenas em taxas de transacção, mas sim nas carteiras digitais, com a criação de super-apps multifuncionais capazes de agregar serviços de e-commerce, transportes, saúde ou seguros. A ambição central é capturar dados de consumo e, a partir deles, estruturar novos modelos de negócio.
As fintechs, por sua vez, exploram nichos com grande agilidade. Empresas como PayPal, Nubank, Mercado Pago ou Revolut oferecem soluções que vão desde o microcrédito até às criptomoedas e investimentos digitais. Só em 2022, estas empresas atraíram mais de 22 mil milhões de dólares em capital de risco, de acordo com o Global Payments Report 2023 da McKinsey, confirmando o seu papel como laboratórios de inovação dentro do sector.
Economia e impacto
As carteiras móveis e o mobile money têm tido efeitos profundos na economia real, transformando a forma como indivíduos, Governos e empresas lidam com dinheiro. No campo da inclusão financeira, o efeito é notório. De acordo com o Global Findex 2021 do Banco Mundial, centenas de milhões de pessoas tiveram no telemóvel a sua primeira porta de acesso ao sistema financeiro formal. Mulheres e populações rurais estão entre as maiores beneficiadas, quebrando barreiras históricas de exclusão. Outro vector de impacto está nas remessas. Nos últimos dez anos, o custo médio das transferências internacionais caiu de 9% para 6%, embora ainda esteja acima da meta de 3% estabelecida pelo G20.
5 TENDÊNCIAS FUTURAS DAS CARTEIRAS MÓVEIS
O horizonte das carteiras móveis aponta para uma convergência entre finanças, identidade e tecnologia
ÁFRICA, LÍDER GLOBAL DO MOBILE MONEY
O continente concentra mais de metade das contas e movimenta dois terços do valor global
Número total de contas móveis
Em milhares de milhões de pessoas
Volume de mercado das transacções móveis
Moedas digitais de bancos centrais (CBDC)
Quase 90 países estudam ou testam projectos de CBDC (moedas digitais de bancos centrais), que poderão ser integradas em carteiras móveis.
Criptomoedas e stablecoins
Ainda que enfrentem riscos regulatórios, começam a ser incorporadas como opções em algumas carteiras globais.
Identidade digital
Sistemas de e-KYC (processo digitalizado de verificação da identidade de um cliente) e credenciais verificáveis serão fundamentais para segurança e expansão global.
Super-apps
A integração de transporte, alimentação, pagamentos, crédito e entretenimento numa única aplicação é tendência consolidada na Ásia e com sinais de expansão em África e na América Latina.
Sustentabilidade
Reduzir a circulação de numerário diminui custos ambientais, mas o consumo energético de data centers e criptografia é um desafio em crescimento.
FONTE Bank for International Settlements, McKinsey & Company, BCE, Deloitte e PwC
FONTE Relatório sobre o Estado da Indústria do Dinheiro Móvel 2024
Estados Unidos
CINCO MERCADOS, CINCO REALIDADES
De África às Américas, passando pela Ásia, Europa e Estados Unidos, cada região revela dinâmicas próprias no uso e impacto das carteiras móveis
O mercado é fragmentado, com Cash App, PayPal, Venmo, Apple Pay e Google Pay, mas a entrada do FedNow pode consolidar maior interoperabilidade.
Europa Ásia
Bizum (Espanha) e iDEAL (Holanda) são exemplos de soluções locais robustas, mas a região ainda depende de carteiras de big techs para escala internacional.
A China domina em escala e a Índia em inovação regulatória. O Sudeste asiático, com GCash e GrabPay, cresce como pólo de super-apps.
América Latina
O Brasil, com o Pix, tornou-se referência global. O Mercado Pago lidera em pagamentos digitais regionais.
Neste contexto, os serviços móveis afirmam-se como canais cada vez mais utilizados para o envio de pequenas quantias, sobretudo em África, onde desempenham um papel vital no sustento das famílias. Também os Governos têm encontrado nos formatos digitais uma ferramenta eficaz para os seus programas de transferências sociais, conhecidos como G2P (government-to-person). A digitalização destes pagamentos não só aumenta a eficiência da distribuição como reduz significativamente o risco de fraudes. Em países como Gana e Nigéria, a expansão dos pagamentos digitais já começa a representar uma contribuição relevante para a arrecadação fiscal.
Do lado da economia dos comerciantes, os benefícios são igualmente tangíveis. Ao reduzir a dependência do numerário, os pequenos negócios diminuem custos operacionais, evitam perdas associadas a roubos e melhoram os processos de reconciliação contabilística. Em muitos mercados emergentes, esta eficiência adicional tem-se traduzido numa maior formalização da actividade produtiva e num aumento da competitividade no sector do comércio.
África
Epicentro do mobile money, com mais de 80 mil milhões de transacções anuais e contribuições directas superiores a 5% do PIB em alguns países.
Os Governos têm encontrado nos formatos digitais uma ferramenta eficaz para os seus programas de transferências sociais. A digitalização destes pagamentos não só aumenta a eficiência da distribuição como reduz significativamente o risco de fraudes
Regulação e políticas públicas
O Banco Mundial destaca que licenças de e-money tornaram-se numa norma em vários países africanos e asiáticos, permitindo que os operadoras de telecomunicações trabalhem sob supervisão. Já a União Europeia avança com a PSD2 e a futura PSD3 (segunda e terceira directivas de Serviços de Pagamento, respectivamente), que obrigam bancos a abrir API (mecanismos que permitem que dois componentes de software se comuniquem usando um conjunto de definições e protocolos) e estimulam a competição no open banking.
No caso da Índia, o UPI regulado pelo Banco Central tornou-se referência global: interoperabilidade, baixo custo para comerciantes e inovação rápida. Já no Brasil, o Pix mostra como sistemas de pagamentos instantâneos podem ser integrados com carteiras digitais, acelerando a formalização da economia. A governança de dados também surge como preocupação: enquanto a China restringe o uso de dados financeiros pelas big techs, a Europa aposta na privacidade (General Data Protection Regulation GDPR) e em consentimento explícito do consumidor.
E&M | Novembro 2025
FONTE Banco Central do Brasil, Bank for International Settlements, Federal Reserve, FMI e BCE
BCX, Duas Décadas a Integrar o Futuro Digital de Moçambique
Subsidiária do grupo sul-africano Telkom, a empresa especializou-se em soluções tecnológicas e serviços de integração de sistemas, posicionando-se hoje como uma das referências nacionais em consultoria tecnológica, cibersegurança, gestão de TI e transformação digital.
Texto e Fotografia • M4D
Numa conversa com a Economia & Mercado, o CEO da BCX Moçambique, Emílio Jorge, fala sobre o seu percurso numa tecnológica moçambicana que lidera no seu segmento de mercado e onde está desde o primeiro dia, olhando para os desafios do mercado, o papel da regulação e as novas oportunidades que se abrem com a criação do Ministério da Comunicação e Transformação Digital. E deixa claro que o futuro da digitalização em Moçambique “só pode passar” por soluções acessíveis e à medida das necessidades, e uma crescente inclusão das MPME no ecossistema tecnológico nacional.
Que empresa é hoje a BCX Moçambique e como tem evoluído desde a sua criação em 2005?
A BCX é uma empresa especializada em tecnologias de informação e comunicação. Estabelecemos o nosso escritório em Maputo há 20 anos, inicialmente com apenas sete colaboradores. Começámos com um cliente-âncora, a Mozal, à qual continuamos a prestar serviços até hoje. É um motivo de grande orgulho, pois em duas décadas nunca houve um mês em que não tivéssemos actividade com a Mozal.
Naquela altura, o nosso foco era a terceirização de serviços de TIC e alguma consultoria. Hoje, somos uma equipa de cerca de 220 colaboradores e a empresa transformou-se profundamente. Sobrevivemos a momentos difíceis, como a crise das dívidas ocultas e a pandemia, e saímos mais fortes, com um portfólio di-
versificado e uma estratégia clara de expansão e inovação.
Como definem hoje o posicionamento da BCX no mercado?
Consideramo-nos um integrador de sistemas (systems integrator). Somos agnósticos em relação à tecnologia, o que nos dá independência para escolher as melhores soluções para cada cliente. O nosso trabalho é compreender as necessidades das empresas e integrar hardware e software de forma coerente, permitindo que o valor esperado seja efectivamente alcançado. Actualmente, estamos também a posicionar-nos como fornecedores de plataformas tecnológicas (platform providers), disponibilizando serviços digitais em regime de subscrição — soluções de core banking, bilhética electrónica, gestão municipal e cloud computing, entre outras.
Referiu a transformação digital e algumas soluções inovadoras. Que projectos destacaria neste percurso?
Um dos primeiros marcos foi, em 2018, a implementação de uma solução digital para a gestão de receitas municipais, ainda hoje em funcionamento e fornecida como serviço. Logo depois, lançámos o sistema de bilhética electrónica para os Caminhos-de-Ferro de Moçambique, uma das primeiras plataformas do género no País, que já vai na sua terceira versão. Mais recentemente, desenvolvemos uma plataforma de core banking adaptada à realidade moçambicana e vocacionada para instituições microfinanceiras – microcréditos e microbancos. Esta so-
Emílio Jorge é Administrador Delegado da BCX Moçambique desde 2012, liderando uma das principais empresas de Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) do País. Com uma visão estratégica orientada para a inovação, tem sido figura central na transformação digital de sectores como minas e energia, finanças e administração pública.
Sob a sua direcção, a BCX – presente em Moçambique desde 2005, com escritórios em Maputo e Tete – consolidou-se como parceiro tecnológico de referência, empregando especialistas locais e oferecendo soluções avançadas em nuvem, cibersegurança, IoT e consultoria digital, contribuindo activamente para o desenvolvimento tecnológico do País.
lução permite reduzir custos, eliminar a necessidade de grandes investimentos em soluções tecnológicas e reduzir custos operacionais, uma vez que o cliente paga apenas pelo consumo do serviço.
A cloud é uma das vossas apostas estratégicas. Que papel desempenha no vosso crescimento?
A nossa cloud local, a BCX Outloud, é uma infra-estrutura de nível hyperscaler, totalmente instalada em Moçambique. Acreditamos que o futuro passa por aqui. Contudo, o sector público ainda é reticente à adopção de serviços cloud, sobretudo por falta de regulamentação clara. Esperamos que o novo regulamento de processamento na nuvem e o trabalho do regulador das TIC venham clarificar as regras. Uma vez definido o enquadramento legal, o potencial de crescimento será enorme, tanto para o sector financeiro como para outros segmentos empresariais.
Como olha para o surgimento do novo Ministério da Comunicação e Transformação Digital?
É uma excelente notícia. Durante anos, o maior entrave à evolução do sector foi
“A nossa cloud local, a BCX ALP CLOUD, é uma infra-estrutura de nível hyperscaler, totalmente instalada em Moçambique”
a ausência da figura do regulador para o sector das TIC e/ou a autoridade limitante concedida. A criação deste Ministério demonstra vontade política de colocar as tecnologias de informação e comunicação no centro da agenda nacional e de as transformar numa alavanca para o desenvolvimento. Esperamos que isso traga também maior disciplina e coerência na forma como o mercado opera, permitindo um ambiente mais favorável à inovação e à adopção de soluções digitais.
Que desafios persistem na digitalização das empresas moçambicanas?
O principal desafio é a capacidade financeira. Muitas empresas continuam a trabalhar em spreadsheets e sistemas
manuais, por falta de meios para investir em plataformas tecnológicas. O nosso objectivo é democratizar o acesso à tecnologia, oferecendo “soluções como serviço” — desde core banking até à gestão municipal — para que as empresas possam ser mais eficientes e competitivas.
Outro desafio importante é a segurança cibernética. O ecossistema digital é tão forte quanto o seu elemento mais fraco. Como 80% do tecido empresarial moçambicano é composto por pequenas e médias empresas, precisamos de soluções de cibersegurança acessíveis, que permitam às PME equipar-se com todos mecanismos de segurança e provar a sua robustês aos parceiros contratantes ou integrantes do ecosistema.
Que oportunidades identifica para o futuro próximo da BCX?
As nossas prioridades passam por consolidar a cloud local, expandir as soluções de core banking para outros mercados da região — como Zâmbia e Zimbabué — e reforçar a oferta de serviços de segurança e plataformas digitais em modelo de subscrição.
Estamos igualmente a investir em ciência de dados e em soluções de inteligência artificial, que serão inevitáveis.
Q&A: O QUE É UMA CLOUD HYPERSCALER?
Uma cloud hyperscaler é uma infraestrutura tecnológica capaz de oferecer serviços de computação em nuvem em larga escala, com elevada flexibilidade e capacidade de expansão quase ilimitada. Estes sistemas operam através de redes globais de data centers altamente automatizados, que permitem ajustar recursos de forma dinâmica, acompanhando o crescimento e as necessidades dos utilizadores em tempo real.
Os principais exemplos mundiais de cloud hyperscalers são a Amazon Web Services (AWS), Microsoft Azure, Google Cloud Platform (GCP), IBM Cloud e Alibaba Cloud — empresas que suportam desde startups até grandes corporações globais, todos parceiros da BCX Moçambique.
Esperamos que, a médio prazo, e olhando ao sector financeiro, haja uma grande evolução. E aqui refiro-me ao facto de a abertura de uma conta bancária, por exemplo, possa ser feita remotamente, com reconhecimento facial e validação biométrica.
E muito mais. A digitalização, a IA e outras ferramentas digitais trarão enormes benefícios, mas exigem também educação e regulamentação adequadas. A esse nível, acredito que terá de haver também uma reconversão profissional e uma aposta no ensino digital, preparando os jovens para um futuro em que a tecnologia e a adaptação constante serão essenciais.
E quanto ao impacto social da tecnologia no emprego?
Há quem tema que a IA vá eliminar empregos, mas eu vejo-a como uma oportunidade de transformação de carreiras. O desafio está em criar condições para que as pessoas possam reinventar-se, adquirir novas competências e ocupar funções que a própria tecnologia vai gerar. É fundamental começar essa mudança logo na escola, formando jovens versáteis, preparados para um mercado em permanente evolução.
Leasing, Crédito ao Consumo e Depósito a Prazo: Três Formas de Dar Vida aos Próximos
Capítulos da Sua História
Todos trazemos dentro de nós uma história por escrever. Muitas vezes, ela nasce de um simples desejo – o automóvel que simboliza liberdade e independência, o negócio que há tanto tempo mora no papel ou aquele passo decisivo que nos aproxima de um futuro mais tranquilo. O verdadeiro desafio não está em sonhar, mas em transformar o sonho em realidade, sem comprometer o equilíbrio e a segurança que já construímos. É precisamente neste ponto que as ferramentas certas se tornam indispensáveis. Não como soluções padronizadas, mas como verdadeiros parceiros estratégicos que se adaptam à sua vida e ao seu ritmo. No Absa Bank Moçambique, acreditamos que o Leasing, o Crédito ao Consumo e o Depósito a Prazo vão muito além de produtos financeiros – representam capítulos possíveis, caminhos abertos, possibilidades concretas. Imagine-se ao volante do automóvel com que sempre sonhou ou a equipar o seu novo espaço de negócio. O Leasing
permite-lhe avançar sem sacrificar as suas poupanças, possibilitando o acesso imediato ao que necessita e pagamento faseado, com prestações que se ajustam à sua realidade. No fim, se quiser, aquilo que começou por ser um sonho pode tornar-se verdadeiramente seu.
Mais do que uma solução, o Leasing representa liberdade com responsabilidade – é o equilíbrio entre avançar e manter o controlo das suas finanças.
Existem ainda momentos em que as necessidades não podem esperar. Uma avaria inesperada no frigorífico, um computador que precisa de uma actua-
"O Leasing, o Crédito ao Consumo e o Depósito a Prazo são instrumentos essenciais para diferentes conquistas na vida"
lização ou a mobília perfeita para a sua sala, que finalmente encontrou! Para estes casos, o Crédito ao Consumo surge como uma resposta ágil, consciente e responsável, permitindo-lhe dizer “sim” ao que faz falta agora, sem comprometer o amanhã.
Mais do que um crédito, é uma ponte entre um presente confortável e um futuro sustentável. Uma ferramenta que transforma urgência em oportunidade.
E porque todas as histórias de sucesso precisam de uma base sólida para crescer, o Depósito a Prazo surge como o guardião do amanhã. É a escolha ideal para quem reconhece que os grandes frutos exigem tempo e paciência para amadurecer. Com taxas fixas e prazos ajustáveis, esta solução garante o crescimento seguro do seu dinheiro.
É como plantar uma árvore: no início exige paciência, mas pouco tempo depois vai oferecer sombra, tranquilidade e recompensa.
Como refere Denise Cruz, Directora de Banca de Retalho do Absa Bank Moçambique: “As histórias de sucesso nascem dos sonhos. O Leasing, o Crédito ao Consumo e o Depósito a Prazo são instrumentos essenciais para diferentes conquistas na vida. Cada sonho merece a oportunidade de se tornar realidade. A nossa missão é caminhar lado a lado com as pessoas, ajudando-as a transformar as suas ambições em realizações com equilíbrio e sustentabilidade."
Individualmente, cada uma destas soluções já faz a diferença. Mas quando são utilizadas em conjunto, transformam-se numa verdadeira estratégia de vida: permitem-lhe realizar aquilo de que precisa hoje, enquanto constrói um futuro mais seguro e estável.
