A Chancela da Paisagem Cultural Brasileira. Subsidios para a integração da Paisagem no Território

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A Chancela da Paisagem Cultural Brasileira Subsidios para a integração da Paisagem e do Território na normatização e na gestão do patrimônio cultural brasileiros Autor: José Antonio Hoyuela Jayo Consultor UNESCO – IPHAN, PRODOC 4018 Doutor Arquiteto e Urbanista, UVA (Es) / UFMG (Br) jose.jayo@iphan.gov.br

Superintendência do IPHAN no Rio de Janeiro Avenida Rio Branco, 46. CEP 20.090-002 - Centro, Rio de Janeiro, RJ Tel. 55 21 2233-7350 Tel. 55 21 998307718

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Contenido Introdução: chancela da paisagem? ou dos territórios culturais? ................................... 4 Patrimônio Cultural é Paisagem ................................................................................... 6 Alinhamento conceitual: patrimônio cultural, paisagem, território e sistemas. ............. 7 Patrimônio Cultural ...................................................................................................... 8 O Patrimônio Federal. ......................................................................................................................... 8 As dimensões do patrimônio cultural. .............................................................................................. 13 O patrimônio natural no IPHAN ........................................................................................................ 15 Patrimônio Cultural desde uma perspectiva territorial e de desenvolvimento sustentável. ........... 19

Paisagem. .................................................................................................................... 21 A Paisagem planejada, a cidade de Rio de Janeiro como modelo. ................................................... 23 A paisagem como lugar, ambiência, topos ou rarum. ...................................................................... 26 As paisagens como ecossistemas culturais. ...................................................................................... 28

Território e sistemas. .................................................................................................. 30 Território e suas diversas escalas e apropriações ............................................................................. 30 Sistemas territoriais e narrativas históricas e funcionais do território. ............................................ 31

A história, como argumento e narrativa da nova paisagem cultural. ........................ 32 Uma imagem global ou uma imagem local? ..................................................................................... 32 Sistematizar e entender o patrimônio desde o território. ................................................................ 35

Análise da proposta da Chancela ................................................................................... 40 1) princípios e diretrizes da chancela da paisagem cultural brasileira....................... 40 2) conceitos e entendimentos-chave ......................................................................... 44 3) objeto da chancela da paisagem cultural brasileira ............................................... 46 4) objetivos da chancela da paisagem cultural brasileira .......................................... 50 5) descrição do processo de chancela e de seus principais elementos ..................... 52 6) atribuições e papéis dos envolvidos....................................................................... 53 1. O papel do Iphan em uma política de preservação de Paisagens Culturais ................................. 53 2. Partícipes nos processos de Reconhecimento e Gestão da Paisagem Cultural chancelada. ........ 54 3. Etapas previstas no fluxo e atribuições dos partícipes ................................................................. 54 4. Sobre a Comissão Interdepartamental da Paisagem Cultural: ..................................................... 54

7) Recomendações ................................................................................................... 56 1) operacionais para retomar o instrumento no IPHAN ................................................................... 56 2) divulgação interna e externa. ....................................................................................................... 57 3) sobre eventos e afins .................................................................................................................... 57 4) sobre os envolvidos/continuidade dos processos ........................................................................ 57 5) sobre a regulamentação ............................................................................................................... 57

Concluindo: patrimônio cultural é paisagem. ................................................................ 59 Naturalizar os tombamentos: verdear e azulejar o cinza. ................................................................ 63 Passar de um sistema passivo de planejamento a um flexível ......................................................... 65 Como proteger? Tombamento, portarias e Planos de Ação............................................................. 67 Alguns instrumentos de interesse para a gestão. ............................................................................. 67

Bibliografía: ..................................................................................................................... 71 Notas:.............................................................................................................................. 76

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José Antonio Hoyuela Jayo

Doutor Arquitecto, Universidad de Valladolid, Es Arquiteo e Urbanista pela UFMG, Br Membro de ICOMOS Brasil e do Comité Científico Internacional de Paisagens Culturais, IFLA Director General de la Asociación Ecología e Innovación, ECOINNO Director Gerente: TERYSOS DO BRASIL, Architetura e Sustentabilidade, LTDA

www.terysos.com email: antonio.hoyuela@gmail.com skype: ahoyuela Celular no Brasil: (55) +21-998307718

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Introdução: chancela da paisagem? ou dos territórios culturais? Queria, antes de mais nada, parabenizar a equipe do IPHAN liderada por Monica Mongelli, e também a equipe do Comité Científico brasileiro de Paisagens Culturais, capitaneado por Vanessa Bello, pelo enorme esforço e pela oportuna reflexão aberta sobre o conceito da paisagem, sua normatização e seus futuros instrumentos e propostas de gestão sustentável. Queria agradecer também o apoio, o carinho e todo o conhecimento que Carlos Fernando de Moura Delphim, um dos instigadores da Chancela, me ofereceu desde que comecei a trabalhar com as Paisagens Cariocas como foco de meu trabalho para UNESCO e para o IPHAN. Minha experiência no planejamento urbano e territorial baseado no paradigma da paisagem me coloca num lugar diferente de aquele identificado pela Chancela. Definitivamente, acredito, e afirmo rotundamente, que “todo patrimônio cultural é paisagem”, mesmo o sabre do General Osório. Esse é provavelmente o bem cultural mais pequeno tombado a escala federal, mas impossível de entender sem suas múltiplas camadas de valores, atributos e caraterísticas. O espírito do lugar que o criou, transforma o espaço que o envolve, a construção que o acolhe mediante processos de apropriação cultural em patrimônio de todos. Os bens são tanto seus elementos tangíveis, como edificações, sítios, paisagens, rotas, objetos, como suas dimensões intangíveis formadas por memórias, narrativas, escritos e tradições orais, mitos, ritos, festivais, que nos fazem sentir o sentimento do sagrado e acordam nossos desejos de adoração, de identificação e de valorização dos bens (De Moura Delphim, A Paisagem (texto apresentado no V Congresso Brasileiro de Paisagismo), 2010). Dessa forma, os conhecimentos tradicionais e as formas de interação entre o homem e a natureza, transformam-se em texturas, cores, odores e outras múltiplas manifestações culturais. Dessa forma materializa-se o patrimônio cultural, transformando os elementos físicos e espirituais em algo que nos transmite valores, significados, emoções, sentimentos e mistérios que nos oferecem novas leituras sobre aquele lugar. O bem material, tangível, não pode ser considerado por tanto de forma destacada do espírito do lugar, seu componente intangível, nem das relações ecológicas com o seu entorno. Nada há de adverso entre eles, o material e o imaterial se interagem e se edificam de forma mútua e recíproca. Do mesmo jeito, as dimensões ambientais, econômicas e sociais, do entorno imediato donde o bem encontra-se inserido, interatuam com ele, de uma forma intensa, e as vezes definitiva. Por isso, a capacidade de percepção do espírito de uma paisagem é uma experiência altamente enriquecedora ao mesmo tempo que complexa. Quando identificamos as interações entre natureza e cultura, e suas raízes sociais mais profundas, estamos construindo a ideia de lugar, de paisagem. Essa construção é, ao mesmo tempo, pessoal e social, individual e coletiva, mas sem dúvida perceptiva. Cada espaço, em cada escala que queiramos interpretá-lo, tem uma paisagem no redeador que o define. Ao mesmo tempo, quando esse espaço, junto com outros, é apropriado, transforma-se em “território”. Os territórios têm nome e sobrenome, estão

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localizados, e tem sua própria personalidade e sua sociedade, espécie ou espírito que o domina. Assim surgem os territórios quilombolas, os territórios associados a povos, indígenas, ou até os territórios da onça pintada, ou dos guarás, por exemplo. Já a paisagem pode repetir seus modelos, suas componentes, seus elementos, seus processos sem por isso perder identidade.

Figura 1 .- Todas as paisagens podem ser lidas ou interpretadas em diferentes contextos e narrativas históricas, ou ambientais, ou culturais. O mais importante é o olho do observador e a percepção.

Quando somos capazes de ler e entender os territórios dentro de uma ou várias narrativas históricas, artísticas, ambientais ou funcionais, estaremos construindo o conceito de sistemas territoriais, que podem apoiar-nos na construção de estratégias de intervenção no patrimônio cultural de uma forma agrupada e coerente com os valores e caraterísticas de estes conjuntos. Entendemos por tanto que a proposta da Chancela vai mais por um reconhecimento do que queremos denominar como “territórios culturais” e não paisagem, já que essa envolve todos e cada um dos bens culturais que entendemos como tais. E importante destacar, nesta releitura do conceito da paisagem, que o patrimônio histórico, artístico e cultural, não pode ser separado do patrimônio natural, nem da ideia de sustentabilidade, ou de cidades habitáveis, ecológicas e territórios inteligentes. A paisagem constrói a identidade de um lugar, tornando-o mais sustentável integrando a história, a cultura, a forma urbana e a arquitetura dum lugar, ao tempo que salvaguarda sua identidade, sua autenticidade e sua originalidade. Precisamos abordar uma ecologia da paisagem, entendendo as suas múltiplas dimensões e conexões, naturais e culturais, começando pelas logicas locais, mas entendendo sua integração em sistemas territoriais globais, de maior abrangência e significado, e integrando as leituras eruditas, técnico-científicas, com a linguagem mais popular, com a cultura que nasce da apropriação pela sociedade.

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Patrimônio Cultural é Paisagem A era do antropoceno é a era da cultura da paisagem. Desde a perspectiva de sustentabilidade do planeta, estamos chegando no ponto de não retorno, temos que reagir. Temos que criar uma nova forma, revolucionária, de diálogo com as cidades. Temos que pensar os espaços públicos, o patrimônio natural e cultural, e a arquitetura do século XXI como recursos estratégicos. Temos que criar soluções inteligentes, simbióticas, integradoras, sintéticas, compreensivas, respeitosas com os valores do patrimônio, material e imaterial, mas ao mesmo tempo, inovadoras, criativas, abertas ao futuro ... a nova "arte de desenhar a paisagem do futuro" exige novas narrativas, discursos dinâmicos, processos participativos, exige coração e cabeça, transversalidade ... Uma nova visão da paisagem, "a new Landscape Declaration" (LAF, Landscape Architecture Foundation, 2016), um novo paradigma, um modelo para pensar nosso entorno que foi declarado em 2016 pela fundação de arquitetura da paisagem .

A história geológica, pedológica e biológica da Terra constrói as topografias sobre as quais os solos e rocas dão suporte a formações vegetais, estruturam bacias hidrográficas e conectam ecossistemas. Mas entender essas paisagens exige não só a percepção da base natural, mas também das culturas que as sociedades que as habitam assim como a incorporação, dentro desse discurso, do entendimento perceptivo, estético e artístico. A paisagem é uma invenção holística, mas ao mesmo tempo sintética e, ao mesmo tempo, fragmentada de todas as “realidades” que nos envolvem. É um recorte da totalidade, da complexidade do visível, que depois será reelaborado e cristalizado através de desenhos, pinturas, fotografias, cartografias, diagramas, dados estatísticos e outros desenhos técnicos ou perceptivos. A paisagem exige a síntese das ciências e das técnicas, mas também das percepções estéticas e artísticas, das emoções e da beleza. Por tanto as narrativas históricas de tempos geológicos (períodos da construção da terra), solares (estacoes), e do relógio (a aceleração do dia a dia contemporâneo), junto a ciência ambiental, botânica, geográfica, arquitetônica, urbanística, a antropologia, a arqueologia, a paleontologia, e outras formas de conhecimentos, compõem a base do conhecimento da paisagem cultural explicando uma dimensão mais abrangente do patrimônio cultural. Uma visão que incorpora o patrimônio cultural, o espaço público e até o vazio, entendido como o não construído, dentro de uma leitura mais abrangente da complexidade do espaço e suas interações, até imateriais, com a sociedade e os seres vivos que o constroem e transformam.

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Alinhamento conceitual: patrimônio cultural, paisagem, território e sistemas. “A proteção de paisagens culturais pode contribuir para técnicas modernas de uso sustentável e o desenvolvimento da terra, ao mesmo tempo conservando ou melhorando os valores naturais da paisagem... Esta busca por compreender, de forma associada, as dimensões materiais, imateriais, culturais e naturais dos patrimônios, mesmo focada nos ambientes rurais ou periurbanas, tem exigido uma abordagem integrada de gestão e a participação das comunidades locais, tornando-as agentes imprescindíveis à preservação” (Bello Figueiredo, O Patrimônio e as Paisagens: novos conceitos para velhas concepções?, 2013, pág. 107)

Valores, atributos e caraterísticas dos bens devem ser pensados para aproximar o patrimônio cultural aos cidadãos e aos gestores. É a partir deles que devemos fomentar a pactuacão das políticas orientadas a sua preservação, conservando-os e requalificando-os. Os entornos definem o patrimônio cultural a través da paisagem e agregam elementos fundamentais para a construção dos sistemas territoriais, e, com eles, dos diversos territórios e identidades. As paisagens são os elementos definidores da ambiência, do caráter do lugar. Por isso, a adequada integração das paisagens garante a sustentabilidade do modelo a serem aplicado para a conservação dos valores e para sua requalificação. Tentaremos concretizar os instrumentos, estratégias, e metodologias para as novas abordagens paisagísticas e territoriais e para a normatização e gestão do Patrimônio Cultural. Partiremos da experiencia desenvolvida junto ao DEPAM no Rio de Janeiro. Para isso vamos desenvolver quatro conceitos fundamentais, o patrimônio cultural; a paisagem e os elementos, ecossistemas e processos “culturais” associados; o território e seus sistemas territoriais, patrimoniais ou complementares; e as narrativas como elementos integradores que integram história, arte, técnica e cultura com o espaço. Queremos propor uma visão mais ampla do conceito de patrimônio cultural que integre o conceito de lugar, de ‘genius loci’, e de paisagem. Um conceito que vai além dos valores materiais e imateriais e dos processos culturais e naturais, integrando a percepção e a participação dentro dessas leituras. Essa visão de síntese nos apoia na hora de ordenar e planejar nossas cidades e nossos territórios desde a perspectiva e o paradigma da sustentabilidade. Mesmo nos espaços donde o valor cultural seja primordial, para seu reconhecimento como paisagem cultural, também devemos integrar as suas outras múltiplas dimensões económicas, sociais e ambientais. Processos mais integrados de participação e percepção tem que acompanhar essas propostas vinculando o planejamento com movimentos sociais, com ecossistemas e hábitats locais, com os processos econômicos e com a consciência e a identidade do “lugar”. Na gestão compartilhada de bens culturais protegidos, nos diversos âmbitos ou esferas de governo, temos que refletir sobre o caráter da paisagem contemporânea, é do conceito de paisagem cultural (IPHAN, COPEDOC, 2008). Devemos faze-o seja desde a perspectiva específica do patrimônio cultural, e sua evolução para modelos mais sustentáveis e contemporâneos (Castriota, 2007; Hoyuela Jayo, A paisagem como instrumento para um planejamento sustentável: uma visão dialética entre Europa e o

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Brasil, 2016), seja desde a perspectiva mais holística, sintética e integradora, que hoje está sendo incorporada nos PDU, e nos planos metropolitanos, da paisagem como conceito de sínteses nas análises urbanas e/ou territoriais, mas também como ferramenta para o planejamento.

Patrimônio Cultural “Constituem o patrimônio cultural brasileiro, os bens, de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.” (Presidência da República, 1988, pág. art. 216)

O Patrimônio cultural tem sua origem no sentimento de pertencimento, na lembrança comum ou coletiva, de que algo faz parte de nossa memória, da nossa cultura, e que por tanto tem que ser preservado. Quando se fala em Patrimônio, logo nos vem à mente a ideia de Patrimônio Arquitetônico, de construído. Mas o patrimônio cultural hoje vai bem além, englobando três categorias de elementos: naturais e culturais, materiais e imateriais, ou elementos simbólicos da memória. Por tanto a paisagem está formada pelos elementos que pertencem à natureza, como, rios, mares, montanhas, pelas lembranças; as construções, os artefatos, objetos, obras, edificações, infraestruturas ou criações advindas das mãos humanas; e por último, as tradições e as técnicas e os elementos referentes às experiencias vividas pelo homem para poder viver em seu meio ambiente. Também devemos incorporar, desde uma visão mais ampla, os elementos documentais, artísticos, científicos e históricos, que descrevem esses bens, e seus entorno, recuperando assim as narrativas com as quais se relacionam. O Patrimônio Federal. Já passamos um periodo importante de inventario, identificação e inicio das primeiras ações de planejamento, chamados de periodos de preservação, conservação e restauração (Castriota, 2007; Hoyuela Jayo, 2014 c). Hoje, estamos entrando num periodo que denominamos de modelo Paisagístico, onde continuamos preservando e protegendo, mas onde precisamos incorporar propostas e medidas para o desenvolvimento do nosso patrimônio e sua integracao em modelos de desenvolvimento sustentável (Hoyuela Jayo, 2016). Hoje devemos pensar a preservação dos bens de interesse cultural integrada no paradigma do desenvolvimento sustentável. Um planejamento integrado deve cumprir o requisito constitucional de “defender e valorizar” o patrimônio através de instrumentos de proteção específicos e de uma programação de ações que promovam de forma coesa a sustentabilidade económica, ambiental e social desde uma perspectiva

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territorial, pensando o patrimônio cultural como recurso do desenvolvimento sustentável. Gerir esse patrimônio nacional exige novos olhares que incluem repensar os mecanismos de tombamento. Também exige revisar as Portarias/IPHAN nas áreas de entorno, assim como sua condição de elementos componentes de sistemas territoriais de interesse patrimonial mais amplos que exigem uma gestão compartilhada dos diferentes atores das políticas setoriais envolvidas. Mas exige sobretudo colocar a paisagem como protagonista, de nossas análises e de nossas propostas. O Decreto-Lei nº 25 de 1937, do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, definiu o tombamento como um instrumento jurídico destinado à proteção do patrimônio da nação com classificação e inscrição em quatro livros.

Figura 2 .- O patrimônio federal tombado, os limites das paisagens cariocas (UNESCO), e do Parque Nacional da Tijuca e Florestas de Proteção acima das cotas 80 e 100 (IPHAN), no Rio de Janeiro. Fonte: dados do IPHAN, do Comitê Gestor, IRPH e o IPP, e elaboração própria.

Eles vão desde a pequena escala, dos bens móveis como o sabre do General Osório, até o Parque Nacional da Tijuca e suas florestas de proteção (90 milhões de m2). A maioria dos bens estão inscritos na categoria histórica (122), ou de belas artes (108), assim como 26 na categoria de arqueológico, etnográfico e/ou paisagístico, nenhum na categoria de artes aplicadas. O desenvolvimento científico e tecnológico, não obstante, caracteriza alguns desses bens. Seria o caso do aeroporto Santos Dumont, e o nascimento da aeronáutica, ou o caso do próprio jardim botânico e do horto e a ciência botânica, assim como a gestão das águas na floresta da Tijuca. Mas essa perspectiva não foi suficientemente abordada, porque no Brasil só cinco processos foram lançados com esse propósito. Nesse sentido a Chancela parece querer cobrir essa ausência.

