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Tsion no deserto
Rabino Benjie Gruber
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Oque levou jovens judeus Reformistas norte-americanos, britânicos e sul-africanos a, nas décadas de 1970 e 1980, se mudarem para o fim do mundo, ou seja, para os confins do deserto, na escaldante região de Aravá 1 , deixando para trás confortáveis vidas de primeiro mundo, além de famílias e amigos?
O título deste meu pequeno artigo é retirado de um livro escrito pelo professor William Miles, onde ele explora as questões da identidade dos judeus que vivem nos dois únicos Kibutzim Reformistas do mundo: Yahel e Lotan.
Eu trabalho como rabino no Kibutz Yahel e na região de Aravá há quase dez anos. Vivi com minha família em Yahel por seis anos e estou lá toda semana servindo como rabino. Eu também ensino em Lotan e sou chamado para realizar cerimônias (casamentos, bnei mitsvá 2 e funerais) e dar aulas sobre assuntos judaicos. Eu amo meu trabalho. Eu transito em comunidades diferentes, todas elas procurando definir sua identidade israelense judaica no século XXI.
Yahel e Lotan são únicos nesta área, uma vez que ambos foram fundados como Kibutzim Reformistas, ou seja, combinando a ideologia do movimento kibutziano e a ideologia do movimento reformista. Yahel foi fundado em 1976 e Lotan, seu irmão mais novo, em 1982. Os fundadores das duas comunidades escolheram viver numa parte essencialmente secular de Israel, onde a maioria dos habitantes da área realmente não entendiam o que eram esses dois kibutzim “religiosos reformistas”. Na região, apenas os habitantes do Kibutz Keturá, afiliado ao movimento Masorti – Conservador – de Israel, os entendiam.
Contudo, tudo o que os fundadores fizeram foi forjar uma nova maneira de viver, celebrar e explorar sua identidade e prática judaico-israelense, ao mesmo tempo em que viviam o Sionismo no dia a dia, construindo uma sociedade democrática dentro do democrático Estado de Israel.
À esq., Kibutz Lotan; no meio e à dir., Kibutz Yahel.
Esses jovens pioneiros foram inspirados por rabinos e líderes em suas comunidades e pela vida comunitária dos acampamentos de verão do Movimento Reformista.
Um dos membros fundadores de Yahel que ainda vive lá, sendo atualmente um avô orgulhoso, disse-me: “Eu amava o acampamento de verão do Movimento Reformista e queria morar lá o ano todo, então fundamos um Kibutz Reformista”. Isso significa, entre outras coisas, que oramos juntos na noite de sexta-feira e depois fazemos um jantar de shabat comunal e sempre analisamos os textos judaicos nos processos de tomada de decisões.
Yahel e Lotan têm sinagogas e têm serviços regulares para o shabat e chaguim. A maioria dos outros kibutzim na região de Aravá não tem sinagogas, mas ainda assim eles também celebram o judaísmo à sua maneira.
O Kibutz Yotvatá constrói a maior sucá do Oriente Médio e organiza um seder de Pessach para 900 pessoas, usando uma Hagadá escrita por seus membros. Contudo, Yotvatá se classifica como sendo um kibutz secular.
Nesse sentido, a vida judaica israelense parece ser confusa e é muitas vezes incompreensível para um judeu da Diáspora, que está acostumado a celebrar seu judaísmo numa sinagoga ou centro comunitário.
Em Yahel e Lotan falamos de Deus e Torá e Judaísmo e Ecologia e seu lugar na tradição judaica. Temos serviços de oração regulares e dizemos Birkat Hamazon no início e no final de todas as refeições. O aspecto religioso está na agenda e é claro para todos. A questão de como viver uma vida reformista, comunitária, ecológica, judaica e democrática não tem uma única resposta. Além disso, as respostas que eram verdadeiras, pelo menos parcialmente, nas décadas de 1970 e 1980 podem não mais ser viáveis para hoje.
Também tentamos incorporar os ideais da Reforma Judaica no nosso dia a dia fora da sinagoga. Questões finan


ceiras, comunitárias e outras podem e devem ser consideradas sob uma perspectiva reformista. Celebramos todos os feriados de forma criativa e kibutziana, contando sempre com ampla participação. Um dos destaques do ano é a cerimônia de Shavuot, que ainda é celebrada na maioria dos kibutzim. Em Yahel e Lotan, além desta cerimônia no estilo kibutziano, também celebramos o recebimento da Torá e temos uma sessão de estudo tarde da noite – Tikun Leil Shavuot.
Algumas das crianças que nasceram no kibutz estão se casando e tendo filhos. Alguns deles voltaram a morar no kibutz. Estamos agora perto de uma nova geração de crianças bar e bat mitzvá nos anos que estão por vir.
Ambos os kibutzim têm diretorias e comitês muito ativos, que cuidam inclusive dos negócios de propriedade conjunta – agricultura, turismo e indústria.
Neste ano em Yahel concluiu-se a construção de várias casas novas e se realizaram as obras de expansão em outras tantas casas, num projeto de expansão previsto para 2017- 2019. Isto aconteceu depois de muitos anos sem crescimento populacional. Estas obras demonstram a expansão da população e também a procura do kibutz por novas pessoas dispostas a integrar a comunidade.
