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HOLLARD
A completar 20 anos no mercado segurador de Moçambique, a Hollard é hoje a líder de mercado nos vários segmentos, posição que reforçou depois de confirmada a aquisição da carteira da ICE. Henri Mittermayer, CEO e fundador da seguradora, recorda o trajecto de sucesso da empresa no mercado nacional e revela a estratégia para os próximos anos, assente numa perspectiva “de especialização nos vários segmentos essenciais para o desenvolvimento de Moçambique”
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A completar 20 anos no mercado, gostaria que recordasse um pouco da história da Hollard Moçambique até aos dias de hoje.
Cheguei a Moçambique em 1994, era ainda um jovem licenciado, e a minha intenção era que esse fosse um primeiro passo para chegar ao topo da carreira. Estava longe de imaginar que, 30 anos depois, estivesse onde estou hoje. Nessa fase, a indústria financeira em Moçambique era predominantemente dominada pelo investimento português, em oposição à matriz mais sul-africana. Quando lançámos a Hollard, no final de 2001, fizemo-lo com uma perspectiva diferente sobre o mercado. Gosto de pensar que trouxemos uma visão inovadora em termos de estilo, do tipo de contrato de transferência de risco. E penso que o mercado aceitou bem essas diferenças.
Quais são as grandes mudanças dos sectores financeiro e segurador, em específico, nestas últimas duas décadas e como os caracterizaria hoje em dia?
Se compararmos o mercado interno com o nosso vizinho mais próximo, a África do Sul, que é o maior mercado de seguros em África, Moçambique terá ainda um longo caminho de desenvolvimento a percorrer.
Se olharmos ao nosso mercado, ele tem sido, e especialmente, impulsionado pela atracção de investimento directo estrangeiro (IDE). É esse o núcleo fundamental das carteiras dos rendimentos dos prémios gerados em Moçambique. Depois, outra grande diferença é a quantidade de seguradoras no mercado. Em 1995, penso que existiam quatro companhias de seguros, em meados de 2000 eram perto de 12 companhias de seguros e no início dos anos 20, creio que eram 22 companhias de seguros privadas.
Acontecimentos como o dos ciclones e da pandemia vieram reforçar a importância do sector segurador, concorda?
Sabemos que é sempre assim nesta área, a maioria das pessoas apenas compreende que o seguro é importante quando as coisas más acontecem. E é por isso que fazemos campanhas de literacia financeira, para reforçar essa consciência.
Mas o negócio, de facto, mudou desde os ciclones e com a pandemia que veio trazer uma nova mentalidade em termos da importância do capital humano, das coberturas dos colaboradores e, diria, um aumento em termos de compreensão do que tem de ser coberto e também a capacidade das empresas para agora investirem, reterem e consolidarem os seus recursos humanos – o que se nota, por exemplo, com o crescimento das apólices de seguros de saúde, um dos grupos de seguros com evolução mais rápida em Moçambique.
Actualmente, existe também uma maior proximidade entre seguradoras e bancos, enquanto verdadeiros parceiros de negócio, uma proximidade que, porventura, não existia há alguns anos. Concorda?
Sim, é verdade. Ainda hoje, cerca de 80% do mercado é gerado pelos corretores, o lado da intermediação do merca-
do, mas há esses sinais de mudança que são encorajadores. Nos últimos sete, oito anos, já fazemos aquilo a que chamamos de bancassurance, e as parcerias com os bancos são cada vez mais interessantes e estão a crescer.
Vemos, cada vez mais, os bancos ‘mergulharem’ no sector do retalho de seguros, em áreas como os empréstimos sobre veículos automóveis, sobre habitação e nos seguros a elas associados e em algumas operações mais complexas.
Claro que, infelizmente, houve acontecimentos na economia nacional dos últimos anos que atrasaram um pouco esta nova dinâmica, e que afectam sempre o consumo, sendo este um sector muito sensível ao risco, como sabemos. Mas, ainda assim, há uma clara trajectória de crescimento.
Sei que tem, também, vindo a desenvolver a Hollard ao nível da sua organização interna, não se ‘acomodando’ à liderança do mercado. Gostaria que me falasse dessas mudanças estruturais, no modo de fazer e olhar o negócio dos seguros por parte da empresa.
Temos três níveis de abrangência sobre o mercado que respondem às necessidades das organizações que estão a chegar ao mercado nacional ligadas, de alguma forma, aos projectos de gás natural de Cabo Delgado e a toda a cadeia de valor de fornecedores à construção de infra-estruturas, por exemplo.
