Revista Capoeirando no. 6 (Mar/25)

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ITOJU ARÁ ITOJU ARÁ

MEMÓRIAS E SABERES COMO

TECNOLOGIA ANCESTRAL

EDITORIAL

Existe uma força que nos leva a reconstruir nossas vidas, a repensar nossos passos e repensar nossas estratégias Essa força só se torna completa quando estamos em coletivo, trabalhando para que nossa existência não venha só de um lugar de sobrevivências, mas também do júbilo de estar vivo, de partilhar e de curar as feridas a partir de um lugar de acolhimento. Somente no coletivo podemos nos aproximar de nos ver por inteiro.

Itoju Ará é o cuidado com o corpo, é tecnologia ancestral manifestada no saber que existe em cuidar de si para cuidar de nós, é o reencontro com a vitalidade que pulsa nos nossos corações - mesmo que esse reencontro seja gradual e repleto da necessidade de curar nossas feridas de guerra.

A 6ª edição da revista Capoeirando é uma celebração da ancestralidade que permite que não só cheguemos até aqui, mas também reajustemos nossos passos, que nos torna aprendizes. É a construção de uma ponte entre a força da vida que desponta e da sabedoria dos olhos daqueles que já viveram, sentiram e escutaram muito. É o desejo de estar em rede e compor o movimento daqueles que cultivam um solo mais fértil há tantas vidas Saudamos a ancestralidade que nos garante a vida, em toda a sua prosperidade. Saudamos a força que nos permite continuar abrindo caminhos e ter fé na reconstrução de um mundo em destroços.

FICHA TÉCNICA

Conselho Editorial: Cristiano M Gallep, Christian da Silva Rodrigues, Gina Monge Aguilar, Luciano Medina, Pedro Augusto dos Santos

Editora chefe: Beatriz LuMO.

Editores executivos: Anthony Moraes, Julia S ia Cordeiro França.

exto: Anthony Moraes, Julia S X Cordeiro França.

s: Isabella Carolina Silva De cius do Santos Germano ciana Barbeiro.

rte: Beatriz LuMO, Anthony S X da Silva , Lilia Cordeiro

eatriz LuMO e Lilia Cordeiro

z LuMO

Beatriz LuMO, Anthony Moraes, ilva , Lilia Cordeiro França.

rganização de textos: Anthony S. X. da Silva , Lilia Cordeiro

deo: Guilherme B. Fauth e dão.

uilherme B. Fauth. me B. Fauth e Miguel Passará. es desta Edição: a Santos, Andresa Alves da Silva, Nunes de Souza, Carolina Lima Contramestre Varão, Filipe asé Fabiana d'Oxóssi, Isabella eniffer Éffes, Leandro Rodrigues de Oliveira, Leonardo Canovas cas de Jesus Mota Ferreira, ara de Souza de Oliveira, Mestre tre Jahça, Mestre Jogo de stre Marrom, Mestre Topete, ará, Ori Minohara, @Pac.jpg, Oliveira Rodrigues, Vinicius aléria Simony Oliveira Inácio De Cristine Alves Bueno.

índice

Desobedecer .7

O impacto da capoeira nas comunidades 8

5º Iê Viva Anastácia .11

Escola Praia de Amaralina .14

Vivências de Capoeira 15

Mestre Antônio - uma pequena biografia .16

3ª roda de capoeira em homenagem ao Mestre Antônio da Praia de Amaralina .22

A Continuidade do Legado de Mestre Antônio 24

Mulher Ogum sobrevivente .26 itoju ará .30

Mestra Janja e a Capoeira: Resistência, Transformação e Comunidade 32

Entrevista - Mestre Jogo de Dentro .41

Entrevista - Mestre Danny .44

Baobafricampinas .46

Lamento 50

Capoeira dramaturgia cênica a partir da investigação de um treinamento de ator pautado na cultura afro-brasileira” .52

Pesquisa de Campo em Salvador, Bahia -transformações entre o sujeito e o fazer artístico .59

AFROestima a Autoestima de uma pessoa negra .60

Marsha pelo orgulho .68

Taça das favelas de Campinas: Um resgate ao futebol popular 72

Torneio arandura .76

Aconteceu na unicamp - 15ª ed. da tecnologia em foco -

Sustentabilidade, inovação e sociedade 78

Indicações de Livros .80

DESOBEDECER

Nascemos aprendendo que tudo se baseia em guerra

Pois temos que ser melhor que o outro

Tendo notas melhores pra passar no vestibular

Competir com o amigo até o ponto de machucar

Não podemos ser uma criança desobediente

Temos que obedecer

Pois ter nossa própria expressão e autonomia

Assusta quem está no poder

E assim se segue nossa relação com o mundo

O padrão e a norma tem que ser mantidos

Caso contrário é guerra

Sem direito de ser debatido

E esse padrão e norma vocês sabem muito bem qual é

Vem do mesmo lugar que diz que azul é cor de homem e rosa é cor de mulher

Assim o que foge disso tem que ser combatido

Transformando corpos que estão vivos

Em corpos inimigos

Pra que essa vividez seja morta

Dando espaço para o tradicionalismo

Para o antigo

Mas no antigo encontro força

Não precisa guerrear

Honrar os ancestrais

Não me impede de falar

Só me fortalece, camará

O importante é ninguém morrer de fome

Por isso repito para não esquecer

Que a capoeira é tudo que a boca come

Miguel Passará

O impacto da capoeira nas comunidades

A Capoeira: Transformando Vidas e Comunidades no Brasil

Texto: Júlia Santos Xavier

A capoeira é muito mais do que uma simples arte marcial ou dança Para muitas comunidades brasileiras, especialmente as mais periféricas, ela se tornou um ponto de resistência, aprendizado e esperança Em um contexto onde a falta de atividades estruturadas pode levar crianças e adolescentes a buscar as ruas como forma de ocupar o tempo livre, a capoeira surge como uma poderosa ferramenta de transformação social. Em bairros onde o acesso a centros culturais, escolas de arte ou programas de lazer é limitado, as ruas podem se tornar um espaço perigoso. Crianças que, sem orientação, saem para brincar ou encontrar algo para fazer, muitas vezes acabam sendo atraídas pela criminalidade, pelo tráfico de drogas e até pela violência.

A curiosidade, muitas vezes alimentada pela falta de alternativas, podem levar essas crianças a se envolverem em comportamentos destrutivos, prejudicando não só o seu presente, mas também o seu futuro

A capoeira, nesse cenário, se destaca como uma alternativa positiva e transformadora. Ao contrário da rua, onde a falta de regras e estrutura pode dar margem ao caos, a capoeira ensina disciplina, respeito e responsabilidade. Desde o início do aprendizado, os capoeiristas são orientados a respeitar horários, a nunca chegar atrasados aos treinos e a manter uma postura de respeito, especialmente para com os mais velhos. São valores que se refletem diretamente na vida adulta, quando o comprometimento e o respeito ao próximo são cobrados em diversos ambientes, seja no trabalho, na família ou na sociedade em geral.

IIÊ! Ê! VIVA VIVA ANASTÁCIA ANASTÁCIA

5 Viva Anastácia Êi o

IÊ Viva Anastácia - evento de Capoeira Angola da cidade de Piracicaba/SP que ocorre a cada dois anos - está organicamente ligado à história de seu idealizador, Paulo César Ferraz. Conhecido na Capoeira Angola por Meia-Noite, sua jornada teve início em 1990 sob orientação de Mestre Geninho. No entanto, uma mudança de endereço levou-o, orientado por Mestre Geninho, a treinar com Mestre Zequinha, naquele momento focado na Capoeira Regional do grupo Cativeiro. Em 1992 ocorreu uma mudança de direção no grupo que frequentava, e Meia-Noite começa sua trajetória na Capoeira Angola, culminando em 1996 na autorização para dar aulas no Centro Comunitário do Jaraguá, em Piracicaba/SP.

Inserido neste novo universo, Mestre Zequinha instruiu que seus alunos formados também realizassem seus próprios eventos. MeiaNoite, que pretendia oferecer so-

mente uma oficina, viu nascer um evento grandioso no ginásio do bairro Jaraguá, atraindo um grande público e diversos participantes; desta forma o 1º Viva Anastácia teve seu início, em 2013.

Segundo Meia-Noite, foi em outra atividade conduzida por Mestre Zequinha, ainda nos anos 90, que a figura de Anastácia conquistou sua mente e seu coração. Ele deveria escrever uma ladainha para o primeiro concurso de ladainhas da ECRA¹. Para essa tarefa, durante suas pesquisas na biblioteca municipal da cidade, encontrou referências a várias personalidades negras, mas se encantou com a Anastácia² Inspirado por essa descoberta, escreveu uma ladainha em homenagem a ela e conquistou o primeiro lugar no concurso, momento que marcou sua trajetória não apenas como uma vitória pessoal, mas também uma conexão profunda com a história e a cultura que Anastácia simboliza. Desde

¹ Escola de Capoeira Raiz de Angola ² A Escrava Anastácia é uma figura emblemática da história do Brasil, simbolizando a resistência e a luta contra a opressão. Nascida no século XVIII, Anastácia foi uma mulher escravizada que se destacou por sua beleza e força, mas também pelo sofrimento que enfrentou nas mãos de seus senhores A história de Anastácia é marcada por sua luta pela liberdade e pela dignidade Ela é frequentemente retratada com um manto azul e uma máscara, que, segundo a tradição, teria sido imposta a ela como punição por sua rebeldia e desejo de liberdade. A máscara se tornou um símbolo de resistência e coragem diante da injustiça Anastácia é considerada uma mártir da causa abolicionista e sua memória é celebrada em diversas manifestações culturais, como na capoeira e nas festas afrobrasileiras. Sua história representa não apenas o sofrimento dos escravizados, mas também a força da cultura afro-brasileira e a luta contínua por igualdade e justiça social

então, Meia-Noite se tornou devoto de Anastácia, faltando somente visitar a igreja, dedicada a ela no Rio de Janeiro, para se sentir um devoto fervoroso. Desta forma, considerou "Iê Viva Anastácia de Capoeira Angola e Cultura AfroBrasileira" o nome perfeito para seu evento.

Neste ano de 2024 ocorreu a 5�� edição do Iê Viva Anastácia de Capoeira Angola e Cultura AfroBrasileira, com Meia-Noite desenvolvendo seu trabalho pelo Centro Cultural de Capoeira Angola e Cultura Afro-brasileira Quilombo dos Ancestrais - QDA. Foram quatro dias muito especiais com oficinas, apresentações culturais e rodas de Capoeira Angola, além de uma surpresa ao final do terceiro dia: o reconhecimento de Meia-Noite como mestre de Capoeira Angola por outros mestres presentes no evento.

No primeiro dos três dias de evento, foi possível notar a profundidade da relação de MeiaNoite com a Capoeira Angola, o modo como preza sua ancestralidade, e seu esforço para a conscientização sobre o papel da capoeira na sociedade. O primeiro dia demonstrou toda dedicação de Meia-Noite com a Capoeira Angola e com a sua importância para com a ancestralidade e a conscientização da sociedade do papel da capoeira. Com seus alunos, em grande maioria crianças e adolescentes, foram compartilhadas fotografias, no intuito de proporcionar o maior contato com os mestres mais antigos a partir da trajetória de Paulo Ferraz dentro

desse universo tão rico. O objetivo era mostrar aspectos que muitas vezes não aparecem nas redes sociais e que são essenciais para a compreensão da capoeira. “É fundamental que os alunos reflitam sobre a história da Capoeira Angola e a importância de figuras como o mestre Pastinha e tantos outros mestres”, esclareceu Meia-Noite. Essa atmosfera se replicou nos outros dias do evento

O segundo dia destacou-se, portanto, pela chegada de outros mestres de capoeira, além das apresentações do grupo de Rap 4MP (4 mulheres pretas) e da atriz e professora Eva Prudêncio, com uma sensível performance teatral. O músico e Prof. de História Eduardo Benedito (Campinas/SP) palestrou sobre a cultura preta na diáspora africana em tempos de colonização, assunto que inflamou um debate sobre racismo e as condições da população afro-brasileira na sociedade contemporânea. Esses dias tiveram como palco o centro comunitário do bairro São Paulo em Piracicaba/SP.

