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Loucura que só fã entende
A equipe da revista CDM foi atrás de pessoas que não medem esforços para se sentirem mais próximos dos ídolos, sejam eles atores, bandas ou sagas inteiras. Eles se arrependem de algo que fizeram? Pode apostar que não
Por Carolina Mildemberger, Mayara Nascimento, Silvia Tokutsune e Vinicius Cordeiro
N“No meio do caminho, o ônibus quebrou literalmente no meio do deserto de Nevada.” - Thaís Carvalho, estudante.
Todo mundo já teve, tem ou terá sua dose de loucura na vida. Seja pulando de paraquedas, fazendo um mochilão pela Europa com pouquíssimo dinheiro ou agindo de forma que outras pessoas não entendem muito bem para ir à pré-estreia de um filme, homenagear a sua saga predileta, ou ir a um show esperado há anos.
Thaís Carvalho, 21 anos, por exemplo, passou por um perrengue daqueles para ver sua banda do coração pela primeira vez na vida. Se ela faria de novo? Com certeza.
2013 foi um ano especial para todos os fãs da Fall Out Boy, banda de pop-rock formada em 2001, na cidade norte-americana de Chicago. Depois de um hiato (período em que houve uma pausa da banda) de três anos, o quarteto anunciou a volta e um novo CD a ser lançado no mesmo ano. “Em 2013, eu queria viajar para os Estados Unidos para ir para a Warped Tour, mas não tinha qualquer plano concreto ainda”, conta Thaís sobre como toda essa maluquice começou. Depois que os roqueiros quase quebraram a internet com o retorno e a divulgação de uma pequena turnê para promover o novo álbum pelos Estados Unidos, Thaís sabia que aquela era a hora certa de se decidir pela viagem. “Foi o empurrão final”, afirma.
E foi aí que os problemas começaram. Devido à grande demanda, os ingressos para a show em Los Angeles, onde Thaís planejava ir, se esgotaram antes que ela pudesse adquirir o seu. O jeito foi comprar um bilhete para a apresentação em Las Vegas, cidade que fica a aproximadamente 430 quilômetros da metrópole californiana – só que os ingressos também se esgotaram por lá. Thaís acabou comprando por um site de cambistas e pagando o triplo do preço. Para completar, o site não fazia entregas no Brasil e a pessoa que ficou responsável por enviar os suados ingressos para Thaís se atrapalhou nas datas. Resultado: o envelope com as entradas ficou preso na Receita Federal e Thaís só conseguiu colocar as mãos nele duas horas antes de ir para São Paulo, de onde sairia o voo para os Estados Unidos.
E ainda tem mais. Entre voos, escalas, trens, metrôs e quatro dias sem dormir, Thaís ainda pegou um ônibus de Los Angeles a Las Vegas para ir ao show. “Decidi ir de ônibus para ver a paisagem e era uma viagem de seis horas. Então, achei que valia a pena”, conta. Mal sabia que isso iria trazer mais dor de cabeça. Com apenas algumas horas para poder chegar a tempo no show, o ônibus enguiçou. “Tivemos que parar no acostamento umas sete vezes até finalmente chegarmos”, relata. Apenas dez minutos depois de chegar à casa de shows em Las Vegas, Fall Out Boy subiu ao palco e tudo compensou. E foi mesmo uma grande sorte: “Se por um acaso algo no processo tivesse atrasado mais um pouquinho, eu teria perdido o show.”
No entanto, essa não foi a única experiência que Thaís teve nos
Thaís já fez coisas impensáveis para conseguir ir a shows narionais e internacionais.
Estados Unidos. A Vans Warped Tour, festival itinerante de música e motivo pelo qual ela queria viajar primeiramente, ainda estava por vir. “Foi uma das experiências mais legais da minha vida. É aquele tipo de sonho de adolescência que você nunca imagina que vai se realizar, já que desde os 15 anos eu via bandas como Fall Out Boy e Blink 182 falarem desse festival como se fosse a melhor coisa do mundo”, conta animadamente.
As coisas na Warped Tour ficaram um pouco mais “tranquilas”, mas só relativamente. Em cada dia do festival, aproximadamente 90 bandas tocam em diversos palcos das 11 às 21 horas. A parte mais legal, segundo Thaís, é conhecer os músicos em barracas que ficam espalhadas pelo festival, onde as bandas vendem itens de merchandise e marcam sessões de autógrafos e fotos com fãs.
Mãe, eu não sou um trouxa!
Dormir na praça com chuva não poderia ser um desfecho melhor. Pelo menos é isso que Marília da Costa, também com 21 anos e estudante de Design Gráfico, tem a dizer sobre ir até Londres para a pré-estreia de Harry Potter e as Relíquias da Morte Parte II, último filme da saga que começou em 2001 e terminou em 2011, somando oito longas-metragens e legiões de fãs.
Talvez alguns fãs que acompanham a saga desde o comecinho pudessem chamar Marília de poser (termo de denomina pessoas que
se dizem fãs de algo, mas que na verdade só gostam superficialmente), já que, inicialmente, não lia os livros e apenas via os filmes. “Minha mãe até tentou me dar [Harry Potter e ] a Câmara Secreta para ler, mas eu demorei meses e até pulei capítulos”, conta a estudante. Apesar disso, Marília organizava, desde o quarto filme, idas a estreias com os amigos. Essas, é claro, aconteciam aqui mesmo no Brasil. Foi só então, em Harry Potter e o Cálice de Fogo, que Marília começou a leitura das obras de J. K. Rowling. “Quando eu já estava definitivamente viciada, decidi começar a ler os livros. Li o quinto volume em quatro dias, e por aí foi”, relata. É valido comentar que o livro ao qual ela se refere, Harry Potter e a Ordem da Fênix, tem mais de 700 páginas, dependendo
da edição, e é o mais extenso entre os sete tomos da saga.
Voltando para a parte que em Marília teve de dormir na praça, tudo aconteceu no dia 7 de julho de 2011 na Trafalgar Square, no centro de Londres, que apesar de receber esse nome por causa de uma batalha durante as Guerras Napoleônicas, é famosa por ser um ponto turístico obrigatório e por
“Dormi na praça, fiquei 20 horas lá esperando junto com os outros.” Marília da Costa, estudante


