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8. Dissolução e liquidação
Aprovado o relatório da comissão de desmembramento e os projetos de estatutos das novas cooperativas estas são constituídas, procedendo-se as respectivas transferências contábeis e patrimoniais e a averbação na Junta Comercial, visto que a segunda assembleia geral extraordinária funciona como assembleia constitutiva das novas cooperativas (art. 18, § 6º, da lei 5.764/71).
8. Dissolução e liquidação
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A existência legal das sociedades cooperativas tem início com a inscrição dos seus atos constitutivos no registro próprio (art. 45 e 985 do CC c/c art. 18, § 6º da lei 5.764/71), e a sua extinção se dá com o cancelamento do seu registro após o encerramento da fase de liquidação (art. 51 e 1.109 do CC c/c art. 63, parágrafo único, e art. 74 da lei 5.764/71), em decorrência de uma das causas de dissolução da sociedade dos artigos 63 e 64 da lei 5.764/71, além de outras definidas no estatuto social da cooperativa (art. 21, inc. VII da lei 5.764/71). Portanto, a personalização jurídica das cooperativas se inicia com a inscrição dos atos constitutivos na Junta Comercial, e termina com o encerramento da fase de liquidação e posterior cancelamento da sua inscrição, sendo que a
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personalidade jurídica subsiste até que se conclua a liquidação (art. 51, caput, do CC c/c art. 66 da lei 5.764/71). Deste modo, a dissolução por si só não extingue a sociedade cooperativa, apenas inicia a fase de liquidação (art. 65 da lei 5.764/71) ao fim da qual esta se encerra. Para a extinção da cooperativa são necessárias três etapas: a dissolução, a liquidação e a extinção propriamente dita. Isto porque a dissolução é um ato declaratório que inicia a fase de liquidação, que por sua vez conduz ao ato declaratório de encerramento da sociedade, que representa a confirmação do ato de dissolução e aprovação da liquidação. A dissolução pode ser total com a liquidação e a extinção da sociedade ou parcial, que tem amparo no princípio da preservação da empresa e de sua função social, e visa evitar a dissolução e liquidação da cooperativa nos casos em que parte dos associados pretendam a resolução da sociedade. Neste caso, ocorre a resolução da sociedade em relação a um ou alguns associados, desfazendo-se os respectivos vínculos pela exclusão (art. 35, inc. I da lei 5.764/71), podendo-se utilizar o procedimento especial do artigo 599 e seguintes do Código de Processo Civil.
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Pode ser realizada de pleno direito, nas hipóteses do artigo 63 da lei 5.764/71, ou judicialmente quando a dissolução da sociedade não for promovida voluntariamente, hipótese em que a medida poderá ser tomada judicialmente a pedido de qualquer associado ou por iniciativa do órgão executivo federal incumbido de sua fiscalização, ajuizada contra a cooperativa (REsp. 1.653.141/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, julgado em 26/06/2018, DJe 29/06/2018) no foro do lugar da sua sede (art. 53, inc. III, al. a do CPC), e seguirá o procedimento comum do Código de Processo Civil (art. 318 c/c art. 1.046, § 3º). Dissolvida de pleno direito significa que prescinde de prévia declaração judicial, bastando a mera deliberação em assembleia geral extraordinária porque a própria lei enumera as causas de dissolução voluntária. Entretanto, a ocorrência das causas de dissolução podem ser contestadas judicialmente por qualquer associado (art. 1.035 do CC). Dissolve-se de pleno de direito a cooperativa: a) quando assim deliberar a assembleia geral extraordinária (art. 46, inc. IV, da lei 5.764/71), desde que os associados, totalizando o número mínimo de vinte associados (art. 6º, inc. I, da lei 5.764/71), não se disponham a assegurar a sua
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continuidade; b) pelo decurso do prazo de duração; c) pela consecução dos objetivos predeterminados; d) pela redução do número mínimo de associados ou do capital social mínimo se, até a assembleia geral subsequente, realizada em prazo não inferior a 6 (seis) meses, eles não forem restabelecidos; e) pela paralisação de suas atividades por mais de 120 (cento e vinte) dias, quando não ocorrer a intervenção pelo Poder Público, na forma do artigo 93, inciso III, da lei 5.764/71. Como visto no item 7.1 supra a alteração da forma jurídica da sociedade cooperativa não é mais causa de dissolução de pleno direito, uma vez que se admite a operação de transformação em outro tipo societário com a continuidade de suas atividades; e o cancelamento da autorização para funcionar também não é mais causa de dissolução de pleno direito, visto que a partir da Constituição de 1988 (art. 5º, inc. XVIII) não é mais necessária a autorização para o funcionamento das sociedades cooperativas como exigiam os artigos 17 e 18 da lei 5.764/71. A dissolução pelo decurso do prazo de duração pode ser evitada pelos associados que decidirem dar continuidade a sociedade cooperativa, aplicando-se o disposto no inciso I do artigo 1.033 do Código Civil, segundo o qual o vencimento do
