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“Jericoroa”: Teresina tem praia de água doce!

Por Roberta Laurindo e Vanessa Kelly

Nossa querida Teresina, primeira capital planejada do país e a única que fica na divisa de dois estados: Piauí e Maranhão, é também a única capital nordestina que não tem praia, pois não está localizada no litoral e por isso não tem mar.

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Isso é o que muita gente pensa, pois desconhecem um local que virou ponto turístico da cidade: A Jericoroa, que é um bar construído em uma coroa do Rio Parnaíba. “Coroas” são os chamados “bancos de areia” que se formam ao longo do leito quando o nível das águas cai. E que bom que a natureza nos presenteou com um lugar tão agradável para passar o tempo!

Podemos afirmar que Teresina tem sim uma praia. Uma praia de água doce! Um lugar diferenciado, com atendimento maravilhoso e com uma localização de fácil acesso entre as pontes José Sarney (Ponte da Amizade) e a Ponte Metálica Governador João

Luís Ferreira, sob uma coroa de areia no Rio Parnaíba, como já falamos acima. O local chama atenção por causa de sua beleza e aparência contrastante em relação ao centro da cidade.

A Jericoroa foi reativada oficialmente em 2016, mas ficou dois anos sem funcionar em razão da pandemia. Foi batizada com esse nome em razão da inspiração do dono, seu Zezinho, na praia de Jericoacoara, localizada em Jijoca, litoral do Ceará. Uma praia bastante famosa por ser um lugar agradável para passar com a família, vendo paisagens lindas que faz com que tenhamos a sensação de estar no paraíso, com aquele vento batendo no rosto e aquela sensação de paz. Além disso, as estruturas de hotéis e pousadas chamam muita atenção e o local também é considerado um dos principais destinos turísticos da região Nordeste.

Porém, aqui em Teresina, a nossa praia de água doce não é tão diferente.

Desde que surgiu, chamou atenção dos teresinenses e é muito visitada por cantores, atores, jornalistas, entre outros. Confessamos que não conhecíamos a Jericoroa. Quando estávamos no ônibus que passa na Avenida Maranhão, ficávamos curiosas em saber o que tinha naquele local, e hoje em pleno 2022, graças ao jornalismo, pudemos conhecer. E olha, foi muito legal conhecer aquele bar, aquela família tão simpática e experimentar saborosas piabas que eles nos ofereceram de cortesia.

Era por volta das 14h, sob um sol escaldante e com pouco vento que visitamos a Jericoroa. Foi tudo muito novo para nós, que nem sequer

Pessoas aguardando o barco. Foto: Roberta Laurindo. havíamos andado de barco antes.

Antes que esqueçamos, há um detalhe: para chegar lá, você precisará pegar um barco! Ao lado do famoso Troca-Troca, há um cais com dois barcos fazendo a travessia do Rio Parnaíba entre Teresina, Jericoroa e Timon. A passagem custa apenas R$ 2,50, o trajeto de ida e volta soma R$ 5,00 que podem ser pagos em espécie ou via pix. Vale a pena a experiência da travessia!

Durante a viagem, aquele aguaceiro chamou a atenção dos nossos olhos, que estavam atentos a cada detalhe daquela paisagem. Foi bem rápido para chegar à Jericoroa.

Desembarcamos.

Ficamos maravilhadas com aquela praia. Não resistimos e tiramos muitas fotos no local, mesmo com um sol de rachar. Foi quando um cachorro caramelo, nos recepcionou. Ele era tão fofo que deu vontade de levar para casa! E não fomos as únicas que tivemos esse pensamento. Descobrimos que o cachorrinho era dos donos do bar, e a dona Keila disse que muita gente se apaixona por ele. Por isso, quando tem muita gente no bar, o cachorro fica preso, pois eles têm medo de o levarem embora.

