Revista Capoeirando no. 5 (Ago/24)

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editorial

É com imensa alegria que entregamos mais uma edição da Revista Capoeirando. Na sua 5° edição, ela vem recheada de arte, cultura e resistência, elementos que são a matéria viva que funde o alicerce para a construção da revista e também da universidade que queremos, livre, plural, pública e extra muros! Quero agradecer grandemente a equipe da Revista Capoeirando, nossos professores orientadores e todos os alunos que tornam esse projeto possível.

Maryane Comparoni

Estar presente na construção da Capoeirando é um exercício de se encontrar e se reconhecer, como parte e como ser capaz A revista nos convida ao olhar para o entorno, encontrar raízes profundas no meio em que habitamos e tornar isso memória - escrita, fotografada, ilustrada ou poetizada Um projeto cultivado por muitas mãos, atuais e ancestrais Essa edição está carregada de amor e todo o desenvolvimento que ele proporciona.

Beatriz LuMO

Conselho Editorial: Cristiano M Gallep, Christian da Silva Rodrigues, Gina Monge Aguilar e Luciano Medina, Pedro Augusto dos Santos

Editora chefe: Maryane Comparoni

Editora executiva: Beatriz LuMO

Editores de texto: Anthony Moraes, Julia S X da Silva , Lilia Cordeiro França.

Redes Sociais: Isabella Carolina Silva De Araújo e Vinícius do Santos Germano

Logotipo: Luciana Barbeiro

Direção de arte: Beatriz LuMO, Isabella Carolina Silva De Araújo, Maryane Comparoni.

Ilustração: Beatriz LuMO, Herbert Otacilio da Silva, Maryane Comparoni

Capa: Herbert Otacilio da Silva e Maryane Comparoni

Editoração: Beatriz LuMO, Isabella Carolina Silva de Araújo, Maryane Comparoni, Amanda Freitas Camarini.

Correção e organização de textos: Anthony Moraes, Julia S X da Silva , Lilia

Cordeiro França, Karen Zapala, Isabela Dantas, Caio Gutierres, Fernanda Lagoeiro

Edição de vídeo: Guilherme B. Fauth.

Filmagem: Guilherme B Fauth, Maryane Comparoni, Leonardo Lisboa Cordebello Som: Guilherme B Fauth , Anthony Moraes

Colaboradores desta Edição: Karen Ap dos Santos Zapala, Isabela Dantas de Souza, Cris Gallep, Amanda Freitas Camarini, Maria Gabriela G. Tonhosolo, Fernanda Lagoeiro, Leando Groninger Monteiro, Caio Henrique Gutierres, Leonardo Lisboa Cordebello, Herbert Otacilio da Silva, Celso Niger, Dani Pierce, Bruna Giselle Arruda, João Victor dos Santos, Julia Aro, Beatriz Coseuza, Camila Akemi, Cris Monteiro.

índice

Caminhos da Capoeira - A história da Casa Ponto de Memória e Cultura Ibaô . 6

História - Mestre Cobrinha Verde . 10

Coletivos Negros - NCN e Coletivo Conexão Preta - A história dos movimentos 14

UBN encontro de jovens negros e pardos 16 Fala Mestre! Marquinhos Simplício . 20 Passo a passo Berimbau . 22 O berimbau e seu sistema de notação rítmica . 24 Hora da Capoeira 28

Muito mais que uma festa a celebração da representatividade preta 34 Festival Cria Ativa . 38 Nação Nagô . 40 Feira da Agricultura Familiar . 44

Baile C.R.A.U. - Cridão e Arapuca de Urubu . 50 Festa DCE 54

Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos 58 UNIMÍDIA 15 62

acesso: issuu.com/revistacapoeirando contato: capoeirandorevista@gmail.com

Ser o que quiser, ser como puder, ser você mesma, apenas ser! esse ser único, ser envolvente, ser eloquente, ser potente. ser abrigo, ser proteção, ser destemida, ser intuição. ser curandeira, ser mandingueira, ser rezadeira, ser capoeira, ser mulher. serpente. Dani Pierce

A história da Casa Ponto de Memória e Cultura Ibaô Caminhos da Capoeira

No bairro Vila Padre Manoel da Nóbrega, em uma das muitas esquinas da rua Ema, existe um galpão que se destaca por ser vivo em história e resistência

Criado pela população residente da Cohab (Companhia de Habitação Popular de Campinas) do bairro e de sua necessidade de um local de comércio e vivências, o galpão servia como espaço de integração, acolhimento, convivência, cursos, datilografia, crochê, práticas de esporte, dança e música; como a Capoeira, sendo iniciada por Mestre Tedi nos anos 80.

Discípulo de Mestre Tedi, Mestre Davi nos conta durante uma entrevista a importância para a comunidade da Vila Padre Manoel de Nóbrega o acolhimento das crianças e jovens por meio da Capoeira, ensinando sobre comunidade, história, identidade e ancestralidade, trazendo desde as diversas raízes africanas da Capoeira, até a história atual dela no Brasil; além de abrir espaços para a música e o corpo, se expressando e tendo voz na comunidade

“Como uma criança de periferia, que os pais não são muito presentes por n motivos, eu aprendi muito com o Mestre Tedi, principalmente sobre a rua” - Mestre Davi.

Assim, o galpão naquela época, ainda pertencente à associação de moradores do bairro, Foi um grande centro de vivências e histórias, com foco principalmente na Capoeira. Contudo, após o falecimento de Mestre Tedi em 1994, o grupo sofre grandes perdas e muitos se distanciam do local

Com a perda do Mestre Tedi, Davi, que depois se tornaria um dos co-criadores do Ibaô, passa a ser o instrutor de Capoeira na associação de moradores, conciliando as atividades na comunidade com as viagens pelo Brasil para conhecer e se atualizar mais sobre a Capoeira, encontrando com diversos novos grupos e mestres de outros estados

Um desses mestres foi o Mestre Ralil Salomão e seu grupo de Capoeira Raízes do Brasil

Fundado em 1980, com a matriz em Brasília, do qual Davi se aproximou e se filiou em 2002, trazendo uma filial para o galpão, que viria a ser o Ibaô em 2006 quando a associação de moradores por má utilização do espaço, perde a gestão do mesmo.

Como forma de resistência, os moradores e frequentadores da Capoeira naquele espaço se reuniram e coletaram fotos, registros e arquivos de Mestre Tedi e das memórias vividas naquele espaço, visando mostrar a importância do local e da ligação com a comunidade. A Cohab passa a gestão para o grupo e o Ibaô- Instituto Baobá surge com o propósito de cultivar práticas que semeassem a cultura de matriz africana por diversas geraçõespresentes e futuras, relacionando-se com o Baobá ao utilizar o significado de Árvore do conhecimento e da vida no dia a dia, mantendo as tradições, o contato com antepassados e a cultura viva.

Após a mudança de gestão, o Ibaô passou a se envolver mais com a comunidade e cultura local, realizando eventos, reuniões e aulas, com enfoque na Capoeira, Afoxé, Jongo, Maculelê, Samba de Roda, Puxada de Rede do Xaréu e Balaio das Águas, evento popular que visa reunir as diversas práticas afro culturais em um dia e local, resultante também das religiões de matrizes africanas e da relação entre elas e a cultura local e muitos outros eventos de grande importância, principalmente pelo contato da cultura com a religião, dado no terreiro da mãe Iberecy, a quem Ibaô presta muitas homenagens e memórias relativas à sua criação.

Com esse envolvimento local e cultural, Ibaô foi reconhecido como Ponto de Cultura em 2009, mas não sem muita luta! O primeiro passo foi ir atrás de Órgãos Públicos para reconhecer as práticas históricas e culturais de matrizes africanas como patrimônio brasileiro A Capoeira foi registrada/reconhecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como patrimônio histórico e cultural brasileiro em 2008 e, posteriormente, Campinas foi o primeiro município a reconhecê-la como Patrimônio Cultural Imaterial em 2013 e o Ibaô foi um dos grandes responsáveis por tal conquista. Ibaô se torna também um Ponto de Memória em 2011, a partir de suas fotos e vivências, como eles afirmam em seu próprio site: “O Ibaô ( ) tem como foco a realização contínua de pesquisa, documentação e difusão de acervo das culturas de matriz africana, por meio de mobilizações coletivas e comunitárias ”

A instituição tem tamanha importância e influência na comunidade que dois documentários já foram feitos sobre eles: um sobre a Capoeira e seus caminhos internacionais (Em São Tomé e Príncipe) e outro sobre o Balaio das Águas, além de outros trabalhos acadêmicos que elucidam como as ações coletivas sediadas no Ibaô estão em contato com a sociedade atual, tanto com a população residente quanto com população estrangeira.