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prazo de duração pode ser prorrogado por tempo indeterminado quando vencido este e sem oposição de associado, a sociedade não entrar em liquidação. Portanto, na assembleia os associados podem deliberar pela continuidade da cooperativa, inclusive alterando seu estatuto para modificar o prazo de duração (art. 21, inc. I c/c art. 46, inc. I da lei 5.764/71). A dissolução judicial também pode ocorrer nos casos de anulação da constituição da cooperativa por aplicação do inciso I do artigo 1.034 do Código Civil, sendo que decai em três anos o direito de anular a sua constituição, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação de sua inscrição na Junta Comercial (art. 45, parágrafo único, do CC). Assim como ocorre na falência, é cabível o pedido de restituição de adiantamento de contrato de câmbio formulado por instituição financeira contra sociedade cooperativa em regime de liquidação judicial (STJ, REsp. 1.317.749/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Terceira Turma, julgado em 19/11/2013, DJe 28/11/2013). Quando a dissolução for deliberada pela assembleia geral, esta nomeará um liquidante ou mais dentre os associados (art. 46, inc. IV da lei 5.764/71), podendo a escolha recair em
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pessoa estranha a cooperativa (art. 1.038, caput, do CC), e um Conselho Fiscal de 3 (três) membros para proceder à sua liquidação, podendo, em qualquer época, destituir os liquidantes e os membros do Conselho Fiscal, designando os seus substitutos (art. 65 da lei 5.764/71). A publicação no Diário Oficial da ata da assembleia geral que deliberou a liquidação acarreta a sustação de qualquer ação judicial contra a cooperativa, pelo prazo de 1 (um) ano (STF, RE 232.098/PR, Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgamento em 28/06/05, DJ 26/08/05) prorrogável por no máximo mais um ano (STJ, REsp. 1.833.613/DF, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Terceira Turma, julgado em 17/11/2020, DJe 20/11/2020), sem prejuízo, entretanto, da fluência dos juros legais ou pactuados e seus acessórios, na forma do artigo 76, caput, da lei 5.764/71, permitindo que seja realizado o ativo. O Tribunal Superior do Trabalho possui jurisprudência no sentido de que “a liquidação extrajudicial de sociedade cooperativa não suspende a execução dos créditos trabalhistas existentes contra ela” (OJ nº 53 da SDI-2). Isto porque, a execução trabalhista deve prosseguir perante a Justiça do Trabalho mesmo após a decretação da liquidação extrajudicial,
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visto que não está sujeita a habilitação em liquidação (art. 5º e 29 da lei 6.830 c/c art. 889 da CLT). Da mesma forma, a liquidação extrajudicial da sociedade cooperativa não é causa de suspensão das ações de execução fiscal (art. 187, caput, do CTN e art. 29, caput, da lei 6.830/80), mas os seus atos executórios podem ser suspensos pelo oferecimento de garantia, na forma do artigo 9º da lei 6.830/80. Os liquidantes terão todos os poderes normais de administração podendo praticar atos e operações necessários à realização do ativo e pagamento do passivo (art. 67 da lei 5.764/71), devendo usar a denominação da cooperativa seguida da expressão: “em liquidação”, para todos os atos e operações. As obrigações e as responsabilidades dos liquidantes regem-se pelos preceitos peculiares aos dos administradores da sociedade liquidanda, na forma do artigo 49 da lei 5.764/71. Portanto, a fase de liquidação é o momento em que ocorre a realização do ativo e o pagamento do passivo para que se possa extinguir regularmente a sociedade cooperativa. Respeitados os direitos dos credores preferenciais, o liquidante deve pagar as dívidas sociais proporcionalmente e sem distinção entre vencidas ou não, mas, em relação a estas, com
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desconto (art. 71 da lei 5.764/71 c/c art. 1.106 do CC). A assembleia geral poderá resolver, antes de ultimada a liquidação, mas depois de pagos os credores, que o liquidante faça rateios por antecipação da partilha a medida em que se apurem os haveres sociais (art. 72 da lei 5.764/71). Sem autorização da assembleia não poderá o liquidante gravar de ônus os móveis e imóveis, contrair empréstimos, salvo quando indispensáveis para o pagamento de obrigações inadiáveis, nem prosseguir, embora para facilitar a liquidação, na atividade social (art. 70 da lei 5.764/71), respondendo perante a sociedade quando agir com excesso de poderes.
Conforme determina o artigo 77 da lei 5.764/71, na realização do ativo da sociedade, o liquidante devera mandar avaliar, por avaliadores judiciais ou de Instituições Financeiras Públicas, os bens de sociedade, admitindo-se a dispensa da avaliação nas hipóteses dos incisos I e II, do artigo 871 do Código de Processo Civil; e proceder à venda dos bens necessários ao pagamento do passivo da sociedade, observadas, no que couber, as normas constantes dos artigos 142 da lei 11.101/05.
