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Shira Pruce

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Any Dana

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mulheres do muro: a missão, a história e a evolução

shira Pruce

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Missão

Mulheres do Muro é um fenômeno judaico internacional. Há quase 25 anos Mulheres do Muro vem trabalhando com o objetivo central de conseguir o reconhecimento do nosso direito social e legal de, enquanto mulheres, usar talitot (xales de oração), rezar e ler a Torá coletivamente e em voz alta no Muro das Lamentações (Kotel Hamaaravi).

História

Quando o Kotel foi liberado ao final da Guerra dos Seis Dias em junho de 1967, os paraquedistas israelenses tornaram o acesso ao muro livre para todo o povo judeu, no mundo todo.

No dia 1o de dezembro de 1988 um grupo de aproximadamente setenta mulheres, reformistas, conservadoras e ortodoxas, aproximou-se do Kotel em Jerusalém levando um Sefer Torá (rolo com o texto da Torá) para realizar um serviço religioso haláchico (de acordo com a lei judaica) só de mulheres.

Até aquele momento não havia nada formalmente previsto ou estabelecido sobre a leitura da Torá na parte do Kotel reservada para as mulheres; assim, elas trouxeram um Sefer Torá, ficaram juntas e rezaram em voz alta (umas tantas dentre nós usaram talitot – xales de oração).

Muitas mulheres e homens do outro lado da mechitzá (a barreira que separa os homens das mulheres em algumas sinagogas ortodoxas) começaram a Há 25 anos sofremos perseguição e intolerância oriunda de uma parte dos espectadores que frequentam o Kotel. Mas desde o ano passado, nós, as Mulheres do Muro, passamos a sofrer protestos violentos a cada Rosh Chodesh, quando chegamos para rezar.

As fotografias deste artigo são do acervo do movimento Mulheres do Muro.

Mais de duzentas mulheres de todo o mundo rezam regularmente no Muro em Rosh Chodesh.

gritar, praguejar e até a ameaçar o nosso grupo enquanto rezávamos.

Não obstante o que se passava, aquelas mulheres conseguiram completar a sua leitura da Torá. O administrador do Kotel naquela ocasião, o rabino Yehuda Gertz, permitiu que elas dessem continuidade ao serviço religioso, declarando expressamente que elas não estavam violando halachá.

Há 25 anos sofremos perseguição e intolerância oriunda de uma parte dos espectadores que frequentam o Kotel. Mas desde o ano passado, nós, as Mulheres do Muro, passamos a sofrer protestos violentos a cada Rosh Chodesh (o novo mês judaico), quando chegamos para rezar.

E como se isto não bastasse, o administrador do Kotel e a liderança charedi (ultraortodoxa) não somente nada fizeram para deter o sinat hinam (ódio gratuito) e a profanação daquele lugar sagrado, como também apoiaram e participaram do processo.

O comportamento deles choca o mundo judaico.

A desigualdade das mulheres no Muro Ocidental, um lugar sagrado e público em Jerusalém, e o mais sagrado dos lugares para a visitação dos judeus, galvanizou o judaísmo mundial. Mulheres do Muro conta com mais de cinquenta mil ativistas espalhados pelo mundo, organizando eventos de solidariedade e campanhas on-line para manter as orações de mulheres no Kotel. Regularmente mais de duzentas mulheres de todo o mundo rezam conosco naquele lugar sagrado em Rosh Chodesh. Muitos homens as acompanham, apoiando do lado de lá da mechitzá.

