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Destino Brasil

Imigrantes contam como é viver no nosso país e o que fazem para manter suas tradições mesmo estando fora de seus países

Por Beatriz Pacheco, Gustavo Lavorato, Jhenifer Valentim, Laura Espada e Mariana Papi

Cada um possui a sua história, as suas raízes e as suas tradições. Partir para um lugar distinto daquele em que você nasceu não é tarefa fácil. O Brasil retornou com força total na rota da imigração há pouco tempo, em decorrência do seu crescimento econômico, do setor petroquímico em alta e a chegada de grandes empresas no país. O número é impressionante. Segundo dados do Censo 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia a e Estatística (IBGE), o crescimento de estrangeiros que vivem em terras brasileiras subiu 86,7% em dez anos, onde o Paraná figura em segundo lugar no ranking dos principais destinos. Em Curitiba é possível encontrar gente de qualquer lugar do mundo. No centro da capital paranaense, nos deparamos com libaneses e, com certeza, companheiros sul-americanos. Nos bairros mais afastados, vemos japoneses, coreanos e até árabes, a maioria responsável por comandar cozinhas de requintados restaurantes temáticos da cidade. Também encontramos aqueles estrangeiros que vieram para o Brasil crianças, cresceram aqui e, hoje, não podem deixar de ser considerados um pouquinho brasileiros. Daniela Maccio nasceu em Córdoba, na Argentina, e veio morar no Brasil com poucos anos de idade. Filha de pai argentino e mãe brasileira, a jornalista conta que tem orgulho de ter nascido no nosso país vizinho e que mantêm algumas tradições típicas. “Na minha casa, fala-se o português e espanhol ao mesmo tempo, quase como se fosse o mesmo idioma. Minha mãe aprendeu várias receitas quando morávamos lá, então em cada refeição tem um pouco de Argentina”, diz a jornalista. Daniela conta que não pensa em voltar a morar lá, mas sempre que pode viaja para rever parentes e amigos. “É um lugar que eu amo, com pessoas que eu amo e que me traz muita paz. Que tipo de pessoa eu seria se não amasse meu país?”, afirma. Daniela conta que já sofreu preconceito de diversas formas e que se criou um estigma no Brasil de que argentinos e brasileiros são rivais não apenas no futebol. “Quando era mais nova, me importava mais com criticas e opiniões, mas hoje nem ligo. Tem muita gente ignorante tanto aqui quanto lá”, finaliza. Nos últimos anos uma crise econômica instalou-se na Europa. Por esse motivo, muitos estrangeiros europeus encontraram nos países emergentes, como o Brasil, um lugar para iniciar uma vida nova. O professor Camilo Fama veio da Itália há menos de um ano. Sua vontade de emigrar já era grande desde o início da crise, quando conheceu uma brasileira e acabou se casando com ela. Foi só unir o útil ao agradável e embarcar para o Brasil. Chegando aqui, Fama decidiu preservar, na medida do possível, um

Alice Sakamoto Daniela Maccio

Créditos: arquivo pessoal

“Brasil representa a beleza, tanto o país quanto o povo”