Texto e Entrevista Amanda Freitas Camarini

Fotografias: Beatriz LuMO

história

Mestre Cobrinha Verde

Rafael Alves França, mais conhecido como Mestre Cobrinha Verde, nasceu em 24 de outubro de 1912, em Santo Amaro/BA Foi primo e irmão de criação, do lendário Besouro Mangangá, quem primeiro lhe ensinou Capoeira, aos 4 anos de idade e lhe deu o apelido por sua agilidade Aprendeu também com muitos outros mestres da cidade - um berço da Capoeira - entre eles os mestres Maitá, Licuri, Dendê, Siri de Mangue, Doze Homens, Espinho Remoso e Canário Pardo.

Tido como valentão na região, aos 17 anos enfrentou o delegado Veloso (sim, avô de Caetano…) e teve que fugir, após, se incorporou ao bando do insurgente Horácio de Matos em Lençois, na Chapada Diamantina, atuando 3 anos e meio como mercenário desse coronel Abandonou o bando ao sonhar com seu pai, que lhe pedia para tal

Foi até Manaus e depois Rio Branco, voltando à capital do Amazonas onde constituí família com uma indígena Juçara, tendo dois filhos Sabendo dos agitos comandados por Getúlio Vargas, abandona a família e luta na revolução de 30, indo a pé do Ceará a Alagoinha/BA Pediu para ir a São Paulo, conter a contra-revolução de 1932, lutando por 6 meses Voltando a Salvador, foi promovido por heroísmo em combate Por calúnia de um tenente, foi preso no quartel e posteriormente suspenso, voltando à profissão de pedreiro até sua aposentadoria

Desde a década de 1930, ensinou vários capoeiristas sem nunca cobrar por isso, como prometido a seu mestre, Besouro Conviveu com vários bambas da época, como mestres Waldemar e Aberrê Conhecedor das forças não visíveis, dizia que "não era só com Capoeira que eu me livrava dos meus inimigos O bom capoeirista é mágico Ele tem o poder de aprender boas orações e usar um bom breve, porque a Capoeira não livra a gente de bala". Dizia que seu breve (amuleto de proteção) continha diversas orações e era vivo: ficava pulando em cima da mesa, em prato virgem Mas houve algum problema, pois o breve, que lhe havia protegido de muitas coisas, fugiu… O breve havia sido um presente do velho tio Pascoal, em Santo Amaro, que lhe ensinou mais de 65 orações

Dizia ter ensinado antes de Bimba e também de Pastinha, com quem brigou, ofendido, por ser acusado de desvio de dinheiro após uma apresentação na base naval em Salvador. Para ele, "[ ] a Capoeira é uma das lutas originais do mundo brasileiro [ ] A Capoeira Angola é luta do mundo construída pelos Africanos [...] A Capoeira nasceu dentro de Santo Amaro e Cachoeira Depois foi que se espalhou"

"A Capoeira nasceu no Recôncavo, acorrentados dentro dos engenhos, a partir de uma dança, o batuque A Capoeira Angola nunca pode ter disputa, porque dois que conhecem a luta, se disputarem vão terminar um dando no outro A Capoeira Angola é uma luta A primeira do mundo. É original, por isso ela não tem disputa".

Criticava a alimentação artificial, industrializada Só comia "tudo vivo" E não era "de extravagâncias, de bebedeiras".

Em 1961, grava o LP histórico com mestres Traíra e Gato Preto, mas em relançamento de maior tiragem, em 1964, muda-se o nome na capa do disco para "Mestre Traíra - Capoeira da Bahia".

No início da década de 80, aparece em várias reportagens sobre a Capoeira em Salvador, e recebe homenagens.

Faleceu em 12 de maio de 1983

Texto: Cristiano M Gallep

Coletivos Negros

NCN e Coletivo Conexão

Preta - a história dos movimentos

Os Coletivos Negros da Unicamp são grupos formados por estudantes pretes com o propósito de acolher alunes negres e ao mesmo tempo, lutar por seus direitos e criar uma rede de apoio para resistir aos desafios diários no ambiente universitário Nessa matéria, conheceremos um pouco da história e objetivos de dois desses coletivos, o NCN (Núcleo de Consciência Negra) do campus de Campinas, e o Coletivo Conexão Preta, do campus de Limeira

Núcleo de Consciência Negra da Unicamp (NCN), Coletivo auto-organizado que tem por objetivo unir e congregar estudantes negres em torno de um debate positivo sobre ser negre e estar na universidade Desde a fundação, em 2012, temos estratégias de atuação política alinhadas com o Movimento Negro Brasileiro. Junto a outros coletivos, estivemos à frente da luta pela implementação das cotas étnico-raciais na Unicamp, da criação do Grupo de Trabalho (GT) de combate ao racismo, da implementação da Comissão de Diversidade Étnico-Racial (CADER), da elaboração e construção da Feira Afro-Brasileira na Unicamp (UnicampAfro), realizada pela primeira vez em 2019, e da composição do AquilombaForúm, em conjunto com os demais coletivos negros da Universidade Vem atuando na disseminação do debate racial no âmbito universitário, por meio de eventos como o “Quem tem Cor Age”, em torno dos quais congregamos debates científicos, profissionais, artísticos e estéticos que contribuam com a luta antirracista, a fim de potencializar nossa atuação como pessoas negras engajadas na transformação social.

Coletivo Conexão Preta Como o coletivo surgiu ?

O Coletivo foi estabelecido no final de 2018 (em setembro de 2018) e teve sua criação oficial após uma Semana de administração e administração pública (SAAP), na qual foram discutidos temas como racismo e a implementação da Lei 10 639/03, promovida pelo CAACS. Em um contexto de hostilidade da universidade em relação aos corpos negros, reunir-se representava um ato de resistência Diante dos questionamentos surgidos durante o evento e da insatisfação com a falta de representatividade no ensino superior, o Coletivo Conexão Preta foi fundado

Como o coletivo busca promover a valorização e representatividade da comunidade negra ?

O coletivo, como um movimento vivo, encontrou maneiras de resistir às diversas opressões da época Desde sua criação, enfrentou hostilidades intensificadas pela forte polarização política e, mesmo assim, em colaboração com o movimento estudantil, lutou pela implementação de cotas afirmativas na Unicamp Com o aumento de estudantes negros advindos das cotas, lutaram para que as experiências negras fossem discutidas dentro da universidade Em 2022, surgiram debates sobre a permanência deles na instituição e os sentimentos de solidão que enfrentam Em 2023, exploraram como transcender suas adversidades. E neste ano, buscam ampliar o debate sobre significados e desenvolvimento

Quais são os maiores desafios enfrentados pelo coletivo na luta contra o racismo e pela igualdade racial ?

Uma das maiores dificuldades em lidar contra o racismo dentro da universidade é a falta de mobilização das pessoas. Eles enfrentam o desafio de garantir não apenas que as pessoas compreendam a importância do que está sendo debatido, mas também que participem ativamente desses debates e das ações que promovem. Além disso, a universidade, ao excluir constantemente as pautas sociais, não oferece o apoio necessário, o que gera sempre a sensação de que algo está faltando ali

Quais são os passos futuros?

Eles estão se organizando para receber parcerias que possam contribuir para o desenvolvimento profissional dos estudantes, com cursos e experiências que os preparem para o mercado de trabalho e estágios como parte de seus planos. No entanto, não querem realizar isso de forma que exclua os momentos de aquilombamento; desejam não apenas ocupar grandes empresas, mas também continuar se reunindo na universidade e em outros espaços

Como a comunidade e a sociedade em geral podem contribuir para fortalecer e ampliar a voz do coletivo ?