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O projeto PRODOC envolve um conjunto de professionais coordenados a través da equipe do DEPAM em Brasiliai, e uma equipe do IPHAN RJii, entre outros importantes professionais colaboradores. Os objetivos do projeto são identificar, organizar e articular os instrumentos normativos incidentes sobre os bens tombados localizados em vários cenários diferentes tais como Rio de Janeiro, Cachoeira e São Felix, Recife, Florianópolis, Porto Seguro, Belém do Pará, Petrópolis, Serra do Navio, Salvador de Bahia, e outros núcleos e contextos que vão se agregando durante o desenvolvimento do projeto. O propósito é elaborar leituras, em termos territoriais, focadas na gestão compartilhada entre os diversos entes federativos que têm atribuição concorrente na área de estudo. Em termos específicos, objetiva a produção de metodologias de abordagem para identificação e análise de condicionantes que subsidiem a formulação de diretrizes e critérios de preservação, bem como de parâmetros de intervenção. No processo, devese garantir a apropriação, por parte das entidades e órgãos federais, estaduais e municipais, de conceitos e princípios urbanísticos, tradicionais ou mais inovadores, voltados para a preservação do patrimônio cultural, assimilando-os nos respectivos instrumentos de planejamento e nos processos e instrumentos de gestão. O Patrimônio Cultural deve ser considerado como paisagem, e também na paisagem. A paisagem deve ser considerada como o conjunto de elementos culturais em sua relação com o lugar que podem alterar ou dar suporte aos valores reconhecidos do bem. A paisagem sempre será uma leitura coletiva e dependerá da forma que é percebido. A aproximação deve considerar a perspectiva cultural, científica, artística, histórica, etnográfica, simbólica, ecológica... Desde uma perspectiva mais ampla deve considerarse como instrumento que envolve e integra os aspectos sociais, econômicos e ambientais sob o paradigma da sustentabilidade. É aqui que entram os valores ecológicos, naturais, biológicos, mas também os relativos à percepção, a economia e a biodiversidade e ao patrimônio natural. Uma abordagem adequada exige entender os elementos junto aos processos, de forma dinâmica, são os chamados os ecossistemas culturais e naturais. Nessas áreas de entorno ou amortecimento é onde devemos desenvolver as chamadas portarias. Hoje devemos olhar para diversas áreas do conhecimento para conseguir discutir as contribuições para a formação do conceito de paisagem cultural contemporâneo, e seus desdobramentos teóricos e práticos. Essas são sem dúvida a geografia, a arte, a arqueologia, a engenharia (e especialmente a engenharia da paisagem), a ecologia, a biologia, as técnicas florestais, o patrimônio cultural e a gestão cultural, bem como, a comunicação, a sociologia e a antropologia (como forma de integrar a etnografia e a percepção). Por isso ele requer de equipes e perspectivas transdisciplinares que envolvam diversos atores, diferentes áreas de conhecimento, e sistemas de participação mais abrangentes, não procurando o domínio sobre várias outras disciplinas, mas a abertura de todas elas as quais perpassa e ultrapassa. A paisagem que queremos é polissêmica e poliédrica e, por isso, tem múltiplos significados e múltiplas perspectivas. Essa construção da paisagem cultural exige novas tipologias e instrumentos, como o da paisagem histórica urbana (Cury, A construção do conceito de Paisagem Histórica Urbana, 2012), revendo: contexto e entorno, as rotas e itinerários culturais, o papel do

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patrimonio natural, dos jardins históricos e do paisagismo, e também dos espaços públicos, das paisagens rurais, arqueológicas, sistémicas, sensoriais, das paisagens das águas e das industriais, assim como os novos métodos de leitura e de monitoramento (tecnologias da informação). A paisagem como método de aproximação a gestão dos bens federais, precisa, também, de uma necessária percepção artística e cultural: "O certo é que as emoções e belezas que sentimos diante das paisagens emanam da arte e não da própria natureza. São os artistas que nos ensinam a ver o mundo e perceber as suas belezas" (De Moura Delphim, Estudo sobre a Paisagem Cultural Brasileira, 2006)

Podemos concluir, sem dúvida, que a paisagem no Brasil já teve um longo percurso, e que as condições do país fazem dele um importante protagonista no contexto nao só nacional, mas também internacional, para a definição de novos paradigmas no contexto de sua gestão e desenvolvimento. Também devemos lembrar que Rio de Janeiro, nesse contexto, representa um caso muito especial, excepcional e de referencia e escala mundial por ter a primeira declaração da UNESCO baseada no conceito da paisagem cultural em área urbana de escala metropolitana (Cury, A construção do Sistema de Paisagens Nacionais no Rio de Janeiro e o sítio da paisagem cultural carioca patrimônio mundial, 2015). Mas agora também Pampulha (2016) e Paraty (2019) vieram a nos lembrar as importantes relacoes entre o lugar e a cultura, entre o vernáculo e o erudito, entre a natureza e a cultura do jeito que é percebida. As novas estratégias de preservação e intervenção incluem planejar o entorno como projeto de desenvolvimento sustentável, a restauração de jardins, parques e espaços públicos de interesse histórico, artístico, cultural ou ambiental, integrar arquitetura, urbanismo e paisagem, pensar na restauração, reabilitação e reciclagem da paisagem, pensar além da proteção, integrar e programar propostas de intervenção na paisagem, e também ligar a paisagem cultural com a cidade e com o planejamento regional. Optamos, na nossa abordagem, por um enfoque contemporâneo, ecológico e integrado, de forte influência dos paisagistas americanos (desde Olmsted) e franceses (Giles Clement), e outros (Battle em Espanha, p.e.), sob a influência pós-moderna, com visão ecológica, elementos arquitetônicos mais integrados, até bio-arquitetônicos, com elementos de infraestrutura verde, sem esquecer o papel das cores, das texturas e da arte, sempre presentes na paisagem. O objetivo é, no futuro, inserir as propostas dentro de um marco de políticas mais amplo: urbanísticas, ambientais, turísticas, do transporte, de controle de riscos ambientais, etc... que entendam e integrem as múltiplas dimensões da paisagem. Pactuar no território será o nosso grande desafio. Analisar e reconhecer os ecossistemas, culturais e naturais, ajuda-nos a procurar a essência da paisagem como sínteses entre a arte e o homem. A narrativa dessas histórias marca o tempo, seja geológico, solar, ou acelerado de nossos dias. A encíclica do Papa Francisco confirma, de forma contundente, falando da “2. Ecologia cultural”, essa união entre ecologia e patrimônio cultural, artístico e/ou histórico (Franciscus, 2015). Por isso nossa proposta para integrar a paisagem na gestão do patrimônio cultural se estrutura em dois grandes grupos, natureza e cultura. Também estamos propondo quatro níveis de aproximação ao território, baseados na própria metodologia específica de análise e

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de planejamento: unidades da paisagem, sistemas territoriais, morfotipos e áreas de interesse paisagistico. Mas, quando falamos de ambiencia e do tratamento dos entornos sempre é um discurso baseado na ideia da sua percepção cultural. Os tombamentos de bens naturais, no marco do IPHAN, devem ter como finalidade a conservação paisagística, histórica, artística, etnográfica, etc... (Rabello, 2009 b). Igualmente a preservação do seu entorno não deve se limitar exclusivamente aos bens de natureza construída, mas também aqueles naturais, que influem na dita ambiência, mas sempre vinculados aos atributos, percepção e compreensão do bem protegido. Para eles são preferenciais as ações de preservação de seus valores culturais, mas também a preservação dos ecossistemas como estratégia fundamental a serem pactuada com outros órgãos. Essa visão territorial e paisagística deve ser aplicada a través de instrumentos específicos (Planos de Manejo, Planos Urbanísticos, Planos Estratégicos ou outros), desde que tenham como finalidade a manutenção dos sistemas vitais e interdependentes ligados com a conservação do bem ou do conjunto (ecológicos, hidrológicos, urbanísticos...), e, por tanto, da paisagem.

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As dimensões do patrimônio cultural. Todo bem cultural deve ser avaliado segundo os conceitos de integridade e autenticidade. A integridade diz respeito à relação entre diferentes elementos de um mesmo sistema. Diz-se que um bem é íntegro se houver equilíbrio entre esses elementos, se houver uma relação equilibrada e harmoniosa. Quanto à autenticidade, tem a ver com o grau de originalidade dos elementos. Sobretudo em um jardim, onde sucessivas alterações vão se processando ao longo de sua história, é necessário primeiro verificar quão íntegro ele se encontra e, em seguida, quão autêntico. Se no sistema constituído por esses elementos a relação entre os componentes é equilibrada, pode-se dizer que o bem é íntegro. Se os elementos têm um grau de originalidade bastante preservado, pode-se dizer que o bem é autêntico. Essas são condições importantes para justificar a tomada de medidas para preservação de todo bem cultural inclusive os jardins históricos e constituem a premissa de qualquer trabalho, inclusive de tombamento e de outras formas de acautelamento legal (De Moura Delphim, Manual de intervenção em Jardins Históricos, 1999, pág. Cap. 5)

Os valores gerais identificados no Artigo 1o se configuram a partir de valores específicos, que, partindo dos valores materiais, básicos, de todo bem, são enriquecidos por quatro outras dimensões. A primeira delas seria a dimensão material. Bem cultural – (1) Entendimento aplicável ao patrimônio cultural. (2) Contempla as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações cientificas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços des5nados às manifestações artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sí5os de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. (IPHAN, 2018)

Os bens culturais compreendem diversas dimensões entre as quais a material, que reflexa as obras construídas a partir da aplicação das formas de criação, vivência e do fazer dos povos brasileiros, mas também a dimensão imaterial: Entende-se por cultura todas as ações por meio das quais os povos expressam suas “formas de criar, fazer e viver” (Constituição Federal de 1988, art. 216). A cultura engloba tanto a linguagem com que as pessoas se comunicam, contam suas histórias, fazem seus poemas, quanto a forma como constroem suas casas, preparam seus alimentos, rezam, fazem festas. Enfim, suas crenças, suas visões de mundo, seus saberes e fazeres. Trata-se, portanto, de um processo dinâmico de transmissão, de geração a geração, de práticas, sentidos e valores, que se criam e recriam (ou são criados e recriados) no presente, na busca de soluções para os pequenos e grandes problemas que cada sociedade ou indivíduo enfrentam ao longo da existência.

Os âmbitos analisados, os bens e seus entornos, constituem parte da memória coletiva do bairro, do lugar, da cidade ou do território, e são símbolos de uma utopia, um ideal, arquitetônico, urbano, rural ou paisagístico, e como tal representante de diversos momentos históricos relevantes, de tradições ou de formas de ocupação do território do Brasil.

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Os bens estão constituídos por lugares, sítios ou espaços onde ocorreram personagens, construções, edificações e paisagens, além de ações, tradições ou crenças de interesse histórico, cultural, ambiental e/ou antropológico. Essa mistura, essa miscelânea, ou palimpsesto, sobreposição, de restos materiais e imateriais, de construções, lugares, e conjuntos, de referências, lendas, e tradições, compõem o complexo do patrimônio cultural. Os bens, individualmente, como conjuntos, lugares, o simplesmente construções ou edificações, mas também como partes dos sistemas territoriais patrimoniais, constituem o patrimônio cultural, em que são guardados vestígios da cultura, da natureza, da paisagem e suas transformações ao longo dos tempos da cidade, criando verdadeiros palimpsestos. O valor derivado da dimensão de centralidade cultural e natural, de escala local, urbana, regional ou até nacional, nos entornos dos bens analisados, se expressaría como: a) Os bens analisados e seus entornos são peças fundamentais do sistema de espaços públicos e corredores culturais e verdes da cidade, símbolos da cultura carioca, espaços sacralizados pelo uso e pela sua condição de bens tombados, e pontos para uma acupuntura urbana. b) Os bens e seus entornos são espaços centrais de referência e identidade urbanas, para o conjunto metropolitano da baixada fluminense como um todo, tanto em termos de recreação, como de encontro social e manifestação cultural, nas várias escalas temporais e espaciais do cotidiano, do bairro, da cidade, e da região. c) Os bens e seus entornos permitem, e até que recomendam e exigem, enquanto espaços públicos de referência, o uso da ordenação e da gestão urbanística como instrumento para favorecer intervenções estruturantes de preservação e desenvolvimento urbano. d) As urbanizações espontâneas de encostas, planícies e várzeas devem ser reabilitadas e requalificadas, procurando seu controle e frear sua expansão assim como sua integração social, econômica e ambiental, respeitando e valorando a paisagem, e garantindo os direitos básicos da sociedade. Parágrafo único – A centralidade dos bens analisados é constituída tanto pelos bens declarados como pelos elementos urbanos de maior interesse situados em seu entorno e indicados em cada uma das fichas específicas que necessariamente devem ser considerados como formando conjuntos ou sistemas orientadores do Plano, no sentido de garantir a eficácia das ações propostas e potencializar a dimensão histórica, cultural, social, económica e ambiental dos mesmos. Já o vazio... como o silêncio, também tem seus valores derivados da ausência dos elementos que poderiam conformar sua existência, sua forma, seu espírito, seu ser: “O espaço vazio é talvez o elemento mais importante dos jardins e dos parques. É uma expressão do invisível, um centro em torno do qual tudo se ordena. É o equivalente do silêncio, que constitui, não se deve esquecer, um dos componentes da eloquência.

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O vazio tem um valor espiritual: nossas catedrais são um invólucro de um espaço de dimensões perfeitas que suscitam a prece” (Duc d'Harcourt, 1993 (1º ed 1969))

Sem os grandes espaços abertos e desocupados, condições indispensáveis à percepção dos elementos naturais ou culturais, construídos pelo homem, se perdem, perde-se a noção de espaço. Para as culturas Orientais não há apenas quatro elementos: água, ar, terra e fogo; também á um quinto, o vazio, como diz Lao Tsé no livro Tao Te Ching, um dos livros que servem de pilar à antiga sabedoria chinesa: “Trinta raios convergem no centro de uma roda, mas é o vazio central que permite a utilização de um carro. Modelando o barro, fazemos um jarro. No maciço das paredes recortamos portas e janelas: o vazio permite o uso de um quarto. É assim que se produz o ser útil, mas o não ser é que o torna eficaz”. (Tsé, 2008 (1ª ed. 500 a. C.), pág. 8)

O texto continua “É melhor não tentar carregar um vaso que tentar carregá-lo cheio demais. Se a sala está cheia de ouro e jaspe, quem poderá cuida-la?... Não será o espaço entre o céu e a terra semelhante a um gigantesco fole ou flauta? Esvazia-se sem se exaurir. Inesgotável” (Tsé, 2008 (1ª ed. 500 a. C.), pág. 7)

Aferrando-nos ao vazio, protegemos nosso ser interior mantendo-o livre, e entendemos o equilíbrio das coisas, e que a paisagem é culta, porque não é só natural, que o vazio está rodeado de objetos, que o rural, do urbano, e a floresta, da cidade: "Cuando las personas llegan a saber lo que es bello, aparece también la noción de lo feo. Cuando llegan a saber lo que es bueno, aparece también la noción de lo malo. De esta manera existencia e inexistencia, lo difícil y lo fácil, lo largo y lo corto, lo alto y lo bajo permiten conocer mutuamente lo uno y lo otro. Los diferentes sonidos, uniéndose, crean la armonía. De la misma manera, lo anterior y lo siguiente van uno tras otro armoniosamente." (Tsé, 2008 (1ª ed. 500 a. C.), pág. 7)

A perda de contexto que vem acontecendo no Rio de Janeiro, mas também em outras cidades de interesse histórico e paisagístico como Ouro Preto, Salvador de Bahia, ou Recife, parte da falta de reconhecimento do vazio como um valor a serem preservado. O controle de gabaritos e ocupações do solo também deve pensar e contribuir para o controle das áreas não construídas que em muitos casos configuram o verdadeiro espírito do lugar. O patrimônio natural no IPHAN § 2º Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela natureza ou agenciados pela indústria humana (Presidência da República (Gustavo Capanema, Getulio Vargas), 1937).

Para Mario de Andrade a paisagem cultural representa as “obras conjuntas do homem e a natureza” e ilustra a evolução da sociedade humana e seus assentamentos ao longo do tempo, condicionados pelas limitações e/ou pelas oportunidades físicas que seu

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entorno natural apresenta e pelas sucessivas forças sociais, econômicas e culturais, tanto externas como internas. Mas já em 1937, como descreve Rafael Winter (Ribeiro, 2007), no debate da Lei de Patrimônio, surgindo entre os posicionamentos de Mario de Andrade e Rodrigo Melo Franco de Andrade, apareceu, na legislação cultural brasileira, o conceito de patrimônio natural. O projeto reconhece o patrimônio cultural como produto humano iii, vinculado a arteiv, mas a lei que o reconhece também como indústria humana, ou “feiçãov notável” dotada pela naturezavi . Por tanto, a legislação federal permite o tombamento de áreas naturais por seu valor excepcional, ou também de uma paisagem de excepcional valor dotada pela natureza. Para Mario de Andrade “Paisagens: determinados lugares da natureza, cuja expansão florística, hidrográfica ou qualquer outra, foi determinada definitivamente pela indústria humana dos Brasis, como cidades lacustres, canais, aldeamentos, caminhos, grutas trabalhadas etc.” (Andrade, 1980)

Os valores que a o patrimônio natural representa para sua conservação como recurso de interesse público, pode por tanto ser derivado por seu papel em fatos memoráveis da história do Brasil (desde a própria descoberta até o grito de Ipiranga), quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico (donde podemos falar da arqueologia da paisagem), ou bibliográfico (herbários, classificação de tipos de águas) ou artístico (vistas das cachoeiras, das baias, dos rios, dos pintores paisagistas, ou dos fotógrafos), mas também, como bens que representam uma “feição notável”, produzida pela natureza ou pela “indústria humana”. Como tal bem natural de interesse cultural manifesta-se na aparência exterior; na sua forma, caráter, aspecto ou comportamento ou feitio1 de um rio, uma cachoeira, um espelho d’água, uma lagoa, de suas bordas, ou elementos, infraestruturas ou construções de apoio, ou como a maneira de fazer algo, de agir, como configuração, uma espécie de jeito de se comportar e influenciar no entorno, na paisagem. Por tanto, além das caraterísticas ambientais, naturais, ou paisagísticas (as vezes ocultas nos processos ecológicos), também pelas caraterísticas perceptivas, pela vista, o por outros sentidos tais como o ouvido (sons), o tacto (texturas), o cheiro (aromas) ou sabor (das próprias águas e de seus produtos derivados) que nascem do desejo do homem pela beleza, pela supervivência, ou pela convivência com outras espécies, como reflete Carlos Fernando de Moura Delphim no seu fantástico texto donde convergem a cidade e o desejo, na ideia sintética da paisagem (De Moura Delphim, 1996). Um patrimônio natural “construído pela indústria humana” como nos faz lembrar Carlos Fernando de Moura Delphim: “Todas as paisagens, desde que transformadas, representadas ou simplesmente pela forma como são percebidas pelo homem, tem significado cultural” (De Moura Delphim, Estudo sobre a Paisagem Cultural Brasileira, 2006)

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Forma, configuração. Disposição de espírito. Execução de um trabalho por um artista ou artífice, neste caso a natureza. Caráter; jeito, comportamento.

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Depois serão elaboradas umas Diretrizes para a análise e a classificação do patrimônio natural (XAVIER; DELPHIM, 1988) e um relatório – proposta para a definição, análise de impactos, classificação, e recomendações para a gestão da paisagem cultural brasileira, por Carlos Fernando de Moura Delphim. Nestes documentos, é proposta uma classificação do patrimônio natural. O primeiro documento propõe a diferenciação entre sítios naturais e sítios alterados pelo homem. O documento apresenta uma caracterização do patrimônio natural, propondo uma divisão, dos sítios naturais, nas seguintes categorias: 1. Sítios que representem feições típicas da natureza brasileira 2. Sítios naturais de grandes singularidades 3. Paisagens excepcionais pela beleza cênica e os pontos de vista de onde se pode fruir o espetáculo desse panorama 4. Sítios importantes como habitat de espécies de flora e fauna ameaçadas ou dos quais eles dependam indiretamente 5. Sítios de interesse científicos Sítios alterados pelo homem, nestas outras: 1. 2. 3. 4.