Alguns anos atrás, o Mulheres do Muro era praticamente desconhecido em Israel, e aqueles que conheciam o nosso trabalho pensavam que não passávamos de um grupelho de imigrantes feministas e extremistas. Porém, um estudo recente feito pelo Instituto de Democracia Israel (IDI) demonstra um progresso extraordinário na opinião pública israelense: 63.5% dos israelenses que se identificam como seculares apoiam o Mulheres do Muro, assim como 53% daqueles que se definem como tradicionais,

mas não religiosos. Considerando todos os grupos, 51.5% dos homens entrevistados e 46% das mulheres apoiam as iniciativas do Mulheres do Muro.1

Vem de longe e tem se mostrado dura a luta judicial do Mulheres do Muro. Até bem recentemente o status quo do Muro Ocidental era o reinado do rabino ultraortodoxo Shmuel Rabinowitz, nomeado autoridade dos lugares sagrados e presidente da Fundação Herança do Muro Ocidental. Uma decisão da Suprema Corte emitida em 2003 foi interpretada pela polícia e por Rabinowitz como definindo o costume local do Kotel da seguinte maneira: os homens ficam livres para rezar conforme quiserem, mas, para as mulheres, as orações deveriam ficar limitadas a um som que não fosse superior a um sussurro, sem xales de oração, nada de filactérios (tefilin) ou de rolos de Torá. A desigualdade das O Mulheres do Muro, seus advogados mulheres no Muro Ocidental, um lugar e outros especialistas legais discordaram e mantiveram que as mulheres tinham o direito de rezar livremente na seção das sagrado e público em mulheres naquele lugar público e sagrado. Jerusalém, e o mais No período compreendido entre 2010 sagrado dos lugares e 2013 ocorreram mais de cinquenta depara a visitação dos tenções e prisões de mulheres por rezarem em voz alta usando talitot no Kotel. A vijudeus, galvanizou são de policiais prendendo mulheres eno judaísmo mundial. quanto rezavam tornou-se constante toMulheres do Muro conta dos os meses e judeus do mundo todo se com mais de cinquenta ergueram revoltados contra este ultraje. mil ativistas espalhados No dia 25 de abril de 2013, reagindo contra a prisão de cinco mulheres usando pelo mundo. talitot, o juiz Sobel, do Tribunal Distrital de Jerusalém, determinou que as orações das Mulheres do Muro não desrespeitavam a lei e nem perturbavam a paz. Esta decisão finalmente possibilitou que as mulheres

As mulheres têm o direito de rezar livremente neste lugar público e sagrado.

rezassem no Kotel em voz alta, colocando tefilin e usando talitot. Infelizmente a Torá ainda continua banida da seção das mulheres, por conta de uma portaria do rabino Rabinowitz.

Desde que esta portaria foi baixada, todas as vezes que o grupo de cerca de duzentas mulheres se reúne para rezar ocorrem violentos protestos no Kotel e nem Rabinowitz e nem a liderança ultraortodoxa fazem coisa alguma para deter este ódio insensato e a profanação do lugar sagrado.

Os manifestantes gritam, cospem, fazem apitaços, jogam ovos e lixo, usam alto-falantes para abafar o som das nossas orações. O mundo judaico se mostra chocado por este comportamento que, mesmo assim, continua a acontecer.

Evolução

Conseguimos nos fazer ouvir quando ganhamos o apoio de judeus em Israel e na Diáspora.

Em Rosh Chodesh Kislev, 4 de novembro de 2013, rezaremos2 na seção de mulheres do Kotel com centenas de nossas irmãs comemorando a celebração do 25o aniversário da fundação do Mulheres do Muro e a possibilidade de concretização do nosso sonho de conquista ao direito de proferir orações completas pelas mulheres no Kotel.

Pois, pela primeira vez em vinte e cinco anos de oração e de luta pela inclusão, o primeiro-ministro de Israel se aproximou da liderança do Mulheres do Muro com

No dia 25 de abril o objetivo de propiciar justiça duradoura de 2013, reagindo contra a prisão de no Muro das Lamentações. Fomos convidadas a acrescentar nossa voz ao processo decisório que formatará o futuro para cinco mulheres usando o Kotel. talitot, o juiz Sobel, do O primeiro-ministro pediu ao presi-