Afinal, os sonhos não têm de ser uma escolha entre o “agora” e o “um dia” podem, e devem, ser ambos.
Com o Absa, os sonhos ganham vida — deixam de ser apenas planos futuros e tornam-se capítulos reais da sua história.
Cortes de electricidade prolongados, durante várias horas por dia, estão a afectar a ilha de Santiago, Cabo Verde, e a capital, cidade da Praia, desde o início de Setembro. As empresas públicas de electricidade explicaram que não têm solução
África
Preços das acções em alta
Os preços das acções em toda a África estão em alta, atraindo a atenção renovada dos investidores globais que procuram retornos face a uma guerra tarifária e ao aumento dos riscos geopolíticos. O mercado bolsista do Gana apresenta o melhor desempenho em dólares este ano. A Zâmbia ficou em segundo lugar, a Nigéria em 14.º, o Quénia em 15.º e a África do Sul logo a seguir ao top 20. Estes países procuraram reformas para reduzir os défices orçamentais e impulsionar o crescimento económico. Todos os países, excepto a Zâmbia, começaram também a reduzir as taxas de juro após a desaceleração da inflação.
imediata para as várias avarias nos geradores da única central eléctrica da ilha. Geradores alugados devem chegar, entretanto, ao mesmo tempo que o Governo anunciou um investimento de urgência em manutenção e equipamentos.
Guiné-Conacri Militares prometem eleições em Dezembro
O líder militar da Guiné disse que o país da África Ocidental vai realizar eleições no dia 28 de Dezembro. O general Mamadi Doumbouya fez o anúncio, por decreto, uma semana depois de os eleitores terem aprovado uma nova Constituição que lhe permite participar na disputa. A votação será a primeira desde que Doumbouya, de 40 anos, tomou o poder num golpe, em 2021. A Guiné é o maior exportador mundial de bauxite, um minério utilizado no fabrico de alumínio.
Costa do Marfim
Presidenciais: Agitação em Abidjan
Cerca de 237 pessoas foram detidas na Costa do Marfim, em Outubro, durante um protesto proibido da oposição contra as próximas eleições. A manifestação, na capital, Abidjan, foi convocada pelo ex-Presidente Laurent Gbagbo e pelo ex-CEO do Credit Suisse, Tidjane Thiam, ambos impedidos de disputar a eleição de 25 de Outubro. O actual Presidente, Alassane Ouattara, procura conquistar um quarto mandato.
Cabo Verde Apagões desde o início de Setembro na capital
Etiópia Títulos em “default” e sem solução
As negociações entre o Governo da Etiópia e os detentores de mil milhões de dólares de títulos que estão em incumprimento (“default”) falharam, com ambos os lados a concordarem em terminar as conversações. O comité “ad hoc” de portadores de títulos da Etiópia, cujos mem-
Quénia
RD Congo
bros detêm colectivamente mais de 40% dos papéis de 2024, disse que propôs um “corte inicial substancial” na dívida pendente. Em troca, o grupo queria um mecanismo para aumentar os pagamentos, caso as receitas de exportação da Etiópia melhorem nos próximos anos.
China: empréstimos viram dívida em yuans
O Quénia converteu empréstimos contraídos junto da China (para financiar uma ferrovia) em dívida denominada em yuans. O país africano espera gerar uma poupança anual de 215 milhões de dólares em juros. O país da África Oriental pediu emprestados 5 mil milhões de dólares ao Banco de Exportação e Im-
portação da China para a linha que liga a cidade portuária de Mombaça a uma cidade próxima da capital, Nairóbi, e cerca de 3,5 mil milhões de dólares ainda estavam pendentes em meados de 2024. O Quénia gasta mil milhões de dólares anualmente no serviço das suas dívidas à China.
Madagáscar Presidente foge, militares apoiam novo chefe de Estado
O coronel Michael Randrianirina tomou posse como novo Presidente de Madagáscar, após anunciar que estava à frente do país, na sequência da fuga de Rajoelina. O ex-chefe de Estado saiu da ilha após protestos anti-governamentais apoiados pela unidade de elite do exército.
O novo Presidente anunciou a suspensão da Constituição malgaxe. O coronel negou ter liderado um golpe de Estado, argumentando que os parlamentares aprovaram uma moção de censura e o Tribunal Constitucional confirmou a vacância do cargo, depois de o Presidente ter fugido. Madagáscar foi abalado por vários golpes de Estado desde que obteve a sua independência da França,
Ex-chefe de Estado condenado à morte
Um tribunal militar da República Democrática do Congo condenou o ex-Presidente Joseph Kabila à morte, à revelia, por traição e multou-o em mais de 30 mil milhões de dólares pelo seu alegado apoio a um grupo armado. Kabila foi considerado culpado de apoiar a rebelião do M23, grupo auxiliado pelo Ruanda, que tomou conta de uma grande área do leste do Congo, rica em minerais. Kabila, que foi Presidente de 2001 a 2019, apareceu recentemente no território ocupado, em trânsito pelo Ruanda. Disse que está a tentar promover a paz e negou qualquer irregularidade.
em 1960, e os últimos distúrbios reflectem profundas frustrações da população com o Governo, a falta de acesso a serviços básicos e uma corrupção generalizada. Madagáscar sofreu três golpes anteriores, em 1972, 1975 e 2009. Este último tinha levado ao poder o próprio Rajoelina, agora derrubado pelo mesmo corpo militar.
Entretanto, o Presidente Randrianirina nomeou para primeiro-ministro o director do conselho de administração do principal banco do país africano, Herintsalama Rajaonarivelo, que liderava o BNI Madagáscar. Trata-se de uma figura proeminente do sector privado, no qual se destacou na consultoria em áreas de comércio internacional e tratados.
Tributação do Gás
Natural: A Necessidade Urgente da Digitalização
Especialista em fiscalidade defende que o País precisa de acelerar a digitalização e reforçar a transparência na tributação do gás natural. E alerta ainda para falhas na reconciliação de receitas e para a ausência de fundamentação técnica na fixação de taxas e royalties
Texto Nário Sixpene • Fotografia Mariano Silva
Adescoberta e o desenvolvimento de recursos de hidrocarbonetos tomaram conta da discussão pública no País há vários anos. O potencial de receitas fiscais provenientes do gás natural tem sido apresentado como uma oportunidade histórica, capaz de financiar infra-estruturas, serviços públicos e programas sociais. Mas a transformação do potencial energético em riqueza efectiva implica decisões técnicas, jurídicas e políticas complexas e, sobretudo, um alto grau de transparência e eficiência na cobrança e gestão dessas receitas.
Mauro Daúd, tax partner da EY e especialista em fiscalidade, acompanha o sector há mais de 18 anos, questiona algumas lacunas ao nível da transparência e destaca medidas prioritárias para que o Governo consiga materializar os benefícios do gás a favor das populações.
O enquadramento fiscal: IRPC, royalties e partilha de produção “O nosso sistema fiscal prevê diversos instrumentos ou mecanismos de tributação desta indústria que é, como sabemos, de capital intensivo”, explica Mauro Daúd, acrescentando que, em termos formais,
as sociedades que operam em Moçambique são tributadas em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRPC) à taxa nominal de 32%. “Mas, na prática, o IRPC só começará a produzir receitas quando a empresa obtiver lucros contabilísticos e isso, em projectos de gás, pode demorar muitos anos”, apontou.
Segundo o especialista, para garantir receitas desde o início da exploração, o Executivo recorre à cobrança de royalties, que no País se designam como Imposto sobre a Produção de Petróleo, aplicado sobre a produção bruta. “As royalties funcionam como um mecanismo de arrecadação imediata. Mesmo antes de as empresas gerarem lucro, o País já começa a receber. A cobrança vai até 6% da produção e constitui, assim, uma fonte importante de rendimentos que mitiga o longo período de retorno do investimento por parte das multinacionais.”
Paralelamente, os contratos de partilha de produção asseguram ao Estado uma quota da produção, em espécie ou em valor, independentemente da recuperação integral do capital investido pelas empresas. “A partilha de produção é um instrumento híbrido: permite ao País receber dividendos periódicos, sem ficar à espera da amortização total do projecto”, observa o
“Muitas vezes fixam-se taxas sem que se saibam os estudos que as suportam. Perguntamo-nos: qual foi o critério técnico que levou à escolha de 6% e não de outro valor?”, questiona o fiscalista
fiscalista, apontando que “não é uma alternativa ao IRPC; é uma forma de complementar a arrecadação. O objectivo é garantir que o País não fique dependente de um único mecanismo e que possa obter receitas desde as fases iniciais.”
A fonte observa que a partilha de produção é o mecanismo no qual a produção é dividida entre as partes (empresa e Estado) após a recuperação dos custos operacionais por parte da empresa. “Geralmente, o Estado recebe uma parte da produção, enquanto a empresa recupera os seus investimentos e custos. Este modelo tem como finalidade incentivar a exploração e garantir que o Estado tenha participação nos lucros, permitindo alinhar os interesses de ambas as partes”, sublinha.
As justificações técnicas por detrás de alterações dos normativos fiscais
Mauro refere que uma das críticas mais recorrente dos especialistas da área prende-se com a justificação técnica. Por exemplo, há vezes que uma análise de custo e benefício, e o impacto da alteração dos normativos fiscais e taxas mostram-se contraproducentes com o objectivo de política fiscal desejada. “Como me referi, para países como o nosso, a aplicação, por exemplo, de Royalties o IPP parece-me ser acertada por parte do Governo, entretanto, quaisquer ponderações sobre
A transformação do potencial energético em riqueza efectiva implica um alto grau de transparência e eficiência na cobrança e gestão de receitas
alterações para cima e para baixo desta devem ser suportadas assegurando-se o alcance, com relativa segurança e certeza, das metas e programas governamentais. Há necessidade de, periodicamente, avaliar-se ou alterar a regulamentação de diversos normativos fiscais, e publicar com regularidade orientações e instruções sobre o seu cumprimento, tal como prevê o nosso ordenamento jurídico-tributário”, explicou.
IVA, exportações e o mecanismo de regularização
Uma questão que merece atenção específica é a da tributação indirecta. “No que toca ao IVA, a exportação de petróleo e gás está normalmente sujeita à taxa zero”, explica o fiscalista. Contudo, o que se torna problemático são os mecanismos de regularização e os regimes especiais aplicáveis em situações domésticas. “Quando as empresas operam internamente ou quando há fornecimentos ligados à cadeia de valor local, surgem dúvidas sobre a dedutibilidade e sobre o tratamento do IVA. É preciso ter regras claras”, defende. Mauro Daúd recorda que, noutros sectores, mudanças do regime de IVA foram aplicadas sem um estudo público exaustivo, um facto que complicou a actuação de agentes económicos e diminuiu a previsibilidade. “A falta de fundamentação dos regimes especiais acaba por gerar insegu-
FALTA BASE DE DADOS COM PREÇOS DE REFERÊNCIA
Um dos pontos técnicos mais complexos diz respeito à definição das bases de cálculo para diferentes tributos. “Para o IRPC, para as royalties e para outros mecanismos de partilha, frequentemente utilizam-se parâmetros distintos. Há preços de referência internacionais, há o valor contratual de venda e há os preços de transferência entre empresas relacionadas. É preciso harmonizar, porque isso evita que uma mesma operação seja tributada de forma incongruente por diferentes leis”, explica. O fiscalista lembra que é habitual em muitos sistemas fiscais que exista um guia ou base de dados de preços de referência que serve para celebrar contratos e calcular royalties e impostos. “Ter essa base de dados pública e actualizada aumenta a previsibilidade e reduz debates técnicos que consomem tempo e recursos”, afirma.
rança e litígios. O Governo deveria publicar as medidas e os estudos que as suportam”, afirma.
A participação da ENH e a questão do financiamento do Estado
A Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (ENH) tem um papel central enquanto representante do Estado nos projectos. “Muitas vezes, a ENH não dispõe de capitais suficientes para acompanhar proporcionalmente os investimentos, e isso leva a mecanismos em que a sua participação é financiada pelas concessionárias”, diz o especialista, sublinhando que tal financiamento implica regras de reembolso e limites para evitar que o Estado fique com pouca receita imediata.
“O objectivo deve ser proteger o interesse do País, permitindo-lhe beneficiar da produção sem perder a capacidade de fiscalização e de obter receitas correntes. Há que definir limites claros sobre quais os montantes que são financiáveis e em que condições esses adiantamentos são reembolsados”, aponta.
Transparência, digitalização e conciliação de dados “A primeira prioridade é a digitalização”, defende o especialista. Mauro Daud recorda que alguns países da região avançaram rapidamente na modernização dos seus sistemas fiscais, integrando ferramentas como o SAF-T (Standard Audit File for Tax purposes ou Ficheiro padronizado/normalizado de auditoria tributária) e outras plataformas que facilitam a declaração, o acompanhamento e a conciliação das receitas. “Angola, por exemplo, tem feito progressos notórios neste campo. Curiosamente, chegaram a pedir-nos para partilhar experiências e hoje estão à frente em certos aspectos”, afirma.
A digitalização, segundo o especialista, melhora não só a eficiência de cobrança, mas também a transparência: “Ter um sistema único que permita conciliar pagamentos a nível provincial e central, cruzar dados de diferentes entidades e emitir relatórios públicos reduz substancialmente as discrepâncias que vemos hoje.”
Mauro Daud alerta: “Já participámos em iniciativas de reconciliação de impostos, (por exemplo, a Iniciativa de Transparência da Indústria Extrativa – ITIE –em Moçambique), e reportámos situações em que a empresa declara que pagou mais impostos e a AT diz que recebeu menos, ou vice-versa, o que não é compreensível num sistema moderno. Nos últimos tempos tem-se constatado que nos relatórios da ITIE, as diferenças são mínimas o que contribui para a transparência e reputação do País”.
MAURO DAUD Tax partner da EY
“Receitas voláteis não podem ser tratadas como recorrentes. É fundamental que o Governo estruture mecanismos de gestão para evitar ciclos económicos desestabilizadores”
Segurança jurídica e cláusulas de estabilidade
Nos contratos de concessão, as cláusulas de estabilidade fiscal são frequentemente apontadas como um elemento essencial para atrair investimento estrangeiro. “Para investidores internacionais, a previsibilidade das regras é crítica. Ter cláusulas que assegurem estabilidade cria confiança e reduz o risco de arbitragem ou de saída de capitais”, explica o profissional.
Por outro lado, o especialista nota que essa estabilidade não pode ser sinónimo de imunidade a reformas. “A legislação tem de ser clara e adaptada ao objectivo nacional. Podemos inspirar-nos em boas práticas internacionais, mas temos de ter leis para moçambicanos e que respondam às nossas prioridades”, afirma.
Por outro lado, Mauro Daúd recomenda que o Estado reforce a capacidade de auditoria, sobretudo em matérias sensíveis como dedução de custos e preços de transferência. “Hoje, com tecnologia apropriada, é possível cruzar dados e identificar discrepâncias em tempo real. O País precisa de investir nessa capacidade para reduzir litígios e assegurar uma aplicação equitativa da lei”, defende.
Para além da arrecadação fiscal directa, o fiscalista destaca a importância de estruturar mecanismos de apoio às comunidades locais de forma auditável e transparente. “Se as concessionárias puderem ca-
nalizar donativos ou investimentos através de programas auditáveis, com regras claras e fiscalização independente, isso reduz o risco de conflito e aumenta a aceitação social dos projectos”, defende. “Não se trata apenas de dar dinheiro. Trata-se de construir projectos de desenvolvimento local, investir em infra-estruturas, educação, saúde e formar mão-de-obra local para reduzir dependência externa”, sublinha.
Lições de sucesso e maus exemplos Ao olhar para países com perfis semelhantes, Mauro Daúd aponta que há lições de sucesso, mas também erros a evitar. “Alguns países africanos avançaram rapidamente na implementação de plataformas electrónicas e em mecanismos de transparência. Outros experimentaram cláusulas de estabilidade fiscal demasiado rígidas que depois complicaram reformas”, refere. “Moçambique tem oportunidade de aprender com essas experiências. Precisamos de legislação que seja transparente, mas também mecanismos de governação que permitam fiscalizar e partilhar resultados com a população”, acrescenta.
O especialista aproveitou a ocasião para alertar sobre o risco da chamada ‘doença holandesa’: “Se o País não estruturar bem as suas políticas, pode depender excessivamente de receitas de um sector e negligenciar outras actividades
económicas. É essencial que as receitas do gás sejam geridas de forma a diversificar a economia e promover desenvolvimento sustentável.”
Uma dificuldade prática que o entrevistado realça é a conciliação entre o que é declarado e o que é efectivamente recebido, tanto a nível provincial como central. “Se existirem mecanismos distintos de registo e cobrança a nível provincial e central, sem um sistema que permita o cruzamento automático, surgem discrepâncias que não são fáceis de resolver. Temos de ter um sistema único que permita a conciliação imediata”, sublinha.