Interesse arqueológico Patrimônio natural urbano Espaços naturais circundantes ou arredores de assentamentos urbanos Sítios de interesse histórico, social, literário, artístico, religioso, legendário ou afetivo

Ainda sobre o patrimônio natural na constituição de 1988, há o estudo realizado por Carlos Fernando de Moura DELPHIM (2004). Nele, é apontado como a preocupação com o patrimônio natural e cultural do país está expressa em dois capítulos distintos da constituição. Desse modo, a conservação da natureza sob o ponto de vista biológico está impressa no capítulo sobre Meio Ambiente, diferente do capítulo sobre a preservação cultural. Nesse sentido, aos órgãos ambientais é dada [...] a responsabilidade legal e administrativa pelo meio ambiente ecologicamente equilibrado, pela preservação e restauração de processos ecológicos essenciais, pela biodiversidade e pela integridade do patrimônio genético, bem como por unidades de conservação como parques nacionais e reservas biológicas. (De Moura Delphim, Estudo sobre o Patrimônio Natural Brasileiro dentro do IPHAN, 2004)

Por tanto Rafael Winter responde: Considerando a categoria de paisagem cultural da forma como tem sido trabalhada junto às instituições internacionais deveríamos ressaltar características interativas entre o cultural e o natural e/ou entre o material e o imaterial, abordando o sítio inteiro de uma maneira holística, até hoje não há bens inscritos no Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico que tenham tido seu valor atribuído por representarem aspectos mais amplos dessa integração. De um modo geral, historicamente, a paisagem tem sido tratada muito mais a partir da ideia de panorama e vinculada a outros bens culturais, a partir dos quais é atribuído valor a ela (Ribeiro, 2007).

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Já em 2006 o relatório de Carlos Fernando vai ser orientar para a Paisagem Cultural Brasileira, no marco da produção da Chancela da Paisagem Cultural. Nesse momento, trata a paisagem cultural como um elemento, ou, mas bem, categoria, que depende da experiencia artística e do processo cultural de apropriação da paisagem, por tanto a construção da paisagem cultural exige uma criação cultural mediada pelos artistas. Na realidade podemos perceber, no discurso e nas reflexões destes autores que temos duas conceições da paisagem. A primeira, seletiva, escolhe aqueles de interesse histórico, cultural, artístico, etnográfico ou estético, são as paisagens culturais. Por outro lado temos o patrimônio cultural, que constroem paisagens genéricas, porque tudo o que nos envolve é paisagem (Hoyuela Jayo, A paisagem como instrumento para um planejamento sustentável: uma visão dialética entre Europa e o Brasil, 2016). Diferenciamos assim a paisagem como categoria cultural, da paisagem como método de análise, ordenamento e gestão de qualquer espaço, rural ou urbano, cultural ou natural, ou combinações de ambas, que nos possam acontecer no decorrer da ordenação de um território. Esses elementos do patrimônio natural atraem a dimensão natural e/ou ecológica para o olhar do responsável da avaliação do patrimônio cultural, mesmo sendo que: “... o patrimônio natural sempre esteve na pauta de debates e de ação do Iphan. O tema vinha à tona quando se discutia a proteção dos monumentos naturais e paisagísticos; a ambiência do patrimônio arquitetônico; o entorno dos bens tombados; os que deveriam ser inscritos individualmente no Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico; ou ainda como pano de fundo ao se tratar dos conjuntos arquitetônicos, urbanísticos e rurais inscritos também nos outros Livros, como o Histórico ou das Belas Artes; na regulamentação da publicidade em sítios protegidos; na inserção de novas obras de arquitetura nos conjuntos acautelados; na reconstituição ou na recomposição de edifícios e obras integrantes das cidades históricas; na elaboração de normas e procedimentos para regulamentação de intervenções etc.” (De Medeiros Mongelli, 2011, pág. 19)

A lei 25, no Art. 1º, em seu parágrafo segundo, equipara os bens de natureza material aos monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importam conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela natureza ou agenciados pela indústria humana. Estabelece que esses bens devam ser inscritos no Livro do Tombo (categoria) Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. As outras categorias por Livros de Tombo são: o Histórico, das Belas Artes e das Artes Aplicadas. Nessa última nenhum bem foi tombado no Rio de Janeiro. Os bens e seus entornos são peças fundamentais no conjunto dos espaços e corredores ecológicos e verdes, mas também são espaços de conservação dentro do ambiente urbano, suporte de recursos naturais e hábitats variados, fundamentais para a biodiversidade e para a conservação das paisagens e dos ecossistemas. Também apresentam um grande potencial para a pesquisa biológica, botânica, ecológica, paisagística, e para a formação e educação, cultural e ambiental, dos cidadãos. Adequadamente preservados devem e podem promover uma melhor qualidade de vida

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para os visitantes e para os moradores, relacionando natureza e cultura, rural ou urbana, tanto em termos práticos quanto simbólicos e representativos. Patrimônio Cultural desde uma perspectiva territorial e de desenvolvimento sustentável. Atualmente novas dificuldades surgem quanto a preservação dos bens culturais no Brasil, oriundas das complexas ameaças ao meio ambiente e desafiando a SPHAN / Promemoria, ao exigir-lhe visão muito mais abrangente que a tradicionalmente adotada para a tutela do patrimônio ... tendo de proceder a novas pesquisas ou consultar a outros especialistas da área multidisciplinar que envolve o problema ecológico, já que a degradação do meio ambiente, da mesma forma que ameaça a vida ou a qualidade de vida, também dificulta ou coloca em perigo a conservação ou preservação dos bens culturais... Nossa forma de atuação tornou-se defasada e insuficiente (De Moura Delphim, Estudo sobre o Patrimônio Natural Brasileiro dentro do IPHAN, 2004)

As premissas da Política de Patrimônio Cultural Material (IPHAN, 2018), aplicáveis no caso carioca, e na nossa proposta, independentemente do tipo de ação, devem inspirar nossa ação. Por isso deveremos destacar uma atitude proativa e propositiva que envolve no futuro atores e ações associadas mediante mecanismos proativo de pactuacão e coordenação das políticas públicas. Também devemos destacar a indissociabilidade entre as dimensões materiais e imateriais, assim como dos documentos que reconhecem e explicam o dito patrimônio. Para esse fim devermos partir da leitura do território e da paisagem, desde uma compreensão das dinâmicas e das políticas econômicas, ambientais, sociais e culturais que convergem nesses espaços e que interatuam, ou interatuarão com os bens. A gestão do patrimônio cultural deve promover a articulação institucional com diferentes níveis de governo e sociedade civil, mediante os instrumentos setoriais (turísticos, de transporte, energia...), ambientais (águas, lixo...), urbanísticos (zoneamento e gestão), estratégicos (metropolitanos, inovadores...), ou de outra índole existentes ou futuros. Na área de participação devemos estimular o fortalecimento de grupos sociais para preservação do seu próprio patrimônio cultural material, criando foros de consulta e apoio a decisão junto a sociedade civil, moradores ou estudiosos. As ações e atividades devem buscar articular com os entes federados e demais órgãos e entidades componentes do Estado Brasileiro, na construção de instrumentos de compartilhamento e de delimitação de atribuições relativas à preservação dos bens protegidos. Espanha tenta manter uma certa coerência na definição das políticas nacionais de urbanismo, ordenamento do território, da paisagem, do patrimônio cultural, apesar de ser mais federal que muitos estados federais (e não tão autonômico como falamos). Nesse contexto, são elaborados pelo Instituto do Patrimônio Cultural, Ministério de Educação, Cultura e Esporte, os Plano Nacionais do Patrimônio Cultural. Entre eles destaca o de Paisagem Cultural, que envolve as paisagens de especial interesse cultural, a maioria deles envolvendo patrimônio cultural e/ou patrimônio mundial já declarado sob a figura de conjunto histórico, com exemplos relevantes como Cuenca, os moinhos de Castela La Mancha, ou Navapalos em Soria, El Paular em Madrid,

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o vinhedo, a Serra de Cartagena – A União (Murcia). Outros importantes planos seriam os relativos as catedrais, conventos e abadias, arquitetura defensiva, e outros sistemas territoriais relevantes.

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Paisagem. “Em realidade, a paisagem compreende dois elementos: os objetos naturais, que não são obra do homem nem jamais foram tocados por ele; os objetos sociais, testemunhas do trabalho humano do passado, como no presente. A paisagem não tem nada de fixo, de imóvel. Cada vez que a sociedade passa por um processo de mudança, a economia, as relações sociais e políticas também mudam, em ritmos e intensidades variados (Santos, Pensando o espaço do homem, 1982, pág. 37)

Figura 3 .- A realidade da paisagem é complexa e sua expressão deve resolver-se a través de complexos esforços de grafismo e expressão cartográfica, cruzando os ecossistemas naturais, com os culturais, e tentando sintetizar a união de todas essas dimensões.

David Harvey e Milton Santos anunciaram, no final do século XX: “… cada homem valerá pelo lugar que habita”2 (Santos, A natureza do espaço: espaço e tempo: razão e emoção, 1999 (1ª ed. 1987), pág. 81). A importância da paisagem, do meio ambiente ou do local, na educação, no bem-estar e na qualidade de vida do sujeito e, por extensão, na sociedade, é fundamental. Um ambiente físico saudável, diversificado, atraente, natural e cultural harmonioso contribui para o bem-estar e a qualidade de vida dos cidadãos e do meio ambiente (Tojo Fariña, 2008). Nos últimos anos do século XX, a sensibilidade ambiental e cultural favoreceu a proteção de muitos espaços e lugares, mediante seu tombamento3. Uma política que visa mais a

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“Cada homem vale pelo lugar onde está. O seu valor como produtor, consumidor, cidadão depende de sua localização no território [...]. A possibilidade de ser mais ou menos cidadão depende, em larga proporção, do ponto do território onde se está” 3

As APA, Áreas de Preservação Ambiental, como tombamento ambiental, e os tombamentos culturais e naturais de bens moveis o imóveis a diversas escalas do IPHAN,…

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proteção e menos a ação ou a gestão e que exige uma nova abordagem. O aumento da consciência social e os movimentos sociais, a globalização e o fortalecimento da identidade local, através de processos de planejamento participativo, contribuíram para construção de novos modelos. A paisagem é o resultado de uma transformação coletiva da natureza, é a projeção cultural de uma sociedade em um determinado espaço (Nogué, La construcción social del paisaje, 2007)

Algumas das características básicas do conceito paisagem podem ser expressadas como essências ou princípios da sua própria conceptualização. A paisagem é uma idealização, uma utopia configurada como um conceito intrínseco da ideia que nasce da eterna busca do paraíso, ou construções virtuais atópicas cheias de ideais pragmáticos. A paisagem também é um conceito subjetivo, na verdade, o epítome do termo. É subjetiva do ponto de vista da interação entre suas formas e manifestações e as pessoas que o ocupam, mas também do ponto de vista de quem o descreve e interpreta. A paisagem é sempre um conceito cultural, no sentido antropológico do termo, uma criação humana e uma forma de descrição do espaço. A paisagem expressa o espírito, valores, sentimentos, experiências, mitos e preconceitos de uma sociedade, "a paisagem é um estado de espírito", nas palavras de Henry-Frédéric Amiel (Amiel, 1919) que une o material e o imaterial, mediante processos de apropriação e expressões simbólicas. O tempo determina a paisagem. O tempo como formador e como ponto de referimento nos permite analisar, descrever, explicar e compreender o espaço. As interações e as complementaridades entre as componentes da paisagem, nos diferentes tempos, vão criando, mudando ou antecipando, processos e mudanças. A paisagem é um produto do tempo e muda com o ritmo dos processos naturais, sociais e econômicos. Você não pode parar ou fixar a imagem da paisagem. Apesar de sua complexidade, a expressão da paisagem é refletida no conjunto, configurando um palimpsesto, uma estrutura holística, de múltiplas leituras. Apenas uma leitura histórica, social, ecológico, ambiental, econômica, cultural, perceptiva... e acima de tudo, dos processos que o justificam, vai trazer-nos mais perto de uma imagem real da paisagem. Habermas (Habermas, 2008 (1ª ed. 1989)) busca nas fontes da fragmentação excessiva do conhecimento na modernidade a perda de um conhecimento de síntese, de uma visão integrada, como a paisagem exige: "... se a modernidade falhou, foi por deixar que toda a vida se fragmentasse em múltiplas especialidades deixadas para a concorrência estreita de variados especialistas";

Por isso ele procura uma solução nas artes as quais convida para colocar-se como um elemento básico de síntese que antecede ao conhecimento: "lançar uma ponte sobre o abismo entre o discurso do conhecimento, a ética e a política, e, assim, abrir o caminho para a unidade da experiência"

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Ao mesmo tempo paisagem é moldada como o contraste entre a cultura e a natureza, entre o artifício e o vernáculo, entre a proteção e o desenvolvimento. Enric Battle no seu livro "O Jardim da metrópole" (Battle i Durany, 2011) propõe a intervenção na paisagem como um modo de "encontrar o equilíbrio entre crescimento e preservação e novas trilhas, ecologicamente corretas, permitindo o uso da terra sem venerar, mas para garantir a sustentabilidade no futuro".

Por isso a ecologia, falando de paisagem, não é só ambiental, mas também social e econômica, pode ser aproximado como um conjunto de ciências que analisam as interações e os processos que explicam a essência da realidade, os fundamentos do meio em que a paisagem se desenvolve e suas relações mútuas. Ao mesmo tempo, a paisagem define-se como um conceito multiescalar donde as fronteiras do espaço em que vivemos foram diluídas por meio da ampliação da ação humana, a colonização progressiva da natureza verde e rural e da metrópole. As escalas da paisagem vão para além do espaço físico e entram no espaço virtual do conhecimento hipervinculado da Internet (Eco, 2013). A paisagem deve ser diluída, sintetizada e concretizada para definir claramente esses limites ou amplia-os. Os elementos componentes da paisagem devem ser expressos em diferentes escalas: paisagens locais (locais), territórios e regiões globais, e entendidas dentro da lógica dos sistemas que os interligam. Mas também devemos pensar a paisagem desde a lógica da colaboração e dos processos participativos, porque a paisagem sofre e expressa a sobreposição de competências, agentes, manifestos, usuários e sistemas. A coordenação e colaboração, não só dos funcionários públicos, mas, sobretudo, privada, acadêmica e da sociedade civil no seu conjunto, tornar-se urgente no planejamento da paisagem e especialmente na sua gestão. A Paisagem planejada, a cidade de Rio de Janeiro como modelo. Vários são os cenários donde estamos consolidando a visão estratégica e os métodos que deveriam ser implementados para normatizar e gerir as paisagens do século XXI. O próprio PRODOC no Rio de Janeiro, os debates no DEPAM em Brasilia, e recentemente com a equipe de paisagistas no encontro de ENANPUR em Natal. Encampando a provocação proposta pela temática deste XVIII ENANPUR, que quis discutir o atual momento de desenvolvimento e crise, a tempo de resistir e a “tempo de caminhar por novas trilhas”, vislumbrando caminhos ao planejamento urbano e regional, a sessão debateu as necessárias interfaces entre as políticas de planejamento territorial integrado e as de preservação da paisagem e dos patrimônios culturais, por meio da atualização conceitual incitada pelo novo paradigma da paisagem cultural e, no nosso caso, pelo projeto PRODOC. Na oficina que fizemos em Natal estiveram presentes Vanessa Belo, Nadia Somek e Laura Lage, e colaboraram Rafael Winter, Leonardo Barci Castriota e Flavio Carsalade.

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O progressivo alargamento daquilo que é considerado objeto de interesse para a preservação, que passou do monumento, como elemento isolado e destacado (natural ou construído), aos conjuntos arquitetônicos e urbanos, centros e cidades históricas reconhecidos em seus valores estéticos e históricos – e, recentemente, aos patrimônios imateriais e à paisagem em diversas escalas territoriais (unidades intraurbanas e sistemas regionais de paisagem), agregando outros valores (antropológicos e de uso ou até valores de reconhecimento a través da construção de uma memória, mediante a arte, a ciência, a literatura...) rumo ao reconhecimento da diversidade e da complexidade culturais, e cria assim novas questões e, portanto, novos desafios ao reconhecimento e à gestão. O conceito de paisagem cultural propõe congregar estes vários aspectos e abordagens correntes no campo da preservação cultural, considerando sua interdisciplinaridade e a necessidade de superação da fragmentação ainda praticada. Partindo-se de uma concepção mais alargada e integradora entre a ação do homem e a natureza e entre os patrimônios material e imaterial, adotar a paisagem como patrimônio promove, ao passo que admite, o constante movimento e as relações inseparáveis e complementares entre conceitos e abordagens de diversos campos do conhecimento – da história, da arqueologia, da arte, da arquitetura, do urbanismo, do planejamento territorial, da sociologia, da antropologia, da cultura, da geografia, da etnografia, da ecologia, da biologia, do turismo, da ciência política, do meio ambiente... – e suas correspondências no meio físico, seja nos objetos móveis, na edificação ou no território – urbano, rural ou natural. Tal como coloca a Recomendação R(95)9 do Conselho de Ministros da Europa (1995), deve pressupor a ação integrada do planejamento e gestão territoriais com as políticas ambientais e sociais, sobretudo em suas dimensões culturais e econômicas. Deve também conjugar a política de preservação ao processo dinâmico de desenvolvimento das cidades, o que implica necessariamente em não impedir as mudanças, mas em direcioná-las a favor dos patrimônios e, portanto, trabalhar na perspectiva do planejamento e desenvolvimento sustentáveis. Pretende-se refletir por tanto, com a ideia de construir uma base conceitual mais sólida para nosso PRODOC, sobre aqueles que nos parecem ser alguns dos atuais desafios das políticas públicas integradas, especialmente as de planejamento, preservação cultural e ambiental e participação social: 1. primeiramente o de compreender a abordagem da paisagem cultural como conceito e uma nova epistemologia do campo do patrimônio cultural e não simplesmente como uma nova categoria de patrimônio, como vem praticando a UNESCO; 2. o de superar a fragmentação e as oposições ainda praticadas no campo da preservação cultural, sobretudo quanto ao que se reconhece e se gerencia como patrimônio natural e cultural, material e imaterial, e documental e simbólico; 3. o de empreender o reconhecimento e a gestão das paisagens culturais em sua totalidade sistêmica e complexa;

