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Mohammad Darawshe
as iniciativas do fundo aBraão
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mohammad darawshe
De uma forma um tanto indelicada, o público de Israel foi despertado para a realidade em maio deste ano, quando se tornou pública a recusa do maior parque de diversões de Israel, o Superland, de vender ingressos para um professor árabe que tentava organizar um passeio de final de ano com seus alunos.
Ao ligar para o escritório do Superland a fim de reservar os ingressos disseram a ele que não havia disponibilidade para a data pretendida. No entanto, desconfiado daquela informação, ele tornou a ligar, passando-se desta vez por um professor de uma escola judaica e dando um nome judeu. Não é que de repente havia ingressos disponíveis para a data?!
Na explicação sobre o acontecimento, a direção do Superland informou que ao final do ano letivo faz reservas em dias separados para as escolas árabes e para as escolas judias. Alegou também que eles fazem isto a pedido tanto de professores árabes como de professores judeus.
Muito embora alguns membros do Knesset tenham se manifestado veementemente contra este incidente, a verdade é que, infelizmente, dadas as circunstâncias em Israel, este episódio não chega a ser surpreendente.
No cerne de muitos dos desafios domésticos de Israel encontramos a divisão societária e o desassossego interno entre as populações judia e árabe. Apesar de compartilharem um Estado, os israelenses judeus e árabes ainda estão divididos por seus respectivos idiomas, religião, cultura e história. As relações são relativamente pacíficas na maior parte do tempo, porém são ocasionalmente marcadas por hostilidade e erupções de violência. Esta divisão traz ramificações negativas para a sociedade israelense de modo geral e alimenta o antigo preconceito contra o setor árabe.
O Fundo Abraão trabalha desde 1989 para promover a coexistência e a igualdade entre os cidadãos judeus e árabes de Israel.
Muitos setores da sociedade israelense vêm reconhecendo gradativamente a existência de discriminação institucionalizada contra os cidadãos árabes. Paulatinamente, várias políticas governamentais, decisões legais, relatórios da ouvidoria e da controladoria, além de comissões (por exemplo, a Comissão Orr1), passaram a tratar do assunto de políticas estatais referentes aos cidadãos árabes. Estudos, levantamentos e coletas de dados sobre este assunto revelaram que a discriminação institucionalizada contra cidadãos árabes continua a existir em um leque de campos que incluem educação, emprego, alocação de terra e habitação.
A Comissão Orr identificou que “a ação governamental no setor árabe caracteriza-se, sobretudo, pela negligência e pela privação” e observou que “o governo não demonstrou sensibilidade suficiente diante das necessidades do setor árabe e deixou de tomar as providências adequadas para alocar recursos estatais para aquele setor de maneira igualitária”.
A Comissão recomendou ainda que o Estado se programasse de modo a obter igualdade genuína no tratamento de seus cidadãos árabes: “O Estado deve iniciar, desenvolver e operar programas que reduzam as falhas, enfatizando itens orçamentários referentes a todos os aspectos de educação, moradia, desenvolvimento industrial, emprego e serviços”. Entretanto, apesar do reconhecimento das falhas e desigualdades institucionalizadas entre judeus e árabes, muito pouco vem realmente sendo feito para corrigi-las.
Visando a correção das desigualdades na sociedade israelense, a iniciativa do Fundo Abraão vem trabalhando desde 1989 para promover a coexistência e a igualdade entre os cidadãos judeus e árabes de Israel. Utilizamos o nosso departamento de advocacia para compreender os tópicos em toda a sua profundidade e para identificar as necessidades mais prementes no seio da sociedade israelense no que tange a população árabe, estabelecendo iniciativas para solucionar as desigualdades.