Mais recursos humanos e gestão rigorosa das receitas Mauro Daúd sublinha que o reforço da capacidade técnica da Autoridade Tributária não passa apenas pela tecnologia, mas também pela formação de recursos humanos especializados. “Ter ferramentas digitais é fundamental, mas também precisamos de fiscais, auditores e analistas com conhecimento técnico do sector. Sem essa capacidade humana, os sistemas serão subutilizados”, observa. No plano orçamental, as autoridades devem planear as receitas de forma prudente. “Receitas voláteis e/ou imprevisíveis, associadas, por exemplo, à mais-valias, não podem ser tratadas como receitas recorrentes. É fundamental que o Governo estruture mecanismos de gestão de receitas (fundos soberanos, regras de poupança e prioridades de investimento) para evitar ciclos económicos desestabilizadores”, afirma o fiscalista.
Passos concretos sugeridos pelo especialista
Mauro Daúd sintetiza um conjunto de medidas que considera prioritárias: “Primeiro, acelerar a digitalização da Autoridade Tributária. Segundo, publicar os fundamentos técnicos que suportam a fixação de taxas e royalties. Terceiro, reforçar a capacidade de auditoria e mecanismos de reconciliação. Quarto, estruturar programas de apoio às comunidades com regras claras e auditoria independente. E, finalmente, garantir que a legislação responde aos objectivos do País sem perder competitividade.”
O especialista apresenta uma via: “Publicar um plano sequencial de digitalização com prazos; elaborar e publicar estudos técnicos que suportem a fixação de royalties; criar um registo público de preços de referência; reforçar a ENH com regras claras de financiamento e de reembolso; estruturar programas sociais auditáveis e aumentar a capacidade de auditoria com formação técnica adequada.”
As Ideias do Nobel 2025 Podem Ajudar Moçambique?
O Prémio Nobel de Economia de 2025 foi atribuído a três nomes que há décadas estudam o crescimento económico: Joel Mokyr, Philippe Aghion e Peter Howitt. Quais seriam os resultados se as suas conclusões fossem aplicadas em Moçambique?
Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R
Omais recente Prémio Nobel de Economia reconhece os contributos decisivos de três economistas para explicar como a inovação (e não apenas a acumulação de capital) se tornou no motor essencial do desenvolvimento. Mais do que uma homenagem académica, o galardão abre uma oportunidade de reflexão para países como Moçambique, onde o crescimento económico ainda depende, em grande medida, de recursos naturais, da ajuda externa e de um tecido produtivo limitado.
Joel Mokyr recebeu metade do prémio “pelas suas análises sobre as condições culturais e institucionais que tornaram possível o progresso tecnológico sustentado." Aghion e Howitt partilharam a outra metade “pela formulação da teoria do crescimento impulsionado pela destruição criativa”, que mostra como a concorrência e o avanço tecnológico, ao substituírem velhas indústrias e métodos, geram novos ciclos de prosperidade.
Em conjunto, as ideias ajudam a perceber como sociedades abertas ao conhecimento, à ciência e ao empreendedorismo constroem riqueza duradoura, ao contrário das que se fecham ao risco e à mudança.
O poder da inovação
No caso de Joel Mokyr, o foco recai sobre a dimensão cultural da inovação. O economista israelita-americano argumenta que o crescimento da Europa após a Revolução Industrial não se deveu apenas a invenções isoladas, mas a uma verdadeira “república do saber”, onde cientistas, artesãos e comerciantes partilhavam ideias e aprendiam uns com os outros. A curiosidade científica e a confiança na razão criaram um ambiente propício à descoberta e ao aperfeiçoamento contínuo das técnicas.
Para Mokyr, o desenvolvimento depende de uma cultura que valorize o conhecimento e que permita contestar o estabelecido. Esta é uma lição crucial para Moçambique, onde a produção científica e tecnológica ainda ocupa um espaço reduzido na economia e na formulação de políticas públicas. Reforçar o ensino científico, promover a pesquisa aplicada e criar pontes entre universidades, empresas e Governo seriam passos decisivos para transformar o conhecimento em crescimento sustentável.
A força da “destruição criativa”
Já Philippe Aghion e Peter Howitt, cujas obras se tornaram referências desde a década de 1990, explicam que o crescimento moderno resulta de um processo
Moçambique precisa de um sistema de investigação capaz de gerar soluções locais na agricultura, energias renováveis, gestão ambiental e tecnologias digitais
JOEL MOKYR é um economista e historiador israelita-americano, nascido em 1946, professor na Universidade Northwestern (EUA). Especialista em história económica, tornou-se referência pelos seus estudos sobre as origens culturais e intelectuais da Revolução Industrial. É autor de obras como The Lever of Riches e A Culture of Growth.
dinâmico de “destruição criativa”, conceito inicialmente proposto por Joseph Schumpeter. Em cada ciclo económico, novas empresas ou tecnologias substituem as antigas, aumentando a produtividade global. A inovação destrói empregos e modelos de negócio obsoletos, mas cria outros, mais eficientes e competitivos. A chave, para ambos, está em garantir que os incentivos à inovação (como protecção de patentes, acesso ao crédito, regulação justa e educação de
Que posição Moçambique deve(ria) assumir?
Economista francês, nascido em 1956, professor no Collège de France e na London School of Economics. É co-autor de Endogenous Growth Theory e The Power of Creative Destruction e tem influenciado fortemente o debate sobre produtividade e desigualdade.
qualidade) sejam suficientemente fortes para superar as forças de inércia e resistência dos grupos estabelecidos.
Em Moçambique, o modelo de Aghion e Howitt pode ajudar a compreender porque é que o País cresce sem, necessariamente, transformar a estrutura produtiva. Apesar de haver sectores dinâmicos, como a energia, mineração ou telecomunicações, grande parte da economia continua dependente de pequenas actividades informais e de
Economista canadiano, nascido em 1946, professor emérito da Brown University (EUA). As suas pesquisas exploram a dinâmica entre inovação, instituições e produtividade, influenciando políticas de inovação em todo o mundo.
baixa produtividade. A ausência de um ecossistema competitivo e de políticas de inovação coerentes impede a renovação tecnológica e a criação de valor. A “destruição criativa”, neste contexto, é limitada, porque há pouca criação e porque a destruição sem alternativas sustentáveis apenas acentua a exclusão social. O desafio é encontrar o equilíbrio que consiste em promover a concorrência e a inovação sem deixar para trás os que não têm meios de adaptação.
A aplicação dos estudos destes laureados exige políticas de longo prazo. À luz das suas lições, Moçambique precisa de um sistema robusto de investigação e desenvolvimento, capaz de gerar soluções locais na agricultura, energias renováveis, gestão ambiental e tecnologias digitais. É fundamental criar condições institucionais que encorajem a experimentação e a liberdade académica. Também se exige um ambiente regulatório previsível e justo, que premeie o mérito e desincentive monopólios ou favoritismos. No plano social, o País deve investir em capital humano, desde a educação básica até à formação técnica e científica, para preparar uma força de trabalho capaz de inovar e adaptar-se às mudanças do mercado.
A teoria da destruição criativa também alerta para os riscos de uma modernização desequilibrada. A inovação pode gerar desigualdade se concentrar oportunidades nas zonas urbanas ou entre elites com acesso à tecnologia. Por isso, as políticas de crescimento devem incluir mecanismos de protecção profissional, programas de requalificação e apoio a micro e pequenas empresas, de modo a facilitar a transição para uma economia inovadora.
O legado intelectual de Mokyr, Aghion e Howitt oferece, assim, um guião claro: o progresso não é apenas uma questão de capital ou recursos, mas de ideias e instituições. As economias que valorizam o conhecimento, estimulam a concorrência e apostam na criatividade dos seus cidadãos são as que mais prosperam a longo prazo.
PHILIPPE AGHION
PETER HOWITT
“Queremos Ser Uma Referência na Advocacia em Moçambique”
Moçambique prepara-se para entrar num novo ciclo de investimento, transformação estrutural e afirmação económica, e é neste contexto que a PLMJ Colab Moçambique – NMP Advogados reforça presença, liderança e ambição no País
Texto e Fotografia • M4D
Através da integração operacional no ecossistema da PLMJ, a NMP Advogados formalizou, no segundo semestre de 2025, o seu posicionamento próprio em Moçambique. Com equipa e liderança locais e um foco sectorial definido, este é o início de uma nova fase, num movimento que consolida a evolução natural de um escritório que conhece profundamente a realidade moçambicana e que mantém, através da rede PLMJ Colab, acesso a mais de 300 advogados e especialistas em múltiplas jurisdições.
A partir de Maputo, a NMP Advogados reforça a capacidade de resposta jurídica num mercado em transformação, com foco em rigor, estruturas robustas, confiança regulatória e criação de valor sustentável para investidores, banca, empresas e instituições do País.
Nuno Morgado Pereira, sócio local da NMP Advogados e advogado em Moçambique e Portugal, assume a liderança do escritório da PLMJ Colab Moçambique num momento decisivo para o País. A estabilização macroeconómica, o regresso dos grandes investimentos energéticos e a nova geração de projectos estruturantes colocam o sector jurídico no centro da capacidade de execução e da atracção de capital internacional. O reforço de presença local responde a essa necessidade: proximidade, especialização sectorial e visão de longo prazo.
Com experiência transversal em financiamento, energia, O&G, GNL, transição energética, infra-estruturas e project finance, Nuno Morgado Pereira identifica esta fase como a oportunidade para consolidar uma advocacia moçambicana mais competitiva, tecnicamente sofisticada e preparada para suportar o próximo ciclo de crescimento do País.
O que motivou o seu regresso ao País neste momento e que significado pessoal e profissional tem liderar a PLMJ Colab Moçambique – NMP Advogados? Só se regressa a um sítio quando o deixámos alguma vez, o que não é, de todo, o caso. Sou Moçambicano e cresci aqui, sendo também advogado Moçambicano. Desde 2012 que integro a equipa da PLMJ que desenvolve trabalho no País, lado a lado com clientes locais e internacionais. Por tudo isto, não faz sentido falar em regresso, o que faz sentido, sim, é falar num passo de compromisso reforçado, consolidado de dedicação ao mercado moçambicano.
É uma responsabilidade que levo muito a sério, que é uma consequência natural do meu percurso no escritório e resultante da forma como o escritório olha hoje para as outras geografias onde está.
A nossa ambição, de todos na PLMJ e da PLMJ Colab Moçambique — NMP Advogados é a de que este projeto se torne, muito rapidamente, numa referência
“O grande desafio continua a ser garantir a bancabilidade: contratos bem estruturados, repartição equilibrada de riscos, garantias adequadas e um quadro jurídico estável”
da advocacia moçambicana. Tem sido pessoal e profissionalmente muito enriquecedor acompanhar projectos de elevada sofisticação em várias dimensões, inclusive aquela em que me especializei, que é a do financiamento. E é com muita ambição, convicção e entusiasmo que assumo este desafio de desenvolver um projeto de advocacia em Moçambique e em prol de Moçambique.
Qual é o posicionamento que a PLMJ pretende assumir no mercado jurídico moçambicano e quais os elementos diferenciadores que trazem para este ecossistema?
O nosso posicionamento é muito claro e é uma continuação do muito trabalho que já temos desenvolvido em Moçambique. A NMP Advogados quer ser o parceiro jurídico que está no top of mind das partes envolvidas nos grandes projectos estruturantes do País. A nossa equipa está vocacionada para assessorar empresas nos seus projectos de entrada e crescimento em Moçambique. E temos feito isso mesmo através da equipa de Lisboa, mas agora queremos fazê-lo com um hub aqui, em Moçambique. Temos estado em projectos que querem fazer o País avançar e desenvolver-se. Das infra-estruturas à energia, ao apoio na estruturação de financiamentos complexos e robustos na área das ligações ferroviárias e aeroportuárias. Recentemente, temos a destacar ainda vários investimentos nos quais fomos parceiros e temos um papel relevante no seu desenvolvimento: desde a prestação de serviços de consultoria jurídica para o sector público na área de projectos de energia renováveis, capacitação de quadros do sector financeiro; estivemos muito envolvidos na maior operação de M&A do País no ano passado (Galp Rovuma). São exemplos que demonstram a
NUNO MORGADO PEREIRA
Sócio local da NMP Advogados e advogado em Moçambique e Portugal
capacidade que temos de ajudar a concretizar os projectos que podem e certamente farão a diferença num País que tem tudo para dar um grande salto na sua prosperidade económica. Mas falando do presente, hoje, o primeiro desafio é identificar e preservar o talento. Fala-se muito de IA, mas estas ferramentas só fazem sentido se houver pessoas bem preparadas. A IA ajuda, mas são as pessoas que fazem acontecer.
Na PLMJ temos feito um caminho incrível na capacitação das equipas porque estamos a pensar no que será exigido ao advogado de amanhã. Tem de, não só ter bases académicas sólidas, como também compreender literacia digital e legal project management. E, portanto, tem de aliar o raciocínio quantitativo rigoroso à inteligência emocional e à criatividade contratual, criando estruturas jurídicas flexíveis que não apenas protejam em cenários adversos, mas que também consigam transformar volatilidade em fonte de oportunidades.
É isto que queremos trazer: um escritório que oferece aos advogados de
Nuno Morgado Pereira é advogado em Moçambique e Portugal e sócio local da NMP Advogados. Com mais de uma década de experiência, lidera a prática do escritório em Moçambique, especializado em financiamento e desenvolvimento de projectos nos sectores da energia — incluindo petróleo, gás, GNL e transição energética — bem como em recursos naturais e infra-estruturas.
Actua como consultor jurídico de promotores, bancos e instituições financeiras multilaterais e bilaterais, com vasta experiência em joint ventures, estruturas financeiras complexas e financiamento comercial e à exportação.
É licenciado e mestre em Direito pela Universidade Católica Portuguesa e pela Universidade Nova de Lisboa, e membro das Ordens dos Advogados de Portugal e Moçambique.
Moçambique um sítio para se desenvolverem em todas estas e outras valências. Este é, talvez, o aspeto mais entusiasmante porque o impacto que terá na nova geração de advogados do País será real.
De que forma a integração na rede PLMJ Colab reforça a capacidade do escritório local e potencia soluções para empresas moçambicanas e investidores internacionais?
O modelo da PLMJ Colab hoje bebe muito das lições aprendidas com a nossa própria experiência de internacionalização, bem como do que temos vindo a assistir em termos do que faz ou desfaz o sucesso deste tipo de redes de colaboração. E o que temos por certo é que há aqui uma grande oportunidade de criar hubs regionais que sirvam de ponte entre diferentes mercados. Em Maputo, o objectivo é precisamente esse, sermos uma plataforma que liga Moçambique a Angola, à África do Sul e aos demais Países africanos da região, aos EAU,
à Índia, a Portugal e ao mundo, trabalhando em rede com mais de 300 advogados da PLMJ e parceiros internacionais com uma especialização técnica do Direito, combinada com profundo conhecimento dos sectores que podem e vão mudar Moçambique para melhor. Ser simultaneamente advogado em Moçambique e noutra jurisdição possibilita navegar entre jurisdições, traduzindo realidades distintas para que financiadores, promotores e autoridades falem a mesma língua. Em mercados emergentes, onde a prática institucional pesa tanto quanto a lei escrita, esta tradução é essencial. A prestação de serviços jurídicos ao mais alto nível em várias geografias é um desafio diário. Implica não só ter os melhores profissionais, mas também uma cultura comum transversal, que garanta uma experiência consistente de qualidade. É um caminho exigente, mas é o único que assegura que os clientes têm, em qualquer mercado, o mesmo rigor e a mesma confiança.
Trabalhar em jurisdições diversas amplia conhecimento, obriga a pensar de forma criativa e torna as equipas mais competitivas. Na PLMJ Colab Moçambique - NMP Advogados -, trabalhamos com equipas multidisciplinares, transversais aos vários escritórios da rede, constituídas a pensar nas especificidades de cada projeto. Esta diversidade tem um valor tangível para os clientes que se querem internacionalizar a partir de Moçambique ou investir no País.
A nossa missão é simples. Queremos trabalhar em Moçambique e por Moçambique. Vamos oferecer assessoria jurídica com a qualidade e especialização, fruto da ligação às equipas da PLMJ, mas com a proximidade e o conhecimento de quem vive e entende este mercado todos os dias.
Qual a sua leitura sobre o actual estado do sector bancário e financeiro em Moçambique?
E que reformas ou avanços jurídicos poderão fortalecer o acesso ao financiamento e a competitividade das instituições financeiras — e de que forma a PLMJ pretende apoiar este ecossistema na modernização e criação de confiança?
Moçambique está prestes a entrar numa fase de transformação profunda, ancorada no regresso dos grandes investimentos em energia e logística.
É um movimento que poderá duplicar o PIB do País em poucos anos, mas que exige visão, estruturas sólidas e capacidade de execução. O País está a entrar numa nova fase de oportunidade: depois
Verifica-se uma tendência de aumento de investimentos no Oil & Gas
do “boom” no início da década de 2010 e dos desafios que se colocaram a partir de 2016, Moçambique está agora a estabilizar macroeconomicamente — inflação controlada, metical estável, investidores a regressar. E o sistema e sector bancário estão – e bem – a preparar-se para a sua própria transformação, que é essencial para conseguir responder ao que aí vem. Há finalmente uma base para que a banca e o sistema financeiro deixem de estar permanentemente em ‘modo de sobrevivência’ e entrem numa fase de crescimento e internacionalização. Dito isto, é crucial que o sector avance em três eixos: melhorar o acesso ao crédito para PME/informal através de garantias eficazes, registos funcionais e regimes de insolvência modernos; diversificar fontes de financiamento, nomeadamente via mercado de capitais, project finance e instrumentos de securitização, para além da banca tradicional e, por último mas não menos importante, refor-
çar confiança. É preciso garantir que os marcos regulatórios, cambiais e contratuais (sobretudo nos projectos de grande escala) são previsíveis e transparentes — o que é essencial para atrair investimento, em particular de entidades que venham contribuir para o desenvolvimento do País ao mesmo tempo que, claro, aqui desenvolvem os seus negócios.