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4. o de compreender territorialmente os patrimônios, incluindo-os como elementos estruturadores nas políticas de planejamento territorial intraurbano e regional; 5. as contraposições entre a patrimonialização de paisagens identificadas e valoradas como “excepcionais” ou “representativas” (paisagens culturais da Chancela) e aquelas ordinárias tratadas como unidades de um território culturalmente marcado, constituindo um recurso favorável à gestão territorial de maneira geral, para além do reconhecimento oficial enquanto patrimônio; 6. o de pensar a preservação também pelo seu oposto dialético, a transformação, abrindo a porta a contemporaneidade, integrando as novas formas e narrativas, sem perder as leituras anteriores que estão no reconhecimento dos valores originais; 7. o desafio de tratar o patrimônio de forma viva e dinâmica nas cidades, incluindo os usos, identidades e apropriações sociais, construindo uma nova relação das comunidades com os seus referenciais de herança coletiva e prática cultural, reinserindo-os como parte da vida urbana, das relações cotidianas e da paisagem; 8. o de verificar como a proximidade da relação entre identidade, território e paisagem vem imputando aos planos urbanos e regionais um novo direito, o direito à paisagem (Oliveira, Custódio, & Carneiro Lima, 2016), e um consequente exercício de cidadania ligado à luta e usufruto deste direito, uma cidadania paisagística (Brack Duarte C. , 2017; Cardoso Guimarães, 2009); 9. inexoravelmente, os dois desafios anteriores, incitam a ampliação da participação das comunidades no reconhecimento e gestão dos patrimônios e das paisagens, para além da tradicional participação daqueles que detém o chamado “notório saber”, típica da representação que compõe os órgãos de preservação brasileiros, os cidadãos e a sociedade civil; 10. por fim, o imenso desafio de construir um sistema sustentável de gestão, com estruturas que possibilitem o compartilhamento intersetorial (entre os diversos setores de um mesmo nível de governo) e interinstitucional (entre as três esferas de governo), a transdisciplinaridade, a conjugação de instrumentos e o planejamento territorial com forte participação cidadã. Para isso já iniciamos vários contatos institucionais que temos que consolidar. A sessão temática proposta foi concebida de forma a criar um equilíbrio entre o exame do conceito e a sua aplicação prática, enfocando os avanços e problemas junto ao campo do planejamento urbano e regional. Rio de Janeiro e Campinas, assim como exemplos menores de Belo Horizonte, foram analisados e debatidos. Esta forma de abordagem permite a discussão teórica integrada com os mecanismos de gestão do território e da paisagem, o que se torna visível na apresentação de estudos de casos práticos. Nesse sentido, os estudos de casos e experiências selecionadas para este debate apontaram uma visão panorâmica destas questões e desafios no Brasil e no exterior. Durante a sessão serão debatidos os desafios e questões enfrentadas pelo IPHAN e pela Prefeitura do Rio de Janeiro diante da elaboração do Plano de Gestão da Paisagem Cultural do Rio, chancelada pela UNESCO em 2012, assim como do projeto PRODOC, de 25


normatização e gestão do patrimônio cultural brasileiro; a recente experiência em curso no tradicional bairro do Bixiga em São Paulo; a experiência recente de revisão do arcabouço urbanístico de Campinas-SP (2016), que apresentou a metodologia específica criada para identificação de paisagens culturais pensados como um sistema estruturador do planejamento territorial integrando desenvolvimento socioeconômico e cultural via plano diretor e lei de uso e ocupação do solo; mas também foi apresentada uma experiência internacional realizada em Londres e Holanda, com análise e gestão do território a partir da leitura da paisagem, por meio de metodologias específicas HLC e Belvedere; e, por fim, o último trabalho apresentará a metodologia do HLC aplicada ao caso de Lagoinha, em Belo Horizonte. O exame crítico dessas experiências nacionais e internacionais conseguiu promover uma discussão sobre os desafios entre limites e possibilidade da abordagem da paisagem e da paisagem cultural para formação de políticas públicas territoriais integradas no Brasil que estamos integrando nesta proposta metodologia e na estratégia de aproximação ao territorio. A paisagem como lugar, ambiência, topos ou rarum. “[...] a ‘paisagem’ é um conceito complexo, que admite uma infinidade de aportes e passeia por diferentes disciplinas, desde a geografia, como um de seus principais conteúdos, até atingir o âmbito da preservação cultural, inclusive constituindo categoria do patrimônio da humanidade instituída pela UNESCO em 1992.” (Bezerra de Menezes, 2002, pág. 29)

O ‘Topos’ grego, a envolvente, vai ser enriquecida a través do conceito mais amplo de ‘Rarum', alemão, baseado na compreensão não só do "envelope", mas também do meio ambiente, do lugar. O espaço entendido a partir da consideração duns limites mais amplos (Bollnow & D'Ors, 1969, pág. 39). Limites que considerem o habitar (Heidegger, 1954 (1ª ed. 1951)) como condição do sistema. Fronteiras além dos objetos e seus entornos imediatos que integrem as funções (ecológicas, econômicas, sociais...) que dão sentido e valor a uma proposta de planejamento de "lugares" não mais de elementos ou espaços. A ideia de Heidegger desenvolvida por Bollnow define o lugar como uma síntese histórica entre os valores de identidade (culturais e intangíveis) e o espaço. Uma síntese expressa e gravada nas formas da arquitetura e concretizada dentro de um determinado limite (geografia). A paisagem como lugar é uma unidade totalizante. Mesmo onde a predominância de fatores e expressões culturais é maior, a paisagem transcende esses elementos, arquiteturas, ou formas, e vai além do físico atingindo o imaterial. Compreender o lugar precisa tempo e esforço (Lynch K. , La planificación del sitio, 1980, pág. 101). O espírito do espaço se manifesta lentamente, é complexo e multidisciplinar. Se a nossa busca pela essência do lugar é estruturada com base nos pilares de nossas metas e objetivos de desenvolvimento sustentável, então precisamos analisar o espaço do ponto de vista social, econômico, ambiental e perceptual. Neste "lugar" dialogam o cheio com o vazio, as expressões culturais com a natureza da geografia, o tempo com as formas e com os estilos, e os símbolos com as percepções. E assim que construímos o

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conceito de lugar como a própria essência do espaço, a través dos seus valores e da compreensão de seus elementos identitários. E ai que Kenneth Frampton (Frampton, 1985) procura as bases do "regionalismo crítico" e da verdadeira essência do lugar que vai nos permitir superar a tendência do consumismo, da simplificação e da globalização do espaço e das formas. É ai quando a arquitetura e o urbanismo concentraram seus esforços na produção e na definição de um conceito de estilo, diferenciador, excepcional, integro e autentico. Frampton vai defender uma posição de compromisso com o lugar entendido como um "enclave limitado", e, portanto, específico e bem delimitado. Um conceito similar ao que Robert Venturi defende no seu "modelo de cultura como um ambiente total" (Venturi, 1995), que propõe que deve ser colocado na base do projeto e, por extensão, do Plano.

Figura 4 .- Entender as paisagens cariocas dentro do Parque Nacional da Floresta da Tijuca e Florestas de Proteção exige classificar, identificar e ordenar a geomorfologia, a hidrografia, os sistemas patrimoniais das fazendas, das infraestruturas das águas, dos corredores ecológicos, das nascentes e da transição entre as baixadas, e os sucessivos sistemas montanos até os ecossistemas nebulosos.

Esta visão deve fazer-nos repensar a ideia de paisagens culturais como uma unidade isolada ou separada. A ideia do lugar surge assim como uma forma de transcender a disciplina da arquitetura e do planejamento na procura de uma identidade e da essência do espaço. A ideia do lugar como paisagem está ligada à história como um conjunto de processos e acontecimentos, condições e circunstâncias que moldaram, dotaram identidade, e não "ter ocorrido" (De Las Rivas Sanz, El espacio como lugar: sobre la naturaleza de la forma urbana, 1992, págs. 19-40). A paisagem entendida como um lugar não pode ser isolada, setorizada ou contraída (paisagem cultural, urbano, rural, natural...), mas deve sim procurar compreender a complexidade do conteúdo, a periodicidade, os ritmos e as percepções. A leitura tem que se transferir a partir dos elementos para os processos (e, consequentemente, os agentes), e de ai para os sistemas e as narrativas componentes, sem esquecer as percepções e símbolos culturais 27


e antropológicos que produzem e são produzidos pelo espaço de interação junto a sociedade. As paisagens como ecossistemas culturais. “A par do património natural, encontra-se igualmente ameaçado um património histórico, artístico e cultural. Faz parte da identidade comum de um lugar, servindo de base para construir uma cidade habitável. Não se trata de destruir e criar novas cidades hipoteticamente mais ecológicas, onde nem sempre resulta desejável viver. É preciso integrar a história, a cultura e a arquitetura dum lugar, salvaguardando a sua identidade original. Por isso, a ecologia envolve também o cuidado das riquezas culturais da humanidade, no seu sentido mais amplo. Mais diretamente, pede que se preste atenção às culturas locais, quando se analisam questões relacionadas com o meio ambiente, fazendo dialogar com a linguagem técnico-científica e com a linguagem popular. É a cultura – entendida não só como os monumentos do passado, mas especialmente no seu sentido vivo, dinâmico e participativo – que não se pode excluir na hora de repensar a relação do ser humano com o meio ambiente.” (Franciscus, 2015, pág. Par 143)

Analisar os ecossistemas naturais e culturais nos ajuda a procurar o bem comum e defender a paisagem como síntese entre o patrimônio natural e a cultura, a arte e a história, seja geológica seja do tempo solar, do nosso tempo. Na mesma encíclica que acabamos de citar, o Papa Francisco afirma, de forma contundente falando da “2. Ecologia cultural”. Numa visao dinamica da paisagem devemos entender o papel dos ecossistemas sejam eles culturais, sociais, económicos ou ambientais: ... o funcionamento dos ecossistemas naturais é exemplar: as plantas sintetizam substâncias nutritivas que alimentam os herbívoros; estes, por sua vez, alimentam os carnívoros que fornecem significativas quantidades de resíduos orgânicos, que dão origem a uma nova geração de vegetais (Franciscus, 2015).

Quando falamos de ambiencia e do tratamento dos entornos sempre é um discurso baseado na ideia da sua percepcao cultural. Os tombamentos de bens naturais, no marco do IPHAN, devem ter como finalidade a conservação paisagística, histórica, artística, etnográfica, etc... (Rabello, 2009). Igualmente a preservação do seu entorno não deve se limitar exclusivamente aos bens de natureza construída, mas também aqueles naturais, que influem na ambiência. Para eles são preferenciais as ações de preservação de seus valores culturais, mas também a preservação dos ecossistemas, como estratégia, ou diretriz a serem pactuada com outros órgãos, e aplicada com outros instrumentos específicos (Planos de Manejo, Planos Urbanísticos, ou outros), e pode ser considerada desde que tenha como finalidade a manutenção dos sistemas ecológicos vitais e interdependentes para a conservação do bem ou do conjunto. Por consequência, os efeitos jurídicos da intervenção estatal será o de evitar toda ação danosa que possa intervir naquele bem enquanto paisagem, e não enquanto ecossistema. É evidente que existe relação entre a destruição de determinados setores vitais da floresta e a sua conservação, mas quando esta relação não for necessariamente dependente e interferente, ela não interessa- rá ao tombamento. Sendo os interesses públicos diversos, a ação do Estado, nesses casos, deverá ser orientada pelo motivo da preservação no sentido de alcançar a finalidade de cada uma das leis específicas.

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Estamos num cenário mais abrangente que tenta integrar não só o conceito da paisagem cultural (envolvente imediata afetada pelo bem), mas sim, também o conceito de patrimônio cultural de origem natural, como valor e bem igualmente tombado (Floresta da Tijuca, ou o próprio Jardim Botânico) e o conceito de visão de conjunto de entorno, como garantia para a preservação da chamada “ambiência”. E essa última ideia que nos faz pensar os entornos, como acontece no Jardim Botânico, não só desde a perspectiva de cada um dos bens, mas também do conjunto e suas interações visuais e ambientais com os pontos de maior interesse que possam estar envolvidos no reconhecimento do local.

Figura 5 .- Medir e entender as diferentes componentes da paisagem é um primeiro passo para poder ordenar e gerir suas diferentes componentes. Projeto PRODOC 4018.

As portarias no Rio de Janeiro, na Floresta da Tijuca, Jacarepaguá, ou Jardim – Botânico, focalizam principalmente no conteúdo do art. 18, falando de gabaritos, ocupação do solo ou caraterísticas das coberturas ou dos painéis publicitários. A falta de concreção dos valores, os problemas nas delimitações excessivamente genéricas, ou a exclusão dos bens de interesse natural, fazem que estejam exclusivamente focadas na construção, e menos nos espaços públicos (ambiência), no patrimônio natural ou na ambiência. A estratégia de abordagem, que considera a paisagem como paradigma do patrimônio cultural, como epistemologia, ou forma esta recolhida no documento: Pro03. Cad01. Estratégia de Abordagem

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Território e sistemas. A palavra território refere-se a uma área delimitada sob a posse de um animal, de uma pessoa (ou grupo de pessoas), de uma organização ou de uma instituição. O termo é empregado na política (referente ao Estado Nação, por exemplo), na biologia (área de vivência de uma espécie animal) e na psicologia (ações de animais ou indivíduos para a defesa de um espaço, por exemplo) (Haesbaert, 2009).

A través da nova política nacional de patrimônio cultural, pretende-se, a partir de um conhecimento completo e minucioso dos territórios de análise, nas suas diferentes escalas, e de seus componentes, pensar de forma mais ampla o conceito de território. Assim, as diferentes agrupações, de caráter transversal (território fluminense), ou de caráter mais vertical (p.e. sistema territorial dos mosteiros franciscanos do Brasil, ou do nordeste só) vão nos ajudar na leitura do espaço, mas também na gestão futura desses elementos.

Figura 6 .- Sistema territorial dos engenhos e das fazendas de Rio de Janeiro, sistemas infra de corredor Norte (caminho de Santa Cruz), baixada de Jacarepaguá, Maciço da Tijuca e Lagoa Rodrigo de Freitas.

A aplicação dos diversos instrumentos de ordenação é gestão tem que ser pensada desde uma visão integrada do desenvolvimento sustentável, integrando-os de uma forma rigorosa e adequada nos seus territórios e sistemas territoriais de referência. A casuística específica para a delimitação dos Sistemas Territoriais tem a ver com a fusão, com a difusão e com a exploração dos bens e seus valores e potenciais, não só culturais, mas também históricos, artísticos, ecológicos, ou simplesmente de ambiência (Cavalheiro & Nucci, 1998). Território e suas diversas escalas e apropriações Mas o instrumento ideal para atuar nas paisagens é o planejamento territorial, entendido em seu sentido mais amplo, que engloba as diferentes escalas espaciais e os diferentes níveis de competência política. Paisagem e território interagem; Não há nenhuma decisão sobre a política territorial que não se manifesta na paisagem, que

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por sua vez pode fornecer essa política com uma referência de coerência geral e um grau final de qualificação formal (Cruz, 2013)

O território nasce da palavra terra, implica o princípio da posse por uma pessoa, propriedade ou sociedade em uma área específica ou região do espaço. Na geografia física, território é sinônimo de superfície terrestre pertencente a uma unidade administrativa, seja nação, região ou província. Já a escala regional, o território é um sistema ou complexo formado por todos os elementos físicos, naturais e antrópicos. Em ecologia pode ser sinônimo de ambiente natural, ou conjunto de lugares interligados por redes e fluxos horizontais, mas também um território de relações ecológicas de dimensões sociais, econômicas e ambientais. O território representa um espaço absoluto em que os diferentes objetos e fenômenos são apresentados, um espaço natural ou cultural, formado pelo conjunto de elementos e formas socializadas, que interagem, mesmo desde a distância, porque compartilham elementos comuns. Nesse sentido, paisagístico, ou social, ou antropológico, pode ser considerado como um sistema formado pelas interações entre a sociedade e o meio ambiente que habita. O território pode ser interpretado como Pátria (De lat. patria), à qual o ser humano está vinculado por laços jurídicos, históricos e afetivos, ou por ser o lugar, cidade ou país em que nasceu; como nação (de lat. natĭo, -ōnis), formado pelo grupo de habitantes de um país regido pelo mesmo governo e que compartilham a mesma origem que geralmente falam a mesma língua e têm uma tradição comum; o estado, como assembleia dos órgãos dirigentes de um país soberano, ou como uma porção de território cujos habitantes são governados por suas próprias leis, mesmo que estejam sujeitos em certas matérias às decisões de um governo comum. Pode alcançar o reconhecimento de País (De p. Pays), como nação, região, província ou território, ou simplesmente como paisagem (pintura ou desenho). Sistemas territoriais e narrativas históricas e funcionais do território. A percepção da paisagem como um sistema exige o concurso de muitas disciplinas que interferem na compreensão do conceito. Disciplinas como a história, a ciência, a antropologia, a arqueologia, a paleontologia, a geologia, a estratigrafia e outras formas de conhecimento que compõem a cultura humana e que participam do complexo e difuso tema da paisagem cultural; (De Moura Delphim, Considerações sobre a paisagem cultural do Rio de Janeiro, 2009)

Para o planejamento e gestão dos nossos bens e seus entornos, considerados como um todo, definimos agrupamentos homogêneos geralmente descontínuos e hierárquicos de caráter funcional chamados sistemas territoriais patrimoniais. Nas suas diferentes escalas eles podem ser paisagísticos, do entorno imediato, regionais, ou até nacionais. Esses sistemas constituem a base das nossas propostas, integrando narrativas e elementos componentes. Essa infraestrutura integra funções, usos, estiles, sistemas construtivos, paisagens e entornos, atividades e processos. Podem ser próprios, patrimoniais ou complementares (afetam aos bens, e os definem, mas não formam parte intrínseca dos valores reconhecidos aos mesmos).

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A história, como argumento e narrativa da nova paisagem cultural. Os trabalhos vão partir da identificação e avaliação e valorização do patrimônio tombado a nível federal e suas correspondentes áreas de entorno definidas nas respetivas portarias. Queremos por tanto, fazer uma breve reflexão sobre o conceito de patrimônio cultural no Brasil, e particularmente no Rio de Janeiro, e seus desdobramentos contemporâneos no contexto também de ICOMOS e da UNESCO. Colocar em discussão formas diversas de construir narrativas, e fazer com isso sentido do passado, não é fácil. Sem perder rigor e qualidade científica a narrativa deve incorporar os valores naturais e culturais, mas também, e sobretudo, um discurso de apropriação por parte da sociedade da história, da geografia, e dos bens imateriais, a chamada percepção que nasce de processos participativos que deveremos ativar. Por isso, a patrimonialização do passado, como estratégia contemporânea, requer uma leitura sistemática e objetiva (dentro do possível). As práticas de representação historiográfica, geográfica, cartográfica, artística, cultural (pictórica, literária, cinematográfica...) do passado, devem estruturar todas às operações de apropriação num processo dialético e coletivo. Neste recorrido de análise dos planos e das políticas que envolvem a gestão dos bens e dos entornos das portarias do IPHAN no Rio de Janeiro extraímos algumas linhas para a discussão nos próximos meses durante a proposta metodológica e instrumental dos novos instrumentos prevista no projeto PRODOC. Elas são divididas em fins e objetivos, ou a imagem que queremos; em reflexões sobre o caráter territorial, nas suas dimensões e escalas; em análise de bens e entornos, para tratar das questões que refletem sobre os tombamentos; e aquelas ideias que refletem sobre as portarias referentes aos entornos e as áreas de amortecimento. Uma imagem global ou uma imagem local? A reputação internacional do Rio de Janeiro foi construída progressivamente, mais no exterior, do que no interior do país. No mínimo, duas imagens, não convergentes, foram construídas da mesma cidade, do mesmo espaço, e nos mesmos tempos. Os estereótipos foram sendo conformados por imagens primordiais consolidadas ao longo de séculos. As transformações urbanísticas de modernização, que podemos falar que dão início com os primeiros engenhos de açúcar no fim do século XVI, vão se intensificar com João VI, com a construção de referências arquitetônicas, como o neoclassicismo da escola francesa, por políticas de comércio exterior e de propaganda, que envolvem os grandes eixos de equipamentos públicos, e pelos filmes de outros países, em particular as produzidas pelos Estados Unidos da América, que idealizaram os estereótipos, de entre eles a praia, a paisagem, a sensualidade, o bom tempo e a música. Ao mesmo tempo, a realidade social, económica e ambiental do país estavam construindo um espaço diferente. Os brasileiros nas suas visões fílmicas estavam começando a confrontar a realidade com filmes como Dois Filhos de Francisco (Breno Silveira, 2005), Cazuza (Sandra Werneck, 2004), Olga (Jayme Monjardim, 2004), Carandiru (Hector Babenco, 2003) e Cidade de Deus (Fernando Meirelles, 2002). O

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crescimento e crise das comunidades nos morros e nas baixas, o desrespeito ambiental, a violência, os desequilíbrios sociais, a perda de identidade, a globalização da cultura, e outros diversos problemas estavam crescendo, tão rápido quanto a urbanização acelerada e descontrolada. Até ao final da Segunda Guerra Mundial a construção da imagem de marca internacional da Cidade Maravilhosa é fruto da interação de intenções nacionais e da capacidade de tradução e interpretação cultural da indústria cinematográfica norte-americana. Hoje, os meios de comunicação, mais rápidos, e menos comprometidos com uma narrativa bonita do que com uma realidade violenta, fora de escala e sangrenta, escolhem preferentemente as notícias que a população consome. Sua realidade não é abrangente, nem sequer prioriza os aspetos mais relevantes para nossa convivência, mas sim as audiências, lideradas pelas fake News, ou notícias falsas. Duas realidades por tanto convivem e o patrimônio cultural deve entender as duas dimensões como um equilíbrio entre realidade e utopia (Hoyuela Jayo, Borsagli, & Mesquista, Paisagem, Memoria e Utopia, durante o processo de construção da Nova Capital de Minas, 2015 f). Leituras idealizadas podem se colocar na base das nossas propostas, mesmo como objetivos impossíveis, mas horizontes que orientem nossas ideias para um mundo ideal não podem esquecer a realidade que hoje vivem o país ou a cidade de Rio de Janeiro. A dinâmica de consolidação de ícones representativos do patrimônio cultural e natural do Rio de Janeiro deve se repensar, não só na realidade, mas no ideário de planejadores e gestores culturais se constituindo como um eco do futuro, uma base da afirmação da cidade no imaginário de quem tem responsabilidade no patrimônio a longo prazo. E tudo isso num contexto de crise institucional, econômica, de segurança e de mudanças climáticas. A construção da imagem e da narrativa do tombamento, e dos planes de gestão dos bens, nas cidades, nas paisagens e nos centros históricos deve se apoiar na sua relação com a história urbana e com os processos que deram forma a essas paisagens. A partir de aí, da reconstrução das bases da paisagem, a partir dos tempos geológicos, da lógica fisiográfica, começar a identificar os momentos mais relevantes para a construção da identidade e dos valores do local. Porque são esses valores locais, esse genius locci, quem pode nos ajudar a manter os valores do local. Valores do substrato natural, da lógica territorial das bacias, da lógica das águas, dos solos e da agrologia, junto com a lógica dos processos de construção territorial coerentes com suas propostas.

