RBSP v. 43 n. 4 (2019)

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i Secretaria da Saúde do Estado da Bahia ISSN 0100-0233 ISSN (online) 2318-2660 Revista Baiana de Saúde Pública v. 43 n. 4 out./dez. 2019

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Rev. baiana saúde pública Salvador v. 43 n 4 p. 1-167out./dez. 2019
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E-ISSN 2318-2660

1.Saúde Pública - Bahia - Periódico. IT

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ESPÍRITO SANTO

Y HOSPITALIZACIONES POR ENFERMEDADES CARDIOVASCULARES EN MUNICIPIOS DE LA REGIÓN NORTE DE ESPÍRITO SANTO, BRASIL

de Medeiros, Jordana Herzog Siqueira, Taísa Sabrina Silva Pereira

CHARACTERIZATION OF ENDOPARASITES IN FECAL ANALYZES IN A NEIGHBORHOOD OF THE STATE OF BAHIA, BRAZIL

Y CARACTERIZACIÓN DE ENTEROPARÁSITOS EN MUESTRA DE HECES DE UN DISTRITO DE BAHÍA, BRASIL

Lopes Crisostomo, Maricélia Maia de Lima, Lucíola Maria Lopes Crisostomo

RIGHT TO HEALTH: DEMAND FOR FOOD SUPPLEMENTS IN RIO DE JANEIRO – A CASE STUDY DERECHO A LA SALUD: DEMANDA DE SUPLEMENTOS DIETÉTICOS EN RÍO DE JANEIRO – UN ESTUDIO DE CASO

Aldo Pacheco Ferreira, Juliana Nobre dos Santos Silva, Marcos Besserman Vianna, Dorival Fagundes Cotrim Junior, Eduardo Dias Wermelinger

ARTIGO DE REVISÃO

REVIEW ARTICLES ARTÍCULOS DE REVISIÓN

FRAGILIDADES NA ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DAS EQUIPES DE SAÚDE DA

WEAKNESSES IN THE PERFORMANCE OF THE PROFESSIONALS OF THE FAMILY HEALTH TEAMS DESCRIBED IN THE LITERATURE FRAGILIDADES EN EL DESEMPEÑO DE LOS PROFESIONALES DE LOS EQUIPOS DE SALUD FAMILIAR DESCRITOS EN LA LITERATURA

Caren Fernanda Muraro, Andrei Bonamigo, Themis Goretti Moreira Leal de Carvalho, Helio Aisenberg Ferenhof, Marcelo Gitirana Gomes Ferreira, Fernando Antonio Forcellini

ATOR SOCIAL E AS INVESTIGAÇÕES EM SAÚDE: OLHAR PARA NOVA CONTRIBUIÇÃO TEÓRICA

SUMÁRIO | CONTENTS | SUMARIO EDITORIAL | EDITORIAL | EDITORIAL 7 Marcele Carneiro Paim ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE FREE THEMED ORIGINAL ARTICLES ARTÍCULOS ORIGINALES DE TEMAS LIBRES CARACTERIZAÇÃO DE PACIENTES COM ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO EM ATENDIMENTO FISIOTERAPÊUTICO EM UMA UNIVERSIDADE PÚBLICA 09 CHARACTERIZATION OF PATIENTS WITH ENCEPHALIC VASCULAR ACCIDENT IN PHYSIOTHERAPEUTIC CARE IN A PUBLIC UNIVERSITY CARACTERIZACIÓN DE PACIENTES CON ACCIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO EN ATENCIÓN FISIOTERAPÉUTICA EN UNA UNIVERSIDAD PÚBLICA Mariana Araújo Goes da Mota, Tânia Cristina Dias da Silva Hamu, Rina Marcia Magnani MORTALIDADE E INTERNAÇÕES POR DOENÇAS CARDIOVASCULARES EM MUNICÍPIOS DA REGIÃO NORTE DO ESPÍRITO SANTO 26 MORTALITY AND INTERVENTIONS FOR CARDIOVASCULAR DISEASES IN MUNICIPALITIES OF THE NORTHERN REGION OF
MORTALIDAD
Katiucia
PREVALÊNCIA E CARACTERIZAÇÃO DE ENTEROPARASITOS EM ANÁLISES DE FEZES EM UM DISTRITO DA BAHIA, BRASIL 44 PREVALENCE AND
Bernardo
DIREITO À SAÚDE: DEMANDA POR SUPLEMENTOS ALIMENTARES NO RIO DE JANEIRO –UM ESTUDO DE CASO 57
Vasconcelos
PREVALENCIA
FAMÍLIA
71
DESCRITAS NA LITERATURA
87

SOCIAL ACTOR AND HEALTH RESEARCH: LOOKING AT A NEW THEORETICAL CONTRIBUTION

ATOR SOCIAL Y LAS INVESTIGACIONES EN SALUD: MIRADA HACIA UNA NUEVA CONTRIBUCIÓN TEÓRICA

Sydia Rosana de Araujo Oliveira

FEBRE DO NILO OCIDENTAL: UMA REVISÃO DA LITERATURA 107

WEST NILE FEVER: A LITERATURE REVIEW

FIEBRE DEL NILO OCCIDENTAL: UNA REVISIÓN DE LA LITERATURA

Taiana Andrade Freitas, Érika Dayane Leal Rodrigues, Matheus Moreira Reis

ESTUDO SOBRE A QUALIDADE DA ÁGUA PARA CONSUMO HUMANO

E AS DOENÇAS DIARREICAS NO BRASIL

STUDY ON DRINKING-WATER QUALITY AND DIARRHEAL DISEASES

ESTUDIO SOBRE LA CALIDAD DEL AGUA POTABLE Y LAS ENFERMEDADES DIARREICAS EN BRASIL

Bruno Oliveira Souza e Silva, Alexandre Sylvio Vieira da Costa

119

CUIDANDO DO PRAZER NO PRÉ-NATAL: DISFUNÇÃO SEXUAL NA GRAVIDEZ 135

CARING FOR ANTENATAL SEXUAL SATISFACTION: SEXUAL DYSFUNCTION IN PREGNANCY

CUIDADO DEL PLACER EN PRENATAL: DISFUNCIÓN SEXUAL EN EL EMBARAZO Maria da Conceição Costa Rivemales, Mary do Valle Boz Lacava

RELATO DE EXPERIÊNCIA EXPERIENCE REPORTS

PRECEPTORSHIP EXPERIENCE WITH NURSING STUDENTS IN THE FAMILY HEALTH STRATEGY

PERCEPCIÓN SOBRE LOS ESTUDIANTES DE ENFERMERÍA EN LA ESTRATEGIA DE SALUD FAMILIAR

Fábia Luanna Leite Siqueira Mendes Santos, Fernanda Kelly Fraga Oliveira, Jucielma de Jesus Dias

TRAINING THE EXERCISE OF TUTORING IN PERMANENT HEALTH EDUCATION DE LA FORMACIÓN AL EJERCICIO DE TUTORÍA EN LA EDUCACIÓN PERMANENTE EN SALUD

Juleimar Soares Coelho de Amorim, Fernanda de Freitas Mendonça, Mariana Bertol Leal, Helvo Slomp Júnior, Rossana Staevie Baduy

DIRETRIZES PARA AUTORES I GUIDELINES FOR AUTHORS DIRECTRIZES PARA AUTORES

RELATO DE
PRECEPTORIA COM DISCENTES DE ENFERMAGEM NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA
EXPERIENCIA
146
DA FORMAÇÃO AO EXERCÍCIO
TUTORIA
EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE
DA
EM
153

É com grande satisfação que apresentamos este novo volume, composto por reflexões no campo da saúde coletiva que oportunizam troca de experiências, produção e difusão de conhecimento entre profissionais de saúde, discentes, docentes, gestores e cidadãos. Nesse sentido, buscamos também contribuir com o debate sobre a relevância da democratização e circulação de informações técnico-científicas em saúde.

A seção “Artigo Original de Tema Livre” reúne quatro estudos que versam sobre temáticas importantes e atuais da saúde pública, tais como fisioterapia de pacientes com acidente vascular encefálico; doenças do aparelho circulatório, taxas de mortalidade e de internação; doenças parasitárias como causa de morbimortalidade; direito à saúde na perspectiva da judicialização; e discussão sobre acessibilidade e gestão dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS). São eles: Caracterização de pacientes com acidente vascular encefálico em atendimento fisioterapêutico em uma universidade pública; Mortalidade e internações por doenças cardiovasculares em municípios da região Norte do Espírito Santo; Prevalência e caracterização de enteroparasitos em análises de fezes em um distrito da Bahia, Brasil; e Direito à saúde: demanda por suplementos alimentares no Rio de Janeiro – um estudo de caso.

Este novo número apresenta também cinco artigos de revisão: Fragilidades na atuação dos profissionais das Equipes de Saúde da Família descritas na literatura; Ator social e as investigações em saúde: olhar para uma nova contribuição teórica; Estudo sobre a qualidade da água para consumo humano e as doenças diarreicas no Brasil; Febre do Nilo Ocidental: uma revisão de literatura; Cuidando do prazer no pré-natal: disfunção sexual na gravidez. Complementando os trabalhos desta edição, temos dois relatos de experiência na área da educação em saúde: Preceptoria com discentes de enfermagem na Estratégia Saúde da Família; e Da formação ao exercício da tutoria em educação permanente em saúde.

Almejamos que esta nova publicação incentive a produção de novos conhecimentos para gestão, cuidado e atendimento às necessidades de saúde da população, endossando o debate sobre a importância dos estudos e contribuições no campo da saúde coletiva e na defesa do SUS, enquanto modelo público de ações e serviços de saúde no Brasil.

https://orcid.org/0000-0002-3065-2144

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Revista Baiana de Saúde Pública
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ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE

CARACTERIZAÇÃO DE PACIENTES COM ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO

EM ATENDIMENTO FISIOTERAPÊUTICO EM UMA UNIVERSIDADE PÚBLICA

Mariana Araújo Goes da Motaa

https://orcid.org/0000-0001-9481-3907

Tânia Cristina Dias da Silva Hamub

https://orcid.org/0000-0002-8776-5991

Rina Marcia Magnanic

http://www.researcherid.com/rid/Y-4600-2018

Resumo

O acidente vascular encefálico (AVE) pode levar a alterações funcionais nas áreas sensitiva, motora, cognitiva e de comunicação. Ocorre através de alterações vasculares do encéfalo, originadas de uma suspensão do fluxo sanguíneo que causa danos celulares irreversíveis, podendo ser dividido em isquêmico ou hemorrágico. O objetivo deste estudo foi identificar o perfil epidemiológico e clínico dos pacientes com acidente vascular encefálico atendidos pela fisioterapia em uma clínica escola de instituição pública na região Centro-Oeste do Brasil. Trata-se de um estudo de corte transversal, descritivo, com abordagem quantitativa. Após aprovação do Comitê de Ética, foram tabulados e analisados os dados dos prontuários, através de um formulário estruturado no programa Excel. Os resultados mostraram que, dos 138 indivíduos, 60,15% eram do sexo masculino, e a idade média foi de 59,53 anos. De acordo com a etiologia, 45,3% sofreram AVE isquêmico; 52,5% possuíam hemiplegia à direita, e 16,55% tiveram múltiplos AVE; 78,98% eram hipertensos; 97,1% utilizavam medicamentos. Em relação ao diagnóstico funcional, a maioria possuía déficit de equilíbrio (39,9%); o objetivo fisioterapêutico mais frequente foi melhorar a amplitude de movimento (96,4%), e a conduta prevalente foi o alongamento (65,9%).

a Fisioterapeuta. Especialista em Saúde da Criança e do Adolescente Cronicamente Adoecidos. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: mariana_agm@hotmail.com

b Fisioterapeuta. Doutora em Ciências da Saúde. Docente e Coordenadora do Laboratório de Pesquisa em Musculoesquelética (LAPEME) da Universidade Estadual de Goiás. Goiânia, Goiás, Brasil. E-mail: tania.ft@gmail.com

c Fisioterapeuta. Doutora em Ciências da Saúde. Docente da Universidade Estadual de Goiás. Goiânia, Goiás, Brasil. E-mail: rinamagnani@gmail.com

Endereço para correspondência: Universidade Estadual de Goiás. Campus Metropolitano. Unidade Goiânia (ESEFFEGO). Av. Oeste, n. 56-250, Setor Aeroporto. Goiânia, Goiás, Brasil. CEP: 74075-110. E-mail: taia.ft@gmail.com

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Revista Baiana de Saúde Pública
DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a3001

Concluiu-se que como a incidência de AVE na população e o desenvolvimento de tecnologias assistivas vêm aumentando a cada dia, menos pacientes morrem por conta do AVE, por isso, faz-se necessário o desenvolvimento de estratégias de prevenção primária, como campanhas educativas, além da prevenção secundária, que por meio da fisioterapia precoce, pode reduzir a proporção de pacientes com incapacidades e melhorar a funcionalidade desses indivíduos.

Palavras-chaves: Acidente vascular encefálico. Epidemiologia. Fisioterapia.

CHARACTERIZATION OF PATIENTS WITH ENCEPHALIC VASCULAR ACCIDENT IN PHYSIOTHERAPEUTIC CARE IN A PUBLIC UNIVERSITY

Abstract

Stroke can lead to functional changes in the sensory, motor, cognitive and communication areas. It occurs through vascular alterations of the brain originated from a suspension of the blood flow that causes irreversible cellular damages, being able to be divided into ischemic or hemorrhagic. This study aimed to identify the epidemiological and clinical profile of stroke patients cared at physical therapy teams in a public institution school in the Midwest region of Brazil. This is a cross-sectional, descriptive study with a quantitative approach. After approval by the Ethics Committee, the data of the medical records were tabulated and analyzed using a form structured in the Excel program. The results showed that of the 138 individuals, 60.15% were males and the mean age was 59.53 years. According to the etiology, 45.3% suffered from ischemic stroke; 52.5% had right hemiplegia, and 16.55% had multiple strokes; 78.98% were hypertensive; 97.1% used drugs. Regarding the functional diagnosis, most patients had an equilibrium deficit (39.9%); the most frequent physiotherapeutic objective was to improve range of motion (96.4%), and the prevalent conduct was elongation (65.9%). In conclusion, although the incidence of stroke in the population and the development of assistive technologies are increasing each day, fewer patients die due to stroke, therefore, it is necessary to develop primary prevention strategies such as educational campaigns, in addition to of secondary prevention that, through early physiotherapy, can reduce the proportion of patients with disabilities and improve the functionality of these individuals.

Keywords: Stroke. Epidemiology. Physical therapy.

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CARACTERIZACIÓN DE PACIENTES CON ACCIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO EN ATENCIÓN FISIOTERAPÉUTICA EN UNA UNIVERSIDAD PÚBLICA

Resumen

El accidente vascular encefálico (AVE) puede llevar a cambios funcionales en las áreas sensitiva, motora, cognitiva y comunicación. Se produce a través de cambios vasculares del encéfalo originado por una suspensión del flujo sanguíneo que causa daños celulares irreversibles, los cuales se dividen en isquémico o hemorrágico. El objetivo de este estudio fue identificar el perfil epidemiológico y clínico de los pacientes con accidente vascular encefálico atendidos por la fisioterapia de institución pública de la región centro-oeste de Brasil. Este es un estudio de corte transversal, descriptivo, cuantitativo. Después de la aprobación del comité de ética, fueron tabulados y analizados los datos de los registros clínicos mediante un formulario en el programa Excel. Los resultados mostraron que, de los 138 individuos, el 60,15% eran del sexo masculino y el promedio de edad fue de 59,53 años. De acuerdo con la etiología, el 45,3% sufrió AVE isquémico; El 52,5% tenía hemiplejía a la derecha, y el 16,55% tuvo múltiples AVE; El 78,98% eran hipertensos; El 97,1% utilizaban medicamentos. En relación al diagnóstico funcional, la mayoría tenía déficit de equilibrio (39,9%); el objetivo fisioterapéutico más frecuente fue mejorar la amplitud de movimiento (96,4%), y la conducta prevalente fue el estiramiento (65,9%). Se concluyó que como la incidencia de AVE en la población y el desarrollo de tecnologías asistidas vienen aumentando cada día, menos pacientes mueren a causa de AVE, por lo que se hace necesario el desarrollo de estrategias de prevención primaria como campañas educativas, además de la prevención secundaria que, por medio de la fisioterapia precoz, puede reducir la proporción de pacientes con discapacidades y mejorar la funcionalidad de estos individuos.

Palabras clave: Accidente vascular encefálico. Epidemiologia. Fisioterapia.

INTRODUÇÃO

O acidente vascular encefálico (AVE) pode levar a alterações funcionais nas áreas sensitiva, motora, cognitiva e de comunicação. Ocorre através de alterações vasculares do encéfalo, originadas de uma suspensão do fluxo sanguíneo que causa danos celulares irreversíveis, podendo ser dividido em isquêmico (obstrução de um vaso sanguíneo) ou hemorrágico (ruptura de vasos sanguíneos)1.

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Revista Baiana de Saúde Pública

Por ano, 16 milhões de indivíduos sofrem AVE1 e 6,2 milhões vão a óbito decorrente dele no mundo, a grande maioria em países de baixa renda2. De acordo com o DATASUS, a taxa de mortalidade em Goiânia para doenças isquêmicas no ano de 2011 foi de 42,4 por 100 mil habitantes3

Os principais fatores de risco para essa doença podem ser divididos em dois grupos. O de riscos não modificáveis, que inclui idade avançada, principalmente acima de 55 anos, indivíduos do gênero masculino, baixo peso ao nascimento, etnia negra e herança genética. Já o outro grupo é o que podemos intervir com ações preventivas, que são os riscos modificáveis, como hipertensão arterial sistêmica (HAS), indivíduos fumantes, diabetes melitus (DM), dislipidemia, dentre outros1

Como consequência do AVE, a fraqueza muscular e diminuição da sensibilidade são frequentes em um hemicorpo e/ou no rosto, além de outros sintomas, como alteração na marcha, do equilíbrio, da fala e da visão e dor de cabeça4. Para realizar um bom plano de tratamento e prognóstico, é necessária uma avaliação minuciosa que parta do princípio da funcionalidade, promovendo assim uma boa qualidade de vida. Portanto, a avaliação fisioterapêutica deve abranger questões sensoriais, cognitivas e motoras, incluindo equilíbrio, flexibilidade, marcha, transferências, alimentação e atividades de higiene e lazer1.

A fisioterapia é primordial na reabilitação das alterações secundárias que acometem pacientes com AVE. Para reparar as incapacidades desencadeadas por essa doença, é necessário um programa de reabilitação para promover maior independência funcional5 A recuperação neurológica é mais acelerada na fase inicial da lesão6, por isso a importância de um tratamento precoce.

Diante da alta prevalência de AVE entre a população idosa e portadora de HAS, doenças cardíacas (DC) e DM, é necessário conhecer as informações epidemiológicas acerca do AVE para embasar o planejamento de programas de intervenção e iniciativas que auxiliam na prevenção e tratamento precoce dos pacientes. Dessa forma, ajudará no direcionamento de investimentos para o controle, além de propiciar melhor compreensão dos fatores que interferem na evolução natural da doença, a fim de melhorar a assistência prestada pela equipe multiprofissional.

O presente estudo visa descrever o perfil dos pacientes com AVE, por meio das características sociodemográficas e avaliação cinético-funcional, além de descrever os principais aspectos da avaliação e do tratamento fisioterapêutico. O objetivo deste estudo foi identificar o perfil epidemiológico e clínico dos pacientes com AVE atendidos pela fisioterapia em uma clínica escola de instituição pública na região Centro-Oeste.

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MATERIAL E MÉTODOS

A presente pesquisa é do tipo transversal, de caráter observacional e descritivo. A coleta de dados ocorreu nos arquivos da Clínica Escola de Fisioterapia de uma universidade pública da região Centro-Oeste, através do banco de dados dos prontuários eletrônicos.

A coleta dos dados foi realizada por meio do levantamento de análise de prontuários de pacientes que tiveram diagnóstico de AVE e foram atendidos no setor de neurologia por estagiários do curso de fisioterapia. Os prontuários consultados foram aqueles correspondentes ao atendimento prestado e alta, durante o período compreendido entre os anos de 2006 e 2013. Os critérios de inclusão foram: prontuários de pacientes com diagnóstico clínico de: “AVC”, “AVE” ou “acidente vascular cerebral/encefálico”; com a data da alta entre os anos de 2006 e 2013. Foram excluídos os pacientes cuja avaliação estava incompleta em 30% ou mais.

Após o levantamento, os prontuários foram analisados e agrupados em categorias para a descrição do perfil epidemiológico e clínico da amostragem obtida. Foi realizado o registro dos dados através de um questionário estruturado, desenvolvido pelo próprio autor. Os dados foram divididos em três categorias. A primeira foi a caracterização da amostra, que incluía: gênero, idade, etnia, hábitos de vida, estilo de vida e patologias associadas; na segunda categoria, descreveu-se o perfil clínico por meio dos seguintes dados: uso de medicamentos, diagnóstico clínico, hemicorpo acometido, AVE múltiplos, queixas principais e sinais vitais; a terceira categoria, que descreveu aspectos da avaliação e reabilitação fisioterapêutica, incluiu: diagnóstico fisioterapêutico, medida de independência funcional, deambulação, uso de dispositivo auxiliar para marcha, objetivos do tratamento, condutas mais frequentes, tempo de terapia, frequência semanal da terapia, número de sessões e motivo da alta.

A técnica utilizada para a análise de dados foi a estatística descritiva, adotando-se a frequência simples e a relação absoluta. Para isso, os dados foram tabulados e analisados por meio do software Microsoft Excel 2010. A apresentação dos resultados obtidos se deu por meio de tabelas.

Este estudo está de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas envolvendo seres humanos (Resolução nº 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde). A presente pesquisa foi submetida para a análise ao Comitê de Ética em Pesquisa, sendo aprovada conforme protocolo nº 155.482. Como a consulta ocorreu nos prontuários, excluiu-se a necessidade de assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo o mesmo substituído pelo Termo de Ciência Institucional.

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RESULTADOS

O banco de dados da clínica escola contava com 5.797 pacientes atendidos desde sua fundação, no ano de 1998, até 2014. Desse total, 9% (526 pacientes) eram portadores de AVE. No período incluído no estudo (2006-2013), foi atendido um total de 2.476 pacientes, sendo 424 de etiologia neurofuncional – desses, 143 possuíam diagnóstico de AVE. Foram excluídos cinco prontuários devido à avaliação estar incompleta em 30% ou mais, restando no estudo de 138 prontuários de pacientes com AVE.

A análise descritiva das variáveis da caracterização da amostra revelou que, dos 138 prontuários analisados, 83 (60,15%) eram do sexo masculino e 55 (39,85%) do sexo feminino. A idade média dos pacientes foi de 59,53 (± 15,06) anos, com faixa etária de 18 a 96 anos. Com relação à etnia dos sujeitos, podemos observar que 60,15% (n = 83) da população relatavam ser brancos, 37,7% (n = 52) pardos, 1,44% (n = 2) negros, enquanto um sujeito não apresentava essa informação preenchida no seu prontuário.

