Memórias de Teresina e seus reflexos hoje
Monumento Gregório: Histórico & Macabro
“Jericoroa”: Teresina tem praia de água doce
Por dentro do Multiverso musical da
202 Produções
Há uma casa de memórias no Centro de Teresina

Monumento Gregório: Histórico & Macabro
“Jericoroa”: Teresina tem praia de água doce
Por dentro do Multiverso musical da
202 Produções
Há uma casa de memórias no Centro de Teresina
Dhara Leandro
Eliane Carvalho
Juliene Santos
Eric Medeiros
Airton Lima
Glenda Muryelle
Isadora Holanda
Izaura Martins
Esse bem que poderia ser o título de uma dissertação de mestrado, mas é tão somente a abertura da oitava edição da Revista Oxente! Um veículo de comunicação que destaca o jornalismo cultural e se utiliza de uma narrativa de um jornalismo literário, mais livre, mais ousado.
Outubro de 2022 tem sido um mês complexo, em meio a um processo eleitoral polarizado, com muita desinformação e violência, não só simbólica, mas física. Outubro de 2022 reflete no Brasil, a fotografia de um tempo, um tempo sombrio, onde os direitos dos cidadãos tem sido retirados e questionados, sobretudo, das consideradas minorias em direitos, mas que nem sempre se configuram como minorias em número, como mulheres, comunidades LGBTQIA+ , negros, indígenas e outros.
Outubro de 2022 queima aos nossos olhos, quando o sol chega ao meio do céu e as temperaturas marcam 38º, o mundo parece parar, provavelmente, cansado da humanidade desumana que aqui reside. O que resistirá ao tempo e chegará aos anais da história? História que hoje apresenta versões negacionistas e paralelas. História que até o terraplanistas querem revisar.
O impensável e o imponderável tomou conta das mentiras vendidas nos mercados das redes sociais, como versões da verdade.
Mas felizmente, nem tudo é sombrio neste outubro de 2022. A Revista Oxente chega a sua oitava edição trazendo um interessante percurso pela Teresina do presente e do passado que ativa tempos entre tempos, memórias e se coloca para a história.
O percurso do leitor pode ser o que melhor lhe convier. Podemos começar conhecendo o Troca-troca na beira do rio Parnaíba e de lá pegar um barco para a Jericoroa, onde tradição e belezas aguardam os visitantes. Mas também é possível iniciar a trajetória pela praça Pedro Segundo, conhecida como P2 e lá percorrer os sebos que resistem às transformações mercadológicas temporais. A visita aos monumentos do Gregório e do Cabeça-de-cuia também pode ser realizado nas páginas da oitava edição da Revista Oxente! Sem contar um mergulho nos festivais de música e nas exposições de artes plásticas, para além de outras possibilidades de entrar em contato com a cultura local, nacional e internacional.
Então, outubro de 2022 é também vida que avança, é também cultura que resiste, é também afeto e acolhimento.
Nossos futuros jornalistas já estão prontos para contar ótimas histórias com suas narrativas instigantes e intrigantes. Boa leitura!
Nossa querida Teresina, primeira capital planejada do país e a única que fica na divisa de dois estados: Piauí e Maranhão, é também a única capital nordestina que não tem praia, pois não está localizada no litoral e por isso não tem mar.
Isso é o que muita gente pensa, pois desconhecem um local que virou ponto turístico da cidade: A Jericoroa, que é um bar construído em uma coroa do Rio Parnaíba. “Coroas” são os chamados “bancos de areia” que se formam ao longo do leito quando o nível das águas cai. E que bom que a natureza nos presenteou com um lugar
tão agradável para passar o tempo!
Podemos afirmar que Teresina tem sim uma praia. Uma praia de água doce! Um lugar diferenciado, com atendimento maravilhoso e com uma localização de fácil acesso entre as pontes José Sarney (Ponte da Amizade) e a Ponte Metálica Governador João
Luís Ferreira, sob uma coroa de areia no Rio Parnaíba, como já falamos acima. O local chama atenção por causa de sua beleza e aparência contrastante em relação ao centro da cidade.
A Jericoroa foi reativada oficialmente em 2016, mas ficou dois anos sem
funcionar em razão da pandemia. Foi batizada com esse nome em razão da inspiração do dono, seu Zezinho, na praia de Jericoacoara, localizada em Jijoca, litoral do Ceará. Uma praia bastante famosa por ser um lugar agradável para passar com a família, vendo paisagens lindas que faz com que tenhamos a sensação de estar no paraíso, com aquele vento batendo no rosto e aquela sensação de paz. Além disso, as estruturas de hotéis e pousadas chamam muita atenção e o local também é considerado um dos principais destinos turísticos da região Nordeste.
Porém, aqui em Teresina, a nossa praia de água doce não é tão diferente.
Desde que surgiu, chamou atenção dos teresinenses e é muito visitada por cantores, atores, jornalistas, entre outros. Confessamos que não conhecíamos a Jericoroa. Quando estávamos no ônibus que passa na Avenida Maranhão, ficávamos curiosas em saber o que tinha naquele local, e hoje em pleno 2022, graças ao jornalismo, pudemos conhecer. E olha, foi muito legal conhecer aquele bar, aquela família tão simpática e experimentar saborosas piabas que eles nos ofereceram de cortesia.
Era por volta das 14h, sob um sol escaldante e com pouco vento que visitamos a Jericoroa. Foi tudo muito novo para nós, que nem sequer
Pessoas aguardando o barco. Foto: Roberta Laurindo. havíamos andado de barco antes.
Antes que esqueçamos, há um detalhe: para chegar lá, você precisará pegar um barco! Ao lado do famoso Troca-Troca, há um cais com dois barcos fazendo a travessia do Rio Parnaíba entre Teresina, Jericoroa e Timon. A passagem custa apenas R$ 2,50, o trajeto de ida e volta soma R$ 5,00 que podem ser pagos em espécie ou via pix. Vale a pena a experiência da travessia!
Durante a viagem, aquele aguaceiro chamou a atenção dos nossos olhos, que estavam atentos a cada detalhe daquela paisagem. Foi bem rápido para chegar à Jericoroa.
Desembarcamos.
Ficamos maravilhadas com aquela praia. Não resistimos e tiramos muitas fotos no local, mesmo com um sol de rachar. Foi quando um cachorro caramelo, nos recepcionou. Ele era tão fofo que deu vontade de levar para casa! E não fomos as únicas que tivemos esse pensamento. Descobrimos que o cachorrinho era dos donos do bar, e a dona Keila disse que muita gente se apaixona por ele. Por isso, quando tem muita gente no bar, o cachorro fica preso, pois eles têm medo de o levarem embora.