Se mobilizando O interesse de cada um em não deixar nossas pautas morrerem, expressando insatisfação com o cenário atual

UBN encontro de jovens negros e pardos

UBN promove evento de conexão e desenvolvimento de talentos negros e pardos na Unicamp

Em sua terceira edição, o encontro com a Unicamp Black Network - UBN promoveu um evento exclusivo para pessoas negras e pardas, que ocorreu na Universidade Estadual de Campinas - Unicamp, no Centro de Convenções, de forma gratuita com mais de 500 pessoas envolvidas Teve como programação palestras e feira de talentos, sendo um momento de conexão e inspiração para a comunidade negra

A iniciativa partiu da associação UBN, um grupo formado em 2020 de alunos e ex-alunos negros da Unicamp, que promove atividades em virtude da equidade e diversidade racial no mercado de trabalho, sejam com os fornecimentos de cursos profissionalizantes, visitas técnicas, vagas de empregos e network

Neste ano, o encontro com a UBN superou as expectativas, através da realização de uma palestra de grande destaque, contando com três profissionais negros: Denise Carvalho, Alberto Cordeiro e Maria Augusta, que contaram sobre suas vivencias, experiências e processo criativo, o que gerou inspiração e representatividade para os jovens presentes.

Além disso, por meio da feira de carreiras, os estudantes puderam se conectar e formar uma rede de network com as mais de 20 empresas parceiras (Agi, Alpargatas, Albert Einstein Hospital, Bain Company, BCG, Bosch, BTC, Cargill, Deloitte, Dow, Embraer, EMS, EY, GE Vernova, Goldman Sachs, Google, Kearney, Loreal, Localiza&CO, MARS, P&G, Raízen, Unilever e Santander). Durante o evento, eles circulavam pelos estandes das empresas, trocavam contatos, conversavam sobre suas dúvidas e interesses com profissionais negros e renomados de dentro destas organizações Os presentes também receberam brindes, como camisetas e copos distribuídos gratuitamente.

Destaca-se o depoimento de Keila, estudante de medicina na Unicamp que esteve no encontro:

O objetivo da UBN ao promover esse evento é gerar reconhecimento, representatividade e espaço para network.

Texto e foto Isabela Dantas De Souza

“Eu vejo este evento como uma grande potência, para a gente se aquilombar, para a gente se unir, para a gente ver as potências do nosso povo, da gente se inspirar em pessoas que estão em posições que a gente almeja, de descobrir estratégias de como chegar nesses lugares e também de fazer conexões porque a gente não chega a lugar nenhum sozinho”.

SE A NOSSA COMUNIDADE FOSSE REGADA EM UNIÃO

E BANHADA EM FRATERNIDADE, SERÍAMOS COMO UNIDADE, E JUNTOS TRANSGREDIRMOS O COMUM.

COM TANTA FORÇA, EM UM TIPO DE VIOLÊNCIA DE IDEIAS, QUE MACHUCA O EGO

E BATERÍAMOS COM TANTA FÚRIA EM ANTIGAS CONVICÇÕES EQUIVOCADAS

QUE FORJARÍAMOS A DIVERSIDADE AO REVÉS DO PADRÃO.

A APODRECIMENTO DE NOSSAS RAIZES, RESULTARAM EM FRUTOS FRACOS

QUE FACILMENTE SE PERDEM NO CHÃO.

E A PUTREFAÇÃO SE TORNA EMINENTE, JÁ QUE NÃO HÁ MAIS O CONTATO

COM AQUILO QUE NUTRE.

SOMOS SERES SENSÍVEIS: NEM TUDO É MENTAL, NEM TUDO É REAL, NEM TUDO É SENTIMENTO, E NEM TODO SENTIMENTO É MAL.

OUSE SONHAR, OUSE LUTAR, OUSE SER BEM MELHOR QUE ONTEM, OUSE TER TEMPO PARA AMAR, VIVER E SE ENCONTRAR!

Celso Niger

Fala Mestre!

Marquinhos Simplício

O mestre recebeu a Capoeirando no espaço de seu grupo, "Crispim Menino Levado", para um boa conversa! É só clicar pra degustar!

Ditadura e Capoeira

Cantando história

Composição do Capoeira

Centro Cultural Crispim Menino Levado

A Capoeira hoje

Violência

Despedida

Acompanhe o mestre via Instagram @marcos alberto simplicio

Direção e montagem - Guilherme Fauth

Roteiro - Karen Zapala, Isabela Dantas, Amanda Freitas Camarini, Maria Gabriela Tonhosolo, Fernanda Lagoeiro, Leando Groninger Monteiro, Caio Gutierres, Leonardo Lisboa, Herbert Otacílio, Beatriz Luizari e Marcos Simplício

Operação de Câmera - Guilherme Fauth, Maryane Comparoni e Leonardo Lisboa

Som - Anthony Moraes

Produção - Cristiano de Mello Gallep, Maryane Comparoni, Guilherme Fauth, Beatriz Luizari, Anthony Moraes, Christian Rodrigues

Músicas - Cristiano de Mello e alunos, Mestre Marcos Simplício

Passo a passo Berimbau

A Capoeira, mais do que uma dança ou uma luta, é um patrimônio cultural imaterial que carrega em suas raízes séculos de história, resistência e expressão artística. Dentro desse universo rico e diversificado, o berimbau emerge como um símbolo icônico, não apenas como instrumento musical, mas como um elo entre a tradição e a inovação, entre o passado e o presente. A seguir, será possível entender melhor o processo artesanal e cultural de construção do berimbau, desde a seleção da matéria-prima até o toque final que dá vida a esse singular instrumento.

Verga - madeira da árvore beriba, daí o nome berimbau Ela é super resistente, sendo necessário envergá-la para iniciar a construção do berimbau.

Arame retirado de pneu de carro.

Rami/barbante - você enrola ele ao redor da verga e prende, para que ela não retorne a sua posição inicial

A Cabaça, oriunda do pé de cabaceira, nada mais é do que a caixa de ressonância do berimbau. Após ser encontrada na natureza, ela é cortada, limpa e enverniza, tornando-se aplicável para o instrumento

A baqueta de árvore tucum é utilizada para bater no arame

O Caxixi é recortado também do pé de cabaceira, da parte inferior da cabaça. Antes de ser trançado e fechado com palha, em seu interior são adicionadas sementes, como de açaí ou pau-brasil, a fim de produzir seu som característico.

Dessa forma, o conjunto de elementos se completa, formando o berimbau.

Por último, utiliza-se uma pedra lisa ou um dobrão, a fim de modificar a sonoridade do berimbau.

O berimbau e seu sistema de notação rítmica

O que determina o estilo de jogo durante a roda de Capoeira é a música, sendo essa uma particularidade dentre as artes marciais Introduzida nos treinos de luta, ajudou a mascarar o intuito do treino, fazendo com que os movimentos fossem similares aos de dança, sendo assim, aceita por escravizadores A música tornou-se peça fundamental da prática

O principal instrumento da Capoeira é o berimbau, também chamado de hungu. É um instrumento da família das cordas; constituído por uma única corda em uma haste de madeira, contendo também uma caixa de ressonância feita de cabaça. A corda é percutida por uma baqueta e junto a ela o instrumentista também carrega o caxixi, enriquecendo a sonoridade

Podemos ver na imagem abaixo três exemplares de berimbau, que possuem diferença na qualidade do som, no caso, a altura Não estamos falando de volume, mas sim de frequência: Agudo, médio e grave. O que determina essa qualidade no berimbau é o tamanho da cabaça

Berimbau Gunga: Possui a cabaça grande e som grave É ele quem inicia a bateria e dá a base rítmica.

Berimbau médio: Possui a cabaça média e som intermediário em relação ao Gunga e a Viola Sua função também é de base rítmica, mas tocando o inverso do ritmo determinado pelo Gunga Ex : Se o Gunga toca o ritmo Angola o Médio toca o ritmo São Bento Pequeno.

Berimbau Viola: Possui a cabaça pequena e som agudo. Tem a função de solo e improviso

A principal forma de resistência da capoeira que se mantém até hoje é a oralidade. O ritmo, o poema, a história, a dança, a luta vivem até hoje graças aos mestres que seguem fiéis aos ensinamentos adquiridos de seus antepassados.

