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O caminho político de um diplomata e ex-BBB
Rômulo Neves admite que surpreendeu os colegas de Itamaraty ao aceitar participar de um programa popular. Mas sua volta gerou uma curiosidade contida de muitos deles.
Diplomata e ex-BBB, Rômulo Neves não esconde de ninguém que a política está na sua essência. Aliás, foi ela que o fez aceitar o inusitado convite que recebeu para participar do BBB 2017, quando estava a caminho de um jogo de futebol, depois de pensar que era um trote. Topou após concluir que isso poderia ajudar projetar sua imagem e alavancar o objetivo de ser candidato a deputado federal em 2018. Acabou abrindo mão da disputa por motivos pessoais, mas revelou à revista Plano B sua disposição de disputar uma vaga à Câmara dos Deputados no futuro. Por ora, segue na carreira diplomática e escrevendo. Publicou nos últimos anos um livro sobre Política Internacional e, neste ano, seu segundo de poesia. Confira!
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Você já declarou que não assiste o Big Brother Brasil, nem mesmo o que participou em 2017. Como foi parar lá?
Fui abordado na rua, quando estava a caminho de um jogo de futebol. No início achei que fosse alguma brincadeira. Não acreditei nos produtores do programa que me abordaram. Pediram que eu desse o meu telefone, pois o diretor do programa me ligaria alguns dias depois para me convidar para conversar. Ainda pensei em dar meu número errado, mas acabei dando o correto e realmente me telefonaram depois.
Quando cheguei em casa, contei para minha esposa, mas ela também não acreditou. Fui pesquisar sobre os índices de audiência do programa e, como estava preparando minha candidatura a deputado federal às eleições de 2018, decidimos que, se fosse real o convite, eu toparia participar, já que seria uma ótima oportunidade para divulgar meu nome, com efeitos para a campanha.
Nesse aspecto, minha participação foi muito exitosa. Nas primeiras pesquisas para deputado federal no DF, ainda na metade de 2017, cheguei a figurar na terceira colocação – de
8 vagas. As primeiras colocadas naquelas pesquisas realmente foram eleitas: Flávia Arruda e Erika Kokay. Desisti, posteriormente, de concorrer, por razões pessoais e familiares.
Como o Itamaraty e seus colegas de trabalho reagiram quando voltou ao trabalho, depois da eliminação do BBB?
Sei que foi uma grande surpresa para todos. Na grande maioria dos casos de colegas que vieram conversar comigo, com curiosidade, mas de maneira contida. Pois se trata de um programa popular, com muita polêmica.
Houve também muitas críticas, mas nunca fui abordado de maneira crítica abertamente. Os críticos se mantiveram distantes. Voltei, entretanto, para o mesmo setor e para as mesmas funções que tinha antes. Assim, do ponto de vista estritamente profissional, nada foi alterado.
Uma conversa com uma colega me marcou bastante. Ela me disse que minha “coragem” em aceitar participar de um programa popular deixou-a mais à vontade e inspirada para seguir uma via que sempre havia ensaiado, mas nunca havia se aprofundado na vida artística. Hoje está bastante ativa
Que lições o diplomata Rômulo Neves levou dessa inusitada experiência?
Acho que duas específicas, mas de natureza e intensidade diferentes. A primeira, de natureza mais geral, é a de que a indústria de entretenimento é ao mesmo tempo produto e causa de algumas das nossas fragilidades sociais atuais.
O processo de edição, pelo qual passam as imagens e a narrativa do programa, é muito parecido com o processo de edição e divulgação parcial dos discursos e objetivos políticos dos candidatos. A falta de avaliação crítica frente a esses discursos e, com isso, a facilidade com que parte da população cai nessas narrativas ainda me impressiona.
Em segundo lugar, de natureza mais individual, é o conhecimento da estabilidade emocional e mental que consegui atingir. A pressão a que somos submetidos, com a súbita popularidade e visibilidade é descomunal.
Assim, ter tido a tranquilidade de manter o meu passo e os meus planos de longo prazo na mesma toada foi uma conquista, e o reconhecimento dessa minha característica foi um aprendizado.