Isso e muito mais ela contou durante a nossa longa conversa sobre esse local que passou de geração para geração. Então, após tirarmos várias fotos naquele “sol para cada um”
em pleno BRO-Bró, com a alegria de sentir um vento tão gostoso batendo no rosto e depois da bela recepção, seguimos alegres, eufóricas, cansadas e com muita areia dentro de nossos tênis [risos]. Chegamos tímidas ao bar:
“Olá! Sou Roberta e essa é a Vanessa. Somos estudantes de Jornalismo e gostaria de uma entrevista com você ou o dono do bar sobre este local” , falou Roberta à mulher que estava na cozinha, Dona Keila, que gentilmente aceitou falar conosco, pois o Seu José (ou seu Zezinho), marido dela, estava uma rede neste momento e não queria interromper seu momento de descanso.
Keila Maria Veras, dona do bar,
nos contou que a barraca é uma tradição familiar criada pela mãe de José Pinheiro [marido e dono do bar também]. Já são 50 anos de tradição no total! Uma herança passada de mãe para filho. O casal mora em Timon e tinha uma loja de roupa, mas o negócio não andava bem, então resolveram ir para a “Jericoroa”.
Keila relatou também que no passado haviam muitas barracas, mas os donos foram envelhecendo e os jovens não quiseram dar andamento nos negócios, e desde então, a coroa conta apenas com o bar deles. É um modelo de empreendimento que dá muito trabalho e há certas dificuldades (que vamos abordar mais à frente no texto) e pode ser por esse motivo que
outras pessoas não arriscam montar uma barraca por lá.
Um pouco mais tarde, Seu José Pinheiro, dono do bar, disse que quem colocou o nome de “Jericoroa” foi ele mesmo. Explicou que quando mandou fazer uma placa de publicidade de uma marca de cervejas, o rapaz perguntou qual nome do estabelecimento ele queria pôr. Ao invés de colocar “Barraca do Zezinho”, optou por “Jericoroa”. E deu muito certo! Percebemos que grande parte da popularidade do local surgiu por causa do nome.
Roberta comentou que surgiu uma outra “Jeri”: a Jericodipi. Seu Zezinho logo fala “O bom é para ser copiado né? Eu copiei a outra lá [Jericoacoara], e
agora já me copiaram [risos]. Mas aqui nós somos bem familiares e mantemos o negócio família” , comentou, de forma descontraída, sobre a concorrente.
O funcionamento do bar está condicionado ao horário de circulação das barcas. Dona Keila falou que o atendimento ao público inicia às 6h da manhã e vai até as 18:40h, de domingo a domingo.
O simpático casal conversou conosco por muito tempo, e contou várias curiosidades sobre o local. Uma delas é um tanto quanto engraçada. Lá existem dois animais de estimação, o cachorro Luque [o doguinho que nos recebeu] e a gata Katilanga. O cachorro Luque é o que podemos chamar de cachorro
consciente, pois ele não suporta ver sujeira no rio.
Nadador experiente, se ele ver uma sacola ou qualquer outro tipo de poluição, mesmo que esteja no fundo do rio, ele vai buscar! Quando o doguinho veio nos recepcionar, ficamos um pouco apreensivas, mas logo vimos que ele não queria nos fazer mal. O Luque é muito espertinho!
Seu José Pinheiro já nos avisou que criará um canal no Youtube para o doguinho, com o nome “Cachorro Consciente” para mostrar as ações dele no dia a dia. Contou também que o Luque faz sucesso com a clientela e jornalistas.
Na Jericoroa, duas coisas são um grande sucesso: o peixe e os animais de estimação. Mas além desses, questionamos dona Keila Maria para saber qual é o maior diferencial de lá. “Aqui é um ponto turístico, uma área de lazer. É uma praia no centro de Teresina. Tem gente que gasta para ir em outros lugares, sendo que tem uma praia tão perto. Quando você chega na coroa, parece que está em um lugar diferente. Outro diferencial nosso é o atendimento e o peixe. Ah, peixe aqui é muito falado, graças a Deus! Todo mundo que come uma vez, sempre volta”, portanto, fica a dica para quem gosta de comer um peixe assado ou uma boa piaba.
E realmente, nós duas podemos
concordar que essa fala é verdade! O peixe é muito saboroso, e acompanhado de uma cervejinha gelada, fica mais ainda!
Entretanto, nem tudo é um mar de rosas. Seu José Pinheiro, que a essa altura da entrevista já tinha se envolvido na conversa porque gostou dos assuntos, falou que a Jericoroa tem um certo perigo em relação a assaltos.
“Aqui é o paraíso, lugar lindo de se viver! Olha esse clima! Em nenhum lugar de Teresina você não acha um lugar como esse nessas horas. Mas o perigo existe sim! E só não aconteceu porque eu quase não durmo a noite. Fico vigiando. Quando estamos ilhados é mais seguro, mas desse jeito aqui [baixo nível de água] eu não gosto, porque o bandido anda no rio com a água batendo na canela. No mês de julho, que é quando vendemos bem, aí é que eu não durmo mesmo, principalmente na noite de domingo para segunda que é o dia que eu apuro um dinheirinho melhor, e as vezes os bandidos podem pensar que eu estou com ele aqui dentro e podem tentar fazer o mal”, explicou.
Uma outra dificuldade é em relação a ligação de energia. Apesar dos pedidos feitos à companhia de energia, a empresa alega não ser possível fazer a ligação. Procurada, a Equatorial Piauí, distribuidora que atende Teresina, deu esclarecimentos.
A Equatorial Piauí informa que recebeu solicitação de ligação para um ponto comercial ao lado do Troca Troca, no Centro de Teresina. Contudo, ao enviar equipe para execução do serviço, foi identificado que não existia no local um imóvel associado à ligação solicitada e que a conexão com a rede da Equatorial seria para uma derivação da fiação sobre a água para uma barraca instalada na coroa no meio do Rio Parnaíba.
A Distribuidora, então, não realizou a ligação do ponto citado, uma vez que a instalação para a barraca não atende aos critérios técnicos e de segurança, pois a fiação ficaria exposta sobre a água e próxima a uma área com fluxo de embarcações e potencial risco de acidentes.
Vale destacar que ligações de energia elétrica em áreas costeiras e de rios, seguem os critérios da legislação ambiental e de marinha.
Então esse é um dos grandes causadores de prejuízo, pois sem energia elétrica, o casal gasta muito dinheiro com gasolina para o gerador e com gelo para esfriar as bebidas todos os dias, mesmo com pouco movimento.
Durante o período em que a barraca está montada, a família mora naquele local pois o bar também é casa deles.
“Certa vez, um cliente perguntou como é aqui no escuro, aí eu respondi que não tem nada para fazer pois não tem como assistir uma TV. Aproveitamos o tempo livre de outras formas”, relatou Keila Maria Veras.