No que se refere ao estilo de vida, 83,4% (n = 115) adotavam um estilo de vida sedentário, não praticando exercício físico regularmente; apenas 5,1% da amostra relatou praticar exercício físico, enquanto 16 prontuários (11,5%) não apresentavam essa informação. Quanto aos hábitos de vida, a maior parte da amostra informou não ser tabagista nem etilista ( Tabela 1 ).

Tabela 1 – Distribuição da amostra de acordo com os hábitos de vida. Goiânia, Goiás – 2014

Quanto aos aspectos clínicos do AVE, iniciamos a análise pelas patologias associadas. Dos 138 indivíduos, 69 tinham apenas uma patologia associada ao AVE, 35 tinham duas doenças, 13 três doenças, 5 tinham quatro, apenas 1 com cinco doenças associadas e 15 prontuários não apresentavam essa informação.

Em referência ao uso de medicamentos, podemos observar que 97,1% (n = 134) faziam uso de algum tipo de medicamento e somente 4 sujeitos 2,9% não faziam o uso deles. Dentre o primeiro grupo, 55 indivíduos tomavam medicamentos para somente uma finalidade,

14
Hábitos de vida N % Tabagista 27 19,56% Etilista 20 14,49% Ex-tabagista 20 14,49% Ex-etilista 15 10,86% Nenhuma das opções 65 47,10% Não responderam 15 10,86%
Fonte: Elaboração própria.

43 para duas, 30 para três fins, 9 para quatro, 2 para cinco, 1 para seis finalidades diferentes e 8 prontuários não apresentavam esta informação.

Com relação ao medicamento anti-hipertensivo, dos 99 sujeitos, 25 fazem uso de dois medicamentos, 9 fazem uso de três e um indivíduo faz uso de quatro medicamentos desse tipo. Em relação à medicação para diabetes, 4 pessoas usavam dois medicamentos para tal. As patologias associadas e finalidades dos medicamentos estão representadas na Tabela 2

Tabela 2 – Distribuição da amostra de acordo com as patologias associadas e medicação. Goiânia, Goiás – 2014

Quanto aos sinais vitais, foram registrados em 124 prontuários durante a avaliação, encontrando a frequência cardíaca (FC) média de 72,25 (± 12,19) bpm, pressão arterial (PA) sistólica média 125,3 (± 20,99) mmHg e a diastólica 80,66 (± 10,99) mmHg, apresentando valores dentro da faixa de normalidade. Quando investigado o controle da PA durante as sessões, observamos que a grande maioria (84,9%) não apresentava o registro desse dado na evolução diária dos pacientes.

Quanto ao diagnóstico do AVE, 13,76% (n = 19) foram do tipo hemorrágico (AVE-H), enquanto 46,37% (n = 64) foram do tipo isquêmico (AVE-I), e 55 prontuários (39,87%) não apresentaram informação quanto ao tipo de AVE. O hemicorpo mais comumente acometido foi o direito, em 51,45% (n = 71) da amostra, contra 39,87% (n = 55) dos sujeitos que apresentavam hemiparesia à esquerda; não foi encontrada essa informação em 12 (8,68%) prontuários.

Na amostra estudada, a maioria não apresentou histórico de AVE múltiplo, sendo encontrado somente em 16,67% (n = 23) da população; quatro prontuários (2,88%)

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Revista Baiana de Saúde Pública
Patologias N % Amostral Medicamentos N % HAS 109 78,98% Anti-hipertensivo 99 71,73% DM 30 21,74% AAS 62 44,92% Cardiopatia 19 13,76% Antiepiléptico 22 15,94% Hipercolesterolemia 16 11,59 DM 15 10,86% Chagas 9 6,52 Anticoagulante 14 10,15% Arritmia 4 2,89% Hipercolesterolemia 14 10,15% Trombose 3 2,17% IC, arritmia 7 5,07% Hipotireoidismo 3 2,17 Anti-vasoespasmo 4 2,89% Dislipidemia 2 1,44% Omeprazol 4 2,89% Epilepsia 2 1,44% Antiespasmódico 3 2,17% Hipertireoidismo 2 1,44% Hipertireoidismo 2 1,44% ↑Triglicérides 2 1,44% Cianose hepática 1 0,72% Fibrilação atrial 1 0,72% Bronquite 1 0,72% Convulsões 1 0,72% Polineuropatia periférica 1 0,72% Anemia falciforme 1 0,72% Aneurisma 1 0,72% Fonte: Elaboração própria.

não apresentaram essa informação. Do total que apresentou múltiplos AVE, 65,2% (n = 15) apresentaram o número de dois episódios, 17,4% (n = 4) apresentaram três AVE e a mesma proporção (n = 4) apresentou quatro acidentes. O valor médio do número de repetições de ocorrências de AVE foi de 2,56 (± 0,89) episódios.

Em relação à topografia da queixa principal, a maioria dos pacientes (64,5%; n = 89) relataram alterações em membros inferiores (MMII), 49,27% (n = 68) em membros superiores (MMSS), 14,5% (n = 20) apresentaram comprometimento nas mãos, 8,7% (n = 12) no rosto e pescoço, e somente um prontuário apresentou queixa em relação à coluna vertebral. Sobre a queixa no aspecto da funcionalidade, 12,31% (n = 17) dos pacientes apresentaram déficit da marcha e 49,27% (n = 68) tiveram a falta de equilíbrio como queixa principal.

No que diz respeito à avaliação fisioterapêutica, do total da amostra, 73,18% (n = 101) realizavam marcha, 24,65% (n = 34) não realizavam marcha e 2,17 (n = 3) não tiveram registro em seus prontuários. Entre os 101 que realizam marcha, 2 (1,45%) utilizavam muleta canadense e 6 (4,34%) utilizavam bengala.

A distribuição da frequência do diagnóstico fisioterapêutico está evidenciada na Tabela 3, sendo que 18,1% (n = 25) não apresentaram o diagnóstico. A medida de independência funcional (MIF) dos 88 registrados apresentou escore médio de 103,67 (± 29,4).

3 – Distribuição da amostra de acordo com o diagnóstico fisioterapêutico.

Goiânia, Goiás – 2014

Os objetivos e condutas fisioterapêuticas estão apresentados na Tabela 4, sendo que 24 não apresentaram estas informações no prontuário.

16
Tabela
Diagnóstico N % Déficit de equilíbrio 55 39,9% Fraqueza muscular 46 33,3% Espasticidade 37 26,8% Limitação ADM 30 21,7% Alteração no padrão da marcha 28 20,3% Hipertonia 26 18,8 Alteração postural 22 15,9 Alteração de sensibilidade 13 13% Hipotonia 6 4,3 Alteração do padrão respiratório 5 3,3 Hiperreflexia 3 2,2 Hiporreflexia 3 2,2 Dificuldade de transferência 2 1,4 Fonte: Elaboração própria.

Tabela 4 – Distribuição da amostra de acordo com o objetivo terapêutico e conduta fisioterapêutica adotada. Goiânia, Goiás – 2014

O tempo de início da reabilitação na clínica escola após o AVE foi contado em anos: 39,8% (n = 55) iniciaram a terapia com menos de 1 ano de lesão; 17,39% (n = 24) começaram a terapia de 1 a 2 anos após; 23,18% (n = 32) de 2 a 3 anos depois; 5,7% (n = 8) depois de 3 a 4 anos; 4,3% (n = 6) após 4 a 5 anos, 2,17% (n = 3) começaram a terapia após 5, 6 e 7 anos; 5,7% (n = 8) começaram a terapia após 10 anos de AVE.

A média do tempo de espera para o início das sessões após a triagem foi de 23,66 (± 99,65) dias, com variação entre 0 dias e 2 anos, sendo que 5 deles fizeram a triagem e não retornaram para a fisioterapia. O tempo de tratamento em dias obteve média de 380,21 (± 637), variando de 0 dias a 9,14 anos, sendo que 15 prontuários não apresentavam esse dado. Já o número de sessões foi de em média 51,66 (± 67,72), variando de 0 a 280 sessões, e em 20 prontuários não constava essa informação. O motivo de alta encontrado em 65,9% dos prontuários estudados foi o abandono do tratamento, e somente 12,3% obtiveram alta pela melhora do quadro clínico, sendo, portanto, o abandono o desfecho mais comum.

DISCUSSÃO

Este estudo procurou investigar o perfil epidemiológico e clínico da população atendida na clínica escola de fisioterapia. Foram analisados prontuários de 138 pacientes que tiveram AVE. Na primeira categoria de variáveis, foram incluídas informações sobre a caracterização da amostra: em relação ao gênero, 60,15% eram homens, assim como em diversos estudos que mostram prevalência de AVE no sexo masculino1,7-9

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Objetivos N % Condutas N % Melhorar ADM 133 96,4% Alongamento 91 65,9% Melhorar padrão de marcha 83 60,1% Fortalecimento muscular 88 63,8% Melhorar força muscular 79 57,2% Treino de marcha 81 58,7% Melhorar controle motor 67 48,6% Treino de atividades funcionais 73 52,9% Modular de tônus 40 29% Treino de equilíbrio 67 48,6% Melhorar postura 40 29% Kabat 58 42% Reestabelecer sensibilidade 20 14,5% Modulação de tônus 57 41,3% Diminuir dor 18 13% Dissociação de cinturas 47 34,1% Melhorar padrão ventilatório 14 10,1% Descarga de peso em MMSS 39 28,3% Melhorar propriocepção 13 9,4% Descarga de peso em MMII 33 23,9% Frenkel 24 17,4 Dessensibilização 20 14,5% Bobath 10 7,2% Fonte: Elaboração própria.

A idade média dos pacientes na presente pesquisa foi de 59,53 (± 15,06) anos, com faixa etária de 18 a 96 anos, abrangendo pacientes adultos jovens até idosos, corroborando outros estudos10-12. Obteve-se também que 28 (20,28%) pacientes tinham menos de 45 anos, assim como identificado em pesquisa realizada na Bahia com 45 pacientes, na qual a idade média foi de 58,4 anos e 28% (n = 13) tinham menos de 45 anos10. Portanto, podemos destacar que as estratégias de prevenção devem abranger essa extensa faixa etária.

Quanto à etnia dos indivíduos portadores de AVE, sabe-se que a maior prevalência é na raça negra1,8,10, contrapondo o presente estudo, em que a maioria (60,15%) eram brancos e apenas 1,44% eram de etnia negra.

Em nossa pesquisa, constatamos que o fator de risco mais prevalente foi o sedentarismo (83,4%). Um estudo realizado em Tocantins evidenciou que grande parte dos pacientes (65,6%) eram sedentários13. Apesar do tabagismo ser um forte fator de risco para o AVE1, nosso estudo mostrou uma baixa prevalência (19,56%), assim como no estudo feito em Tocantins, em que apenas 9,4% eram tabagistas13. O etilismo em nossa amostra também obteve baixa porcentagem (14,49%), assim como em estudo realizado na Paraíba, no qual somente 7,5% dos participantes eram etilistas14. Porém, sabe-se que essas informações podem ser subnotificadas, pois é possível que os pacientes tenham receio de relatar tais comportamentos ao profissional de saúde.

Com relação às características clínicas, devemos destacar a grande quantidade de patologias associadas. Os pacientes analisados tiveram de 1 a 5 patologias associadas ao AVE. A mais frequente foi a HAS (78,98%), que é um forte fator de risco, assim como diversos estudos identificaram8,14-16, seguida da DM, com 21,74%, e DC, com 13,76%.

Quanto aos sinais vitais verificados no momento da avaliação, encontrou-se valores dentro da normalidade, com as médias da FC de 72,25 (± 12,19) bpm, PA sistólica 125,3 (± 20,99) mmHg, PA diastólica 80,66 (± 10,99) mmHg, sendo que os maiores valores encontrados foram de 220x170 mmHg. Quando investigado o controle da PA durante as sessões, observamos que a grande maioria (84,9%) não apresentava o registro desse dado na evolução diária dos pacientes. Deve-se ressaltar que tal atitude dos terapeutas não é recomendada, pois picos hipertensivos podem causar recidiva do AVE, evidenciando assim a importância da aferição e registro da PA em todos os atendimentos pelos fisioterapeutas e estagiários, para controle e prevenção de recidivas, assim como forma de documentar e se resguardar de forma legal de qualquer eventualidade que aconteça posteriormente.

Em relação à medicação, 134 dos 138 pacientes utilizavam algum medicamento, e para até 6 enfermidades, sendo os mais frequentes: anti-hipertensivos, antiagregante plaquetário

18

e anti-hiperglicemicos, assim como em estudo realizado em Natal, no setor de fisioterapia de um hospital universitário17. Tal sinal é positivo, por um lado, pois na prevenção secundária está inclusa a utilização de medicamentos, e entre as principais finalidades são: antiagregação plaquetária, fibrilação atrial (no caso de AVE-I), controle de HAS, DM e hiperlipidemia. Outras indicações de anticoagulação para eventos de AVE-I são: remédios para infarto agudo do miocárdio, trombo no ventrículo esquerdo, cardiomiopatia, forame oval patente, doença valvar cardíaca e estenose carotídea1. Por isso, os profissionais devem estar sempre atentos às medicações utilizadas pelos pacientes.

Assim como foi descrito em outros estudos de diversas partes do país, este estudo constatou a prevalência de AVE-I (46,37%)9,10,17,18; sobre o hemicorpo acometido, não foi encontrado um consenso na literatura sobre a prevalência, enquanto no presente estudo o hemicorpo direito foi pouco mais acometido, com prevalência de 51,45%.

Em uma pesquisa realizada em Recife, com 53 indivíduos com AVE, apenas 16% tiveram mais de um episódio de AVE, assim como neste estudo, em que 16,67% tiveram histórico de AVE múltiplo, sendo a média de 2,56 (± 0,89) episódios de AVE; em outro estudo realizado com 73 pacientes, a média do número de episódios de AVE foi de 1,6 (± 1,3)19.

As queixas principais dos indivíduos foram divididas em topografia e sinais e sintomas; no quesito topográfico, a queixa mais encontrada foi de MMII (49,27%), o que corrobora um estudo realizado com pacientes da Clínica Escola de Fisioterapia de universidade pública do Sudoeste da Bahia e do Núcleo de Prevenção e Reabilitação Física, em que foi constatado que 100% dos pacientes tinham alguma alteração em MMII20

Já em relação à funcionalidade, a queixa mais frequente em nosso estudo é o déficit de equilíbrio, observado em 49,27% dos pacientes, o que coaduna outro estudo realizado no Centro de Atendimento ao Diabético e Hipertenso na Bahia com pacientes de AVE-I, no qual uma das principais sequelas foi o desequilíbrio, com 34,8%21

Quanto à avaliação fisioterapêutica, o primeiro dado coletado foi o diagnóstico fisioterapêutico, que se mostrou muito complexo, pela quantidade de déficits motores que podem estar presentes no indivíduo que sofreu um AVE. A extensão dessas alterações depende da gravidade e do local do cérebro que a lesão afetou4. Os mais frequentes em nosso estudo foram: déficit de equilíbrio (39,9%), fraqueza muscular (33,3%), espasticidade (26,8%) e redução da ADM (21,7%).

A marcha independente estava presente na maioria dos pacientes avaliados. Apenas 1,45% utilizavam muleta canadense e 4,34% utilizavam bengala, o que pode não ser um bom sinal, pois o uso da bengala, quando bem indicado, podem melhorar

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significativamente a simetria e estabilidade da marcha, podendo influenciar no equilíbrio e em outros aspectos funcionais22.

Para reparar as incapacidades desencadeadas por essa patologia, é necessário um programa de reabilitação para o paciente voltar a realizar as atividades de antes5. Esse programa deve ser iniciado com maior antecedência possível, para que se minimize as incapacidades. Além disso, deve ter como objetivo primordial a inclusão e a participação social desses pacientes1 Em nosso estudo, os objetivos principais encontrados nos prontuários foram melhorar a ADM, a marcha, a força muscular e o controle motor. As condutas são comumente traçadas de acordo com os objetivos, sendo as mais utilizadas nos pacientes do estudo o alongamento, o fortalecimento muscular e o treino de marcha.

Porém, existem diversos recursos que podem e devem ser explorados no tratamento de AVE. Estudos destacaram benefícios no tratamento com neuromodulação, Bobath, Kabat, RPG (reeducação postural global), bandagem funcional e terapia do espelho19,23-28. Apesar da quantidade de opções de técnicas terapêuticas, que pode tornar a fisioterapia mais interessante, a adesão do paciente ao tratamento não é boa: no presente estudo, 65,9% dos pacientes abandonaram o tratamento, e somente 12,3% obtiveram alta pela melhora do quadro clínico. Isso pode ser um importante sinalizador, evidenciando a necessidade de os terapeutas criarem estratégias para melhorar a adesão.

A fisioterapia se mostra essencial nas intervenções das sequelas decorrentes do AVE, cabendo ao fisioterapeuta proporcionar a esses indivíduos uma melhor qualidade de vida29. É comum que pacientes se sintam desanimados com o tratamento repetitivo e muitas vezes doloroso, e assim, acabem abandonando o tratamento antes de estarem totalmente reabilitados devido ao aspecto emocional, que tende a ser abalado. Uma das alternativas pode ser oferecer o tratamento com maior variedade de exercícios, trazendo a cada semana técnicas novas e, assim, gerando boas expectativas e motivação para o paciente.

A média de tempo de tratamento dos pacientes desta pesquisa foi de aproximadamente 12 meses. Em média, foram realizadas 51 sessões (com o mínimo de 0 e o máximo de 280 sessões) na amostra. O tempo de início da fisioterapia após o AVE, em estudo realizado em Maceió, teve média de três meses, variando de 1 a 36 meses28. Já no presente estudo, 39% dos pacientes iniciaram a terapia com menos de 1 ano de lesão, o que é muito tempo para esses indivíduos permanecerem sem tratamento. A variação foi bastante ampla, abrangendo de 0 a 20 anos após o AVE para o início da fisioterapia, o que também nos leva a refletir sobre estratégias para redução dessa lacuna de tempo para o início do tratamento ambulatorial.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como a incidência de AVE na população adulta e idosa e o desenvolvimento de tecnologias assistivas vêm aumentando a cada dia, menos pacientes morrem por conta do AVE. Por isso, faz-se necessária a realização de estudos que destaquem o perfil epidemiológico desses indivíduos, com o intuito de abrir caminhos para a promoção de estratégias de prevenção primária, através de campanhas educativas, além da prevenção secundária, que por meio da fisioterapia precoce, pode reduzir a proporção de pacientes com incapacidades e melhorar a funcionalidade desses indivíduos. Além disso, esse tipo de estudo permite a identificação das deficiências e os benefícios do processo de reabilitação de pacientes com AVE, o que pode auxiliar na organização dos serviços e planejamento para alocação adequada dos recursos públicos, visando melhorar a assistência prestada.

Assim como na literatura pesquisada, nosso estudo mostrou a prevalência do AVE isquêmico e entre o sexo masculino; acometendo de jovens até idosos; indivíduos sedentários e com HAS como fatores de risco; com queixas predominantemente em MMII e com déficit de equilíbrio. Já os dados que discordaram da literatura foram etnia, profissão e o fator de risco tabagismo.

O presente estudo possui limitações. Foi um estudo transversal, baseado em dados registrados em prontuários. Alguns dados, como hábitos de vida, estilo de vida, patologias associadas e uso de medicamentos foram coletados com base na história clínica, podendo apresentar algum viés. Além disso, alguns dados não estavam registrados na ficha de avaliação, podendo alterar também a interpretação dos resultados.

Além disso, percebemos uma lacuna em alguns dados da avaliação desses pacientes, como a PA, que deveria ser aferida em todos os atendimentos fisioterapêuticos e não foi encontrada na maioria dos prontuários. Outra informação importante que não foi frequentemente registrada nos prontuários são os dados de exames de imagem, que indicam a localização da lesão e poderiam auxiliar na detecção dos principais sintomas e no tratamento desses pacientes.

Portanto, devemos destacar que a avaliação desses pacientes deve ser minuciosa, e para isso, poderia ser realizada uma padronização da ficha de avaliação, com as informações mais relevantes para essa patologia, assegurando que não falte nenhum dos itens essenciais. Além disso, poderiam ser realizadas atividades educativas para estimular o preenchimento correto dos prontuários, visando não só melhorar a qualidade das pesquisas com base neles, como também a qualidade da assistência prestada, já que o prontuário fornece informações para todos os profissionais que darão continuidade ao atendimento do paciente.

Esta foi uma pesquisa inicial, que buscou descrever o perfil dos pacientes com AVE por meio das características sociodemográficas e avaliação cinético-funcional, além

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de apresentar os elementos principais da avaliação e do tratamento fisioterapêutico. Tais informações são de fundamental importância no manejo desses pacientes, evidenciando a relevância do cuidado fisioterapêutico e podendo refletir em ações de promoção de saúde, prevenção de danos, educação permanente, tratamento e reabilitação. Diante disso, esperase que este estudo subsidie novos trabalhos sobre o AVE, incluindo aspectos de prevenção e reabilitação, colaborando para o aprimoramento da assistência a esses pacientes.

AGRADECIMENTOS

Ao Programa de Bolsa de Iniciação Científica da Universidade Estadual de Goiás (PBIC-UEG).

COLABORADORES

1. Concepção do projeto ou análise e interpretação dos dados: Mariana Araújo Goes da Mota, Tânia Cristina Dias da Silva Hamu e Rina Marcia Magnani.

2. Redação do artigo ou revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Mariana Araújo Goes da Mota, Tânia Cristina Dias da Silva Hamu e Rina Marcia Magnani.

3. Revisão e/ou Aprovação final da versão a ser publicada: Mariana Araújo Goes da Mota, Tânia Cristina Dias da Silva Hamu e Rina Marcia Magnani.

4. Responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Mariana Araújo Goes da Mota, Tânia Cristina Dias da Silva Hamu e Rina Marcia Magnani.

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Recebido: 4.3.2019. Aprovado: 1.2.2021.

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MORTALIDADE E INTERNAÇÕES POR DOENÇAS CARDIOVASCULARES

EM MUNICÍPIOS DA REGIÃO NORTE DO ESPÍRITO SANTO

Katiucia Vasconcelos de Medeirosa

https://orcid.org/0000-0002-7975-5021

Jordana Herzog Siqueirab

https://orcid.org/0000-0003-0116-7411

Taísa Sabrina Silva Pereirac

https://orcid.org/0000-0002-5922-7424

Resumo

O objetivo deste estudo foi descrever as taxas de mortalidade e de internação por doenças do aparelho circulatório, em municípios localizados na região norte do Espírito Santo. Foram utilizados dados do Sistema de Informação de Mortalidade e do Sistema de Informação de Internação Hospitalar, dos municípios de Conceição da Barra, Jaguaré, Pedro Canário e São Mateus, no período de 2004 a 2014. Verificou-se o aumento progressivo de mortes e internações por grupo de doenças do aparelho circulatório nos municípios estudados. O coeficiente de mortalidade mais elevado foi em Conceição da Barra (2010) por doença isquêmica do coração entre os homens, e em mulheres (2006) por doenças cerebrovasculares. Os mais elevados coeficientes de internação foram observados em São Mateus (2013) entre os homens, e em Pedro Canário (2014) entre as mulheres, ambos relacionados às doenças cerebrovasculares. Todos os municípios apresentam coeficiente de mortalidade e de internação elevados.