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Figura 7 .- As narrativas propostas incluem aspetos ambientais e aspetos culturais, lógicas ecossistêmicas e momentos históricos. Na imagem, a Lagoa Rodrigo de Freitas, com referências dos ecossistemas originais (restingas, mangues, morros...) e também das industrias que ocuparam a região e dos primeiros assentamentos e aterros.

Respostas a problemas globais, relacionados com a perda de identidade, com as mudanças climáticas, com a concorrência urbana a escala planetária, devem ser respondidos com a lógica que nasce do local, donde o que nos diferencia, e nos identifica, deve protagonizar nossas iniciativas, sem perder de vista o entorno, nem o contexto exterior.

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Sistematizar e entender o patrimônio desde o território. “é preciso urbanizar o campo e ruralizar a cidade” (Cerdá, 1968)

Devemos integrar a paisagem, entendido como o lugar donde acontece o que dá sentido ao patrimônio. Esse sentido "paisagístico" das declarações aprofunda nos valores não só desde a perspectiva artística, cultural ou monumental, mas também ambiental, ecológica, funcional, histórica, sentimental, perceptiva, económica, social... Também introduz a componente multiescalar, que exige olhar com diferentes zooms, a diferentes escalas, e a componente das narrativas históricas que unem os elementos componentes desses sistemas.

Figura 8 .- Os engenhos se expandiram pelo Brasil a partir do final do século XVI como uma estrutura territorial de caráter autónomo e rural. Na Bahia de Guanabara não serão representados nos mapas da família Teixeira Albernaz nem no mapa de 1665 (só as povoações), e nunca tão bem quanto os pernambucanos ou os baianos, e sempre no entorno imediato da baia de Guanabara, mesmo que, na época, já tinham sido construídos os engenhos da Fonte: Biblioteca Nacional de França, João Teixeira Albernaz II, neto de Luis Teixeira.

O patrimônio cultural não nasce de forma isolada e suas relações naturais e culturais com outras escalas do território tem que ser compreendidas e integradas nas nossas propostas desde que identificadas e valoradas nas nossas análises. Enfim, os grandes desafios hoje seriam, resumindo muito, entender o caráter sistémico do patrimônio, integrar seu reconhecimento dentro de uma ideia mais ampla de paisagem, é conseguir uma gestão sustentável a partir de um planejamento integrado. Por isso não podemos esquecer seu caráter territorial. Para gerir as paisagens do século XXI, mesmo as de predominância cultural, uma visão conceitualmente holística, e espacialmente unitária, é necessária devido à su complexidade e à necessária integração entre valores e critérios de intervenção. A 35


Paisagem se manifesta como o instrumento capaz de sintetizar e ordenar essa complexidade. Nesse paradigma, com base no caráter do lugar, e não só na sua forma construído, elementos imateriais, ambientais e derivados do processo participativo, serão igualmente integrados.

Figura 9 .- A proposta UTOPIA elaborada dentro do projeto do Mapa Histórico Digital de Belo Horizonte, tenta pensar a cidade planejada da Nova Capital desde uma perspectiva contemporânea, ecológica e integrada. Fonte: mapa histórico digital de BH (Hoyuela Jayo J. A., Mapa Histórico Digital da Cidade de Belo Horizonte, 2015 g).

Para isso, um novo planejamento integrado e participativo é necessário. As interações dos bens a proteger com o território, exige a participação de todos os agentes: internacionais, nacionais, estaduais e locais, públicos e privados. E essas escalas de decisão “vertical” devem também conviver visões setoriais, mas sintéticas e operativas. Não podemos nos deixar levar por uma lógica administrativa baseada exclusivamente nos graus de responsabilidade. É necessário uma maior interoperabilidade e consenso no planejamento desde um contexto global e não setorial e seletivo. Por tanto se faz necessário trabalhar em escalas múltiplas, desde o local até o metropolitano, e com diferentes olhares, desde diferentes disciplinas, para conseguir poder proteger e dinamizar adequadamente as paisagens do século XXI.O desenvolvimento urbano, o meio ambiente, as políticas de transporte, de turismo, de riscos e os planos territoriais, que nos conectam com o território como um todo são não são necessárias, mas fundamentais. É necessário proteger os valores a partir do conhecimento profundo dos elementos componentes, a partir de entender os seus limites, e suas conexões, nas suas diferentes

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escalas, e a partir de aí propor um desenvolvimento sustentável e de acordo com os tempo e valores derivados de um pacto social. Desse processo participativo deriva o caráter dinâmico e perceptivo da paisagem reconhecido pela Convenção Europeia ou também pela IFLA. As paisagens devem manter esse caráter diante de outras prioridades, o que significa buscar calma, a tranquilidade, a manifestação de transcendência, a excelência ambiental, social e económica da paisagem, e sua coerência cultural, histórica e patrimonial, mas também a coerência dos processos ecológicos e da base ambiental que as caracterizam. A paisagem é construída sobre tradições, vazios, lacunas e desafios, e não necessariamente de objetos, serviços e intervenções. Devemos "desconstruir" uma parte do território para entender suas essências, mas também devemos trabalhar com o vácuo, o entorno donde ela se manifesta. Intervir na paisagem não é necessariamente sinônimo de construção da paisagem, mas muitas vezes o contrário, de voltar às origens, de resgatar os fundamentos da paisagem. Esses elementos base são a geomorfologia, a vegetação e as plantas originais, agrológicamente coerentes, a lógica das águas, elementos em definitiva que expressam a funcionalidade antes do que a forma, os valores de coerência entre forma, função e beleza, por cima dos objetos entendidos como elementos isolados e autónomos.

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Análise da proposta da Chancela A Paisagem foi objeto de debate no IPHAN desde a promulgação da Lei 37, da UNESCO desde a convenção de 1972 (data da sua criação) e nos países europeios ou nos estados unidos desde início do século XX, desde os primeiros projetos urbanos. Hoje, em 2016, a ASLA fez uma declaração em defesa da paisagem, a chamada “declaração da paisagem” donde entende que todo é paisagem: “Do outro lado das fronteiras e além das muralhas, dos centros das cidades até o último deserto, o terreno comum da humanidade é a própria paisagem. Comida, água, oxigênio... tudo o que nos sustenta vem e retorna à paisagem. O que fazemos para as nossas paisagens, em última análise, fazemos para nós mesmos” (LAF, Landscape Architecture Foundation, 2016).

A Paisagem já entrou nos tombamentos do IPHAN com propostas como cemitérios, jardins, lugares históricos da memória, passos, pedra, gruta, rios... desde 1938. Desde nossa perspectiva não deveria ser uma política separada, mas sim integrada, dentro da política nacional do patrimônio cultural, unindo o material e o imaterial, o objeto e sua descrição, e expressão artística associada. A paisagem envolve todos os bens culturais brasileiros, construído laços e conexões entre os elementos tombados, entre o material e o imaterial, entre o natural e o cultural, entre a memória e a realidade, a través da análise cientifica e técnica, e também da percepção e da construção social de leituras sintéticas e compartilhadas. Já temos debatido sobre a definição de paisagem entre Europa e o Brasil no campo do patrimônio cultural (Hoyuela Jayo J. A., A paisagem como instrumento para um planejamento sustentável: uma visão dialética entre Europa e o Brasil, 2017) chegando na conclusão de que todo patrimônio cultural deve ser entendido na sua paisagem, e também no território o territórios que os explicam e sustentam, sendo agrupados por sistemas, complementares ou até patrimoniais, a partir do reconhecimento das narrativas que os definem. Por tanto, pensamos que são muito louváveis os objetivos propostos, mas entendemos que deveriam ser estendidos a todo o patrimônio cultural e não só a porções peculiares do território, chamadas erroneamente de “paisagens culturais”. As reflexões sobre a administração dos bens não podem nos levar a compreender ou definir os mesmos, mas só o contrário, uma adequada identificação dos bens pode nos levar a repensar a administração, normatização e gestão deles.

1) princípios e diretrizes da chancela da paisagem cultural brasileira. A chancela da paisagem cultural brasileira é um instrumento relativamente novo, que não acarreta a substituição dos que a antecedem, mas pode complementá-los. Com a chancela, o Iphan está agregando uma nova possibilidade de reconhecimento de bens culturais, incrementando o mapa do patrimônio cultural do Brasil. Os trabalhos da Chancela da Paisagem Cultural Brasileira, paralelos a nova política do patrimônio cultural brasileira, incluídos na portaria 375. De repente por isso, nenhum deles recolhe as interessantes propostas mútuas, nem sequer seus princípios ou 40


objetivos. Nesses documentos se fala das dimensões paisagísticas e territoriais, sintéticas e integradoras, assim como participativas e perceptivas (subjetivas) do patrimônio cultural. Se essas visões fossem integradas, poderiamos contribuir para resolver os objetivos de ambos os textos. Podemos construir uma política do patrimônio cultural verdadeiramente integrada, sintética e coerente com a complexidade de nossos bens e com as exigências da sociedade pós-industrial contemporânea. Por tanto, nas suas diferentes escalas e expressões, pensamos que todo deve ser abordado como paisagem, sim. E isso deve ser pensado independentemente da escala, ou da importância do lugar, do vazio, ou dos elementos componentes do bem cautelado na construção dos valores, atributos e caraterísticas do objeto. Sem por isso deixar de entender que paisagem cultural possa ser um determinado tipo de paisagem donde a força esteja mais na integração natureza – cultura que na expressão artística, estética ou meramente cultural. Excluir de uma visão paisagística ao patrimônio cultural brasileiro, como um todo, faz perder a esse a dimensão holística, integrada e sintética que ele tem. Temos que olhar o patrimônio cultural além das pedras e da cal e pensar nas suas interações ecossistêmicas com o meio ambiente, com a sociedade, e com a economia local. Isso nos permitirá colocar o patrimônio cultural numa dimensão de sustentabilidade. Patrimônio cultural é paisagem, de repente, paisagem cultural é um subconjunto desse conceito mais amplo. O fato de ser criada por Portaria pelo Iphan, ou por um ato administrativo de seu Presidente, faz com que seja um instrumento normativo infralegal. Do ponto de vista jurídico, essa é uma regulamentação de caráter interno, e que, por si só, não imputa direitos e deveres aos cidadãos e agentes externos. Porém, como ela é um instrumento de reconhecimento e também um instrumento de gestão, na medida em que reúne os agentes em uma conjunção de esforços pela preservação do bem cultural, isso não foi visto como uma fragilidade. Além do que, para a criação do instrumento em base legal hierarquicamente superior, isso implicaria esforços políticos e outros arranjos, envolvendo Ministério da Cidadania, Casa Civil e Congresso Nacional, o que parecia fora do escopo do grupo propor. O que se pensou foi que, no futuro, o instrumento poderia receber um Projeto de Lei ou converter-se em uma Portaria Interministerial.

Na realidade, a política do Patrimônio Cultural já integra a dimensão paisagística dos objetos, as relações ecológicas (ambientais, sociais e econômicas) dos bens com seus entornos, de forma direta (conteúdos culturais) ou de forma indireta. Uma revisão da Lei deve acontecer, até porque em breve cumprirá 100 anos. Nessa revisão, ou melhor, nesta atualização, a ideia da integração no lugar, de qualquer bem tombado, deve virar protagonista. Neste sentido também o patrimônio natural, o espaço público e o vazio devem ser integrados nos processos de reconhecimento, de valorização, de normatização e gestão do patrimônio cultural como um todo. Ainda que estabelecida por meio de Portaria, a chancela vem propor e sanar lacunas de instrumentos de Identificação e Reconhecimento existentes no Iphan, sendo, nesse sentido, autossuficiente, e sua operacionalidade torna oportuno acionar outros instrumentos legais em uso no território. Dependendo de cada contexto, de cada situação, da legislação incidente na porção territorial, das características e circunstâncias da paisagem cultural, a rede de atores mobilizada deve verificar o que

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é necessário acionar. Lembrando que o uso da chancela também pode ser estratégico para fortalecer onde há bens registrados e bens tombados, ou sítios identificados ou em processo de identificação.

Devem ser clarificados os instrumentos de normatização e gestão do patrimônio cultural, flexibilizando e escalando, de forma adequada, seus conteúdos, começando pelos tombamentos, passando pelas portarias e as instruções normativas, e chegando nos planos de ação. Não deveria ser um instrumento de fortalecimento, mas sim, um instrumento de análise e também de ordenamento do patrimônio cultural, porque todo patrimônio cultural já está inserido na paisagem. Poderíamos dizer que a chancela identifica um tipo de paisagem donde o valor reside mais no conjunto que nos elementos componentes, mais nas interações dos elementos, especialmente os naturais, do que neles considerados de forma individual. Por isso, todo patrimônio cultural tombado deveria ser paisagem cultural. Só estamos a falar da escala, procurando, nesse contexto, identificar novos horizontes do tombamento, na escala mais territorial. A rede de atores envolvidos pode abranger órgãos públicos, grupos sociais e/ou indivíduos que desenvolvem práticas de manejo e conservação responsáveis pela conformação de aspectos físicos e simbólicos associados à paisagem cultural, instituições privadas que possuem iniciativas de promoção e valorização da cultura e memória locais associadas à paisagem em questão, dentre outros.

Isso deveria acontecer com todos os bens, seja qual for sua natureza dominante, ou predominante. A pactuacão das políticas de preservação e de requalificação ou valorização do patrimônio cultural deve ser sempre compartilhada entre os diferentes atores. Há diferentes enfoques e ações complementares entre as esferas com respaldo legal para atuar para o patrimônio cultural e para o meio ambiente, e no planejamento urbano e regional, sendo necessário construir a cooperação entre as instâncias, para que haja efetividade, e eventualmente de modo a minimizar ou dirimir conflitos.

Efetivamente, são múltiplas as dimensões dos necessários diálogos entre o patrimônio cultural e o território (entendido o território como a maior dimensão de referência donde podemos identificar os valores culturais associados aos bens) A paisagem é compreendida como um sistema que tem como base as relações entre os grupos sociais e a natureza. Engloba os usos e apropriações do território, mas também interpretações, percepções e vivências humanas em relação aos espaços, o que confere diversidade às manifestações culturais.

Essa seria uma definição perfeita de paisagem cultural, mas, pode ser aplicada, e deve, a qualquer bem, independente da escala, ou da predominância da natureza ou da cultura, do lugar ou do artificio, na sua configuração passada, presente ou futura. São os grupos sociais que conferem sentido ao patrimônio cultural, a partir de suas referências, a partir das condutas e práticas, das vivências e percepções, fundadas no imaginário social, e que são dinâmicas, podendo se reconfigurar ao longo do tempo.

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Reconfigurar, reinterpretar, revalorizar... a percepção e o conteúdo do património cultural é dinâmico, e a sua apropriação social varia com o tempo e deve ser integrada em todos os processos de identificação, valorização, preservação ou gestão do patrimônio cultural A concepção de política pública reforçada por meio do instrumento da chancela estimula a participação cidadã, atua pela inserção social, considera o desejo de permanência dos grupos em suas localidades, atenta para os contextos tradicionais e para as paisagens urbanas e rurais resistentes aos processos contemporâneos de globalização, massificação e expansão urbana, além de buscar promover o desenvolvimento social por meio da valorização da cultura.

Essa participação deve se estender a todos os elementos componentes do patrimônio cultural brasileiro, e não de forma exclusiva as chamadas “paisagens culturais da Chancela”. O reconhecimento do bem cultural pressupõe definir uma narrativa e selecionar um recorte territorial, o que pode ocorrer no início ou no curso do processo. Não basta realizar levantamento exaustivo das manifestações materiais e imateriais no território e trabalhar como se fosse um somatório de aspectos ou de atributos a cada recorte. Essa é uma visão equivocada. Perpassa, isso sim, verificar dinâmicas combinadas entre forças naturais e sociais, desvendar arranjos próprios, compreender referências culturais, as realidades da vida local, garantir processo participativo desde a identificação do bem, estimular o diálogo e, por meio de constante interpretação, interrelacionar os aspectos e formular coletivamente a ideia da paisagem cultural, tendo em vista suas características estruturantes e os principais valores, importantes de serem salvaguardados às gerações futuras.

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2) conceitos e entendimentos-chave “...espaços geográficos, ambientes agenciados pelo homem que ilustrem relações de vida entre comunidades/grupos sociais e a natureza, bem como sistemas específicos de trabalho e de produção, em localidades urbanas ou rurais, em que se identifiquem valores culturais, tradições, sentimentos de pertencimento, de afetividade, ou outras memórias coletivas vinculadas à porção territorial e às práticas dinâmicas que nela se desenvolvem”. Definição de Paisagem Cultural Brasileira.

Entendendo que a definição proposta é correta, mas o conceito mais adequado seria território cultural, até pelo sentido de apropriação, e não tanto paisagem. Também queremos destacar que todo o patrimônio cultural cumpriria essa regra, considerado como paisagem. Ou podemos deixar fora as cidades, os monumentos, ou as fortificações, ou os conventos ou os engenhos dessa definição? Parece que só estamos falando de um problema de escala, da dimensão “territorial” dos conjuntos a serem chancelados, orientado a uma gestão diferenciada, que poderia, e deveria ocorrer com a totalidade dos bens tombados. Art. 1º (Opção 1 – Portaria 127/2009) Paisagem Cultural Brasileira é uma porção peculiar do território nacional, representativa do processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores.

Essa definição poderia ser aplicada a São Bento, ou a igreja de Nossa Senhora da Cabeça, a Sinagoga de Recife, ou ao forte dos Reis Magos, não só aos lenções maranhenses, por tanto, como estamos sugerindo, todo patrimônio cultural é paisagem. Art. 1º (Opção 2 – Redação formulada pelo GT) Paisagem cultural brasileira é o resultado da interação entre grupos sociais e natureza, expresso por meio de práticas culturais em curso, associadas a um território específico, compondo um sistema de relações que se refere à identidade, memória e ação dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira.

A clara diferencia dessa definição tem a ver com a expressão “em curso” e com a dimensão “relacional”, ou, poderíamos dizer, ecológica. Alguns patrimônios culturais perderam, e no futuro alguns outros poderão perder, seu uso e função, sem por isso perder seus valores culturais. Um dos maiores desafios da política do patrimônio cultural brasileiro seria manter esses valores reconhecidos procurando usos e atividades compatíveis com a preservação e requalificação desses elementos. Mas isso não faz diferencia na sua dimensão paisagística, a nosso modo de ver. Por outro lado, os processos, passados, presentes ou futuros, que caracterizam os bens, e seus elementos componentes, incluído o vazio, ou o meio ambiente, são fundamentais para sua compreensão, mas sobretudo para sua gestão futura. Devemos partir de que a Chancela está sendo proposta num processo paralelo a revisão da política nacional do Patrimônio Cultural, cuja portaria, 375 de 19 de setembro de 2018, que é citada só uma vez, integra como um dos elementos a paisagem, mas também, e sobretudo, o território, e a gestão compartilhada.