Apesar das dificuldades, o casal da Jericoroa já presenciou situações inusitadas. Keila contou que houve um período no qual ela estava internada, e o filho, Francisco Pedro, de 11 anos, ligou para ela dizendo “mamãe, os meninos do jet-ski vieram aqui e derrubaram a barraca, a polícia veio também e apreendeu a máquina de música e meu pai foi preso”.
Já dá para imaginar o desespero né?
Mas calma! Seu José não foi preso, apenas a máquina que foi apreendida em razão do barulho. Mas quanto a barraca, essa realmente foi derrubada. Os rapazes que fizeram a proeza são clientes do bar, mas pelo o que nos contaram, as pazes foram feitas e tudo foi resolvido.
José Pinheiro também nos contou uma coisa curiosa: para a montagem da barraca, ele traz material do interior em um caminhão, ao chegar no cais do lado Timon, coloca os materiais na canoa e leva até a coroa. “Até deixar feito desse jeito é confusão! E aqui foi só eu, ela e meu menino que fizemos a barraca neste ano, só nós três! Levou por volta de dois dias para a gente fazer isso aqui sozinhos. Aí depois chega um cliente que pergunta quanto
é a cerveja, aí a gente diz que é 10,00, e ainda diz que é caro. Dá raiva... Mas depois que o cliente ‘anestesia o couro da testa’ tudo fica barato e nem ligam mais. (risos)”
E convenhamos, R$ 10,00 é um valor justo levando em conta toda a mão de obra e gastos envolvidos para manter o local. Pelo centro, há vários outros bares que cobram muito mais caro por uma cerveja e nem por isso as pessoas deixam de beber. Além do mais, é uma experiência completamente diferente do que podemos encontrar em Teresina.
Em um determinado momento, perguntamos: “E acidentes? Já ocorreram por aqui?”
O casal respondeu que nunca aconteceu, mas para que para banhar no Rio, basta tomar cuidado e tomar banho apenas na parte rasa. Até onde dá para ver o pé.
Pelo menos eu, Roberta, não sou muito fã de rios. E, curiosamente, apesar de viver numa coroa no meio do rio, seu José também disse que não gosta muito.
É muito importante nós sabermos como ocorre o surgimento das coroas do Rio Parnaíba, que são os bancos de areia que ficam no leito do rio, e os cuidados que devemos tomar para
evitar acidentes.
Conversamos com o Professor do curso de Geografia da UFPI, Lucas Almeida Monte, que explicou para nós sobre a constante interação da natureza e o fenômeno que forma as coroas. Ele esclareceu que os elementos naturais que formam a paisagem, como o rio, solo, vegetação, entre outros, interagem constantemente e há todo instante eles estão ali tendo uma relação de interferência entre um e outro. É uma relação de interdependência, que um depende do outro.
De acordo com o Geógrafo, na natureza também existe um fenômeno chamado intemperismo, que é um processo que acontece principalmente nas formas de relevo e nas rochas, e nada mais é do que o desgaste desses materiais, ou seja, se você tem uma rocha que vai sofrer intemperismo, significa dizer que ela vai ficar toda desgastada.
“O Rio Parnaíba é conhecido por transportar uma grande quantidade de sedimentos, é por isso que ele tem aquela cor mais barrenta, quanto que o Rio Poti é mais esverdeado. Isso acontece porque como o Rio Parnaíba tem muitos sedimentos, ele acaba tendo essa coloração”, explicou.
“Vez ou outra, principalmente nos períodos mais secos, que a gente está vivendo agora, onde nós temos um
baixo índice pluviométrico, não chove tanto, e a vazão do Rio Parnaíba fica menor. Com a vazão do rio Parnaíba estando menor, ele não tem forças suficientes para transportar todos esses sedimentos e eles começam acumular no meio do rio, a ponto de formar esses bancos de areia que a gente conhece como coroa”, disse Lucas Almeida.
Lucas comentou ainda que muitas pessoas pensam que a coroa é o fundo do rio que está aparecendo, mas são apenas bancos de areia porque o rio teve essa vazão reduzida devido a quantidade de chuvas que também reduziram. O geógrafo ressaltou também o processo de intemperismo no surgimento das coroas:
“Está vendo como está tudo interligado? O clima está interligado com o rio para poder transportar o
sedimento, e quando os sedimentos acumulam formam aqueles bancos de areias que a gente conhece que fica ali no meio do rio. Tudo isso que foi originado lá desde o processo de intemperismo”, explicou.
Há pouco tempo, houve alguns acidentes envolvendo rios no Estado, e por isso nos atentamos para os cuidados que as pessoas devem tomar ao visitar a Jericoroa, visto que as pessoas gostam de tomar banho no rio. Na Jericoroa, como já citado acima, nunca ocorreu afogamentos, mas é importante que os visitantes continuam tendo atenção para que não ocorram situações desagradáveis. O Geógrafo Lucas contou que muitas pessoas insistem ir além do banco de areia, e isso é um fator preocupante:
“Ele pode chegar a ter 7 ou 8 metros de profundidade, ou seja, as pessoas
acabam se afogando porque elas caem em um local onde não tem nenhuma sustentação para elas. Então, é muito importante, que as pessoas tenham consciência de não ir nadar em locais que elas não conhecem, tendo em vista principalmente que o Rio Parnaíba tem uma correnteza relativamente forte. Ou seja, mesmo que você saiba nadar, pode acabar se cansando, e se você está cansado, você é arrastado! Então, é um grande perigo”, alertou.
Vamos nos divertir, mas com cuidado se for tomar banho de rio! Convidamos a todos a conhecer a maravilhosa praia de água doce, nossa querida Jericoroa. Ah, e lembramos que, segundo seu Zezinho, a barraca funcionará até este mês de outubro. E acabando o mês, voltarão somente em meados de julho do próximo ano. Garantimos que não irão se arrepender. Aproveita e vai logo conhecer a Jericoroa!
Os sábados são os melhores dias para sair, principalmente à noite. A noite de Teresina te reserva coisas que você nem imagina que poderia encontrar, coisas que você nem pensou que descobriria quando chegasse no seu destino. Foi no meio de uma dessas saídas nas noites de sábado na capital que nós dois nos encontramos em um lugar de atmosfera inexplicável, rodeados de pessoas que se uniam por uma paixão em comum: a música.
O nome do evento que fomos, com o intuito de escrever sobre e de fazer umas entrevistas com quem tivesse à disposição de nos responder, era Festa da Firma e aconteceu no espaço Multiverso, na zona Leste da cidade de Teresina. O evento produzido pela 202 Produções- produtora de eventos que eu tive o prazer de conhecer e de saber mais sobre - unia diferentes bandas, autorais e covers, e reuniu um público grande de pessoas que se
encontravam em sintonia, curtindo um momento único. Logo, pudemos nos ver nos unindo à elas também, como se aquele entusiasmo fosse algo contagioso.