Contudo, houve o interesse de alguns em criar notações musicais, possibilitando também o registro gráfico de suas composições

Trago dois exemplos:

O primeiro deles, é o método criado pelo Mestre Maxuel em 1998

CAPOEIRA SUL DA BAHIA - “A Arte do Berimbau”

C - Mestre Maxuel

O arco musical surgiu por volta de 1500 A.C. Instrumentos derivados dele foram descobertas em várias partes do mundo (Novo México, Patagônia, África, Egito, Fenícia, Persa e Assíra). Existiu da forma que conhecemos na África, de onde foi trazido pelos escravizados africanos

O Berimbau também é chamado de urucungo, orucungo, oricungo, uricungo, rugungo berinbau de barriga, gobo, marimbau, bucumbumba, gunga magungo, mutungo, aricongo, arco musical rucumbo, xitendeno sul de Moçambique, hungu ou m’bolumbumba em Angola.

Chi: Baqueta encima pedra solta contra o arame

Tom: Vaqueta embaixo sem a pedra

Tonsh: Baqueta encima, pedra em contato com o arame

Tim: Baqueta encima pedra em contato com o arame

Domdomdom: Baqueta embaixo, várias vezes sem intervalo

Angola São Bento Pequeno

São Bento Grande Angola (tradicional)

Jogo de Dentro

Podemos observar que as figuras representam características sonoras. Estes sons são representados por um círculo, que possui diferenças em seu interior Estes símbolos, quando postos um ao lado do outro, criam a música do berimbau.

Santa Maria Samba de Roda
São Bento Grande de Bimba Cavalaria
Texto de Karen Aparecida Dos Santos Zapala
Idalina
Banguela Iuna

Hora da Capoeira

é mais que um livro, é um material didático que pode ser utilizado em sala de aula por professores e arteeducadores, em suas mais diferentes áreas de atuação, em rodas de leitura e discussões sobre a importância da literatura negra e da cultura popular.

Olá!

Peço licença às mais velhas e aos mais velhos, a todas e todos que chegaram antes, abrindo os caminhos da Capoeira!

Meu nome é Daniele Alfonso Ramirez, tenho 34 anos e sou conhecida no universo da Capoeira como Dani Pirce. Sou uma mulher negra, artista, capoeirista, escritora, professora e arte-educadora Resido em Campinas, SP, há 9 anos

Em 2006, iniciei na Capoeira com o Mestrando Escurinho e, em 2019, fui reconhecida como instrutora pelo Mestre Camisa e pela Escola Abadá Capoeira Há 1 ano, me desliguei da Escola, decidindo conhecer outros espaços, ter novas experiências e mergulhar ainda mais nessa minha paixão pelas capoeiras, pela cultura popular e pela literatura. Sou professora de Capoeira e professora universitária, graduada em Educação Física e pósgraduada em Gestão de Projetos Sociais e Culturais, coordenando também o coletivo Caleidoscópio Brasil, junto à Professora Dra Lívia Pasqua

Vou compartilhar um pouco sobre um dos meus trabalhos com a Capoeira: um livro produzido com as artistas Eduarda Diniz e Jaqueline Diniz.

HORA DA CAPOEIRA foi criado por três mulheres!

Várias mulheres marcaram época e deixaram um legado significativo na produção literária É essencial continuarmos celebrando e apoiando as vozes femininas na literatura brasileira, fortalecendo o trabalho de artistas independentes Eduarda é formada em Artes Visuais pela UNICAMP, ela planejou o design e a ilustração; Jaqueline fez a pintura digital e eu escrevi a poesia que compõe o livro

O lançamento aconteceu no Goma - Arte e Cultura, em Barão Geraldo, no ano de 2022.

Este livro é movimento! Voltado para o público infantil e para amantes da arte Capoeira, o livro é um convite a jogar com suas dobras e poesia Assim como o jogo de Capoeira acontece mediante a um corpo que se dobra e desdobra continuamente, este livro acompanha essa dinâmica em sua movimentação, permitindo que as páginas se liguem direta ou indiretamente, numa série de possibilidades e floreios, experimentados por quem o lê O livro não ensina a jogar, ele é o próprio jogo e inspira a transformar!

O manuseio deste livro é divertido e dinâmico, desperta a curiosidade e estimula o interesse pela leitura Observando as ilustrações que se conectam em diferentes dobras e brincando com as rimas, é possível despertar um olhar envolvente pela capoeira

HORA DA CAPOEIRA é mais que um livro, é um material didático que pode ser utilizado em sala de aula por professores e arte-educadores, em suas mais diferentes áreas de atuação, em rodas de leitura e discussões sobre a importância da literatura negra e da cultura popular. Conecta o leitor ao universo ancestral, aprofundando-se em saberes e tecnologias necessárias para uma educação efetiva sobre igualdade e direitos humanos, seguindo um viés lúdico

Falar sobre a importância da literatura, da cultura popular e das manifestações afroindígenas na primeira infância é plantar a semente e contribuir, logo cedo, para uma educação afroafetiva e antirracista, promovendo consciência cultural, respeito às diversidades, desconstrução de estereótipos e confronto aos sistemas e estruturas que incitam a violência

Desejo que as crianças negras tenham referências desde cedo, se reconheçam e se sintam representadas pelos meus trabalhos

Produzir livros e materiais pedagógicos com a temática da Capoeira e de outras manifestações afro-diaspóricas é um presente imensurável!

Capoeira é tecnologia ancestral! Viva a Capoeira! A luta continua!

Saiba mais em @horadacapoeira

Texto Dani Pirce

herói s

aqui se faz heróis

aqui se faz governos

aqui se faz genocidas aqui se faz verdades aqui jaz

Poesia e ilustração Maryane Comparoni

Muito mais que uma

festa a celebração da representatividade preta

Todo ano, na segunda semana de julho, a Comunidade Jongo Dito Ribeiro celebra o Arraial Afrojulino – mas este ano foi diferente: comemoramos também os 250 anos de Campinas, mesmo ano em que, por acaso, as iniciativas culturais da Comunidade Jongo Dito Ribeiro e da Casa de Cultura Fazenda Roseira se tornaram parte do calendário oficial de São Paulo.

A Comunidade Jongo Dito Ribeiro é referência em cultura e turismo preto Seus projetos e iniciativas culturais acontecem, em sua maioria, na Casa de Cultura Fazenda Roseira, com o objetivo de recuperar e preservar os registros e as memórias afro-brasileiras da cidade, desde a época dos barões do café A Fazenda, inclusive, é fruto da mobilização social de um movimento negro, que conseguiu a permissão para utilizar o espaço em 2015.

Em sua vigésima segunda (22ª) edição, o Arraial Afrojulino contou com apresentações artísticas de grupos de diversas localidades do estado de São Paulo, do segmento afro, além de barracas de comidas típicas e de artesanato, uma fogueira e a tradicional Roda de Jongo com a Comunidade Jongo Dito Ribeiro, e outras comunidades de jongo (Jongo, para quem não sabe, é uma dança de roda africana do tipo batuque ou samba)

Toda a elaboração, desenvolvimento e organização do Arraial é realizado pela própria Comunidade, unindo membros novos, antigos e gerações de amigos e familiares. Lucas Barata é um reflexo dessa união Mais conhecido como DJ Barata, é natural de Salvador (BA), membro da Comunidade, e foi uma das atrações do Arraial Afrojulino.

Mas, para ele, o Arraial vai além de uma simples festa; representa o seu pertencimento enquanto pessoa “Sou de Salvador, vim pra Campinas estudar Filosofia, e foi um período muito difícil para mim. Passei por um processo de depressão e tristeza”, relembra. “A família Jongo Ribeiro me devolveu o afeto e o pertencimento, e Campinas, pela primeira vez, fez sentido para mim”. Ele acredita na música como veículo de reconstrução social, e que a festa celebra isso dando voz à resistência preta “Campinas é o último ciclo de escravismo massivo no Brasil ligado ao café Às vezes não se percebe, mas Campinas é uma cidade preta. E Campinas tem uma resistência preta muito politizada, muito articulada. Tem mestres que participaram da fundação do Ilê Aiyê (primeiro bloco afro do Brasil) Tem tecnologia em desenvolvimento, muito importante para o afro futurismo”, conta o filósofo.

Uma das atrações mais esperadas da festa era o grupo Família Sistema Negro, de Campinas, que atua desde 1992 e foi referência na cena hip-hop O grupo tem 7 álbuns e agitou o público do começo ao fim, com seus sucessos clássicos e também o trabalho novo, “Terroristas em Ação”, que marca reflexões vividas na época da pandemia de covid-19. O Arraial Afrojulino reuniu cerca de 3 000 pessoas, e ocorreu das 12 horas de sábado (dia 13) até as 02 horas de domingo (dia 14), marcando a data de referência do reinício do Jongo Dito Ribeiro na cidade de Campinas

Todo o rendimento arrecadado é beneficente, e direcionado para ações sócio culturais da comunidade e para manutenção de projetos culturais na Casa de Cultura Fazenda Roseira.