No dia seguinte, o evento se moveu para o prédio tombado da Estação da Paulista, foi o dia mais longo do evento e também aquele no qual ocorreu a surpresa mencionada. Nessa ocasião ocorreram oficinas com os Mestres Moreno, Tulé, Rene e Serginho, e também a graduação dos alunos e a formatura de professor do aluno Marcos. Ao término daquele dia o reconhecimento de Meia-Noite como mestre de Capoeira Angola pela comunidade presente surpreendeu a todos, inclusive ao próprio anfitrião!

No domingo, o encerramento se deu em outro local, no Engenho Central, com a apresentação do grupo Ilê Aiyê de Campinas, sob a orientação de Mestre Tulé, grupo atuante desde 1982.

Para todos que presenciaram o 5º IÊ Viva Anastácia ficou a sensação de enriquecimento, pois foram quatro dias de reverência à ancestralidade, a cultura afrobrasileira e da Capoeira Angola

Iêêêê Viva Anastácia!

Mestres e participantes do evento

No cenário vibrante da capoeira, diversos mestres e grupos se destacam pela sua contribuição nesta edição do evento. Entre eles, temos o renomado Mestre Tulé do Grupo Saci Pererê de CampinasSP; Mestre Renê Bittencourt da Acanne - Academia de Capoeira Angola Navio Negreiro; Mestre Serginho do grupo Iê Guaiá, de Caraguatatuba/SP. O evento contou ainda com a presença do Mestre Dominguinhos e do Mestre Noel, ambos da Escola de Capoeira Raiz Negra, São Sebastião-SP Não podemos esquecer do Mestre Geninho, do Grupo Engenho Central. O Mestre Topete da Escola Resistência e o então Contra Mestre Leo Lopes (hoje já reconhe-

cido como mestre) também marcaram presença no evento. Ainda participaram o Mestre Moreno, do grupo Nagô de Capoeira Angola, e o Mestre Al Capone, que é da linha de Mestre Paulo dos Anjos; o Mestre Alemão de Tietê e o Mestre Marquinhos de Geacap. Não esqueçamos do Mestre Galeguinho de Ilhéus e do Mestre Boca. Por fim, Jurubeba, do grupo de Mestre Péde-Chumbo Para complementar, a lista de participantes foi muito rica: Ari da Paz, aluno de Mestre Virgílio de Ilhéus (já falecido), e Minhoca da casa de Mestre Ananias, são outros importantes mestres representantes. O Contramestre Danny do grupo Semente do Jogo de Angola (nomeado Mestre em dezembro de 2024) e o Contramestre Lampião da Escola de Capoeira Raiz de Angola, contribuíram com suas experiências valiosas para o evento Esses mestres e participantes não só fortaleceram a tradição como também trouxeram suas histórias e legados para enriquecer ainda mais esse evento

Texto e foto por Adriano Sgrignero Mestre em História pela Unicamp, é fotógrafo e criador do Blog de Capoeira Angola "Veneno da Noite"

Escola Praia de Amaralina

A Praia de Amaralina foi uma escola de capoeira fundada pelo Mestre Antônio, inicialmente em Rio Preto e posteriormente enraizada na cidade de Campinas

Suas ações inspiraram e formaram mestres que dão continuidade à memória da capoeira na cidade e também abriram espaço para a propagação de seus saberes dentro de instituições acadêmicas, tais como o DCE da PUC e o Instituto de Artes da Unicamp, onde permaneceu por 15 anos.

Sua ancestralidade se faz viva no trabalho de seus formados, nas rodas de celebração de sua memória no centro de Campinas e na prática da capoeira.

VIVÊNCIAS DE CAPOEIRA

continuidade da capoeira de Mestre Antonio por Mestre Jahça e outros formandos.

Terça e quinta das 16H às 19H na Casa Tainã Participe!

para saber mais, entre em contato

(11) 94143-1596

Mestre Antônio

uma pequena biografia

Retirado do trabalho 'Projeto só Mandinga' (2007)

Antônio Ambrósio os Santos nasceu em Santo Antônio Itambé – MG - no dia 18 de janeiro de 1954. Foi capoeirista, trabalhador, professor e artista popular. Filho de Genésio Ambrósio dos Santos e Maria Amália da Silva, teve uma rica história desde que saiu de Minas Gerais e foi morar em São Paulo, com a mãe e os irmãos. Em Olímpia, São José do Rio Preto e Campinas, o Mestre montou trabalhos de capoeira e deixou sua influência.

Um “certificado de aprovação no curso primário”, emitido pelas escolas reunidas “Alcebíades Nunes” em 07 de setembro de 1969, testemunha a única formação escolar oficial do Mestre, adquirida ainda na sua cidade de origem. Foi para a cidade grande – São Paulo – provavelmente em busca de melhores oportunidades. Sem dinheiro e sem estudo, Antônio ajudava a família vendendo limão Era frequentemente roubado pelos meninos maiores e mais maliciosos Teve o desejo de aprender um pouco de malandragem pra se defender. Encontrou a capoeira que nos finais de semana era jogada na Praça da República. Se apaixonou, e foi o Mestre Gilvan quem o aceitou como discípulo Mestre Natanael em seu depoimento falou dos tempos em que a capoeira era pouco popular em São Paulo. Falou sobre sua vivência com capoeiristas como Zumbí, Antônio e Gilvan Assim como os Mestres Suassuna, Brasília e Limão, Natanael foi um dos bons – e poucosda época. Contou um pouco sobre suas vidas de capoeiras e de rapazes humildes que eram - ver entrevista com Mestre Natanael.

Antônio foi dispensado de incorporação militar por “excesso de contingente”. Aos 20 anos de idade, no dia 20 de maio de 1974, a Associação de Capoeira Regional Ilha de Itapoã concedeu o diploma de capoeirista profissional ao Prof. Antônio. Mestre Gilvan era muito exigente, pois tinha nome a zelar, e passou muito do que sabia ao Antônio, sobre jogo e canto, e Antônio aprendeu.

Um dos momentos em que Antônio tocava berimbau na praça da República –primeiro da direita para a esquerda – foi registrado nesta foto, em que o prédio que hoje abriga a Secretaria de Estado da Educação pode ser avistado ao fundo.

A foto seguinte mostra em pé os Mestres Miguel Machado, Aberrê, Lobão, Suassuna, Tarzan, Paulo dos Anjos, Antônio Ambrósio e Belisco. Agachados, Mestres Galo e Joel – irmão de Gilvan, sempre da esquerda para a direita. A imagem e sua descrição foram cedidos pelo Mestre Cláudio – Sapo Durante a década de 1970, o Prof. Antônio montou academia em Olímpia, capital nacional do folclore Seu pessoal - da Associação de Capoeira Praia de Amaralinadesfilava nos carnavais e durante as comemorações da semana do folclore. Antônio gostava muito de festas, de fartura e de música. Foram selecionadas algumas imagens que refletem seu gosto pela arte, pela brincadeira e pela luta, ou seja, gosto pela cultura popular.

Antônio contava com prestígio e foi citado com alguma frequência na imprensa local, o que ajudava a divulgar seu trabalho e suas apresentações pelas cidades do interior Um artigo de jornal, datado de 24/06/1977 - sem o nome do periódico - traz como título: “Capoeira de Olímpia: show em Santa Fé do Sul”. Na seqüência o texto: “ ... o show da famosa academia de Olímpia é feito por intermédio do professor Santana e organizado pelo professor Antônio a capoeira é um excelente esporte para a juventude... procure a Associação de Capoeira “Praia de Amaralina” localizada à Rua São João, 805, em Olímpia”

Outro artigo de jornal - este sem data e sem o nome do periódico – traz com título: “Capoeira Paria de Amaralina fará show em Catanduva”. Trecho do texto: “ ... nota dez ao Prof. Antônio, que vem se esforçando bastante para divulgar o nome de nossa cidade através destes shows que vem promovendo em outros centros”. Tais exibições visavam a preparação para os batizados que eram realizados pela associação em datas festivas como a semana do folclore. Uma imagem do trabalho do Mestre nesta época.

Algum tempo depois o Mestre centrou seu trabalho em São José do Rio Preto. Antônio seguiu em frente e confirmou sua popularidade. Um certificado que estava entre os seus documentos pessoais conferiu ao Mestre o título de “destaque do ano de 1978”, na categoria capoeira, como resultado de uma pesquisa realizada pela TV Rio Preto, filiada à rede Record No entanto, a popularidade nem sempre vem para bem. E nem só de alegrias foi a trajetória do Mestre na capoeira. O Jornal Dia e Noite - São José do Rio Preto – no dia 09 de março de 1979 trouxe uma matéria de capa com o seguinte título: “Mestre de capoeira espancado por seis policiais do tático móvel”. Nesta matéria foi relatado que Mestre Antônio esteve internado na Santa Casa de S J do Rio Preto e teve alta Os policiais o pegaram na saída do Jóquei Clube na terça-feira de carnaval. O Mestre declarou ao autor da matéria: “ ... fui espancado com violência a ponto de quebrar meu maxilar inferior em dois lugares e perder a noção das coisas de tanto levar soco no estômago”.

No final da década de 1970, Antônio era capoeirista afamado O que não se sabe exatamente é se foi em 1979 ou no início dos anos 80 que o “Mestre Antônio de Rio Preto” chegou em Campinas. Vários capoeiristas da região procuravam Antônio para aperfeiçoar sua formação. Os Mestres Godoy e Maya, fundadores da Academia Coquinho Baiano, são exemplos de capoeiristas que passaram a freqüentar a academia do Mestre em Rio Preto para cumprirem estágio

Pelo intermédio de vários capoeiristas, Mestre Antônio instalou um trabalho em Campinas. Segundo os relatos, sua primeira academia - Praia de Amaralina - em Campinas funcionou no bairro Taquaral. Um tempo depois, o Mestre ocupou os fundos de uma loja na Rua General Osório. Posteriormente, alugou uma casa na Rua Marechal Deodoro, onde derrubou as paredes e montou sua academia Ao que parece, foi nesta academia que o trabalho do Mestre foi mais intenso. O Mestre teve um trabalhou também no DCE da Puc, na Rua Regente Feijó Durante as décadas de 1980 e 1990, o Mestre adquiriu dois terrenos no bairro São

Domingos, onde construiu uma casa o foi residir Nos fundos, construiu uma academia onde dava aulas. Tinha espaço e equipamentos pra treinos e rodas. Lá foi local de muitos encontros e churrascos, o que é apontado como uma das características do Mestre. Algumas imagens:

Outra característica do Mestre era o trabalho. Contam que não tinha preguiça. Estava sempre ocupado com lidas cotidianas. O Mestre trabalhou muito com artesanato e foi expositor – junto com o Zabotto - na feira de artesanato do Centro de Convivência Cultural, em Campinas A casa e a academia do São Domingos, o próprio Mestre ergueu Lá ele trabalhava, descansava, dava suas festas e jogava capoeira. Quem quisesse treinar podia ir até lá.

Mestre Antônio, apesar de ter uma capoeira bonita e com movimentos plásticos, foi violento e jogava pra dentro. Alguns dizem que ele não era violento, ele jogava capoeira No entanto, seu sistema era duro. Muitos tinham medo, enquanto outros tinham curiosidade. Alguns desafiavam o Mestre, mas freqüentemente levavam a pior. Teve muitos alunos. Alguns começaram do zero e se tornaram professores. Outros chegaram com alguma formação e realizaram estágios para se formarem Além de querido, o Mestre foi temido e respeitado. Chegou a levar a fama de “Mestre de Mestres” pela consideração adquirida na roda de capoeira. Como seu Mestre – Gilvan - foi vítima de homicídio, Antônio terminou sua formação com o Mestre Joel, irmão de Gilvan. Além de ótimo capoeirista, Antônio foi bom percussionista e bom cantador. Participou do teatro

da gravação de “Navio negreiro”: acervo pessoal M A

de Solano Trindade e de trabalhos com Dona Raquel Trindade. Promoveu incontáveis shows e apresentações de capoeira e participou das gravações do filme “Navio negreiro”.