Tribunal Distrital de dente do executivo da Agência Judaica, Jerusalém, determinou Natan Sharansky, que apresentasse uma solução justa à questão e Sharansky proque as orações das pôs a divisão da esplanada do Kotel em Mulheres do Muro não três áreas: uma exclusivamente masculidesrespeitavam a lei e na, uma exclusivamente feminina e uma nem perturbavam a paz. igualitária.3 Não é a decisão que ansiávamos, pois as mulheres ortodoxas do Mulheres do Muro querem ter o direito de ler a Torá e rezar conforme a halachá publicamente num ambiente exclusivamente feminino. Contudo, não poderíamos, em sã consciência e depois de vinte e cinco anos fazendo lobby junto ao governo e à sociedade israelense para que ouçam as nossas vozes, recusar a oportunidade de dialogar diretamente com o governo quando ela nos é oferecida. Assim que, sem perder de vista a sua responsabilidade de concretizar todas as oportunidades significativas de realização dos nossos objetivos, a nossa direção decidiu recentemente compilar uma lista de demandas a ser entregue ao primeiro-ministro – são as exigências indispensáveis para a existência de uma terceira seção igualitária e pluralista do Muro.4 Esta nova seção deve ser igual a dos homens e das mu-

As Mulheres do Muro querem uma seção igualitária e pluralista no Muro.

lheres em extensão, orçamento e topografia. Deve permitir orações igualitárias, mas também ter uma divisão para permitir liberdade a quem procure orações exclusivamente para mulheres.

Esta nova seção, em oposição ao que ocorre agora, não seria administrada pelo rabino Rabinowitz. A gestão da seção pluralista caberia a um grupo de líderes de todas as denominações judaicas, com 50% de participação do Mulheres do Muro.

Esta nossa decisão não está sendo muito bem aceita por alguns dos grupos que nos apoiam. Assim como nós, sentem-se decepcionados por verem que o governo israelense optou por não contestar os administradores ultraortodoxos do monumento nacional e local sagrado mais importante do país.

O momento também não é o ideal, já que estamos a poucas semanas das celebrações do nosso 25o aniversário, mas o convite nos chegou em meados de setembro de 2013, e o prazo para respondermos ao convite do primeiro-ministro estava muito próximo.

Contudo, conforme expliquei, resolvemos não desperdiçar a oportunidade.

Por enquanto, esta nova seção continua sendo um sonho e assim o será até que o último tijolo seja colocado e a última exigência tenha sido satisfeita. Enquanto isso, continuaremos firmes em nossas orações, na seção de mulheres no Kotel, como é nosso direito.

Olhando para o futuro, vamos nos assegurar de que as mulheres sejam capazes de rezar no Kotel, quer na seção das mulheres quer na nova seção pluralista, quando esta estiver funcionando de acordo com as nossas exigências.

Graças aos muitos milhares de pessoas que nos apoiam incansavelmente, tanto em Israel como na Dispersão, estamos tendo a oportunidade de chegar perto da concretização do nosso sonho e continuar a lutar pela nossa imutável missão.

Notas da redação

1. Leiam sobre esta enquete em: http://en.idi.org.il/analysis/articles/israeli-public-opinion-on-the-women-of-the-wall. 2. Este texto foi escrito em final de outubro de 2013. 3. Leiam a entrevista de Natan Sharansky na Devarim 21. O acesso pode ser feito pela biblioteca eletrônica da revista em www.devarim.com.br. 4. Leiam a matéria http://www.timesofisrael.com/women-of-the-wall-issue-demands-that-could-take-years-to-meet/.

Shira Pruce é diretora de Relações Públicas e Desenvolvimento do Mulheres do Muro. Trabalhou anteriormente em prol do incremento das mudanças sociais em Israel no Centro de Apoio às Vítimas de Violência e Ataque Sexual do Negev, no Portas Abertas do Orgulho e Tolerância de Jerusalém, na World Union for Progressive Judaism e no Knesset. Antes de fazer aliá em 2004, concluiu o Mestrado em Estudos sobre Mulheres e Gêneros na Universidade Rutgers em New Jersey, Estados Unidos.

Traduzido do inglês por Teresa Cetin Roth.

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