Por exemplo, a partir de uma das constatações do relatório Orr, o Fundo Abraão decidiu se envolver no que diz respeito à melhoria do relacionamento entre a polícia de Israel e a sua população árabe. O objetivo é aumentar o alcance e a qualidade dos serviços policiais prestados aos cidadãos árabes de Israel através da criação de diálogo e parcerias, além de equipar a polícia com as capacitações e as conscientizações indispensáveis para servir a uma sociedade diversificada. Os objetivos finais desta ação são aumentar a igualdade para os cidadãos árabes e avançar no caminho para uma sociedade coesa, segura e justa para todos os cidadãos de Israel.
Outra iniciativa estabelecida pelo Fundo Abraão para corrigir a segregação sistemática entre as escolas árabes e judaicas chama-se “O Idioma como Ponte Cultural”. O programa consta de quatro elementos: um currículo de árabe oral chamado “Ya Salam” nas escolas judaicas, atividades culturais árabes nas escolas judaicas, atividades culturais judaicas nas escolas árabes e encontros em pares de escolas entre professores e alunos judeus e árabes.
Expondo, alunos e professores, uns à cultura dos outros, “O Idioma como Ponte Cultural” pretende diminuir a desconfiança mútua e erradicar o preconceito que está enraizado na sociedade israelense fazendo progredir a compreensão entre judeus e árabes e tentando evitar situações como o incidente no Superland.
Além disso, para compreender os padrões de voto da comunidade árabe, realizamos uma pesquisa para descobrir porque quase 50% do setor árabe não vota. Depois de computados os resultados, descobrimos que um número muito maior de pessoas votaria se houvessem mulheres e políticos jovens entre os candidatos.
Então, o Fundo Abraão estabeleceu o programa “Sharikat Qiyadeyat” (Parceiros Para a Liderança), para tratar das causas sistemáticas e subjacentes ao limitado envolvimento das mulheres árabes na esfera pública. O programa dirige-se às mulheres árabes de todo o espectro geográfico e político israelense e fornece a elas ferramentas de liderança às quais elas não teriam acesso de outra maneira. Assim, ao fim e ao cabo, aumenta o número de mulheres árabes capazes de assumir posições de liderança em processos deci-
Expondo, alunos e sórios locais e, quiçá, nacionais em Israel. professores, uns à cultura dos outros, o Outra iniciativa dirigida às necessidades específicas da população feminina árabe é o projeto “Sharikat Haya”, que ofereprograma “O Idioma ce trabalho a mulheres árabes e se formou como Ponte Cultural” para assegurar a promoção de justiça sopretende diminuir a cial e econômica, habilitando e reforçandesconfiança mútua e do o papel das mulheres árabes na sociedade e em casa. O projeto prevê suporte erradicar o preconceito tangível e conhecimento prático para as que está enraizado na mulheres árabes sobre trabalho e seu pasociedade israelense pel em potencial na sociedade, ao mesfazendo progredir a mo tempo em que as encoraja a assumicompreensão entre rem um papel ativo em suas comunidades. O resultado é que estas mulheres, ao judeus e árabes. se tornarem mais ativas em suas comunidades, levam outras mulheres a se tornarem agentes modificadoras. Esta iniciativa desenvolve as capacidades de liderança em muitas mulheres árabes, promovendo assim a igualdade entre mulheres judias e árabes e entre homens e mulheres de modo geral. O Departamento de Advocacia e Mídia do Fundo Abraão desempenhou um papel significativo no estabelecimento de uma das mais recentes ações destinadas a criar uma sociedade israelense igualitária. Em 2011 o Fundo Abraão identificou o acesso dos cidadãos árabes aos serviços como uma área central de ação. Esta iniciativa baseia-se em uma perspectiva compreensiva que engloba: contratar funcionários árabes para o serviço público e em agências governamentais; incrementar a visibilidade do idioma árabe; integrar cidadãos árabes nas lideranças de instituições e organizações; abrir escritórios e filiais das agências governamentais em cidades árabes e reforçar as atividades e laços de corporações, organizações e instituições nas cidades árabes. Atitudes como estas gradualmente levarão a um papel exponencial nas atividades de todas as organizações da sociedade civil, com o objetivo de influenciar as políticas do governo e promover a igualdade. Através destas iniciativas, o Fundo Abraão trabalha para criar uma democracia mais forte em que todos os cidadãos sejam tratados da mesma maneira. O Fundo Abraão, que recebeu o nome do ancestral comum a judeus e árabes, pretende trazer à tona uma sociedade israelense coesa, segura e justa, promovendo políticas baseadas em modelos
O Fundo Abraão crê em uma sociedade com respeito e reconhecimento aos direitos dos indivíduos e das comunidades.