Depois, esta área do bancassurance, que está em desenvolvimento e, por fim, a distribuição directa e alternativa, como, por exemplo, o fenómeno das fintech, que está a desenvolver mecanismos inovadores.
E nesta nossa nova divisão, estamos, por exemplo, a vender seguros de responsabilidade civil online na fronteira com a África do Sul, desenvolvemos o ‘Paga Leve’ que se direcciona à realidade moçambicana, nomeadamente o seguro de responsabilidade civil mínimo, e sabemos que milhares de veículos ainda
não o têm, porque é dispendioso e estamos a tentar resolver este problema com base numa solução inovadora, prática e barata.
Será correcto dizer que, hoje, estamos perante uma “Hollard 2.0”, organizada e estruturada de uma forma substancialmente diferente, é assim?
A mudança está aí, na inovação que criamos, apostando muito fortemente na distribuição, e trabalhando com parceiros como a Recarga Aki ou a Appload. Estamos, cada vez mais, a tornar-nos mais específicos nas ofertas que disponibilizamos.
Gostamos de pensar que é assim e, de facto, temos vindo, nos últimos cinco anos, a reestruturar a nossa estratégia e formas de abordar o mercado, tendo feito uma reorganização da empresa em termos da sua compreensão das necessidades do mercado para criar um conhecimento baseado na oferta.
Uma das novas divisões é a de benefícios para trabalhadores, que engloba produtos como saúde, pensões, vida, funeral. Tudo o que seja orientado para o colaborador está agora numa divisão, com um know-how diferente e mais especializado.
Há também uma aposta em segmentos disruptivos, como a agricultura, um pouco diferentes do habitual no sector segurador. Pode explicar melhor em que se baseia esta vertente do negócio?
A nível do grupo, sabemos que esse é um sector fundamental em África. E a Hollard, também ao nível do grupo, começou uma tendência de especialização. Disso, nasceu a Hollard Agri, um centro de excelência para o agro-negócio, uma marca baseada na indústria e não num produto, que pressupõe um acompanhamento de todos aqueles largos milhares de agricultores que estavam, até então, fora dos serviços de seguros.
Lançámos uma acção completamente inovadora no País, em parceria com a Universidade da Califórnia e com a empresa Phoenix Seeds, um serviço de seguros que é vendido com sementes resistentes à seca, para 15 mil pequenos agricultores da zona Centro, sendo que agora são 60 mil os beneficiários.
É um sistema baseado no conhecimento especializado nas áreas onde os clientes têm as suas colheitas, e se essas áreas sofrem secas ou cheias, nós cobrimos esse risco. Isto é entusiasmante, pelo investimento no futuro sustentável do País, mas também por chegar a segmentos do mercado que não existiam antes de apostarmos neles. É esse o nosso objectivo: participar activamente no desenvolvimento sustentável de Moçambique.
A aquisição da carteira da ICE, tendo a Hollard se tornado na maior seguradora do mercado, é também já um passo dado nesta nova estratégia. De que forma?
A nossa capacidade já era considerável, mas se pensarmos nas perspectivas de futuro, com os grandes projectos no horizonte, e a ICE tinha uma boa carteira ao nível desse tipo de projecto (extractivas), com o crescimento económico que se espera, temos de estar preparados para essas novas dinâmicas, e estamos nesse caminho.
É preciso proteger o mercado interno, e isso passa por ter players com poder, internamente, nesta área porque, se assim não for, os grandes negócios não irão passar pelas seguradoras nacionais, e todos, e o próprio País, perdem com isso. Sem entrar em questões técnicas, creio que existem demasiadas licenças, o que provoca questões operacionais num mercado ainda pequeno que funciona em economia de escala, e por isso creio que a tendência de fusões se irá manter, o que é bom para o mercado, que pretendemos que seja cada vez mais robusto.
Como é que vê o sector segurador evoluir no País nos próximos anos?
O desafio passa pelo desenvolvimento económico, pelos grandes projectos e todas as oportunidades da cadeia de valor, mas fundamentalmente pela emergência de uma classe média que irá impulsionar toda a área do consumo, e pela capacidade de terem habitação própria, automóvel, educação.
O efeito de ‘cascata’ destes grandes projectos é o que devemos abordar e investir para o desenvolvimento do País. A minha visão, e espero que isto não seja demasiado aspiracional, é que é aqui que está a nossa responsabilidade enquanto seguradora – tentar fazer parte desse grande processo de desenvolvimento.