Palavras-chave: Sistemas de informação em saúde. Mortalidade. Atenção primária à saúde. Doenças cardiovasculares.

a Enfermeira. Especialista em Epidemiologia. Vitória, Espírito Santo, Brasil. E-mail: vasconceloskatiucia@hotmail.com

b Nutricionista. Doutoranda em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Espírito Santo. Bolsista da FAPES/CAPES. Vitória, Espírito Santo, Brasil. E-mail: jordana.herzog@gmail.com

c Nutricionista. Doutora em Saúde Coletiva. Professora na Universidad de las Américas Puebla. Cholula, Puebla, México.

E-mail: taisa.sabrina@hotmail.com

Endereço para correspondência: Universidad de las Américas Puebla. Ex. Hacienda Santa Catarina Mártir, s/n, San Andrés Cholula. Cholula, Puebla, México. CEP: 72810. E-mail: taisa.sabrina@hotmail.com

26 26 DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2989
ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE

MORTALITY AND INTERVENTIONS FOR CARDIOVASCULAR DISEASES IN MUNICIPALITIES OF THE NORTHERN REGION OF ESPÍRITO SANTO

Abstract

This study aimed to describe mortality and hospitalization rates due to diseases of the circulatory system, in municipalities located in the northern region of the state of Espírito Santo. Data from the Mortality Information System and Hospital Inpatient Information System were used in the municipalities of Conceição da Barra, Jaguaré, Pedro Canário and São Mateus in the period 2004-2014. There was a progressive increase in deaths and hospitalizations per group of diseases of the circulatory system in the municipalities studied. The highest mortality rate was in Conceição da Barra (2010) due to ischemic heart disease among men, and in women (2006) due to cerebrovascular diseases. The highest coefficients of hospitalization were observed in São Mateus (2013) among men, and in Pedro Canário (2014) among women, both related to cerebrovascular diseases. All municipalities have high mortality and hospitalization rates.

Keywords: Health information systems. Mortality. Primary health care. Cardiovascular diseases.

MORTALIDAD Y HOSPITALIZACIONES POR ENFERMEDADES CARDIOVASCULARES EN MUNICIPIOS DE LA REGIÓN NORTE DE ESPÍRITO SANTO, BRASIL

Resumen

El objetivo de este estudio fue describir las tasas de mortalidad y hospitalización por enfermedades del sistema circulatorio, en municipios ubicados en la región norte de Espírito Santo (Brasil). Se utilizaron datos del Sistema de Información de Mortalidad y del Sistema de Información de Internación Hospitalaria en los municipios de Conceição da Barra, Jaguaré, Pedro Canario y São Mateus, en el período 2004-2014. Se verificó el aumento progresivo de muertes y hospitalizaciones por grupo de enfermedades del sistema circulatorio en los municipios estudiados. El coeficiente de mortalidad más elevado fue en Conceição da Barra (2010) por enfermedad isquémica del corazón entre los hombres y en mujeres (2006) por enfermedades cerebrovasculares. Los más altos coeficientes de hospitalización fueron observados en São Mateus (2013) entre los hombres y en Pedro Canario (2014) entre las mujeres, ambos relacionados a las enfermedades cerebrovasculares. Todos los municipios presentan coeficiente de mortalidad e internación elevado. Palabras clave: Sistemas de información en salud. Mortalidad. Atención primaria de salud. Enfermedades cardiovasculares.

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Revista Baiana de Saúde Pública

INTRODUÇÃO

O envelhecimento populacional é um fator crucial para ascensão da prevalência e mortalidade por Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT)1. As DCNT constituem as principais causas de morte e incapacidade na população mundial, além de serem responsáveis por altos encargos econômicos sobre indivíduos, sociedades e sistemas de saúde2. Em 2011, 30,4% dos óbitos registrados no Brasil foram por Doenças Cardiovasculares (DCV) e, em 2012, ocorreram 1.137.024 de internações por DCV no Sistema Único de Saúde (SUS), com custo global superior a 2 bilhões de reais3,4.

Diante dos elevados custos com a saúde, principalmente no tratamento das DCNT como hipertensão, dislipidemia, diabetes, dentre outras, o Ministério da Saúde definiu o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT)

2011-2022, visando a ampliação de um conjunto de intervenções com abordagem integral à saúde, à prevenção e ao controle dessas doenças por meio dos seus principais fatores de risco5.

Entre os fatores de risco, podemos destacar a genética e a idade, além de outros ligados ao estilo de vida, como o excesso de peso, tabagismo e sedentarismo6,7. No Espírito Santo, as DCNT apresentam prevalência de 40,6%, sendo que para as mulheres a prevalência é de 43,6%, e para os homens, 34,3%8. Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde, em 2013, 13,1% da população do ES era composta por fumantes; 9,7% possuíam colesterol alto; 6,1% eram diabéticos; 20,6% eram hipertensos; 1,3% tinha histórico de Acidente Vascular Encefálico (AVE); 3,1% eram portadores de doença do coração9 e, em 2014, 1.273 pessoas morreram por doenças do aparelho circulatório10

Diante do exposto, torna-se importante conhecer as condições de saúde e os fatores de risco que afetam a população para que haja mais ações eficazes de prevenção e de controle das DCNT. No Brasil, conforme preconizado pelo SUS, essas ações integram o escopo a Atenção Primária à Saúde (APS), a qual é porta de entrada para a rede assistencial11. Nela deve ocorrer a abordagem integral ao paciente, desde a identificação dos grupos de risco, diagnóstico, tratamento da doença em seus estágios iniciais até o encaminhamento para especialista. Segundo Bastos e Kirsztajn12, os gastos com pacientes que tiveram encaminhamento precoce para as especialidades são bem menores comparados aos daqueles encaminhados tardiamente.

Desse modo, a abordagem do respectivo tema é de fundamental importância para a análise da situação de saúde, para determinar prioridades de ação e para embasar a tomada de decisões dos gestores quanto à adoção de estratégias voltadas à detecção precoce das DCV nos usuários da APS, visando a ampliação da qualidade de vida, a redução de complicações

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e de maiores gastos públicos futuros. Sendo assim, o objetivo deste estudo foi descrever as taxas de mortalidade e de internação por doenças do aparelho circulatório, em municípios localizados na região Norte do Espírito Santo.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo ecológico utilizando dados secundários do Departamento de Informática do SUS (DATASUS). Por se tratar de dados públicos, a aprovação pelo Comitê de Ética torna-se dispensável. A busca dos dados foi realizada utilizando o Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) e o Sistema de Informação de Internação Hospitalar (SIH).

O SIM foi criado pelo DATASUS, cuja análise dos dados permite a construção de importantes indicadores para a descrição do perfil de saúde de uma região. Assim, a partir das informações contidas nesse sistema, pode-se obter a mortalidade proporcional por causas, faixa etária, sexo, local de ocorrência e residência e letalidade de agravos dos quais se conheça a incidência, bem como taxas de mortalidade geral, infantil, materna ou por qualquer outra variável contida na Declaração de Óbito (DO), uma vez que são disponibilizadas várias formas de cruzamento dos dados. Entretanto, o não preenchimento correto das DO prejudica o uso dessa rica fonte de dados para a construção de indicadores13. Já o SIH-SUS é a única fonte de informações sobre a morbidade hospitalar no país14. Trata-se de uma base de dados administrativa, que armazena as informações das internações hospitalares ocorridas no sistema público de saúde, e tem seu funcionamento baseado na Autorização de Internação Hospitalar (AIH)14

Foram coletadas informações acerca da mortalidade e de morbidade por doenças isquêmicas do coração, cerebrovasculares e por outras doenças do aparelho circulatório, na população de 30 a 80 anos ou mais, residente nos municípios de Conceição da Barra, Jaguaré, Pedro Canário e São Mateus, os quais se localizam na região Norte do estado do Espírito Santo, no período de 2004 a 2014, e a morbidade de 2007 a 2014. Quando realizada a busca no DATASUS, não foi observado, no município de Jaguaré, registro de óbitos por demais causas do aparelho circulatório (Doenças Vasculares Periféricas), código 170-174, nas mulheres no período de 2004 a 2014, bem como em relação à população masculina, só havia o registro de número de óbitos por essas doenças a partir do ano de 2005 em todos os municípios estudados. O caminho percorrido para a busca das informações de mortalidade foi:

(1) Estatísticas Vitais; (2) Mortalidade – 1996 a 2014, pela CID-10. E para a busca de morbidade:

(1) Epidemiológicas e Morbidade; (2) Morbidade hospitalar do SUS (SIH-SUS); Geral, por local de residência – a partir de 2008.

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Revista Baiana de Saúde Pública

A classificação das causas básicas de mortalidade foi realizada de acordo com a 9ª Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde (CID-9), códigos 410 a 458, e foram consideradas para a realização do presente estudo as doenças do CID-10 (10ª revisão), do capítulo IX – doenças do aparelho circulatório, o qual inclui doença isquêmica do coração, código 120-125; doença cerebrovascular, código 160-169; e demais causas, código 170-174.

As estimativas populacionais de referência foram obtidas dos censos (1980, 1991, 2000 e 2010), contagem (1996) e projeções intercensitárias (1981 a 2012), segundo faixa etária, sexo e situação de domicílio; das estimativas de 1992 a 2016, utilizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) para determinação das cotas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) – (sem sexo e faixa etária) – e das estimativas da população: município, sexo e idade, 2000 a 2015, da Rede Interagencial de Informações para a Saúde/Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística15

Foi calculado o coeficiente de mortalidade estratificado por sexo, expresso pelo número de óbitos de residentes por cada doença específica, dividido pela população total residente para 100 mil habitantes, e estimado o coeficiente de internação para as doenças do aparelho circulatório, conforme a Lista de Morbidade CID-10. Foram avaliadas as internações ocorridas no Hospital Estadual Dr. Roberto Arnizault Silvares, hospital público de referência desses municípios, assim como nos hospitais privados conveniados ao SUS localizados nos municípios de Pedro Canário (Hospital Menino Jesus) e São Mateus (Hospital Maternidade São Mateus).

As internações contabilizadas foram: doença isquêmica do coração (infarto agudo do miocárdio e outras doenças isquêmicas do coração), doença cerebrovascular (hemorragia intracraniana, infarto cerebral, acidente vascular cerebral não especificado como hemorrágico ou isquêmico, outras doenças cerebrovasculares) e demais causas do aparelho circulatório (aterosclerose, outras doenças vasculares periféricas, embolia e trombose arteriais). Por não haver o registro do número de internação nos anos de 2004, 2005 e 2006, esses dados foram apresentados a partir de 2007.

Foi calculado o coeficiente de prevalência de internação estratificado por sexo, expresso pelo número de internação de residentes por doenças do aparelho circulatório dividido pela população total residente para 100 mil habitantes. Os dados foram tabulados no programa Excel, e para as figuras, foi utilizado o software Origin 8.0.

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RESULTADOS

Houve aumento expressivo dos coeficientes de mortalidade e de internação por outras doenças do aparelho circulatório, doenças cerebrovasculares e doenças isquêmicas do coração em todos os municípios. Também é importante relatar que não ocorreram registros de internações por doenças cerebrovasculares, por doenças isquêmicas do coração e demais causas do aparelho circulatório nos hospitais Menino Jesus e Maternidade São Mateus, os quais são conveniados ao SUS, no período estudado.

Observamos que não houve registro de óbitos entre as mulheres no município de Jaguaré no período de 2004 a 2006 e 2012, todavia, nos anos de 2007 a 2009 registrouse aumento da taxa de mortalidade, chegando a aproximadamente 120 óbitos/100 mil habitantes. No município de Conceição da Barra não ocorreu o registro de óbitos em 2009. Por outro lado, de 2006 a 2008, de 2009 a 2011 e de 2013 a 2014 houve aumento, sendo que em 2011, o coeficiente de mortalidade foi cerca de 110 óbitos/100 mil habitantes. Percebe-se, também, que o município de Pedro Canário, no ano de 2006, apresentou o coeficiente de mortalidade de 120 óbitos/100 mil habitantes. Em São Mateus, o coeficiente de mortalidade atingiu valores menores, sendo o maior pico observado em 2008 (75 óbitos/100 mil habitantes) (Figura 1).

Figura 1 – Coeficiente de mortalidade por doenças isquêmicas do coração por 100 mil habitantes, segundo os sexos, nos municípios do Norte do ES, 2004-2014. Cholula, Puebla, México – 2019

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Revista Baiana de Saúde Pública Fonte: Elaboração própria.

Entre os homens, observamos um alto coeficiente de mortalidade em todos os municípios, com exceção do município de Conceição da Barra, que não apresentou registro de óbito no ano de 2004. Entretanto, apresentou tendência de aumento a partir de 2007, sendo que no ano de 2010 o coeficiente de mortalidade foi de aproximadamente 206 óbitos/100 mil habitantes. Em linhas gerais, pode-se constatar que todos os municípios apresentaram redução ou aumento nesse coeficiente ao longo dos anos avaliados, contudo, não se nota estabilidade (Figura 1).

Na Figura 2 verificamos uma variação nos coeficientes de mortalidade para todos os municípios no período estudado, sendo que, entre as mulheres, os municípios de Jaguaré, em 2005 e 2010, e de Pedro Canário, em 2009, não apresentaram registros de óbitos, e o coeficiente mais alto foi observado em Conceição da Barra (2006), totalizando 143 óbitos/100 mil habitantes. Nos homens, constatamos um elevado coeficiente de mortalidade em todos os municípios, com exceção do município de Jaguaré (2004 e 2008), no qual não houve registro de óbitos; mas, em 2005 e 2007, chegou a registrar um coeficiente de mortalidade maior que 100 óbitos/100 mil habitantes. Finalmente, observamos que o município de Conceição da Barra, em 2004, apresentou um coeficiente de mortalidade de 195 óbitos/100 mil; e Pedro Canário (2009), 132 óbitos/100 mil habitantes.

Figura 2 – Coeficiente de mortalidade por doenças cerebrovasculares por 100 mil habitantes, segundo os sexos, nos municípios do Norte do ES, 2004-2014. Cholula, Puebla, México – 2019

Na Figura 3, verificamos que em relação às mulheres, os municípios de São Mateus (2011), Pedro Canário (2004 a 2010 e 2013) e Conceição da Barra (2004, 2005,

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Fonte: Elaboração própria.

2007, 2009, 2011 a 2013) não apresentaram registros de óbitos. Em contrapartida, no ano de 2014, Conceição da Barra registrou um coeficiente de mortalidade de 55 óbitos/100 mil habitantes, e Pedro Canário, de 33 óbitos/100 mil habitantes. Entre os homens, os municípios de São Mateus (2008), Pedro Canário (2005 a 2008, 2012 e 2014), Conceição da Barra (2005 a 2012) e Jaguaré (2005 a 2007, 2009, 2012 a 2014) não apresentaram registros de óbitos. No entanto, Pedro Canário em 2013 apresentou o coeficiente mais elevado, cujo valor foi 33 óbitos/100 mil habitantes, índice seguido pelo de Conceição da Barra (2014), com 27 óbitos/100 mil habitantes.

Figura 3 – Coeficiente de mortalidade por outras doenças do aparelho circulatório (doenças vasculares periféricas – DVP) por 100 mil habitantes, segundo os sexos nos municípios do Norte do ES, 2004-2014. Cholula, Puebla, México – 2019

Na Figura 4, em relação aos Coeficientes de Internação por Doenças Cerebrovasculares, observamos que, para todos os municípios, em ambos os sexos, o coeficiente é elevado, exceto o município de Jaguaré, que em 2009 não apresentou registros de óbitos em mulheres. Com respeito aos Coeficientes de Internação por Doenças do Aparelho Circulatório – Doenças Vasculares Periféricas (DVP) –, observa-se a ausência de registros de internação para as mulheres nos municípios de Conceição da Barra (2007 e 2012), Jaguaré (2007, 2008 e 2012) e Pedro Canário (2007). Para os homens, a ausência de registros foi observada nos municípios de Conceição da Barra (2009), de Jaguaré (2007, 2008, 2010 a 2012) e de Pedro Canário (2008). Para os Coeficientes de Internação por Doenças Isquêmicas do Coração, observa-se que não ocorreram registros de internação nos municípios de Conceição da Barra (2007) e de Pedro Canário (2007 e 2013) para as mulheres.

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Revista Baiana de Saúde Pública Fonte: Elaboração própria.

Entre os homens, houve registro de internação em todo o período estudado, e notamos que o coeficiente de internação foi alto em todos os municípios.

Figura 4 – Coeficiente de internação por doenças cerebrovasculares, por outras doenças do aparelho circulatório (DVP) e por doenças isquêmicas do coração por 100 mil habitantes, segundo os sexos nos municípios do Norte do ES, 2007-2014.

Cholula, Puebla, México – 2019

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Fonte: Elaboração própria.

DISCUSSÃO

O presente trabalho demonstrou que os coeficientes de mortalidade e de internação por outras doenças do aparelho circulatório, doenças cerebrovasculares e doenças isquêmicas do coração apresentam aumento progressivo em todos os municípios, ao longo dos períodos estudados. Entretanto, constatamos que, em muitos dos locais, houve também a ausência de registros de mortalidade e de internação pelo grupo de doenças do aparelho circulatório, gerando uma incerteza quanto à qualidade desses registros, decorrente da provável falta de controle dos processos de geração de dados.

Constatou-se que o coeficiente de mortalidade por doença isquêmica do coração em 2011-2012 foi maior do que por doenças cerebrovasculares, compatível com os dados obtidos nesse mesmo período quanto à mortalidade por DCNT em todo o estado do Espírito Santo16. A tendência de mortalidade por DCV no Brasil mostrou redução de 1980 a 2012, no entanto, não foi observada redução da mortalidade por Doenças Isquêmicas do Coração no período de 2007 a 2012 entre homens e mulheres17. Lentsck et al.18 analisaram as variações da mortalidade por DCV no Brasil e em seus estados e constataram que a taxa de mortalidade cardiovascular total e por causas, padronizada pela idade, apresentou queda entre os homens (524,8 para 315,8 a cada 100 mil habitantes) e mulheres (358,3 para 210,7 a cada 100 mil habitantes) no período de 1990 a 2015. De acordo com dados de 2019 da Pesquisa Nacional de Saúde19, a hipertensão arterial foi a doença crônica mais referida dentre os entrevistados (prevalência de 23,9%; 21,1% entre os homens e 26,4% entre as mulheres), sendo a diabetes e as doenças do coração referidas por 7,7% e 5,3% da amostra, respectivamente. No Espírito Santo, de 2006 a 2016, as internações por doenças do aparelho circulatório no sexo feminino chegaram a 9,8%, enquanto no sexo masculino foram de 12,3%20. Nos últimos anos, tem sido crescente o interesse por utilizar o sistema de informação em saúde para pesquisas clínico-epidemiológicas. Em 2013, na pesquisa realizada pela Secretaria de Vigilância em Saúde, a qual descreveu a magnitude e a variação do percentual das taxas de mortalidade prematura por DCNT nas 27 Unidades da Federação, no período de 2000 a 2011, o Espírito Santo apresentou redução da mortalidade por DCV para ambos os sexos21. Em Niterói, entre 1998 e 2007, houve queda dos coeficientes de mortalidade populacional por doenças do aparelho circulatório em homens e mulheres com idade acima de 30 anos22. No Paraná, entre os triênios 1979-1981 e 2006-2008, verificou que, independentemente da idade e do gênero, houve também redução na ocorrência de mortes pelo conjunto de DCV e suas principais causas específicas (doença isquêmica do coração e cerebrovascular)23. Comportamento semelhante ocorreu no Rio de Janeiro, no período de 1979 a 201024.

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Estudo realizado com hipertensos usuários de duas Unidades Básicas de Saúde de São Paulo evidenciou que as mulheres apresentaram índices de controle de pressão arterial mais elevados do que os homens, apesar da presença de fatores desfavoráveis que podem dificultar esse monitoramento25. Já está bem estabelecido na literatura que as mulheres têm um histórico de frequentar mais os serviços de saúde; além disso, recebem atendimento nas diversas especialidades, como intervenções educativas de prevenção de agravos de doenças crônicas degenerativas26.

A redução dos coeficientes de mortalidade por DCV em determinadas regiões do país pode ser explicada pela morbidade, fatores socioeconômicos e geográficos, prática médica e pelo sistema de saúde24. No caso específico das DCV, considera-se, ainda, que o ajuste de fatores comportamentais possa determinar seu controle ou avanço, uma vez que escolhas individuais podem ser limitadas pelo ambiente, como a oferta de alimentos saudáveis, preço e disponibilidade de cigarros e álcool27. Por outro lado, não se pode deixar de considerar as mudanças socioeconômicas ocorridas nos últimos anos, entre as quais a melhoria da renda, do poder de consumo da sociedade brasileira e maior acesso à educação e à informação, de modo que indivíduos com mais anos de estudo tendem a modificar seus hábitos de vida28

Embora não seja alvo do nosso estudo, os fatores supracitados podem interferir no aumento ou redução dos coeficientes de mortalidade e de internação por DCV. Visando a identificação dos problemas cardiovasculares da população, a Rede de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas definiu, em 2016, protocolos de encaminhamento, com o objetivo de ampliar o cuidado clínico e a resolutividade na Atenção Básica (AB)29

No Espírito Santo, foi incorporado à rede básica o processo de Planificação da Atenção à Saúde (PAS), visando promover um olhar mais amplo sobre indivíduos portadores de DCNT30. Com a PAS, é possível identificar o risco cardiovascular ao qual o indivíduo está exposto, bem como a capacidade instalada dos serviços no território, com o intuito de otimizar o uso dos recursos em saúde. A PAS ocorreu em três unidades-laboratório (São Mateus, Nova Venécia e Barra de São Francisco) e em 24 referências técnicas municipais31

Dentro do contexto atual de prevenção cardiovascular, o Escore de Risco de Framingham (ERF) contribuiu para uma nova visão de risco cardiovascular total. Ele possibilita que os profissionais de saúde tomem, em conjunto com o usuário, a melhor decisão terapêutica, bem como elaborem intervenções preventivas de acordo com o risco cardiovascular total encontrado e, consequentemente, a prevenção primária das DCV32. Wister et al.32, ao investigarem o efeito do aconselhamento por telefone para a modificação do estilo de vida, verificaram redução do risco cardiovascular utilizando o ERF em indivíduos adultos. Cavagioni e Pierin33, ao estratificarem

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o risco cardiovascular em profissionais de saúde, constataram que o ERF demonstrou ser uma ferramenta importante que atua como preditora de doença coronariana.

