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Profissão: repórter

A reportagem da CDM conversou com alguns dos jornalistas que participam da cobertura da maior investigação política do país, a Operação Lava Jato

Texto: Beatriz Peccin Fotos: Roberto Rohden e Vitor Cruz

“C orre para o aeroporto amigo!” é uma frase dita com frequência aos motoristas de táxi no dia a dia de jornalistas que cobrem eventos fora de suas cidades. Eles estão sempre em trânsito, indo e vindo em busca de novas informações, novos furos, novas descobertas para manter você bem informado.

As rotinas de Felipe Igreja, 27 anos, jornalista da rádio CBN de Brasília; de Ricardo Brandt, 39 anos, jornalista do jornal Estado de São Paulo; de Rafael Coimbra, 45 anos, jornalista da Globo News; de Vladmir Netto, 42 anos, jornalista do Jornal Nacional, da Rede Globo, e de outros profissionais da imprensa não são muito distintas entre si. Eles são repórteres especiais em veículos de comunicação e têm vindo com regularidade a Curitiba, sede da investigação da operação política mais famosa do país. A reportagem da CDM acompanhou a rotina produtiva destes jornalistas durante uma semana intensa para a Operação Lava Jato.

É comum ver nos carros, principalmente na capital paranaense, os adesivos de apoio à operação e ao juiz Sérgio Moro. Para o jornalista Vladimir Netto, que vem com regularidade à cidade, a operação é hoje um motivo de esperança para o brasileiro contra a corrupção.

– Às vezes, as pessoas me param na rua e um dia uma senhora, aqui em Curitiba, me disse: “Você que é o Vladimir ?”. Eu disse: “Sim, pois não ?”. Ela disse: “Muito obrigada pelo o que você está fazendo. Respondi que não estou fazendo nada, que sou apenas um mensageiro, que não era eu quem estava fazendo a mudança. Ela, então, me falou: “Mas eu me emociono quando vejo tudo aquilo na TV, eu já fui vítima da corrupção”. Ela chorou e eu também.

Além da comoção popular e do sentimento de justiça, Vladimir atribui o “sucesso” da operação às ações do juiz, que está encaminhando o caso, Sérgio Moro.

– Devido à maneira que ele conduz o processo – seguindo o que está dito na Constituição – a Lava Jato vai mais longe do que outras operações como essa foram. Com a transparência da operação, a imprensa alimenta a cobertura e conseguimos explicar melhor para a população dando o retrato de toda a investigação e não somente de um determinado ponto de vista, como era antes.

Operação Lava Jato

A operação Lava Jato teve início em 17 de março de 2014, após investigação de denúncia do empresário de Londrina, Hemes Magnus, em 2008 sobre um esquema de lavagem de dinheiro entre o ex-deputado José Janene (Partido Progressista/ Paraná) morto em 2010 e o doleiro Alberto Youssef. Depois da denúncia do empresário, a Polícia Federal colocou os olhos no doleiro e chegou a um outro esquema de Youssef em Brasília, um posto de gasolina na capital federal que servia como ponto de distribuição de proprina à políticos e servidores públicos. Com o início da operação o doleiro, que morava e trabalha em Curitiba, foi preso e depois de um acordo de delação premiada – técnica de investigação legal que consiste na oferta de benefícios pelo Estado àquele que confessar e prestar informações úteis esclarecedora de um fato investigado e criminoso – muitos outros nomes foram envolvidos no maior escândalo de corrupção do país. Atualmente, segundo o MPF são mais de 60 investigados entre parlamentares, ex-executivos de grandes empresas do setor público e empresários das maiores empreiteiras do país. Há investigação sobre esta operação na Justiça Federal do Paraná e no Supremo Tribunal Federal, devido ao envolvimento de parlamentares nos esquemas criminosos.

Corre Corre

A investigação contra a corrupção está balançando o Brasil. Desde de março de 2014 você tem semanalmente notícias sobre a Operação Lava Jato. O trabalho jornalístico de investigação e divulgação das novas apreensões, prisões, delações premiadas, nome de novos investigados e a divulgação de novas quantias desviadas de órgãos públicos é fundamental para o conhecimento e apoio da população à Polícia Federal e à Justiça Federal. Este é o maior trabalho dos jornalistas que vem à cidade cobrir operações e eventos específicos para os grandes veículos de imprensa em que trabalham.