A NMP Advogados gostaria de contribuir precisamente para robustecer a sustentabilidade no longo prazo dessa transição: seja assessorando operações de crédito estruturado, seja desenhando instrumentos modernos de Compliance e apoiando a banca local a posicionar-se como parceiro de project finance e das empresas. Em síntese: o sistema está pronto para dar um salto — e a reforma certa em todas as dimensões críticas vai acelerar e consolidar esse salto.
A energia tem sido um eixo central da vossa actuação. Quais são os
principais desafios jurídicos e regulatórios que hoje se colocam aos grandes projectos em Moçambique?
Quando falava há pouco do regresso dos grandes projectos de investimento, a área da energia e da logística vão ser centrais. Se há algo que os investidores procuram é previsibilidade. Um quadro legal estável e consistente não só reduz o risco percebido, como permite projectar contratos de longo prazo com confiança. Moçambique e os Países vizinhos precisam de reforçar essa estabilidade — fiscal, laboral, regulatória — para que empresas nacionais e internacionais possam apostar a médio e longo prazo. O nosso contributo é, claro, ajudar a desenhar e implementar estruturas jurídicas e financeiras robustas, que transformem oportunidades em projectos bancáveis.
Em termos de financiamento de projectos, que tendências
e estruturas jurídicas estão a emergir no País e como a PLMJ pretende apoiar operações cada vez mais complexas?
A banca moçambicana tem sido um parceiro muito importante na construção das Parcerias Público-Privadas (PPP) e nos mega projectos do País, nomeadamente no apoio que consegue dar na navegação dos temas cambiais e regulatórios. Mas também é preciso dizer que Moçambique “tem track-record” de honrar direitos dos projectos e que a estabilidade jurídica/regulatória é um factorchave para investidores, pelo que há aqui um ponto de partida fértil. Nos últimos meses, os anúncios de grandes projectos em Moçambique (desde a retoma do LNG na Área 1 liderada pela TotalEnergies, ao Coral Norte da Eni, passando pelo arranque do Mphanda Nkuwa e pela aprovação de vários projectos de infra-estrutura e energia renovável) revelam tendências claras no financiamento de projectos. Em primeiro lugar, assiste-se a uma reafirmação do papel dos mega-projectos de gás como âncoras de investimento, que atraem financiamento internacional de enorme escala, normalmen-
mento jurídico é determinante para assegurar repartição adequada de riscos e confiança dos financiadores.
Em quarto lugar, há uma clara tendência para reforço do papel de garantias governamentais e multilaterais, seja através de garantias soberanas, seja de seguros de risco político ou mecanismos de crédito de instituições como IFC, AfDB ou MIGA que funcionam como catalisadores de capital privado num contexto de risco-País ainda elevado.
Por fim, assiste-se a uma diversificação sectorial: para além do gás, vemos investimentos relevantes em mineração, agro-negócio e projectos de médio porte em energia e logística. Isso abre espaço para estruturas de project finance menos massivas, onde também bancos locais, fundos de capital de risco baseados na África do Sul e noutros Países da Região e investidores regionais podem ter maior protagonismo.
Em suma, a tendência é clara: Moçambique está a sair de uma fase de paralisia para uma nova vaga de investimentos, combinando mega-projectos energéticos com iniciativas em renováveis, infra-estrutura e sectores produtivos. O grande desafio continua a ser ga-
“Há uma base para que a banca e o sistema financeiro deixem de estar permanentemente em ‘modo de sobrevivência’ e entrem numa fase de crescimento e internacionalização”
te assente em consórcios de bancos comerciais, agências de crédito à exportação e multilaterais. São operações que exigem contratos robustos, garantias soberanas e mecanismos de mitigação de risco político e securitário.
Em paralelo, cresce uma segunda tendência muito relevante: a diversificação para projectos de energia renovável e electrificação, onde vemos estruturas de financiamento mais híbridas combinando capital concessionário, multilaterais e fundos de impacto e uma maior exigência em torno da bancabilidade dos PPAs celebrados com a EDM. Este é um espaço de grande oportunidade, pois permite atrair capital internacional orientado para sustentabilidade e ESG. Terceiro, os investimentos em infra-estruturas de transporte, portos e ferrovias surgem como condição para viabilizar tanto o LNG como a mineração e o agronegócio. Aqui prevalecem modelos de concessão e PPP, em que o enquadra-
rantir a bancabilidade: contratos bem estruturados, repartição equilibrada de riscos, garantias adequadas e um quadro jurídico estável.
Se esse caminho for consolidado, Moçambique pode transformar os seus recursos e projectos em motores efectivos de crescimento sustentável. Falando da NMP Advogados, é aqui que a nossa integração na PLMJ Colab prova de forma muito clara o seu valor. Os grandes projectos de infra-estruturas portugueses contaram, em alguma dimensão da implementação do projeto, com o conhecimento e contributo das equipas da PLMJ. Fosse financiamento, aspetos regulatórios, ou outros, ali estavam as equipas PLMJ. As mesmas que trarão a sua valiosa experiência e profundo conhecimento para Moçambique. E isto é muito entusiasmante para mim como moçambicano e como líder de um escritório local que pode trazer esta experiência global.
“A NMP Advogados quer ser o parceiro jurídico que está no top of mind das partes envolvidas nos grandes projectos estruturantes do País”
Que papel poderão desempenhar os investimentos em infra-estruturas no crescimento de Moçambique e como pode o enquadramento jurídico acelerar a execução destes projectos?
Os investimentos em infra-estruturas são absolutamente centrais no crescimento de Moçambique. O País está, hoje, a projectar uma escala de projectos em infra-estrutura (portos, ferrovias, energia) que pode superar duas vezes o PIB actual. Esta magnitude gera emprego, cria ligações logísticas, reduz custos de escoamento e fortalece o País como porta de entrada regional. Para que estes projectos se executem rapidamente, o enquadramento jurídico é determinante em aspetos essenciais. Por um lado, garantir transparência, previsibilidade e estabilidade nos contratos de concessão e PPPs, assim como nos direitos dos parceiros privados, porque a entrevista salienta que Moçambique. Por outro lado, simplificar os procedimentos de licenciamento, licenciamentos ambientais, acesso ao financiamento internacional e aos mecanismos de garantia. Processos mais claros significam decisões mais rá-
pidas e menos custo de atraso. E, finalmente, assegurar um regime cambial e de transferências de capitais que suporte fluxos internacionais.
A competitividade das empresas moçambicanas continua a ser um desafio. Que tipo de apoio jurídico será determinante para que consigam integrar e beneficiar da nova vaga de investimentos?
A competitividade das empresas nacionais continua a ser um desafio, sobretudo porque muitas ainda têm dificuldades de acesso a financiamento, tecnologia e mercados. O apoio jurídico pode ser determinante em três dimensões: na estruturação de garantias e veículos de financiamento que permitam às PME aceder a crédito em condições sustentáveis; na simplificação dos processos societários e de compliance, para que as empresas consigam participar em cadeias de fornecimento ligadas a grandes projectos de energia e infra-estruturas; e na proteção da propriedade intelectual, contratos e direitos laborais, criando confiança para parcerias com investidores estrangeiros. No fundo, o jurídi-
co não é apenas reativo — é uma ferramenta para que as empresas nacionais se tornem mais competitivas e consigam integrar-se e beneficiar da nova vaga de investimentos
Para além da energia, que sectores emergentes considera estratégicos e com potencial para atrair capital e gerar crescimento sustentável?
Moçambique tem oportunidades extraordinárias de diversificação económica. Vejo três eixos: agro-indústria, dada a riqueza de terras e potencial de exportação; turismo sustentável, em particular o ecoturismo e as zonas costeiras; e sobretudo os créditos de carbono e soluções baseadas na natureza. O País está a liderar em África com o projecto MozBlue, que pode gerar créditos de carbono de qualidade, atrair financiamento climático e, ao mesmo tempo, criar empregos locais e proteger ecossistemas (PLMJ está envolvida). O enquadramento jurídico é essencial para dar segurança na titularidade dos créditos, garantir repartição justa dos benefícios com as comunidades e alinhar com padrões internacionais de verificação. Com regras claras, Moçambique pode transformar os seus activos naturais em uma das principais fontes de crescimento sustentável e de liderança no mercado global de carbono.
Numa perspectiva de médio e longo prazos, que visão tem sobre a economia nacional e o seu desenvolvimento nos próximos anos?
Diria que precisamos de formar e reter talento de forma transversal em termos de sectores. Sem talento, pessoas capazes, motivadas, ambiciosas, comprometidas, não temos o recurso mais básico para impulsionar Moçambique do ponto de vista económico, mas também social.
O segundo factor que destacaria é a estabilidade: social, económica e política. Há um País para fazer e a construção dessa visão assenta numa condição de conciliação. Não há melhor cartão de visita para o investimento estrangeiro – e Moçambique precisa deste investimento – do que um País que está concentrado no futuro e não no passado.
Acho que estamos a caminhar para aí. Os projectos começam a aparecer, a vontade de regressar a Moçambique existe. Temos de saber receber tudo isto e de alimentar essa vontade. Com a capacitação de pessoas, com a capacitação das instituições e, claro, com um desígnio comum.
João Gomes • Partner @BlueBiz joaogomes@bluebizconsultoria.co.mz
1Introdução Transformação digital não é download. É construção colectiva. Neste artigo, convido os meus leitores/as a responderem à seguinte pergunta: como transformar digitalmente uma região, e depois o país, sem importar soluções prontas a servir?
Financiado pela Cooperação Italiana no âmbito da Iniciativa DigIT, o Programa MDITecHub1 nasce como um laboratório vivo de futuro, onde jovens, professores, startups e instituições vão experimentar, testar e consolidar o que será o ecossistema digital de Moçambique nos próximos anos.
Este artigo complementa dois textos que escrevi nesta coluna, com o título: - Africanicidade Como Diferencial Competitivo Para o Sucesso dos Negócios (I e II, notas2 e 3).
2. O que o país quer (PESI) e o que o MDITecHub entregará
O Programa Estratégico para a Sociedade da Informação (PESI 2019-2028) traça prioridades claras: educação digital, governação electrónica, conectividade e estímulo ao empreendedorismo tecnológico. O MDITecHub surge como um acelerador operacional destas prioridades traduzindo intenções em acções concretas:
• Formação de centenas de jovens em vários níveis, desde as competências digitais básicas até à programação avançada;
• Sensibilização de milhares de estudantes do ensino secundário para STEM4, evitando que o talento feminino abandone cedo as ciências;
• Incubação de ideias digitais, incluindo as criadas por jovens em situação de vulnerabilidade ou com deficiência;
• Serviços digitais co-criados, através de hackathons e de um marketplace anual, que juntam Governo, sociedade civil e startups.
Cria, Conecta, Transforma — O Programa MDITecHub
Em vez de números frios, pensemos em rostos: uma estudante do secundário que descobre a programação num clube TIC, um jovem com deficiência que lança a sua primeira startup digital, um funcionário público que aprende a redesenhar serviços com base em dados reais. São estas histórias que o MDITecHub quer multiplicar
3. Quanto, onde e quando
Com um investimento de 2 milhões de euros, o MDITecHub terá uma duração de 32 meses (Fev. 2025 – Jul. 2027) e será implementado na Grande Maputo. Não é apenas um projecto: é um teste de modelo, que poderá ser replicado noutras províncias e países.
“Se é escola, instituição pública, empresa ou jovem faça parte desta transformação”
4. Teoria da Mudança de Lewin: descongelar, mudar, (re)congelar
Kurt Lewin5 dizia que mudar implica três fases: descongelar, mudar e (re)congelar. O MDITecHub traduz esta teoria em prática, apoiando-se em quatro pilares: TecHub físico, capacitação, startups & MPME e serviços digitais.
a. Descongelar — alinhar visão, abrir caminhos, reduzir fricção. Antes de inovar, é preciso expor as falhas do status quo. O MDITecHub descongelará velhos padrões com:
• Estudos do ecossistema digital: micro-observatórios, análises de mercado e identificação de lacunas de competências.
• Campanhas nas escolas e universidades: mais de 25 000 jovens sensibi-
lizados para a importância das STEM e uso seguro das TIC.
• Inclusão digital activa: um fundo de acessibilidade garante vouchers e transporte para estudantes vulneráveis, incluindo pessoas com deficiência.
Este “descongelar” já nos revela um diagnóstico claro: exclusão digital, défice de competências e fragilidade no uso social das tecnologias.
b. Mudar — executar, formar, incubar, co-criar
A fase de mudança já está a ser marcada pela acção, por experiências e criação de alternativas:
Pilar 1 | Operação do MDITecHub: expansão física do espaço6 (pré-incubadora/incubadora/aceleradora), equipa contratada e treinada (governação + pré-incubação + incubação + aceleração), webinars (40) e weeklab (3); assistência técnica local.
Pilar 2 | Formação massiva: formação de professores, cursos de literacia digital e de programação avançada, MOOC7, estágios TIC e hackathons. Jovens, mulheres e pessoas com deficiência ocupam o centro.
Pilar 3 | Startups e MPME: competições de planos de negócio, pré-incubação, incubação e aceleração dedicadas ao sector digital.
Pilar 4 | Serviços de utilidade social: hackathons anuais, pré-incubação e incubação de serviços digitais que respondem a necessidades públicas priorizadas no marketplace de ideias e negócios. Aqui, a mudança acontecerá no terreno, com resultados visíveis e métricas claras. c. (Re)congelar o nível alcançado — institucionalizar, medir, escalar Qualquer inovação corre o risco de evaporar-se. O MDITecHub apostará no “(re)congelar” através de:
• Integração com o PESI (2019-2028), assegurando que os avanços não são paralelos, mas parte da política pública nacional.
• Parceria público-privada em acção: consórcio internacional (CIES, CIUEM, CA Inovação, PoliMi, FPM)
O MDITecHub é uma actividadepiloto porque quer testar sete inovações sistémicas
já está a partilhar gestão, execução, monitorização e avaliação. É um novo modelo de governança colaborativa de techubs.
• Produção de materiais didácticos e MOOC permanentes, garantindo reutilização e escalabilidade.
• Clubes TIC em escolas secundárias, sustentados por professores capacitados.
5. Porquê testar transformação digital?
O MDITecHub é uma actividade-piloto porque quer testar sete inovações sistémicas:
1. Parcerias público-privadas (PPP) em 360º, da concepção à avaliação;
2. Inclusão radical, colocando jovens vulneráveis e pessoas com deficiência no centro;
3. Longa cauda, intervindo cedo em escolas e universidades;
4. Advocacia STEM, para não perder talento feminino;
5. Sustentabilidade embutida, com formação de formadores (ToT), clubes TIC e materiais reutilizáveis;
6. Internacionalização com raízes locais, PoliMi traz excelência, CIUEM e CA Inovação traduzem-na para o contexto local;
7. Africanicidade, transformando cultura, símbolos e pertença em vantagem competitiva e adesão. Mais do que metas e relatórios, o que se pilota aqui é uma forma diferente de fazer política pública digital: colaborativa, inclusiva e enraizada.
6. Conclusão
Começámos com uma provocação: transformação digital não é download. É construção colectiva. O Programa MDITecHub resume este princípio: transforma diagnósticos em acção, acção em resultados e resultados em rotinas sustentáveis. Mostra que é possível criar localmente, conectar talentos e instituições e transformar contextos com parcerias sólidas, inclusão e cultura própria.
Ao longo do artigo, vimos que transformar um país não se faz apenas com tecnologia. Faz-se com pessoas, instituições fortes, parcerias sólidas e coragem para mudar. A transição digital não será importada pronta, nem copiada de fora: será construída aqui, com africanicidade, adaptando metodologias globais à nossa realidade.
O MDITecHub mostra como isso acontecerá: ao descongelar diagnósticos de exclusão e défice de compe-
tências; ao mudar práticas com formação, incubação de startups, hackathons e serviços digitais co-criados; e ao (re) congelar modelos novos que se integram no PESI e permanecem no sistema através de ToT, clubes TIC e produção de conteúdos reutilizáveis.
A sua força está nas PPP robustas, que asseguram governação partilhada, monitorização e avaliação transparente. Está na inclusão radical, que torna PCD e jovens vulneráveis protagonistas da mudança. Está também na longa cauda de impacto, que começa nas escolas secundárias, passa pelas universidades e chega ao mercado de trabalho e ao empreendedorismo.
Tudo isto com um diferencial competitivo: a africanicidade como vantagem. Incorporar sentidos, espiritualidade e pertença nas experiências de aprendizagem e nos serviços digitais é o que aumentará adesão, retenção e orgulho — e o que fará do MDITecHub um projecto enraizado, não importado.
Os resultados esperados são claros: talento formado, soluções incubadas e serviços digitais inclusivos, sustentados por rotinas de parceria público-privada que ficam para além do tempo do projecto.