Isso e muito mais ela contou durante a nossa longa conversa sobre esse local que passou de geração para geração. Então, após tirarmos várias fotos naquele “sol para cada um” em pleno BRO-Bró, com a alegria de sentir um vento tão gostoso batendo no rosto e depois da bela recepção, seguimos alegres, eufóricas, cansadas e com muita areia dentro de nossos tênis [risos]. Chegamos tímidas ao bar:

“Olá! Sou Roberta e essa é a Vanessa. Somos estudantes de Jornalismo e gostaria de uma entrevista com você ou o dono do bar sobre este local” , falou Roberta à mulher que estava na cozinha, Dona Keila, que gentilmente aceitou falar conosco, pois o Seu José (ou seu Zezinho), marido dela, estava uma rede neste momento e não queria interromper seu momento de descanso.

Keila Maria Veras, dona do bar, nos contou que a barraca é uma tradição familiar criada pela mãe de José Pinheiro [marido e dono do bar também]. Já são 50 anos de tradição no total! Uma herança passada de mãe para filho. O casal mora em Timon e tinha uma loja de roupa, mas o negócio não andava bem, então resolveram ir para a “Jericoroa”.

Keila relatou também que no passado haviam muitas barracas, mas os donos foram envelhecendo e os jovens não quiseram dar andamento nos negócios, e desde então, a coroa conta apenas com o bar deles. É um modelo de empreendimento que dá muito trabalho e há certas dificuldades (que vamos abordar mais à frente no texto) e pode ser por esse motivo que outras pessoas não arriscam montar uma barraca por lá.

Um pouco mais tarde, Seu José Pinheiro, dono do bar, disse que quem colocou o nome de “Jericoroa” foi ele mesmo. Explicou que quando mandou fazer uma placa de publicidade de uma marca de cervejas, o rapaz perguntou qual nome do estabelecimento ele queria pôr. Ao invés de colocar “Barraca do Zezinho”, optou por “Jericoroa”. E deu muito certo! Percebemos que grande parte da popularidade do local surgiu por causa do nome.

Roberta comentou que surgiu uma outra “Jeri”: a Jericodipi. Seu Zezinho logo fala “O bom é para ser copiado né? Eu copiei a outra lá [Jericoacoara], e agora já me copiaram [risos]. Mas aqui nós somos bem familiares e mantemos o negócio família” , comentou, de forma descontraída, sobre a concorrente.

O funcionamento do bar está condicionado ao horário de circulação das barcas. Dona Keila falou que o atendimento ao público inicia às 6h da manhã e vai até as 18:40h, de domingo a domingo.

O simpático casal conversou conosco por muito tempo, e contou várias curiosidades sobre o local. Uma delas é um tanto quanto engraçada. Lá existem dois animais de estimação, o cachorro Luque [o doguinho que nos recebeu] e a gata Katilanga. O cachorro Luque é o que podemos chamar de cachorro consciente, pois ele não suporta ver sujeira no rio.

Nadador experiente, se ele ver uma sacola ou qualquer outro tipo de poluição, mesmo que esteja no fundo do rio, ele vai buscar! Quando o doguinho veio nos recepcionar, ficamos um pouco apreensivas, mas logo vimos que ele não queria nos fazer mal. O Luque é muito espertinho!

Seu José Pinheiro já nos avisou que criará um canal no Youtube para o doguinho, com o nome “Cachorro Consciente” para mostrar as ações dele no dia a dia. Contou também que o Luque faz sucesso com a clientela e jornalistas.

Na Jericoroa, duas coisas são um grande sucesso: o peixe e os animais de estimação. Mas além desses, questionamos dona Keila Maria para saber qual é o maior diferencial de lá. “Aqui é um ponto turístico, uma área de lazer. É uma praia no centro de Teresina. Tem gente que gasta para ir em outros lugares, sendo que tem uma praia tão perto. Quando você chega na coroa, parece que está em um lugar diferente. Outro diferencial nosso é o atendimento e o peixe. Ah, peixe aqui é muito falado, graças a Deus! Todo mundo que come uma vez, sempre volta”, portanto, fica a dica para quem gosta de comer um peixe assado ou uma boa piaba.

E realmente, nós duas podemos concordar que essa fala é verdade! O peixe é muito saboroso, e acompanhado de uma cervejinha gelada, fica mais ainda!

Entretanto, nem tudo é um mar de rosas. Seu José Pinheiro, que a essa altura da entrevista já tinha se envolvido na conversa porque gostou dos assuntos, falou que a Jericoroa tem um certo perigo em relação a assaltos.