A jornalista paranaense Thaís Skodowski foi correspondente do jornal carioca O Globo sobre a operação e define a Lava Jato como “um prazeroso e cansativo desafio”. Para ela “é muito legal ver seu trabalho na capa de um jornal nacional, é uma responsabilidade enorme para dar todos os dados corretos (e é muita coisa), tentar ser o mais imparcial possíO jornalista da rádio CBN de Brasília Felipe Igreja está na cobertura da operação desde o começo e já veio quatro vezes à Curitiba em 2015, para cobrir a operação. Mesmo não se autodenominando jornalista especializado em política ou na Lava Jato, ele diz ter mais afinidade com o tema e explica que o trabalho não é de um homem só “há outros dois colegas que também dividem o trabalho comigo e contamos com um banco de dados recheado na redação para nos auxiliar neste trabalho”.

O jornalista é calmo e com voz serena em meio à multidão de jornalistas zanzando de um lado para o outro no hall da Justiça Federal. É mais um dia de depoimentos e o repórter tem que entrar ao vivo na programação da rádio a cada meia hora com atualizações sobre o assunto. “A cobertura é densa. Tenho uma mesma rotina. Fico hospedado no mesmo hotel na Praça Osório, e vou do hotel para a Justiça Federal, de lá para a Policia Federal e volto para o hotel” diz o jornalista.

vel, saber lidar com esse momento de Fla-Flu político em que se você escreve sobre a esquerda, a direita acha que você é da direita e vice-versa”.

A importância da cobertura de uma investigação desta proporção e com vários nomes de alto escalão político marca a carreira de todos os jornalistas que estão fazendo parte desta cobertura, seja pela experiência, seja pelo relacionamento com as fontes ou pela dedicação a uma investigação tão notória.

O trabalho é complexo e desafiador até para os mais experientes. “A notícia está nas entrelinhas e você tem que está muito atento. É um trabalho em que você tem de saber tudo o que já aconteceu e tudo que está acontecendo, porque é uma operação muito grande. É uma coisa insana! ”, diz com um sorriso no rosto o repórter Vladimir Netto – que já realizou várias coberturas de investigações políticas entre elas o Mensalão do PT entre 2005 e 2010.

Thaís Skodowski é correspondente do jornal O Globo em Curitiba.

O material produzido durante a CPI é enviado instantaneamente aos veículos de comunicação.

O jornalista Ricardo Brandt cobre a Operação Lava Jato durante a CPI em Curitiba.

Vitor Cruz

Vitor Cruz

O tempo em que os repórteres especiais passam nas cidades realizando a cobertura de uma determinada pauta ou evento é ocupado pelas entrevistas com as fontes e pela apuração dos novos

acontecimentos. O jornalista especializado Ricardo Brandt do jornal paulista O Estado de São Paulo está fazendo parte , nesta cobertura, da equipe do Blog do Fausto – blog no canal online do jornal especializado em investigações políticas. Ricardo conta que sua rotina como repórter especial é “a cada hora (nós) estamos em uma cidade. Como fico para fazer coberturas especiais, fico muito no hotel, nos locais em que acontecem as investigações e depoimentos, e entre entrevistas com fontes e amigos jornalistas. Não curto a cidade. Fui ao museu (MON) em Curitiba quando levaram as obras apreendidas pela operação”.

A realidade de pressa e agitação é comum para todos os jornalistas. Rafael Coimbra é repórter do canal Globo News há 18 ano e cobriu golpe de estado, Copa do Mundo, eleição americana entre outras reportagens especiais. Hoje está cobrindo a Lava Jato e revezando com alguns colegas de emissora. Rafael é um jornalista multitarefa e por isso sua “equipe” é menor que as demais equipes de TV. Ele conta com a ajuda de seu operador de câmera para fazer as entradas ao vivo na programação do canal informativo. “Tenho uma relação constantecom a minha redação. Eu passo as novas informações daqui e eles me fornecem outras de lá”, diz. Unidos Venceremos

O ambiente de maior concentração de jornalistas por metro quadrado foi a CPI (Constituição Parlamentar de Inquérito).

Nessas horas, o ambiente entre os jornalistas é silencioso, a não ser pelo barulho do teclar sem parar no notebook. Às vezes se ouve um pedido de licença para correr atrás do sinal de internet ou de uma declaração do advogado do investigado que acabou de sair sob escolta policial. Às vezes, é para dar uma corridinha ao toalete ou comer um pacote de biscoito, porque já são quase quatro horas da tarde e ainda não houve intervalo entre as sessões.