Marcelo White, estudante

pouco da cultura italiana. Passou a participar de um coral italiano e de aulas do idioma em um centro cultural da Itália, localizado no bairro Água Verde, em Curitiba. Ele destaca como é a nova imigração para o Brasil e como está a procura por um novo campo de trabalho “Antigamente, as famílias vinham para o Brasil fugindo de alguma guerra, da fome e também de pestes que dilaceravam certas regiões. Já hoje em dia, os imigrantes que vêm pra cá, são engenheiros, médicos, professores e pessoas mais capacitadas, que vêm com um currículo extenso, procurando novas oportunidades e não somente fugir da fome. Como o brasileiro é muito receptivo, eles conseguem se adaptar com facilidade”, observa Fama. Para os que nasceram aqui, a distância das suas raízes e a falta de contato com a cultura da qual descendem não são motivos que os afastem das suas origens. A família da estudante Alice Sakamoto, como o nome não nega, é de origem japonesa. Os avós da jovem vêm de diferentes regiões do Japão – a família paterna é da Região Norte, enquanto a materna é de Hiroshima –, mas ambos vieram para o Brasil em busca de melhores condições de vida. Mesmo nunca tendo pisado no Oriente, a sansei curitibana revela se identificar muito com a cultura nipônica, até mais do que com a brasileira. Dos costumes e tradições de seus avós, há apenas resquícios na rotina da universitária. A iniciativa de alfabetizar as filhas na língua japonesa foi abandonada pelos seus pais quando sua irmã mais velha começou a confundir o idioma com o português. “O que resistiu [da cultura dos avós] foi o respeito pelo mais velho e a valorização da educação. Acho que, no Brasil, pouco se respeita a experiência dos mais velhos. Aqui ainda há aquela visão de que as gerações antigas e seus costumes estão ultrapassados e que não há nada a ser aproveitado. No mais, nós mantemos alguns costumes somente no ambiente familiar, ainda nos cumprimentamos em japonês: ohayou, oyasuminasai, itekimasu, tadaima, itadakimasu, gotisosama, etc”, explica a estudante. Sobre como se vê hoje, Alice percebe que se tornou mais “certinha do que muitas outras pessoas”, ela se reconhece uma perfeccionista e admite ter dificuldade para trabalhar em grupo. “Tenho muito mais facilidade de me relacionar com os descendentes de japoneses do que com os outros. Até porque já sofri muito preconceito por ser oriental. Muitas vezes escutei nas ruas as pessoas falando com tom de depreciação “arigatô”, “sayonara”, o famoso “abre o olho japonesa” e “mas japonês é tudo igual mesmo”, me chamavam até de “xingling”. Já teve momentos em que o mérito das minhas conquistas não era meu, e sim da minha descendência”, revela a jovem. Tipicamente japonesa? Bom...

Marcelo White

Alice tem olhos rasgados, gosta de ler mangá, assistir animes, filmes e novelas japonesas, mas, no fim, ela é brasileira. Mesmo a vontade de conhecer o Japão não impede que a jovem manifeste admiração pela alegria e hospitalidade do seu povo. “This is Brazil”, afirma com humor Marcelo White, lembrando a frase de Vin Diesel no filme Velozes e Furiosos 5 - Operação Rio (2011). Ele, que agora brinca com a situação e não tem plano nenhum de voltar aos Estados Unidos, teve uma vinda conturbada para cá. Aos 13 anos, teve apenas três dias para arrumar as malas, se despedir dos amigos e viajar. Sua mãe é brasileira, e como trabalha como corretora de imóveis decidiu, em 2009, que seria melhor sair de São Francisco (CA) – lugar onde moravam – e voltar ao Brasil. Preconceito? Nenhum. Marcelo conta que, para fazer amigos aqui, foi fácil. “Sempre tinham festas e comemorações, todo mundo era muito amigável”, lembra. O difícil mesmo foi aprender o idioma. “Conjugação de verbo, artigo, acentos, sotaques... E toda vez que eu trocava de colégio, precisava aprender a maneira como eles falavam. Tantas gírias e maneiras de falar que chega a ser absurdo” observa. “Eu deixei os Estados Unidos nos Estados Unidos. Para mim, aquela vida não existe mais. Parece um sonho”, completa White sobre a relação com sua pátria mãe. Hoje, ele afirma amar o Brasil e ainda destaca: “Brasil representa a beleza, tanto o país quanto o povo”. O caso de Ghislain Mathos é parecido com o de Marcelo. Em 2006, aos 22 anos, ele saiu de Paris e veio para o Brasil. O motivo foi o seu pai, que precisou vir para cá por causa do trabalho. A dificuldade em aprender o novo idioma foi um dos aspectos que mais marcaram. Para poder começar a entender e responder as pessoas, foram seis meses. Hoje, as dificuldades diminuíram, mas ainda existem “Quero melhorar um pouco meu português – escrita e fala –, porque vou estudar Comércio Exterior e preciso estar perfeito”, comenta ele empolgado com o novo desafio que começa no ano que vem. As amizades continuam as mesmas. Mesmo com a distância, Mathos conta que mantém contato com vários de seus amigos franceses. “Sou DJ, então todos os anos eu acabo indo para lá. Alguns amigos até já vieram para cá me visitar”, conta. Apesar de gostar muito do Brasil e entender o país como um lugar de povo aberto e feliz, Mathos aponta um detalhe que deixa a desejar, o preconceito. “No geral, o brasileiro gosta do francês, mas senti preconceito por ser negro”, relata. E é daqui para o mundo. Depois de formado, ele não pretende nem ficar no Brasil, nem voltar para a França. Seu objetivo é ir para algum outro país e tentar se estabelecer profissionalmente. Ghislain Mathos

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