Texto e foto Fernanda Lagoeiro

“Comunidade Jongo Dito Ribeiro comemora o 22º Arraial Afrojulino nos 250 anos de Campinas”

Festival Cria Ativa

O Festival Cria Ativa iluminou Campinas com uma celebração única da criatividade, inovação e inclusão. Com o tema "Criatividade, que história é essa?", o evento destacou a rica herança criativa da cidade ao longo dos últimos 250 anos através de diversas atividades O Festival, que compõe a Semana Municipal da Criatividade e o World Creativity Day, uma plataforma colaborativa fundamental desde sua primeira edição em 2018, permite a expansão e a valorização do processo criativo

Acolhido pela Casa de Cultura Tainã, o evento realizou uma importante junção das vertentes culturais de Campinas Durante o dia 21 de abril, ocorreu a união do Jongo do Dito Ribeiro, movimento cultural ancestral promovido pelas mulheres integrantes da Casa de Cultura Fazenda Roseira, com uma Ballroom organizada pela Majestade Babilônia e sua casa, juntamente com a presença de apresentações e a amplificação da Rouffneck SoundSystem - resultando no encontro de importantes raízes culturais da cidade de Campinas

Cria Ativa também foi palco para uma apresentação circense dos artistas de rua Duo Zeakrona, uma contação de histórias do livro Contos de Chão e Vento, escrito por 5 pessoas negras da cidade, um show da rapper Duarte, artista em ascensão da cena 019 e também para os DJs Bruk e Green B, formados pelo projeto Cultura nas Ruas - que, inclusive, já foi registrado em uma matéria da 4ª edição da nossa revista

A arte também estava representada através de artesãs empreendedoras, reunidas em uma feira de economia criativa, em sua maioria mulheres negras e periféricas, assim, criando a possibilidade de uma geração de renda Tópico importante de ser ressaltado, uma vez que, movimentos culturais como este, além de garantir lazer e entretenimento, são capazes de abrir espaços para grupos rotineiramente marginalizados

Por fim, o festival ainda contou com uma arena de impacto - um espaço que amplifica acesso de grupos marginalizados a projetos sociais, como Hub Quebrada e Movimento, Base Social e a Cooperativa de Crédito Solidário CRESOL

Fechando a Semana Municipal da Criatividade de Campinas, o Festival Cria Ativa representou um importante fluxo que tem acontecido em nosso território, que traz a manutenção, o fortalecimento e a união de nossas culturas ancestrais - historicamente menosprezado e esquecido pelo poder público Movimento que também fomenta as tecnologias sociais de inovação, que se alimentam dos saberes de suas raízes para direcionarem e potencializarem seu futuro Assim, segundo os Adinkras africanos, Cria Ativa é a materialização de Sankofa

Texto por Beatriz LuMO

Nação Nagô

Na periferia de Campinas, em meio à pulsante vitalidade da Casa de Cultura Tainã, um movimento de resistência e valorização cultural ganha força a cada quarta-feira. A Nação Nagô, como é conhecida, se reúne para discutir e promover a extensão comunitária, criando um espaço vibrante de troca e aprendizado.

A Casa de Cultura Tainã, um quilombo urbano fundado em 1989, sempre foi um bastião da cultura afro-brasileira e indígena Recentemente, suas atividades se intensificaram com a participação ativa de coletivos negros de estudantes da Unicamp. Esses encontros semanais não são meras reuniões; são celebrações de identidade, tradição e luta Eles representam um esforço coletivo para enraizar os saberes ancestrais e contemporâneos nas práticas cotidianas e acadêmicas

O Propósito dos Encontros

Os encontros da Nação Nagô têm um propósito claro: fortalecer os vínculos entre a Casa Tainã e a Unicamp, promovendo uma extensão comunitária que seja verdadeiramente inclusiva e representativa Através de discussões abertas e colaborativas, os participantes buscam maneiras de integrar o conhecimento acadêmico com as tradições culturais da comunidade. Esta integração visa criar um ambiente onde a diversidade cultural é não apenas reconhecida, mas celebrada

Para os coletivos negros de estudantes da Unicamp, os encontros da Nação Nagô são uma oportunidade única de se conectarem com suas raízes e com a comunidade local Estes estudantes trazem consigo suas experiências e conhecimentos acadêmicos, que se encontram e se mesclam com os saberes tradicionais guardados pela Casa Tainã. Este intercâmbio é fundamental para a construção de um espaço onde todos se sintam representados e valorizados.

A valorização das manifestações culturais afro-brasileiras e indígenas é um dos pilares dos encontros da Nação Nagô A Casa Tainã tem uma longa história de promoção de tecnologias ancestrais, curas, festas e, principalmente, memória e conhecimento. Estes encontros reforçam a importância de manter viva a herança cultural através da dança, da música, das celebrações e das práticas religiosas.

Confluência das Águas

Os encontros da Nação Nagô são uma verdadeira confluência das águas, onde o conhecimento tradicional e o acadêmico se encontram e se enriquecem mutuamente Assim como as águas que evaporam dos rios brasileiros e retornam à África através da chuva, o conhecimento compartilhado nesses encontros propicia empatia, cura, bem-estar, amor, memória e festa.

Neste espírito de colaboração e respeito mútuo, a Casa Tainã convida a todes a se juntar à sua dança. Os encontros são mais do que uma série de reuniões; são um movimento vibrante e transformador Eles representam a resistência, a celebração e a promoção de uma extensão comunitária que valoriza e integra as diversas manifestações culturais do nosso país. Encontros Nação Nagô, todas as quartas na casa de cultura Tainã, rua Inhambu, 645, Campinas

Texto por Herbert Otacilio

Neste espírito de colaboração e respeito mútuo, a Casa Tainã convida a todes a se juntar à sua dança.

Uma verdadeira confluência das águas, onde o conhecimento tradicional e o acadêmico se encontram e se enriquecem mutuamente

Feira da Agricultura Familiar

Desde 2023 o estacionamento da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp se tornou palco de uma das atividades de extensão da universidade, a Feira de Agricultura Familiar (FAF) Ela ocorre pelo menos uma vez por semestre, tendo as datas e horários divulgados pelo perfil no Instagram @faf.unicamp. É um projeto que foi criado por um grupo de trabalho da disciplina "EX023 - Educação Popular, Alimentação e Arte" com o intuito de promover comunidades agrícolas da região de Campinas, auxiliando na renda dessas comunidades e ampliando seu contato com a universidade

A feira conta com a presença de diversas comunidades, como a Menino Chorão, Marielle Vive, Milton Santos, Elizabeth Teixeira e Itajaí. A maioria delas vive em situação de vulnerabilidade e, por isso, a venda de seus próprios produtos é muito importante Entretanto, também é essencial a abertura do espaço da universidade para essas comunidades que, muitas vezes, se encontram muito distantes desse ambiente

Além disso, a feira de agricultura familiar da FEA traz a arte e a cultura de várias comunidades que chegam na Unicamp com uma proposta de feira diferente do que já conhecemos em nossa vivência universitária Durante a feira, quando possível, diversos artistas se apresentam e as comunidades produtoras estão sempre disponíveis a trocas ricas de conhecimento

Pães, bolos, doces, frutas, hortaliças, temperos e muitos outros itens que são vendidos na feira são planejados e produzidos de maneira artesanal O produto final possui um significado muito grande da resistência e luta dessas comunidades, carregando muitas histórias, dificuldades e conquistas.

Durante a feira que ocorreu no dia 15 de maio de 2024, conversamos com uma das comunidades, para saber um pouco mais sobre seu processo produtivo e a importância da FAF para eles Quem nos concedeu a entrevista foi Carmen Sousa, líder responsável por fundar, em 2010, a comunidade feminista “Menino Chorão”, que hoje abriga mais de 380 famílias e é organizada por mulheres que lutam pelos seus direitos.