A Festa da Firma tinha a proposta de reunir essas bandas e de proporcionar para o público um momento único na cena musical da cidade, dando notoriedade para as bandas autorais, que à propósito, merecem todo o reconhecimento do mundo, o Piauí é mesmo cheio de pessoas talentosas! E dando espaço também para bandas covers mostrarem a que vieram.
O lugar estava todo enfeitado, cheio de luzes, de pessoas, de sorrisos. A piscina que se encontrava do lado de um dos palcos montados no evento, depois se encheu de pessoas, o que foi um momento muito divertido na noite.
Assim como os momentos em que as bandas se apresentaram e mostraram seu potencial, deixando bem claro que os músicos locais executam seu
trabalho com bastante perfeição, sorte daqueles que estavam ali naquela noite e puderam presenciar tudo aquilo que aconteceu.
também que isso é uma coisa que, lá quando ele estava começando a ser compositor, se questionava muito, com perguntas como “Meu Deus, onde é que eu vou tocar?”. Ele contou que depois que conheceu o cenário, ensaiou no estúdio da 202 e conheceu a produção, ficou impressionado com o que eles faziam, com o fato de estarem sempre produzindo eventos com bandas autorais, Ele acredita que essa é uma forma de, pelo menos, manter a cena viva.
“São eventos importantes. Eu gostaria que tivessem eventos de maior magnitude como foi o Festival GiraSol.”
Nós estávamos empenhados em conseguir capturar aquela noite do ponto de vista de outra pessoa, de alguém que pisou no palco e tocou para aquele público, e foi com essa motivação que conseguimos conversar com duas pessoas muito receptivas e que fizeram questão de nos contar sobre o evento pelos olhos dos mesmos. Eram Artur Caldas, de 22 anos, guitarrista, vocalista e compositor da banda piauiense Florais da Terra Quente, e João Mereu, de 25 anos, violinista da mesma banda.
Artur me contou que dentro de Teresina é muito complicado para os músicos contarem com a iniciativa privada para fazerem shows desse tipo, com bandas autorais, e disse
“Acho muito importante mesmo esses eventos, porque pelo menos mantém a cena aquecida, a cena querendo continuar trabalhando. As bandas autorais se conhecem por meio desses eventos e comoartilham as experiências, então assim, é importante por isso. Hoje aqui, a gente ta tocando com pessoas que são todas praticamente de outros estilos.”
Ao questionar João sobre o show que eles fizeram mais cedo, ele contou que o show do dia foi uma etapa muito importnate para a banda, porque a pouco tempo atrás eles tiveram o show do Festival GiraSol, que os animou muito e já no dia da Festa da Firma, eles puderam perceber algumas dificuldades que eles passam, enquanto membros de uma banda,
sobre questões de organização na execução de uma tarefa ou outra. Ele conta também que com a experiência eles puderam absorver muita coisa e que vão conseguir melhorar bastante coisa também, porque toda banda tem seus altos e baixos e aquele tinha sido um dia que ofereceu ambos à eles.
Quando perguntei ao Artur sobre a experiência de tocar em um evento onde as pessoas vão porque gostam das suas músicas e porque tem interesse em conhecer mais sobre a banda, ele me disse exatamente a seguinte coisa:
“É muito massa sabe, a gente vem aqui, a gente toca super cedo e ainda assim tem gente que vem assistir nosso show. Apesar das dificuldades, às vezes... Hoje é sábado mas tem gente que, sei lá, na quarta-feira, as pessoas tão trabalhando e ainda assim vão atrás da gente e tal, vão escutar, porque gostam da musica que a gente faz. Então assim, é isso que me deixa mais orgulhoso mesmo, quando a gente pensa: ‘Ai, esse show aqui acho que não vai dar tanta gente’ e aparecem pessoas novas, aparecem pessoas que a gente já reconhece... Então, é bom saber que tem um publico consolidado e é bom saber também que têm pessoas que tão esperando da gente alguma coisa, até alguma coisa a mais do que a gente já faz. Por isso que ultimamente também, a gente tem aproveitado esses últimos shows pra tocar músicas novas e ver a reação do público, e
tem sido muito positivo. Então é isso, só felicidade. Tem o estresse todo de tocar, de fazer o show mas a recepção do publico sempre é animadora e eu fico sempre feliz.”
É notório que a cena musical de Teresina vem retomando cada vez mais seu espaço, esteve um tanto apagada por um tempo mas atualmente está muito ativa, mostrando as caras e mostrando novos talentos para o público que tanto ama a música. Sobre esse renascimento da cena musical, João afirmou que: “Algum tempo atrás eu percebia que Teresina tava com um cenário musical muito parado, mas agora, dá pra perceber que ele ta se renovando cada vez mais com os eventos que tão acontecendo agora em 2022. A gente tá finalmente voltando a ser a Teresina musical de antigamente e a gente tem muito tesouro escondido pra pegar, tem muita coisa pra ser descoberta também, acho que, por exemplo, o evento de hoje que traz um bocado de banda autoral que tá em atividade nesse tempo tá tendo muita oportunidade também de crescimento porque dá até uma certa notoriedade também. Tem gente que só não conhece banda boa porque não tá tendo show e aí aparece aqui e começa a gostar de alguma coisa local como foi eu com algumas bandas daqui. Então, acho que o evento de hoje foi uma coisa maravilhosa, acho que tem muito a agregar pra Teresina e também, tem pessoas extremamente
competentes realizando esse evento que vão trazer cada vez mais novodade pra nossa cidade.”
Estado cobrisse mais essa questão da cultura. Eu espero que mais produtoras queiram investir mais e deem a mesma estrutura aque dariam pra, por exemplo, um artista que vem de fora tocar aqui, deem pra essas bandas locais, porque tem muita gente que é perfeitamente capaz de fazer shows em uma magnitude de uma banda nacional, entende, os show no festival GiraSol, por exemplo, foram incríveis e se tivessem a mesma estrutura que tinham os artistas nacionais, talvez fosse ainda mais animador assim pra cena, só espero realmente que esse tipo de estrutura surja cada vez mais aqui em Teresina.”