arquivo pessoal

Thaís e a banda While She Sleeps na Vans Warped Tour em 2013.
arquivo pessoal
Marília ficou pertinho dos gêmeos James e Oliver Phelps. Felipe mostra suas tatuagens em homenagem a saga Star Wars.
arquivo pessoal
Marília exibe sua coleção de objetos do universo Harry Potter.
crédito: Silvia Tokutsune
receber eventos desse porte. Marília conta que ficou sabendo que um grupo de fãs brasileiros estava organizando uma viagem à capital inglesa para assistir à pré-estreia, assim como eles já haviam feito para outros filmes. “Como era o último filme, eu precisava ir”, enfatiza. Com outras 30 pessoas, a estudante chegou a Londres no dia 6, mas foi imediatamente para a praça, já que o número de pessoas que poderiam ficar nos arredores do ilustre tapete vermelho era limitado. “Dormi na praça, fiquei 20 horas lá esperando junto com os outros. O ônibus de viagem foi para o hotel com as nossas malas e eu só fui vê-las no dia seguinte”, relata Marília. Apesar do esforço, ela conta que valeu a pena. “Consegui ver todos eles de perto, inclusive a J.K. Rowling.”
E até que os pais de Marília levaram toda essa loucura numa boa. “Quando eles viram que eu estava falando sério, eles até me entenderam. Eles sabiam o quanto Harry Potter significava para mim. E, além do mais, fui eu quem paguei a maior parte da viagem.”
Se ela faria isso de novo? “Com certeza. Mesmo com todas as coisas que não estavam previstas, dormir na praça com chuva, por exemplo, foi uma experiência que de certa forma serviu para fechar com chave de ouro a minha história com a saga Harry Potter.”

A força está com você
Felipe Alves tinha apenas 9 anos quando conheceu Star Wars (Guerra nas Estrelas) em 2002, no lançamento do quinto filme da saga, o Episódio II – Ataque dos Clones na ordem cronológica. Agora, com 21 anos e depois de mais alguns episódios, ele reconhece que algumas coisas que fazia naquela época já poderiam ser consideradas vício. “Me pegava citando frases como a clássica do mestre Yoda ‘do or do not, there is no try’ [faça ou não faça, não existe tentar], e trazendo isso como filosofia de vida até hoje.”
Felipe realmente começou cedo. Ele conta que assistia à saga periodicamente e que a cada dez brinquedos que tinha, oito eram relacionados à saga Star Wars. “Reconheci isso como um vício somente depois de mais velho”, admite. A comprovação do vício, no entanto, só veio aos 17 anos, com duas tatuagens de personagens da saga: Darth Vader e mestre Yoda – que basicamente representam o mal e o bem, respectivamente. Quando perguntado sobre o motivo dessa escolha, ele responde: “A ideia foi distinguir os dois lados da Força com personagens marcantes”.
Mas não é tudo felicidade, agulhas e tinta. Felipe diz que as pessoas riram quando ele contou que tinha feito as duas tatuagens. “Não acreditavam que eu chegaria a tal ponto”, conta entre risos. Apesar da incredulidade dos amigos e da família, Felipe tem planos para mais tatuagens no futuro: “Estou com alguns projetos em mente”.
Sobre o impacto que Star Wars teve em sua vida, Felipe conta que, desde criança, tentava manter a calma em diversas situações, lição presente no livro de ensinamentos Jedi, ordem do lado luminoso da Força. “Pensava que não queria chegar a sentir medo, porque o medo me levaria ao lado negro da força”, explica e, logo em seguida, ri. “Idiota, mas me influenciou quando pequeno e isso fez parte da minha formação.”