“Aqui é o paraíso, lugar lindo de se viver! Olha esse clima! Em nenhum lugar de Teresina você não acha um lugar como esse nessas horas. Mas o perigo existe sim! E só não aconteceu porque eu quase não durmo a noite. Fico vigiando. Quando estamos ilhados é mais seguro, mas desse jeito aqui [baixo nível de água] eu não gosto, porque o bandido anda no rio com a água batendo na canela. No mês de julho, que é quando vendemos bem, aí é que eu não durmo mesmo, principalmente na noite de domingo para segunda que é o dia que eu apuro um dinheirinho melhor, e as vezes os bandidos podem pensar que eu estou com ele aqui dentro e podem tentar fazer o mal”, explicou.

Uma outra dificuldade é em relação a ligação de energia. Apesar dos pedidos feitos à companhia de energia, a empresa alega não ser possível fazer a ligação. Procurada, a Equatorial Piauí, distribuidora que atende Teresina, deu esclarecimentos.

Nota De Esclarecimento

A Equatorial Piauí informa que recebeu solicitação de ligação para um ponto comercial ao lado do Troca Troca, no Centro de Teresina. Contudo, ao enviar equipe para execução do serviço, foi identificado que não existia no local um imóvel associado à ligação solicitada e que a conexão com a rede da Equatorial seria para uma derivação da fiação sobre a água para uma barraca instalada na coroa no meio do Rio Parnaíba.

A Distribuidora, então, não realizou a ligação do ponto citado, uma vez que a instalação para a barraca não atende aos critérios técnicos e de segurança, pois a fiação ficaria exposta sobre a água e próxima a uma área com fluxo de embarcações e potencial risco de acidentes.

Vale destacar que ligações de energia elétrica em áreas costeiras e de rios, seguem os critérios da legislação ambiental e de marinha.

Então esse é um dos grandes causadores de prejuízo, pois sem energia elétrica, o casal gasta muito dinheiro com gasolina para o gerador e com gelo para esfriar as bebidas todos os dias, mesmo com pouco movimento.

Durante o período em que a barraca está montada, a família mora naquele local pois o bar também é casa deles.

“Certa vez, um cliente perguntou como é aqui no escuro, aí eu respondi que não tem nada para fazer pois não tem como assistir uma TV. Aproveitamos o tempo livre de outras formas”, relatou Keila Maria Veras.

Apesar das dificuldades, o casal da Jericoroa já presenciou situações inusitadas. Keila contou que houve um período no qual ela estava internada, e o filho, Francisco Pedro, de 11 anos, ligou para ela dizendo “mamãe, os meninos do jet-ski vieram aqui e derrubaram a barraca, a polícia veio também e apreendeu a máquina de música e meu pai foi preso”.

Já dá para imaginar o desespero né?

Mas calma! Seu José não foi preso, apenas a máquina que foi apreendida em razão do barulho. Mas quanto a barraca, essa realmente foi derrubada. Os rapazes que fizeram a proeza são clientes do bar, mas pelo o que nos contaram, as pazes foram feitas e tudo foi resolvido.

José Pinheiro também nos contou uma coisa curiosa: para a montagem da barraca, ele traz material do interior em um caminhão, ao chegar no cais do lado Timon, coloca os materiais na canoa e leva até a coroa. “Até deixar feito desse jeito é confusão! E aqui foi só eu, ela e meu menino que fizemos a barraca neste ano, só nós três! Levou por volta de dois dias para a gente fazer isso aqui sozinhos. Aí depois chega um cliente que pergunta quanto é a cerveja, aí a gente diz que é 10,00, e ainda diz que é caro. Dá raiva... Mas depois que o cliente ‘anestesia o couro da testa’ tudo fica barato e nem ligam mais. (risos)”

E convenhamos, R$ 10,00 é um valor justo levando em conta toda a mão de obra e gastos envolvidos para manter o local. Pelo centro, há vários outros bares que cobram muito mais caro por uma cerveja e nem por isso as pessoas deixam de beber. Além do mais, é uma experiência completamente diferente do que podemos encontrar em Teresina.

Em um determinado momento, perguntamos: “E acidentes? Já ocorreram por aqui?”