sociais inovadores e conduzindo iniciativas de mudança social, educação pública e jurídica em larga escala.
O Fundo Abraão acredita que a construção de uma sociedade compartilhada de inclusão e igualdade entre os cidadãos árabes e judeus de Israel é um imperativo moral e pragmático para o Estado de Israel; uma sociedade na qual os direitos individuais, assim como o caráter político, cultural e religioso de cada comunidade, sejam reconhecidos e respeitados claramente e sem ambiguidades. É liderado em Israel por diretores co-executivos judeus e árabes e por um conselho diretor e quadro de funcionários diversificado e totalmente integrado.
Notas
1. Nota do Tradutor: A Comissão Orr, encabeçada pelo juiz Theodore Orr, foi estabelecida pelo governo de Israel para investigar os acontecimentos de outubro de 2000, quando doze cidadãos árabes de Israel, um cidadão judeu de Israel e um residente da Faixa de Gaza foram mortos. O objetivo da Comissão era investigar estes incidentes e suas causas e propor recomendações para intervenção do governo.
A comissão enfatizou a necessidade urgente de que fossem tomadas medidas corretivas imediatas e de longo prazo. A comissão apurou que os cidadãos árabes de Israel “constituem o tópico doméstico mais sensível e importante que Israel enfrenta hoje em dia”. (traduzido do jornal Haaretz em 02/09/2003)
Mohammad Darawshe é co-diretor executivo do “Abraham Fund Initiatives”. Traduzido do inglês por Teresa Setin Roth
Assisti a uma palestra de Mohammad Darawshe em maio deste ano, na conferência bianual da World Union for Progressive Judaism em Jerusalém.
Mohammad nasceu e ainda vive numa aldeia árabe na Galileia. Cursou o elementar na escola árabe de sua região, o ensino superior na Universidade Hebraica e a pós-graduação nos Estados Unidos. Segundo ele este trânsito foi fundamental em sua visão de que as sociedades têm que ser inclusivas e igualitárias.
Em sua palestra ele nos falou sobre os esforços para que o Estado de Israel remova a desigualdade de tratamento que ainda dispensa aos cidadãos árabes. “Isto é importante principalmente para definir o caráter judaico do Estado. O judaísmo sempre se preocupou essencialmente com a dignidade do homem e o Estado de Israel tem que seguir esta diretriz para ser verdadeiramente judaico”, afirmou. Não é muito comum ouvir isto de um cidadão árabe-israelense e logo após a palestra me aproximei e lhe pedi um texto para a nossa Devarim. Da mesma forma gentil que trata a todos ele atendeu ao pedido sem pestanejar. Digno de registro também foi a sua resposta a uma excelente pergunta feita por um dos companheiros da WUPJ: “Como, nós judeus da Dispersão, podemos ajudar para que Israel trate os cidadãos árabes com igualdade e dignidade?”, foi a pergunta respondida aproximadamente assim: “Continuem doando e ajudando ao Estado de Israel com todas as formas que estiverem ao seu alcance, pois isto é importante para nós, cidadãos israelenses. Contudo preocupem-se em avaliar se as instituições que vocês apoiam limitam a sua assistência aos judeus ou a estendem a todos os cidadãos do país e pressionem as que estão no primeiro caso a mudar de atitude”.
Mohammad Darawshe é uma pessoa especial, dentro de uma região muito especial.
Raul Cesar Gottlieb (Diretor de Devarim)






Promovendo cidadania por meio da educação e formação de líderes.