O trabalho em equipe dos jornalistas sempre foi comum, mas o acolhimento e compartilhamento de informações factuais surpreende Christianne Machiavelli, assessora de imprensa da Justiça Federal.

– Temos um grupo no whatsapp com quase 50 jornalistas e meu telefone apita o dia inteiro. Ali, eu e eles compartilhamos áudios de advogados, mudança de horários de CPIs, reuniões e coletivas. Mesmo em veículos concorrentes eles sempre acabam se ajudando e trabalhando em conjunto – diz ela.

O jornalista especializado do Estadão chega com um sorriso tímido, cumprimenta alguns colegas e senta ao fundo junto à colega Julia Affonso. A colega é parceira de Fausto Macedo e, junto com Ricardo, auxilia na produção do

“O almoço de domingo é sempre uma reunião de

pauta.” - Vladimir Netto, repórter

Curitiba

A grande cobertura de investigação política dos últimos anos acontece na nossa cidade. Para o jornalista do Jornal Nacional, este fato contribui muito para a idoneidade do processo: – Quando eu cheguei na Lava Jato, eu imaginei que era apenas mais uma operação. Eu me surpreendi! A Lava Jato é uma operação diferente das outras. Eu cobri muitas investigações que iam do início espetacular ao fim melancólico. Em Curitiba, eu percebi que ela ia mais longe. O fato de ser aqui no Paraná é crucial para o sucesso da Lava Jato. Se fosse realizada em outro estado, ela não teria esse alcance e não teria sido feita desta maneira, diz Vladimir Netto.

Blog do Fausto. Brandt mantém contato diário com o jornalista Fausto Macedo – cujo o blog leva o seu nome – para a apuração de informações e produção de notícias sobre as novidades na Lava Jato. “Há uma equipe dentro do jornal que só faz a Lava Jato. Eu e o Fausto, por exemplo, ficamos trocando figurinha o tempo inteiro”, comenta Ricardo.

De Família

Vladimir Netto é daqueles jornalistas que inspiram qualquer estudante de Jornalismo. Talvez seja pela criação – ele é filho de Miriam Leitão e Marcelo Netto – ou pelo interesse de desvendar os mistérios e contar uma boa história. Ele percebe essa investigação como diferente de todas que já cobriu, e coloca a Lava Jato como a mais importante realizada até agora

– Às vezes, faço uma comparação um pouco imprecisa, mas que gosto: É como se o Mensalão fosso o plano cruzado – a primeira tentativa mais forte de estabilização da economia brasileira -, e a Lava Jato, o plano real – uma lição que funcionou. Porque, as lições que foram apreendidas no plano cruzado foram aplicadas no plano real. Assim como as lições que foram apreendidas no Mensalão foram aplicadas na Lava Jato.

A família é cheia de jornalistas consagrados no país. Por estar cobrindo a operação na cidade, nos momentos em família também também surge comentários sobre a Lava Jato: “O almoço de domingo é sempre uma reunião de pauta”, revela.

O repórter Vladimir Netto vem ã cidade para a cobertura pol[itica e diz gostar muito de curitiba.

Roberto Rohden

Internacional

Segundo a assessoria da Justiça Federal, há 64 veículos de comunicação (entre veículos de distribuição local, nacional e internacional) realizando a cobertura da Lava Jato. Veículos como Wall Street Jornal, New York Times, Der Spiegel e as agências internacionais Agência France Press e Reuters.

O correspondente alemão Jens Glüsing mora há 24 anos no Rio de Janeiro. Em reportagem especial para a revista alemã, o jornalista veio a Curitiba para estudar a Lava Jato. “Para mim, é a cidade mais europeia do Brasil, e o tempo chuvoso e as temperaturas amenas que peguei na última vez que vim me lembrou bastante da minha cidade, Hamburgo”. O jornalista, que recebeu o maior prêmio de jornalismo, O Embratel, na categoria correspondente em 2005, alerta para a visão mundial sobre o Brasil: “A operação Lava Jato deixa uma imagem boa, porque mostra que pelo menos esta parte do judiciário está funcionando. Por outro lado, a crise e o escândalo em geral, deixam uma impressão muito ruim no exterior”, relata.

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