O convite que aqui faço8 é directo: se é escola, universidade, instituição pública, empresa ou jovem faça parte desta transformação. Traga alunos/as para as campanhas STEM, proponha desafios ao marketplace de ideias e negócios, candidate-se a estágios, hackathons, pré-incubação, incubação ou aceleração. A região da Grande Maputo não será apenas consumidora de tecnologia. Será produtora, criadora e exportadora de soluções.
O futuro digital de África não espera: Cria. Conecta. Transforma.
1 Para saber mais sobre o Programa MDITecHub: https:// tinyurl.com/mr27dtv9
4 Acrónimo STEM: Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática.
5 LEWIN, Kurt. Frontiers in group dynamics. Human Relations, v. 1, n. 1, p. 5-41, 1947. DOI: https://doi. org/10.1177/001872674700100103
6 A incubadora de negócios da UEM – Universidade Eduardo Mondlane.
7 MOOCS (Massive Online Open Courses): Cursos online abertos e massivos.
8 Como Coordenador Geral do Programa MDITecHubdigit.coordination@cies.it
Um Retrado ao Mercado dos ‘Likes’ em Moçambique
Empresas, pequenos empreendedores e cidadãos recorrem cada vez mais às redes sociais como ferramentas de comunicação, mas o acesso continua restrito. O que parece ser um espaço aberto e democrático ainda carrega marcas de elitização e desigualdade. Será Moçambique capaz de alargar esta janela digital para todos?
Celso Chambisso • Fotografia D.R.
Em Janeiro de 2025, o País contava com cerca de 3,70 milhões de utilizadores activos nas redes sociais, o equivalente a 10,5% da população. A distribuição de género reforça desigualdades: 59% dos utilizadores são homens e 41% mulheres, reflexo de barreiras socioeconómicas e culturais. Embora a taxa de utilização global seja baixa face aos valores internacionais, traduz uma trajectória de crescimento constante, espelhando a presença cada vez mais forte do digital na vida quotidiana dos moçambicanos. Os dados constam do relatório “Digital 2025: Mozambique”, publicado pela DataReportal – uma referência mundial em estatísticas digitais, que compila dados de fontes como a GSMA Intelligence e plataformas sociais para oferecer uma visão sobre quem está ligado às redes ou não.
O documento indica que o acesso é quase exclusivamente feito por telemóvel (98% dos utilizadores), revelando tanto uma dependência em relação às operadoras como a limitação da Internet fixa, que é cara e restrita. Esta realidade impõe custos elevados e serviços instáveis a milhões de cidadãos, mas, ainda assim, as plataformas móveis têm sido ferramentas de inclusão digital.
No campo da publicidade digital, os números impressionam: mais de 4 milhões de pessoas podem ser alcança-
das por anúncios, concentradas sobretudo em zonas urbanas e nos segmentos com maior poder de compra.
Franco crescimento, mas com muita exclusão Apesar dos avanços, mais de 89% da população permanece fora das redes sociais, seja por falta de dispositivos, seja pela incapacidade de suportar os custos da Internet móvel. Esta exclusão digital constitui um dos maiores desafios do País: comunidades rurais perdem acesso a informações educativas e oportunidades de emprego, pequenos negócios ficam fora do mercado online e jovens empreendedores não conseguem divulgar os seus produtos ou ideias. O resultado é um efeito cumulativo que fragiliza a coesão social e limita o desenvolvimento económico, mantendo uma grande parte da população à margem do crescimento digital.
Mesmo assim, as redes sociais já movimentam a economia. Pequenos negócios e microempresas recorrem ao Facebook e ao Instagram como vitrinas digitais, rompendo barreiras logísticas e financeiras. O futuro do sector dependerá da redução dos custos de acesso, da melhoria da infra-estrutura e da promoção da inclusão, factores decisivos para que as redes deixem de ser espaços elitizados e passem a contribuir de forma efectiva para o desenvolvimento social e económico.
Na publicidade digital, mais de 4 milhões de pessoas podem ser alcançadas por anúncios, concentradas sobretudo em zonas urbanas e nos segmentos com maior poder aquisitivo
À lupa, o pulsar de cada plataforma
Nenhuma rede é igual a outra. Cada qual segue a sua própria dinâmica, reflectindo hábitos distintos de acesso e consumo de conteúdos digitais. O Facebook continua a ser a rede dominante em Moçambique, embora com variações recentes em alcance publicitário. Em Janeiro de 2025, contava com cerca de 4,73 milhões de utilizadores potenciais, o que corresponde a 12,6% da população total e cerca de 40% dos utilizadores de Internet no País. Apesar de não reflectir exactamente utilizadores activos mensais, estes números evidenciam a centralidade da rede na vida digital moçambicana. O Facebook é amplamente usado pela comunicação social, para divulgação de conteúdos e, cada vez mais, para negócios locais. A plataforma mantém uma audiência predominantemente masculina (59% homens e 41% mulheres) e continua a ser a principal rede para atingir públicos urbanos com maior poder de compra.
O Instagram apresenta uma escala menor, mas estratégica. Com cerca de 1,1 milhão de utilizadores activos no País, equivalente a 3,1% da população, a rede tem um alcance publicitário estimado próximo a este número. É particularmente popular entre jovens urbanos e destaca-se como espaço de expressão criativa, promoção de marcas pessoais e divulgação de pequenos negócios. O equilíbrio de género (aproximadamente 52% homens e 48% mulheres) e a presença de públicos segmentados tornam o Instagram numa plataforma essencial para estratégias de marketing digital, sobretudo nos sectores de moda, cultura e gastronomia.
O TikTok, por sua vez, confirma a sua rápida ascensão. Em Janeiro de 2025, a rede atingia 2,84 milhões de utilizadores
Texto
QUEM ESTÁ DENTRO, E QUEM FICA DE FORA?
Os homens são os que mais aproveitam as redes sociais, enquanto milhões permanecem à margem
Utilizadores activos nas redes sociais
QUAIS AS REDES QUE PESAM MAIS... E MENOS?
Facebook, TikTok, Instagram e LinkedIn mostram diferentes níveis de alcance e participação, revelando quem domina e quem ainda fica de fora do universo digital em Moçambique
3,70 milhões (10,5% da população total)
mil membros (2,2% da população
Enquanto a rede fixa caminha para maior eficiência, a Internet móvel mostra sinais de regressão, ampliando o risco de exclusão para milhões de cidadãos que dela dependem
acima dos 18 anos, cerca de 8,3% da população total, e representava aproximadamente 22% dos utilizadores de Internet. O TikTok é caracterizado por uma audiência jovem, na sua maioria abaixo dos 30 anos, e desempenha um papel central na criação e difusão de tendências culturais e de consumo. Com 56% de homens e 44% de mulheres, a rede torna-se também uma plataforma de oportunidade para empreendedores e criadores de conteúdo que buscam visibilidade rápida e engajamento directo com o público.
O relatório destaca que, juntas, estas três plataformas reflectem diferentes facetas da transição digital moçambicana: o Facebook representa maturidade e centralidade, o Instagram actua como vitrina segmentada; e o TikTok impulsiona inovação, criatividade e tendências emergentes. Ao observar cada rede, é possível compreender melhor os padrões de acesso, consumo e produção de conteúdos digitais, bem como os desafios de inclusão e democratização do ecossistema online.
LinkedIn, a porta para o sucesso profissional
Em Moçambique, cada vez mais profissionais descobrem no LinkedIn uma plataforma capaz de transformar carreiras. Vejamos um exemplo: Eugénio Boene,
técnico de manutenção de equipamentos, partilhou os seus projectos na rede e acabou por ser recrutado pela multinacional Kenmare em apenas três meses. Histórias como esta ilustram a procura crescente por qualificação e a valorização de uma rede que se tornou símbolo de especialização e oportunidades.
Apesar de ter uma penetração relativamente baixa na população total, o LinkedIn continua a ser um espaço relevante para profissionais, para oportunidades de negócio e construção de redes de contacto, consolidando-se como a principal plataforma de carácter profissional em Moçambique.
No início de 2025, o Linkedin contava com cerca de 760 mil membros registados, o que correspondia a 2,2% da população total e aproximadamente 4,4% da população adulta (maiores de 18 anos). Entre os internautas locais, o LinkedIn alcançava 10,9% da base total de utilizadores de Internet.
A rede tem apresentado um crescimento consistente: ao longo de 2024 registou um aumento de 150 mil membros (+24,6%). O perfil demográfico da plataforma é predominantemente masculino, com 68,4% de homens e 31,6% de mulheres. Estes números baseiam-se no total dos membros registados e não reflectem necessariamente a actividade mensal dos utilizadores.
A qualidade da Internet não tem ajudado
O relatório aponta que, em Janeiro, os utilizadores de Internet em Moçambique enfrentavam uma realidade contrastante no que respeita à velocidade de ligação. A Internet móvel, que, no País, continua a ser o principal meio de acesso à rede mundial, registou uma velocidade mediana de 12,6 Mbps, uma queda acentuada de 36,3% em comparação com o início de 2024. Esta redução levanta preocupações, sobretudo porque a maioria dos moçambicanos depende do acesso móvel para navegar, comunicar e trabalhar online.
Por outro lado, a Internet fixa mostrou sinais de evolução, atingindo uma velocidade mediana de 16 Mbps (ainda assim, um valor baixo para os padrões internacionais), o que corresponde a um crescimento de 22,5% no período de um ano. Embora o acesso fixo continue limitado a áreas urbanas e a utilizadores com maior poder de compra, a melhoria indica algum avanço na infra-estrutura e no investimento do sector.
O cenário sugere, portanto, um paradoxo: enquanto a rede fixa caminha para maior eficiência, a Internet móvel (essencial para a inclusão digital) mostra sinais de regressão, ampliando o risco de exclusão para milhões de cidadãos que dela dependem quase em exclusivo.
Ligações crescem, mas ainda longe da inclusão
Segundo a GSMA Intelligence, Moçambique contava, no início de 2025, com cerca de 17,7 milhões de ligações móveis activas, número equivalente a 50,4% da população total. Embora elevado, este indicador não significa que metade dos moçambicanos esteja efectivamente ligada, já que muitas pessoas utilizam mais que um cartão SIM (um para uso pessoal e outro para o trabalho, por exemplo), prática que, com a chegada dos eSIM se tornou ainda mais acessível.
Apesar disso, o País ainda não atingiu a barreira simbólica de 100% de penetração móvel, e o último ano trouxe até uma ligeira retracção: menos 43 mil ligações (-0,2%) entre Janeiro de 2024 e Janeiro de 2025.
Um dado encorajador, no entanto, está no tipo de conectividade. Cerca de 88,4% das ligações são hoje consideradas de banda larga móvel, isto é, utilizam redes 3G ou 4G. Ainda assim, a estatística deve ser lida com cautela: ter acesso a estas redes não significa necessariamente usar Internet móvel, uma vez que muitos planos continuam limitados a chamadas de voz e SMS.
A Internet móvel é o principal meio de acesso à rede global
Transformação Digital Como Motor de Crescimento Para as Empresas
Diego Marconatto • Prof. de Mestrado e Doutoramento Profissional da FDC
Enquanto muitas economias emergentes ainda gatinham no caminho para a digitalização, Moçambique surge como um caso expressivo de como a transformação digital pode melhorar o ambiente de negócios e criar oportunidades surpreendentes para as empresas. Com os investimentos directos estrangeiros a crescerem 44,7% em 2025 e um ambicioso Plano Quinquenal da Digitalização (2025-2029), o País posiciona-se estrategicamente para se tornar num centro tecnológico na África Oriental.
A evidência é contundente: a província de Maputo atraiu mais de 2 biliões de dólares em investimentos nos últimos anos, consolidando-se como o principal pólo industrial e económico do País. Este crescimento não é mera coincidência, mas resultado de uma estratégia deliberada de modernização digital, que combina infra-estrutura robusta, políticas governamentais coordenadas e parcerias internacionais estratégicas.
O contexto de transformação acelerada
Moçambique vive um momento de viragem. O forte investimento público em infraestrutura digital, aliado a parcerias internacionais consistentes e a uma procura crescente por soluções tecnológicas, abre uma janela de oportunidade capaz de definir o futuro competitivo das empresas nacionais
Em 2025, o Governo moçambicano criou o Ministério das Comunicações e Transformação Digital, unificando as políticas de digitalização sob uma estrutura centralizada. Um ano antes, havia lançado a iniciativa “Internet para Todos”, com a meta de alargar o acesso à Internet dos actuais 20,7% da população para 100%, até 2030. Este esforço soma-se a um histórico de avanços: em 2021, o País já registava 65% de população adulta com conta de mobile money, evidenciando maturidade digital crescente.
Este não é apenas um projecto de inclusão digital, mas também uma estratégia de desenvolvimento económico. O programa VaMoz Digital, em parceria com a União Europeia (UE) e a União Internacional de Telecomunicações (UIT), prevê a criação de pólos tecnológicos em Nampula e Zambézia, descentralizando as oportunidades de inovação além da capital. Os números revelam a dimensão desta transformação, com mais de 6000 pontos de acesso à tecnologia 4G instalados, suportados por parcerias com operadoras como a Vodacom, Movitel e Tmcel. O sistema de mobile money alcançou uma penetração impres-
sionante, com 65% da população adulta a ter uma conta em 2021, sendo este um indicador de maturidade digital que supera muitos países desenvolvidos.
A infra-estrutura digital como vantagem competitiva
A infra-estrutura digital moçambicana representa uma oportunidade única para as empresas entrarem num mercado em expansão. O Banco Mundial aprovou 150 milhões de dólares para o Projecto de Governança Digital e Economia (EDGE), focado em conectividade, cibersegurança e regulação. Esta combinação de investimento público e privado cria um ambiente favorável para empresas que procuram estabelecer operações regionais.
A província de Maputo exemplifica esta convergência de factores, considerando 1086 indústrias transformadoras, rede de transportes desenvolvida, energia estável e gás natural acessível, oferecendo ainda condições ideais para empresas que precisam de infra-estrutura confiável. O Parque Industrial de Beluluane, com 25 anos de operação, emprega 12 mil trabalhadores e abriga mais de 50 empresas de 18 países, o que demonstra a viabilidade de operações industriais sofisticadas no País.
Os desafios como oportunidades de mercado
Há certas contradições e nuances marcantes no ambiente moçambicano. Embora o Índice de Robustez Empresarial tenha caído de 30% para 25% no último trimestre de 2024, reflectindo desafios como a escassez de divisas e os altos custos logísticos, o investimento directo estrangeiro cresceu consistentemente. Esta aparente contradição demonstra que investidores experientes reconhecem o potencial de longo prazo, apesar das dificuldades.
Estes desafios também podem ser vistos como oportunidades de diferenciação para as empresas. A escassez de divisas, por exemplo, favorece aquelas que conseguem operar com menor dependência de importações ou que oferecem soluções tecnológicas capazes de reduzir a necessidade de divisas. Já os elevados custos logísticos aumentam a procura por soluções de eficiência operacional e tecnologias de rastreamento.
“Este momento representa uma oportunidade de liderar a construção de uma economia digital africana a partir de Moçambique”
As oportunidades sectoriais prioritárias
A Agência para Promoção de Investimento e Exportações (APIEX) tem destacado como sectores prioritários para o País a agro-indústria, a industrialização ligeira, o agro-negócio e as infra-estruturas. Estes segmentos tendem a beneficiar directamente do avanço da conectividade digital e da expansão dos sistemas de pagamento electrónicos em Moçambique. O sector agrícola moçambicano oferece um potencial notável. Com 1,2 milhão de hectares de terra arável, dos quais 50% disponíveis para investimento, o País necessita de tecnologias de agricultura de precisão, sistemas de irrigação inteligente e plataformas de comercialização digital, soluções que empresas moçambicanas podem oferecer.
A estratégia de entrada no mercado digital
Para empresas interessadas em explorar oportunidades em Moçambique, há três
frentes estratégicas que merecem destaque. A primeira é aproveitar as parcerias governamentais já em curso, especialmente as que estão alinhadas com o Plano Quinquenal da Digitalização, que prevê a integração de serviços públicos e cria procura por soluções de interoperabilidade, gestão e pagamentos digitais.
A segunda é o posicionamento nos corredores logísticos estratégicos — como o corredor Maputo (N4), que liga o país à África do Sul, Essuatíni e Zimbabué através dos portos de Maputo e Matola, alargando o acesso a mercados regionais. Por fim, a terceira frente envolve o aproveitamento das lacunas de capacitação digital, na qual existe uma forte necessidade de literacia tecnológica, formação profissional e soluções em software e consultoria.
O momento estratégico para as empresas nacionais Moçambique vive um momento de vi-
ragem. O forte investimento público em infra-estrutura digital, aliado a parcerias internacionais consistentes e a uma procura crescente por soluções tecnológicas, abre uma janela de oportunidade capaz de definir o futuro competitivo das empresas nacionais. Quem apostar agora em capacitação digital e inovação tecnológica estará à frente, com possibilidades de liderar um mercado que cresce num ritmo acelerado.
Para as empresas moçambicanas, principalmente as que têm capacidade de adaptação e visão de longo prazo, este momento representa mais do que uma oportunidade de crescimento; é uma possibilidade de liderar a construção de uma economia digital africana a partir de Moçambique.
Com investimento em tecnologia, formação de equipas e parcerias estratégicas, as empresas nacionais estão posicionadas para se tornarem protagonistas dessa transformação.