Sua versatilidade chamou a atenção de um grupo de professores universitários que foi apreciar a uma apresentação de Mestres Uma matéria do Jornal da Unicamp de outubro de 1987 contou um pouco desta história. “Os professores viram que Mestre Antônio se destacava claramente dos demais, não apenas por sua agilidade e técnica, mas pelo que criava com suas acrobacias”.

A capoeira ganhou um importante espaço fora dos terreiros e das academias, e se converteu em disciplina universitária Desde março de 1987, o departamento de dança do Instituto de Artes da Unicamp inclui essa arte em seu currículo. A Unicamp tornou-se a primeira escola de nível superior a inserir a capoeira em seu currículo obrigatório. Na ocasião, Profa. Marília de Andrade, chefe do departamento de dança, explicou a importância da capoeira para o currículo do dançarino e a eficiência dessa técnica amadurecida no Brasil

Mestre Antônio ministrou a disciplina “danças brasileiras” sob a responsabilidade do renomado Professor Antônio Carlos Nóbrega “Tão importante quanto os movimentos acrobáticos é o controle absoluto que o capoeirista tem sobre os músculos e a mente...” foi citado o Mestre neste artigo, que deixou ainda sua impressão a respeito do presente momento: “ só muito recentemente a capoeira começou a ser vista como uma das fortes manifestações da cultura popular brasileira”

Bastidores

Outra matéria, publicada no Jornal Correio Popular de 05 de outubro de 1991, trouxe como título: “Alunos de dança aperfeiçoam movimentos jogando capoeira”.

Antônio Ambrosio estava contratado como técnico-didata, apesar de contar apenas o curso primário. “Foi um grande salto em minha vida...” confessou o Mestre.

Nesta matéria Mestre Antônio afirmou que sua característica era jogar capoeira dominando o oponente na ginga de corpo. Sobre seu jogo, ainda mencionou: “ ... quando entro na roda ao som dos atabaques, alguma coisa toma conta do meu corpo e os movimentos vão saindo naturalmente... é a capoeira bonita das acrobacias, a verdadeira mandinga do escravo de angola”.

O Mestre atuou durante 15 anos no Departamento de Dança da Unicamp. Lá ele teve contato com o pessoal acadêmico e passou a mudar de hábitos. As meninas da dança eram bailarinas, e o Mestre teve de se adaptar a esta nova realidade

Como era explosivo e gostava de uma boa briga, as meninas da Unicamp aconselhavam: “Mestre, o senhor trabalha na Unicamp... não pode ficar brigando por aí”. Ele começou a manerar e melhorou no controle da violência. Foi aí que começou a desenvolver o jogo de mandinga. Segundo sua concepção, o jogo alto era pra dentro, e se o adversário não se esquivar o golpe entra O jogo baixo era mais plástico e mais malicioso, sem desnecessária demonstração de violência. A professora Grácia Navarro, do Instituto de Artes da Unicamp, foi aluna do Mestre e com ele conviveu durante a montagem e as apresentações do seu trabalho de conclusão de curso, o espetáculo “Bailarinas de Terreiro”. Ela contou que o Mestre era muito gentil e cuidadoso com as meninas: “Pisava em ovos” e não sabia muito bem o que fazer com as bailarinas. Queria manter seu emprego e se dar bem com todo mundo Com o tempo, se adaptou

Uma aluna - Laís Elaine Pereira de Moraes – no seu trabalho de conclusão de disciplina comentou: “Mestre, você traz no seu jogo e na sua aula muito da tradição e da história da capoeira, uma história que não se encontra relatada em livro algum... percebo que sua ginga está presente em todos os movimentos. Uma ginga cheia de mandinga e que faz com que a capoeira seja caracterizada como jogo, uma brincadeira de angola....o Mestre não demonstra cansaço durante o jogo, parece que não faz esforço algum para jogar...”

Num documento de 28 de Abril de consta a função do Mestre - já como instrumentista de orquestra. Atuou através de interpretação musical em espetáculos e do ensino de instrumentação Ministrou aulas práticas nas disciplinas AD 115 (Danças Brasileiras); AD 700 C (Danças Brasileiras III); e AD- 417 (Improvisação), além de aulas de linguagem da capoeira – jogo, canto e música. Um item desse documento descreve os “futuros projetos” do Mestre. Ele pretendia formalizar um curso de extensão comunitária na Unicamp com o jogo de mandinga. Tinha a intensão de gravar um acervo instrumental e de escrever sua biografia, com relatos de sua experiência na capoeira e na cultura popular.

Apesar de sua vitalidade e energia, o Mestre partiu cedo Ao que relatam, gostava muito de mocotó, de carne e de cachaça. Apreciava especialmente uma cachaça curtida com ervas e cobras, dentre outras mandingas Esta é uma parte da explicação atribuída ao infarto fulminante que sofreu. Outra explicação é atribuída ao desgosto que o mestre sentia com a capoeira.

Alguns relatos coincidem no ponto em que o Mestre tinha conhecimento e consideração na capoeira, porém, nos seus últimos tempos estava afastado de seus alunos, e já não era mais tão convidado para batizados e festas de capoeira

Talvez pelo seu modo de ser e de proceder, que o tornava difícil a convivência.

Talvez fosse pela sua cobrança em relação à capoeira. Fato é que vários alunos estavam se tornando Mestres e estavam formando Mestres. Vários mudaram de associação ou grupo de capoeira para serem graduados mais rapidamente. Para o Mestre Antônio, talvez isto não estivesse muito certo

Faleceu em Campinas no dia 05 de setembro de 2001. Com uma boa situação material e com nome na capoeira. Foi uma surpresa. Houve um funeral com cortejo de muitos capoeiristas, toque de Iúna e menções na imprensa local. Foi, mas deixou seu nome gravado na capoeira.

3ª roda de capoeira em homenagem ao Mestre Antônio da Praia de Amaralina

Na terceira celebração à memória do Me. Antonio, responsável por nutrir e propagar os saberes ancestrais da capoeira na cidade de Campinas, seus formandos e seus netos de capoeira, junto com seus aliados e parceiros ocuparam a praça Bento Quirino para realizarem uma roda de Capoeira para manter suas ancestralidades vivas, honrando a caminhada de seu mestre

Fotos por Isabella Aparecida

A Continuidade do Legado de Mestre Antônio

O legado de Mestre Antônio segue sendo transmitido, e um exemplo marcante dessa continuidade aconteceu quando o Mestre Jahça, seu seguidor e grande representante da tradição da capoeira, foi convidado para um encontro pelo LabDrama na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Nesse dia, ele teve a oportunidade de bater um papo com a galeria, compartilhando suas vivências e experiências adquiridas ao longo dos anos, tanto dentro quanto fora do ambiente acadêmico. Durante o encontro, Mestre Jahça falou sobre sua trajetória, as práticas e desafios que enfrentou, e como a capoeira tem sido um veículo de ensino e integração, especialmente no contexto universitário

Além do bate-papo, o momento também foi de celebração da cultura e da tradição da capoeira, com uma roda que reuniu alunos e praticantes A roda de capoeira na UNICAMP simbolizou a perpetuação do legado de Mestre Antônio, reafirmando a importância da prática para a formação de valores como respeito, solidariedade e resistência. Este evento não foi apenas um encontro de gerações, mas uma verdadeira celebração do que a capoeira representa: um elo entre passado e futuro, uma arte que se reinventa e se fortalece a cada novo praticante, mantendo viva a chama da cultura afro-brasileira.

Parasabermaissobrecomo foioencontrono Labdrama...

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Mulher Ogum sobrevivente

Uma mulher de pele parda, vestido longo, sapatilha no pé, espada de São Jorge pendurada na orelha e com uma mala de mão, quer recomeçar a sua vida. Ela está parada em uma estrada de terra perdida, olhando ao longe sem saber qual é o rumo que irá tomar dali para frente Se acha vitoriosa por ser mais uma sobrevivente de uma tentativa de feminicídio. Ela está em busca de sua liberdade que foi perdida. Se sente subtraída com tudo o que passou, não sabe ao certo qual a sua finalidade aqui na terra. O que lhe mantém em pé é a fé que ela tem em Ogum. Ela quer provar a si mesma que é capaz de viver livre do sofrimento que passou. Não quer olhar para trás, quer viver em paz, tranquila com a pouca dignidade que ainda lhe resta

Quer dizer ao machismo nunca mais!

Apesar de estar paralisada, a mulher é forte, aguenta firme, ela ainda tem sede por mudança, pois sua vida de casada não foi um mar de rosas não. É como se o seu casamento fosse uma prisão, mas uma prisão mental Foram 20 anos aos trancos e barrancos vivendo ao lado daquele homem que só a oprimia. Carrega consigo lembranças dolorosas de uma vida conjugal infernal. Viver feliz e ser amada por quem se ama, é o sonho de qualquer mulher, mas infelizmente muitas morreram sonhando alto assim Ela se pergunta que mulher é feliz? Quem não se desespera vendo o seu conto de fadas virar um crime?

Uma edícula e um quintal bem grande é o palco da história que eu irei narrar. Era por volta do meio-dia, quando o marido chegou em casa para o almoço O casal tinha 4 filhos, 1 mulher que era a mais velha e na época estava grávida de sua primeira filha e 3 homens, todos já maiores de idade, mas naquele dia só estava a mulher em casa Quando o marido chegou, a mulher estava em frente ao fogão fritando batatas fritas. O homem estava segurando um machado na mão, que trouxe do trabalho, puxa uma cadeira, senta em volta da mesa, com o seu olhar sanguinário e faminto, assiste os movimentos da mulher pela cozinha. Ele começa a questioná-la sobre algumas coisas de seu passado, a mulher começa a ficar nervosa e pede para ele parar. O homem insiste com aquela conversa e os dois começam a discutir, quando de repente, o homem levanta da cadeira com o machado na mão e vai em direção a mulher, ao perceber que ele irá atacá-la, ela sai correndo pelo quintal em direção ao portão. Ela não consegue abrir o portão e quando se dá por si cai no chão e o homem começa a dar machadadas em sua cabeça, o sangue começa a escorrer Enquanto isso pessoas passam pela calçada, mas não fazem nada, assistem tudo impunemente, ninguém meteu a colher. O homem por sua vez ao olhar a mulher ali toda ensanguentada, pensa em ter matado ela, então ele pega o corpo dela e arrasta até o pé da mangueira. Deixa o corpo lá e vai lavar o machado no quintal mesmo, depois entra em casa e vai para o banheiro tomar banho, ao terminar o banho o homem se arruma para sair, como se nada tivesse acontecido, saí de casa deixando o corpo da mulher no quintal. Horas depois chega um dos filhos do casal Ao abrir o portão e ver a mãe caída no pé da mangueira, o rapaz fica desesperado, sem saber o que fazer, agacha e começa a abraçá-la. Ele percebe, que seu coração ainda está batendo e começa a gritar; mãe? mãe?

