Jornal Terceira Via 190

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14 A 20 DE JUNHO DE 2020

MOMENTO CRÍTICO Nome de famoso filme encaixa feito luva à situação atual do Brasil

Bom seria que o título reportasse apenas a ficção cinematográfica, cujo roteiro discorre sobre terroristas que sequestram um Boeing 747, e soldados do Exército americano, liderados pelo agente David Grant (Kurt Russel), com a ajuda da comissária de bordo Jean (Halle Berry), tentam impedi-los. Mas não. A matéria ‘roubou’ o título do filme para expressar a realidade singular ora vivida pelo Brasil, que nas próximas semanas

terá que lidar com limites – questões de alta quatro meses, alimentando uma crise genecomplexidade – definidores ralizada, descomunal, sem de um segundo semestre precedentes e que agora vai Ou o Brasil acha a mola se aproximando de algum dramático e de consequências imprevisíveis ou – como que o levará ao alto ou desfecho – seja este qual for. todos esperamos –, menos Entre ações atrasadas, encara a âncora que caótico e de resultados conerros grotescos e absoluta o prenderá ao fundo trolados. desarmonia, tratou a panPor certo, o Brasil passou demia da Covid-19 como se o primeiro semestre, em especial os últimos não fosse uma pandemia. Criou, não há dú-

vida, cenário cuja narrativa atropela a mais rudimentar noção de bom senso, gerando perplexidade tanto dentro do País como no resto do mundo. Agora, contudo, não há mais tempo. É chegado o momento crítico: o 2º semestre que se avizinha não será parecido com a primeira metade do ano: ou o Brasil acha a mola que o levará ao alto ou encara a âncora que o prenderá ao fundo.

Tinha uma pandemia no caminho

Brasil amarga pior momento em 15 anos

Não se cuida aqui de questão ideológica, ou de política propriamente dita ou, ainda, dos acertos ou erros atribuídos ao presidente Jair Bolsonaro, respectivamente por seus apoiadores e opositores – extensivos aos governadores dos estados. Trata-se de entender que o Brasil vive o momento mais frágil, tenso, inseguro e perigoso dos últimos 25 anos, tendo em vista que num quadro onde já se desenhava fortes pinceladas de insta-

É curioso observar que ante transformações tão profundas, em que o ‘novo normal’ ainda não se mostrou por inteiro, mas as paisagens são outras, os costumes e hábitos tiveram que mudar, o trabalho mudou, estudos foram interrompidos, casamentos adiados, as pessoas quase não se visitam, ninguém viaja e as praias estão fechadas e desertas – e sem a menor ideia,

FHC

bilidade política, surgiu a Covid-19. Simples assim: diante uma pandemia que deveria ser tratada como prioridade e em função da qual todas as diferenças ideológicas, políticas e partidárias precisavam ser jogadas para a lateral – prevalecendo a união dos contrários na luta contra um inimigo comum, potencialmente capaz de produzir uma catástrofe humana para a população brasileira – fez-se o contrário, ampliando-se o cenário perturbador.

Lula

Dilma

também, de quando e como as coisas voltarão à rotina e se no futuro as máscaras poderão ser dobradas e postas num fundo de gaveta... enfim, um estado de coisas inimaginável até três meses, o ‘Brasil-Estado’... digamos assim, o Brasil administrativo e governamental, parece inerte e anestesiado. As autoridades competentes debatem, discutem e questio-

nam, mas não tratam a questão com a devida efetividade, seriedade e celeridade. Enquanto isso, projeções admitem que o País poderá se tornar o de maior número de óbitos pelo novo coronavírus em todo mundo até o final de julho, caso não ocorram mudanças significativas. São, de fato, tempos sombrios: a pandemia de braços dados com a irracionalidade.

Temer

O risco de catástrofe social Não fosse o conjunto de fatores que lança a nau do Brasil em assustadora tormenta e este box teria o título de ‘catástrofe sanitária’ – o que já seria muita coisa. Entretanto, a vulnerabilidade política, econômica e social do País, turbinada por uma discussão ideológica de total inutilidade, deixa o Brasil a poucos passos do abismo. Trata-se de situação da mais alta gravidade. Ninguém escolhe ‘sua’ pandemia, mas a do novo coronavírus veio na pior hora para o Brasil. Com a economia estagnada (o PIB em 2019, apelidado de ‘pibinho’, cresceu frustrantes 1,1% – abaixo dos 1,3% de

2017 do governo Temer) e o governo Bolsonaro fortemente pressionado graças a atitudes, posições, comportamento e falas que agradam seu núcleo de apoiadores mais radicais, porém intranquilizam o restante da população, – o que se via era uma nau à deriva sem a tormenta, quanto mais quando a tempestade chegou; no caso, a pandemia. Jair Bolsonaro foi legitimamente eleito presidente da República. A vontade da maioria é soberana e tem que ser respeitada. Contudo, pulando tudo o que disse em 2019 e nos primeiros meses deste ano (e algumas de suas de-

clarações foram preocupantes) para focar apenas no período do coronavírus, é razoável – pergunta-se – que o presidente tenha fomentado o viés da discórdia que lhe é próprio e elevado o tom da insegurança justamente durante a pandemia? Com ou sem razão, não seria melhor uma trégua? Gabinete do ódio; “quem manda sou eu”; “eu sou a Constituição”; armar a população; manifestações antidemocráticas; sistema próprio de inteligência; desafiar o Supremo ao dizer que “ordens absurdas não se cumprem”; o Planalto retardando as informações sobre o número

de mortes pela Covid e, acima de tudo, demitir o ministro que seguia a orientação da ciência enquanto ele próprio promove aglomerações em frontal desrespeito ao distanciamento social. Não se trata das posições político-ideológicas ou do jeito de ser do presidente, sejam elas adequadas ou não. Do ‘conjunto da obra’ cuidará a eleição de 2022. Trata-se de vidas. De 25 anos para cá, possivelmente FHC enfrentaria uma pandemia com outro tipo de atitude. Lula, mesmo com Mensalão, Petrolão e todo o esquema de corrupção de que foi

acusado, condenado e preso, certamente saberia liderar o Brasil contra a doença. Dilma, responsável por um dos piores governos da história recente – arrogante e politicamente despreparada – até pelo perfil, deixaria a questão na mão de quem entende. Temer – desmascarado pelo áudio nos porões do Jaburu e escândalos de corrupção de toda ordem – mas, de certo, um presidente equilibrado, que buscaria a união contra o inimigo comum. Por fim, neste momento crítico, o Brasil torce para que a sensatez prevaleça e todo o resto fique para depois.


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