Energia, Talento, Visão — Standard Bank no Centro da Transformação da Economia Moçambicana
A10.ª edição da Mozambique Gas & Energy Summit & Exhibition, realizada em Maputo, nos dias 22 e 23 de Setembro, voltou a colocar o País no centro das atenções do sector energético global. O encontro reuniu empresários, investidores, decisores e profissionais para debater o futuro da energia e das infra-estruturas nacionais, num contexto em que o gás natural liquefeito (GNL) se assume como motor de desenvolvimento e instrumento de transformação económica.
Entre os protagonistas, o Standard Bank destacou-se pela visão integrada apresentada nas diferentes sessões, nas quais se cruzaram as agendas da inclusão social, da segurança energética, do investimento global e da competitividade empresarial — pilares que o banco elege como essenciais para um futuro sustentável em Moçambique.
Na sessão de abertura da cimeira, o Administrador Delegado do Standard Bank, Bernardo Aparício, reafirmou o compromisso do banco com o progresso das infra-estruturas críticas para a conectividade regional, sublinhando que “o apoio ao sector é mais do que uma prioridade, faz parte do nosso ADN.”
Inclusão e emprego: o talento existe
A abertura do debate veio de Sasha Vieira, Directora de Operações do Standard Bank, que defendeu uma nova narrativa sobre o emprego e as competências no País.
“O talento existe”, afirmou com convicção, recordando que, no último programa de graduados do banco, mais de 4000 jovens moçambicanos concorre-
Texto e Fotografia • M4D
ram para apenas 50 vagas. “Foi difícil escolher os 50 finais”, sublinhou, realçando que o verdadeiro desafio não está na ausência de capacidades, mas em ligar o talento existente às oportunidades.
Um exemplo concreto disto é a forma como identificámos talentos de excelência para o nosso programa de desenvolvimento de graduados. Identificámos talentos em todas as províncias e os trazemos para Maputo, onde fica a nossa Sede. “Particularmente, tenho graduados de Pemba, Lichinga, Nampula e Sofala na minha equipa”. Esta iniciativa promove uma diversidade de perspectivas e garante oportunidades iguais para todos os moçambicanos.
Vieira defendeu igualmente uma agenda activa de equidade e inclusão de género. “Na nossa equipa de tecnologia, temos ainda muito poucas mulheres. Por isso, estamos a investir em competências STEM e a patrocinar certificações profissionais para elevar o nível do mercado.”
“A oportunidade não é infinita. Existem hoje 23 projectos em construção no mundo que vão colocar no mercado 200 milhões de toneladas anuais de GNL. Se até 2030 houver excesso de oferta, Moçambique poderá perder espaço”
O Standard Bank foi o patrocinador exclusivo da Cimeira Africana de Portos, Logística e Infra-estruturas, realizada em Maputo, como evento paralelo à 10.ª edição da Mozambique Gas & Energy Summit & Exhibition
A executiva alargou a reflexão ao ecossistema empresarial, reforçando que “existe um mito comum de que as grandes multinacionais de Oil & Gas resolverão, por si só, os elevados índices de desemprego em Moçambique”. No entanto, a solução está nas oportunidades geradas por toda a cadeia de valor – desde as empresas EPC (Engenharia, Aquisição e Construção) até ao nível mais local. É no fortalecimento desta cadeia completa que se encontra a verdadeira chave para a geração massiva de emprego. “É por isso que a nossa Incubadora é uma parte fundamental dos pilares estratégicos do banco, uma vez que não só apoia o crescimento das empresas moçambicanas, mas também, indirectamente, potencia a visibilidade de talento e oportunidades de emprego”, concluiu.
Segurança energética com janela temporal limitada
A dimensão social e empresarial ganhou uma perspectiva geoestratégica com Ziyad Adam, Director de Energia e Infra-estruturas do Standard Bank. “O contexto global da energia está extremamente volátil”, afirmou, apontando para os efeitos da guerra na Ucrânia e das tensões no Médio Oriente. “A Europa deixou de depender do gás russo e já investiu em nove unidades flutuantes de regaseificação. Isso cria um espaço único para novos fornecedores, e Moçambique está no centro dessa oportunidade.”
Segundo Adam, o País tem um GNL de alta qualidade, competitivo e valorizado no mercado internacional. Contudo, deixou um alerta: “A oportunidade não é infinita. Existem hoje 23 projectos em construção no mundo que vão colocar no mercado 200 milhões de tone-
ladas anuais de GNL. Se até 2030 houver excesso de oferta, Moçambique poderá perder espaço.”
Para o executivo, o sucesso da indústria depende também da integração social e económica das comunidades locais. “Quando integramos essas comunidades no mercado de trabalho, reduzimos a vulnerabilidade à insurgência e reforçamos a segurança dos projectos”, afirmou.
Investimento global: deixar o canto inferior esquerdo
A abordagem macroeconómica coube a Paul Eardley-Taylor, responsável pelo sector do gás no Standard Bank. Com um gráfico em mãos, resumiu a ambição de transformar Moçambique num actor energético de escala global. “Não existe país rico que não tenha uma elevada procura de energia. O nosso trabalho é levar os mercados africanos do canto inferior esquerdo para o canto superior direito”, referiu.
Eardley-Taylor apresentou dados elucidativos: em 2016, a procura global de gás natural era de 256 milhões de toneladas; em 2023 atingiu 411 milhões — um aumento de 160 milhões em apenas oito anos. Quando o Mozambique LNG e o Coral Norte entrarem em operação, o mercado poderá ultrapassar os 600 milhões de toneladas anuais,
“Há 23 projectos em construção no mundo que vão adicionar 200 milhões de toneladas de GNL. Se até 2030 houver excesso de oferta, Moçambique poderá perder espaço.”
— Ziyad Adam, Director Executivo de Energia e Infra-estruturas
“A logística é o coração da economia moçambicana. Existem inúmeras oportunidades, mas é preciso reforçar competências e preparar empresas para competir em qualidade, escala e eficiência.”
— João Guirengane, Director da Banca Corporativa e de Investimentos
com projecções que rondam 700 milhões até 2040. Parte desse gás, sublinhou, será consumido dentro do continente africano. “A África do Sul vai perder entre 8 e 10 gigawatts de energia produzida através do carvão nos próximos cinco anos e terá de importar o equivalente a 8 a 10 milhões de toneladas de GNL.”
Infra-estruturas e logística: oportunidade sem limites
Se o gás é motor, as infra-estruturas são alicerce. Foi essa a mensagem de João Guirengane, Director da Banca Corpora-
tiva e de Investimentos do Standard Bank, durante a Cimeira Africana de Portos, Logística e Infra-estruturas de Moçambique. “O potencial do sector das infra-estruturas em Moçambique é praticamente ilimitado”, afirmou. “A logística é o coração da economia moçambicana, e existem inúmeras oportunidades para empresas locais entrarem neste mercado.”
Mas deixou também um aviso: “O aproveitamento dessas oportunidades depende do reforço de competências e da preparação das empresas para competir em qualidade, escala e eficiência.”
Um banco, várias agendas, um objectivo
Da inclusão social à segurança energética, do investimento global às infra-estruturas, a mensagem foi clara: o Standard Bank vê-se não apenas como financiador, mas como parceiro estratégico do desenvolvimento de Moçambique.
“Temos uma incubadora, apoiamos PME, formamos pessoas e trabalhamos com operadores para capacitar a população. O nosso papel é ajudar a criar um futuro sustentável”, concluiu Ziyad Adam.
É essa conjugação — financiamento, conhecimento e visão de longo prazo — que coloca o Standard Bank “no centro da agenda de transformação econó-
Sacha Vieira, Directora de Operações do Standard Bank
Coral Norte Quer Colocar País como
3.º Maior Produtor
Africano
Depois do sucesso da exploração e liquefacção de gás em alto mar com a plataforma Coral Sul –uma feito mundial, em água ultraprofundas – o consócio da Área 4 formalizou o investimento que a E&M já havia detalhado: em 2028, a Coral Norte inicia produção
Texto Redacção • Fotografia DR
Há um prazo assinalado no calendário. “Apontamos para 2028: dentro de três anos, vamos iniciar a produção. É um compromisso, não se trata apenas de conversa.” O director-executivo da petrolífera Eni, Claudio Descalzi, foi muito claro durante a assinatura da decisão final de investimento (FID) da segunda plataforma flutuante da bacia do Rovuma, baptizada de Coral Norte, por 7,2 mil milhões de dólares (6,2 mil milhões de euros). A cerimónia decorreu a 2 de Outubro, em Maputo. O líder da petrolífera italiana, que já opera a plataforma flutuante (gémea idêntica) Coral Sul, garante que aquela “fará de Moçambique o terceiro maior produtor de gás natural liquefeito (GNL) em África”, depois da Nigéria e da Argélia, duplicando a actual produção do País (que depende apenas da Coral Sul), para sete milhões de toneladas anuais (mtpa).
Segundo Descalzi, Moçambique “está também a posicionar-se na transição energética” global. “Ao longo deste ca-
minho, qualquer um de nós é um parceiro a longo prazo empenhado no crescimento e na prosperidade do País”, garantiu, recordando: só a Coral Sul “já entregou com sucesso mais de 120 cargas de GNL desde o ‘primeiro gás’ em 2022.” Graças um desenho “inovador” e a um “desempenho de produção consistente”, a Coral Sul tem sido responsável pelo crescimento do PIB do País e pela criação de emprego. “Partindo desta base sólida”, a Coral Norte, enquanto “réplica melhorada da Coral Sul, irá agora alargar ainda mais estes benefícios, provando que o processamento flutuante de GNL é uma solução rápida, competitiva e fiável.” “Há alguns anos (cinco ou seis), toda a gente dizia que isso era impossível. Agora já estamos no segundo projecto”, apontou.
A importância de um projecto estruturante
O novo projecto Coral Norte deverá gerar 23 mil milhões de dólares em receitas fiscais para Moçambique ao longo dos 30 anos de operação, duplicando os postos de trabalho da primeira plataforma e
Como “réplica melhorada da Coral Sul”, a nova plataforma “vai alargar os benefícios, provando que o processamento flutuante de GNL é uma solução rápida, competitiva e fiável”
O arranque do investimento foi formalizado a 2 de Outubro, em Maputo
prevendo um orçamento de três mil milhões de dólares em contratos para empresas locais. Da negociação com o Governo moçambicano ficou ainda definida, contratualmente, “a disponibilização de gás natural ao mercado doméstico na proporção de 25% do total do gás a ser produzido” e 100% do condensado para a produção de electricidade, permitindo o “desenvolvimento de projectos de industrialização” do País.
Recorde-se: Moçambique tem outros dois megaprojectos aprovados para exploração das reservas de gás da bacia do Rovuma: um da TotalEnergies (13 mtpa), em fase de retoma, após a suspensão devido a ataques terroristas na região, e outro da ExxonMobil (18 mtpa), que aguarda decisão final de investimento, ambos na península de Afungi.
PR aponta para “oportunidade única”
O Presidente da República, Daniel Chapo, apontou o orçamento de três mil milhões de dólares em contratos para empresas locais como “uma oportu-
NÚMEROS
DO PROJECTO CORAL NORTE
A nova plataforma vai ser construída no mesmo estaleiro da Coral Sul pela Samsung Heavy Industries (SHI), em Geoje (Coreia do Sul)
30 anos
Prazo previsto de operação
23
mil milhões de dólares
Previsão de receitas fiscais
3
mil milhões de dólares
Previsão de contratos para empresas locais
nidade única” para o tecido empresarial nacional. “É esta a nossa visão, por isso criámos vários fundos, entre os quais o Fundo de Garantia Mutuária para que as pequenas e médias empresas nacionais possam fortificar-se e aproveitar esta oportunidade de negócio”, disse Chapo.
O projecto Coral Norte “não é apenas uma obra de engenharia”, mas também uma “esperança para o povo moçambicano”, por chegar “num momento em que Moçambique enfrenta desafios macroeconómicos e sociais importantes”, como “pressões” na balança de pagamentos, “necessidade urgente de criação de emprego” e o “imperativo de diversificação” da economia. O projecto Coral Norte “deve ser um pilar de estabilidade económica e social de Moçambique, um catalisador de industrialização e um instrumento de prosperidade inclusiva entre os moçambicanos”, defendeu o chefe do Estado. O Presidente considerou ainda necessário “assegurar que o gás doméstico e o condensado cheguem nas quantidades acordadas e
ENI VAI REFORÇAR PRODUÇÃO DE ELECTRICIDADE
Na mesma cerimónia, o Presidente Daniel Chapo anunciou um acordo com a Eni para a construção de uma central térmica de 75 MW no sul do País, um investimento de 130 milhões de dólares.
“Esta central será construída em Temane, na província de Inhambane”, onde está a ser construída também uma central de 450 MW. “Vamos ter mais 75 MW através da Eni. Este empreendimento reforçará a capacidade nacional de produção de energia, contribuindo para a segurança energética e para a dinamização da nossa economia”, destacou.
“Outro sinal do compromisso da Eni com o futuro do nosso país é o investimento no desenvolvimento da cadeia de produção de biocombustíveis, através do fomento da produção agrícola.
Este projecto terá um impacto social profundo em Moçambique, ao gerar emprego e renda para milhares de famílias camponesas que integrarão a cadeia de fornecimento”, acrescentou o Presidente da República.
a preço acessível” às indústrias e famílias moçambicanas, garantindo igualmente a sustentabilidade da petrolífera estatal ENH.
Empresários querem preparação à altura
Em comunicado, os empresários moçambicanos pediram uma melhor preparação para fornecer serviços ao novo megaprojecto Coral Norte. “Este investimento constitui um sinal de confiança dos investidores internacionais e de esperança renovada para os moçambicanos. O projecto melhorará directamente as condições de vida de cerca de 100 mil pessoas em Cabo Delgado, através da dinamização económica, criação de emprego e fortalecimento das cadeias produtivas locais”, lê-se no documento divulgado pela Confederação das Associações Económicas (CTA) de Moçambique. “Este é o momento apropriado para que o sector privado moçambicano se prepare e se capacite, tornando-se competitivo e integrado nas cadeias globais de fornecimento”, defendeu a CTA.
WEB
Pesquisa Com IA Reduz
Tráfego Humano Nas
Páginas da Wikipédia em 8%
A fundação Wikimedia está a identificar mudanças de tráfego ao longo deste ano, com picos elevados de procura que são feitas por contas automatizadas (‘bots’). São contas que recolhem conteúdos para alimentar os modelos de inteligência artificial e novos motores de busca impulsionados por aquela tecnologia.
Trata-se de uma mudança de tendência que levou a fundação a actualizar os seus sistemas de detecção de tráfego, especialmente à medida que os bots se tornaram mais sofisticados em ultrapassar as medidas de detecção.
Desde Abril que as páginas da Wikipédia registam um declínio de 8% no número de visitas feitas por humanos.
Apesar disso, a fundação admite que as mudanças não são inesperadas, devido às variações que envolvem a pesquisa online, não apenas pela implementação de serviços baseados em IA generativa, como o modo IA do Google ou os ‘chatbots’ como o ChatGPT.
“Os LLM [modelos de linguagem em grande escala] devem promover o acesso aberto para que o conhecimento gratuito possa continuar a fluir de forma sustentável”, refere o blogue oficial.
A fundação Wikimedia está a trabalhar em novas políticas, estruturas e capacidades técnicas para que terceiros possam aceder e reutilizar responsavelmente o conteúdo da Wikipédia em grande escala.
ACADEMIA
Faculdade de Engenharia da UEM Moderniza o Ensino Com Equipamentos Robóticos
A Faculdade de Engenharia da Universidade Eduardo Mondlane recebeu novos equipamentos de última geração nas áreas de electrónica, hidráulica, informática e robótica, com o objectivo de modernizar o ensino e aproximar o País da transformação digital. Avaliada em cerca de quatro milhões de dólares e financiada pelo Banco Mundial, a aquisição integra o projecto do Centro de Excelência de Ensino de Engenharia, destinado a modernizar laboratórios e reforçar a qualidade da formação, com destaque para o
LOGÍSTICA
desenvolvimento de sistemas robóticos. O projecto contempla várias fases. Na primeira, foram entregues equipamentos informáticos; seguem-se materiais laboratoriais, incluindo seis robôs, sistemas de transmissão de calor, dispositivos hidráulicos e pneumáticos, bobinagem e equipamentos eléctricos.
Nos próximos meses serão distribuídos novos lotes destinados à área automóvel e à produção de biodiesel a partir de diferentes sementes, para aplicação em diversos tipos de motores.
Cleiton Michaque Lança Drones Para Serviços de Entregas
O jovem moçambicano Cleiton Michaque apresentou um novo drone capaz de entregar encomendas em 30 minutos, dispensando a necessidade de monitorização ou piloto. Depois de ter criado, em 2024, um modelo voltado para o mapeamento de zonas afectadas por desastres naturais, Michaque anuncia uma proposta que visa reduzir o tempo e os custos das entregas.
Segundo o criador, o dispositivo foi pensado para apoiar empresas que actuam no sector da logística, permitindo um serviço mais rápido e flexível, mesmo em locais de difícil acesso ou congestionados.