A mulher lentamente abre os olhos ensanguentados e começa a chorar. Ele a deixa ali e vai atrás da ajuda de algum vizinho, que possa levá-la ao hospital. Naquela época as coisas eram difíceis, a família era pobre, não tinha carro e também não tinham telefone fixo ou celular para chamar ambulância Depois de bater em algumas casas, ele finalmente encontra um vizinho que está disposto a ajudá-lo Os dois entram no quintal, pegam o corpo da mulher e levam até o carro. Ao chegarem ao hospital, a mulher é atendida imediatamente e levada para o leito de internação. O médico pede para que os rapazes esperem ele chamar para conversar sobre o caso da mulher Após algumas horas de espera o médico chama pelo filho da mulher e explica para ele, que o caso dela é grave e que ela ficará internada sem previsão para sair de lá, o médico pergunta ao filho sobre o que aconteceu, mas o rapaz diz que não sabe, diz quando chegou em casa, já encontrou a mãe caída no chão e naquela situação. O médico diz também que é um milagre a mulher ter sobrevivido e que sua mãe precisará de muita fé para sair dessa situação bem e que ela possa voltar para a casa logo, o médico diz a eles também já podem ir embora e que alguém volte no próximo dia a tarde, para visitá-la. Esse caso, que eu estou narrando, aconteceu no ano de 1989, em uma periferia da cidade de Campinas, no interior de São Paulo. Na época não existia a lei 11340 do ano 2006 (Lei Maria da Penha). Mas o que se sabe sobre esse caso, é que o homem que agrediu a mulher foi preso dias depois, após ser denunciado por alguém que passava na rua no momento que ele dava as machadadas na cabeça da mulher, no dia do acontecido. Ele foi preso por uma delegada, que acompanhou o caso de perto. Ficou 3 meses preso. Os filhos do casal com medo do pai voltar para casa ao sair da prisão, abandonaram a própria casa e alugaram uma outra em um outro bairro, para esperarem a volta da mãe

A mulher ficou internada por um mês no hospital Todos os dias algum filho ia visitála, levando algumas coisas de necessidade básica para ela. Foi no último dia de sua internação que vi a mulher na estrada de terra perdida, pele parda, vestido longo, sapatilha no pé, espada de São Jorge pendurada na orelha e com uma mala de mão. Ela sentou ao meu lado no ponto de ônibus e começou a conversar comigo dizendo tudo o que aconteceu com ela E que estava com medo de voltar para a casa Me contou também que tinha muita fé em Ogum, e a certeza que ele iria abrir seus caminhos novamente e que ela iria vencer essa batalha com muito orgulho de ter sobrevivido. Eu fiquei tão encantada com os brincos que aquela mulher estava na orelha de espada de São Jorge, que ela me deu um e ficou com outro. Vou lembrar e levar essa mulher comigo, para onde eu for Ela é mais uma sobrevivente do que hoje chamamos de feminicídio. Acredito que a mulher esteja viva até hoje, vivendo sua vida, na fé de Ogum. Eu desejo que o homem que a agrediu tenha de fato pago por tudo que fez com aquela mulher.

Autora: Jeniffer Éffe’s

ITOJU ARÁ ITOJU ARÁ

MEMÓRIAS E SABERES

COMO TECNOLOGIA ANCESTRAL

1. Dois rostos virados de costas um para o outro, compartilhandoo mesmocérebro:

A escolha dos rostos de costas representa a dualidade e o contraste entre o "velho" e o "novo", algo que se reflete na passagem da tradição para a modernidade. O fato de eles compartilharem o mesmo cérebro simboliza a ideia de que, embora as perspectivas possam parecer diferentes ou separadas, elas estão conectadas por um pensamento coletivo e uma memória compartilhada. Isso sugere que a cultura ancestral (como a capoeira, o candomblé, etc.) não está separada da modernidade, mas vive através do entendimento e da troca de conhecimentos entre as gerações. O cérebro, como centro de pensamento e sabedoria, reforça a ideia de que a memória ancestral e a continuidade cultural estão presentes na mente coletiva

3.As árvorescom folhascaindo ao redor: As árvores representam a conexão com as raízes e a história. As folhas caindo ao redor simbolizam o ciclo da vida, onde algo precisa se renovar para que a cultura e o conhecimento possam se perpetuar. As folhas caindo podem representar o legado das gerações passadas, enquanto as novas folhas que irão nascer (mesmo não representadas visualmente) sugerem a continuidade e a transformação da cultura

Esse ciclo também pode aludir ao "fluxo" de uma sabedoria que nunca morre, mas se reinventa ao longo do tempo, como acontece na capoeira, que é transmitida e reinterpretada de geração para geração

2.O conceito criado pela Fabiana D’ Oxossi "Itoju ara" – Cuidadocom ocorpo:

A expressão "Itoju ara " desta edição da Capoeirando traz a representação do conceito que significa "cuidado com o corpo". Esse conceito vai além do simples ato de proteção física; ele reflete a ideia de que o corpo é o veículo da memória ancestral, do saber coletivo e da sabedoria acumulada ao longo das gerações. Na tradição da capoeira e de outras manifestações culturais afro-brasileiras, o corpo é visto como um templo que carrega as histórias, os ensinamentos e as experiências de nossos ancestrais. O cuidado com o corpo, portanto, é um princípio fundamental não apenas para a preservação da saúde física, mas também para a continuidade cultural e espiritual Ele é o ponto de conexão entre o passado e o futuro, entre as gerações que passaram e as que virão

Esses elementos combinados criam uma capa que não só homenageia a história da capoeira e outras manifestações culturais afro-brasileiras, mas também aponta para o futuro, lembrando que a cultura não é algo que se perde ou se esquece, mas que continua a crescer e evoluir, com as gerações que mantêm essas tradições vivas

Essas interpretações se conectam profundamente com a ideia de preservação da cultura e a importância do contato humano, mostrando que, ao mantermos essas trocas e ao entendermos as raízes culturais, podemos seguir adiante com respeito e compreensão.

Fala, Mestre!

Nutrindo as reflexões sobre a passagem dos saberes e da memória como uma tecnologia de existência e de vida, a Yalasé Fabiana d'Oxossi, Mestre Marrom, Mestre Jahça, Mestre Topete e Contramestre Varão nos contam sobre como suas vidas foram marcadas pela sua ancestralidade.

Suas compreensões sobre tecnologia ancestral e a importância da sua passagem de geração pra geração foram partilhadas nas entrevistas abaixo.

Clique para assistir e ouvir

Yalasé Fabiana d'Oxossi

Mestre Marrom

Mestre Jahça

Mestre Topete

Contramestre Varão

Entrevista realizada por Pedro Rosa

Pedro Rosa:

Qual música você gostaria que não fosse mais cantada nas rodas de capoeira, e qual você gostaria que fossem cantadas mais vezes, que fosse mais valorizada?

Se preferir responder só uma das 2 perguntas fica à vontade.

Mestra Janja:

Qualquer coisa que a gente fale hoje sobre capoeira, a gente se refere a um universo E a gente precisaria no mínimo de um tempo para refletir a sua dimensão E portanto, eu, com certeza, não dou conta do que você chama de a música da capoeira. Eu tenho um pequeno universo dentro de uma coisa muito grande. E tenho ficado muito alegre porque quando eu viajo eu chego em lugares, e eu vejo que é cada vez mais complexo esse universo musical com influências locais. Eu vinha desde o lugar que eu achava que estava consagrado como uma matriz mais abrangente. E, aí, isso obviamente vai sendo desmontado e você vai vendo que tem uma coisa incrível Então tem músicas incríveis dentro da capoeira! Eu gosto muito de cantar as músicas antigas, ou as músicas que falem do mar. O mar para mim é muito importante, é muito precioso. Então, aquelas que eu não gostaria de ver cantada dentro da capoeira eu também não canto Que são as músicas de conteúdo sexista, racista, ou que reforçam e reafirmem estereótipos de um grupo humano inteiro, vinculado a coisas marginalizantes, digamos assim Então eu não canto, não canto. A medida do possível, eu proponho interferências. Quando eu entrei na capoeira, se cantava: "Vou dizer a dendê: sou homem, não sou mulher" Nos anos 90, eu me recusei a seguir dizendo "sou homem, não sou mulher" E aí eu comecei a cantar: "tem homem e tem mulher”. E isso é algo que hoje acabou no mundo todo usa E, mais recentemente, a gente ainda foi além: "vou dizer a dendê: tem homem, mulher e tem LGBTs". Então, olhar para esse universo como um universo de acervo histórico é para mim importantíssimo. E, portanto, eu reflito o meu lugar também nesse processo. Mas gosto de cantar músicas desde "ô sim, sim, sim, ô não, não, não”, até aquelas que a gente vem trazendo mais recentemente também para o universo da capoeira Como cantar: "se não fosse a sereia cantar tubarão me comia lá no mar". Acho que é um ensinamento muito precioso para a vida das mulheres. Enfim, é isso, eu quero cantar tudo aquilo que produza discussão, mas que produza também encantamento, mergulho.

P: Queria saber sobre a trajetória da capoeira LGBTQIA+, e como você vê a inserção desse público no ambiente historicamente machista?

Mestra Janja: Ah, como eu vejo. Infelizmente, eu me vi pouco preparada, embora conscientemente aberta a reconhecer a importância desse debate no interior da capoeira O que eu pude lamentar é que a gente dá conta muito superficialmente de alguns debates. E aí, agora, recentemente, quando a gente fez um programa formativo com 4 parceiros, com 15 horas de formação, com cada um desses parceiros. E com pessoas envolvidas nas mais distintas pautas da comunidade LGBT, que você percebe que você sabe muito pouco. Você lida ali com elementos de senso comum, ainda que buscando construir um olhar de natureza crítica e comprometida com a justiça social. E eu estou ficando velha, tô no meu processo de envelhecimento Então eu tenho até pedido sempre malembe, pedido agô para os mais novos dizendo "tenham paciência com a tia, porque agora vai rolar um delay nesse processo de alfabetização", mas esse é um dos menores desafios que a gente vive enquanto capoeirista, porque também a capoeira, em todas suas linguagens, seja na movimentação física, seja na movimentação rítmica, instrumental, ela também passa por desafios Ela também passa por alterações, então eu acho que a gente vive isso aí o tempo todo: um processo formativo de reconhecer os valores do passado para pensar e refletir esse futuro que depende da gente. É isso, eu acho que a comunidade LGBT hoje, no interior da capoeira, ela tem consciência de que o Brasil segue sendo um país extremamente perigoso, mas ainda assim é de se celebrar, ver como, cada vez mais, mais e mais grupos e organizações de capoeira se abrem para discutir essas questões, para reconhecer a presença das pessoas LGBT no interior dos seus grupos, ou até mesmo para valorizar a formação de coletivos LGBTs, como já existem em algumas organizações de capoeira, não mais apenas no nosso [grupo]. Então, já existem outros grupos, outros coletivos, outros movimentos que vão se fazendo. Isso é muito importante. A capoeira ta comprometida com algo muito maior. Capoeira tem um compromisso político muito maior Não pode vacilar nesse jogo de né?

P: Comprar uma luta e abandonar as outras, né?

Mestra Janja: É, tem que se aprender a partir da matriz. A matriz é a luta de resistência dos negros

P: Alguns grupos, apesar de assumir o papel da capoeira como movimento de resistência, de luta, frequentemente são condescendentes em relação a questões como machismo, autoritarismo. Qual o seu entendimento sobre como lidar com as lutas sociais e políticas amplas da sociedade, e como elas se reproduzem na roda de capoeira?

Me Janja: Olha, se tem uma coisa que eu não me dedico a fazer dentro da capoeira é falar de alguns grupos, eu quero sempre falar do meu grupo. Porque é mais honesto E eu acho que já tenho no meu grupo, assim, muitas falhas, muitos erros, muitas frustrações. Eu sempre acho que a gente tem um potencial que podia ser melhor aproveitado, sabe? Mas não dá para deixar de dizer que existe… Houve um momento em que fazer um evento de mulheres capoeiristas, uma conferência de mulheres capoeirista, era quase que uma agressão dentro da capoeira Era inaceitável Hoje a gente tem consciência de que existe eventos de mulheres que são realizados em grupos que, por trás dele, tem pessoas que… ou tem uma conduta de grupo totalmente questionável. Mas enfim, eu acho que os movimentos de resistência se fazem na consciência dos sujeitos oprimidos. E obviamente que eu acho que o meu papel e de muitas outras pessoas é exatamente se dirigir a quem está em formação dentro da capoeira, entendeu? Eu acho muito importante, por exemplo, que hoje, sendo uma mulher velha, me mostre dentro da capoeira conectada com a realidade dos jovens e tudo aquilo que eles enfrentam, desde as dificuldades formativas de mercado de trabalho, etcetera, à todas as formas de violência, principalmente entre os mais pobres; então não dá pra se contentar Não é que não dê para dizer que não existe, porque tá aí Mas não dá para se contentar e ver que a capoeira, que tem uma possibilidade de ir muito mais além, ela fique restrita a determinados aspectos Existe uma coisa nova na capoeira, e aí eu falo agora da capoeiragem, que a gente não pode deixar de considerar: a complexidade da capoeira é tamanha, porque num período histórico de menos de 100 anos ela deixa de ser um crime e ela se torna um fenômeno cultural, numa dimensão de internacionalização absurda. Ela estrutura em torno de si uma economia, é quando a gente fala da existência de uma economia da capoeira. A gente está falando não mais de pessoas que tinham que se esconder, ou praticar capoeira escondida, etc. A gente está falando da existência de pessoas que hoje se profissionalizam, ou se entregam a prática da capoeira em busca de se profissionalizar, se tornando um profissional da capoeira. Então, obviamente que tem coisas novas, que talvez a minha geração ela só consiga dar conta de evidenciar essa passagem. Mas são as próximas gerações que vão possivelmente dar conta de analisar melhor isso. Eu fico aqui bisbilhotando e vendo aqui e ali as marcas de mercado, de como já algumas coisas se estruturam em torno de forças distintas dentro dessa economia.