O casal respondeu que nunca aconteceu, mas para que para banhar no Rio, basta tomar cuidado e tomar banho apenas na parte rasa. Até onde dá para ver o pé.

Pelo menos eu, Roberta, não sou muito fã de rios. E, curiosamente, apesar de viver numa coroa no meio do rio, seu José também disse que não gosta muito.

Formação das coroas e os cuidados que se deve tomar ao visitá-las

É muito importante nós sabermos como ocorre o surgimento das coroas do Rio Parnaíba, que são os bancos de areia que ficam no leito do rio, e os cuidados que devemos tomar para evitar acidentes.

Conversamos com o Professor do curso de Geografia da UFPI, Lucas Almeida Monte, que explicou para nós sobre a constante interação da natureza e o fenômeno que forma as coroas. Ele esclareceu que os elementos naturais que formam a paisagem, como o rio, solo, vegetação, entre outros, interagem constantemente e há todo instante eles estão ali tendo uma relação de interferência entre um e outro. É uma relação de interdependência, que um depende do outro.

De acordo com o Geógrafo, na natureza também existe um fenômeno chamado intemperismo, que é um processo que acontece principalmente nas formas de relevo e nas rochas, e nada mais é do que o desgaste desses materiais, ou seja, se você tem uma rocha que vai sofrer intemperismo, significa dizer que ela vai ficar toda desgastada.

“O Rio Parnaíba é conhecido por transportar uma grande quantidade de sedimentos, é por isso que ele tem aquela cor mais barrenta, quanto que o Rio Poti é mais esverdeado. Isso acontece porque como o Rio Parnaíba tem muitos sedimentos, ele acaba tendo essa coloração”, explicou.

“Vez ou outra, principalmente nos períodos mais secos, que a gente está vivendo agora, onde nós temos um baixo índice pluviométrico, não chove tanto, e a vazão do Rio Parnaíba fica menor. Com a vazão do rio Parnaíba estando menor, ele não tem forças suficientes para transportar todos esses sedimentos e eles começam acumular no meio do rio, a ponto de formar esses bancos de areia que a gente conhece como coroa”, disse Lucas Almeida.

Lucas comentou ainda que muitas pessoas pensam que a coroa é o fundo do rio que está aparecendo, mas são apenas bancos de areia porque o rio teve essa vazão reduzida devido a quantidade de chuvas que também reduziram. O geógrafo ressaltou também o processo de intemperismo no surgimento das coroas:

“Está vendo como está tudo interligado? O clima está interligado com o rio para poder transportar o sedimento, e quando os sedimentos acumulam formam aqueles bancos de areias que a gente conhece que fica ali no meio do rio. Tudo isso que foi originado lá desde o processo de intemperismo”, explicou.

Há pouco tempo, houve alguns acidentes envolvendo rios no Estado, e por isso nos atentamos para os cuidados que as pessoas devem tomar ao visitar a Jericoroa, visto que as pessoas gostam de tomar banho no rio. Na Jericoroa, como já citado acima, nunca ocorreu afogamentos, mas é importante que os visitantes continuam tendo atenção para que não ocorram situações desagradáveis. O Geógrafo Lucas contou que muitas pessoas insistem ir além do banco de areia, e isso é um fator preocupante:

“Ele pode chegar a ter 7 ou 8 metros de profundidade, ou seja, as pessoas acabam se afogando porque elas caem em um local onde não tem nenhuma sustentação para elas. Então, é muito importante, que as pessoas tenham consciência de não ir nadar em locais que elas não conhecem, tendo em vista principalmente que o Rio Parnaíba tem uma correnteza relativamente forte. Ou seja, mesmo que você saiba nadar, pode acabar se cansando, e se você está cansado, você é arrastado! Então, é um grande perigo”, alertou.

Vamos nos divertir, mas com cuidado se for tomar banho de rio! Convidamos a todos a conhecer a maravilhosa praia de água doce, nossa querida Jericoroa. Ah, e lembramos que, segundo seu Zezinho, a barraca funcionará até este mês de outubro. E acabando o mês, voltarão somente em meados de julho do próximo ano. Garantimos que não irão se arrepender. Aproveita e vai logo conhecer a Jericoroa!

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