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quanto internacionais. Márcia Sant’anna (2009, p.52) coloca que tal crítica não partiu de discussões europeias ou ocidentais, mas de países, asiáticos ou do chamado Terceiro Mundo à época, apontando que estes possuíam enorme quantidade de expressões de sua cultura que não cabiam ao antigo conceito de patrimônio cultural, assim como de sua relação com o meio ambiente. Como descreve Maria Cecília Londres Fonseca ao comentar o debate que ainda acontecia na conferência de Nara, realizada em 1994, no Japão: a impossibilidade de incluir na lista bens como o Templo de Ise, naquele país (Japão), que é sistematicamente destruído e reconstruído no mesmo local, ou a arquitetura no Norte da África cujas edificações devem ser constantemente refeitas devido à ação do vento, constituía um desafio para o Comitê do Patrimônio Mundial. Nos dois casos, e em outros tantos, a proteção física do bem é inviável, mesmo porque não é esta a lógica de preservação. (FONSECA, 2009, p.72)
Estas críticas abriram caminho às mudanças sobre a noção de patrimônio baseadas na autenticidade e na possibilidade de definição da posse legal da propriedade. Lentamente começa a tornar-se hegemônica a leitura de que a tradicional perspectiva não dá conta da multiplicidade de possibilidades de bens. De diferentes formas, diversos países, assim como a UNESCO, buscaram novas legislações e novos conceitos para o tratamento dos patrimônios culturais. Não menos importante, a ideia de patrimônio cultural da humanidade também passa a ser discutida neste momento, demonstrando outro viés da mudança em curso, já que monumentos históricos e patrimônios culturais remetiam, até então, aos estados nacionais, ou preservados exclusivamente a partir de instituições nacionais. Podemos tomar a Convenção do Patrimônio Mundial e Cultural e Natural da UNESCO, em 1972, como um marco temporal internacional que marca o reconhecimento da necessidade de ampliação da concepção de patrimônio, passando-se à pesquisa e criação de instrumentos de proteção às manifestações populares (SANT’ANNA, 2009, p.53). Da mesma forma a Recomendação sobre a Salvaguarda da Cultura Tradicional e Popular, aprovada pela Conferência Geral da UNESCO, em 1989, indica a necessidade dos países preocuparem-se com as manifestações de caráter popular. Posteriormente, documentos produzidos em diversos países trataram deste tema, destacando-se na França sua política de proteção aos ofícios tradicionais.