Quando questionei Artur sobre a mesma coisa, ele me contou sobre seu ponto de vista: “Eu acho que assim, muito do que não acontece em Teresina, é mesmo também por falta de condição, às vezes condição financeira [...] Muito do que a gente precisa também, acho que é isso, pessoas que estejam dispostas a investir porque muitas vezes, a gente fica dependente do apoio do Estado, que também não consegue cobrir todo mundo. Agora eu acho que as iniciativas do Estado são super essenciais também e acho que faz todo sentido, eu gostaria até que o
Ainda caminhando pelo evento e buscando entender mais, agora sobre a parte da produção, nos encontramos com Edward, produtor da 202 e também músico. Ele conversou conosco e nos falou sobre a experiência dele na organização e quais eram as suas realizações como alguém que participou de perto de todo o processo de realização do evento. Sobre a importância desses eventos ele afirmou que acha de suma importância que aconteçam, por conta da valorização da imagem que têm as bandas daqui da região, que é uma coisa que está um pouco fragilizada no moemnto. As bandas, infelizmente, de acordo com ele, ainda não têm a atenção que merecem, então eles realizam esses eventos, com essa ideia de mostrar para o
mundo e para quem quiser ver, e fazer o máximo de divulgação possível de todas as bandas que se apresentam. “Por exemplo hoje, tá tocando aqui a Florais, a Monte Imerso [...] tem a Into Morphin, então, é muito importante essa demonstração pra abrir espaço, aquela idéia de abrir espaço pras bandas autorais porque é muito fraco o espaço pra elas aqui e em um evento grande como esse daqui, que tem um público grande, tem um público legal, facilita as bandas a transmitirem as mensagens delas.”
“A idéia do evento é sempre trazer as bandas autorais pra galera conhecer, a minha experiência dentro disso é tipo, a gente tem um universo gigantesco, inexplorado, por conta dessa falta de conhecimento que a gente tem das bandas regionais, nacionais, enfim... A gente já sabe como que é a questão do mercado em relação ao nosso nincho, mas nesmo assim a gente tenta porque é uma coisa que a gente gosta. Tem gente que gosta e nao tem acesso [...] Pessoalmente, eu acho isso incrível porque é sempre uma coisa, como posso dizer, uma surpresa ter contato com as bandas que a gente tem aqui em Teresina, é sempre uma coisa mágica, porque a bandas daqui têm um som muito bom, os músicos daqui de Teresina têm um som de qualidade muito boa, sabe, eles conseguem transmitir uma vibe maraviljosa e poucas pessoas conhecem isso, poucas pessoas têm acesso a isso e poxa, é
exatamente essa a idéia de todo esse trampo que a gente ta fazendo hoje aqui e é muito gratificante quando a gente vê o resultado, quando a gente vê uma festa dessa, com todo mundo pirando, a galera ovacionando as bandas daqui... Quando eu vejo a galera comemorando as bandas daqui, sabe, comenorando, cantando junto as músicas e pirando do mesmo jeito, isso traz a energia que eu sinto vontade de sentir, essa é a ideia de todo esse festival, de toda essa parada que rola aqui sabe.”
Enquanto conversávamos, pude perceber o entusiasmo dele em participar desse evento e ver de perto a reação positiva e calorosa das pessoas que foram ali para assistir e
para prestigiar aquele momento, que acabou sendo um momento muito importante tanto para a 202 Produções, quanto pra quem foi assistir os shows. Perguntei sobre o pensamento dele sobre aquilo tudo e ele contou com bastante alegria, ainda deu um aviso sobre projetos pessoais futuros que estariam por vir, para acrescentar ainda mais nessa cena tão bonita que só cresce mais a cada dia.
“Eu sou um cara que eu sou muito ligado à música, eu gosto de música, sou músico, pratico música, vivo música, respiro música… Eu toco bateria, eu canto e futuramente vocês vão conhecer meu nome melhor aí, futuramente eu vou tá fazendo meus próprios projetos [...]Eu sou muito focado nessa área, porque é uma coisa que eu amo fazer, eu amo e me sinto feliz com cada perrngue, com cada estresse que eu passo e consigo resolver dentro dessa vibe, sabe, a 202 é uma produtora que ela senpre tá focando nessas ideias de trazer exatamente esse mercado, de fazer esse mercado crescer, sabe, essa idéia de poder mostrar o nosso trabalho pra o mundo. Enfim, eu particularmente amo fazer isso aqui e eu sinto uma gratificação inexplicável, sabe, quando termina um trampo desse eu fico muito feliz [...] Eu tento não trazer muito pra esse lado da satisfação pessoal, eu fico mais feliz quando eu vejo as outras pessoas felizes pelo resultado do meu trampo, isso é a parte mais gratificante
disso. A 202, ela me facilita muito, é a produtora que eu to inserido a um time já, ela facilita muito essa minha vontade pessoal de transmitir exatamente essa ideia, e o Júlio é um cara incrível, que é o chefão né, o nosso querido chefinho, valeu Julio!”
Ele acrescentou ainda que é mágico poder fazer parte dessa experiência e concluiu agradecendo aos seus amigos e colegas de trabalho pela oportunidade:
“E é magico mano, a palavra que melhor define isso e ‘mágico’ porque música todos nós gostamos, todo mundo gosta de pelo menos uma música. e a gente poder transmitir essa imagem, transmitir essa energia aqui, é sensacional. Muito obrigado a 202 Produções por me permitir ‘trampar’ com isso, é uma coisa que eu amo muito fazer!”
Por Nathan Rangell Felício e Caio Henrico
Era uma tarde típica do mês de setembro, mais especificamente do dia 28, a hora era mais ou menos 15 da tarde, horário em que o sol escaldante do B-R-O BRÓ disputa espaço com as sombras dos ipês, espalhados pela capital. Seria mais uma tarde comum para a parte cultural de Teresina, em geral, se não fosse um pequeno diferencial: dois amigos indo em busca de se aprofundar mais sobre a parte teatral dessa cidade. Mais especificamente, esses amigos, é esse que vos narra, Caio Monteiro, e meu parceiro que me acompanhou nessa empreitada jornalística, Nathan
Rangell. E foi assim que decidimos que iríamos nos aprofundar mais sobre o lado teatral da capital do Piauí, pensamos na importância de difundir a escola de teatro Gomes Campos, para quando qualquer um que ler essa matéria poder conhecer como está seu atual funcionamento.
Logo ao chegar na entrada da escola de teatro Gomes Campos, facilmente possível de se encontrar pelos seus pontos de referencia (perto do Verdão e do Lindolfo Monteiro)
ficou fácil identificá-la, tanto por sua placa externa, quanto pelo pequeno
memorial explicando sobre a escola ao passar pelo portão.