P: Sua última pesquisa chama-se mulheres negras e pessoas LGBTQIAPN+ na capoeira: fissuras de restauração política e justiça epistêmica no espaço negro. Poderia nos explicar mais detalhadamente o que entende por fissuras de restauração política, e como ela se manifestam no contexto da capoeira?

Mestra Janja: Fissuras de restauração política eu falo da gente primeiro, romper a ideia de que a capoeira ou a capoeiragem se articula através de uma linguagem uníssona. Então, ela é um cenário muito complexo, de várias narrativas, num contexto dessas narrativas existe um campo político em disputa permanentemente

Então, num momento em que se discute os processos de branqueamento da capoeira, e os processos de deslocamento para a classe média, sobretudo a Capoeira Angola, alguns grupos, num contexto de pautas mais amplas, vão produzindo rasgos e dizendo: "Tudo bem a mestra Janja e a mestra Gegê, essa galera começou há 30 anos atrás com as conferências das mulheres capoeiristas, etc. Mas agora a gente quer organizar a mulher preta".

É porque a gente estava aí no início das conferências, fora do Brasil inclusive. Então tem grupos que se olham dentro da capoeira e nos acusam de sermos identitários Mas o que a gente está querendo dizer é que, nesse contexto de refazimento dos territórios da capoeira, tem grupos que tem bandeiras políticas sendo levantadas, e que elas precisam ser reconhecidas. E aí, nas minhas lentes, nessa pesquisa, se voltaram para três grupos especificamente: um de mulheres negras - os coletivos de mulheres negras que se formam a partir dos coletivos de mulheres no interior da capoeira. Outros dois coletivos de mulheres, que a gente chama de mulher tambor, ou tambora, que são coletivos de mulheres percussionistas que passaram a tocar atabaque sagrados. Enquanto aspectos relacionados à comunidade LGBTQIAPN+ onde tudo isso é refletido. Através de dois coletivos, o capoeira para todes, um coletivo lá de Campinas, e o coletivo LGBT do próprio grupo Nzinga, que é o coletivo que reúne pessoas de vários países onde tem o Nzinga, onde que tem já uma produção, um ativismo, uma agenda política própria Então, é um pouco disso que eu estou dedicada nessa última pesquisa, pensando como esses grupos articulam esses aspectos ambicionados do ponto de vista da restauração através da justiça epistêmica. Ou a definição da justiça epistêmica como base para todas as outras. Ou seja, o conhecimento sobre o outro como motor principal da transmissão desses saberes

P: Qual é o seu entendimento? Qual é a definição de justiça epistêmica?

Mestra Janja: A justiça epistêmica é aquela justiça que reconhece oque se faz primeiro, reconhecendo que numa sociedade de conhecedores você tem comunidades que são comunidades epistêmicas, comunidades tradicionais, comunidades técnicas, comunidades culturais ou de linguagens outras. E que, portanto, a gente não está mais topando pensar isso tudo através da lente da comunidade epistêmica que é a academia, que é a universidade corrompida, inclusive com outras bases cosmológicas que não nos interessam mais Tem um movimento de pensar essas matrizes coloniais.

P: Como sua trajetória pessoal na capoeira influenciou sua decisão de se dedicar à pesquisa sobre gênero, raça e sexualidade?

Mestra Janja: Eu só sei ser sendo. Só sei fazer fazendo, entendeu? Eu acho que eu não vi quando aconteceu, sempre foi assim. Sempre foi assim. Eu tinha 3 anos de capoeira quando eu resolvi escrever sobre a psicologia da capoeira. Primeiro texto, de lá para cá, eu sempre achei que a capoeira permite ser trabalhada, ser tratada por várias linguagens, várias, várias linguagens Eu sou essencialmente curiosa Na realidade, a capoeira me ensinou uma coisa muito bacana, que é me fazer um ser aprendente. Então é isso. Me fazer um ser aprendente, que está no mundo. Você olhar para o conhecimento, saber que ele é como disse Pastinha: "Inalcançável ao mais sábio capoeirista"! Isso é fantástico! O mínimo que me chama é estar presente

Pedro: E desse tempo para cá, desse seu primeiro texto, o que você gostaria de compartilhar sobre a psicologia da capoeira?

Mestra Janja: Iiiii... hahahahah Eu não sei porque chamar de... hoje eu nem chamaria de psicologia da capoeira, que eu não arriscaria ser faxineira de Freud Mas, é um textozinho de uma super jovem capoeirista, tentando olhar para capoeira e perguntando para si própria: O que é que acontece quando a gente inverte as noções de estar no mundo com as reparações invertidas, de cabeça para baixo, etc. O que acontece? Quando você é treinado tendo o outro como aquele que você vai usar para você crescer, e você descobre no meio do caminho que é ele que te forma, ele que te constitui; então assim, coisas dessa natureza. É como eu entrar numa roda, pegar um berimbau e cantar: ô sim sim, sim ou não não não Eu não vejo canção mais complexa para mim, dentro da roda de capoeira, do que cantar isso, sabe? Porque ela é tão cheia de sentido, mais do que de significado. Ela é tão cheia de sentido. Ela leva você pra lugares. Tem coisa que é bacana não poder ser dita com palavras, e essa talvez seja uma delas.

P: É possível apontar diferenças entre o estilo de jogo da linhagem do mestre João Pequeno e da linhagem do mestre João Grande? Se sim, quais? Quais seriam? Há alguma outra característica, que não do jogo em sí, que você gostaria de destacar?

Mestra Janja: Olha, eu acho que é possível você apontar diferença dentro do mesmo grupo até. Dentro do mesmo grupo. Assim, acho que no passado a gente tinha comunidades mais fechadas Agora, as comunidades são abertas Os grupos se internacionalizam, eles têm outras formas de convivência, eles têm outras trocas de saberes. Eles têm, inclusive, a internet. Então, você vai encontrar no aluno do seu grupo um movimento que você nunca passou. Uma abordagem sobre o movimento que você nunca [fez]. E é assim. São todos diferentes. Eu acho que é mais fácil falar do que assemelha: uma capoeira ritualizada, uma capoeira pautada numa dinâmica musical. Marcada, amarrada, como diria tanto o João Pequeno quanto o João Grande. Então tem coisas que se assemelham. E que qualquer pessoa que chegue e passe numa roda de capoeira vai dizer: essa é uma roda dessas escolas de capoeira, porque elas têm isso como uma marca muito forte. Enquanto, por exemplo, Nzinga, FICA, já tem uma marca mais pegada do GCAP, uma musicalidade mais do GCAP. Eles têm mais a marca do Mestre Pastinha.

P: O que mais te admira na capoeira Angola, que você gostaria de destacar pra atrair olhares de quem não conhece a capoeira, de quem está simplesmente lendo a revista?

Mestra Janja: Muito difícil dizer hahahaha Então eu vou fazer uma escolha impossível, né? Talvez isso mesmo. Quando eu entrei na capoeira, eu dizia assim: "a capoeira é o quê?".

E aí, uma das primeiras coisas que eu aprendi foi que ela é impossível de ser definida. Como luta, como uma dança ou como um esporte… Ela não cabe em nenhuma definição. E eu achei isso muito charmoso, achei fantástico. Mas eu gosto muito de saber que a capoeira é, acima de tudo, uma prática comunitária Eu gosto muito de pensar isso como uma potência muito, muito, muito grande, porque tem uma interrupção de aspectos individualistas e de isolamento, que as pessoas estão jogadas através das suas vivências em redes sociais, que aí eu acho que esses são oásis, claraboia, chame como quiser, são espaços de um respiro, de uma vida integrada a outros saberes, a outro tempo, que eu acho que é muito importante da gente refletir sempre

P: Eu, quando treinei no Nzinga, no espaço da Vila Sônia, eu ficava muito impressionado com as crianças, tinham crianças ali de sete, oito anos que jogavam com uma fluidez, com conhecimento, tocavam, cantavam. E foi uma coisa que me ficou muito marcada, porque eu já vi trabalhos bons de capoeira com crianças em outros lugares. Mas eu lembro daquilo me impressionar demais. Também imagino que seja uma pergunta meio difícil de responder, mas… o que tinha ali para isso acontecer? Como que essa magia surgiu?

Mestra Janja: Olha, eu acho que uma das coisas que a gente aprendeu é que criança não gosta de ser "infantilizada" Ela não gosta Primeiro, você ter um grupo onde criança treina com adulto, onde ela não tem um mundo que separe. É uma vivência como é no mundo real, como ela está dentro da casa dela: tem adulto, tem criança. Então, não tem turma de criança, não tem turma de adulto, separadamente E, segundo, é o aprendizado mesmo, fundamento, vamos dizer assim, fundamento número um: você será sempre mais velho para outra pessoa, a hora que você for mais velho de alguém, você passa a ter responsabilidade com a formação dela, então, de uma certa forma, aquelas crianças foram estimuladas a aprender, mas elas foram estimuladas a aprender sabendo que elas ensinariam, que elas seriam chamadas a ensinar Então, ainda hoje a gente faz isso Ontem eu fui aqui em Salvador, dar o treino do grupo Cheguei lá e tinha um garoto de 14 anos, dizendo que estava muito tenso porque estava se preparando para fazer o vestibular do Instituto Federal. Aí eu falei: Ah, eu tenho uma solução bacana pra curar a tua tensão: puxa o treino de hoje.

P: Não vai se preocupar com outra coisa

Mestra Janja: Puxa o treino de hoje. Então você tem, aí, uma criança ali na frente, você tem um conjunto de adultos fazendo o que ele orienta, ele vai corrigindo. Eu acho que não é uma coisa mágica. É uma coisa mesmo de você refletir sobre processos formativos, que reintegrem essa coisa da convivência, da prática comunitária, onde todo mundo tem sua importância, seu valor.

P: Tem alguma pergunta que você gostaria que eu tivesse feito?

Mestra Janja: Não

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Entrevista Mestre Jogo de Dentro

Pedro: Da sua perspectiva, o que você tem para contar para a gente da história desse espaço (Cedéga) e a história que esse espaço carrega, através do conhecimento da Capoeira Angola

Mestre Jogo de Dentro: Meu nome é Jorge Egídio dos Santos, sou nascido em Alagoinhas, Bahia Iniciei na capoeira com o Mestre João Pequeno nos anos 80, no Forte do Santo Antônio, em Salvador. Hoje, dou continuidade ao legado do Mestre

João Pequeno na Capoeira Angola. Morei em Campinas por 9 anos, onde dei aulas no DCE da Unicamp, na Chácara Primavera e na 13 de maio, e decidi abrir um espaço para dar aulas e realizar diversas atividades em Barão Geraldo, ao lado do terminal Então, eu decorava esse espaço de forma similar à decoração do Cedéga Tinha uma foto do mestre, um atabaque ao lado, um berimbau na parede e um mural, que representava isso aqui, com um desenho do Pelourinho.