Carmen compartilhou conosco um pouco da representatividade e importância da feira para eles Segundo ela: “A feira é importante, gera uma fonte de renda e conhecimento

Além das pessoas nos conhecer, a gente também conhece novos companheiros, de novas ocupações. É um movimento que, além de trazer renda pra gente, trás uma união dos movimentos, dos agricultores” Carmen também destacou a importância de ter contato com os outros produtores e como a feira tornou essa interação possível. Com isso, exemplifica que a partir do contato com outras comunidades e suas agriculturas, pode haver uma troca de trabalho, de produtos e experiências

Como já citado, a feira é um espaço para que as comunidades produtoras sejam representadas diante da comunidade universitária, de modo que haja um maior contato e conhecimento sobre elas. Diante disso, os produtos vendidos são muito mais que mercadoria, possuem uma importância singular e potente para quem os produz Nesse sentido, a líder destacou o processo árduo pelo qual a comunidade passou para se tornar o que é hoje, “A gente tem uma comunidade feminista que foi fundada por mulheres e ainda hoje é organizada por mulheres e lá a gente venceu vários obstáculos Hoje a gente tem que dizer que somos mais que vencedoras, a gente venceu a fome, desemprego, preconceito, violência ”

Dentre tantas dificuldades, a líder também contou um pouco sobre as questões de reconhecimento da ocupação, a fome que enfrentaram, e sobre a criação dos projetos da comunidade “Não tinha ônibus, não tinha água, não tinha luz, mas hoje a gente tem isso Então hoje a gente precisa do asfalto e legalizar o nosso espaço, porque a gente ainda não tem o título de posse né, nós estamos lá a 14 anos e temos o direito, é o que a gente precisa". Carmen conta que no começo todas as mulheres estavam desempregadas e relata como elas se viravam para conseguirem comer: "A gente não tinha nem o que comer, a gente catava latinha pra poder conseguir alguns alimentos, fazia aquele almoço coletivo, cada um trazia o que tinha e fazia aquele panelão. Nós não tinha cozinha, fazia debaixo de uma árvore, era a única sombra que a gente tinha” Ela também ressaltou a dificuldade em dias chuvosos: “Tinha mil criança pra comer, aí a gente colocou duas telha uma na outra e cozinhamos na lenha na chuva, aí uma segurava a telha, enquanto a outra mexia a panela” Durante a pandemia, a correria para que as famílias tivessem uma fonte de alimentação se intensificou, dona Carmem contou que neste período as famílias, infelizmente, passavam fome e, numa iniciativa de erradicar esse fato na comunidade, ela e alguns amigos se mobilizaram para arrecadar cestas básicas para as famílias. Porém, a grande questão era a falta de cozinha, como consumir os produtos da cesta se não há como cozinhá-los? Carmen então passou a pegar marmitas no Sesi “Aí na pandemia eu fiquei louca, as mulheres tava passando fome, aí primeiro ato eu fui no Sesi, fui atrás de uns amigos e consegui marmita pela Sesi Na verdade, primeiro eu consegui as cestas, depois descobri que as mulheres não tinha gás, imagina a tortura psicológica você ter o alimento e não ter como cozinhar” A líder acrescenta que a criação de uma cozinha era uma necessidade e não um luxo Com a construção da cozinha, foi possível preparar os alimentos para as

famílias que não tinham condições de cozinhar, enquanto as demais continuaram recebendo as cestas Assim surgiu “A Cozinha das Pretas” que, segundo ela, após a melhoria das condições, passou a ser uma importante fonte de renda, levando em conta que vários produtos lá feitos são vendidos como forma de arrecadação de dinheiro para a comunidade

Ao fim dessa entrevista a líder elogiou o registro e falou da importância de divulgar a cultura e realidade das comunidades carentes, “Ajuda muito fazer esse registro porque muitas vezes as pessoas não conhece A gente mora numa área bem crítica da cidade, a gente mora do outro lado da cidade que é a parte mais humilde, mais carente, que se sabe, todos nessa área é incriminado, tem a visão que gente mais pobre é bandido, é isso e aquilo outro”.

Assim sendo, a feira foi um espaço de incrível troca cultural e saberes, para além das questões econômicas Nosso agradecimento à Carmen por compartilhar um pouco de sua vivência e comunidade, alinhado à importância da feira. Que esse contato entre os produtores e a universidade se estreite cada vez mais e que a feira possa continuar sendo um meio para isso.

Convidamos todos os interessados a participar das próximas edições da Feira de Agricultura Familiar e a apoiar as comunidades que nela participam! Siga no Instagram o perfil @faf unicamp para acompanhar e ficar por dentro das notícias e próximos eventos relacionados ao tema

Texto, entrevista e fotografias, Maria Gabriela Tonhosolo, Bruna Giselle Arruda, João Victor dos Santos, Julia Aro, Beatriz Cosenza, Camila Akemi

ATENTA E FORTE

Espelho

O impreciso espelho do meu tempo quebrou porque fez o que era pequeno grande e o que era grande, pequeno.

Ditadores e monstros preencheram sua face. Mesmo agora enquanto respiro seus cacos perfuram as paredes do meu coração e em vez de suor eu transpiro vidro

Poesia Kajal Ahmad
Ilustração Maryane Comparoni

Cridão e Arapuca de Urubu Baile C.R.A.U.

Cris Monteiro, conhecido carinhosamente por Cridão. Comecei minha trajetória como músico muito jovem, aos 15 já tocava na noite como percussionista autodidata Depois deste período, entrei no conservatório de Tatuí, onde aprofundei nos estudos de ritmos brasileiros e teoria musical, o que me deu base para procurar mestres com quem aprendi ritmos cubanos e africanos, que fazem parte de minhas referências musicais Mais tarde, estudei bateria brasileira na antiga ULM (Universidade Livre de Música).

A memória afetiva de músicas ouvidas por meus pais, trouxeram a influência do brega para os meus estudos e pesquisa, foi onde encontrei referências que me nutrem até hoje, tais como Odair José, Alípio Martins, Alberto Kelly, Assisão, Beto Barbosa, Luiz Caldas, Sidney Magal e Fagner As minhas pesquisas do brega atualmente misturam influências das guitarradas, carimbó, banguê , boleros, lambada, merengue e zouk.

Toda essa mistura gerou as músicas autorais que compõem o baile do CRAU, que é uma festa que une o calor da dança com o amor ao brega e o cheiro no cangote, há uma magia que acontece no salão, que vibra com a troca de energia e pulsa em cada pessoa que faz parte deste movimento libertador

Nesse momento, me preparo pra lançar meu segundo disco autoral, FAGULHA, que chega cheio de axé, firmando a resistência dessa expressão cultural longe de suas raízes

“Salve a música brega e os seus!”

Texto Cris Monteiro

Foto Maryane Comparoni

Festa DCE

Na data de 06/04 aconteceu o evento “Festa do DCE” que tinha como principal comemoração às conquistas dos alunos durante a greve de 2023.

A matéria a seguir tem como objetivo registrar conversas sobre a luta dos discentes ao longo desses 10 últimos anos, que resistiram por diferentes governos do estado e da federação Nesse período, inúmeras pautas foram levantadas pelos alunos e, parte delas, foi acatada depois de muita luta

Apesar do cenário de comemoração, há muito a ser conquistado, por direito, aos alunos que estão e que virão a integrar nossa universidade

Para comentar sobre isso, agradeço a participação dos convidados Jonnas Lima Patrício, ex-aluno da Unicamp, com ingresso em 2014 e Kauan Lopes de Melo com ingresso em 2024

J:“Eu sou o Jonas Lima Patrício, eu tenho 29 anos Eu entrei pela primeira vez na Unicamp em 2014 pelo vestibular de ampla concorrência no curso de Engenharia Agrícola, que na época não era um curso que eu almejava Porém, eu tinha vontade de ser professor, e por isso fiquei no Unicamp no período de 2014 até o período de 2016, mais ou menos ali até o primeiro semestre.”