Diferente do amigo e parceiro de matéria Nathan Rangell, eu já estudei e inclusive me formei nessa escola de Teatro. Entrar nela de novo e ver tudo tão novo mas ao mesmo tempo tão parecido com o tempo que eu estudei lá me fez sentir uma estranha sensação de nostalgia e também de curiosidade pelo novo, claro. Cada corredor, cada sala, o palco para ensaios, tudo isso me trouxe tantas boas lembranças, me fizeram flutuar novamente pela arte, área essa que tanto me prende e me fascina. Porém, eu não era o único a estar tendo sensações boas ao andar
pela Gomes Campos. Meu bom amigo e parceiro de equipe, Rangell, também é artista, inclusive já fez um espetáculo em que eu estava participando, então ele também foi pego pelo teor artístico do local. No entanto, era uma sensação diferente da minha. Por já ter me formado ali, eu exalava nostalgia. Já ele estava com os olhos brilhando, enxergando possibilidades e exalando sonhos.
Após nosso passeio para passar uma primeira vista na escola fomos entrevistar o Diretor de lá, o que nos rendeu um conversa muito boa e esclarecedora. O professor Augusto Neto, Diretor da Gomes Campos, nos
revelou que inicialmente começou sua formação em teatro aqui mesmo em Teresina, na UFPI na década de 80. Infelizmente esse curso foi extinto por aqui. Um curso que, se ainda existisse, eu certamente faria. Porém, não foi pela UFPI que o professor Augusto Neto se formou. Ele se formou na UNB, em artes cênicas, inclusive já foi presidente da Federação Nacional dos artistas educadores do Brasil, além de também já ter ajudado no festival latino americano de cultura. Ele se tornou diretor da Gomes Campos durante a pandemia, em 2020, tendo isto como um grande desafio, pois era uma época difícil para se conseguir manter a escola viva. No entanto, o professor Augusto Neto conseguiu passar por esse desafio e, após o pico da pandemia, foi capaz de reformar a
Gomes Campos e incrementar cursos novos, além do teatro, que é o nosso foco. Os cursos, no caso, são os de canto, musica e instrumental.
Outro ponto importante a se frisar sobre a gestão do professor Augusto Neto como diretor foi sua observação no fato de grande parte dos professores que lá davam aula, apesar de artista, não tinham formação na área. Ele, então, direcionou parte específica do dinheiro para fazer com que todos os professores fizessem um curso para que tivessem uma formação na área. Por fim, vale ressaltar, que o professor Augusto foi um dos idealizadores originais da escola de teatro Gomes Campos, por volta de 1995, com outros professores, como o professor Acir Campelo.
Após nossa boa conversa com o diretor, decidimos conversar com os alunos sobre a escola. Primeiramente conversamos com o aluno Gil Cleison, que nos informou que conheceu a Gomes Campos por meio de uma minuciosa busca pelo google por algum lugar que ensinasse teatro em Teresina. Confesso que isso me fez lembrar muito de mim mesmo. Sim, a maneira que conheci a Gomes Campos, anos atrás, foi basicamente a mesma, e com a mesma intenção, encontrar um lugar em Teresina que ensinasse bem sobre o teatro. Depois de muita procura encontrei a Gomes Campos, da mesma forma que o aluno Gil Cleison, e, certamente ele possui o mesmo intuito que eu tinha na época, de se tornar logo um ator profissional. Também pelas palavras do aluno Gil Cleison, o ensino atual lá na Gomes
Campos é muito bom.
Decidimos, então, fazer uma última entrevista, com mais um estudante de lá, para termos uma perspectiva diferente. Entrevistamos a aluna Juliana Rodrigues, que revelou ter conhecido o curso através do seu psicólogo. Isso já deixou mais clara a nossa visão sobre a forma como a Gomes Campos vem sendo mais bem difundida. Segundo a aluna Juliana, o curso é bastante proveitoso e muito bom, ela almeja se manter nesse ramo artístico, após completar o curso.
Ao fim da tarde nossa empreitada havia chegado ao fim, com ambos os jornalistas altamente satisfeitos. Sim, de fato a arte sempre consegue saciar a alma. Assim sendo, para dois jornalistas, que também são atores, não há arte mais embriagante que o
Segundo o dicionário, nostalgia é um sentimento prazeroso misturado com um pouco de tristeza e saudade quando pensamos sobre o que aconteceu no passado. Acredito que esse foi o sentimento mútuo de todos que visitaram a exposição da artista visual Lidia Bulgari, no Museu do Piauí ao longo dos 17 dias que as obras da artista estiveram em exibição no museu. A exposição, intitulada Museu da Minha Mente, traz vivências e lembranças da infância da artista.
Mas afinal, como eu cheguei à exposição? Fiquei sabendo da exposição através de uma conhecida, por um post em uma rede social. Logo que vi a postagem comentei com alguns amigos e alguns dias depois ao participar de uma aula de campo
no centro da cidade de Teresina, um dos locais visitados foi justamente a exposição da artista.
Chegamos na igreja de São Benedito, no dia e local escolhido para o encontro da turma e o início da nossa jornada pelas ruas do centro da capital, por volta das 16h de quinta-feira. De lá passamos por diversos pontos conhecidos da cidade, do Theatro 4 de setembro à lanchonetes populares. Chegamos a Praça da Bandeira já no final da tarde em meio ao corre corre das pessoas saindo de seus trabalhos, vendedores ambulantes, lojas fechando e pessoas retornando a suas residências. Assim que chegamos ao museu, o local já estava fechando, no entanto conseguimos visitar a exposição, quando adentramos o espaço o sentimento de nostalgia
aparentemente foi comum a todos.
Era perceptível por meio de comentários dos que estavam ali presentes, “Na casa da minha avó tinha uma maquina dessa” , “Meus avós tinham um altar desses com santinhos” , “Lá em casa tinha um filtro desse de barro” , as reações eram as mais diversas e sempre acompanhadas de muitas risadas.
antigamente. Desde o ferro de passar que eram de ferro com carvão, a bileira que colocavam o pote de barro, hoje a gente não vê mais, mas eram coisas tradicionais de todas as casinhas do interior e a exposição os quadros passam esse mesmo sentimento, é algo que provoca certa nostalgia e é regional .”
Já Rebeca me relatou que acreditava que a intenção da exposição era a sutileza de representar as diversas tarefas que o campo guarda, “A enxada, os paus, por exemplo, minha avó fazendeira usa estes itens para direcionar gado e galinha. Esses objetos são a rotina dela” .
Perguntei a duas colegas da turma suas impressões sobre a exposição e o que elas tinham achado, “Quando eu entrei na exposição eu tive a sensação de coisas que me remetiam ao interior, aos meus avós que vieram do interior” , iniciou relatando Sarah e continuou “Você conseguia rever uma casinha antiga, como eram as coisas
A exposição estava dividida em dois espaços, sendo o primeiro com o trabalho de pintura da artista exposto em telas, cadernetas e com algumas collabs com outros artistas regionais e até mesmo instituições, como a Casa de Zabelê, que lançaram juntos a Coleção Memórias com as obras da artista estampadas em camisetas, que estavam a venda no local. O objetivo da exposição além da divulgação de seu trabalho é a arrecadação de fundos para o custeio de uma viagem.