Quando retornei para a Bahia, em 2007, depois de 9 anos morando em Campinas, retirei toda a decoração desse espaço para representar um pouco da realidade, da cultura mesmo. A decoração para mim traz essa coisa do jeito que a Capoeira Angola sempre foi A Capoeira Angola não aceita um espaço com pode até acontecer, mas a energia é outra… não aceita um espaço-tempo com muitos espelhos na parede, com essa coisa toda moderna. Na Capoeira Angola, a gente respira,sente o suor das pessoas e também se conecta com o passado. De certa forma, todo o material e equipamento daquele espaço em Barão Geraldo, quando voltei à Bahia, eu doei para o espaço do Danny, aqui no Cedéga, que até hoje mantém. Essa é toda a história que deixei em Barão Geraldo, agora preservada aqui.

Quando vejo um banco que foi usado há 15 anos atrás, ou um berimbau que tocamos quando eu morava em Campinas, ainda sendo cuidado e preservado aqui, para mim isso é preservar a ancestralidade e a história da capoeira de Campinas Então, esse espaço traz toda essa energia, com imagens do Mestre Pastinha, do Mestre João Pequeno, e de todos esses mestres que se foram. Acredito que essa ancestralidade está sempre presente A Capoeira Angola é isso E fico feliz de saber que o espaço mantém tudo isso como uma forma de resistência.

Pedro: Sobre tecnologia ancestral, pensando em tecnologia não como aparelho ou equipamento, mas como o conhecimento da técnica e da cultura, qual é o seu entendimento sobre a tecnologia ancestral?

Mestre Jogo de Dentro: A tecnologia ancestral é a oralidade Era a forma com que os mais velhos passavam seu conhecimento, transmitindo seus ensinamentos. Você conviver, viver e ver o que ele estava fazendo no dia a dia e absorver. Quando falavam sobre um conhecimento seja uma música, um toque, um ritmo, ou uma dança não havia a facilidade de hoje, em que conseguimos ver tudo na internet ou em câmeras Esse processo acontecia naquele momento de convivência. Portanto, a tecnologia ancestral é isso: a capoeira, o samba, tudo isso é oralidade. Os mais velhos passavam seu conhecimento de forma direta e, com essa oralidade, você absorvia, entendia e convivia com eles. Essa era a tecnologia deles. E, infelizmente, hoje estamos perdendo isso. Hoje, os mais velhos não estão falando muito, e muitas vezes, quando a gente ensina o movimento e não consegue transmitir, as pessoas não entendem. No meu caso, tento ensinar de forma física, mas, além da aula física, tento transmitir esse conhecimento para que as pessoas possam entender e fazer a conexão entre o prático e o teórico. Essa é a realidade.

Espaço Espaço Cedéga Cedéga de de Campinas Campinas

PARTE 2 PARTE 2

Entrevista - Mestre Danny

Pedro: Mestre Danny, gostaria de saber um pouco da história do Cedega. Como surgiu? Há quanto tempo?

Mestre Danny: O Cedéga surgiu aqui (no CDHU) em 2006 A gente fez a ocupação, aqui é um espaço público, é uma área pública Este aqui é um galpão que foi construído para servir de alojamento para os trabalhadores que construíram os prédios do CDHU. Era tipo um alojamento, o restaurante da galera, o pessoal guardava os equipamentos. Quando terminaram a construção, três meses depois, percebi que o espaço estava abandonado Eu já vinha de uma história de ocupação desde 2000, quando ocupamos a estação de trem chamada Guanabara Essa prática de ocupar espaços públicos para fazer atividades culturais com a comunidade já começou lá atrás. Inclusive, outro trabalho de capoeira comecei lá em 2003, Mestre Jogo de Dentro também ia nas rodas que eu organizava lá nessa estação de trem. Nós fomos desalojados pela Unicamp, e foi através desses desalojamentos que consegui um apartamento aqui (no CDHU) Logo depois, percebi que precisava de um espaço para dar aula de capoeira, e vi que esse galpão estava abandonado, sendo ocupado por pessoas consumindo drogas. Eu era síndico e fiz um abaixo-assinado pedindo apoio na ocupação, conseguindo várias assinaturas de moradores e outros síndicos. Essas assinaturas levei para direção regional do CDHU, que ficava no centro, e consegui falar com o diretor geral do CDHU. Inclusive, tinha também um morador daqui que administrava outro galpão, que era usado para a distribuição de frutas do Ceasa, e ele me apoiou na ocupação. Ele foi comigo lá, conversamos com o diretor, na época era o Frate, que disse que não poderia me dar nada escrito, nenhuma autorização escrita, mas ele falou: ó, entra e faz o seu trabalho Verbalmente E foi isso que fiz

Pedro: E hoje tem o reconhecimento da Secretaria de Cultura, não é?

Mestre Danny: Na verdade, não. Aquele reconhecimento é do grupo de capoeira. Os grupos de capoeira, porque foi um movimento da salvaguarda de Campinas. O grupo Semente do Jogo de Angola foi reconhecido. Então não há um espaço cultural, aqui nós ainda não temos nenhuma garantia da nossa permanência aqui, apesar de já fazer 18 anos, que a gente tá aqui, não existe nenhuma garantia

Estamos montando uma associação de modo que, com o CNPJ, consigamos a garantia de permanência neste espaço.

Quais são os dias das atividades de capoeira do grupo?

Adultos: Segunda, quarta e sexta. Segunda 18h no DCE da Unicamp, e quarta e sexta 19h no Cedéga Crianças: Quarta e sexta 18h no Cedéga

Endereço Cedéga: Rua José Mendonça, 61, Vila Renascença, Cep: 13067-350, Campinas/SP (em frente ao CDHU Premium Hotel do Padre Anchieta). Contato Celular: (19) 99117-0194. E-mail: dasoan@yahoo.com.b

fotos: Adriano Sgrignero

MEMÓRIA - RESISTÊNCIA - FUTURO

O Baobafricampinas é um movimento de reavivar a memória e celebrar o povo preto de Campinas Através de ações de retomada e relato da memória campineira, realizadas por meio de pesquisas, compartilhamento de saberes e organização das experiências obtidas, o movimento fortalece a ancestralidade e a resistência negra na cidade.

Em momentos sombrios de dor e perda, e no ato de rememorar a resistência do povo preto em Campinas contra o massacre histórico deste território, o Baobafricampinas enraíza a história dos nossos, abrindo caminho para o processo de retomada da consciência, da ação e da cura através da ancestralidade. Esse movimento é realizado pela Nação Nagô, constituída por territórios e movimentos negros de Campinas, por negros afrodescendentes guiados por Olorum, para a construção de um mundo mais do nosso jeito, para as nossas crianças.

OBJETIVOS

Retomada da memória para a projeção do futuro

Valorização e fortalecimento dos territórios e culturas afrobrasileiras

Estimular a criatividade, trocas de saberes e união da comunidade

Construção coletiva de um mundo mais do nosso jeito

LAMENTO

Hoje, na roda de capoeira, Lembrei da orquestra do Titanic, Costurando a trilha sonora De um final já desenhado. Meus olhos ardem,

O sol já não é mais normal.

O pior ar do mundo, O pantanal se queimou.

Fumaça no prato, Fogo por toda parte, O rio secou, A madeira queimou.

Meus pulmões se apertam, Enrolam meu coração.

Será que já é hora Do toque de lamento?

Hoje, no almoço, tem agrotóxico, Temperado com sangue de índio. Mas, quando o céu cair, Nós vamos cair junto.

CAIS CAIS

FOTO: GLENDA ALONSO

MAYARA: Como surgiu a ideia para essa IC?

PI: Eu acho que sempre quis fazer IC, desde que comecei a graduação. Eu me interessava muito pela ideia de pesquisar enquanto ator. Só que eu não tinha a ideia matutada do que pesquisar O que eu sabia é que queria uma coisa prática. Eu tinha muito interesse, no começo, em pesquisar algo envolvendo o candomblé, mas era um interesse muito pessoal. Eu e a Grácia tentamos achar uma temática que envolvesse o ator e o candomblé, mas eu senti que queria me aproximar do candomblé mais por mim do que para pesquisar sobre ele, para não ser apenas esse corpo de pesquisa indo atrás do candomblé para pegar coisas. Eu já fazia capoeira e comecei a me interessar muito por isso, tanto pela questão de ancestralidade e do pertencimento, quanto também Com matérias da faculdade. Eu comecei a me perguntar como ligar a capoeira para um treinamento de ator. E FOI AÍ QUE CHEGAMOS NA IDEIA. a partir daí, pensei em tudo o que queria

lugar, para nutrir o imaginário que transpassa a capoeira e, principalmente, essa questão ancestral e negra Eu senti que meu projeto estava muito amarrado nesses pontos. Como foi essa viagem? Incrível. Primeiro, porque eu fui sozinho Foi meu corpo ali sendo transpassado diretamente a partir da minha perspectiva e não pela de alguém que estivesse comigo.

Muitas coisas me afetaram

Isso aconteceu no meio do ano. No primeiro semestre, fiz laboratórios, trabalhei bastante sozinho. Chamei a Mariana Procópio para conduzir um laboratório, e a Grácia me orientou bastante, mas a primeira parte foi basicamente eu indo para a sala de trabalho para fazer laboratório sozinho e investigar a partir dali. Durante todo esse primeiro semestre, muitas coisas me apoiaram. Consegui fazer cursos no Lume, que também tinham muito a ver com a forma como eu estava investigando o trabalho do ator.

M: Quais foram esses cursos?

PI: “Treinamento para Atuadores", com o Jesser, e “O Palhaço e o Sentido Cômico do Corpo”, com o Ricardo. A priori, nem parece ter relação, curso de palhaçaria, mas, ao mesmo tempo, estava muito conectado, porque o treinamento de ator está intrínseco dentro dos atores do Lume. Foram trocas muito importantes

Eu sinto que fui carregando essas experiências comigo, inclusive na sala de TRABAHO No primeiro semestre, também fiz aulas com uma mãe de santo que veio dar aulas na Unicamp. E tudo foi me alimentando, enquanto eu também praticava capoeira tanto aqui na Unicamp quanto no grupo do qual eu faço parte.

m: Qual grupo?

pi: O Grupo de Capoeira IBECA, do Mestre Formiga. E aí, tudo isso foi meio que se juntando, fazendo uma grande mistura na sala de trabalho, ajudandome a entender o que estava pesquisando: concentração de energia, velocidade, ritmo… e como eu usava a capoeira para investigar tudo isso. No meio do ano, fui para a Bahia e tudo foi fortificado pelo imaginário que trouxe dessa experiência. Então, voltei em julho, escrevi o relatório parcial e voltei para a sala de trabalho para o segundo semestre. A partir daí, pensei “agora preciso de gente, preciso amalgamar pessoas”.

Eu queria chamar pessoas para somar comigo, seja na música, na luz, seja, na orientação de cena, ou até em provocações.

m: Acho que esse espírito de amalgamar pessoas moldou muito a cena que assistimos. Mesmo com uma pessoa no palco, a palavra “coletividade” ficou na minha cabeça. Também achei muito legal que você tenha trazido uma lista por escrito de agradecimentos.!

Pi: É, tem muitas pessoas. É uma coisa muito simbólica. A gente, que é ator, trabalha com muita coisa simbólica, né? E isso, pra mim, é algo que faz muito sentido enquanto ética de trabalho, agradecer devidamente Eu trabalho com iluminação e, muitas vezes, as pessoas esquecem de agradecer os técnicos, quem ajudou nessas montagens, e sem aquelas pessoas não tem espetáculo A Grácia falou que ficou muito feliz de ver tantas pessoas me dando suporte, que achou isso uma das coisas mais belas e importantes. Eu concordo, teve muita gente ali me ajudando

M: Apesar de não incluir o candomblé como tema da proposta, dá para ver que ele se integrou muito àquilo que você fez.