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Concordamos com a Chancela como forma de proteção e como proposta para uma gestão integrada, mas não separada do patrimônio cultural. O tombamento, e suas diversas implicações, deveriam ser detalhados admitindo diversos grados de proteção e diversas fórmulas de gestão. Seria aí que encaixaria a Chancela, como uma proteção mais leve (até pela dinâmica dos bens considerados) e orientada a uma gestão compartilhada. Isso permitiria reconhecer a dimensão paisagística de todos os bens culturais (não só dos chancelados) e também incluir os “territórios culturais” como elementos do patrimônio cultural brasileiro (por motivos materiais, imateriais ou de apropriação simbólica). Tudo cabe, e deve caber, no conceito de paisagem cultural porque tudo patrimônio cultural é paisagem. Outras figuras como paisagem dos bens culturais ou do entorno dos bens, como territórios culturais, ou sistemas territoriais patrimoniais, ou sistemas territoriais complementares, deveriam nos ajudar a costurar uma trama de ordenamento e gestão adequada para o desafio de gestão do patrimônio cultural brasileiro a escala e dimensão de um país – continente donde as paisagens dominam e caracterizam sempre os bens e os territórios. O conceito proposto desde 2009 é muito interessante, mas a definição não está clara. Não seria uma paisagem cultural a Fazenda de Taquara, p.e., com suas terras, visuais, florestas, campos, rios e elementos naturais? Se só queremos que seja um “recorte territorial” por que não o chamamos de territórios culturais? A chancela não está associada com um bem, nem com um conjunto, mas sim com um conjunto de bens, nem necessariamente homogéneos, nem necessariamente próximos, essa é sua principal caraterística. A chancela estaria mais próxima do que estamos querendo propor como territórios culturais, ou, se for especificamente associado a uma narrativa só, aos sistemas territoriais, a saber: “Os Sistemas Territoriais Patrimoniais são, por tanto, agrupamentos homogêneos geralmente descontínuos e hierárquicos de interesse estético, artístico, histórico, funcional ou ambiental, chamados STP, que servem para a interpretação de uma determinada narrativa assim como para a gestão dos bens integrantes ou permitem e contribuem a sua valorização”.

A narrativa, ou narrativas, deve ser incorporada sim pelo IPHAN, de forma colaborativa e participativa. O SICG, em construção, já identifica os sistemas territoriais componentes, ou interações do bem com outros bens, em qualquer bem tombado (estabelece grupos e hierarquias do bem em sistemas). Na seleção dessas narrativas, estaríamos na mesma disjuntiva do que os Sistemas Territoriais. Temos diferentes escalas, formas de agrupação, expressões, grados de interesse e relevância, interconexões fora do âmbito da proposta (Supra) e dentro (Infra) que enriquecem a leitura desses territórios. Também podemos ressaltar aqui a possibilidade de identificar as paisagens culturais que poderíamos chamar de “próprias”, ou patrimoniais, que foram deliberadamente criadas para esse fim, de aquelas “improprias”, ou complementares, que procedem de uma agregação não deliberada, mas que pode ser interpretada como uma unidade cultural, grupo, ou sistema.

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3) objeto da chancela da paisagem cultural brasileira O apartado V do art. 216 não deixa claro se esses valores podem acontecer de forma separada ou necessariamente conjunta: “V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico”

Por isso deveríamos falar de dominância. Os valores convivem, e as vezes demoram para serem reconhecidos, mas acabam sendo identificados. Só o conceito de “ecologia” introduz uma complexidade enorme dentro dos bens introduzindo dimensões não só ambiental, mas também econômica e social, no reconhecimento dos valores dos bens integrantes do patrimônio cultural brasileiro, e, sobretudo, a incorporação dos elementos e processos caraterísticos do meio ambiente. A paisagem (tiramos o conceito de cultural) é, portanto, constituída dos elementos que expressam esses valores, sejam eles materiais, com as configurações físicas do meio ambiente ou elementos construídos pelo homem; ou imateriais, como as práticas sociais que acontecem no espaço, e os significados culturais e percepções que o constituem como um território conformador de identidades (IPHAN, Instituto de Patrimônio Histórico Artístico Nacional, 2019).

Dessa forma, a definição proposta (sem o atributo de cultural) deveria ser aplicado a todo patrimônio cultural, e em todo caso ou contexto. O Patrimônio Material deveria reconhecer os elementos materiais, e imateriais (e suas conexões e processos de interação), assim como o vazio, o patrimônio natural, com reconhecimento cultural (patrimoniais), ou não (valores complementares de ambiência, contexto ou entorno) “As práticas cotidianas” constroem todas as paisagens culturais, em minoria ou maioria, da elite ou dos povos minoritários, ou dos grupos sociais maioritários, no geral. Igualmente, existe sempre uma relação indissociável entre território e práticas culturais. Mesmo assim, essa pode ser a única diferencia clara das paisagens culturais, e seu verdadeiro sentido, em relação a qualquer outro tipo de patrimônio cultural, a “permanência” das práticas culturais, em certa maneira, poderíamos falar de autenticidade e integridade, mas também, sobretudo, de permanência. A apropriação do patrimônio cultural deve estar unida a vontade manifesta dos grupos motivadores/produtores na perpetuação dos bens, a partir da verificação do empenho na transmissão geracional e em sua salvaguarda. Em Cabedelo, João Pessoa, um grupo de vizinhos está preservando o bem. As práticas, atividades e usos (turismo, cultura, comercio...) não são os mesmos dos que o formaram (defesa), mas os valores podem ser preservados com seu apoio. Nesse caso poderia ser paisagem cultural, de acordo com a Chancela, mas sempre patrimônio cultural. Não devemos reduzir o conceito nem as bases sobre as quais é aplicado excluindo os outros bens. Quando a proposta da Chancela fala dos “Territórios cujos valores tenham suporte em aspectos físicos e práticas culturais vigentes reconhecidas pelos atores sociais que vivenciam o espaço, ainda que os valores sejam contraditórios e ensejem conflitos”

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Podemos afirmar que essa é a escala, o território. Na verdade, a principal diferencia está na escala, no tamanho, e na ligação da “sociedade”, não dos “indivíduos” como grupo, mas sim como sociedade, com uma forte identidade associada ao bem. Mas uma vez, sugerimos criar o nome de “territórios culturais” associados a um sistema territorial patrimonial que expressa uma ou várias práticas culturais concretas (sucedidas separadamente, ou complementares). Esses territórios culturais poderiam considerarse: “unidades de paisagem que fazem parte de porções territoriais muito abrangentes ou complexas”

Essa caraterística entra dentro da definição de sistema territorial, no sentido que por cima e por baixo podem existir subunidades, p.e. os engenhos de Jacarepaguá, ou cariocas, ou da baixada fluminense (baia de Guanabara e entorno) ou do Brasil conformariam entre todos eles um Sistema Territorial de interesse federal, com diferentes manifestações, ou agrupações, subsistemas, mas, ao mesmo tempo, subsistemas e subunidades independentes. -Paisagens associativas, quando fazem parte de um sistema de valores mais abrangente, considerando significações culturais, históricas e cosmológicas que fundam as identidades dos grupos.

No caso de UNESCO existem unas categorias com características similares. Mais uma vez o conceito de território, que implica a apropriação, identidade e significação social, seria o conceito, a nosso modo de ver, mais conveniente. Contextos em que a configuração paisagística abrigue comunidades tradicionais ou grupos em situação de vulnerabilidade, entendendo que o instrumento pode potencializar a garantia de direitos e a efetividade de políticas públicas

Sendo essa indicação uma necessidade explicita, não deve ser separada de outras situações ou configurações dos bens de interesse cultural de outras naturezas, e ou contextos. Os planos de gestão, ou cartas, ou contratos de custódia compartilhada, deveriam poder ser aplicados em muitas outras situações, e não deveriam definir a diferencia entre a Chancela e o Tombamento. Diversos níveis de aplicação desses instrumentos poderiam permitir a adaptação a esses diferentes contextos. Um ponto que não encontrou consenso no debate do grupo foi o uso do instrumento da chancela para ressignificar as narrativas constituídas pelo tombamento ou registro. Por um lado, considerou-se que a chancela envolve a formulação de objetos diferentes do que os outros instrumentos colocam; e por outro, considerou-se oportuna a formulação de atualização das narrativas e criação de outros olhares sobre os bens já protegidos.

Acho que não deveriam ser diferentes as narrativas da Chancela, das narrativas do Tombamento, aliás, são a mesma coisa. Seja patrimônio cultural, ou natural, ou imaterial, a chancela reconhece os seus valores culturais. As narrativas podem estar em

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permanente revisão, sim, mas isso não anula a importância, todo pelo contrário, da narrativa na construção do processo de preservação, mesmo que modificada no futuro. Uma abordagem que envolve o conjunto de elementos e práticas culturais necessariamente atrelados ao território, materiais ou imateriais, é exatamente o posicionamento sugerido pela portaria 375. Por tanto deveria ser aplicado a todo o patrimônio cultural, independentemente de sua formação e/ou tipologia. Os tombamentos, ou reconhecimentos do valor do patrimônio cultural acontecem até em quatro esferas: federal, estadual, municipal e planos especiais (tipo as APAC) como bens preservados. Esses quatro níveis deveriam permitir diferentes aproximações dependendo do impacto dos valores dos bens e da escala de sua representatividade, incluído assim a todas as paisagens de interesse. O objetivo final de todo tombamento deveria ser a ancoragem social, porque, como reconhece o texto constitucional, o patrimônio cultural é uma apropriação social, não uma imposição administrativa. Territórios cujos valores se pautem em práticas culturais não vigentes, ou em elementos físicos desaparecidos, tais como Guararapes, que obedeceu a práticas e eventos históricos já esquecidos, também deveria poder fazer parte. Um posicionamento excludente impediria que lugares da memória foram reconhecidos. Eles poderiam e deveriam estar nesta categoria de proteção (paisagem ou território cultural). Igualmente pensamos respeito as paisagens configuradas por ações danosas ou predatórias ao meio ambiente ou conflituosas com os direitos humanos. O foco do instrumento é a sustentabilidade das práticas e dos valores culturais. O sentido do reconhecimento de paisagens onde a ação do homem desqualifica o meio ambiente ou ameaça a dignidade humana poderia ser um mecanismo educativo e formativo orientado a atuar em sentido contrário. Auschwitz Birkenau, German Nazi Concentration and Extermination Camp (1940-1945), é patrimônio da humanidade desde 1979, por tanto, deveríamos considerar seus valores culturais, para a educação e para a difusão de fatos históricos, mesmo que contrários aos princípios fundamentais e aos nossos direitos, até para conseguir que situações similares não se repitam, e sejam conhecidos na sua inteira dimensão patrimonial, como expressão material de uma cultura específica que danou de forma irreparável a humanidade. Certamente, a escolha do perfil dos “territórios culturais”, e seus sistemas componentes, deve ser uma opção que nasce da escolha social e de decisões participativas e compartilhadas. Guararapes tem várias narrativas (atributos), e várias perspectivas dessa narrativa (caraterísticas). A escolha deve se formalizar no momento da inscrição. O esforço empreendido por uma rede de atores visando à incorporação efetiva dos valores culturais de uma paisagem, ou bem de interesse cultural, nas ações e atividades por eles desenvolvidas naquele território, com vista a sua preservação e gestão, deveria se aplicar para qualquer iniciativa que vise proteger, defender, difundir ou simplesmente reconhecer o patrimônio cultural brasileiro. Para isso deveremos caracterizar o território e suas diferentes paisagens componentes, desde a perspectiva natural e cultural, e relacionar de forma explicita os valores, 48


atributos e caraterísticas nele contidos. Em segundo lugar deveríamos propor a conformação de pactos em prol da preservação assim como o comprometimento efetivo dos atores envolvidos com a execução de um plano de gestão coletivamente formulado. Esse posicionamento deveria ser aplicado em qualquer tipo de patrimônio cultural, de forma isolada, ou a través de sistemas territoriais ou de territórios culturais (paisagens em termos da Chancela).

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4) objetivos da chancela da paisagem cultural brasileira Acreditamos que a Chancela seja muito importante para a proteção do patrimônio cultural brasileiro, sem nenhum tipo de dúvida, ao propor uma gestão integrada dos bens e seus entornos em função das narrativas e valores neles reconhecidos. Chancelar os territórios vinculados a narrativas históricas, artísticas, estéticas, simbólicas de forte dominância cultural em lugares de relevância e grande reconhecimento (na verdade, Sistemas Territoriais Patrimoniais) Alguns elementos de interesse patrimonial só alcançam um valor cultural quando são analisadas e consideradas em conjunto, desde uma perspectiva sistêmica. Outros elementos adquirem seu valor no diálogo entre a natureza e o artificio, entre os elementos básicos do lugar e os elementos criados pela mão do homem. O objetivo da gestão compartilhada, e dinâmica, dos bens, deveria ser aplicado em todos os classificados de interesse como patrimônio cultural, bem de forma individual, bem especialmente como grupo As diferentes formas de relação entre o homem e a natureza, entre artificio e lugar, são as responsáveis das diversas expressões paisagísticas na procura do desenvolvimento sustentável. Nesse processo construídos, mediante mecanismos de apropriação, estimulando relações afetivas com o que queremos chamar de territórios culturais. O instrumento da Chancela deve contribuir para o desenvolvimento sustentável: O Iphan (...) deve se integrar ao processo de avaliação de impactos ambientais, articulado aos outros órgãos, estaduais e municipais de cultura, bem como aos órgãos ambientais em cumprimento à sua responsabilidade institucional (De Moura Delphim, y otros, 1997)

O desejo de propiciar a abordagem abrangente e integrada do território exige considerar diferentes dimensões de construção de significado, superando dicotomias conceituais como as que envolvem a distinção entre a natureza material e imaterial do patrimônio, ou a integração do patrimônio natural nos processos de reconhecimento do patrimônio cultural. Essa abordagem exige a compreensão do território considerando seus aspectos físicos, simbólicos, e históricos, assim como as práticas sociais, como seus elementos conformadores. Para isso devemos entender as lógicas de formação e transformação (narrativas), e perceber as forças atuantes (processos) assim como as referências culturais dos diversos grupos que o vivenciam e significam, e que constroem esses ecossistemas culturais e naturais que conformam as paisagens dos entornos dos bens culturais. Essa atitude deveria ser aplicada a gestão de todo o patrimônio cultural, na sua totalidade e diversidade de manifestações, e não só as paisagens culturais (como um recorte deste). Uma visão transversal, aberta para a pactuacão institucional e para a gestão compartilhada já foi incluída na nova portaria 375 que foi pensada para a totalidade do patrimônio cultural. Estamos por tanto a falar de uma maior escala que procede da agregação de alguns elementos no território, os chamados sistemas territoriais patrimoniais que configuram os “territórios culturais”. A Chancela contribuiria assim

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para uma gestão sustentável dos sistemas ou territórios culturais mais relevantes, fomentando a integração entre natureza e cultura, entre o material e o imaterial, contribuindo para o compromisso da sociedade, e para a difusão dos valores do patrimônio cultural brasileiro, a través da sua compreensão e leitura, no interior e no exterior, das ricas e variadas paisagens brasileiras.

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5) descrição do processo de chancela e de seus principais elementos Sem dúvida, a análise jurídica e a emissão de parecer devem inspirar e acompanhar todos os processos, até porque a tradição do IPHAN não inclui, normalmente, a pactuacão das políticas nem o envolvimento de outros órgãos com responsabilidade no território. Por isso, No processo de gestão deveriam ser aprimorados mecanismos menos burocráticos e mais colaborativos. Um grupo poderia sim, e seria de o máximo interesse, definir os sistemas territoriais patrimoniais mais relevantes na construção do território do Brasil. A partir de aí, poderiam ser identificadas suas expressões culturais, e valores, e de aí surgiriam, em várias escalas, possíveis chancelas para os que queremos chamar de “territórios culturais”. O fato de aplicar os mesmos instrumentos na proposta da Chancela, e no patrimônio cultural tombado, já revela a proximidade dos conceitos. Numa normatização e gestão mais flexível e ampla do patrimônio, que envolva a visão paisagística e territorial, e não mais exclusivamente elemento a elemento, mas a través de sistemas e narrativas compartilhadas (para depois chegar a cada elemento) as paisagens e os territórios culturais surgem de forma automática, como estruturas que permitirão compreender essas relações, processos, e ecossistemas que os definem. A interdisciplinaridade, e as diferentes componentes (material, imaterial ou até de construção da memória) exigem equipes amplas e visões complementares que só uma figura como o Conselho proposto conseguiria resolver. A maioria de “territórios culturais” envolverão, sem dúvida, elementos do patrimônio cultural, por tanto não parece sensato que o Conselho renuncie a gestão, e, como estamos falando, sua dimensão paisagística e territorial exigem uma maior transdisciplinaridade que só o conselho pode oferecer. Mas, ao mesmo tempo, deveriam ser estruturados instrumentos mais agis para avançar nos processos, assim como equipes específicas em colaboração direta com as Superintendências. Assim, por exemplo, a definição dos sistemas territoriais pode acontecer a través das instruções normativas como um instrumento operativo e flexível do IPHAN, em vez de portarias, leis ou outro tipo de instrumentos mais complexos. Esse tipo de instrumentos, já existentes, mas insuficientemente utilizados, deveriam ser aplicados no futuro a todo o patrimônio cultural como já antecipa a Política do Patrimônio Cultural da Portaria 375 A Chancela, como o Tombamento, deveria se orientar a proteção dos valores reconhecidos, sim, como eixo prioritário, mas também a requalificação e a gestão sustentável dos territórios baixo sua custódia. Novos instrumentos como CONTRATOS ou ACORDOS deveriam poder ser ativados desde que cumpram com os objetivos da chancela, dos tombamentos e das políticas do IPHAN, sempre sob o controle das superintendências e dos serviços centrais do IPHAN. Os processos detalhados na proposta parecem adequados mesmo em processos de rerratificação, elaboração de portarias ou de planos de ação para os bens já tombados, ou futuramente tombados, pelo que achamos que tem um grande interesse como base de partida para futuras ações.

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6) atribuições e papéis dos envolvidos Não devemos entrar muito nos detalhamentos dos agentes e processos, já que entendemos que isso deve acontecer no marco da atual gestão do patrimônio cultural material, e das matrizes lógicas estabelecidas pelo IPHAN para o desenvolvimento de processos de rerratificação, elaboração de portarias, elaboração de planos de ação, ou propostas de instruções técnicas normativas para a identificação de paisagens ou morfotipos, ou bem para a definição de novos instrumentos, sistemas territoriais patrimoniais ou complementares, ou até territórios culturais. Mas tentaremos acompanhar a proposta iniciada pelo grupo que elaborou a Chancela com alguns comentários. 1. O papel do Iphan em uma política de preservação de Paisagens Culturais A mobilização e articulação de redes de preservação, assim como a responsabilização compartilhada pela gestão da preservação e requalificação, a través da valoração e fomento a ações e inciativas locais, devem formar parte das competências do IPHAN, seja seus serviços centrais (definindo políticas, instrumentos e até leituras territoriais de escala federal) seja as superintendências. Também deve tomar um papel protagonista na pactuacão dos acordos e instrumentos de gestão com os entes federais, estaduais e municipais, com os instrumentos anteriormente citados, e também com os planos, programas e projetos que afetem aos ditos territórios e aos bens e entornos declarados a escala federal. Sem dúvida a gestão do Patrimônio Cultural entra dentro do campo da ação política, da cidadania, e do desenvolvimento da nação, precisando se integrar especialmente com as políticas ambiental, turística, económica, educativa, da casa civil (política nacional) e de assuntos exteriores (até pela diversidade e complexidade das origens do patrimônio cultural brasileiro). Na Espanha a Paisagem está sendo gerida numa escala estadual reforçando os nacionalismos e as identidades regionais e locais (p.e. Valencia, Catalunha, Galiza e Pais Vasco tem leis próprias para gestão da paisagem, sem coordenação federal a escala do desafio). Mesmo assim, planos diretores são elaborados para os principais conjuntos de bens, tais como catedrais, arquitetura defensiva, ou conventos e abadias, entre outros, com o intuito de promover uma gestão mais integrada e participativa desses conjuntos, ou paisagens, na verdade, territórios, ou sistemas territoriais, necessariamente compartilhados, donde as políticas territoriais, ambientais, urbanísticas, econômicas, estratégicas, de controle de riscos, turísticas ou culturais, adquirem seu maior valor e eficiência. A atuação em rede é o modelo de governança mais adequado para o enfrentamento dos desafios, mas requer a pactuacão das políticas públicas, processos participativos e um planejamento sério e bem estruturado. Nesse contexto o IPHAN deverá promover a revisão dos tombamentos, em primeira instancia, ou de novos tombamentos, registros, ou catálogos ou inventários quando seja preciso.