Embora o uso de drones para entregas já seja uma realidade em países como a China e Estados Unidos e nalgumas nações europeias, a invenção de Michaque posiciona-se entre as primeiras do género de-
ENTRETENIMENTO
senvolvidas em Moçambique. O jovem, que já foi distinguido com o Prémio Jovem Criativo da Secretaria de Estado da Juventude e Emprego, ambiciona tornar-se no primeiro moçambicano a criar e comercializar veículos aéreos totalmente “Made in Mozambique”.
Spotify e Netflix Anunciam Parceria Para Transmissão de Podcasts em Vídeo
A Spotify e a Netflix anunciaram uma parceria que pretende disputar parte da audiência de videopodcasts dominada pela YouTube. A YouTube é reconhecida pela forte posição em podcasts em vídeo, o que levou estas plataformas a assumirem uma estratégia conjunta.
Com este acordo, a Spotify visa levar os seus conteúdos a mais plataformas, enquanto a Netflix pretende alargar a sua oferta de entretenimento através do formato de videopodcast. A parceria abrange uma selecção de podcasts em vídeo — já disponíveis na Spotify — que passarão a poder ser vistos também na Netflix. Apesar de não haver valores públicos, o lançamento nos EUA está agendado para início de
2026, com outros mercados internacionais a seguir-se.
“A Netflix está sempre à procura de novas formas de entreter os seus subscritores”, afirmou Lauren Smith, vice-presidente de licenciamento de conteúdos e estratégia de programação da Netflix.
Com a crescente popularidade dos videopodcasts, esta parceria permite oferecer programas emblemáticos nas áreas da cultura pop, estilo de vida, true crime e desporto. A selecção adiciona vozes novas e diferentes perspectivas, ajudando a Netflix a diversificar o seu catálogo. A oferta terá início nos Estados Unidos no início de 2026. A Netflix garante que, em breve, também será disponibilizada noutros países.
Dicas para uma viagem inesquecível às Cataratas Vitória
Um espectáculo natural que mistura força bruta, poesia e história 82
ESCAPE
Cataratas Vitória
VOLANTE Mazda CX-5
Um carro desenhado para dar mais espaço, conforto e utilidade 84
O primeiro Tawny com 20 anos lançado pela Boplaas 85
ADEGA Cape Tawny
AGENDA Novembro
Um guia para tudo o que não pode perder na agenda cultural (e não só) que aí vem 86
CATARATAS VITÓRIA
Visitar as Cataratas
Vitória é viver duas experiências diferentes num único destino.
Cataratas Vitória:
AS CATARATAS VITÓRIA, conhecidas pelos povos locais como Mosi-oa-Tunya –“a nuvem de fumo que troveja” –, foram descritas pela primeira vez, em 1855, pelo explorador escocês David Livingstone. No entanto, para as comunidades vizinhas, a imponência das cataratas já as caracterizava como um lugar sagrado muito antes da sua chegada.
Localizadas no Rio Zambeze, na fronteira entre o Zimbabué e a Zâmbia, estas quedas de água não são apenas uma paisagem de postal: são um espectáculo natural que mistura força bruta, poesia e história.
Com 1,7 quilómetro de largura e mais de 100 metros de altura, as Cataratas Vitória são a maior cortina de água do planeta. Durante a época das chuvas, entre Fevereiro e Julho, o Zambeze despeja ali milhões de litros por segundo, criando uma parede líquida que pa-
a Maior Cortina de Água do Planeta Está Aqui ao Lado
rece infinita. Uma névoa de gotículas chega a erguer-se a mais de 400 metros e pode ser vista a dezenas de quilómetros de distância.
Dois lados da mesma maravilha
Visitar as Cataratas Vitória é como viver duas experiências diferentes num único destino. Do lado do Zimbabué, encontra-se a clássica vista panorâmica. No Parque Nacional das Cataratas Vitória, uma rede de trilhos leva os visitantes a miradouros de onde se contemplam quedas como a “Devil’s Cataract” e a imponente “Main Falls”. A cidade de Victoria Falls, vibrante e turística, completa a experiência com mercados de artesanato, restaurantes e o charme colonial do Victoria Falls
As quedas de água surpreendem qualquer visitante
Hotel, onde um chá da tarde com vista para a ponte fronteiriça torna-se uma viagem no tempo.
Na Zâmbia, o contacto é mais próximo e visceral. A Ponte Knife-Edge leva o visitante para o “coração” da névoa, num percurso em que a roupa fica, inevitavelmente, molhada. É também daqui que se pode explorar a Ilha Livingstone, ponto de partida para a experiência mais radical: a Piscina do Diabo. Aberta apenas na estação seca (de Agosto a Dezembro), esta pequena piscina natural permite mergulhar literalmente na borda da catarata.
Mais que uma paisagem
As Cataratas Vitória não são apenas um espectáculo para os olhos. São também um território de aventuras e memórias inesquecíveis:
• há voos panorâmicos de helicóptero sobre a queda de água, baptizados como “O Voo dos Anjos”;
• safáris fotográficos no Parque Hwange (Zimbabué) ou no Parque Chobe (Botsuana) ficam a poucas horas de distância;
• o visitante dispõe de cruzeiros ao pôr-do-sol no Zambeze, entre elefantes, hipopótamos e crocodilos;
• “rafting”, tirolesas e “bungee jumping” na ponte que liga os dois países são actividades disponíveis para os mais destemidos.
Cada detalhe, desde os mercados coloridos até aos hotéis de luxo à beira-rio, faz parte da experiência de visitar este destino. É uma viagem que tanto fascina os aventureiros como encanta os turistas que procuram romance e contemplação.
Quando ir O calendário muda a experiência. Na época das cheias,
de Fevereiro a Julho, a imponência é arrebatadora, mas alguns trilhos ficam inacessíveis e há actividades como “rafting” ou a visita à Piscina do Diabo que não são possíveis. Já na estação seca, as cataratas perdem volume, mas revelam novas perspectivas, trilhos escondidos e outras oportunidades de aventura. Para muitos viajantes, Julho e Agosto oferecem um equilíbrio entre a força da queda de água e acessibilidade.
Os níveis de água diferem bastante ao longo do ano, no lado da Zâmbia. Quem visitar o país no final da estação seca, em Outubro, poderá questionar-se sobre o que há de tão especial, ao contemplar apenas um fio de água ou até mesmo rocha exposta.
A época de águas baixas decorre entre Setembro e Janeiro, quando os níveis descem durante o Inverno seco. Isto coincide com a época alta de safaris, até à chegada das chuvas da primavera, por volta de Novembro.
Como chegar a partir de Maputo
O percurso aéreo mais comum é Maputo - Joanesburgo - Victoria Falls (Zimbabué) ou Livingstone (Zâmbia). A viagem demora cerca de 5 a 6 horas, incluindo escalas. Chegando ao destino, o trajecto do aeroporto até ao centro da cidade ou aos hotéis dura entre 15 a 30 minutos.
Também é possível viajar por terra até Harare (Zimbabué) e depois seguir de autocarro ou avião para Victoria Falls, mas a distância (mais de 1200 km) torna essa opção longa e cansativa, sendo pouco indicada para estadias curtas.
Diferentes miradouros sobre as cataratas
Localizadas no Rio Zambeze, na fronteira entre o Zimbabué e a Zâmbia, estas quedas de água não são apenas uma paisagem de postal: são um espectáculo natural que mistura força bruta, poesia e história
Texto Ana Mangana
Fotografia Istock Photo
MAZDA CX-5
No que toca à segurança, o novo Mazda CX-5 está equipado com um amplo conjunto de sistemas avançados de assistência ao condutor
Terceira Geração do CX-5 Reforça Carácter Desportivo
O NOVO MAZDA CX-5, apresentado em Julho, representa a terceira geração deste popular SUV, com um design renovado, que segue a filosofia KODO Design: linhas elegantes, fluidas e uma presença mais desportiva e afirmativa.
O exterior apresenta um capô alongado, faróis mais largos com assinatura luminosa actualizada e uma grelha frontal com um padrão exclusivo redesenhado.
No interior, o habitáculo foi redesenhado para oferecer maior espaço, conforto e utilidade, com destaque para um ambiente limpo e focado no condutor, mas também pensado para a família.
A conectividade foi melhorada com um novo ecrã central sensível ao toque de 12,9 ou 15,6 polegadas, oferecendo interacção semelhante à de um “smartphone”, com menus personali-
záveis e integração Google - uma estreia para modelos Mazda.
O painel de instrumentos digital de 10,25 polegadas e controlos simplificados no volante garantem informações claras e intuitivas. As versões topo de gama contam ainda com sistema de som premium Bose, com 12 altifalantes, tecto panorâmico e iluminação ambiente nas portas dianteiras.
Motorização híbrida
Em termos de desempenho, o novo CX-5 é impulsionado por um motor a gasolina de 2,5 litros com tecnologia híbrida eléctrica, oferecendo 141 cv e um binário de 238 Nm, prometendo uma condução suave e resposta rápida ao toque no acelerador. O modelo está disponível com tracção dianteira (FWD) e
No interior, o habitáculo foi redesenhado para oferecer maior espaço, conforto e utilidade, com destaque para um ambiente limpo e focado no condutor
integral (AWD), com melhorias no chassis e suspensão para maior estabilidade e conforto de condução, além de uma capacidade de reboque até 2000 quilos. O SUV conta com modos de condução “normal” e “sport” para adaptar a experiência conforme o tipo de terreno ou preferência do condutor.
Opções e segurança de base
O espaço interno foi optimizado com uma distância entre eixos alargada, proporcionando mais espaço para passageiros e carga, que aumentou 61 litros, além de portas traseiras com abertura mais ampla e um banco rebatível. O interior oferece várias opções de acabamento, incluindo pele preta ou castanha, pele artificial bicolor e acabamento em feltro, variando conforme a versão. No que toca à segurança, o novo Mazda CX-5 está equipado com um amplo conjunto de sistemas de assistência ao condutor, tecnologias electrónicas que usam sensores e câmaras e radares para vigiar o ambiente circundante.
Permitem ajudar o condutor em operações de rotina e a prevenir colisões, visando uma classificação 5 estrelas na avaliação de segurança Euro NCAP, incluindo tecnologias de assistência activa e preventiva para maior tranquilidade no trânsito.
A terceira geração do Mazda CX-5 alia um design sofisticado e desportivo a uma condução confortável e dinâmica, tecnologia de ponta em conectividade e segurança, além de um interior espaçoso e versátil, consolidando-se como um dos SUV mais atractivos e completos da sua categoria para o público moderno e familiar.
Texto Ana Mangana Fotografia D.R
Cape Tawny Colheita 2005 é o primeiro Tawny com 20 anos lançado pela Boplaas. Com apenas 600 garrafas disponíveis, o vinho foi inicialmente oferecido aos membros do Boplaas Wine and Whisky Club e hoje está disponível ao público
O Sucesso de Castas Portuguesas e de Vinho
O RECÉM-LANÇADO Boplaas Colheita 2005 Tawny foi nomeado, pelo quinto ano consecutivo, como o Melhor Vinho Fortificado, na selecção de Tim Atkin, jornalista britânico especializado, no seu 13.º Relatório Especial sobre vinhos da África do Sul. O Reino Unidos tem uma importância histórica para a marca, sendo um destino de exportação da Boplaas desde 1880.
Reconhecimento contínuo em competições
O reconhecimento internacional tem raízes nacionais. Em Junho, a adega alcançou um hat-trick no National Wine Challenge (NWC/ Top 100 Wines), conquistando novamente o título de melhor da categoria. O Cape Tawny Colheita 2005 foi nomeado Grand Cru National Champion Best in Class para vinhos doces, reafirmando a consistência e qualidade da produção.
Outros rótulos também brilharam: o Cape Vintage Reserve 2023 e o Family Reserve Ring of Rocks 2022 receberam Double Platinum, entrando para a lista dos 100 melhores vinhos da competição. O Cape Vintage e o Touriga Nacional Family Reserve conquistaram Double Gold nas suas categorias.
Segundo Daniel Nel, director de marketing da Boplaas, “a plantação de castas portuguesas na década de 1970 e os anos de estudo sobre o vinho do Porto reflectem-se nestas conquistas, que são resultado de uma longa jornada de dedicação e inovação.”
Colheita 2005 Tawny: um marco histórico O Cape Tawny Colheita 2005 é o primeiro Tawny com 20
do Porto na África do Sul
anos lançado pela Boplaas. Com apenas 600 garrafas disponíveis, o vinho começou por ser oferecido aos membros do Boplaas Wine and Whisky Club e hoje está disponível ao público por 1600 rands (cerca de 5800 meticais) a garrafa. De perfil elegante, apresenta notas de frutos secos como figos e passas, combinadas com caramelo, mel e especiarias. O aroma revela camadas de casca de laranja, caramelo e especiarias quentes, enquanto o paladar é doce, suave e aveludado, com um final longo.
Tradição, inovação e liderança intergeracional
Os vinhos fortificados da Boplaas sempre foram liderados por Carel Nel, um veterano enólogo, mas hoje contam também com a visão e criatividade da sua filha, Margaux Nel, que tem consolidado a qualidade de toda a gama da adega.
A história da Boplaas está profundamente ligada às castas portuguesas. Na década de 1970, o patriarca Danie Nel plantou videiras que acreditava serem Shiraz, mas que mais tarde se revelaram ser Tinta Barroca. Essa descoberta, confirmada por professores da Universidade de Stellenbosch, abriu caminho para a produção de vinhos fortificados com inspiração portuguesa. Distinguindo-se dos estilos locais mais doces, a Boplaas foi pioneira em vinhos fortificados mais secos, alinhados com a tradição de Portugal.
Filosofia de produção e ligação à terra
De acordo com Tim Atkin, os melhores enólogos sul-africanos são aqueles que respeitam a terra, as vinhas e o carácter único de cada colheita. Para ele, “o lugar é indiscutivelmente mais importante do que o estilo ou a casta.” A filosofia da Boplaas reflecte exactamente isso: vinhos que contam a história do clima e do solo de Calitzdorp, com flexibilidade e consistência, mesmo perante os desafios de cada safra.
Disponibilidade e acesso
Os vinhos, portos e bebidas espirituosas da Boplaas estão disponíveis em lojas de retalho de qualidade em toda a África do Sul, bem como para encomenda online em boplaas.co.za. Quem se inscreve como membro do Boplaas Wine and Whisky Club tem acesso antecipado a lançamentos exclusivos e benefícios adicionais.
Texto Ana Mangana Fotografia D.R
A história da Boplaas está profundamente ligada às castas portuguesas. Na década de 1970, o patriarca Danie Nel plantou videiras que acreditava serem Shiraz, mas que mais tarde se revelaram ser Tinta Barroca.
AGENDA NOVEMBRO
Um mês movimentado na agenda de eventos dedicados à economia africana
PARA OS AMANTES da velocidade, o final do mês vai revelar quem será o melhor piloto de ralis. A batalha decisiva entre Sébastien Ogier e Elfyn Evans ocorrerá na primeira edição do Rali da Arábia Saudita.
Para a economia africana, este mês é movimentado, com eventos de alto nível que prometem impulsionar investimentos, inovação e cooperação regional.
Angola recebe a Cimeira de Investimento Sustentável de África (ASIS) e o Forbes África Lusófona Annual Summit. Em relação à
MUNDIAL DE RALIS (WRC)
Rali da Arábia Saudita
De 26 a 29 de Novembro wrc.com
A luta pelo título de pilotos está acirrada entre Sébastien Ogier e Elfyn Evans. Tudo será decidido nesta última prova, numa “velocidade furiosa” que vai até às arábias. A corrida percorre rocha vulcânica e areia desértica, num circuito único, de quarta-feira à noite até sábado ao meio-dia e será o primeiro Rali da Arábia Saudita, país que já recebe o Dakar e a Fórmula 1.
FÓRUM
Forbes Annual Summit Luanda, Angola 18 de Novembro
É a segunda edição deste fórum que se afirma como um dos pontos de encontro da comunidade lusófona em Angola. O evento contará com a presença de líderes, empreendedores e agentes de mudança oriundos de diferentes países de expressão portuguesa.
Com uma programação estruturada em dois momentos - Financial Summit durante a manhã e Economy Summit à tarde - o encontro propõe-se promover o intercâmbio de ideias, a cooperação regional e o desenho de soluções concretas para os desafios partilhados pelas economias lusófonas.
O Que Não Pode (Mesmo)
Cimeira, esta vai colocar as oportunidades de investimento em África no centro das discussões globais sobre o desenvolvimento económico e as estratégias de crescimento empresarial, promovendo a posição de Angola a nível regional. Quanto à segunda edição do fórum organizado pela Forbes, irá reunir líderes e empreendedores para discutir inovação, sustentabilidade e o futuro da economia lusófona. No conforto do seu sofá, prepare-se para a segunda
Perder em Novembro
temporada de “Landman”. A série inspira-se no podcast Boomtown para contar uma história contemporânea sobre a procura de fortuna no mundo das plataformas petrolíferas. São episódios que acompanham operários e bilionários vorazes e selvagens que têm alimentado um “boom” tão grande que influencia o clima, a economia e a geopolítica mundial.