Lídia foi convidada a expor no Museu do Louvre em Paris por meio da Galeria Luciana Severo, em outubro. Já o segundo espaço possuía alguns móveis e objetos que remetem ao interior e ao passado, como enxadas, máquinas de costura antigas, filtro de barro, lamparina, entre outros elementos.
A artista nos recebeu e prontamente foi nos mostrando as obras e relatando de forma breve sobre os quadros e as collabs. Perguntei sobre o que teria sido a sua principal fonte de expiração, “São minhas memórias afetivas, as memórias que eu tenho da minha infância, principalmente as que eu tenho com minha família materna” .
Todas as obras retratam um pouco sobre a cultura piauiense, como os altares de santinhos, que quase sempre estão presentes nas casas em todo estado. O caju e a cajuína, lamparinas, a cana de açúcar, “Eu tentei trazer tanto essa parte das pinturas que tratam do regionalismo e da cultura piauiense, como a parte da instalação que envolvia móveis e utensílios. Que até o Pedro Vidalco costuma falar e eu adotei Memorabilia, que são móveis com memória afetiva , então eu realmente tentei trazer todas essas coisas que cresceram junto comigo para estarem presentes junto com as pessoas, realmente pela carga
de memória afetiva que esses móveis e pinturas me trazem” .
Continuamos a observar as obras da artista e um colega perguntou sobre o processo de construção da exposição e Lídia nos disse que toda a exposição foi pensada como uma forma de arrecadação de fundos para auxiliar no custeio da viagem, para expor no Louvre. Ela ainda nos disse que essa é sua primeira exposição individual e que tem uma importância ainda maior por ser no Museu do Piauí, que o sentimento que ela tem é de “satisfação” em expor no local.
Aproveitei e questionei sobre como era pra ela ser tão jovem e receber um convite desses, de expor no Museu mais famoso do mundo, “Expor fora do país pra mim é uma grande coisa, até pelo fato que eu sou uma artista bem jovem e já dá esse salto gigantesco.
Além de que tem o fato que a cultura piauiense só ser realmente reconhecida e valorizada quando vai pra fora , são reconhecidos lá e voltam pra cá” .
divisor de águas na minha vida, e de já, ele já tem aberto muitas portas, até pq eu nunca imaginava fazer uma exposição individual e a partir dessa necessidade de ir, eu me vi na correria pra conseguir lugares para expor., talvez se não fosse o convite para expor eu ainda não tivesse organizado minha primeira exposição.”
Falamos também sobre o impacto desse convite e viagem na sua vida, “Eu sinto que essa viagem, essa exposição e esse convite foi e vai ser um grande
Falando sobre essa questão de arrecadação de fundos e custeio, aproveitamos para falar sobre as dificuldades de ser artista aqui no estado. Afinal sabemos que o cenário cultural aqui em Teresina e no estado em geral, é algo que não tem tanta visibilidade e as pessoas, principalmente as mais marginalizadas, não têm o devido acesso, “A maior dificuldade do cenário artístico e cultural aqui do Piauí e em Teresina é o apoio e também falta a comunicação e maior divulgação de como participar de editais e concursos, e esse incentivo. Muitas pessoas produzem matérias belíssimas, mas por falta de incentivo e divulgação não conseguem mostrar aos outros o que elas fazem.” Encerramos nossa conversa por ali e continuei a observar a exposição com os demais da turma.
Ao final da visita a exposição perguntei às meninas o que mais tinham gostado na exposição, para Rebeca o que mais chamou sua atenção foram os quadros entre outros elementos da exposição, “Eu adorei os quadros, a toalha de mesa bordada de lei, os cajuzinhos e as florzinhas do pé de caju, é de uma delicadeza sem igual. Dos quadros o meu favorito é o da cajuína. A gente vê uma onda de cores quentes, passando um efeito de aurora boreal tanto na própria cajuína quanto ao fundo, e eu achei sensacional.”
“Eu achei bastante interessante, porque é como se tivessem resgatado hábitos da nossa cultura que hoje em
dia não são tão comuns, mas que em algum momento fizeram parte da nossa vivência diária.” disse Sara.
Pois bem, finalizamos a visita ao museu com essa sensação nostálgica com a gente, pelo resto do nosso passeio pelo centro. De lá retornamos a igreja de São Benedito, nosso ponto de partida, porém no caminho de volta para encerrar além da sensação de nostalgia alguns experimentaram e vivenciaram o sentimento do novo, provando pela primeira vez o bom e velho caldo de cana. Afinal, qual a melhor forma de encerrar um passeio com tanta regionalidade piauiense, se não com um caldo de cana com pastel?
Entende-se por “sebo” as livrarias que comercializam livros usados, além de CDs, DVDs, gibis, entre vários outros produtos. Nunca entendi o porquê desse nome, então, como uma criança curiosa que pergunta para a mãe por que a vida é como é, fui procurar, e a resposta foi mais simples do que eu esperava: o termo “sebo” surgiu a partir da ideia de que os livros usados, por serem muito manuseados, ficam cheios de gordura — o sebo em questão.
Supostamente, os sebos surgiram na Europa no século XVI, quando
mercadores passaram a vender papiros e documentos da época para pesquisadores, e chegaram ao Brasil no século XIX. Não se sabe ao certo quando, mas também chegaram na capital do Piauí. Distribuídas pela cidade, as pequenas livrarias compartilham do mesmo objetivo de espalhar conhecimento e cultura. Uma delas, no entanto, me chama a atenção. Abarrotada de livros e revistas usados, a banca do Seu Clemente fica escondida ali do ladinho do prédio dos Correios, na Avenida Antonino Freire — a menor avenida do mundo.
São 16h de uma quarta-feira. Estranhamente, ao chegar no local, me deparo com vários clientes esperando ser atendidos pelo dono do sebo. Sento na calçada frente à barraca observando a interação de Clemente com a clientela. Por várias vezes ele me pergunta se quero alguma coisa. “Quero conversar com o senhor, mas pode atender seus clientes primeiro!”, digo. Quando ele termina e olha para mim, parece que até já sabe o que quero perguntar. “Você é jornalista?”, indaga. Abro um sorriso e explico que estou fazendo uma matéria sobre sebos em Teresina, e ele prontamente se dispõe a me contar sua história. Ali, sentados na sombra em busca de um alívio do calor, ele começa:
“Sou Clemente, mas todo mundo me conhece como Processo. Esse apelido foi um advogado que me deu, porque
eu vendia muito livro de Direito. Se você chegar aqui e perguntar quem é Clemente ninguém conhece, só Processo. Mas não vou lhe processar não”, ele diz brincando.