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Precisamos exemplificar e avançar na caracterização do patrimônio cultural e de suas paisagens associadas, identificando valores, demarcação os sítios, apontando critérios para a proteção do bem, da ambiência e dos valores associados, a través de intervenções diretas, de instrumentos de conservação e proteção, e a través de ações indiretas, junto a sociedade, e nos territórios e sistemas territoriais envolvidos na gestão desses bens. O IPHAN deve ser um apoiador e incentivador das redes para a gestão compartilhada o que envolve a criação dos comités e plataformas adequados (se for possível o apoio aos já existentes), e a formulação do plano de gestão compartilhado. Igualmente deve trabalhar na formulação de instrumentos técnicos de produção de conhecimento e gestão com um olhar sensível às paisagens culturais, instrumentos de planejamento estratégico que promovam participação e o controle social. 2. Partícipes nos processos de Reconhecimento e Gestão da Paisagem Cultural chancelada. Dentro do Iphan deveriam participar os diferentes departamentos, Gabinete da Presidência, Superintendências, Escritórios Técnicos, Comissão Interdepartamental da Paisagem Cultural, (Conselho Consultivo). Como parceiros governamentais estariam os ministérios, secretarias, órgãos e unidades nas três esferas de poder público, da área da Cultura e das demais áreas. E Como parceiros não-governamentais: instâncias de participação vinculadas a políticas públicas correlatas (conselhos, fóruns, etc), coletivos de grupos ou segmentos, associações, cooperativas, órgãos internacionais (Unesco, FAO, etc), organizações não-governamentais, entre outros representantes da sociedade civil com capacidade de interlocução e representação dos valores culturais reconhecidos. 3. Etapas previstas no fluxo e atribuições dos partícipes O Ponto mais importante passa pela criação de uma cultura de pensamento que envolva uma mirada além dos bens, e que integre os conceitos de paisagem, de sistemas territoriais e de territórios culturais. Para isso deve promover a difusão da política nacional, a formação dos funcionários públicos, da sociedade civil e dos diferentes níveis educativos. Também deveria construir de forma participativa os serviços, instrumentos e orientações sobre as possibilidades de atuação do Iphan nos diferentes assuntos e contextos territoriais. Envolver a justiça, a promotoria e o ministério público. Trabalhar com dados geográficos (tipo SICG) e criar os meios para disponibilização de informações acessíveis na Internet. Em todo momento é necessário manter uma comunicação clara e transparente com os interessados, as plataformas de gestão e todos os envolvidos. 4. Sobre a Comissão Interdepartamental da Paisagem Cultural: A Comissão Interdepartamental da Paisagem Cultural deverá estar vinculada à Presidência e promover essa articulação territorial, esse novo olhar territorial sobre o patrimônio cultural e a revisão dos diferentes instrumentos a escala nacional de forma articulada e coerente com os princípios das políticas nacionais. O Iphan carece de uma estrutura institucional para o monitoramento a pesar de que algumas propostas já foram avançadas (Cury & Hoyuela Jayo, Monitoramento das 54


Paisagens Cariocas, 2018). Deve incluir as ações e atividades realizadas assim como as previstas nesses planos de preservação. Tal acompanhamento é fundamental e essa seria uma responsabilidade compartilhada. Para isso tornam-se fundamentais as ferramentas tipo IDE (Infraestruturas de Dados Espaciais) orientadas a interoperabilidade, e, por tanto a integração dos agentes que operam sobre o território e suas bases de dados georreferenciadas.

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7) Recomendações Penso como Sêneca que achava que “ a lei deve ser breve para que os indoutos possam compreendê-la facilmente”, o que se aplica a uma portaria concebida para regular um assunto que deve ter um cunho mais popular e menos acadêmico (De Moura Delphim, Estudo sobre a Paisagem Cultural Brasileira, 2006)

Acreditamos que a Chancela seja um instrumento de enorme valor para a gestão do Patrimônio Cultural brasileiro. Estamos propondo, não obstante: 1. Que seja aplicada a conjuntos de elementos, cidades, e seus entornos de valor patrimonial (cultural ou natural, mais reconhecidos, e apropriados pela sociedade) em territórios amplos, mesmo que descontínuos, correspondentes a determinadas manifestações e narrativas históricas, funcionais ou estilísticas. 2. Que seja interpretada como uma forma de gestão específica para esses Sistemas Territoriais Patrimoniais, muitas vezes de caráter seriado, não só no âmbito local donde se estabelece, mas também em outros lugares do território brasileiro donde foi desenvolvida a mesma narrativa, e consolidou-se o diálogo entre sociedade e lugar (ou natureza). 1) operacionais para retomar o instrumento no IPHAN Incorporar o território é a paisagem como dimensões fundamentais do Patrimônio Cultural brasileiro, a través da definição do conceito de paisagem cultural (entorno imediato do bem que influencia, altera ou pode contribuir a requalificar os valores culturais reconhecidos do bem nas suas diversas dimensões ambiental, social ou económica) e também do conceito de território cultural (espaços donde se desenvolvem narrativas coerentes que contribuem a construir um sistema patrimonial único e singular, mesmo que desconexo, e que se expressa em diferentes escalas e com diferente intensidade). É necessário investimento substancial na mudança da cultura política do Iphan, reforçando a importância dos encontros e compartilhamentos de saberes e conhecimentos, assim como da participação social ampla na revisão contínua de procedimentos, instrumentos e normativas como caminho para políticas de patrimônio realmente representativas e democráticas. A incorporação de novos servidores nos últimos anos poderá contribuir de forma decisiva neste sentido graças aos novos perfis e a uma disposição positiva as mudanças. Paulatinamente, construção de vários atlas das Paisagens Culturais Brasileiras a partir de textos como os de Odum reelaborados pela UNICAMP (Odum H. T., y otros, 1987 (ed. brasileira da UNICAMP)), ou de Aziz Ab’Saber (Ab'Sáber, Diretrizes para uma política de preservação de reservas naturais do Estado de São Paulo, 1977; Ab'Sáber & Marigo, Ecossistemas do Brasil, 2009; Ab'Sáber, O caráter diferencial das Diretrizes para uso e preservação da Natureza, a nível regional, no Brasil, 1977) ou Carlos Fernando de Moura Delphim (De Moura Delphim, Estudo sobre o Patrimônio Natural Brasileiro dentro do IPHAN, 2004; De Moura Delphim & Ribeiro de Xavier, Diretrizes para a análise e a classificação do patrimônio natural, 1987; De Moura Delphim, Estudo sobre a Paisagem

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Cultural Brasileira, 2006), ou os que estamos desenvolvendo para o Rio de Janeiro, com especial interesse na definição conceitual e estratégica (Hoyuela Jayo, Produto 02-2019. Caderno 01. Estrategia, 2019), a proposta metodológica (Hoyuela Jayo, Produto 022019. Caderno 02. Metodologia de Execução, 2019) e os diferentes exemplos de propostas para os diferentes instrumentos de rerratificações, portarias, planos de ação ou instruções normativas, entre outros (Hoyuela Jayo, Produto 02-2019. Caderno 03. Instrumentos Propostos, 2019; Hoyuela Jayo, Produto 02.2019. Caderno 04. Normativa, tombamentos, portarias e planos de ação, 2019 b). 2) divulgação interna e externa. É preciso dar continuidade a um GT que inclua equipes de todas as áreas do IPHAN (material, imaterial, coordenação e fomento...), assim como das superintendências, para garantir o desenvolvimento desse paradigma territorial, paisagístico e patrimonial enraizado na geografia e na compreensão do território. Elaborar materiais e publicações específicas como alinhamentos conceituais, guias metodológicas dos instrumentos de normatização e gestão, manuais orientadores, exemplos, glossários e vocabulários controlado, revisão do que consta do site etc. A capacitação e a produção de material de orientação serão fundamentais. 3) sobre eventos e afins Seria necessário sim promover oficinas e seminários regionais e nacionais sobre paisagem cultural, junto a universidades, órgãos ambientais, secretarias de cultura e patrimônio, ONGs etc... A proposta de fazer periodicamente seminário para avaliação/rediscussão sobre o tema, incorporando novos técnicos – novas visões sobre o assunto e “agentes multiplicadores”, evitando que a saída de um deixe uma lacuna no processo. Ao mesmo tempo seria importante fazer um Plano de Comunicação e estabelecer uma estratégia de difusão com Superintendências ligada com a Política Nacional do Patrimônio Cultural Material e Imaterial. 4) sobre os envolvidos/continuidade dos processos Apoiar-se em servidores/técnicos/pessoas que supostamente se mantenham na Instituição independentemente de mandatos políticos, para dar continuidade aos trabalhos, assim como nos novos servidores que tem uma projeção maior no tempo. A Comissão Interdepartamental deveria tratar, de início, das políticas do Patrimônio Cultural, integrando a paisagem, o território, e e o planejamento contínuo, pactuado e compartilhado. Uma adequada planificação dos recursos é necessária para que os processos não sejam rompidos durante possíveis mudanças ou alterações de atores e assim, que o instrumento seja enfraquecido. 5) sobre a regulamentação Incluir a definição e os objetivos para a gestão da paisagem e do território, e as interessantes ideias sobre a integração das diferentes formas de patrimônio (material e

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imaterial, natural e cultural, físico e documental ou simbólico) a través de instrumentos digitais mais eficientes, a través da geografia dos dados, e a través dos processos de pactuacão, participação e compartilhamento de responsabilidades e decisões.

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Concluindo: patrimônio cultural é paisagem. "Cabe a cada um de nós dispor dessas pequenas formas (elementos da paisagem, sensações olfativas e táteis e a literatura) para nossa própria apreensão, como cabe aos arquitetos paisagistas propor marcos ou armadilhas para nossa memória. No entanto, nem um, nem o outro, serão capazes de resolver a relação de essa grande forma constitutiva da paisagem que é a derrubada retórica do provável artifício da natureza-verdade." (Cauquelin, 2015, pág. 234)

Estamos numa nova fase de valorização do patrimônio cultural. Depois das diferentes etapas, sinalizadas por Castriota (Castriota, Paisagem cultural: novas perspectivas para o patrimônio, 2013), de preservação, conservação e reabilitação/revitalização entramos na era do patrimônio cultural entendido como paisagem (Hoyuela Jayo J. A., Paisagem como lugar versus Planejamento Sustentável, 2014 c), num amplo contexto, e desde uma visão que sintetiza ao tempo que entende e integra a diversidade. Dentro das paisagens cariocas e dos âmbitos analisados, as águas e as montanhas sempre cobram um enorme protagonismo. Como nas obras de Richard Long (Long, 1993) isso pode ser percebido desde o primeiro olhar, ou desde reflexões mais profundas, que entendam o patrimônio solo desde uma perspectiva paisagística, associada com os processos (principalmente os das águas), e com as sociedades que construíram e habitam essas paisagens. As serras dos maciços de Tijuca e Pedra Branca, e os morros das baixadas, assim como as águas, em movimento, ou paradas, doces, salobres, ou salgadas, sempre dominam e controlam a paisagem, tanto quanto justificam, definem e organizam o patrimônio cultural. Defendemos uma abordagem da paisagem cultural como objeto de análise e como novo paradigma, uma nova epistemologia que inclui um método e um conteúdo paisagístico. Não é simplesmente uma nova categoria de patrimônio, mas sim uma nova forma de entender o patrimônio cultural reconhecendo que todo patrimônio cultural, e seu entorno, são paisagem. Devemos superar a fragmentação e o isolamento do conhecimento setorial e das posições excludentes, que ainda são praticadas no campo do patrimônio cultural. A preservação deve abrir espaço para a trasformacao e o desenvolvimento de alternativas contemporâneas e utópicas, de novos projetos e horizontes. A paisagem deve integrar o patrimônio natural e cultural, o material e imaterial, o simbólico e o documental. As paisagens culturais devem entender e ordenar e gerir a totalidade sistêmica e complexa da realidade que envolve os bens reconhecidos e declarados. Essa visão holística e territorial, desde múltiplas disciplinas e diversas escalas, exigem, para uma gestao sustentável, a conexão com as políticas de planejamento territorial intraurbano e regional, desde os diferentes setores (ambientais, urbanísticos, turísticos...), com os diferentes atores, e nas diferentes escalas (espaciais, desde o local até o global). A patrimonialização das paisagens identificadas e valoradas como “excepcionais” ou “representativas” deve conviver com a comprensao e integração de aquelas ordinárias e cotidianas que as contornam, escalarecem e complementam, como componentes do território na sua complexidade. 59


O patrimônio deve ser tratado de forma viva e dinâmica, dentro da lógica das cidades, e seus territórios. De esa forma, os usos, as atividades, as identidades e as apropriações sociais, constroem relações entre as comunidades e sua paisagem. Dessa forma vao se criar as referenciais a memoria e a herança coletivas, e a prática cultural que constroe a paisagem, que justifica o direito à paisagem, e o consequente exercício de cidadania uma cidadania paisagística. A ampliação da participação das comunidades no reconhecimento e gestão dos patrimônios e das paisagens, em paralelo a integração da percepção como elemento fundamental para compreender e ordenar a paisagem (como faz IFLA ou a Convenção Europeia da Paisagem) criam uma nova dimensão do conceito e do processo de planejamento. Construir um sistema sustentável de gestão, exige a pactuacão das múltiplas políticas públicas e privadas, entre os diversos setores e territórios. Uma necessária colaboraao interinstitucional entre as três esferas de governo, a sociedade civil, o mundo acadêmico e as empresas privadas e os cidadãos. A transdisciplinaridade e a visão holística devem converter-se em protagonistas, coordenando instrumentos setoriais, urbanístico, estratégicos e territoriais num contexto de forte participação cidadã. Finalmente devemos incorporar sistemas de monitoramento e valorização do patrimônio cultural que incluam a paisagem como referente. Mas antes, devemos identificar os elementos componentes, os limites, os valores do bem e também a situação jurídica, urbanística, de pose, de gestão... A partir de ai devemos integrar os bens dentro de sistemas territoriais específicos de cada uma das dimensões de interesse analisadas, como econômicas (sistemas produtivos ou de interesse turístico), sociais (com as comunidades do entorno ou com tradições, ritos... históricos), urbanísticos, de corredores verdes, ou de corredores ecológicos, de sistemas de tipos de vegetação e arbolado (morfotipos naturais), ou de sistemas hidrológicos ou hidráulicos de maior impacto, abrangência, e, obviamente, tamanho.

Estamos diante de uma proposta muito inovadora na gestão das paisagens culturais, já antecipada por autores como Leonardo Barci Castriota (Castriota, Paisagem cultural: novas perspectivas para o patrimônio, 2013), quando fala que depois da preservação, conservação e reabilitação/revitalização entramos na era do patrimônio cultural entendido como paisagem (Hoyuela Jayo J. A., Paisagem como lugar versus Planejamento Sustentável, 2014 c). No periodo que denominamos de “modelo Paisagístico” continuamos preservando e protegendo, mas donde precissamos incorporar propostas e medidas para o desenvolvimento do nosso patrimônio e sua integracao em modelos de desenvolvimento sustentável (Hoyuela Jayo J. A., A paisagem como instrumento para um planejamento sustentável: uma visão dialética entre Europa e o Brasil, 2016). Esse novo cenário exige pensar o lugar como território, como base, como suporte, como ambiência, e pensar o território, em paralelo, como infraestrutura para as atividades e os usos do homem, dos cariocas, no nosso caso. Integrar o discurso da natureza não é

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comum ainda no IPHAN, mesmo que a paisagem nasce com a própria instituição como conceito. Mas no início, a etapa “gloriosa”, estava focada nas “pedras e na cal”, e isso perdurou mesmo com bens tão paisagísticos como o próprio Horto Florestal, hoje Jardim Botânico. Neste amplo contexto, e desde uma visão que sintetiza ao tempo que entende e integra a diversidade, é muito necessário um olhar amplo, que integre as diversas disciplinas que trabalhamos sobre a paisagem, mas também os usuários, os outros administradores, os visitantes, e os que pensam a paisagem. Aqui, no Rio, não faltaram candidatos, como a Casa Rui Barbosa, a FGV, o próprio Jardim Botânico, Associações de Comunidades de Favelas, ambientalistas e ecólogos, a comunidade cientifica e académica, os amigos e associados dos tantos grupos que trabalham com as paisagens cariocas... enfim, múltiplos interesses, e múltiplas visões. Por isso temos que começar definindo um método claro, expressivo, sistemático e já testado, e provado, em outros contextos. De aí, definiremos as ferramentas, os instrumentos e os elementos a serem identificados, os fins e os princípios da nossa proposta, sejam em forma diretrizes nos planos ou de normas nas Portarias. Depois devemos entrar naqueles assuntos que afetam ao caráter, mais genérico, das paisagens, que tem a ver com seu caráter tipológico homogéneo, funcional, artístico e repetitivo, seriado e por tanto sistémico. Depois passamos a aspectos particulares, específicos, de pontos ou áreas menores, paisagens de interesse, valiosos ou singulares, pensados para uma acupuntura da paisagem. Sua agrupação em entornos de forte identidade (normalmente coincidentes com uma bacia, ou sub-bacia hidrográfica), vão criar subunidades ou unidades da paisagem, que devem ter analises detalhados, cuidadosos, peça a peça, e que geram respostas personalizadas. Finalmente devemos prestar especial cuidado com a gestão e com a integração de nossas propostas nos planejamentos tipo APAC, Planos de manejo da SNUC, LUSOL, PDU, OUC, planos estratégicos e setoriais... porque são eles que vão trabalhar mais facilmente com nossas propostas, para adaptá-las a casos concretos. Igualmente deve ser integrado a través das respostas do IPHAN aos Licenciamentos Ambientais. Os LA são uma obrigação legal prévia à instalação de qualquer empreendimento que possa causar danos ao meio ambiente. O Iphan deve ser consultado sobre os processos de licenciamento que afetem as áreas amb03 de proteção do bem (paisagem cultural), assim como no entorno (amb04), para avaliar se pode haver impacto no Patrimônio Cultural, e verificar a existência de sítios arqueológicos ou outros bens culturais protegidos nesses âmbitos seguindo a Instrução Normativa n° 01/2015, lançada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em abril de 2015vii, que baseia-se na tipologia dos empreendimentos e na avaliação do local do projeto. Dentro das paisagens cariocas e dos âmbitos analisados, as águas e as montanhas sempre cobram um enorme protagonismo. Como nas obras de Richard Long (Long, 1993) isso pode ser percebido desde o primeiro olhar, na própria paisagem, ou desde reflexões mais profundas, polissemias (com muitos significados) e poliédricas (com diferentes ângulos e perspectivas), que entendam o patrimônio solo desde uma perspectiva paisagística, associada com os processos (principalmente os das águas), mas