Texto Luís Patraquim
SUSTENTABILIDADE
Cimeira de Investimento Sustentável Luanda, Angola ● De 26 a 28 de Novembro
Uma Cimeira de Investimento Sustentável de África (ASIS) e a décima Reunião Anual das Zonas Económicas Especiais Africanas vão decorrer, em paralelo, para assinalar um momento decisivo para o futuro económico de África e o papel central que Angola pode desempenhar. Os eventos integram as comemorações oficiais dos 50 anos da independência, sendo anfitriões o Ministério angolano da Indústria e Comércio e a Zona Económica Especial Luanda-Bengo, com organização da União Africana e da Organização das Zonas Económicas de África.
Nesta sua primeira edição, a Cimeira do Investimento Sustentável em África vai servir como uma plataforma de alto nível para investidores, financiadores, decisores políticos e parceiros de desenvolvimento explorarem caminhos concretos para acelerar o investimento inclusivo.
Um Drama Industrial Com um Elenco de Luxo
LANDMAN (T2) / SKYSHOWTIME
21 de Novembro
”LANDMAN” foi um sucesso imediato, há um ano, de tal forma que foi renovada para uma segunda temporada. Criada por Taylor Sheridan e Christian Wallace, a série inspira-se no podcast Boomtown para contar a realidade contemporânea sobre a procura de fortuna no mundo das plataformas petrolíferas, acompanhando operários e bilionários vorazes e selvagens que alimentam um negócio tão grande que influencia o clima, a economia e a geopolítica mundial. Protagonizada por Billy Bob Thornton, que interpreta Tommy Norris, papel que lhe valeu uma nomeação para Melhor Actor numa Série Dramática nos Golden Globes deste ano, esta é uma série que o vai agarrar ao sofá.
A segunda temporada promete elevar a tensão da intriga em torno da família Norris. Novidades no elenco incluem nomes de peso como Demi Moore (no papel da esposa de um magnata) e Andy Garcia, além de Sam Elliott. Os novos episódios aprofundam as questões geopolíticas e os conflitos humanos ligados à extracção de petróleo no oeste do Texas. A série continua a explorar a agitação económica e social que está a moldar o futuro dos Estados Unidos e do mundo. Prepare-se para um drama industrial ainda mais intenso e cativante.
STREAMING
Outras estreias que merecem a nossa atenção:
Dia 2: Robin Hood (MGM+)
Dia 3: St. Denis Medical T2 (NBC), I Love LA (HBO Max) e Crutch (Paramount+)
Dia 4: Squid Game: The Challenge T2 (Netflix)
Dia 5: Heweliusz (Netflix)
Dia 6: All Her Fault (Peacock) e Death By Lightning (Netflix)
Dia 7: Maxton Hall T2 (Prime Video), Pluribus (Apple TV+), Happy’s Place T2 (NBC), Power Book IV: Force T3 (Starz) e Tu Estavas Lá (Netflix)
Dia 10: Where the Sun Always Shines (SkyShowtime)
Dia 12: Palm Royale T2 (Apple TV+) e Mrs Playmen (Netflix)
Dia 13: The Beast in Me (Netflix) e A Batalha dos Samurais (Netflix)
Dia 14: O Cuco de Cristal (Netflix) e Como Ganhar a Lotaria (Netflix)
Dia 19: The Mighty Nein (Prime Video)
Dia 20: Jurassic World: Chaos Theory T4 (Netflix) e A Man on the Inside T2 (Netflix)
Dia 24: Bel-Air T4 (Peacock)
Dia 27: Stranger Things T5A (Netflix)
LIVROS
Sorte, risco, tempo e emoções: como gerir o dinheiro?
Título: A Psicologia do Dinheiro • Autor: Morgan Housel • Editora: Editorial Presença • Género: Economia / Finanças
O dinheiro - seja no investimento, nas finanças pessoais ou nas decisões de negócios - é normalmente explicado com base na matemática, em que fórmulas e dados nos dizem exactamente o que fazer. Mas, na vida real, as pessoas não tomam decisões financeiras a partir de uma folha de Excel. Neste livro, o multipremiado autor Morgan Housel partilha 19 histórias que exploram a estranha forma como as pessoas pensam sobre dinheiro. A premissa central é que um génio que perde o controlo das suas emoções pode ser um desastre financeiro, enquanto uma pessoa comum, com boas competências comportamentais, pode construir uma riqueza substancial.
1. O Poder do Tempo e da Sobrevivência: Housel destaca o conceito fundamental do juro composto (compounding), que não depende de retornos astronómicos, mas sim da consistência no decurso de longos períodos. O maior segredo de investidores como Warren Buffett não foi a genialidade, mas a capacidade de começar cedo e sobreviver a todas as crises. Manter-se no jogo, evitando a ruína financeira, é a habilidade mais subestimada.
2. O Papel da Sorte e do Risco:
O autor argumenta que o sucesso e o fracasso em finanças são significativamente influenciados por forças que não controlamos – a sorte e o risco. Reconhecer a influência destes factores, aceitando que nem todos os resultados são ditados pelo esforço individual, é crucial para mantermos a humildade e evitar a arrogância que pode levar a perdas desastrosas.
3. O Conceito de “Suficiente”:
Uma das lições mais importantes é saber quando parar. Housel usa exemplos de milionários que arriscaram tudo para se tornarem bilionários, acabando sem nada porque não souberam dizer “é suficiente”. A busca incessante por mais, motivada pela comparação social, é o caminho mais rápido para a insatisfação e risco desnecessário.
4. O Verdadeiro Dividendo do Dinheiro:
A verdadeira riqueza não está nos bens visíveis que compramos para impressionar os outros, mas sim no dinheiro que não gastamos – os activos invisíveis que nos dão flexibilidade e, acima de tudo, controlo sobre o nosso tempo. O maior benefício que o dinheiro pode oferecer é a liberdade de fazer o que queremos, quando queremos, com quem queremos, e pelo tempo que quisermos. Esta é uma recompensa que não tem preço e vale mais do que qualquer retorno adicional de investimento.
Em última análise, “A Psicologia do Dinheiro” convida o leitor a ser razoável, em vez de totalmente racional, nas suas decisões financeiras, garantindo que os seus planos são sustentáveis e alinhados com a sua vida real, permitindo-lhes dormir descansados.
“Quando
se é especialista, as pessoas acabam por escolhê-la, não porque é mulher ou negra, mas porque é a melhor. Porque você sabe”
MOÇAMBICANOS PELO MUNDO
Nélia Mazula é uma engenheira química nascida em Maputo. Chegou aos Estados Unidos (EUA) ainda bebé, acompanhada pelos pais que emigraram para aquele país
NÉLIA MAZULA
Engenheira Química
NÉLIA MAZULA é uma engenheira química nascida em Maputo. Chegou aos Estados Unidos (EUA) ainda bebé, quando os pais emigraram. O apoio da família marcou a sua trajectória, conforme conta à Economia & Mercado. “Os meus pais sempre acreditaram em mim e apoiaram-me muito na escola. Isso foi fundamental para eu poder seguir em frente”, recorda. Filha de pais moçambicanos, carrega orgulhosamente as raízes consigo. “A família do meu pai é do Norte. Visitei Nampula, Pemba e houve sempre esse esforço da parte deles para preservar as nossas memórias e a nossa história”, conta. Na infância, destacou-se pela aptidão para a matemática e para as ciências. Os professores rapidamente a colocaram em programas especializados: “Diziam que eu era muito avançada. Mesmo como criança, os meus professores sempre me promoviam nessas escolas. Colocaram-me em vários programas de engenharia, embora eu nem soubesse o que era um engenheiro, na altura.”
Vocação matemática, mas sonho diferente Apesar do talento para disciplinas técnicas, Nélia ti-
Nélia Mazula, Engenheira de Inovadoras Patentes Industriais que Sonha com Moçambique
nha outra ambição: “Eu queria estudar direito internacional, porque pensava: Moçambique está a sofrer, precisamos de ter competências para defender o que é nosso.” O rumo mudou quando a engenheira ganhou uma bolsa para estudar na Arizona State University Tempe Campus, uma universidade americana.
Na recepção, o reitor foi directo, perguntando-lhe que área da engenharia queria estudar. “Não vou estudar engenharia, quero estudar direito”, respondeu. O reitor mostrou-lhe então uma lista das carreiras mais bem remuneradas. “A primeira era engenharia química. A segunda era ciência da computação. Eu não sabia o que um engenheiro químico fazia, mas pensei que, pelo menos assim, poderia pagar a faculdade de direito no futuro. Então, escolhi engenharia química.” E assim começou uma trajectória ines-
perada. “O primeiro engenheiro químico que conheci foi o director da escola, e foi assim que a minha jornada começou.”
Moçambique e a experiência no terreno Na década de 2000, aos 21 anos, Nélia regressou a Moçambique para trabalhar em projectos estratégicos na indústria do gás natural. Trabalhou na Companhia Moçambicana de Hidrocarbonetos (CMH) por cerca de quatro anos, nos blocos de Temane e Pande, onde participou no processo de validação e entrada em operação de unidades de produção de petróleo e gás, experiências que considera transformadoras. Os blocos de Temane e Pande foram as primeiras reservas de gás natu-
ral de Moçambique a serem exploradas comercialmente, numa concessão à petrolífera estatal sul-africana Sasol. “Construímos diversas infra-estruturas. Foi praticamente como transformar uma zona rural numa cidade. Nunca pensei que algo que eu fizesse pudesse ter tanto impacto”, argumenta. O trabalho tinha os seus desafios. Muitas vezes, Mazula ficava meses sem salário, mas a sua paixão mantinha-a motivada. “Eu gostava tanto de trabalhar que memorizei todo a configuração, das válvulas às redes. Queria saber como tudo funcionava. A minha curiosidade não tinha limites”, afirma com entusiasmo, destacando que essa fase reforçou o
seu respeito pela engenharia. “Isso fez-me respeitar a indústria e o que ela faz em termos de desenvolvimento. Percebi que estava no caminho certo.”
EUA e as startups tecnológicas
De regresso aos EUA, decidiu arriscar-se no campo das startups tecnológicas ligadas à programação industrial. “Era uma nova carreira praticamente. Eu era engenheira na construção, nos laboratórios. Mas ali eu estava praticamente na área de ciências de computação”, relembra. O ambiente das startups era intenso segundo a engenheira. “Era sempre volátil. Com muita energia, muito trabalho. Eu gosto da inovação, mas, às vezes, não há uma estrutura. Depende do dono da empresa.”
Apesar da instabilidade, Mazula destacou-se. “Aquela empresa foi comprada pela Siemens. A segunda startup também. Eu trazia sempre projectos gran-
des.” O prestígio abriu portas: uma petrolífera internacional passou a recomendá-la como referência em transformação digital. Pouco tempo depois, Nélia recebeu um convite da gigante francesa Dassault para se juntar à equipa. “Eles ligaram-me. Eu nem conhecia a empresa. Mandaram-me um bilhete de avião para Boston. Gostei. Adorei. Porque era uma empresa inovadora. Tinha infra-estrutura de pesquisa, algo de que eu gosto.”
O salto para o mundo das patentes
Na Dassault, começou a escrever patentes sem imaginar o impacto que elas teriam. “Comecei simplesmente a escrever. Não sabia se seriam aceites. Escrevi várias, mas cinco foram aprovadas. Algumas começaram a ser lançadas anos mais tarde”, conta à E&M.
As suas patentes concentram-se em algoritmos aplicados à indústria. “Em termos simples, trata-se de co-
sualizar instalações industriais em 3D sem deslocação física revelou-se crucial. “É como o Google Maps em 3D, mas aplicado a unidades industriais”, explica a engenheira.
Inspiração para outras mulheres
mo um robô pode ver e analisar informações” sobre “equipamentos, instalações, como pode ver essas questões, analisá-las e extrair dados das mesmas. Essa é a essência do meu trabalho.”
Alguns prémios reconheceram as suas patentes de software focadas em realidade aumentada, visualização de dados e inteligência artificial, tecnologias que contribuíram para a digitalização da engenharia na indústria de petróleo e gás.
A lista de patentes assinada por Nélia Mazula inclui tecnologias muito faladas na actualidade: actualização em realidade aumentada de modelos CAD 3D; reengenharia de varrimento laser de modelos CAD 3D; mapeamento gráfico baseado em densidade; pesquisa baseada em frequência incorporada e processamento de dados gráficos 3D; e re-digitalização de pesquisa 3D para 2D. Com a pandemia da covid-19, a relevância das suas invenções cresceu. A possibilidade de vi-
Graças ao seu trabalho, recebeu o prémio Fiatech Superior Technology Achievement, em 2016, e foi honrada pelo Houston Business Journal como “mulher líder”. Foi ainda reconhecida no National Inventors Museum, distinções que figuram lado a lado com vários certificados e publicações técnicas com o seu nome. Mazula recebeu também prémios da Society of Women Engineers, uma organização que também lhe concedeu uma bolsa de estudos na sua juventude. “Quando fui reconhecida, foi realmente óptimo, porque também foi uma forma de mostrar a outras raparigas que isto é possível”, ou seja, que o género não tem de ser uma barreira.
Actualmente, Nélia Mazula vive em Houston, Texas, e continua a ser uma referência global em inovação digital aplicada à indústria. Mas os seus sonhos continuam ligados a Moçambique. “O que eu realmente gostaria de fazer? Queria ajudar as áreas rurais, criar bolsas de estudo específicas, não só para estudar, mas para criar uma cultura de empreendedorismo, para iniciar negócios. Acho que é muito importante, mesmo pequenos negócios, porque cria uma mentalidade diferente.”
Para Mazula, o segredo está na curiosidade e na dedicação. “Quando recebo uma máquina, quero saber tudo sobre ela, como funciona. Para mim, o mais importante é entender. E quando se é especialista, as pessoas acabam por escolhê-la, não porque é mulher ou negra, mas porque é a melhor. Porque você sabe.”
Área 1: Retoma do Projecto ou um Dossier Ainda em Aberto?
Quatro anos e meio depois do ataque à vila de Palma, a TotalEnergies prepara-se para regressar à península de Afungi. O anúncio, feito na última semana de Outubro, reabre um debate que mistura política, economia, segurança e diplomacia. Mas prevalecem dúvidas sobre as condições da retoma
Plataforma flutuante do Projecto Coral Sul em Afungi
Oconsórcio liderado pela multinacional francesa TotalEnergies, operador do projecto de gás natural liquefeito (GNL) da Área 4, na bacia do Rovuma, revelou as condições para levantar o estado de “força maior”, declarado em 2021, quando os ataques insurgentes obrigaram à evacuação completa da zona de produção.
Na altura, o projecto, avaliado em 20 mil milhões de euros e considerado o maior investimento privado em curso em África foi interrompido abruptamente. A vila de Palma foi atacada e destruída, com um saldo de 800 pessoas mortas e milhares de deslocados, segundo um relatório da ACLED, uma ONG especializada em registos de conflitos.
A proposta da TotalEnergies e a posição do Executivo
Num documento assinado pelo seu CEO, Patrick Pouyanné, e endereçado ao Presidente da República, a TotalEnergies propõe uma prorrogação de 10 anos da concessão do projecto e uma indemnização de 4,5 mil milhões de dólares pelos custos acrescidos durante a paralisação. A empresa admite ainda que a primeira entrega de GNL, inicialmente prevista para Julho de 2024, só deverá ocorrer no primeiro semestre de 2029.
Logo após o anúncio da proposta pela multinacional francesa, as atenções ficaram viradas para a resposta do Governo, através do Conselho de Ministros –para aprovação de uma adenda ao plano de desenvolvimento, incluindo um orçamento e um cronograma actualizados.
“O Governo (ainda) tem de se pronunciar sobre o plano de desenvolvimento, avaliar o impacto da paralisação e ponderar todos os condicionalismos antes de qualquer decisão”
Tal não sucedeu, pelo menos até ao momento de fecho desta edição. É que, apesar do entusiasmo inicial, o anúncio não caiu bem junto do Governo, desde logo pela forma como a informação foi divulgada (através da imprensa internacional). O porta-voz do Conselho de Ministros, Inocêncio Impissa, reagiu com frieza ao modo como a petrolífera difundiu o documento, dizendo que “devia ser dirigido num contexto fechado” ao Presidente da República, “em primeira mão”. Impissa sublinhou que o Governo “repudia o formato” utilizado pela empresa e que “o mais adequado seria conversar dentro dos canais devidamente estabelecidos”. Já em relação às condiçoes impostas pela TotalEnergies, tudo está em aberto. “O Governo (ainda) tem de se pronunciar sobre o plano de desenvolvimento, avaliar o impacto da paralisação e ponderar todos os condicionalismos antes de qualquer decisão”, disse o porta-voz do Governo, acrescentando que a extensão do prazo de concessão “dependerá das condições que ambas as partes colocarem em cima da mesa.”
O jogo de pressões e oportunidades em disputa
O debate em torno da conclusão do investimento em Afungi aconteceu num momento em que o Presidente Daniel Chapo visitou os Estados Unidos e a sede da ExxonMobil, empresa líder do consórcio da Área 1, vizinha do projecto da TotalEnergies. A Exxon já indicou que a sua decisão de investimento final depende do levantamento do estado de “força maior” no projecto adjacente.
Os dois projectos, se operacionais, poderão transformar Moçambique num dos dez maiores produtores mundiais de gás natural liquefeito, responsável por cerca de 20% da produção africana até 2040, segundo a Deloitte. Mas o caminho não é linear: a retoma enfrenta problemas de segurança e um escrutínio crescente de organizações internacionais, que exigem maior transparência sobre os impactos ambientais e sociais do empreendimento.