Clemente diz que o que mais vende no sebo são livros escolares e livretos de poesia. E realmente, assim que cheguei uma professora de História comprava com ele vários folhetos de literatura de cordel para usar em sala de aula. Estudantes do Instituto Federal do Piauí também pararam para folhear livros de Química e Matemática, decidindo quais levariam com eles para casa, em Cocais (PI).
O livreiro me conta que a banca era originalmente do Seu Dentinho, dono de um sebo praticamente em frente aos Correios, que só fica aberto pela manhã. Foi Dentinho quem o ajudou a
começar o negócio, oferecendo a ele o trabalho de vender conhecimento e histórias. E foi assim que o Seu Clemente, morador de Timon (MA), passou a ocupar o centro da cidade com sua personalidade amigável, das 8h às 17h, de segunda à sábado.
Depois de algumas horas batendo papo e observando o movimento, Processo me fala, triste, que os sebos estão acabando. É assim mesmo que ele diz: “Os sebos estão acabando”. Segundo ele, falta incentivo à leitura nas escolas, o que acaba prejudicando não só as vendas de livros usados, mas também bancas e livrarias de todo o país. “O jovem de hoje só quer saber de Internet, não tem mais gosto pela leitura. Aqui só quem compra no sebo é o poeta, advogado, o pessoal antigo. Mas jovem é difícil passar por aqui.”
Ele também conta que o esvaziamento do centro da cidade também prejudicou o negócio. Ali, na região da praça Pedro II, poucas lojas continuam abertas, e a falta de pedestres fica clara nos poucos minutos que levam para se deslocar da Central de Artesanato Mestre Dezinho até a Paróquia de São Benedito. Mas isso nem é novidade. Qualquer teresinense (ou cidadão temporário, como eu) sabe que andar no Centro depois que o horário comercial acaba é missão quase impossível. E dia após dia vamos vivenciando a falta de vida noturna naquela região, que acaba entregue à criminalidade e às drogas.
Apesar de tudo, o sebo do Seu Clemente continua com suas portas abertas e livros espalhados. Mesmo que venha a ser a última banca funcionando na região, seu pequeno
espaço sempre será um refúgio para os amantes da literatura e para quem gosta de conversa de calçada.
Saí de lá com mais um livro em mãos, mesmo após ter prometido a mim mesma que só iria comprar outro livro após ler aqueles que juntam poeira há meses na minha estante. Também prometi ao Processo que logo voltaria trazendo outras pessoas tão amantes de livros usados quanto eu.
Em uma outra quarta-feira, resolvi conhecer o Dentinho de quem tanto Processo falava. E ficava ali, um pouquinho antes dos Correios. Não ocupava tanto espaço, mas tinha mais livros do que eu provavelmente tinha lido a minha vida inteira. Uma mesma estante misturando Durkheim, Eça de Queiroz e Professor Pasquale. Revistinhas de super-heróis dividindo espaço com Nietzche. Toda uma atmosfera que me trazia de volta para quando eu era criança e estava passeando pelo centro de Brasília com minha avó, passando por bancas de revistas cheias de livros, cruzadinhas e afins. E lá estava ele, uma figura magra, com pouco mais de altura do que eu, boné e máscara: Antônio de Pádua, o famoso Dentinho. Cumprimento-o, digo que sou estudante de jornalismo e vim prestigiar seu trabalho. Ele é bem receptivo, e já me guia pelo lugar.
Vendo-o sozinho em meio a tantos livros, pergunto sobre o movimento daquele dia. “Hoje tá fraco”,
responde. Pergunto se não é por conta do meio de semana e a resposta é, ironicamente, não. “Meio de semana é o melhor dia, mas como é final de mês, tá completamente arrasando tudo”, ele ri.
Conversa vai, conversa vem, Dentinho me mostra todo o seu acervo, e eu, surpresa, confesso a ele que nunca tinha ido a um sebo na vida. Dali, ele me conta toda a sua história. Segundo ele, desde criança, seu maior sonho era ter um sebo, que finalmente montou em 2015. Começou sozinho como um ambulante, vendendo revistas. “Colocava as revistas no ombro, você queria uma revista e eu mostrava as capas pra você”, conta, pegando algumas revistas de uma estante e refazendo os movimentos que narrava. Parecia ser memória muscular. Ele cita também que tinha alguns companheiros no trabalho, mas o único que sobrou da turma foi ele. “Alguns morreram, outros foram embora, e eu fiquei”.
A conversa parece encerrar ali. Eu, claramente impressionada com a história do dono do sebo, digo a ele que estou honrada por poder ouvi-la. Por algum motivo, sinto que ele não conta essa história pra tanta gente, ora porque passam muito apressadas pelo sebo, ora porque não querem ouvir. Essa geração de hoje.
Estava de saída do sebo, quando me deparo com um homem olhando os
livros. Decido esperar para ver se era só curiosidade ou se ele vai ficar mais um pouco. Ele fica. Pergunto o seu nome. É Donato Alves, e ele parece ser um frequentador assíduo do sebo.
Seu Donato me conta logo de cara que é professor, então sempre leva livros didáticos para casa. “Na mão dele já comprei vários, de Sociologia, de Filosofia, de História também, Gramática…”, conta, me surpreendendo mais uma vez. Há quanto tempo eu não via um professor de tudo. “Mas eu gosto de ler romances, Machado de Assis, José de Alencar, esses nomes importantes”. Não julgo. Sou apaixonada por Dom Casmurro.
Quando pergunto se o professor pode se considerar um cliente fiel do sebo do Dentinho, recebo uma resposta animada. “Pode-se dizer que sim, agora não sei se ele também acha”, provoca, e logo em seguida Dentinho diz que ele está lá todos os dias. Provavelmente ele também acha, sim.
Antes de ir, seu Donato compra um livro que agora não me lembro bem qual era. Me deseja sorte no curso e diz que também se formou pela Federal. Despede-se de Dentinho e sai, dando lugar a um jovem que buscava livros de Nietzsche em francês. Parecia ser estudante de filosofia. Ele não fica muito tempo e nem consigo perguntar seu nome, mas o que ele está buscando me intriga, e eu nem ficaria surpresa se Dentinho realmente tivesse livros em francês em seu acervo. Até procuro junto para saber se tem, mas só encontro livros em bom português.
Eu queria levar um livro comigo. Gostaria de carregar um pouco da história de seu Dentinho e retomar o hábito da leitura que perdi há tanto tempo. Não pude, mas deixei com ele a promessa de que voltaria para comprar um de seus livros. Ainda não decidi qual, mas sei que vou ler com todo o carinho.