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também com as sociedades que construíram, se apropriaram e habitaram e habitam essas paisagens. As serras dos maciços de Tijuca e Pedra Branca, e os morros, colinas e tabuleiros das baixadas de Jacarepaguá ou da Lagoa Rodrigo de Freitas, assim como as águas, em movimento, ou paradas, doces, salobres, ou salgadas, sempre dominam e controlam a paisagem carioca, tanto quanto justificam, definem e organizam os patrimônios culturais que destacam nesses espaços. Por isso as montanhas e as águas, a vegetação e a paisagem, são nosso foco, mas também nosso instrumento de intervenção, porque devemos trabalhar com a natureza, aproveitando soluções naturais, e o novo paradigma da infraestrutura verde. As tecnologias vão nos ajudar muito e devemos aproveita-las e incorporar sistemas de monitoramento e valorização do patrimônio cultural que incluam a paisagem como referente, em colaboração com projetos como o SIURB da PRJ, porque a paisagem é um direito de todos, e por isso temos que colaborar na sua gestão e na sua defesa. Estamos diante de uma nova etapa. Das pedras e da cal, estamos passando ao período da paisagem como instrumento e como fim, que exigem incorporar o meio natural, o espaço público e uma análise elemento como elemento, como princípio básico. Na estratégia de gestão baseada em dois níveis planejamento do patrimônio cultural, elemento por elemento, e entorno (portarias), como base para um desenvolvimento sustentável, devemos incorporar os valores culturais, sim, mas também os valores sociais, económicos, e ambientais, como base e objetivo de nossas propostas. Em definitiva, devemos passar da paisagem cultural, a um conceito de paisagem mais integrado, que entenda o contexto e o entorno dos bens como paisagem, em dois níveis de aproximação, como paisagem cultural, aquela que envolve diretamente caraterísticas e/ou valores do bem, e a paisagem como entorno, que considera aspectos complementares, mas não necessariamente vinculados com os valores culturais, e que poderiam ser ambientais, urbanísticos, turísticos, ligados a equipamentos e serviços públicos, etc... Utilizar a paisagem como foco e como instrumento, exige passar da paisagem cultural a uma visão da paisagem mais integrada, com gestão compartilhada e colaborativa. Estamos num cenário mais abrangente que tenta integrar não só o conceito da paisagem cultural (envolvente imediata afetada pelo bem), mas sim, também o conceito de patrimônio cultural de origem natural, como valor e bem igualmente tombado (Floresta da Tijuca, ou o próprio Jardim Botânico) ou a serem preservado dentro do entorno, e como garantia para a preservação da chamada “ambiência”. E essa última ideia que nos faz pensar os entornos não só desde a perspectiva de cada um dos bens, mas também do conjunto e suas interações visuais e impactos sociais, ambientais e económicos que possam estar envolvidos no reconhecimento e valorização do local. A necessidade de monitoramento integrado e de disciplina deverão garantir a sustentabilidade da proposta em último termo

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Naturalizar os tombamentos: verdear e azulejar o cinza. Al contrario del paisaje, que a pesar de su complejidad constituye una realidad tangible, al ambiente no lo ha visto nunca nadie. Ni siquiera hay consenso a propósito de cuáles son los elementos que lo constituyen, más allá de considerar los vectores aire, agua y suelo, y de evaluar el estado de la vegetación o de la fauna. Distinto es que, en la percepción del común de la gente, se identifique ambiente con naturaleza. Ello supone que se suele equiparar ambiente a medio natural, por lo que un paisaje pretendidamente natural se suele identificar con un medioambiente saludable. (Folch & Bru, 2017, pág. 41)

Várias são as propostas para incorporar a natureza dentro dos processos de tombamento. Em primeiro lugar devemos separar os elementos construídos dos não construídos, identificando os pátios, jardins, varandas, praças, acessos e outros espaços vinculados com os bens e que fazem parte da “propriedade”, ou âmbito tombado total (envolvente), donde é possível aplicar a proteção e reconhecer, ao mesmo tempo, outros valores (ecológicos, ambientais, naturais...) mas sempre desde uma perspectiva cultural. Em segundo lugar, dentro do âmbito que chamados da unidade da paisagem cultural, devemos incorporar os elementos naturais. Primeiro identificamos os sistemas territoriais complementares que interatuam com o bem. Um exemplo pode ser a captação de um aqueduto, ou uma paisagem agrícola, ou natural, que define e caracteriza uma fazenda, ou um engenho, ou um caminho, ou ponte, ou acesso, mesmo sem um valor destacado. Esses elementos devem ser protegidos, e por tanto, identificados e mapeados. Pode ser um acupim, uma área de cultivo, um rio, uma lagoa, uma mata ciliar, ou uma floresta... Nela aplicaremos normas plenas Incorporar os elementos do patrimônio natural. A primeira ideia é quebrar os tabus a propósito da integração do patrimônio natural desde que tenha especiais valores, dentro dos processos de tombamento. Todo bem tem sua paisagem, e se no entorno cultural, o que nos denominamos a paisagem cultural (entorno imediato e de percepção cultural do bem), ou amb03, existem elementos de interesse, justificadamente devem incorporar Incorporar os valores ambientais e naturais dentro das declarações Mesmo que estejam meramente ligados com a ambiência, os valores naturais, ecológicos, ambientais, e de ambiência (donde podemos considerar aspetos ligados com a paisagem histórica e as funções e as paisagens necessárias para a comprensao do bem), devem ser incorporadas em todos os processos de tombamento. Hoje, para a rerratificação que estamos propondo, dos bens sob nossa análise, estamos considerando:

Incorporar o espaço público como um elemento independente e focal nos entornos e áreas de amortecimento.

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Passar de um sistema passivo de planejamento a um flexível A primeira questão que queremos identificar faz respeito a como entendemos hoje a preservação, só desde a perspectiva da proteção, e não desde a perspectiva do desenvolvimento. Por isso devemos trabalhar para um planejamento integrado que, cumprindo o requisito constitucional “defenda e valorize” o patrimônio a partir da programação de ações, e da sustentabilidade económica ambiental e social das propostas que garantam um crescimento sustentável e continuo. Reconhecer os bens integrantes, os valores e os limites do tombamento. Elementos integrantes I. II. III. IV. V. VI.

VII. VIII.

Arquitetura. Construções auxiliares. Obras de Arte. Espaços livres vinculados (Pâtios, Jardins, Logradouros...). Documentos primários y secundários descritivos do bem. Elementos de interesse natural (remanescentes florestais, árvores valiosas, arboretos, praias, rochas, rios, lagos, paisagens singulares ou de interesse no entorno,...). Acervos científicos, artísticos ou culturais. Visuais de interesse perceptivo, sensitivo, paisagístico, ou pela intervisibilidade.

Valores I. II. III. IV. V.

Valores Histórico, Artísticos, Culturais e/ou Científicos Valores Naturais, Ambientais, Ecológicos ou Paisagísticos. Valores documentais, arqueológicos e científicos. Valores imateriais, simbólicos e/ou etnográficos. Valores perceptivos e/ou visuais (estéticos).

Limites •

Amb.I – ELEMENTOS. Os elementos inventariados como edificações, construções, áreas naturais de singular valor (massas florestais, rios, morros, tabuleiros...) ou espaços livres de singular interesse (hortos, jardins, pátios, acessos, edificações auxiliares e de apoio, canais...).

Amb.II – PROPRIEDADE. A área de abrangência do tombamento, normalmente lotes, ou propriedades afetas aos principais elementos e valores a serem preservados, tem escala local e envolve não só os elementos, mas também os espaços livres imediatos e relacionados com o bem (parques, jardins, áreas arborizadas, caminhos, acessos, espaços públicos...).

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Amb.III – UNIDADE DA PAISAGEM CULTURAL. Bairro, bacia hidrográfica (ou sub-bacias) ou unidade da paisagem principal na qual se encontram os bens analisados, a partir da análise das bacias visuais, conexões ecológicas, ambientais, culturais e funcionais básicas dos bens e seus diferentes entornos.

Amb.IV – ENTORNO URBANO OU NATURAL. Pedaço de cidade e/ou entorno de maior abrangência donde os bens impactam ou podem ser impactados por decisões ou ações que coloquem em risco os elementos e os valores a serem preservados. Pode ser desde uma bacia fluvial até um bairro ou um distrito, etc...

Amb.IV – ÂMBITOS SISTEMICOS. São os âmbitos de cada um dos sistemas territoriais relacionados com o bem, por exemplo, os corredores ecológicos, ou o sistema hidrográfico/hidráulico. Não tem que ser definidos nem concretizados geograficamente já que podem incluir multiplex elementos e áreas de escala territorial e até regional.

Valorar os bens e incorporar várias categorias de proteção. Quando analisamos os elementos componentes de alguns tombamentos, ou os elementos que deveriam formar parte, como fizemos em Taquara, achamos diversas tipologias de elementos (abertos, fechados, públicos...) e com diferentes grados de interesse e diferentes. Os valores culturais devem basear-se em aspectos artísticos, estéticos, culturais, históricos, etnográficos, ou de ambiência (poderíamos dizer paisagísticos) que justifiquem sua “feição notável”. Nos entornos, deveremos incorporar as proteções previstas nos planos de zoneamento costeiro, nos PDU, também nas leis do Código Florestal, e na Lei das Águas. Incorporar diferentes tipos de conteúdo. E necessário analisar em detalhe, por áreas: reservas legais, anistias (e seus impactos), e a redução das APP e transferir esses conceitos para o patrimonio paisagístico. Devemos usar os instrumentos de ordenamento e gestão da paisagem, urbanísticos (PDU, LUOS...), ambientais (Planos de manejo), ou estratégicos (Plano de Combate as Mudanças Climáticas...) para proteger as águas, seus ecossistemas associados e suas bordas e infraestruturas e serviços associados, assim como os usos ligados a uma gestão eficiente do recurso. Propostas de proteção Propostas de desenvolvimento Propostas de difusão e de conhecimento Propostas para educação ambiental e cultural

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Introduzir soluções a través de modelos mais sustentáveis. Não podemos ficar no tombamento como um elemento exclusivamente restritivo. Hoje o patrimônio cultural requer uma visão paisagística Por isso hoje a gestão das águas requer uma ação que incorpore o uso de soluções baseadas na natureza (Herzog C. , Cidades para todos. Re-aprendendo a conviver com a Natureza, 2013), utilizando projetos de restauração da paisagem (como fez Mario Moscatelli com sua equipe em Jacarepaguá ou na Lagoa Rodrigo de Freitas) e promovendo um uso sustentável das águas (Sonia, IPHAN departamento de educação). Como proteger? Tombamento, portarias e Planos de Ação. Valores reconhecidos no processo de tombamento, ou na rerratificação. As águas desde a perspectiva do ordenamento e da gestão patrimonial, quando tiverem valores destacados, devem ser tratadas como um bem de interesse paisagístico, que une, num objeto só as dimensões naturais, culturais e perceptivas caraterísticas da paisagem. Por tanto, no processo de tombamento podem ser incorporadas suas componentes (o próprio bem, as infraestruturas e construções de apoio), e nas áreas de entorno ou amortecimento, incorporados os usos e atividades associados, assim como as bordas e paisagens das águas dependentes e complementares tanto para sua valorização e compreensão como para sua preservação e sustentabilidade. Nos entornos “culturais” dos bens (amb03). Outra reflexão que queremos fazer é que mesmo nos entornos de bens, conjuntos ou sistemas de claro perfil cultural, as águas devem ser tratadas, nas portarias, nos planos de ação ou nos planos diretores, que desenvolvam ações sobre esses bens, ou regulem esses entornos, ou áreas de amortecimento, como bens paisagísticos, considerando sempre as suas dimensões culturais e ambientais, para a preservação da qualidade do ambiente, e das áreas de amortecimento como berços dos bens tombados. Por tanto esses bens, as águas, devem ser considerados nas áreas de portaria como bens de grande valor, mesmo que não patrimonial, e incorporadas numa categoria de proteção equivalente, por exemplo, aos bens preservados que as APAC no Rio de Janeiro definem como instrumento de detalhe do PDU. Também requer uma visão sistêmica donde sejam integradas medidas e ações para a revitalização, melhoria ou restauração das áreas da propriedade (amb02) e nos elementos componentes (amb01), mas também nas áreas de entorno, seja este cultural (amb03). Outra conclusão direta será aquela de pensar o patrimônio das águas das baixadas, desde as restingas, mangues e áreas orgânicas das baixadas (gleisolos, podsoles úmidos...) como bem a serem pensado junto com os engenhos na ideia de preservar a paisagem histórica que os sustentou, mas também na ideia de garantir a qualidade do ambiente e a sustentabilidade do modelo urbano donde estão inseridos esses bens. Alguns instrumentos de interesse para a gestão. Boas práticas:

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• manter os microrganismos que fazem a depuração das águas (e que vivem pelos ecossistemas) • agricultura sustentável (ecológica, urbana,... ) que reduça a maior demanda, a agricultura, 69% (e até 90% em países em desenvolvimento) do consumo total de água doce (1% do total de água no mundo) Tipos de Normas •

Poderemos definir diretrizes gerais a través de planos estratégicos, p.e. para sistemas territoriais, ou normas básicas, dentro de planos de ação, donde adquirem rango de lei, mas devem ser desenvolvidas dentro de planos de maior detalhe (PDU, OUC, APAC,...) e também poderemos ter normas de aplicação direta dentro de portarias ou normas específicas para os bens e para seus entornos, como vem acontecendo com o IPHAN de forma tradicional.

As normas e diretrizes a aplicar, sobre morfotipos, sistemas ou paisagens de interesse, ou unidades (ou subunidades da paisagem) serão diferenciadas em três categorias:

I – Plenas (P): deverão ser diretamente aplicadas nos âmbitos referidos. Um exemplo são as atuais portarias, suas áreas e seus controles de gabaritos e ocupação do solo, mas queremos ir além com normas sobre o caráter do espaço livre e dos espaços públicos, ou sobre normas de preservação ambiental, ou de usos ou atividades de interesse social o econômico que possam afetar ou impactar aos bens e seus entornos imediatos.

II – Básicas (B): serão aplicadas através de Projetos, Programas ou Planos, cujos conteúdos deverão adequar-se às diretrizes do Plano, e especialmente a través do PDU, do Plano Metropolitano e dos Planos de gestão e de manejo das diferentes figuras do SNUC incluídas dentro dos âmbitos analisados. Os conteúdos deverão adequar-se às diretrizes do Plano específico, de forma justificada, mediante memoria, e a través de processos de co-decisão, e de debate e aprovação específica, donde formará parte o IPHAN, para garantir que os conteúdos finais concordem com as determinações aprovadas no Plano Diretor.

III – Orientativas (O): têm um caráter não obrigatório e são sugestões a serem consideradas nos instrumentos futuros que podam propor ações de desenvolvimento dentro dos âmbitos dos respetivos Planos Diretores, Planos Estratégicos, Estratégias ou Recomendações (guias técnicas, etc...).

Portarias

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Planos de Ação Passar das portarias, de normas de aplicação direta, a um sistema de planejamento mais flexível donde possamos começar com Planos de Ação, com diretrizes orientativas e normas básicas (a serem desenvolvidas e concretizadas por outros planos) Planos Diretores Os planos diretores poderiam planejar e desenvolver, a partir dos primeiros análises sistémicos e territoriais de conjuntos patrimoniais das águas, um conjunto de ideias, programas, ações e planos de pormenor para os diferentes sistemas das águas, naturais ou antrópicos, que envolvem elementos de interesse patrimonial (sistemas complementares como o sistema de Jacarepaguá) ou que formam parte, como elementos integrantes, de áreas como a floresta da Tijuca, ou o Jardim Botânico. Diretrizes ou estratégias As diretrizes ou estratégias podem ajudar a transferir para o contexto carioca as exigências do direito e dos acordos internacionais, assim como as boas práticas, aplicando-as em contextos específicos a partir de análises territoriais que tomem conta das caraterísticas dos ecossistemas e dos biomas donde devem ser aplicadas, assim como da sua biodiversidade e situação socio – económica. Instrumentos como as instruções normativas ou as notas técnicas podem nos ajudar na formulação dessas ideias.

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Infraestruturas verdes, um novo paradigma Por tanto tombar as paisagens, e proteger as águas, exige não só atuar sobre o recurso, ou na área tombada (a propriedade), mas também sobre as infraestruturas, sobre as paisagens associadas a sua presença e sobre os usos do solo e atividades humanas ligadas a seu uso, e por tanto vira fundamental o trabalho sobre o entorno cultural, e sobre a área de amortecimento (urbana ou natural, ou aquela sistémica).

O Patrimônio Cultural contemporâneo deve ser analisado no seu contexto paisagístico e territorial. Devemos passar do período da pedra e da cal ao período da paisagem, do território e da pactuacão e a participação. Para isso devemos ler a paisagem como a somatória dos ecossistemas naturais e culturais que nos envolvem. Os territórios nascem, por outro lado, de um reconhecimento, de uma apropriação, de uma posse. Pode ser um animal ou até uma espécie, uma pessoa ou grupo de pessoas, uma organização ou uma instituição, um povo, ou até um estado, mas o território tem “dono” e está associado a narrativas ou expressões que conectam esses possuidores, esses ocupantes e dominadores do espaço.

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Notas: i

Dirigido por Andrey Rosenthal Schlee, Erica Diogo, e Antônio Miguel de Sousa, Jorge Liderada por Mônica da Costa, Cynthia Vanderlinde, Paulo Vildal, Leticia Von Krüguer Pimentel e Isabelle Cury iii “Paisagens: determinados lugares da natureza, cuja expansão florística, hidrográfica ou qualquer outra, foi determinada definitivamente pela indústria humana dos Brasis, como cidades lacustres, canais, aldeamentos, caminhos, grutas trabalhadas etc.” (Andrade, 1980) iv Para serem inscritas, essas obras de arte deveriam pertencer a pelo menos uma das oito categorias por ele estabelecidas: arte arqueológica, arte ameríndia, arte popular, arte histórica, arte erudita nacional, arte erudita estrangeira, artes aplicadas nacionais e, finalmente, artes aplicadas estrangeiras. v Tem um dobro sentido, como aparência exterior; aspecto, feitio, ou como maneira de fazer algo, de agir, uma espécie de jeito. Por tanto, pelas caraterísticas perceptivas, pela vista, o por outros sentidos (ouvido, tacto, cheiro ou sabor) que nascem do desejo (De Moura Delphim, 1996) vi CAPÍTULO I DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL Art. 1º Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. § 1º Os bens a que se refere o presente artigo só serão considerados parte integrante do patrimônio histórico o artístico nacional, depois de inscritos separada ou agrupadamente num dos quatro Livros do Tombo, de que trata o art. 4º desta lei. § 2º Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela natureza ou agenciados pela indústria humana. (Presidência da República (Gustavo Capanema, Getulio Vargas), 1937, págs. Art. 1, ep. 2) vii Estabelece procedimentos administrativos a serem observados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional nos processos de licenciamento ambiental dos quais participe. ii

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Notas

1min
page 76

Bibliografía

8min
pages 71-75

Concluindo: patrimônio cultural é paisagem

20min
pages 59-70

5) descrição do processo de chancela e de seus principais elementos

2min
page 52

4) objetivos da chancela da paisagem cultural brasileira

2min
pages 50-51

7) Recomendações

4min
pages 56-58

6) atribuições e papéis dos envolvidos

4min
pages 53-55

3) objeto da chancela da paisagem cultural brasileira

7min
pages 46-49

A história, como argumento e narrativa da nova paisagem cultural

8min
pages 32-39

Paisagem

18min
pages 21-29

Patrimônio Cultural

26min
pages 8-20

Território e sistemas

4min
pages 30-31

2) conceitos e entendimentos chave

4min
pages 44-45

Alinhamento conceitual: patrimônio cultural, paisagem, território e sistemas

2min
page 7

Introdução: chancela da paisagem? ou dos territórios culturais?

3min
pages 4-5

Patrimônio Cultural é Paisagem

2min
page 6
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