Pi: Acho que esse talvez tenha sido o segundo eixo mais forte dessa pesquisa, depois da capoeira Veio meio que como uma coincidência. eu descobri que ia ter aula de Dança dos

Orixás na Unicamp, no departamento ao lado. A Rachel me chamou pra ir, a mãe de santo me convidou para entrar e eu falei: “quero ficar aqui". Eu pedi licença para a mãe e ela deixou eu participar das aulas

Isso foi me nutrindo de uma forma muito pessoal e foi escapando para outros lados. Eu fui enxergando outras coisas de modo diferente, fui encontrando simbologia em outras coisas.

No primeiro semestre, eu ainda tinha muita dificuldade de fazer essa relação com a pesquisa, a Grácia via mais, mas eu achava que estava fazendo duas coisas diferentes. Então eu fui para a Bahia e a Bahia é candomblé. Isso se ligou com muita força para mim. Eu percebi que a pesquisa já estava relacionada com o candomblé e eu precisava começar a entender isso conscientemente

M: Muitas das coisas que você está falando foram coincidências que acabaram fazendo sentido para a pesquisa. Você acha que isso pode ter um motivo espiritual?

Pi: Ah, eu sempre sinto que sim. Desde que o candomblé foi entrando, eu fui entendendo outras coisas a partir de outros olhares. E para mim, sim, faz todo o sentido A primeira coisa que eu fiz assim que cheguei em Salvador foi ir no terreiro de Oxumarê, e estava acontecendo uma fogueira de Xangô. Para mim, isso foi muito simbólico, num sentido de proteção Eu pedi

proteção ao babalorixá de lá e, no último dia de pesquisa, isso veio com muita força para mim: a pesquisa tinha dado muito certo, não tinha passado nenhum grande sufoco, nenhum perigo, nada Para mim, tudo foi fazendo muito sentido, as coisas foram se casando Eu sentia que tinha que ser dessa maneira, sentia que precisava ter isso, sentia que eu precisava falar disso… Então, com certeza, sim.

M: E você escolheu começar sua apresentação com a Ramunha, né?

Pi: Isso também foi uma grande coincidência. Eu não queria Ramunha, eu queria uma música de guerra. A gente está entrando em um ambiente de guerra, tráfico negreiro, captura de pessoas, escravidão Queria uma coisa mais guerra, um toque de Xangô, um toque antigo. Só que o Gabs fez o som e eu queria que isso se ligasse ao funk

M: De onde surgiu o funk nisso?

Pi: Mano, a capoeira é periférica Tudo o que é ancestral, o que é preto está na periferia, longe do que é considerado belo. Eu tenho uma vivência muito ligada ao funk, porque o bairro onde eu moro, em São Paulo, é um bairro da periferia que tem muito funk. E, em algum momento, eu comecei a entender as relações entre a movimentação da capoeira e passos do funk paulista A Ramunha é o que melhor se conectava com o funk para fazer essa transição. O Gabs falou que dava para linkar melhor. Mas depois daquela nossa conversa,

para mim, fez muito sentido ter a Ramunha no começo. Na vida, eu sinto que grandes coisas são uma grande coincidência e você vai articulando elas depois.

M: De onde vieram as canções?

Pi: Tem uma canção yorubá que a mãe de santo me passou, de Oxum Eu pedi uma canção que falasse de amor próprio e amor ao outro, porque para mim essa era a dualidade do berimbau: de ser uma pessoa e também representar uma relação da pessoa consigo mesma, como se fosse um espelho. A outra música foi

“Quanto tempo faz”, que é da mestranda Kallú. Uma colega do grupo do IBECA, a Saori, cantava sempre e eu pedi para ela. É uma música linda que essa mestra fez quando o mestre dela partiu. Então tem uma canção de capoeira e uma canção do candomblé.

M: Uma coisa bem marcante na apresentação foi o personagem do chapéu. Como ele surgiu?

Pi: O ser do chapéu surgiu como um contador de histórias, muito inspirado pelas coisas que eu estava lendo sobre a oralidade na capoeira, para preencher a história com simbologias Eu fui colocando essas aparições da entidade para dar uma estrutura maior à apresentação e criar uma conexão com o público. Quando a história estava indo para um lado mais dramático, a entidade trazia uma linha mais cômica. Eu gosto muito do simbólico, então não queria que fosse algo tão concreto, mas algo mais amplo, com metáforas, simbologias,

danças, gestos e movimentos. Então, eu fui entendendo que talvez o chapéu pudesse ser esse guardião de búzios e traçar a relação da pessoa com os búzios.

Mayara: Eu assisti nas três vezes e percebi várias mudanças entre uma apresentação e outra. Você pode falar um pouco

Pi: Eu sinto que, a cada troca com o público, você vai entendendo mais coisas Eu só fui realmente compreender a dimensão de cada elemento, principalmente da entidade, depois de abrir a conversa com o público após a primeira apresentação. As três apresentações foram momentos de experimentação, para entender como eu afeto o público e como posso trazer uma experiência melhor e mais coesa Se tivesse uma quarta apresentação, eu mudaria mais coisas, para testar. É meio que um grande jogo com o público. Um jogo olho a olho, como na capoeira É a relação que se estabelece ali na hora: o que eu entrego para o público e o que o público me devolve

FOTO: IVAN LUCCA

PesquisadeCampoemSalvador,Bahiatransformaçõesentreosujeitoeofazer artístico.

FilipeBatistadeOliveira

RESUMO

Oartigoaborda,atravésdaópticapessoaldopesquisador,arealizaçãodeumapesquisade campoemSalvador,Bahiaenquantoprocedimentometodológicodepesquisavisandoa criaçãodeumadramaturgiacênicaautoralquesedánarelaçãoentreotreinamentodeatore otreinamentodecapoeira.Trata-sedeumapartedoprojetodeIniciaçãoCientífica:Capoeira: dramaturgiacênicaapartirdainvestigaçãodeumtreinamentodeatorpautadonacultura afro-brasileira,fomentadopelaFAPESP(2023/15741-8).

Assim,apesquisadecampofoirealizadademodoanutriretransformaroimaginárioeo sujeitopesquisador,relaçõesatravessadasporumcontextodenegritudeeancestralidade individualdoatoretambémdacapoeira Portanto,todoprocedimentodepesquisatemno horizonteaperspectivadacapoeiraedacenaenquantolentedeseleçãodemateriaisaserem observadosevisitadosepartemdasideiasdeCo-habitarcomaFonte,dométodobailarinopesquisador-intérprete(BPI),deGrazielaRodrigueseperspectivastrazidasporNaomiSilman, apartirdolivroLumeTeatro25anos

ACESSEAQUIOARTIGONAÍNTEGRA

Texto: Alice Da Silva Santos Fotos: @Pac.jpg e Beatriz LuMO Modelos:

Leandro Rodrigues dos Santos de Oliveira, Yasmin Cristine Alves Bueno, Waléria Simony Oliveira Inácio De Sá, Andresa Alves da Silva

reconhecimento da nossa própria imagem, através do nosso corpo, rosto, cabelo e até nossas roupas, como referência de beleza Para nós, pessoas pretas, esse movimento passa por diversos atravessamentos que moldam nossas perspectivas enquanto ainda estamos nos descobrindo no mundo. Desde cedo precisamos estar elegantes aos olhos dos outros, para que não sejamos violentados por esses, que convenhamos, não tem nada de parecido conosco. Porém, quando essa percepção de si e a construção de uma autoestima boa começa, o nosso olhar passa do “ser bem visto” para o “eu me vejo bem” e esse movimento, de trocar o foco, faz ser sobre nós!

Com uma nova perspectiva o cuidar da nossa imagem passa a ser pelo ato de se amar, de se cuidar, sobre ser potente e começar a reconhecer isso. Ainda mais quando estamos entre os nossos, que nos fazem reforçar essa potencialidade, esse movimento passa a ser o nosso conceito de autoestima. Mesmo que o sufixo seja “auto”, que diz respeito a algo sobre si, a autoestima negra é coletiva Nosso cabelo black, na régua, nosso estilo chave, misturam as referências dos que andam conosco no dia a dia, dos que nos criaram mostrando desde cedo quem são em sua grandiosidade, mesmo sem perceber

É daqueles que produzem as artes que consumimos, que saem do mesmo território que nós, deixando sua marca de inspiração e semelhança pelo mundo. Com uma nova perspectiva o cuidar da nossa imagem passa a ser pelo ato de se amar, de se cuidar, sobre ser potente e começar a reconhecer isso Ainda mais quando estamos entre os nossos, que nos fazem reforçar essa potencialidade, esse movimento passa a ser o nosso conceito de autoestima. Mesmo que o sufixo seja “auto”, que diz respeito a algo sobre si, a autoestima negra é coletiva. Nosso cabelo black, na régua, nosso estilo chave, misturam as referências dos que andam conosco no dia a dia, dos que nos criaram mostrando desde cedo quem são em sua grandiosidade, mesmo sem perceber É daqueles que produzem as artes que consumimos, que saem do mesmo território que nós, deixando sua marca de inspiração e semelhança pelo mundo.

Empatia, amor, compaixão, a responsabilidade de olhar pra si antes de validar o olhar do outro, porque afinal, estamos definindo quem somos, estamos reafirmando que respeitamos nossos limites, amamos nossos defeitos e qualidades por igual e que quando vemos pessoas semelhantes a nós ficamos felizes de ver algo tão belo e parecido conosco. Quando nos amamos e enxergamos beleza ao se olhar no espelho, ao revisitar os caminhos da nossa trajetória, estamos amando nossos ancestrais, que hoje se fazem presentes em nós em nossa pele, nosso corpo, nosso estilo e nosso corre Quando há amor em se olhar, saudamos e recebemos o axé dos nossos guias através da paz que é se reconhecer e amar a grandeza e potencia que é ser negro.

“COM

UMA NOVA PERSPECTIVA O CUIDAR DA NOSSA IMAGEM PASSA A SER PELO ATO DE SE AMAR, DE SE CUIDAR, SOBRE SER POTENTE E COMEÇAR A

RECONHECER ISSO.”

MARSHAPELOORGULHO

A universidade é um espaço que deveria ser inclusivo e diversificado, mas será essa arealidade?Desdequandoeaquecustoa universidade começou a verdadeiramente abraçar a diversidade e a inclusão? Esses são alguns dos questionamentos que seguemsendoimportantesdentrodavida acadêmica.A inclusão de pessoas LGBTQIAP+ tem sido uma batalha constante na sociedade e dentro das próprias universidades Movimentos como os Núcleos de Consciência Trans e os Coletivos LGBTQIAP+ têm desempenhado um papel significativo nesse processo dentrodaUNICAMP,marcandoconquistas comoascotastrans,alcançadasdurantea grevede2023.

No entanto, os desafios persistem e um tema recente que gera controvérsias e vem sendo debatido é a adoção de banheirosunissexnoscampusdeLimeira.

O Coletivo Marsha pelo Orgulho desempenha um papel fundamental na promoção da inclusão lgbt+ dentro da comunidadeuniversitáriaemLimeira.

A Revista Capoeirando trás um pouco da história e os depoimentos des estudantes que compõem o Marsha, oferecendo uma visão mais profunda sobre suas lutas, conquistas e desafios dentro do contexto universitáriomaUNICAMP:

"O coletivo Marsha pelo Orgulho é o coletivo LGBTQIAP+ da Unicamp Limeira, cujonomehomenageiaMarshaP.Johnson: presente na revolta de Stonewall, marco importante da luta dos direitos LGBTs; fundadora da Street Transvetite Action Revolutionaries, uma casa de acolhimento ajovenstransedragsemsituaçãoderua;e fundadora da Gay Liberation Front, sendo pioneiranalutapelosdireitosLGBTs.

Fotode:

MARSHAPELOORGULHO

O coletivo surgiu em 2020 com a falta de um espaço de acolhimento para pessoas LGBTs,edesdeentãovemtrabalhandoem atividadesparapromoverespaçosseguros para a comunidade, bem como fortalecer e unir pessoas LGBTs para que haja um espaçodeacolhimento.