Ambos, Yahel e Lotan, estão neste momento testando novos e diferentes modelos de associação, para integrar os que os procuram da melhor forma possível.
A Torá, nos é dito em nossa tradição, foi entregue no deserto, e, como qualquer coisa no judaísmo, temos mais de uma explicação dos motivos para isto. A minha explicação favorita para o fato de o povo de Israel ter recebido a Torá no deserto é sobre sua propriedade. Quem possui a Torá? Quem é dono do judaísmo? Desde o deserto não pertence a ninguém. A Torá foi dada lá para demonstrar que ela também não é exclusiva de ninguém. Que ela
pertence a qualquer pessoa que esteja disTentamos incorporar em um de nossos kibutzim reformistas. posta a investir tempo e energia em estudá-la e vivê-la. O povo de Yahel e Lotan (e os outros os ideais da Reforma Judaica no nosso dia Israel e Brasil estão trabalhando juntos para lidar com a sustentabilidade de áreas áridas. O CfCE tem o prazer de rekibutzim na região de Aravá), fundadoa dia fora da sinagoga. ceber os brasileiros do projeto do The res e recém-chegados, decidiram possuir Questões financeiras, World Tour Israel, “Gira Mundo Israel”. a Torá, possuir a terra, possuir a tradição comunitárias e outras A Volunteers World Brazil (VWB) está se pelo trabalho duro e grandes esforços. Temos responsabilidade com a terra em que vivemos e na criatividade. podem e devem ser consideradas sob uma preparando para receber 20 professores da Rede de Ensino do Estado da Paraíba, que atuam no semiárido.
Criatividade é o segredo para o sucesperspectiva reformista. O CfCE vai capacitar professores do so no mundo moderno. O Centro KibBrasil com seu emblemático programa butz Lotan de Ecologia Criativa (CfCE) explora caminhos Green Apprenticeship (Aprendizagem Verde), com durade engajamento em ações para a sustentabilidade ambienção de quatro semanas, numa versão especialmente adaptal e a justiça social. Visa construir comunidades e organitada para as características específicas da Paraíba. zações saudáveis. O Green Apprenticeship é um programa de treinamen
A maioria das comunidades na região de Aravá é baseato prático com palestras teóricas e práticas. Ele inclui tóda na agricultura. Este nunca foi um modo de vida fácil e picos como técnicas de design de permacultura, engenhacontinua não sendo, principalmente no deserto! Para viria sustentável, agricultura orgânica sustentável, projetos e ver no deserto você deve, antes de tudo, ser um otimista. técnicas de construção naturais e com eficiência energétiAcredito que isso seja verdade em qualquer outro lugar em ca. Também lida com design de sistemas e vida cooperaIsrael, mas aqui esta necessidade é mais aguda. Você pretiva, pesquisando o design, a construção e a execução de cisa confiar em seus vizinhos para assistência e apoio. Afiprojetos sustentáveis, ligando os aspectos ecológicos, sonal das contas, quase todos aqui vivem longe de sua famíciais, econômicos e culturais a um todo unificado. Prevê o lia. São 4 a 5 horas de carro até Tel Aviv ou Jerusalém. Esdesenvolvimento de habilidades através de trabalho prátitamos longe de todos! As 12 comunidades de Aravá têm co em nosso centro de educação ambiental, hortas orgânipopulação total de apenas 4.500 pessoas (incluíndo as 250 cas e projetos alternativos de construção natural. de Yahel e as 200 de Lotan). Quando judeus e não judeus de Israel e do mundo
Enquanto escrevo este pequeno artigo, penso também constroem juntos, eu sinto e acredito que não só teremos em pessoas que não moram a 4-5 horas de viagem de carprojetos sustentáveis, mas também sociedades sustentáveis ro, mas a quase 24 horas de viagem porta a porta, entre que oram e agem diariamente para aprimorar o mundo Brasil e Israel, enfrentando a segurança de aeroportos, a em que vivemos. chatice da espera em escalas e voos frequentemente abarO Estado de Israel tem 70 anos e os Kibutzim Reformisrotados e desconfortáveis. E, então, me sinto abençoado tas, em torno de 50. Em termos de história judaica, 40, 50, por fazer parte do esforço Reformador / Judaico / Sionis60, 70 anos é um quase nada. Às vezes, muitos anos são desta / Democrata para criar Tsion no deserto. Eu sou um recritos na Bíblia em um ou dois versos, se é que o são. Mas cém-chegado. Estou aqui no deserto há meros dez anos, nossa tradição de 4.000 anos está florescendo no deserto e seguindo os passos daqueles fundadores, que continuam em todo o mundo. Que possamos continuar a ser criativos, tão empolgados como estavam antes do sonho que viviam curiosos e dispostos a aprender uns com os outros. ter se tornado realidade. E a vida com entusiasmo criativo e empolgação pelos resultados (mesmo os mais pequenos) Notas é a maior benção de todas. 1 A Aravá é a parte sul do deserto do Neguev, em Israel.
Como este artigo será lido por judeus e não judeus bra2 Bnei é o plural de bar e bat mitsvá. sileiros, eu gostaria de terminá-lo contando sobre a colaboração entre Israel e o Brasil, que está acontecendo aqui Benjie Gruber é rabino e serve na região de Aravá, em Israel