Diante disso, a utilização da classificação de risco global cardiovascular pode contribuir para o planejamento das ações de saúde, de forma que a equipe de saúde possa dispensar atenção diferenciada e mais qualificada à população, assim como a avaliação e o monitoramento da situação de saúde possam fornecer subsídios importantes para os gestores lidarem com situações dinâmicas e heterogêneas34 – no caso da morbidade hospitalar por DCV, tornam-se essenciais para avaliação do comportamento da doença e, indiretamente, das medidas de prevenção utilizadas para seu controle.

A depreensão desse fato implica dizer que todas essas medidas de prevenção devem ser realizadas no primeiro nível de atenção à saúde, especificamente na Estratégia de Saúde da Família (ESF), sendo que as diretrizes e os protocolos para tratamento da hipertensão recomendam a avaliação do risco cardiovascular por meio do ERF35,36. Entretanto, para sua aplicação, é necessária a criação de estratégias de capacitação e de educação continuada aos profissionais da APS, a fim de atingir toda a população assistida por esse nível37

A ausência de notificação de casos de óbitos e de internação pelo conjunto de doenças do aparelho circulatório no sistema de informação foi uma limitação para este estudo, pois pode retratar uma falsa realidade devido à subnotificação dessas informações. Sabe-se que o Sistema de Informação em Saúde é complexo, e que para ser operacionalizado, requer que os diferentes profissionais envolvidos desempenhem suas funções de maneira efetiva.

O preenchimento da DO, distribuída pelo Ministério da Saúde, instrumento único de coleta de dados, é de responsabilidade do médico que atestou o óbito, e nela constam informações sobre causas do óbito e características demográficas, entre outras38. Desse modo, é importante intensificar o treinamento sobre o preenchimento dessas informações.

Embora este estudo tenha se restringido à microrregião Norte do Espírito Santo, provavelmente, seus achados expressam a realidade de muitos municípios brasileiros, quanto às dificuldades estruturais e fragilidades do SIM, que resultam em subnotificação de eventos. Dessa forma, o padrão de mortalidade captado nos municípios pode não ser suficiente para expressar a carga de doença e auxiliar na tomada de decisões. A identificação da realidade epidemiológica de determinada área geográfica pode fornecer subsídios para explicações causais de um agravo e indicar riscos aos quais as pessoas estão sujeitas39, o que permite a tomada de ações rápidas e eficientes por trabalhadores e gestores de saúde.

Por fim, algumas limitações são atribuídas ao banco de dados do SIH/SUS. Uma delas refere-se à ausência de cobertura do setor privado, o que com a expansão dos

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planos de saúde e de novos hospitais, poderia intervir nas taxas de internações, reduzindo as internações por DCV pelo SUS. Ressalta-se que o SIH/SUS só possui informações acerca dos hospitais públicos e privados conveniados ao SUS40, cujas condições são melhores que as do setor de saúde suplementar, ao oferecer sistemas de atenção à saúde organizados pela ESF, já que os cuidados primários não são prioridade na agenda do setor privado41. Vale lembrar, também, que a transcrição dos dados da internação é realizada a partir das informações contidas no prontuário médico, estando sob responsabilidade do serviço de registro da unidade que prestou atendimento. Logo, alguns aprimoramentos no registro e fluxo de informações do SIH-SUS poderiam contribuir para melhorar o desempenho dessa base de dados na vigilância epidemiológica, reduzindo os entraves relacionados à codificação da AIH por profissionais administrativos não treinados42

O investimento em treinamento dos profissionais que manipulam a informação por meio do preenchimento das fichas de notificação, da AIH e da digitação dos dados tornase imperioso. Acredita-se que a melhoria da qualidade da informação em saúde poderá ser alcançada mediante a implementação das seguintes medidas, voltadas para a qualidade do SIH/ SUS: padronização de critérios para emissão da AIH nas emergências; adoção de estratégias focadas na qualidade do preenchimento dos prontuários médicos e da AIH; melhoria do registro do diagnóstico secundário na AIH, que deve ser utilizado para melhorar as informações de óbitos no SIH/SUS; e treinamento das equipes dos sistemas de registro43. O estudo chama a atenção, conforme preconizado pelo MS e ratificado pela PAS, para a relevância de se empregar o ERF na identificação de fatores de risco relacionados às doenças cardiovasculares na população atendida na atenção primária através da ESF, já que essa ferramenta de estratificação identifica o risco cardiovascular de cada indivíduo. Além disso, é necessário o constante treinamento dos profissionais no que tange ao preenchimento das fichas do siste0ma de saúde, pois essas informações possibilitam a produção de análises que subsidiam o planejame0nto e o estabelecimento de prioridades e estratégias primordiais para o processo da qualificação da gestão. Uma vez que o acesso aos indicadores, obtidos por meio dos sistemas de informação, aumenta a capacidade de intervir nos problemas enfrentados, contribui assim para a transformação da realidade.

Os sistemas de informação são importantes para uma melhor análise da situação de saúde, uma vez que, através dos dados coletados, o gestor poderá intervir na saúde do município com maior precisão. Isso se aplica, por exemplo, às estratégias de atendimento, visto que inúmeros estudos apontam que grande parte das pessoas que chegam às urgências e emergências poderiam ser tratadas na APS. Sendo assim, torna-se clara a relevância do uso do ERF no atendimento primário à população, a fim de identificar a presença dos fatores de

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risco para as DCV, bem como melhor orientar, tratar e encaminhar ao serviço especializado os pacientes com maior potencial de desenvolver a doença arterial coronariana, possibilitando a vigilância da situação de saúde da população e a redução desses indicadores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos municípios de Conceição da Barra, Jaguaré, Pedro Canário e São Mateus, os coeficientes de mortalidade e de internação pelo conjunto de doenças do aparelho circulatório têm crescido ao longo dos anos. Isso implica a necessidade de políticas de saúde dirigidas especificamente para essas doenças, no sentido de aumentar continuamente a esperança e a qualidade de vida da população residente nesses locais.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Katiucia Vasconcelos de Medeiros e Taísa Sabrina Silva Pereira.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Katiucia Vasconcelos de Medeiros, Jordana Herzog Siqueira e Taísa Sabrina Silva Pereira.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Katiucia Vasconcelos de Medeiros, Jordana Herzog Siqueira e Taísa Sabrina Silva Pereira.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Katiucia Vasconcelos de Medeiros, Jordana Herzog Siqueira e Taísa Sabrina Silva Pereira.

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Recebido: 23.3.2019. Aprovado: 26.2.2021.

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PREVALÊNCIA E CARACTERIZAÇÃO DE ENTEROPARASITOS EM ANÁLISES DE FEZES EM UM DISTRITO DA BAHIA, BRASIL

Bernardo Lopes Crisostomoa

https://orcid.org/0000-0003-0328-2202

Maricélia Maia de Limab

https://orcid.org/0000-0003-2320-4340

Lucíola Maria Lopes Crisostomoc

https://orcid.org/0000-0003-3669-5978

Resumo

As enteroparasitoses acometem grande número de pessoas, e sua frequência está associada a condições socioeconômicas e de saneamento básico, representando um problema de saúde pública. Apesar da transição epidemiológica mundial, muitos países, como o Brasil, ainda mantêm nas doenças parasitárias importante causa de morbimortalidade. Este artigo tem como objetivo descrever a prevalência de enteroparasitos em exames parasitológicos de fezes em uma unidade laboratorial de um distrito de Feira de Santana, Bahia, Brasil. Foram incluídos 2.304 pacientes que realizaram exames parasitológicos de fezes, entre março de 2011 e junho de 2013, e excluídos os sem dados. As variáveis foram obtidas da base de dados do laboratório local e os dados foram analisados utilizando o software SPSS, versão 17.0. Os pacientes estudados foram com frequência mulheres (59,0%) e com idade inferior a 40 anos (66,2%). Parasitos intestinais foram encontrados em 1.112 pacientes (48,3%). Protozoários representaram 93,3%, e helmintos, 10,3%. O monoparasitismo foi predominante (72,2%). Os parasitos mais frequentes foram Giardia lamblia (8,7%), seguido de Entamoeba histolytica (6,6%), Ancylostomideo SP (4,6%), Ascaris lumbricoides (2,0%), Hymenolepis SP (1,7%) e Schistosoma mansoni (1,6%). A prevalência de enteroparasitos foi

a Graduando em Medicina na Universidade Estadual de Feira de Santana. Bolsista PET-Saúde. Feira de Santana, Bahia, Brasil. E-mail: bernardolopescrisostomo@gmail.com

b Mestra em Enfermagem. Professora da Universidade Estadual de Feira de Santana. Feira de Santana, Bahia, Brasil. E-mail: limapfa@gmail.com

c Professora. Doutora em Ciências. Professora adjunta da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública. Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: luciolacrisostomo@bahiana.edu.br

Endereço para correspondência: Lucíola Maria Lopes Crisostomo. Rua Padre Casemiro Quiroga, n. 2112, Imbui. Salvador, Bahia, Brasil. CEP: 41720-400. E-mail: luciolacrisostomo@bahiana.edu.br

44 44 DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2613
ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE

elevada, com predominância de protozoários e monoparasitoses, e o perfil da população estudada caracterizou-se por maior frequência de mulheres e adultos jovens. Palavras-chave: Enteropatias parasitárias. Parasitos. Doenças parasitárias. Saneamento básico. Saúde pública.

PREVALENCE AND CHARACTERIZATION OF ENDOPARASITES IN FECAL ANALYZES

IN A NEIGHBORHOOD OF THE STATE OF BAHIA, BRAZIL

Abstract

The endoparasites affect large number of people; their frequency is associated with socioeconomic conditions and basic sanitation, representing a public health problem. Despite the worldwide epidemiological transition, many countries, such as Brazil, still have a major cause of morbidity and mortality in parasitic diseases. To describe the prevalence of endoparasites in parasitological exams of feces in a laboratorial unit in a district of Feira de Santana, state of Bahia, Brazil. The study included 2,304 patients that underwent parasitological stool testes between March 2011 and June 2013, absent from missing data. The variables were obtained from the local laboratory database. The data were analyzed using software SPSS v. 17.0. The patients studied were more frequently women (59.0%) and younger than 40 years (66.2%). Intestinal parasites were found in 1,112 patients (48.3%). Protozoa represent 93.3% and helminthes 10.3%. The monoparasitism was prevailing (72.2%). The more frequent parasites were Giardia lamblia (8.7%), followed by Entamoeba histolytica (6.6%), Ancylostomideo SP (4.6%), Ascaris lumbricoides (2.0%), Hymenolepis SP (1.7%) and Schistosoma mansoni (1.6%). The prevalence of endoparasites increased; protozoa and monoparasites predominated; and the studied population’s profile was characterized by a higher frequency of women and young adults.

Keywords: Intestinal diseases. Parasitic. Parasitic diseases. Basic sanitation. Public health.

PREVALENCIA Y CARACTERIZACIÓN DE ENTEROPARÁSITOS EN MUESTRA

Resumen

Los enteroparásitos acometen a un gran número de personas, y esta frecuencia está asociada a condiciones socioeconómicas y de saneamiento básico que indican un problema de salud

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DE HECES DE UN DISTRITO DE BAHÍA, BRASIL

pública. Pese a la transición epidemiológica mundial, muchos países como Brasil todavía mantienen un relevante reflejo de morbimortalidad a causa de enfermedades por parásitos. Este artículo tuvo como objetivo describir la prevalencia de enteroparásitos en muestras parasitológicas de heces en una unidad laboratorial de un distrito de Feira de Santana, Bahía, Brasil. Se incluyeron a 2.304 pacientes que realizaron muestras parasitológicas de heces entre marzo de 2011 a junio de 2013, y se excluyeron a los participantes con datos ausentes. Las variables obtenidas fueron basadas en datos del laboratorio local, y para el análisis de datos se utilizó el programa SPSS, versión 17.0. Hubo un predominio de la población femenina (59,0%) y con edad inferior a 40 años (66,2%). Se encontró parásitos intestinales en 1.112 pacientes (48,3%). Los protozoarios representaron el 93,3%; y los helmintos, 10,3%. Hubo mayor predominancia de un solo parásito (72,2%). Los parásitos más frecuentes fueron: Giardia lamblia (8,7%), seguido de Entamoeba histolytica (6,6%), Ancylostomideo SP (4,6%), Ascaris lumbricoides (2,0%), Hymenolepis SP (1,7%) y Schistosoma mansoni (1,6%). La prevalencia de enteroparásitos fue elevada, predominaron protozoarios y un solo parásito; y el perfil de la población estudiada se ha caracterizado por una mayor frecuencia en mujeres y adultos jóvenes.

Palabras clave: Enteropatías parasitarias. Parásitos. Enfermedades parasitarias. Saneamiento básico. Salud pública.

INTRODUÇÃO

As parasitoses intestinais constituem um sério problema de saúde pública mundial1. Muitos países, incluindo o Brasil, estão num estágio transicional dessas doenças infectocontagiosas para neurodegenerativas, principalmente pelos avanços da atenção básica em saúde no que diz respeito à profilaxia. Contudo, as enteroparasitoses ainda contribuem para a morbimortalidade de pessoas no mundo2,3

A Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou para a alta prevalência das doenças parasitárias na população mundial, estimando, em 2008, cerca de 980 milhões de pessoas parasitadas por Ascaris lumbricoides, 200 milhões por Schistosoma mansoni e 16 milhões pelo

Trypanosoma cruzi4. A precariedade das práticas de higiene pessoal e domiciliar, aliada a um saneamento básico insuficiente, é responsável por, aproximadamente, um terço da população dos países subdesenvolvidos estar em condições extremamente favoráveis para a transmissão dos enteroparasitos, sendo esses habitantes os mais afetados5

No Brasil, as parasitoses intestinais ainda se encontram bastante disseminadas e com alta prevalência6. Estudos apontam que o Norte e o Nordeste do país ainda são

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regiões endêmicas para essas doenças, com percentual de infectados superior a 50%7-10. Os enteroparasitos apresentam variações intra e inter-regionais, dependendo de condições sanitárias, educacionais, econômicas, sociais, índice de aglomeração da população, condições de uso e contaminação do solo, da água e alimentos, e da capacidade de evolução das larvas e ovos de helmintos e de cistos de protozoários em cada um desses ambientes11,12

As crianças e adolescentes em idade escolar são alvos das enteroparasitoses, que podem provocar uma grande repercussão sistêmica, visto que, além dos acometimentos primários em nível gastrointestinal, podem estabelecer déficits de crescimento e desenvolvimento. Dessa forma, esses grupos são os mais acometidos, em decorrência de suas atividades de lazer frequentemente ocorrerem em ambientes peridomiciliares, ruas ou quadras esportivas sem pavimentação – realidade urbana e de muitas localidades rurais –, estando mais expostos a ambientes onde a disposição do lixo, excretas humanos e esgotos sanitários são feitos de forma inadequada7. Alia-se aos aspectos citados a falta de educação em saúde como um fator preponderante para situações potenciais de infecção e reinfecção por enteroparasitos, como o consumo de água e alimentos sem o devido tratamento e o não uso de calçados8,13,14

Quando se considera exclusivamente os parasitos intestinais, apesar da transição epidemiológica mundial, estima-se que existam cerca de 1 bilhão de indivíduos infestados por Ascaris lumbricoides, 900 milhões por Ancilostomídeos, 400 milhões por Entamoeba histolytica e 200 milhões por Giardia lamblia, tendo alta prevalência principalmente em países com realidade socioeconômica precária15

Estudos em diferentes localidades do Brasil apontam alta prevalência dos enteroparasitos, mantendo as variações percentuais e de caracterização dos agentes encontrados7,16-20.

Considerando a extensão do Brasil, com regiões que apresentam distintos perfis socioeconômicos e culturais, há carência de pesquisas que identifiquem prevalências e caracterizem as enteroparasitoses em diferentes comunidades; tais estudos muito contribuiriam para a melhoria da assistência à saúde local e para a implementação de políticas públicas em saúde.

A presente pesquisa teve como objetivo descrever a prevalência de enteroparasitos em exames parasitológicos de fezes em uma unidade laboratorial de um distrito do município de Feira de Santana, Bahia.

MATERIAL E MÉTODOS

Estudo observacional, retrospectivo e descritivo, com base na análise das informações do banco de dados de uma unidade de um laboratório em Feira de Santana, Bahia.

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A população de referência foi constituída de pacientes que realizaram exames em uma unidade laboratorial situada no distrito de Humildes, vinculada a um laboratório de análises clínicas de Feira de Santana, Bahia, Brasil. O distrito de Humildes se caracteriza por apresentar uma realidade socioeconômica tipicamente rural, com atividades voltadas para a agricultura, e cuja população apresenta inadequado nível de higiene21

Foram incluídos consecutivamente todos os pacientes que realizaram exames parasitológicos de fezes (EPF) na unidade laboratorial, com registro na base de dados do laboratório no referido período, e excluídos quando ausentes as variáveis de interesse.

O diagnóstico foi realizado a partir de amostras fecais recolhidas diariamente. Todas foram analisadas no próprio laboratório, utilizando-se o método de sedimentação espontânea ou Hoffmann14

As variáveis de interesse foram idade, sexo, presença de parasitose no EPF (EPF positivo) e caracterização do parasito. As análises foram realizadas com a utilização do software SPSS, versão 17.0, aplicando-se estatística descritiva. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Estadual de Feira de Santana (CAEE 41697115.0.3001.0053) e conduzida em observação à Resolução 466/2012 CONEP/CNS-MS.

RESULTADOS

Participaram 2.304 pacientes, dos quais 1.363 eram do sexo feminino, o que corresponde a 59,0%. A faixa etária variou de 01 mês a 99 anos, e os participantes com idade inferior a 40 anos somaram 66,2% (Tabela 1).

Tabela 1 – Características gerais dos pacientes que realizaram exames parasitológicos de fezes em uma unidade laboratorial de um distrito de Feira de Santana. Feira de Santana, Bahia – 2015

Fonte: Elaboração própria. Dados apresentados em valores absolutos com proporções entre parênteses *Idade em valor mediano, com valores mínimo e máximo entre parênteses

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N 2.304 Homens 941,0 (41,0%) Mulheres 1.363,0 (59,0%) Idade (anos) *24,0 (0,08-99,0) Extratos etários (anos) < 2 165,0 (7,2%) 2-7 423,0 (18,4%) 8-17 369,0 (16,0%) 18-29 316,0 (13,7%) 30-39 250,0 (10,9%) 40-49 212,0 (9,2%) 50-59 203,0 (8,8%) ≥ 60 366,0 (16,0%)

Quanto aos resultados dos EPF, foram positivos em 1.112 pacientes (48,3%).

Os pacientes do sexo masculino apresentaram menor frequência de EPF positivos (45,9%), e quanto à idade, o estrato etário com maior frequência de positividade foi de 20 a 59 anos, seguido dos abaixo de 9 anos (Tabela 2).

Tabela 2 – Resultados dos exames parasitológicos de fezes em uma unidade laboratorial de um distrito de Feira de Santana. Feira de Santana, Bahia – 2015

Fonte: Elaboração própria Dados apresentados em valores absolutos com proporções entre parênteses EPF positivo: exame parasitológico de fezes que revela presença de parasitos EPF negativo: exame parasitológico de fezes com ausência de parasitos

As infecções por protozoários representaram 93,3% e 10,3% por helmintos, entre os EPF positivos. A proporção de protozoários foi maior no sexo feminino, com 45,6%, enquanto a presença de helmintos foi maior no sexo masculino, correspondendo a 3,5%. Protozoários e helmintos estiveram presentes conjuntamente no sexo feminino e masculino em 1,2% e 2,4%, respectivamente.

Em relação ao número de infecções por agentes patogênicos, excluídos os comensais, observou-se 294 parasitos, o que representa 26,4% dos exames positivos. (Tabela 3).

Tabela 3 – Perfil dos exames parasitológicos de fezes positivos com agentes patogênicos em uma unidade laboratorial de um distrito de Feira de Santana. Feira de Santana, Bahia – 2015

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N = 2.304 EPF positivo EPF negativo Geral 1.112 (48,3%) 1.192 (51,7%) Homens 432,0 (45,9%) 509,0 (54,1%) Mulheres 680,0 (49,9%) 683,0 (50,1%) Idade (anos) ≤ 9 257,0 (23,1%) 428,0 (35,9%) 10-19 171,0 (15,4%) 143,0 (12,0%) 20-59 507,0 (45,6%) 429,0 (36,0%) ≥ 60 177,0 (15,9%) 192,0 (16,1%)
N 1.112 Patogênicos 294,0 (26,4%) Entamoeba histolytica 74,0 (6,6%) Giardia lamblia 97,0 (8,7%) Ancilostomideo SP 52,0 (4,6%) Ascaries lumbricoides 23,0 (2,0%) Enterobios vermiculares 3,0 (0,2%) Hymenolepis SP 19,0 (1,7%) Strongyloides stercorallis 2,0 (0,2%) Trichiuris trichiura 6,0 (0,5%) Schistosoma mansoni 18,0 (1,6%) Schistosoma mansoni (isolado) 12,0 (1,1%) Schistosoma em homens 11,0 (91,6%) Schistosoma em mulheres 1,0 (8,4%) Patogênos em homens 136,0 (31,4%) Patogênos em mulheres 158,0 (23,2%) Fonte: Elaboração própria.

Os exames positivos por comensais – Entamoeba coli, Endolimax nana e Iodamoeba butchili – representaram 74,5% em 829 casos e equivalência de 76,9% nos participantes do sexo feminino.

Quanto ao número de infecções nos EPF positivos, 72,2% apresentaram monoinfecções, 22,5% duas infecções, 4,9% mostraram três e 0,2%, quatro infecções ( Gráfico 1 ).

Gráfico 1 – Distribuição de protozoários, helmintos e número de infecções nos exames parasitológicos de fezes positivos em uma unidade laboratorial de um distrito de Feira de Santana. Feira de Santana, Bahia – 2015

Fonte: Elaboração própria.

Considerando todos os exames positivos, a espécie Ancylostomideo sp. representou 4,6%; Ascaris lumbricoides, 2,0%; Hymenolepis sp., 1,7%; Schistosoma mansoni, 1,6%; Trichiuris trichiura, 0,5%; Enterobios vermiculares, 0,2%; e Strongyloides stercorallis, 0,2%. No que tange aos protozoários, amebíase e giardíase foram observadas em 6,6% e 8,7%, respectivamente, da porcentagem válida (Tabela 3 e Gráfico 2).