Como foram suas incursões pela política no DF? Foi chefe de gabinete do ex-governador Rodrigo Rollemberg e candidato a deputado distrital. Pretende participar de outras campanhas?
Me preparei por muitos anos para assumir responsabilidades públicas. A política está na minha essência. Mas não a qualquer preço. Isso me leva a traçar limites aos quais não ultrapasso. Além disso, não tenho parentes políticos, não tenho uma profissão que me coloque junto ao público. Tenho de construir meu caminho devagar.
Sigo atuando nos bastidores, mas certamente devo retornar em algum momento à disputa política no DF. Daqui a alguns anos. Avalio que o Congresso é
Pol Tica
o local onde as disputas políticas devem ser conduzidas, por isso desde a minha primeira candidatura, ainda a distrital, minha avaliação é a de que o meu caminho é a disputa de uma cadeira na Câmara dos Deputados. Quando? Ainda não sei. Por enquanto, cuido da minha família e exerço minha profissão com esmero. Quando chegar a hora, saberei.
Desde 2021 mudou-se para Berlim, onde atua como chefe do Setor de Promoção Comercial na Embaixada Brasileira na Alemanha, qual a imagem que os alemães têm do Brasil e a avaliação deles sobre os acontecimentos ocorridos em Brasília no último dia 8 de janeiro?
Trata-se de uma relação complexa. Ao mesmo tempo em que há muito interesse, especialmente na Amazônia, houve nos últimos anos um distanciamento importante, devido ao discurso que se vinha adotando no país. A eleição do presidente Lula alterou esse quadro, com um interesse crescente do país no Brasil. Para se ter uma ideia, nos primeiros três meses do ano, terá ocorrido mais visitas de alto nível de autoridades alemãs – incluindo o Chanceler (equivalente ao primeiro ministro), o Presidente e o ministro da Economia – do que no total dos dez anos anteriores. Os eventos de 08 de janeiro geraram bastante preocupação, mas a condução da crise pelo Governo Lula gerou, posteriormente, bastante alívio.
Em março, parece que teremos o encontro Brasil/ Alemanha em Belo Horizonte. O que podemos esperar desse encontro após a saída de Jair Bolsonaro e a volta de Lula pela terceira vez?

Como disse, há um movimento muito forte de reaproximação. O próprio ministro da Economia vem para o encontro. Certamente isso vai se traduzir na retomada dos investimentos e do comércio – que caiu bastante nos últimos anos. Não sabemos, entretanto, se essa recuperação conseguirá retomar os números de 2011 a 2013, o pico de nossa relação comercial bilateral, pois o mundo mudou. China, Oriente Médio, África, todos esses lugares aumentaram sua participação no comércio global e a tradicional parceria com países europeus já não ostenta a posição que teve no passado.
Quais são suas expectativas para 2023 para o Brasil e também para Brasília, sua cidade?
Para o Brasil, de modo, geral, imagino que vai ser um ano de reconstrução. O governo começou muito bem, com a formatação de uma frente ampla, com muita gente interessada em retomar as bases da República e da democracia. O problema é que o estrago foi enorme. Alguns amigos que assumiram posições de comando em vários setores afirmam que o termo “terra arrasada” não dá conta de descrever a situação que encontraram depois de 4 anos de desmando. Então, a tarefa não é simples e tomará muito tempo e energia. Em relação ao DF, avalio que seguirá na eterna crise em que se meteu, com equívocos de gestão, há pelo menos 20 anos, inclusive do governo de que eu participei – ainda que tenha havido um esforço descomunal de muitos daquele governo de aprumar as contas públicas. Mas a política local é uma armadilha. Consertar os erros do passado envolve mexer em muitos privilégios e fatos consumados do presente. Muitos interesses cristalizados estão em jogo. Aprumar o estado é contrariar, em muitos aspectos esses interesses. Não é à toa que Rollemberg – com todas as críticas que eu possa ter – não se reelegeu. Muitos interesses foram prejudicados naquele período.