J:“Eu fiquei o ano de 2017 fora da Unicamp e passei de novo no vestibular de ampla concorrência para o curso de física e licenciatura noturno. Minha coleção de grau foi esse ano, 2024, em fevereiro então eu passei, basicamente, e ainda estou incluído na Unicamp, vivo ainda aqui em Barão Geraldo e de lá para cá, presenciei muitos movimentos estudantis, algumas greves e pandemia também, e vi a Unicamp mudar bastante ”

J:“Os estudantes que entravam na Unicamp, a maioria das vagas era destinada para ampla concorrência, e a gente sabe que nessas vagas de ampla concorrência, quem tinha feito escola particular, quem tinha feito um cursinho caro, saía muito na frente, muito na frente Então se via uma universidade muito mais homogênea, tanto do ponto de vista étnico, como do ponto de vista social também Então era muito diferente, muito diferente do que é hoje em dia, por exemplo ”

J:Hoje em dia você vê uma Unicamp muito mais plural, você vê uma Unicamp muito mais heterogênea, e isso se dá muito mais as cotas O número de estudantes, eu não sei números, porque eu também não fui atrás de saber, mas com certeza no meu dia a dia comecei a encontrar muito mais pessoas, pardas, pretas, indígenas, eu tive muito contato, eu nunca tinha tido contato com uma pessoa indígena comecei a ter contato com indígena de 2022 para frente, graças também ao Vestibular Indígena”

J:“Eu vim de uma escola particular, estudei em escola particular a vida inteira, lidei pouquíssimo com pluralidade, assim. Na escola tinha uma pessoa preta só na minha sala, nunca tive um professor preto ”

J:“Quando você começa a conversar e conviver com pessoas diferentes que vieram de origens diferentes de você, você começa a ter uma noção mais real do que é o Brasil… que as cotas não são só uma “esmola”, é sim uma forma de você acabar com o racismo, você acabar com a transfobia, enfim E aí lá em 2014 eu não tinha muita essa noção ainda, e comecei a ter a partir do momento que começam a entrar as cotas, né? Principalmente que as cotas começam a valer

J:Eu conversei com um professor meu, quer dizer.. um chefe meu que trabalha na escola, ele é preto, e ele entrou na Unicamp acho que em 98, né? E ele também foi a primeira pessoa da família dele que entrou numa universidade, e quando ele entrou lá, ele falou que na fila lá pra fazer a inscrição, ele era o único preto, não tinha ninguém igual a ele, ninguém ”

J:“É absurdo, ele contando o relato pra gente, né? E aí ele falou que hoje em dia, quando ele entra, quando ele vem visitar a Unicamp, porque ele é doutor, ele fez mestrado aqui na Unicamp, hoje em dia ele falou que quando ele pisa na Unicamp, ele fala que é muito diferente da época que ele frequentava, sabe? Se na minha época já era diferente, imagina a dele então, né? Porque antigamente não tinha cota nenhuma, e era mais elitista do que era em 2014.”

L:“Muito legal! Você comentou sobre a entrada de alunos vindos do Vestibular Indígena, e como é que você consegue perceber que hoje a Unicamp é muito mais populada por minorias Eu queria que você fizesse uma reflexão que é você acha que hoje a gente só fornecendo pensando na Unicamp consegue fornecer para um aluno indígena, para um aluno trans um ambiente saudável.. acha que hoje a Unicamp está preparada para receber esses alunos, financeiramente, para auxiliar na permanência deles ”

L:“Estou falando, né? Desde o auxílio com bandejão, desde o auxílio-moradia, que é a moras aqui, com os ônibus, enfim Com outros tipos de aportes financeiros, mas também como comunidade ”

J:“Barão Geraldo é um bairro extremamente elitista. Elitista, tipo, você vê a população que não é universitária, que frequenta Barão Geraldo, você vê que é um pessoal de classe média alta. Aqui, tanto a questão imobiliária, quanto a questão de mercado, quanto a questão de combustível de carro, tudo é muito caro aqui comparado às outras cidades ”

J: “E aí, o que acontece? Você coloca pessoas que vêm de uma classe social baixa, que não tem condição nenhuma de se manter aqui, e você coloca, tá, beleza, você deu acesso à faculdade, mas como que ela vai se manter aqui? Onde ela vai morar? O que ela vai comer? Ter Lazer?”

J:” O acesso às bolsas não é tão simples assim de conseguir, um monte de gente negada, falta bolsa mesmo Então, não adianta nada, né? Você dar o acesso para universidade se você não tem nenhum plano de você permanecer na universidade ”

L:”Eu gostaria que você falasse sua visão, se ela é pessimista ou otimista, sobre os movimentos sociais, sobre a luta que o pessoal está tendo na Unicamp.”

J:Cara, eu sou bem otimista em relação a isso, eu acho que vai demorar ainda para chegar no ideal, talvez nem chegue, mas cada ano parece que melhora. Eu sinto também que a informação está chegando, né? Eu me formei no ensino médio em 2012 e lá atrás, falavam na minha classe sobre essas lutas, sobre esses direitos, não tinha debate sobre racismo, machismo, homofobia, transfobia”.

Texto e foto Leandro Groninger Monteiro

J: E aí, hoje em dia, mesmo entre as escolas particulares, principalmente na escola que eu trabalho, tem um movimento antirracista, então tem palestras, tem rodas de conversa antirracista, é bem legal ”

K: “Meu nome é Kauan, eu tentei na Unicamp esse ano, sou 024, e eu faço Engenharia Química. Vim pra cá basicamente por uma questão de preferir a universidade, em parte por ela ser estadual, tem um pouco mais de acesso a verbas, e no geral em busca de algumas oportunidades científicas mesmo. Eu entrei pelo Enem, o Enem já é seletivo para as escolas públicas, então já funciona como uma cota, e além disso eu entrei como cota PPI, sou pardo, vim de Pernambuco, longe pra caramba, mas é isso, eu tava focado em entrar numa universidade que eu considero muito boa.”

L: Eu não sei se você sabe exatamente, mas eu também sou cotista, eu não entrei nas vagas do Enem, porque eu não estudei em uma escola pública. Querendo ou não, no retrato da sociedade brasileira, eu sou sim uma pessoa privilegiada, porque eu consegui, através da minha mãe, que trabalhou bastante, fazer uma escola particular muito boa

L: “Bom, eu acho que, não sei se já aconteceu com você, mas houveram, e eu presenciei, dentro da universidade, casos de racismo comigo e sem ser diretamente comigo Já aconteceu algum episódio com você, enquanto negro e bissexual? Como você está se sentindo pertencente à universidade?”

K: “Não aconteceu nenhum caso comigo… acho que atualmente, pelo menos, o pessoal do Unicamp tá muito plural nesse sentido, todo mundo é muito diferente, na minha turma, principalmente, tem todo tipo de gente, assim, que você possa imaginar, acho que ainda não tá num nível ideal, a turma é meio ao meio, ainda tem bem menos gente negra do que pessoas brancas, mas, de fato, tem todo tipo de gente, todo tipo de orientação sexual, todo tipo de identidade de gênero, a turma é bem plural nesse sentido.”

L:“Você acha que é suficiente, pensando como essa pessoa vai se manter financeiramente na região?”

K: “Cara, esse pra mim foi o maior problema de vir pra Unicamp. As cotas ajudam você a entrar na faculdade, de fato, mas a permanência aqui, de longe, é a parte mais difícil É uma região cara pra se morar, Barão Geraldo é um bairro muito caro. Eu contei muito com o auxílio social da Unicamp quando eu entrei aqui ”

K: “Eu vim pensando nisso, eu preciso de dinheiro pra passar 2, 3 meses até eu conseguir o auxílio social, e daí até o final do curso eu tô seguro Mas, inclusive, isso não foi a minha realidade ”

K: Mesmo tendo a minha instituição referida, mesmo tendo os requisitos, a gente não tem bolsa suficiente pra todo mundo, isso é um fato Então, muita gente que também precisa da bolsa ainda fica fora e tem dificuldade de permanência Acho que esse é, de fato, o ponto mais difícil de entrar na Unicamp ”

L: “E agora eu queria comentar, tocar num outro ponto, que era sobre nós como alunos, professores, pós-graduando, e a Unicamp como infraestrutura para abraçar PCDs?”

K: “Se alguém hoje é cadeirante e entra na Unicamp e ela não pode entrar por outra saída, assim, como é que ela vai ter acesso no RU? Ou, beleza, ela vai pro RS. Como é que ela vai subir até o RS? É Enfim, o RA tem um espaço muito apertado, então, tipo, a gente não tá preparado pra atender, dentro das salas de aula, essas pessoas que vão ser PCD”

Cárcere ou porque as mulheres viram búfalosCompanhia de Teatro de Heliópolis

A peça “Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos”, da Companhia de Teatro de Heliópolis, é uma montagem teatral dirigida por Miguel Rocha e texto de Dione Carlos. Movidos pela violência como matéria central de suas criações cênicas, o grupo de teatro de pesquisa Companhia de Teatro de Heliópolis, em seus 24 anos de existência, empenhase em transformar as vivências de seus integrantes em teatro.