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Gráfico 2 – Perfil das espécies de parasitos nos exames parasitológicos de fezes positivos em uma unidade laboratorial de um distrito de Feira de Santana, 2015. Feira de Santana, Bahia – 2015

DISCUSSÃO

O presente estudo avaliou os resultados de exames parasitológicos de uma população da região Nordeste, historicamente com déficits sociais, com maior prevalência da faixa etária adulta, porém com significativo número de crianças, seguido de idosos, diferindo da atual distribuição etária brasileira, que vem envelhecendo desde a década de 1940, com redução da natalidade e mortalidade, principalmente em populações no Sudeste do país22. Houve predomínio do sexo feminino, o que pode ser explicado pelo maior número de mulheres na população brasileira23. Outra justificativa possível é pelo perfil desse grupo, pois, segundo Pinheiro et al.24, as mulheres utilizam com maior frequência os serviços de saúde para a realização de exames gerais e prevenção – 40,3% entre mulheres, em comparação a 28,4% dos homens –, como também dão maior atenção a quaisquer alterações clínicas que apareçam.

A faixa etária mais evidente na pesquisa engloba as realidades de regiões como o Norte e o Nordeste do país, com prevalência maior de adultos jovens, crianças e adolescentes. É importante observar que, além da questão demográfica, clinicamente são essas as faixas que

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Revista Baiana de Saúde Pública Fonte: Elaboração própria.

merecem mais atenção dos serviços de saúde, em decorrência da maior exposição a fatores de risco para parasitoses. Tal afirmação corrobora as pesquisas de Mamus et al.25 e Cardoso et al.26, que estudaram o perfil de infecção por parasitos, principalmente em escolares e adolescentes.

A positividade dos exames varia muito num contexto intra e inter-regional, a depender das condições socioeconômicas, sanitárias e principalmente educacionais, como consumo de alimentos, água e uso de calçados.

O presente estudo observou positividade em cerca de metade das amostras, concordante com o levantamento multicêntrico de enteroparasitoses realizado por Rocha et al.6, que demostrou a presença de exames positivos em 55,3% dos pacientes estudados.

Segundo Cañete et al.27, em Cuba, onde conhecidamente a saúde pública e educação em saúde recebem maior atenção do Estado, em uma população de zona rural, houve positividade em 23,3% dos testes. Tal porcentagem foi considerada elevada para a realidade local e, mesmo assim, representa uma taxa de positividade significativamente menor do que a observada no presente estudo, o que pode ser explicado pela diferença no perfil de atenção à saúde nos dois países, Brasil e Cuba.

Já a análise de prevalência de enteroparasitos numa cidade do Amazonas, Brasil, realizada por Araujo e Fernandez9, revelou positividade de 64,4%, identificando-se os fatores de risco como banho de rio, consumo de água e alimentos não tratados.

Quanto ao gênero, as mulheres apresentam geralmente menor positividade que os homens em idade escolar e adulta, em decorrência de eles se exporem mais a atividades periurbanas, ocupações em pecuária ou áreas agrícolas, além de a banhos de rio, e nutrirem menor preocupação com higiene, com o consumo de água e alimentos tratados. Pradhan et al.28 corrobora tal análise, apresentando dados com parasitos em 28,2% nos homens e 20,2% nas mulheres.

Os achados da presente pesquisa demonstram maior ocorrência de exames positivos em mulheres que em homens, porém sem alcançar significância estatística. Essa discordância pode ser explicada pelo critério utilizado para considerar um exame positivo: independente de se o micro-organismo encontrado for comensal ou parasito. Contudo, o estudo concorda com as demais pesquisas no que tange à observação apenas dos parasitos. Assis et al.29, numa comunidade indígena no interior de Minas Gerais, observaram maior prevalência de parasitos na faixa etária de pré-escolares (2 a7 anos) até os adultos de 19 a 29 anos, o que está de acordo com os resultados deste estudo. No entanto, houve uma média de parasitos por indivíduo de 2,56. Essa diferença pode ser explicada, possivelmente, pelas condições dos pacientes do referido estudo não serem as ideais de higiene. É fato a péssima

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realidade de saneamento básico nas aldeias estudadas, com percentuais superiores a 70% de moradias de palha, com piso batido, falta de água tratada e ausência de sanitário.

A elevada frequência de protozoários observada na vigente pesquisa relaciona-se, provavelmente, à contaminação por água e alimentos de colheita própria, sem a devida higiene, considerando-se tratar de uma população predominantemente rural. É possível que a escassez de locais de banhos públicos, como rios e açudes, interfira na presença de geo-helmintos, com frequência substancialmente menor desses que a de protozoários. Tal resultado está em acordo com a pesquisa de Gelatti et al.30, que apresentou 33,8% de protozoários e 0,4% de helmintos, contraste ainda mais evidente pela coleta de apenas uma amostra de fezes na referida pesquisa.

Os protozoários comensais foram os mais prevalentes, e apesar de não representarem um agravo para a saúde do infectado, evidenciam falhas de saneamento básico, visto que têm as mesmas vias de contágio e transmissão que amebas patogênicas, como Entamoeba histolytica e Giardia lamblia. Alves et al.10 trazem resultados semelhantes, com 62,9% dos infectados por Entamoeba coli e 23,8% por Endolimax nana, estando esses entre os dois mais prevalentes do estudo.

Marques et al.11, em estudo realizado no Sul do país, dentre os principais agentes patogênicos, identificaram os causadores de giardíase e amebíase. Prevalência equivalente à da atual pesquisa foi exposta por Prado et al.7, em estudo sobre escolares de Salvador, com 8,9% de Giardia lamblia e 5,5% de Entamoeba hitolytica, provavelmente por se tratar de uma realidade semelhante à de Feira de Santana.

Foi notória a proporção significativa de Ancilostomideo, Ascaris lumbricoides e Schistosoma mansoni encontrada no presente estudo, que pode ser explicada pela falta de higiene básica, destino dos dejetos humanos e uso de calçados, além das características geográficas do local, onde é habitual banhos em comunidade.

Tal situação assemelha-se à do estudo de Silva et al.8, realizado no interior do Maranhão, quanto à alta prevalência de parasitos. Observou que apenas 10% das crianças das famílias estudadas usavam calçados constantemente, e 78,1% das famílias realizavam suas necessidades ao ar livre. O reconhecimento de medidas educacionais é essencial para a redução do risco e incidência de parasitoses.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A prevalência de enteroparasitose foi elevada, com predominância de protozoários em relação aos helmintos e de monoparasitose. As espécies de parasitos mais frequentes foram: Giardia lamblia, em seguida, Entamoeba histolytica, Ancylostomideo sp, Ascaris lumbricoides

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e Schistosoma mansoni. Vale reiterar que o perfil dos pacientes estudados apontou para predominância em mulheres, crianças e adultos jovens.

Tais aspectos apontam para a necessidade de intervenção na comunidade através de saneamento básico, melhoria das condições de vida da população e medidas educacionais.

A presente pesquisa apresenta limitações inerentes ao seu desenho e sugere estudos que alcancem outras comunidades.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto ou análise e interpretação dos dados: Bernardo Lopes Crisostomo, Maricélia Maia de Lima e Lucíola Maria Lopes Crisostomo.

2. Redação do artigo ou revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Bernardo Lopes Crisostomo e Lucíola Maria Lopes Crisostomo.

3. Revisão e/ou Aprovação final da versão a ser publicada: Bernardo Lopes Crisostomo e Lucíola Maria Lopes Crisostomo.

4. Responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Bernardo Lopes Crisostomo e Lucíola Maria Lopes Crisostomo.

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Recebido: 9.4.2017. Aprovado: 14.4.2021.

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ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE

DIREITO À SAÚDE: DEMANDA POR SUPLEMENTOS ALIMENTARES

NO RIO DE JANEIRO – UM ESTUDO DE CASO

Aldo Pacheco Ferreiraa

https://orcid.org/0000-0002-7122-5042

Juliana Nobre dos Santos Silvab

https://orcid.org/0000-0002-7735-905X

Marcos Besserman Viannac

https://orcid.org/0000-0001-9411-2086

Dorival Fagundes Cotrim Juniord

https://orcid.org/0000-0002-7389-7635

Eduardo Dias Wermelingere

https://orcid.org/0000-0003-1926-4789

Resumo

Desde a consagração dos direitos sociais pela Constituição de 1988, observou-se um acréscimo na chamada judicialização da saúde, ocasionando uma situação de desequilíbrio no que alude à acessibilidade e gestão dos serviços públicos de saúde. O aparecimento da consciência do cidadão, pela qual se conjectura a garantia de um direito, cresce na proporção das sentenças proferidas em primeira instância, as quais repetidas vezes aclamam o pagamento positivo por parte do Estado. Este estudo teve como objetivo investigar as ações judiciais que buscam garantir o acesso à saúde pública, avaliando o substancial dos processos, para que se tenha um cenário sobre a judicialização da saúde em relação ao tema “insumos alimentares”. Trata-se de

a Doutor em Engenharia Biomédica. Docente da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: aldopachecoferreira@gmail.com

b Nutricionista. Pós-graduada em Direitos Humanos e Saúde e em Fitoterapia Aplicada à Nutrição. Assessora técnica da Câmara de Resolução de Litígios de Saúde (CRLS). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: juligtf@hotmail.com

c Doutor em Saúde Pública. Docente da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: mbessa@ensp.fiocruz.br

d Doutorando do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Professor do Instituto de Direito da PUC Rio. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: dorivalfcotrim@gmail.com

e Doutor em Entomologia. Docente da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: edw@ensp.fiocruz.br

Endereço para correspondência: Fundação Oswaldo Cruz. Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. Departamento de Direitos Humanos, Saúde e Diversidade Cultural. Av. Brasil, n. 4.036, sala 905, Manguinhos. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. CEP: 21040-900. E-mail: aldopachecoferreira@gmail.com

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DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2769

um estudo qualitativo, com foco em pesquisa documental, que analisa ações judiciais por suplementos alimentares ajuizadas contra a Secretaria de Estado da Saúde do Rio de Janeiro, expedidas de janeiro 2014 a agosto de 2017. Foram impetrados 1.322 processos judiciais. As questões judiciais não podem ser acatadas como instrumento basal deliberativo na gestão da assistência médica, mas acolhidas como um componente respeitável na tomada de decisão dos gestores no acesso aos suplementos alimentares pelo SUS. Assim, é necessário que o Ministério da Saúde operacionalize, junto às estâncias reguladoras, o papel terapêutico dos suplementos alimentares, a fim de aparar as arestas do que é medicamento e do que é alimento, bem como discutir com instâncias intersetoriais sobre até onde o Sistema Único de Saúde (SUS) deve ser o responsável por garantir esses alimentos/produtos alimentícios com finalidade terapêutica.

Palavras-chave: Judicialização da saúde. Direito à saúde. Suplementos alimentares. Saúde pública. Direitos humanos.

RIGHT TO HEALTH: DEMAND FOR FOOD SUPPLEMENTS

IN RIO DE JANEIRO – A CASE STUDY

Abstract

Since the incorporation of social rights in the 1988 Brazilian Constitution, an increase in the so-called judicialization of health was observed, which caused an imbalance regarding the accessibility and management of public health services. The emergence of the citizen’s conscience, by which the guarantee of a right is conjectured grows compared to the judgments handed down in the first instance, which again and again claim the positive payment by the State. Investigate legal actions that seek to guarantee access to public health, evaluating the substantial processes to provide a scenario on the judicialization of health regarding dietary supplements. This is a qualitative study that focus on documentary research, analysing legal proceedings for dietary supplements filed against the State Department of Health of Rio de Janeiro, issued from January 2014 to August 2017. In total, 1,322 lawsuits were filed. Judicial issues cannot be accepted as a deliberative baseline instrument in the management of medical care but accepted as a respectable component in the decision-making of managers in the access to dietary supplements by SUS. Thus, the Ministry of Health must work with regulatory agencies on the therapeutic role of dietary supplements to establish a limit between medicine and food and discuss with intersectional instances how far Brazilian Unified Health System should be the responsible for ensuring such food/foodstuffs for therapeutic purposes.

Keywords: Health’s judicialization. Right to health. Dietary supplements. Public health. Human rights.

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DERECHO A LA SALUD: DEMANDA DE SUPLEMENTOS DIETÉTICOS EN RÍO DE JANEIRO – UN ESTUDIO DE CASO

Resumen

Desde la incorporación de los derechos sociales en la Constitución de 1988, se observó un incremento en la denominada judicialización de la salud, provocando una situación de desequilibrio en lo que se refiere a la accesibilidad y gestión de los servicios de salud pública. El surgimiento de la conciencia ciudadana que se conjetura la garantía de un derecho crece en proporción a las sentencias emitidas en primera instancia, que una y otra vez elogian el pago positivo por parte del Estado. Este estudio tuvo como objetivo investigar acciones legales que buscan garantizar el acceso a la salud pública, evaluando los procesos sustanciales para proporcionar un escenario sobre la judicialización de la salud en relación con el tema de los “suplementos dietéticos”. Este es un estudio cualitativo y se enfoca en la investigación documental, analizando los procedimientos legales para suplementos dietéticos presentados contra la Secretaría de Salud del Estado de Río de Janeiro, emitidos desde enero de 2014 hasta agosto de 2017. Se presentaron un total de 1.322 demandas. Las cuestiones judiciales no pueden aceptarse como un instrumento deliberativo de referencia en la gestión de la atención médica, pero se acepta como un componente respetable en la toma de decisiones de los gerentes sobre el acceso a suplementos dietéticos por el Sistema Único de Salud (SUS). Por lo tanto, es necesario que el Ministerio de Salud trabaje con las agencias reguladoras el rol terapéutico de los suplementos dietéticos para recortar los límites de lo que es medicina y que es la comida, así como discutir con instancias interseccionales qué tan lejos el SUS debería ser el responsable de garantizar dichos alimentos/productos alimenticios con fines terapéuticos.

Palabras clave: Judicialización de la salud. Derecho a la salud. Suplementos dietéticos. Salud pública. Derechos humanos.

INTRODUÇÃO

O direito à saúde é um direito prestacional, e como tal requer ações positivas do Estado1. As obrigações podem ser compreendidas por: obrigação de respeitar o acesso a bens que constituem objeto do direito; a obrigação de proteger, impedindo o acesso de terceiros a esses bens; a obrigação de garantir, assegurando que o titular do direito tenha acesso aos bens quando não puder fazê-lo por si mesmo; e a obrigação de promover, que exige do Estado o desenvolvimento de condições para que os titulares do direito tenham acesso aos bens2

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A relação entre direito e saúde na contemporaneidade é um debate latente que necessita, indiscutivelmente, de reflexão que proporcione o entendimento do contexto no qual ambos se inter-relacionam3. Nessa busca incessante por explicações, torna-se necessário expor algumas obrigações essenciais do Estado e quais os direitos relacionados à saúde que os indivíduos possuem, independentemente da idade e do status social4

As políticas públicas de saúde passaram a ser orientadas por meio dos princípios de universalidade e equidade no acesso às ações e serviços de saúde, e pelas diretrizes de descentralização da gestão, de integralidade do atendimento e de participação da comunidade na organização de um Sistema Único de Saúde (SUS)5. A partir do princípio da universalidade, a saúde passou a ser considerada direito de todos e dever do Estado e, assim, os indivíduos adquiriram o direito de ter acesso às ações e serviços de saúde. Por exemplo, tratamentos e internações nas instituições de saúde, exames e consultas, sejam elas públicas ou privadas conveniadas ao sistema2

Ao sistema político, portanto, coube em última análise o comprometimento de produzir subsídios às políticas públicas, capacitando-as a equacionar a carência de recursos com os custos crescentes na área da saúde, decorrentes do progresso técnico, do envelhecimento populacional e da nova e ampliada concepção de doença proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS)4

Contudo, apesar de os princípios do SUS – como universalidade e integralidade –estarem constitucionalmente amparados, historicamente, a assistência à saúde no Brasil seguiu uma lógica hegemônica de atendimento. Com o acesso dificultado por verbas ineficientes, mas mesmo assim operacional, centrou-se, em geral, em procedimentos de média e alta complexidade, com a realização de procedimentos especializados6,7.

O aprofundamento e detalhamento das concepções das referidas obrigações no cenário da saúde é de exímia relevância, sendo um obstáculo a ser resolvido presentemente, uma vez que busca discutir a respeito de como alocar recursos essencialmente escassos, como também quais ações e serviços de saúde o Estado brasileiro necessitaria incorporar à gestão orçamentária frente às demandas sociais e aos imperativos judiciais7

O presente estudo apresenta um quadro situacional das ações judiciais em saúde referentes a suplementos alimentares no estado do Rio de Janeiro, no período de 2014 a 2017. Com isso, permite demonstrar que a judicialização da saúde contempla mais do que ações por produtos e como esse fenômeno evoluiu no estado.

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DIREITO E SAÚDE: A JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE NO BRASIL

As demandas judiciais para a concretização do direito à saúde colocam em evidência os problemas de nosso sistema de saúde, e trazem à discussão jurídica várias teses que discutem a natureza, o conteúdo e as limitações ao direito à saúde8

Assim emergiu a judicialização da saúde, que expressa reivindicações e modos de atuação legítimos de cidadãos, buscando nesse conjunto democrático contemporâneo a segurança e ascensão dos direitos de cidadania9,10. O tema, até o momento, encontra-se centralizado em questões como a impossibilidade do acesso universal às ações de saúde e da integralidade da atenção à saúde, a falta de recursos na área da saúde e o conflito entre o direito individual e o direito coletivo11,12

Por conseguinte, a busca pelo sistema judiciário como última alternativa para obtenção do medicamento ou tratamento ora negado pelo sistema de saúde público ou privado, seja por falta de previsão de estoque, seja por questões orçamentárias, consubstancia o reflexo de um sistema de saúde deficitário, que não consegue concretizar, a contento, a proteção desse direito fundamental no cenário da saúde pública nacional13,14. Silva et al.15 apontam que, dentre as consequências, está a necessidade de justificar as decisões judiciais, fundamentando-as na ampla argumentação baseada nas condições concretas, o que exige a caracterização de todos os direitos envolvidos na situação examinada.

Contudo, as políticas públicas não foram capazes de equacionar adequadamente essas conjunturas, e hoje, decorridos 32 anos da promulgação da atual Constituição, repetese exaustivamente que as normas constitucionais relativas à saúde não conseguiram ser efetivas16. Maus17 sinaliza que haveria um distanciamento entre o texto legal e a realidade institucional, o que poderia evidenciar a inserção do direito à saúde na Constituição como um fato de constitucionalização simbólica. Diante das previsões constitucionais e da ausência de efetividade, o judiciário passou a ser provocado para que demandas em saúde fossem atendidas pelo executivo5

De acordo com Ventura et al.18, os vínculos entre direito e saúde se acentuaram com a materialização de jurisprudências e intervenções do poder judiciário na gestão de saúde. Essa nova realidade normativa, resultado direto dos esforços do movimento pela reforma sanitária, fez com que a categoria saúde alcançasse o nível de direito fundamental, e impôs ao Estado a obrigação de implantar gradualmente um arcabouço institucional capaz de assegurar efetividade às previsões constitucionais.

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EVOLUÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

O poder judiciário tem a função de interpretar e aplicar a lei nos litígios entre os cidadãos e entre cidadãos e Estado para garantir efetividade aos direitos sociais prestacionais.

A judicialização do direito à saúde, mais especificadamente, tem se direcionado a diversos serviços públicos e privados, tais como o fornecimento de medicamentos, a disponibilização de exames e a cobertura de tratamentos para doenças. Não é difícil observar em qualquer governo no Brasil a existência de ações judiciais que buscam o deferimento de pedidos sobre esses e outros assuntos. A constante procura pelo judiciário faz com que a administração pública sofra com os gastos provenientes de tais processos, necessitando, por muitas vezes, desviar verbas de outras áreas, ou de determinados fins, para cobrir os rombos deixados com o custeio de eventuais medicamentos17

O papel do judiciário é um desafio das sociedades democráticas. Atualmente, essa tarefa se tornou ainda mais difícil, em razão da atividade judicial orientada no sentido de garantir efetividade aos direitos sociais. Essa nova atitude dilatou os horizontes do desempenho judicial, reconfigurou as relações entre os poderes da república e abalou várias das bases que denotavam suporte na tarefa de assinalar os limites e as possibilidades da atuação judicial18.

Cabe destacar que o judiciário é determinado como a última alternativa para aqueles que não receberam do Estado ações no sentido de garantir a saúde. Por outro aspecto, Menicucci e Machado9 pontuam que a atuação judicial pode ter efeitos negativos para o implemento do sistema de saúde, e resultar, inclusive, em danos aos pacientes que buscam a proteção judicial.

Por conseguinte, o crescimento das ações judiciais e de seus respectivos gastos no Brasil ganha destaque nos estudos, assim como o fato de que a maioria dos pedidos corresponde a medicamentos13,19. Os estudos apresentam dados oriundos, quase sempre, dos sites dos Tribunais de Justiça estaduais, o que não proporciona uma exposição mais abrangente do cenário da judicialização da saúde nos estados brasileiros, devido ao fato de os dados cabíveis serem disponibilizados em meio eletrônico e a período curto de acompanhamento.

Para lidar com as ações judiciais referentes ao requerimento de medicamentos e afins, o governo do estado do Rio de Janeiro, juntamente com a prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, criou em maio de 2012 a Câmara de Resolução de Litígios de Saúde (CRLS), de forma a atender as demandas por medicamentos e afins daqueles que buscavam a Defensoria Geral do Estado do Rio de Janeiro para peticionar, frente ao judiciário, suas demandas médicas. A CRLS congrega, dessa forma, procuradores do estado e do município do Rio de Janeiro, defensores públicos do estado e da União e membros da Secretaria de Estado de Saúde e da Secretaria Municipal de Saúde.

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Dessa forma, a CRLS busca viabilizar a solução extrajudicial de demandas de saúde não atendidas pelas vias convencionais disponibilizadas pelo SUS, tendo como meta a diminuição da judicialização das políticas públicas da área de saúde no atendimento das demandas apresentadas pelas partes assistidas pela Defensoria Pública Geral do Estado e pela Defensoria Pública da União.

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um estudo com base qualitativa e foco em pesquisa documental, cujo material de análise foram os documentos referentes às ações judiciais por suplementos alimentares, ajuizadas contra a Secretaria de Estado da Saúde do Rio de Janeiro, e do município do Rio de Janeiro, expedidas no período de janeiro de 2014 a agosto de 2017.

A coleta de dados foi realizada na CRLS, no período de setembro a novembro de 2017, a partir do material encontrado. Foram coletados os dados pertinentes ao processo (número, instância, data, comarca, tipo de ação, existência de pedido liminar, resultado); ao beneficiário (sexo, idade, residência); ao representante judicial (advogado, promotor, defensor, advogado do estado); ao réu (esfera de gestão, nome e cargo, caso réu for autoridade coautora em mandado de segurança); ao atendimento (dados dos profissionais, da origem do atendimento, do estabelecimento, do relatório, do diagnóstico); e aos produtos de saúde solicitados (prescrição, data, nome). Foram analisados, igualmente, algumas provas e documentos inseridos nos autos.

O banco de dados assim constituído possui 1.322 ações judiciais. A classificação dos pedidos seguiu o seguinte critério: Analisou-se os acórdãos selecionando as seguintes informações: (1) suplemento alimentar solicitado; (2) presença de prova de existência da doença; (3) incapacidade de custeio do impetrante; (4) origem do atendimento (público ou privado); e (5) embasamento jurídico utilizado nas decisões.