Napandemia,asprincipaisatividadeseram lives de debate sobre assuntos da comunidade, além de rodas de conversas exclusivas para a comunidade, com o fim deserumsuporteemocional

Atualmente, o coletivo promove tanto eventos externos, com o objetivo de conscientizaçãoepermanênciaestudantil, quanto internos, para acolhimento e suporteemocional.Oobjetivodocoletivoé trazer representatividade no âmbito da universidade, além de trazer pautas de conscientização e criar uma rede de apoio parapessoasdacomunidade

Em 2023 foi fundado o Núcleo de Consciência Trans de Limeira, um núcleo dentro do Marsha para pessoas trans. Nossas principais atividades são rodas de conversas internas para apoio em situações dentro ou fora do ambiente estudantil.

Tambémtivemosparticipaçãonagrevede 2023 na luta e conquista de cotas trans, e sempre estivemos presentes em lutas e atosdomovimentoestudantil.

No geral, o Marsha promove espaços seguros para que todas as pessoas possamsesentirlivreseacolhidas,livresde julgamentos, também é um espaço políticoedediscussõeseconscientização

Entendemos que em meio a tanto ódio e agressão, a tantas pessoas nos desejando mal, ter um espaço de pertencimento e apoio é essencial não só para lutarmos, mas resistirmos também sendo felizes e tendoorgulhodenossasjornadas!”

“A gente nota uma diferença entre aqui (Limeira) e Barão Geraldo. Aqui às vezes parecemenos "faculdade", aquiémenor.

Mas justamente por isso eu acho que pertencimentoécomodescreveoMarsha aqui em Limeira. Pertencimento, porque vamosconstruindoumlaçoenossentindo pertencentes à faculdade, pertencimento, porquenosacolhemoseabraçamoscomo um! Estamos todos juntos nisso e vamos tentarsuperarasdificuldades

Serumapessoalgbt+édifícileémaisdifícil ainda sem apoio Às vezes a gente vive numa bolha e depois que sai, nesse caso uma mudança de cidade pra estudar numafaculdade,ficaperdido.

O Marsha pra mim foi esse apoio e esse encontro. Mesmo que fôssemos "poucos" já era algo E talvez por sermos "poucos" (pensando novamente em algo comparado a barão) foi o que criou mais ainda esse vínculo, e eu amo muito todos queconhecinesseespaço.

O Marsha tá crescendo cada dia mais e isso me deixa muito feliz. A ideia é sermos cada vez maiores e mostrar que sim, vamos ocupar todos os lugares, começando pela UNICAMP Estou muito orgulhoso de ser co-presidente e ver para ondeocoletivoestácaminhando”

Aru,co-presidentedo Marsha GraduandoemADS (AnáliseeDesenvolvimentodeSistemas)

Texto: Lilia

Foto: Lili França

Taça das favelas de Campinas: Um resgate do futebol popular

A Taça das Favelas é um torneio de futebol amador, configurando-se como o maior campeonato de favelas do mundo. Organizado pela Central Única das Favelas (CUFA) e produzido pela InFavela, empresa da Favela Holding, foi disputado pela primeira vez em 2012, no Rio de Janeiro.

Com mais de 20 anos de atuação nas favelas brasileiras, a Central Única das Favelas desenvolve iniciativas culturais voltadas ao esporte, à educação, à cidadania e à arte, utilizando a cultura hip-hop como ferramenta, com o objetivo de promover a integração e a inclusão social nas comunidades periféricas. Desse modo, a Taça das Favelas é apenas um dos projetos desenvolvidos e encabeçados pela CUFA, que também atua nos âmbitos econômicos, como parceira social da Expo Favela Innovation, organizadora da maior feira de negócios de favelas do mundo no segmento digital, além da organização da Taça das Favelas de Free Fire, entre outros segmentos e áreas que visam o olhar para as periferias.

Em 2019, foi realizada a primeira edição da Taça das Favelas em Campinas, na qual Vila Brandina foi campeã no masculino, enquanto São José conquistou o título no feminino. Em 2022, São Bernardo e São Marcos venceram no masculino e no feminino, respectivamente. Já no ano passado, a comemoração ficou com São Bernardo (masculino) e Paranapanema (feminino)

Em 2024, a competição contou com a participação de 32 times na categoria masculina e 16 na feminina, envolvendo 48 favelas e um total de 3.117 atletas. Na categoria masculina, os jogadores eram nascidos em 2007, 2008 e 2009, enquanto, na feminina, as participantes tinham a partir de 14 anos, sem restrição de idade. A final da edição foi realizada no dia 23 de junho de 2024, no Estádio Brinco de Ouro da Princesa, do Guarani. A disputa feminina teve como finalistas as equipes de São Marcos e Cafezinho, enquanto o título masculino foi disputado entre São Cristóvão e Vila Bela. As arquibancadas do Brinco de Ouro estavam repletas de alegria e celebração dos torcedores, que se reuniram para apoiar seus amigos, familiares e suas comunidades. É importante destacar que a entrada para assistir à final foi gratuita. O protagonismo popular, que voltou a ocupar os espaços das arquibancadas de onde nunca deveria ter saído, apontou para uma direção oposta ao que tem acontecido no futebol brasileiro, marcado pela elitização dos estádios e dos ingressos, excluindo os verdadeiros protagonistas A Taça das Favelas conseguiu resgatar esses momentos de protagonismo, revelando a verdadeira essência e força do futebol brasileiro.

Com o show de ambos os lados das torcidas, cheio de provocações e gritos eufóricos, os jogos foram movimentados e com a cara do futebol brasileiro, repletos de jogadas de efeito, dribles, gols e muitas comemorações. Com isso, os campeões da 4ª edição da Taça das Favelas de Campinas foram os times de São Marcos, no feminino, e Vila Bela, no masculino. A festa, contudo, não durou somente dentro do estádio, mas estendeu-se para os bairros e arredores do Brinco de Ouro, onde diversos ônibus conduziram as torcidas de volta às suas respectivas áreas. O samba e o funk dominavam a festa, acompanhados de diversos gritos e músicas das torcidas. O domingo em Campinas tornou-se popular e alegre, demonstrando, assim, a verdadeira essência do futebol brasileiro.

Os jogos foram realizados no período da manhã e da tarde, divididos em futsal e vôlei pela parte da manhã e os jogos indígenas pela da tarde.

O torneio foi um sucesso tanto nas modalidades esportivas de futsal e vôlei, quanto nos jogos indígenas com um circuito de corrida de tora, seguido de arco e flecha e por último zarabatana.

IMAGENS DA ABERTURA

O torneio Arandura é fruto do trabalho dos bolsistas indígenas do projeto Arandura, da professora Josely Rimoli, docente responsável, e seus apoiadores e colaboradores

Um outro ponto positivo do torneio a ser mencionado foi a participação da indígena Lu Ahami e sua família, responsáveis por trazer um pouco da culinária indígena, com exposição e venda de artesanato. Lu Ahami e Daniel Awa Mbarete, seu esposo, também foram os responsáveis pelo ritual de abertura dos jogos indígenas.

O torneio foi encerrado com um jantar preparado por Lu Ahami e sua família, com pratos típicos de seu povo Guarani Mbya, no espaço Colmeia onde o centro de extensão e estudos Arandura fica sediado.

Fotos, ilustração e texto: Lilia França

ACONTECEU NA UNICAMP!!!

15ª ED. DA TECNOLOGIA EM FOCO

Sustentabilidade, inovação e sociedade

Nos dias 1, 2 e 3 de outubro de 2024, foi realizada a 15ª edição da Tecnologia em Foco(TF) na Faculdade de Tecnologia (FT) UNICAMP- Limeira. A TF é um evento anual e aberto ao público que acontece na FT, que promove palestras, minicursos, workshops, momentos culturais e rodas de conversas, buscando abranger todas as áreas presentes na FT , sendo elas: computação, telecomunicações, transporte e ambiental, alcançando não apenas a comunidade a acadêmica, mas Limeira em si, uma ótima oportunidade para os estudantes locais conhecerem um pouca da UNICAMP.

Apesar do intuito da semana de tecnologia ser para aproximar o discente do mercado de trabalho, ela também promove espaços para lazer, cultura e diversidade, a TF vem pra entregar o melhor para os participantes e promover espaços de inclusão e diversidade, sempre prezando pelo respeito e proporcionando experiências além do âmbito acadêmico

A TF era organizada pelo corpo docente, atualmente a comissão também é composta por professores responsáveis que atuam como orientadores e suporte, mas o corpo discente é o principal responsável/organizador do evento e nos últimos anos tem entregado grandes edições

Na TF de 2024, tivemos a participação de Anthony Leggett (vencedor do Prêmio Nobel de Física 2003), roda de conversa sobre empregabilidade LGBT, apresentação do Grupo Cultural Kurasí Yasí (Grupo de dança dos estudantes indígenas de Limeira), participação da Motorola Solutions, aula de Ioga, participação das organizações estudantis, participação da palestrante pelo Instituto Socioambiental-ISA e muito mais, sempre pensando em abranger as quatro áreas presentes na Faculdade de Tecnologia da UNICAMP.

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“Como participante e parte da comissão organizadora, posso dizer que foi bastante trabalhoso e cansativo, mas muito gratificante realizar esse evento ao lado de pessoas sensacionais. A semana da Tecnologia em Foco é a semana mais aguardada na FT por mim, porque me leva além além do meu cotidiano acadêmico ”

Lilia França

Indicações de Livros

A literatura negra brasileira tem se consolidado como um espaço essencial para a reflexão sobre a construção da identidade e a resistência ao racismo estrutural. Nesta edição, indicamos três obras como um 'tripé literário', que, de formas distintas, abordam tanto as questões históricas quanto as contemporâneas do Brasil negro

O avesso da pele. Autor: Jeferson Tenório

"O Avesso da Pele", de Jeferson Tenório, é um romance poderoso que mergulha nas complexas questões de identidade racial, família e pertencimento no Brasil contemporâneo. Através da perspectiva de um jovem negro, o autor narra a vivência de um protagonista que lida com as marcas do racismo estrutural, ao mesmo tempo em que busca entender e afirmar sua própria identidade em meio a desafios pessoais e sociais A obra explora com sensibilidade as tensões entre a dor da exclusão e a resistência, trazendo à tona as questões do afeto familiar e a luta pela autonomia do sujeito negro em um contexto de constante marginalização Com uma escrita envolvente e reflexiva, "O Avesso da Pele" é uma leitura necessária para compreender as nuances da experiência negra no Brasil, suas feridas históricas e as formas de cura e resistência que se entrelaçam na trajetória de seus personagens.

Brasil tumbeiro Autor: Mário aranha "Brasil Tumbeiro", de Mário Aranha, é uma obra literária que nos leva a refletir sobre a história do Brasil sob a ótica do sofrimento, resistência e herança cultural africana. Através de uma narrativa poética e impactante, Aranha traça um paralelo entre o navio negreiro, o tumbeiro, e o Brasil póscolonial, revelando as cicatrizes deixadas pela escravidão e as complexas relações sociais que ainda perduram O livro não só denuncia as injustiças do passado, mas também celebra a força e a resiliência do povo negro, ao mesmo tempo em que convida o leitor a revisitar a história para compreender as raízes de muitos dos desafios contemporâneos. Uma obra essencial para quem deseja entender a luta e a contribuição dos negros na formação da sociedade brasileira.

Tornar- se negro. Autora: Neusa Santos Souza "Tornar-se Negro", de Neusa Santos Souza, é uma obra fundamental para a compreensão da construção da identidade negra no Brasil. A autora explora as complexas questões psicológicas e sociais enfrentadas pelos negros em uma sociedade d elo racismo estrutural, processo de internalização e racial e as formas pelas íduo negro constrói sua diante das imposições a analisa como o racismo etividade e as relações propondo uma reflexão bre a experiência de ser um contexto de o. Com uma abordagem teoria e prática, o livro é reflexão sobre as formas ia e os desafios da e uma identidade negra , ge dos estereótipos e da opressão histórica Uma leitura essencial para quem deseja entender a dinâmica racial brasileira e os caminhos para a afirmação da negritude.

Um tributo à Cultura Popular

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