O grupo surge a partir do desejo de Miguel Rocha em encenar o texto “A Queda Para o Alto”, texto de Santa Mara Herzer com colaboração de Eduardo Suplicy, que narra histórias e vivências na Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor - a antiga FEBEM Percebendo a conexão entre o texto e as experiências de jovens da periferia de Heliópolis, Miguel se aproxima de Solange Agda e da UNAS (União de Núcleos, Associações dos Moradores de Heliópolis e Região), entidade surgida em 1978 de comissão de moradores da favela de Heliópolis. Solange trabalha orientando jovens e adolescentes moradores de Heliópolis, enquanto Miguel se dispõe a realizar atividades no UNAS A partir de tal vínculo, ele reúne, para a montagem de “A Queda Para o Alto”, cerca de 30 pessoas - todas moradoras de Heliópolis.

As apresentações de sua primeira montagem fizeram com que a companhia ganhasse muita notoriedade, chamando a atenção de importantes diretores teatrais como Antônio Araújo (diretor do grupo Teatro da Vertigem) e Zé Celso (diretor do Teatro Oficina) Com crescente relevância foi convidado para realizar algumas apresentações no espaço do Teatro Oficina

Vê-se, já no primeiro trabalho do grupo, um valioso impacto na cena teatral A violência é o principal assunto de pesquisa e criação teatral da Companhia de Teatro de Heliópolis. Todos os questionamentos que surgem a partir de tal temática são estabelecidos, pelo grupo, como estímulos para o desenvolvimento de seus espetáculos.

“Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos” é um exemplo disso A peça expõe, de maneira poética, a realidade do encarceramento de homens pretos, pobres e periféricos, e as maneiras com as quais isso impacta na vida das mulheres como mães, filhas, esposas e tias ligadas a eles A estrutura do encarceramento é instaurada no palco, expondo suas vidas entrelaçadas pelo cárcere, ressaltando a similaridade dos corpos femininos com o dos encarcerados em termos de classe social, raça e território geográfico

Iansã-Oyá, orixá associada à força e resistência, é evocada como símbolo dessas mulheres, presente tanto nos momentos de solidão e de força (nas vexatórias revistas da penitenciária, ou no carregar do jumbo pesado - itens levados por mulheres para seus familiares encarcerados), quanto nos momentos de esperança, e festejo (na soltura dos familiares)

Na entrevista, Miguel Rocha nos diz que, no próximo trabalho da Companhia, também estarão presentes temáticas como a violência e a detenção de corpos periféricos, pretos e masculinos, entretanto, a partir da perspectiva pós-liberdade Há o interesse de questionar se a sociedade possibilita essa ação de reintegração, ou se somente perpetua um falso discurso de ressocialização O espetáculo visa delinear o debate de como esses homens se organizam materialmente e psicologicamente ao retomar suas liberdades. Para o trabalho com tais temáticas, a Companhia de Teatro de Heliópolis utiliza-se de uma metodologia de organização na qual todos(as) são soberanos em suas criações O coletivo não cultua uma hierarquia que impeça alguma expressividade ou que coloque o diretor em um território de domínio total da obra Dessa forma, todos(as) têm papel fundamental na criação cênica em desenvolvimento.

Ao abordar a respeito dos públicos das apresentações da companhia, Miguel destaca que há um interesse em se colocarem em relação direta com as pessoas do território de Heliópolis, mas também um desejo em dialogar os que estão além dessa realidade O diretor acredita que, dessa maneira, é possível expor amplamente questões de profunda urgência de debate - como a noção de que a maioria dos encarcerados serem identificados como homens pretos, pobres e periféricos ser consequência do histórico de escravização da população africana ocorrida no Brasil e do imperialismo europeu, e não de uma aleatoriedade contemporânea

Ao refletir sobre as obras da Companhia de Teatro de Heliópolis, Miguel questiona as expectativas da sociedade sobre as produções da periferia em termos de ideias, pensamento e estética Ele afirma: “Podemos também elaborar artisticamente questões complexas, não se limitando em reproduzir a realidade. A realidade se dá de uma forma dura, trazemos para o teatro de uma forma entendível, mas isso não significa que artisticamente estejamos somente nessa fase de composição, vamos para além de outras leituras da primeira camada do entendível.”

“Cárcere ou porque as mulheres viram búfalos” apresentou na cidade de Campinas, no Teatro Castro Mendes, no dia 24 de setembro de 2024 às 19:00hs. Para conhecer mais sobre as obras e a Companhia de Teatro de Heliópolis acesse o instagram: www instagram com/ciadeteatroheliopolis/

Texto Leonardo Lisboa

Fotografia acervo do grupo

UNIMÍDIA 15

O UNIMÍDIA é um evento anual da Midialogia organizado pelos estudantes e voltado para todos aqueles interessados pela área de comunicação e seus desdobramentos. Por meio da realização de mesas, oficinas, mostras e outras atividades, o evento promove a troca de conhecimentos e experiências, aproximando o público de profissionais da área. Incita, dessa forma, as possibilidades de atuação e exploração dos campos que o curso abrange ao mesmo tempo que contribui com a extensão universitária

O UNIMÍDIA busca, primeiramente, transmitir conhecimento acerca da área de comunicação ao mesmo tempo em que traz destaque para produções universitárias A edição de 2024 traz novidades já que celebra dois grandes marcos para a Midialogia: o 20º aniversário do curso e a 15º edição do UNIMÍDIA

A convergência desses dois aniversários foi a inspiração para a criação do tema RAÍZES, de forma a explorar as origens da Midialogia e do evento, buscando revisitar o lugar de onde viemos A intenção é olhar o passado ao mesmo tempo em que vislumbramos o futuro e expandimos o debate sobre as possibilidades dessa área.

O UNIMÍDIA é pensado para atingir e receber a comunidade acadêmica da UNICAMP e a comunidade externa à universidade sendo, dessa forma, um evento aberto aos interessados nos temas e gratuito Com ampla divulgação, a intenção é atrair cada vez mais pessoas de fora da universidade e promover a troca de conhecimentos, contribuindo com a extensão universitária. A média de pessoas que passam pelas atividades do evento aproxima-se das 2 500 pessoas, em todos os dias do evento Neste ano tiveram nomes, mesas e oficinas extraordinárias, com ressalta a mesa “Mulheres negras e indígenas no audiovisual” que busca construir um diálogo entre as convidadas e o público não somente sobre audiovisual, mas como é essa experiência para elas sendo mulheres racializadas, quais são as perspectivas futuras, cenário atual e também perpassar os seus trabalhos no meio, com as convidadas Lilian Solá Santiago e Bárbara Matias.

Destaca-se o depoimento de Beatriz Villela, vice-diretora de produção que acompanhou e batalhou para o evento concretizar-se:

“Acho que é um evento muito desafiador de se organizar, mas necessário. Eu aprendi muito com o Unimidia e espero que ele continue crescendo cada vez mais!”

Do nada, do nadão

Calma, respira e pensa

Agora me conta tudo o que te machuca por baixo da pele preta.

Mas saiba que o nosso coro vibrando é tambor que cala trombeta.

Que eu filmando só as nega, Tentado não dá mancada,

Mas é tanta fita errada

Enraizada na cabeça.

Posto que eu não caiba na mesa por falta de etiqueta.

Ensinado a ficar quieto pra poder evitar as treta, atrito ou "suposição".

Sempre a segunda opção, nos põe em posição de ataque. (Right?)

Então ataquemos já (Figth!)

Mas antes, (Oxê!?)

Nego, a gente tem que se ajuntar, ta ligado?

Esse é nosso legado, essa será nossas heranças.

Não é petulância ou pagação de sábio

É que peguei uns envolvido negar semelhança.

Narciso ou Junquilho é Rabo de rato

Dois galo aqui é peixe,

Capital é rede

E os partido é isca.

Brada, sista, leia, ouça

E se sentiu o que disse nesses versos:

Vibra, canta, dança, viva e grita:

FÉ NA ESPERANÇA

E FOGO NOS RACISTA!

Poeta SouLéo

Revista Capoeirando

Um tributo à Cultura Popular

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