Os dados coletados foram comparados e discutidos com as informações bibliográficas, obtidas por meio de artigos científicos a partir das seguintes bases: Biblioteca Virtual em Saúde, Scientific Eletronic Library Online (SciELO), National Library of Medicine and National Institutes of Health (PUBMED), Science Direct, Portal de Periódicos Capes, com base nos tópicos levantados e inseridos no programa Microsoft Excel, versão 2016. As análises dos dados foram efetuadas no programa SPSS, versão 20.0, e dispostas na forma de gráficos e tabelas para maior clareza dos resultados.

Por se tratar de trabalho ancorado em documentos de caráter público, a pesquisa ficou isenta de submissão ao Comitê de Ética.

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RESULTADOS E DISCUSSÃO

No período estudado, de janeiro de 2014 a agosto de 2017, foram impetrados 1.322 processos judiciais por suplementos alimentares, pleiteando a necessidade de tais produtos auxiliares no tratamento de pacientes internados, conforme a Tabela 1. Dos 1.322 (100%) processos, 501 (37,90%) foram conduzidos por hospitais públicos, 20 (1,51%) por clínicas particulares, 679 (51,36%) pela Defensoria Pública e 122 (9,23%) por hospitais particulares. Em 139 (10,51%) dos processos, o estado foi a instituição demandada, e 1.183 (89,49%) demandaram ao município do Rio de Janeiro.

Tabela 1 – Distribuição dos processos judiciais de acordo com o ano de início do processo judicial. Área de abrangência da Câmara de Resolução de Litígios de Saúde.

Rio de Janeiro, Rio de Janeiro – 2017

Fonte: Elaboração própria.

No que diz respeito à origem da prescrição médica, considerou-se o timbre da primeira prescrição ou receita médica, e foi possível detectar que 623 (47,12%) dos processos judiciais que pleiteavam medicamentos/materiais/insumos tinham como origem da prescrição médica o serviço prestado por hospitais públicos e privados, conforme demonstra a Tabela 2

Tabela 2 – Distribuição dos processos judiciais segundo origem da prescrição médica. Área de abrangência da Câmara de Resolução de Litígios de Saúde. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro – 2017

Em relação à faixa etária e ao sexo dos sujeitos, temos que 677 (51,21%) dos processos judiciais foram movidos por usuários sexo masculino, e a idade média foi de 19,26 anos, com desvio padrão de 27,4 e variação de 0 a 95 anos. Destaca-se a maior concentração de

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Ano Quantitativo Percentual Percentual acumulado 2014 294 22,24 22,24 2015 347 26,25 48,49 2016 385 29,12 77,61 2017 296 22,39 100 1.322 100 100
Origem da prescrição médica Quantitativo Percentual Defensoria 679 51,36 Consultório particular 20 1,51 Unidade de Saúde Estadual 104 7,87 Unidade de Saúde Federal 122 9,23 Unidade de Saúde Municipal 397 30,03 Total 1.322 100
Elaboração própria.
Fonte:

solicitações na faixa etária até 12 anos (815). Vale destacar que em um processo judicial, a idade do usuário não foi mencionada (Tabela 3).

Tabela 3 – Distribuição dos processos segundo faixa etária e sexo dos usuários que os impetraram contra o poder público. Área de abrangência da Câmara de Resolução de Litígios de Saúde. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro – 2017

No que tange às solicitações de suplementos alimentares, foi possível observar que, dentre os pleiteados, houve predomínio do Leite Neocate em 324 (24,51%) processos, seguidos de 174 processos com solicitações do Leite NAN (1, 2, 3, Soy, sem lactose) (13,16%), 99 processos com solicitações de Leite Aptamil (7,49%) e 93 processos com solicitações de Pregomin Pepti (7,03%), perfazendo 52,19% dos pedidos (Tabela 4). Destaca-se que em 100% dos processos não havia solicitações de suplementos alimentares que não fossem de ampla e fácil distribuição no mercado e, por conseguinte, sem necessidade de importação.

Tabela 4 – Distribuição dos processos segundo suplementos alimentares solicitados no processo judicial. Área de abrangência da Câmara de Resolução de Litígios de Saúde. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro – 2017

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Faixa etária (em anos) Quantitativo Percentual ≤ 12 815 61,65 12-18 82 6,20 18-60 230 17,40 ≥ 60 194 14,67 Não mencionado 1 0,08 Total 1.322 100 Sexo Quantitativo Percentual Feminino 645 48,79 Masculino 677 51,21 Total 1.322 100
Fonte: Elaboração própria.
Suplemento alimentar Quantitativo Percentual Leite Neocate 324 24,51 Leite NAN (1, 2, 3, Soy, sem lactose) 174 13,16 Leite Aptamil 99 7,49 Pregomin Pepti 93 7,03 Leite Ninho 63 4,77 Nutren (Prebio, Active, Senior) 63 4,77 Nutridrink 53 4 Ensure 45 3,4 Modulen 45 3,4 Daily Care 31 2,34 Soy Milk 28 2,12 Leite Fortini 26 1,96 Leite de soja Isomil 18 1,36 Thicken Up 18 1,36 Leite Isosource 17 1,28 Pediasure 17 1,28 Fiber Mais 15 1,13 (continua)

Tabela 4 – Distribuição dos processos segundo suplementos alimentares solicitados no processo judicial. Área de abrangência da Câmara de Resolução de Litígios de Saúde. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro – 2017

De maneira geral, os estudos sobre a judicialização da saúde enfatizam mais fortemente os efeitos negativos desse tipo de questão na gestão e governabilidade das políticas e ações de saúde. Uma das principais justificativas é que essa forma de interferência no SUS pode aprofundar as iniquidades no acesso à saúde, privilegiando determinados segmentos e indivíduos com maior capacidade de exigência em prejuízo de outros, na medida que necessidades individuais ou de grupos determinados seriam atendidas em prejuízo às necessidades de outros demandantes13.

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Suplemento alimentar Quantitativo Percentual Nestogeno 15 1,13 Glucerna 10 0,75 Pregestimil Premium 10 0,75 Calogen 9 0,68 Fresubin Hp Energy 8 0,6 Leite Com Formula A Base De Aminoácidos 8 0,6 Leite Pku 8 0,6 Peptamen Junior 8 0,6 Leite Alfarré 7 0,53 Probiatop 7 0,53 Ketocal 6 0,45 L-Carnitina 6 0,45 Leite Neoforte 6 0,45 Maltodextrina 6 0,45 Milnutri Soja 6 0,45 Mucilon 6 0,45 Souvenaid 6 0,45 Suporte para gastrostomia 6 0,45 Cubitan 5 0,38 Whey Protein 5 0,38 Triple Ômega 3-6-9 4 0,32 Nutilis 4 0,32 Óleo De Linhaça 4 0,32 Sustagen Kids 4 0,32 Disfor 3 0,24 Leite Prodiape 3 0,24 Albumina 2 0,15 Castanha da Índia 2 0,15 Farinha Láctea com aveia 2 0,15 Leite Althera 2 0,15 Leite Enfragrow 2 0,15 Leite Infatrini 2 0,15 Leite Puramino 2 0,15 Óleo de peixe 2 0,15 Stimulance 2 0,15 Leite Parmalat 1 0,08 Nestlé Health Science 1 0,08 Neston 1 0,08 Óleo de coco 1 0,08 Osmolite Plus 1 0,08 Total 1.322 100
própria
Fonte:
Elaboração
(conclusão)

A judicialização crescente identificada neste estudo é reiterada em outros estudos e ratifica a necessidade de se pensar sobre essa questão, no que tange tanto à demasia de processos quanto à legitimidade desses, no que se refere à sobreposição de demandas individuais, quando ainda se depara com dificuldades em suprir necessidades de saúde coletivas, que aqui podem estar conectadas ao complexo conceito do mínimo existencial12,20-22. São apontadas, com maior ênfase, as deficiências e insuficiências do sistema judiciário brasileiro e do sistema de saúde para se contraporem de forma satisfatória às novas e crescentes demandas de saúde, numa conjuntura normativa que confere compromissos legais amplos ao Estado brasileiro23,24

A analogia instituída entre acesso à justiça e à saúde pode ter um efeito benéfico na implicação do Estado em aprimorar processos apropriados de incorporação, compra e distribuição de suplementos alimentares pela rede pública. Todavia, as consequências negativas dessa performance podem estar relacionadas à alta e persistente demanda judicial, combinada com respostas automatizadas e precárias, sem uma necessária análise crítica da demanda pelos atores envolvidos.

Segundo Wang et al.1 e Silva et al.25, a combinação desses elementos pode proporcionar uma disfunção nos sistemas, com o risco de se desenvolver o acesso judiciário como meio fundamental para se afiançar o acesso a suplementos alimentares. Nesse sentido, pode ocasionar danos expressivos à efetividade, seja de ordem individual ou coletiva, do direito à saúde, com violação de princípios éticos e legais importantes, tanto quanto do acesso equitativo e da integridade física e saúde do demandante.

Nesse sentido, a equidade no acesso à saúde e a discussão sobre os efeitos da judicialização da saúde são conexas às questões de alocação de recursos públicos para pesquisa e assistência. Destaca-se, nesse campo, a importância do estabelecimento de um padrão de assistência e/ou critérios para a incorporação e acesso aos procedimentos e insumos na assistência pública à saúde de forma mais efetiva, que conduzam à equidade e integralidade no acesso aos suplementos alimentares.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O crescimento das ações judiciais nos últimos anos tem causado grande impacto à gestão do SUS, podendo resultar em agravamento do atendimento hospitalar. O cenário mais desejável abrange fazer com que o que está sendo judicializado possa alterar o planejamento no âmbito do SUS, e assim, atender as demandas. Ao mesmo tempo, passa a ser inevitável considerar a importância da judicialização como sinalizadora das falhas nas políticas públicas, gerando reflexão para a elaboração de novas políticas, de forma a reduzir a distância entre o SUS estabelecido no arcabouço normativo e o SUS que executa as ações e serviços de saúde.

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Assim sendo, o acesso à justiça aqui é considerado de forma mais ampla, tal qual o acesso aos aditamentos jurídicos em geral no nível legislativo e administrativo, além do acesso ao judiciário. Com efeito, há dificuldades de se constituir um consenso entre as partes envolvidas e/ou afetadas pelas decisões judiciais nessa esfera, porque implica decidir sobre o que é justo se reivindicar e o que se deve proteger, a partir da abstração do que é justo e do pluralismo moral existente nas sociedades democráticas. Por outro lado, também é difícil estabelecer a coerência entre o direito vivido – que aponta violações sistemáticas advindas das densas desigualdades pessoais e sociais, combinadas com as deficiências dos sistemas públicos de saúde, que espelham a incapacidade do Estado de atender às necessidades dos cidadãos –e o direito vigente, que reconhece o direito ao acesso à justiça, a judicialização da saúde e a efetividade do direito à saúde de forma universal, integral e gratuita, como uma lei justa.

Mas há de se atentar que os insumos judicializados são, em sua grande maioria, supostamente acessíveis em termos financeiros, o que também nos leva a questionar se todos e toda solicitação judicial, de fato, deveria ser contemplada. Entretanto, a ampliação do poder judicial, com a consequente judicialização da política, não pode ser analisada de maneira pontual e isolada, mas sim como um fenômeno situado historicamente no processo de construção democrática da sociedade brasileira, e potencialmente favorável à ampliação dos mecanismos de participação e garantia de direitos.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Aldo Pacheco Ferreira, Juliana Nobre dos Santos Silva e Marcos Besserman Vianna.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Aldo Pacheco Ferreira, Juliana Nobre dos Santos Silva, Dorival Fagundes Cotrim Junior e Marcos Besserman Vianna.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Eduardo Dias Wermelinger e Aldo Pacheco Ferreira.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Aldo Pacheco Ferreira.

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Recebido: 10.3.2018. Aprovado: 14.4.2021.

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ARTIGO DE REVISÃO

FRAGILIDADES NA ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DAS EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA DESCRITAS NA LITERATURA

Caren Fernanda Muraroa

https://orcid.org/0000-0002-9121-6047

Andrei Bonamigob

http://orcid.org/0000-0002-6670-9755

Themis Goretti Moreira Leal de Carvalhoc

https://orcid.org/0000-0003-2440-4301

Helio Aisenberg Ferenhofd

https://orcid.org/0000-0001-5167-0838

Marcelo Gitirana Gomes Ferreirae

https://orcid.org/0000-0003-1912-9982

Fernando Antonio Forcellinif

https://orcid.org/0000-0003-2851-6028

Resumo

Este artigo tem como objetivo identificar as fragilidades ocorridas no serviço realizado pelos profissionais integrantes das equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF)em diferentes localidades do mundo. Trata-se de uma revisão sistemática de literatura baseada no método Systematic Search Flow , pelo qual foram considerados os estudos de acordo

a Pesquisadora. Consultora de Inteligência Organizacional. Doutora em Engenharia de Produção. Mestre em Saúde Coletiva na área de Saúde Pública. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. E-mail: carenfernanda2009@hotmail.com b Professor Pesquisador. Doutor em Engenharia de Produção. Docente do departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense. Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: andreibonamigo@gmail.com c Professora Pesquisadora. Mestre em Educação. Professora adjunta do Centro da Saúde da Universidade de Cruz Alta. Cruz Alta, Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: carvalhothemis@gmail.com

d Professor. Doutor em Engenharia de Produção Pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina. Docente no Centro Tecnológico da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. E-mail: dm@gotroot.com.br

e Professor Pesquisador. Doutor no Departamento do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. E-mails: marcelo.gitirana@gmail.com f Professor Pesquisador. Doutor no Departamento do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. E-mails: forcellini@gmail.com Endereço para correspondência: Rua Martinho de Haro, n. 300, casa 15, Condomínio Costa Norte, Ingleses do Rio Vermelho. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. CEP: 88058-540. E-mail: carenfernanda2009@hotmail.com

71 v. 43, n. 4, p. 71-86 out./dez. 2019 71 DOI:
n4.a2925
Revista Baiana de Saúde Pública
10.22278/2318-2660.2019.v43

com o objetivo, independentemente da localidade e do ano de realização. Para verificar a recorrência das fragilidades encontradas, foi utilizado o método de análise de conteúdo. Obteve-se um portfólio bibliográfico de 24 artigos. A partir da análise de conteúdo de cada um deles, foram extraídas as unidades de contexto e categorizadas em cinco unidades de análise, para representar as fragilidades. Independentemente da localidade, ocorreram as mesmas fragilidades, remetendo a uma interpretação de que o caminho para que as equipes de ESF consigam alcançar uma atuação mais efetiva e eficaz, no que se refere ao impacto na redução das taxas de internações evitáveis, poderá ser bastante trabalhoso. Porém, estudos como este podem ajudar a compreender tal cenário de forma mais clara e detalhada, e talvez sejam um atalho na busca por melhorias e avanços na atuação dessas equipes de saúde.

Palavras-chave: Atenção primária à saúde. Estratégia Saúde da Família. Serviço de saúde pública.

WEAKNESSES IN THE PERFORMANCE OF THE PROFESSIONALS OF THE FAMILY HEALTH TEAMS DESCRIBED IN THE LITERATURE

Abstract

This article aims to identify the weaknesses that occurred in the service performed by professionals of the Family Health Strategy teams in different locations around the world. This is a systematic literature review that was based on the Systematic Search Flow method, studies were considered according to the objective regardless of location and year. To verify the recurrence of the weaknesses, the content analysis method was used. A bibliographic portfolio of 24 articles was obtained. From the content analysis of each study, the context units were extracted, categorized into five units of analysis, to represent the weaknesses. Regardless of the location, the same weaknesses occurred, leading us to an interpretation that the way for Family Health Strategy teams to achieve a more effective and efficient performance regarding the influence on reducing avoidable hospitalization rates, can be quite laborious. However, studies like this can help to understand this scenario in a clearer and more detailed way, perhaps a shortcut in the search for improvements in this and advances in the performance of these health teams.

Keywords: Primary health care. Family health strategy. Public health service.

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FRAGILIDADES EN EL DESEMPEÑO DE LOS PROFESIONALES DE LOS EQUIPOS DE SALUD FAMILIAR DESCRITOS EN LA LITERATURA

Resumen

Este artículo tuvo como objetivo identificar las debilidades que ocurrieron en el servicio realizado por profesionales que forman parte de los equipos de la Estrategia de Salud Familiar (ESF) en diferentes lugares del mundo. Esta es una revisión sistemática de la literatura basada en el método Systematic Search Flow, en que los estudios se consideraron de acuerdo con el objetivo, independientemente de la ubicación y el año. Para verificar la recurrencia de las debilidades encontradas, se utilizó el método de análisis de contenido. Se obtuvo una cartera bibliográfica de 24 artículos. Del análisis de contenido de cada estudio, se extrajeron las unidades de contexto, clasificadas en cinco unidades de análisis, para representar las debilidades. Independientemente de la ubicación, ocurrieron las mismas debilidades, lo que nos lleva a una interpretación de que puede ser bastante laboriosa la forma en que los equipos de la ESF pueden lograr un desempeño más efectivo y eficiente con respecto al impacto en la reducción de las tasas de hospitalización evitables. Esto puede ayudar a comprender este escenario de una manera más clara y detallada, tal vez un atajo en la búsqueda de mejoras y avances en el desempeño de estos equipos de salud.

Palabras clave: Atención primaria de salud. Estrategia salud de la familia. Servicio de salud pública.

INTRODUÇÃO

O Sistema Único de Saúde (SUS), criado pela Constituição Federal brasileira de 1988, se pauta nos seguintes princípios: universalidade do acesso integralidade do cuidado e equidade, baseando-se na ideia de que todo cidadão é igual perante o SUS1. Para atender essa população em massa, o SUS criou alternativas para maximizar o escoamento das demandas, por meio da Atenção Primária à Saúde (APS). A APS se tornou um elemento central em sistemas de saúde de países a partir da Conferência de Alma-Ata, de 1978, ratificada no mesmo ano pela Conferência Mundial de Saúde em torno da noção de “saúde para todos”. Nesse contexto, a APS é definida como um conjunto de intervenções de saúde em âmbito individual e coletivo, envolvendo promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação2.

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A fim de reduzir as altas taxas hospitalares no que se refere às doenças evitáveis, o Ministério da Saúde (MS) brasileiro, no ano de 1994, adotou para o setor da APS a implantação de equipes multiprofissionais, denominada Estratégia Saúde da Família (ESF). Formadas por profissionais médicos, de enfermagem e Agentes Comunitários de Saúde (ACS), tem como principal diretriz a descentralização do foco na doença, prevenindo e promovendo a saúde das famílias sob uma área territorial demarcada3.

Essa estratégia, adotada pelo Brasil e por outros países, como Inglaterra, Canadá, Austrália, Cuba e todo o oeste europeu, já é reconhecida no mundo há mais de três décadas como capaz de estruturar redes integradas e efetivas no setor da APS4,5.

Entretanto, as altas taxas de hospitalização das doenças evitáveis podem representar um sinal de alerta, no que se refere aos serviços realizados pelas equipes de ESF. A não efetividade dessas equipes compromete toda a resolutividade tanto do setor da APS, como do sistema de saúde em sua totalidade6. Nesse sentido, deve se considerar que, para a consolidação desse modelo estratégico, é necessário que ele seja sustentado por um processo que viabilize aos profissionais envolvidos a oportunidade de colocar em prática, na íntegra, as diretrizes estabelecidas. Só assim será possível adquirir o compromisso de produzir resultados positivos e crescentes, principalmente no que se refere à redução das taxas de internações hospitalares em relação a doenças consideradas evitáveis7

Nessa mesma linha de interpretação, outros autores ressaltam que quando a APS é efetiva e eficaz, consegue minimizar as altas taxas de internações de doenças evitáveis8,9 Relembrando que as equipes de ESF foram concebidas para o setor de APS, portanto, entende-se que para alcançar a redução efetiva das taxas de internação por doenças evitáveis, é primordial que o planejamento da atuação das equipes de saúde busque por melhoria constantemente. Um dos caminhos para tais melhorias consiste em entender e visualizar as fragilidades da atuação dos membros dessas equipes.

No contexto descrito acima e entendendo que, para o fortalecimento das equipes de saúde, são necessárias pesquisas que identifiquem possíveis caminhos para a melhoria, o presente estudo tem como objetivo identificar na literatura prováveis fragilidades no serviço realizado pelos profissionais integrantes dessas equipes em diferentes localidades do mundo.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Os procedimentos metodológicos compreenderam duas etapas. Na primeira, foi realizada uma Revisão Bibliográfica Sistemática (RBS), que seguiu o método Systematic Search Flow (SSF), proposto por Ferenhof e Fernandes10 (Figura 1).

74

Foram consultadas as bases de dados Scopus e ISI Web of Science para identificar as fragilidades nos serviços das equipes de ESF em sistemas de saúde pública. Nessa etapa, foram adotados como critério de inclusão: artigos de periódicos nacionais e internacionais, publicados até julho de 2016. Além disso, utilizou-se como critério a disponibilidade na íntegra dos artigos por meio do acesso da Coordenação de Aperfeiçoamento de Ensino Superior (Capes), do Google, Google Scholar, Microsoft Academic Search ou enviados pelos autores após solicitação via e-mail. É relevante considerar que a ESF foi implantada no Brasil a partir do ano de 1994 e levou quase uma década para se expandir no território nacional e no exterior4. Para as buscas nas bases de dados, foi utilizada a seguinte string: (“Public Health” OR “new development*” OR “weaknesses in Service*”) AND (“family health” OR “primary care”).

Como resultado, foram encontrados 343 artigos, sendo 156 advindos da base Scopus e 187 da Web of Science. Foi encontrado um total de 34 artigos duplicados, que em seguida foram excluídos.

Após, iniciou-se a etapa de análise dos artigos. Foi realizado um segundo filtro dos artigos, que considerou como critério de inclusão e/ou exclusão os estudos selecionados que continham título, resumo ou a presença de palavras-chave associados a termos relativos dentro do corpo do texto. Ainda na mesma etapa de análise, foram excluídos 277 trabalhos, resultando em 32 artigos para serem lidos na íntegra. Dos 32 artigos, 8 trabalhos não atenderam ao critério de disponibilidade na íntegra, o que resultou em um portfólio de 24 estudos para

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Revista Baiana de Saúde Pública Figura 1 – Representação do método Systematic Search Flow. Florianópolis, Santa Catarina – 2016 Fonte: Ferenhof e Fernandes, 2016.

leitura completa. Todos estavam alinhados ao tema, sendo incluídos na síntese final. A Figura 2 apresenta as etapas da RBS.

Figura 2 – Etapas utilizadas para a realização da RBS. Florianópolis, Santa Catarina – 2017

Registros encontrados nas bases de dados (n=343)

Entradas de registros duplicadas (n=34)

Registros excluídos (n=277)

Registros resultados (Portfólio) (n=24)

Fonte: Elaboração própria.