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No artigo 68 da lei 5.764/71 estão descritas as obrigações do liquidante: a) providenciar o arquivamento, na junta Comercial, da ata da assembleia geral extraordinária em que foi deliberada a liquidação; b) comunicar ao respectivo órgão executivo federal a sua nomeação, fornecendo cópia da ata da assembleia geral que deliberou sobre sua nomeação; c) arrecadar os bens, livros e documentos da sociedade, onde quer que estejam; d) convocar os credores e devedores e promover o levantamento dos créditos e débitos da sociedade; e) proceder nos 15 (quinze) dias seguintes ao de sua investidura e com a assistência, sempre que possível, dos administradores, ao levantamento do inventário e balanço geral do ativo e passivo; f) realizar o ativo social para saldar o passivo e reembolsar os associados de suas quotas-partes, destinando o remanescente, inclusive o dos fundos indivisíveis, ao Tesouro Nacional; g) exigir dos associados a integralização das respectivas quotaspartes do capital social não realizadas, quando o ativo não bastar para solução do passivo; h) fornecer aos credores a relação dos associados, se a sociedade for de responsabilidade ilimitada e se os recursos apurados forem insuficientes para o pagamento das dívidas; i) convocar a assembleia geral a cada 6 (seis) meses ou sempre que necessário para apresentar relatório
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e balanço do estado da liquidação e prestar contas dos atos praticados durante o período anterior; j) apresentar à assembleia geral, finda a liquidação, o respectivo relatório e as contas finais (art. 46, inc. V, da lei 5.764/71); averbar na Junta Comercial a ata da assembleia geral que considerar encerrada a liquidação, na forma do artigo 74 da lei 5.764/71. Embora não conste do artigo 68, também deve o liquidante requerer a declaração de insolvência da cooperativa (art. 1.103, inc. VII, do CC), na forma do artigo 754 e seguintes do CPC/73, quando as dívidas excederem à importância dos bens.
Cumpre ao liquidante promover a responsabilização dos administradores e fiscais da cooperativa quando agirem em violação da lei ou do estatuto social, dentro do prazo prescricional de 3 (três) anos contados da primeira assembleia semestral posterior à violação (art. 206, § 3º, inc. VII, al. c, do CC c/c art. 54 da lei 5.764/71). Eventuais responsabilidades de cooperativas centrais (art. 8º da lei 5.764/71) devem ser apuradas nos limites de suas atribuições legais e regulamentares, tendo em conta que dentre outras funções cabe a elas supervisionar o funcionamento das cooperativas singulares, em especial o cumprimento das
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normas que regem esse sistema, não se imiscuindo na administração das filiadas (STJ, REsp. 1.778.048/MT, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, julgamento em 06/10/2020, DJe 26/11/2020). Solucionado o passivo, reembolsados os cooperados até o valor de suas quotas-partes e encaminhado o remanescente conforme o estatuído, o liquidante deve convocar assembleia geral extraordinária para prestação final de contas (art. 73 da lei 5.764/71), que após aprovadas encerra a fase de liquidação e a sociedade se extingue, devendo a ata da assembleia ser arquivada na Junta Comercial e publicada. O associado discordante da prestação de contas tem o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação da ata, para promover a ação cabível. Encerrada a liquidação, o credor não satisfeito só terá direito a exigir dos associados, individualmente, o pagamento do seu crédito, até o limite da soma por eles recebida em partilha, e a propor contra o liquidante ação de perdas e danos, na forma do artigo 1.110 do Código civil. Além da dissolução voluntária e judicial, também pode ocorrer a liquidação extrajudicial (art. 75 da lei 5.764/71) das cooperativas promovida por iniciativa do respectivo órgão
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executivo federal de fiscalização e controle, que designará o liquidante, e será processada de acordo com a legislação específica e demais disposições regulamentares, desde que a sociedade deixe de oferecer condições operacionais, principalmente por constatada insolvência. No tocante as cooperativas de crédito a liquidação extrajudicial se processa na forma da lei 6.024/74 (art. 1º), sendo que o Superior Tribunal de Justiça possui precedentes no sentido de que os depósitos denominados irregulares passam a integrar a massa em liquidação gerando direito de crédito e não à restituição dos valores depositados, concorrendo o correntista com os demais credores quirografários (REsp. nº 492.956/MG, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, Primeira Turma, julgamento em 06/03/2003, DJ 26/05/2003). Como a liquidação extrajudicial se processa mediante procedimento administrativo instaurado pelo próprio órgão liquidante, deve-se sempre observar os valores e normas fundamentais do processo constantes da Constituição Federal, especialmente os princípios do contraditório e ampla defesa, como garantia a sociedade cooperativa que não sofrerá intervenção indevida do Poder Público.
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