Registros não disponíveis na íntegra (n=8)

Registros selecionados para estudo (n=32)

Em seguida, foi realizada a análise de conteúdo dos 24 artigos encontrados, a partir da inferência com relação às fragilidades do serviço prestado pelos profissionais integrantes das equipes de ESF em diferentes localidades. Essa inferência foi realizada sob a ótica das diretrizes propostas pelo MS, visto que o modelo assistencial adotado pelo Brasil é também utilizado em outros países. Para tal, foi seguida a metodologia de análise de conteúdo sugerida por Bardin11, que se divide em três etapas: (1) pré-análise; (2) exploração do material ou codificação; e (3) Tratamento dos resultados, inferência e interpretação, detalhadas na sequência.

RESULTADOS

A Tabela 1 apresenta o portfólio dos artigos encontrados na RBS.

Tabela 1 – Resultados da revisão bibliográfica sistemática. Florianópolis, Santa

Catarina – 2017

Código Título do trabalho

1 Avaliação dos usuários crianças e adultos quanto ao grau de orientação para Atenção Primária à Saúde na cidade do Rio de Janeiro, Brasil

2 Assessment of the technology of care relations in the health services: perception of the elderly included in the family health strategy in Bambuí, Brazil

3 Screening for depressive symptoms in older adults in the Family Health Strategy

4 O cuidar da enfermeira na saúde da família: fragilidades e potencialidades no Sistema Único de Saúde

5 Fortalezas e fragilidades do atendimento nas unidades básicas de saúde tradicionais e da estratégia de saúde da família pela ótica dos usuários

(continua)

Ano Revista Autor

2016 Ciência & Saúde Coletiva Harzheim et al.12

2014 Ciência & Saúde Coletiva Santos et al.13

2014 Revista Saúde Pública Nogueira et al.14

2014 Revista da Escola de Enfermagem da USP Silva e Assis15

2013 Texto & Contexto Enfermagem Marin et al.16

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Revista Baiana de Saúde Pública

Tabela 1 – Resultados da revisão bibliográfica sistemática. Florianópolis, Santa Catarina – 2017

Código Título do trabalho

6 Construindo o fazer gerontológico pelas enfermeiras das Unidades de Estratégia Saúde da Família

7 The process of end-of-life care delivery to the families of elderly patients according to the Family Health Strategy

8 Early Evaluations of the Medical Home: Building on a Promising Start

9 Clinical preventive services for older adults: The interface between personal health care and public health services

10 Evaluation of innovative strategies in the organization of Primary Health Care

11 Disruptive innovation: the future of healthcare?

12 Atenção primária à saúde e a construção de sentidos para a saúde bucal: leitura construcionista social sobre discursos de idosos

13 Effects of Individual and Neighborhood Characteristics on the Timeliness of Provider Designation for Early Intervention Services in New York City

14 The role of the Family Health Program in the organization of primary care in municipal health systems

15 SANDS: a service-oriented architecture for clinical decision support in a National Health Information Network

16 Avaliação do acesso às ações de controle da tuberculose no contexto das equipes de saúde da família de Bayeux-PB

17 Family Medicine Education in Brazil: Challenges, Opportunities, and Innovations

18 Caring for Older Patients: Current Attitudes and Future Plans of Family Medicine Residents

19 Brief communication: National quality-of-care standards in home-based primary care

20 A five state dissemination of a community based disability prevention program for older adults

21 Involving users in service planning: a focus group approach

22

23

24

A multidisciplinary program for delivering primary care to the underserved urban homebound: looking back, moving forward

The feasibility and acceptability of a specialist health and social care team for the promotion of health and independence in ‘at risk’ older adults

Special Articles: Geriatrics Training in Family Practice

Residencies Geriatric Medicine Training for Family Practice

Residents in the 21st Century: A Report From the Residency Assistance Program/Hartford Geriatrics Initiative

Fonte: Elaboração própria.

da Escola de Enfermagem da USP Polaro et al.17

Latino-Americana de Enfermagem Silva et al.18

Journal of Managed Care Peikes et al.19

ral Pediatrics

the American Geriatrics Society Smith et al.32

A partir da análise de conteúdo dos trabalhos, foram definidas a posteriori, cinco unidades de análise. Cada uma delas, corresponde a fragilidades identificadas pelas unidades de contexto (Tabela 2).

77 v. 43, n. 4, p. 71-86 out./dez. 2019
Ano
Revista Autor
2013 Revista
2013 Revista
2012 The American
2012 American Journal of
Public Health Ogden et al.20
2012 Revista
de Saúde Pública Onocko et al.21
2011 Telemedicine
Journal and e-health Yellowlees et al.22
2011 Ciência
& Saude Coletiva Bulgarelli et al.23
2009 Journal of
mental
Develop-
and Behavio-
Kim et al.5
2009 Cadernos
de Saúde Pública Medina e Hartz24
2009 Journal of Biomedical Informatics Wright
e Sittig25
2009 Revista Brasileira de
Marcolino et al.26
Epidemiologia
2008 Academic Medicine Blasco et
al.27
2008 Family Medicine Helton
e Pathman28
2007 Annals of Internal Medicine Smith et al.29
2006 Clinical Interventions
Phelan, et al.30
in Aging
2006 European Journal of
Oncology Nursing Kelly et al.31
2006 Journal
of
2005 Health & Social
in
Community Drennam
Care
the
et al.33
2003 Family
Medicine Warshaw et al.34
(conclusão)

Tabela 2 – Descrição das fragilidades recorrentes encontradas na literatura.

Florianópolis, Santa Catarina – 2017

Código Título do trabalho

1 Avaliação dos usuários crianças e adultos quanto ao grau de orientação para Atenção Primária à Saúde na cidade do Rio de Janeiro, Brasil

2 Assessment of the technology of care relations in the health services: perception of the elderly included in the family health strategy in Bambuí, Brazil

3 Screening for depressive symptoms in older adults in the Family Health Strategy

4 O cuidar da enfermeira na saúde da família: fragilidades e potencialidades no Sistema Único de Saúde

5 Fortalezas e fragilidades do atendimento nas unidades básicas de saúde tradicionais e da estratégia de saúde da família pela ótica dos usuários

6 Construindo o fazer gerontológico pelas enfermeiras das Unidades de Estratégia Saúde da Família

7 The process of end-of-life care delivery to the families of elderly patients according to the Family Health Strategy

8 Early Evaluations of the Medical Home: Building on a Promising Start

9 Clinical preventive services for older adults: The interface between personal health care and public health services

Ano Revista Autor

2016 Ciência & Saúde Coletiva Harzheim et al.12

2014 Ciência & Saúde Coletiva Santos et al.13

2014 Revista Saúde Pública Nogueira et al.14

2014 Revista da Escola de Enfermagem da USP Silva e Assis15

2013 Texto & Contexto Enfermagem Marin et al.16

2013 Revista da Escola de Enfermagem da USP Polaro et al.17

2013 Revista LatinoAmericana de Enfermagem Silva et al.18

2012

2012

10 Evaluation of innovative strategies in the organization of Primary Health Care 2012

11 Disruptive innovation: the future of healthcare? 2011

12 Atenção primária à saúde

15 SANDS: a service-oriented architecture for clinical decision support in a National Health Information Network

16 Avaliação do acesso às ações de controle da tuberculose no contexto das equipes de saúde da família de Bayeux-PB

17

Medicine Education in Brazil: Challenges, Opportunities, and Innovations

18 Caring for Older Patients: Current Attitudes and Future Plans of Family Medicine Residents

American Journal of Managed Care Peikes et al.19

Journal of Public Health Ogden et al.20

2008 Academic Medicine Blasco et al.27

2008 Family Medicine Helton e Pathman28

19 Brief communication: National quality-of-care standards in home-based primary care 2007

20 A five state dissemination of a community based disability prevention program for older adults

21 Involving users in service planning: a focus group approach 2006

22

23

24

A multidisciplinary program for delivering primary care to the underserved urban homebound: looking back, moving forward 2006

The feasibility and acceptability of a specialist health and social care team for the promotion of health and independence in ‘at risk’ older adults 2005

Special Articles: Geriatrics Training in Family Practice

Residencies Geriatric Medicine Training for Family Practice

Residents in the 21st Century: A Report From the Residency Assistance Program/Hartford Geriatrics Initiative

Fonte: Elaboração própria.

2003 Family Medicine Warshaw et al.34

78
The
American
Revista
Pública
de Saúde
Onocko et al.21
Telemedicine Journal
Yellowlees
and e-health
et al.22
e a construção de sentidos para a saúde bucal: leitura construcionista social sobre discursos de idosos 2011 Ciência & Saude Coletiva Bulgarelli et al.23 13 Effects of Individual and Neighborhood Characteristics on the Timeliness of Provider Designation for Early Intervention Services in New York City 2009 Journal of Developmental and Behavioral Pediatrics Kim et al.5 14 The role of the Family Health Program in the organization of primary care in municipal health systems 2009 Cadernos de Saúde
Medina
Pública
e Hartz24
Journal of
2009
Biomedical Informatics Wright e Sittig25
2009 Revista
Marcolino et al.26
Brasileira de Epidemiologia
Family
Annals of Internal Medicine Smith et al.29
Clinical
Phelan,
2006
Interventions in Aging
et al.30
European Journal
of Oncology Nursing Kelly et al.31
Journal
of the American Geriatrics Society Smith et al.32
Health
& Social Care in the Community Drennam et al.33

DISCUSSÃO

As equipes de ESF trazem, em sua dinâmica de atuação, um modelo inovador que surgiu para remodelar os serviços do setor de APS, transformando assim a realidade do acesso aos serviços1,3. Destaca-se que a política pública das ESF foi implantada para substituir um sistema piramidal hierárquico por um sistema de saúde no qual haja integração horizontal de todos os serviços, oportunizando um grau de institucionalização que pode ocupar espaços políticos, educacionais, de representação populacional e do próprio serviço de saúde1,3.

Em suas diretrizes, a ESF busca pelo acolhimento e retrata como resultado as relações humanas no processo de atendimento3. No encontro entre profissionais e usuário, acontece uma negociação, produzindo um vínculo que visa a identificação das necessidades do usuário, com o objetivo de estimular sua autonomia quanto à saúde3. Essa estratégia assume o papel de articuladora entre usuário e profissional, criando espaços conversacionais para a consolidação de uma corresponsabilidade e para a construção de novos conhecimentos, que atuem de maneira direta, em um cuidado longitudinal3.

É nesse contexto que destacamos a relevância dos resultados apresentados no presente estudo. Entre os anos de 2003 e 2016, identificamos que as fragilidades foram recorrentes entre si, independentemente da localidade. Tal dado nos leva a compreender o quanto se faz necessário diagnosticar de forma minuciosa os processos de serviços que envolvem todos os membros das equipes de ESF. Isso porque apesar das melhorias adquiridas ao longo da trajetória, desde que foi iniciada, no ano de 1994, as fragilidades identificadas nesta busca literária apontam possíveis fatores que estariam interferindo negativamente no desempenho e efetividade da promoção e prevenção da saúde, pela ESF, de uma população adscrita, como estabelecem as diretrizes do MS1,3.

A discussão dos resultados foi elaborada como uma crítica construtiva, que visa cooperar com o avanço do desempenho efetivo e contínuo da atuação em campo das equipes da ESF. É nessa perspectiva que são apresentadas as fragilidades recorrentes identificadas nos 24 artigos analisados nesta revisão sistemática.

AUSÊNCIA DE CAPACITAÇÃO DOS MEMBROS DAS EQUIPES DE ESF (MÉDICO, ACS E ENFERMEIROS)

Com base em sete estudos, destacam-se as fragilidades que estariam relacionadas à ausência de capacitação específica e permanente aos profissionais membros da equipe de ESF5,12,17,18,27,28,34. Os estudos apontam para a dificuldade desses profissionais em lidar com situações rotineiras que os níveis dos cuidados primários demandam. Entende-se que quando

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Revista Baiana de Saúde Pública

os profissionais não têm capacitação suficiente para realizar o serviço rotineiro, o desempenho de todas as tarefas que envolvem os processos dessas equipes é prejudicado. Nesse sentido, observa-se que no Brasil e nas demais nações latino-americanas existe uma incompatibilidade entre as estratégias de saúde promovidas pelo governo e os tipos de médicos sendo formados pela educação superior do sistema. As universidades ainda não preparam os médicos para atuarem com a realidade das famílias da comunidade e as exigências a nível de cuidados primários5,12,34, sendo esses fatores desfavoráveis à atuação dos membros das equipes da ESF27. Outros estudos apontam que os enfermeiros e ACS apresentam dificuldades em realizar tarefas diárias, principalmente compreender as novas estratégias adotadas pelo sistema de saúde16,17,28,34. No Brasil, é disponibilizada aos profissionais a formação continuada aos médico da família, bem como treinamentos direcionados tanto aos enfermeiros quando aos ACS, que se destacam como importantes ferramentas frente às fragilidades destacadas3. Com vistas a buscar por uma melhor capacitação das equipe da ESF, o MS define como responsabilidade comum a todas as eferas do governo (federal, estadual e municipal) desenvolver mecanismos técnicos e estratégias organizacionais de qualificação da força de trabalho para a gestão e atenção à saúde, e valorizar os profissionais de saúde, estimulando e viabilizando a formação e a educação permanente dos integrantes das equipes35.

AUSÊNCIA DE INOVAÇÃO NOS SERVIÇOS PRESTADOS PELAS EQUIPES DE ESF

Sete estudos apontam para a ausência de operacionalização e inovação dos processos de serviço dos membros das equipes de ESF. Nesse contexto, foi observada fragilidade nas estratégias em detectar precocemente as patologias nas áreas de atuação13-15,19,20,25,33

Também é apontada a descentralização das decisões, comprometendo assim as soluções dos problemas e dificuldades rotineiras dos membros das equipes.

Na Inglaterra, o envelhecimento da população, os custos crescentes das internações e os cuidados de saúde em longo prazo têm solicitado uma nova agenda política. Tal agenda busca inovação nos modelos de gestão e na qualificação dos profissionais, para que orientem e convençam as pessoas a cada vez mais buscarem qualidade de vida de forma ativa19. Foi observado que os serviços preventivos e os cuidados antecipados ainda eram pequenos e inconclusivos.

Corroborando esse cenário, estudos realizados no Brasil destacam ainda que o atendimento primário realizado nas visitas em domicílio, se fosse efetivo e eficaz, poderia contribuir para expandir os benefícios e reduzir custos, tanto aos sistemas de saúde pública quanto às famílias das comunidades13-15. Outros autores apontam como alternativa de intervenção que poderia repercutir positivamente a busca de informações diretamente em

80

domicílio, em que um sistema tecnológico poderia produzir melhorias específicas e individuais, de acordo com a necessidade de cada família, área ou município20. Tais estudos apontam também que, independentemente do contexto municipal, é evidente a necessidade de inovações organizacionais intimamente relacionadas à ESF13-15,20. De acordo com as fragilidades destacadas acima, seria de grande valia implementar no serviço realizado pelas equipes de saúde um realinhamento entre a necessidade da área de responsabilidade e a utilização de novas tecnologias, para dar suporte e agilidade ao processo de serviço.

AUSÊNCIA DE QUALIDADE NO SERVIÇO PRESTADOS PELOS ACS

Nove estudos apontam fragilidades em relação aos dados computados nos registros eletrônicos pelos ACS12,20,22,23,26,29,31-33. Autores ressaltam que quando os registros eletrônicos não são computados corretamente e tampouco atualizados, decorre a deficiência de precisão do diagnóstico das famílias residentes nas áreas adscritas por cada equipe de ESF. Assim, compromete-se também a efetividade e eficácia das ações, estratégias e programas de prevenção para a realidade de cada área22,29,32, impedindo avanços e direcionamentos que oportunizem melhores e maiores benefícios às equipes de saúde.

No Brasil, autores ressaltam que as insuficientes visitas domiciliares realizadas pelos médicos, enfermeiros e ACS refletem na qualidade da vigilância e prevenção da saúde das famílias da comunidade26. Outros estudos também apontam que a falta de planejamento das ações dos ACS gera excesso de retrabalho diário e desalinhamento das informações entre todos os membros da equipe12,20. Por fim, de acordo com um estudo realizado em Mount Sinai (Nova Iorque), os serviços realizados pela equipe de saúde em domicílio notificaram ser um suporte importante para desenvolver soluções inovadoras de prevenção, bem como a redução de custos com a saúde29.

Outros estudos apontam que tanto no Brasil quanto em outros países, o fato de os ACS não conseguirem cobrir 100% de suas microáreas de responsabilidade gera uma lacuna de informações importantes não registradas, comprometendo a efetividade no planejamento das ações da área de responsabilidade da equipe de ESF23,31,33. Tais estudos também ressaltam que o baixo número de visitas domiciliares realizadas por esses profissionais compromete a qualidade da vigilância e da prevenção territorial necessária.

É relevante destacar que todos os estudos citados nesta unidade de análise, independentemente da localidade, apontaram para a importância da atuação dos ACS na viabilização das atividades territoriais propostas às equipes de ESF. Isso porque o serviço realizado pelos agentes de saúde implica não somente em ser uma forma de acolhimento para

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Revista Baiana de Saúde Pública

as famílias, mas sim uma estratégia fundamental para rastrear e mapear as informações de uma área demarcada, capazes de nortear os planejamentos das gerências das unidades de saúde. Assim, oportuniza-se à população mais acesso aos serviços ofertados por essas equipes, que também fortalecem seu vínculo com os usuários.

AUSÊNCIA DE AVALIAÇÃO DOS SERVIÇOS PRESTADOS PELAS EQUIPES DE ESF

Três estudos apontam fragilidades no que se refere à avaliação dos serviços ofertados pelas equipes da ESF16,17,30. Ressaltam a necessidade de otimizar os instrumentos de avaliação, para que seja feita de forma prática, rápida e adaptável à realidade de cada perfil populacional, para se obter mais eficiência na prestação de serviços. É necessário que os instrumentos possibilitem avaliar os fluxos e processos de serviços que entrelaçam as equipes de ESF, pois é observado que algumas necessidade dos usuários se encontram desalinhadas ao que é ofertado pelas equipes. Dessa forma, demonstra-se o quanto é importante diagnosticar os processos que entrelaçam toda a equipe de ESF, para que sejam feitos ajustes nas tomadas de decisões, no que se refere a traçar as estratégias de apoio às necessidades da comunidade.

AUSÊNCIA DE INTEGRAÇÃO DOS ACS COM OS OUTROS MEMBROS DA EQUIPE

Dois estudos apontam que a ausência de integração entre os membros da equipe é um dos fatores que comprometem diretamente a efetividade e eficácia da atuação15,21, e o ACS é um dos membros que apresenta maior isolamento dos demais15. Ambos os estudos corroboram ao ressaltar que os ACS são imprescindíveis para viabilizar o trabalho territorial proposto pela ESF, sendo que o isolamento desse profissional dentro da equipe repercuti negativamente na qualidade do serviço diário realizado por todos15,21

Os autores lembram ainda que é na prática diária que esses profissionais compreendem e adquirem um conhecimento peculiar sobre toda a população assistida15,21 Apontam também a necessidade de mecanismos de integração do ACS com sua equipe de trabalho, para assim equilibrar a tendência de isolamento desse profissional. Outro fator destacado por colaborar para esse isolamento é a grande rotatividade dos médicos, que trocam seguidamente de posto de atendimento, afetando tanto o envolvimento com os membros da equipe quanto a continuidade dos tratamentos dos usuários.

É de grande valia para todos os envolvidos entender a importância do trabalho dos ACS, não somente para as equipes de ESF ou para a população, já que é esse profissional que despende enorme responsabilidade em recolher informações minuciosas, que somente podem ser registradas nas visitas domiciliares. São essas informações que podem gerar impacto

82

decisivo ao traçar e planejar as estratégias de atuações de toda a equipe. Nessa perspectiva, torna-se primordial desenvolver alguma atividade diária, que viabilize um maior engajamento dos membros da equipe com esse profissional, para que o isolamento seja rompido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo objetivou apontar as prováveis fragilidades do serviço realizado pelos membros das equipes da ESF em diferentes localidades no mundo. Para isso, foram identificadas cinco fragilidades recorrentes entre os 24 artigos analisados, sendo elas:

(1) Ausência de capacitação dos membros da equipe de ESF; (2) Falta de inovação dos serviços prestados pelas equipes de ESF; (3) Ausência de qualidade no serviço dos ACS; (4) Ausência de avaliação dos serviços prestados pelas equipes de ESF; e (5) Ausência de integração dos ACS com outros membros da equipe.

Entende-se que as fragilidades apontadas aqui podem comprometer o planejamento e a execução das estratégias adotadas pelas esquipes da ESF, o que por sua vez impacta nas taxas de internações consideradas evitáveis pelo MS. É muito provável que as fragilidades destacadas neste estudo estejam interferindo e dificultando a atuação diária das equipes da ESF para colocar em prática, e na íntegra, as diretrizes estabelecidas pelos órgãos.

Diante dos resultados desta revisão de literatura, conclui-se que independentemente da localidade, as fragilidades encontradas são as mesmas. A partir disso, infere-se que o caminho para as equipes de ESF alcançarem uma atuação mais efetiva e eficaz, no que se refere ao impacto na redução das taxas de internações evitáveis, poderá ser bastante trabalhoso. Porém, estudos como este podem contribuir para a compreensão do cenário de forma mais clara, representando, talvez, um atalho na busca por melhorias na atuação dessas equipes de saúde.

Ainda nessa perspectiva, cabe salientar que as fragilidades aqui descritas podem direcionar novos estudos, ajudando a repensar e, talvez, gerando novos insights na busca por eliminar/mitigar os mais diversos desafios para melhorar a atuação e a cobertura das equipes da ESF. Todavia, é importante considerar que mesmo diante da relevância dos resultados aqui apresentados, para se buscar um diagnóstico mais preciso, detalhado e individualizado da atuação em campo desses profissionais, sugere-se outras pesquisas.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Caren Fernanda Muraro e Andrei Bonamigo.

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Revista Baiana de Saúde Pública

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Caren Fernanda Muraro e Themis Goretti Moreira Leal de Carvalho.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Fernando Antonio Forcellini, Helio Aisenberg Ferenhof e Marcelo Gitirana Gomes Ferreira.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Caren Fernanda Muraro.

REFERÊNCIAS

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Recebido: 21.1.2019. Aprovado: 26.2.2021.

86

ARTIGO DE REVISÃO

ATOR SOCIAL E AS INVESTIGAÇÕES EM SAÚDE: OLHAR PARA NOVA CONTRIBUIÇÃO TEÓRICA

https://orcid.org/0000-0002-6349-2917

Resumo

Este estudo tem como objetivo investigar o conceito de ator social na saúde coletiva. Para o direcionamento da pesquisa, foram identificados 1.830 documentos, disponibilizados em bancos de dados como LILACS, Scielo, Web of Science e PubMed, além de teses e dissertações (Catálogo de Teses e Dissertações Capes). Para a seleção dos artigos, foram usados como critério: (1) pertencer ao campo da saúde coletiva; (2) apresentar definição/noção de “ator social”; (3) adotar uma perspectiva conceitual que se constitua na ação social; (4) ter referencial teórico da ação social associado ao conceito/noção de “ator social”; (5) possuir dados empíricos de processos de pesquisa ou ser estudo teórico sobre a temática; e (6) investigação realizada na América Latina e Caribe. Após análise e apreciação, foram selecionados 18 documentos que embasaram esta revisão. Observou-se que distintas nomenclaturas foram utilizadas para qualificar os “atores” das ações em saúde, vários autores do campo das ciências sociais foram citados, e a maioria dos trabalhos empregou combinações variadas de referenciais teóricos. A teoria da tradução se apresenta como uma possibilidade pouco explorada no campo da saúde coletiva, e apresentou-se uma breve revisão da teoria do ator-rede. Concluiu-se que as diversas teorias que dialogam com o campo da saúde coletiva buscam explicitar as diversas vertentes de sujeito produtor da ação, contudo, há muito ainda a ser produzido.

Palavras-chave: Ação social. Teoria social. Saúde pública.

a Cirurgiã-Dentista. Doutora em Saúde Pública. Docente/Pesquisadora do Instituto Aggeu Magalhães – Fiocruz. Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: sydia.oliveira@fiocruz.br Endereço para correspondência: Instituto Aggeu Magalhães. Avenida Professor Moraes Rego, s/n, Cidade Universitária. Recife, Pernambuco, Brasil. CEP: 50740-465. E-mail: sydia.oliveira@fiocruz.br

87 v. 43, n. 4, p. 87-106 out./dez. 2019 87 DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2921
Revista Baiana de Saúde Pública

SOCIAL ACTOR AND HEALTH RESEARCH: LOOKING AT A NEW THEORETICAL CONTRIBUTION

Abstract

This study aims to investigate the concept of social actor in collective health. For that, 1,830 articles, thesis, and dissertations were identified in the databases Lilacs, SciELO, Web of Science, and PubMed, as well as in the Catalogue of Theses and Dissertations of the Higher Education Personnel Improvement Coordination (CAPES). Articles were selected based on the following criteria: (1) pertaining to the field of collective health; (2) defining or conceptualizing “social actor”; (3) adopting a conceptual perspective that constitutes social action; (4) utilizing social action associated with the concept/notion of “social actor” as theoretical framework; (5) consisting of a theoretical study on the subject or including empirical data from research processes; and (6) being conducted in Latin America and the Caribbean. After analysis and evaluation, 18 documents were included in this review. In these studies, the “actors” of health actions were classified using different nomenclatures, including several authors in the field of social sciences. Moreover, most of the works combined theoretical references in different manners. Translation theory comprises a theoretical possibility little explored in the field of collective health, presenting a brief review of the actor-network theory. In conclusion, the various theories dialoguing with collective health seek to explain the various aspects of the subject performing the action, but much study on this matter is still to be produced.

Keywords: Social action. Social theory. Public health.

ATOR SOCIAL Y LAS INVESTIGACIONES EN SALUD: MIRADA HACIA UNA NUEVA CONTRIBUCIÓN TEÓRICA

Resumen

Este estudio tiene como objetivo investigar el concepto de actor social en la salud colectiva. Para orientar esta investigación se identificaron 1.830 documentos, disponibles en bases de datos como LILACS, SciELO, Web of Science y PubMed, además de tesis y disertaciones (catálogo de Capes de tesis y disertaciones). Para la selección de artículos, el criterio utilizado fue: (1) pertenecer al campo de la salud colectiva; (2) definición / noción actual de “actor social”; (3) adoptar una perspectiva conceptual que constituya la acción

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social; (4) tener el marco teórico de la acción social asociado al concepto / noción de “actor social”; (5) poseer datos empíricos de procesos de investigación o ser un estudio teórico sobre el tema; e (6) investigación realizada en América Latina y el Caribe. Después del análisis y la apreciación, se seleccionaron 18 documentos para respaldar esta revisión. Se observó que se utilizaron diferentes nomenclaturas para calificar a los “actores” de las acciones de salud, se mencionaron varios autores en el campo de las ciencias sociales y la mayoría de los trabajos utilizaron diversas combinaciones de referencias teóricas. La teoría de la traducción muestra una posibilidad teórica poco explorada en el campo de la salud colectiva, presentando una breve revisión de la teoría actor-red. Se concluye que las diversas teorías que dialogan con el campo de la salud colectiva buscan explicar los diversos aspectos del sujeto que producen la acción, pero aún queda mucho por producir.

Palabras clave: Acción social. Teoría social. Salud pública.

INTRODUÇÃO

Os estudos baseados em teorias da ação social têm espaço privilegiado no âmbito da saúde coletiva. Contudo, diferentes inspirações teóricas perpassam essas investigações, suscitando controvérsias em relação aos usos dos conceitos relativos ao agente, mediador da ação social – “ator social”, (re)agindo no campo da saúde. Este estudo objetiva investigar trabalhos desenvolvidos por autores latino-americanos, da área de política, planejamento e gestão da saúde coletiva, que tenham utilizado o conceito de “ator social”. A perseguição desse objetivo dirige-se a outro não menos importante, qual seja, apresentar uma concepção de “ator” em uma teoria social ainda pouco explorada em estudos sobre a saúde coletiva.

Weber1 desenvolveu o conceito de ação social ao identificar a importância das emoções, das crenças, dos sentimentos, das ideias, entre outros condicionantes da vida social, na discussão do problema do peso atribuído à ação dos indivíduos e o das estruturas na constituição e organização da vida social. Compreende que uma ação acontece na relação interativa entre indivíduos, adiantando que somente pode ser considerada social uma ação dirigida, endereçada a outrem, com um sentido orientado pelas expectativas de padrões e normas de comportamento socialmente definidos. Realça, assim, a necessidade da compreensão sociológica dos significados que os indivíduos e seus grupos atribuem ao agir nessa dinâmica relacional e dialógica que é a vida social.

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Sem perder de vista essa breve apresentação das ideias weberianas para um melhor entendimento sobre o conceito de “ator social”, parece necessário perguntar em que condição uma “ação social” pode ser representada por um “ator social”, uma das formas identitárias construídas na intensa complexidade da relação indivíduo-sociedade. Como distingue Dubar2, “ator”, “agente”, “sujeito”, “autor” são nomes atribuídos que permitem aos indivíduos se definirem pelos outros e definirem a si mesmos.

No veio político, o termo “ator” foi utilizado como aquele que representa socialmente outro, ao qual se confere toda força e poder, “isto é, mais do que consentimento ou concórdia, é uma verdadeira unidade de todos eles, numa só e mesma pessoa”3:105. Goffman se vale da analogia teatral para associar a ação do ator social ao cenário e à cena em um palco. No palco da vida social, as pessoas, ao se comunicarem e interagirem entre si, o fazem representando por meio de ações, comportamentos, gestos etc., à semelhança de um “ator” que encena uma narrativa orientado por um roteiro pré-estabelecido: seus papéis sociais4

Estudos internacionais em saúde pública5,6 denominam “ator social” àqueles que participam de um processo político ou de uma intervenção em prol do desenvolvimento da comunidade. No contexto brasileiro, alguns teóricos valorizam esse entendimento, pois consideram-no essencial à práxis da saúde7. Contudo, mesmo despertando interesse, parece que ainda há muito o que se problematizar, apesar da colaboração reflexiva e atenta de vários investigadores da área. Por se reconhecer que muitas são as contribuições teóricas sobre o tema no espaço da saúde coletiva é que se faz necessário investigar o conceito de ator social na saúde coletiva.

MÉTODO

Realizou-se revisão de literatura sobre o tema “ator social”, que se desenvolveu conforme as seguintes etapas: (1) Identificação do tema e elaboração da questão norteadora;

(2) Busca ou amostragem na literatura; (3) Coleta de dados; (4) Análise crítica dos estudos incluídos; (5) Interpretação dos resultados; e (6) Apresentação da revisão/síntese do conhecimento. Para tanto, se incluíram estudos publicados em periódicos disponíveis em bases de dados bibliográficas informatizadas (LILACS, SciELO, Web of Science e PubMed), além de teses e dissertações (Catálogo de Teses e Dissertações Capes), utilizando-se os descritores e operadores booleanos “sujeito OR ator OR agente OR atuante AND saúde OR saúde coletiva OR saúde pública saúde”, em português e seus correlatos em inglês e espanhol. Além disso, para ampliar a revisão, empregou-se a estratégia de coleta de informações “bola de neve”, buscando-se artigos citados nos textos identificados e capítulos de livros editados.

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Construiu-se uma base de dados única, por meio do programa Excel, com o total de 1.830 documentos identificados. Excluídas as duplicações, obteve-se, então, 1.629 documentos que foram compilados e submetidos a processo de seleção, considerandose os critérios de inclusão: (1) pertencer ao campo da saúde coletiva; (2) apresentar definição/ noção de “ator social”; (3) adotar uma perspectiva conceitual que se constitua na ação social; (4) ter referencial teórico da ação social associado ao conceito/noção de “ator social”;

(5) possuir dados empíricos de processos de pesquisa ou ser estudo teórico sobre a temática; e (6) investigação realizada na América Latina e Caribe. Não foram incluídos textos que:

(1) tratavam de apresentar o diálogo entre profissionais de saúde e usuários; (2) realizavam a discussão de ator/sujeito dentro de disciplinas específicas (administração, psicologia, saúde sexual, saúde do trabalhador, saúde mental); (3) apresentavam conceitos não oriundos de teorias sociológicas; e (4) utilizavam o termo “sujeito” como sinônimo de indivíduo. Não houve exclusão em virtude da língua.

Na primeira etapa após a busca, leram-se os títulos e os resumos da totalidade dos documentos selecionados. Os artigos que preencheram os critérios de inclusão ou que suscitaram dúvidas quanto às suas exclusões imediatas foram selecionados para a etapa seguinte. Após a leitura na íntegra, o exame dos trabalhos selecionados (realizado pela autora principal desta pesquisa) associou-se, em caso de dúvidas, à realização de discussão com outro pesquisador, com resolução por consenso.

Os 16 documentos incluídos estiveram submetidos a dois pesquisadores, que conhecidamente investigam “sujeitos promotores da mudança social” no campo da saúde coletiva, sendo-lhes pedido indicações de estudos adicionais que não estavam incluídos na seleção. Nesse processo, somaram-se mais dois textos, perfazendo um total de 18 documentos para análise.

Os arquivos compilados foram classificados, catalogados e sistematizados de acordo com o instrumento de coleta de dados, permitindo observar as seguintes características em cada um: tipo do estudo; termos e definições; e referencial teórico. Isso posto, realizou-se a leitura crítica e a discussão dos documentos selecionados, cujos resultados são apresentados a seguir.

ATOR SOCIAL E AS INVESTIGAÇÕES EM SAÚDE

Evidenciou-se que a grande maioria dos estudos eram produzidos no Brasil (94,44%), existindo uma publicação realizada no Equador (5,55%). Entre esses, predomina a forma de ensaio teórico (14), havendo estudos empíricos (2), de revisão (1) e etnográfico (1).

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No que se refere aos termos adotados, distintas nomenclaturas foram utilizadas para qualificar os “atores” das ações em saúde, em equivalências de sentidos e significações ou não, conforme o texto se nomeia: ator, sujeito, agente, porta-voz, atuante; mediador; redes. Entre os “atores” citados frequentemente, predominam os sociais e políticos. Acredita-se que a forte inscrição “ator” no sistema de sentidos da ação social na saúde coletiva se deva à fácil associação à função de mudança social: algumas vezes como metáfora ou em equivalência a uma possibilidade de “sujeito promotor” da mudança, de “agente social” da mudança8.

Nos estudos em pauta, os sujeitos emergem com variados predicados: sujeito cultural, sujeito com consciência, sujeito político, sujeito coletivo, sujeito emancipado, sujeito ativo, sujeito social, sujeito-ator, sujeito histórico, sujeito concreto, sujeito público.

Nos estudos selecionados, a identidade do “agente” aparece de modo impreciso, como: agente/s social/is, agente coletivo; rede de agenciamento tecnosemiológicos; mediador; atuante; rede/s; rede sociotécnica/s. Incluiu-se na categoria “porta-vozes” as denominações: intelectuais orgânicos e militantes.

Observa-se como se o sentido puro da palavra “ação social” constituísse, na “consciência coletiva” 9, um valor moral imperativo do compromisso das identidades de indivíduos ou grupos profissionais de saúde com a transformação qualitativa do social.

Sobretudo as profissões do campo da saúde coletiva no sistema de profissões de saúde 10 O que à luz da perspectiva da “sociologia científica”, necessitaria uma análise dos esquemas de “hábitos” existentes e de “necessidades” de indivíduos dominados, nesse campo da saúde, para se entender como se objetificam as ações desses atores individuais, “agentes da ação” 11 .

Foi possível identificar uma diversidade de conceitos fundamentados a partir de diferentes referenciais teóricos (Quadro 1). Entre os 18 estudos analisados, vários autores do campo das ciências sociais foram citados, e a maioria dos trabalhos empregou combinações variadas de referenciais teóricos. Essa diversidade, por um lado, favorece a discussão de distintos aspectos do ator social, mas, por outro, reforça a importância da compreensão dos modos como o “ator” é conceituado.

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Quadro 1 – Conceitos, termos e referenciais teóricos adotados nos diferentes estudos incluídos. Recife, Pernambuco – 2019

Autor e ano Termos adotados Conceito Referencial teórico

Campos, 1992, 199712,13 Atores sociais, sujeitos sociais

Granda, 199514 Sujeito social

Carvalho, 199615 Sujeitos coletivos

Ayres, 200116 Sujeito

Lacaz, 200117

Atores sociais capazes de alterar a correlação de forças, resultante de um processo histórico, da posição social, da capacidade de luta, e da formulação consciente de cada sujeito.

O sujeito social se conforma objetiva, social e subjetivamente no mundo da vida, que é sempre uma parte de “pressupostos culturalmente imbuídos”.

Portadores de projetos políticos de intervenção/interação nas estruturas que moldam socialmente a realidade sanitária.

O ser que produz a história, o responsável pelo seu próprio devir. Constituição dialógica da subjetividade.

Marx, Gramsci

Habermas e Gramsci

Marxismo

Hegelianomarxista; Habermas

Sujeito social; agente; intelectuais orgânicos; sujeito histórico.

Minayo, 20017

Sujeito-ator; sujeito social; sujeito histórico; sujeito coletivo; sujeito cultural; sujeitos com consciência.

Paim, 200118 Atores sociais; sujeitos públicos.

Teixeira, 200119

Sujeito social determinado pelo conjunto de relações em que é colocado e na atividade que o constitui como homem, ou seja, o trabalho. Os intelectuais orgânicos têm a função de dar homogeneidade e consciência para um grupo social nos campos econômico, social e político, criado por aquele grupo social. Ou ainda, sujeito do pensamento social, fruto da formação discursiva.

Ser humano é ator e autor da realidade porque define e cria situações. Sujeito que no seu desenvolvimento histórico se situa junto com os outros, não para agir sobre, mas para se entender e entender o que pode significar conhecer objetos, agir através deles ou também dominá-los. Sujeito à possibilidade da ação, mas também da crítica social que traz, em consequência, a capacidade de sentenciar sobre a ação e buscar a transformação.

Sujeito público que integre processos de construção contrahegemônica e gere novos pensamentos e liderança, capazes de propor uma nova maneira de fazer as coisas.

Foucault, marxismo (Marx, Gramsci)

Marxismo, Weber e Habermas

Rede de agenciamento tecnosemiológicos, agente, sujeitos, atores.

Spagnol, 200520 Sujeito social, ator social.

Tudo aquilo que produz diferença em uma rede, em um sistema, enfim, no mundo, pode ser considerado um ator, e todo ator definirá a si mesmo pela diferença que produz. Agenciamento produz a ideia de “agente” nos processos coletivos de produção de subjetividade.

Homem, um ser social em constante interação com os outros homens e com seu meio, transformando-o e sendo transformado por ele. Um ator social que tem um projeto, uma intencionalidade em seu fazer, e que está constantemente produzindo fatos sociais. Um ser que constantemente produz relações sociais que modificam seus projetos, mas também possui autonomia relativa para realizar seus desejos, buscar seus interesses e satisfazer suas necessidades. Atores que marcam suas posições políticas e ideológicas no campo.

Marxismo

Deleuze e Guattari

Bourdieu

Campos, Onocko, 200621

Coletivo organizado, sujeitos concretos.

Um ser constituído com uma finalidade que transcende cada um dos sujeitos que o integram. Uma rede de relações entretecida entre os sujeitos que o compõem e destes com o contexto.

Marx e Guattari

Fleury, 200922 Sujeitos políticos; atores; atores políticos.

Oliveira et al., 200923 Atores, militante, agente.

Sujeitos políticos capazes de formular e conduzir o processo da reforma sanitária. Sujeitos políticos que, a partir de suas lutas, entram em um processo mútuo de auto e hetero reconhecimento de identidades sociopolíticas entre diferentes sujeitos. Construção do indivíduo (ou grupo) como ator, através da associação de sua liberdade, afirmada com sua experiência de vida assumida e reinterpretada.

Militante que pleiteia uma hegemonia na qual as relações que ocorrem são, antes de tudo, relações de dominação, uma vez que a validade do discurso do outro não é reconhecida; militante que participa de relações mapeando seus múltiplos nós e favorecendo novas conexões.

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Touraine
(continua)
Foucault e Guattari

Quadro 1 – Conceitos, termos e referenciais teóricos adotados nos diferentes estudos incluídos. Recife, Pernambuco – 2019

Autor e ano Termos adotados Conceito

Renovato, 200924 Sujeitos emancipados; sujeitos ativos.

Cavalcante, 201025

O sujeito ativo é fabricado através de esquemas que encontra em sua cultura e que lhe são propostos, sugeridos, impostos. Sujeito ativo é o sujeito independente e livre, capaz de fazer suas escolhas, mas também de se responsabilizar pelo ônus das decisões tomadas ao longo de sua vida.

Referencial teórico

Foucault

Atores; sujeitos políticos; atores sociais; militantes porta-vozes.

Correia, 201026 Sujeitos coletivos; atores.

Gomes et al., 201027

Sujeitos, tanto organizados como desorganizados, que buscam a efetivação do direito a saúde e que produzem diferentes modos de atuação, em tempos e espaços diferentes.

Sujeito é a vontade de um indivíduo de agir e de ser reconhecido como ator. Os atores são analisados por suas ações coletivas e pela identidade coletiva criada no processo. Sujeito que pode ser compreendido evocando a noção de autonomia, liberdade e responsabilidade. O ator social elabora expectativas, bem como avalia as possibilidades e os limites de suas ações.

Gramsci, Deleuze e Guattari

Touraine e Habermas

Agente social; mediador.

Targa, 201028 Atuantes; redes; redes sociotécnicas.

Mediador ou elo. Agentes sociais não agem de maneira disparatada, não fazem coisas sem sentido e não realizam atos gratuitos. O objetivo é de organização da comunidade e de transformação de suas condições.

Atuante é um termo da semiótica para incluir não humanos, ao contrário de ator, geralmente utilizado para humanos, pelo qual todos são quase-sujeitos-quase-objetos.

Leite et al., 201129 Agente coletivo, ator. Sujeito como ator das reformas, transformação do si mesmo em ator. Sujeitos políticos capazes de reformular e conduzir o processo de reforma.

Fonte: Elaboração própria.

Bourdieu

Latour

Gramsci, Touraine, Guattari e Deleuze e Foucault

Assim é que, das diferentes ideias relacionadas às qualificações que particularizem a contextualização, espacial e temporal, destacam-se as que remetem à dinâmica das interações e/ou às defesas por identidade, transformação, reprodução, mobilização, modos de atuação, reconhecimento, negociação e intervenção. Essas palavras pertencem ao campo conceitual de determinadas correntes teóricas, que serão citadas a seguir.

Há que se admitir que a perspectiva do conflito (tradição marxista) e a perspectiva sociológica do consenso (tradição positivista) ainda podem ser consideradas divisoras do campo teórico da sociologia e definidoras de muitas matrizes diferenciadoras30. Da mesma forma, pode-se dizer sobre as perspectivas que encerram o dilema sociológico da teorização da vida social: até que ponto a sociedade constitui os indivíduos e esses, a sociedade. Essa última recobre diretamente o propósito desta análise, pois se situa na arena das possibilidades de os indivíduos constituírem suas práticas, ações e processos outros que, sendo sociais (estruturado/ estruturante), possam ser entendidos e admitidos como reguladores da vida cotidiana, influentes nos modos de vislumbrar o valor da vida para si, para quem admira e para outros. Se essas possibilidades estão teoricamente situadas no campo do poder na perspectiva do conflito

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(conclusão)

(oposição, antagonismo) ou do consenso (assentimento, redução do campo divergente etc.), ou de indivíduos mais coagidos ou mais autônomos, é outra face da moeda extremamente importante para a compreensão da vida social31.

Feitas essas ressalvas e observando, por ano de publicação, os documentos incluídos na amostra, percebe-se que entre aqueles editados na década de 1990, a maioria tem como base aspectos da teoria marxista, evocam a ideia de luta, de um sujeito coletivo combatente, engajado e crítico, fundamentado, em última instância, no conceito de “classe social” operária. Da tradição do conflito derivam pensadores como Marx e Gramsci, que compreendem a importância da racionalidade das “estratégias de poder”, na constituição de indivíduos/grupos e instituições, nas e pelas quais se observa a racionalidade (meio-fim) na imposição dos “interesses” de alguns em detrimento dos outros, podendo haver um conflito aberto nessa luta30

A aproximação do tema da ação social na saúde coletiva dos textos brasileiros com raiz teórica marxista, em específico, provavelmente se associa ao movimento de Reforma Sanitária, que constituiu sujeitos comprometidos com a vida e a saúde dos cidadãos18, e atuou como condutora no processo de implantação do Sistema Único de Saúde. Evoca-se, na década de 1990, ao “ator das reformas” (o movimento social pela Reforma), o seu protagonismo como “sujeito” desse processo de mudança: aquele coletivo que poderá realizá-la ou desviá-la7

Cabe salientar a pluralidade dos textos que trazem uma discussão que suscita quase a obrigatoriedade da atuação civil nas atribuições dos profissionais/trabalhadores da saúde coletiva. Isso assinala, na construção de “atores” em saúde, a exigência do dever da prática e de ações responsáveis, organizativas e críticas no trato das relações entre o sistema de saúde, a sociedade e o indivíduo. Isso faz com que se situem o valor simbólico, conceitual, prático e vivencial, atribuído ao significado de “ação” social nesse campo, como uma relação de poder entre indivíduos mais ou menos intensamente autônomos e ativos.

Nessa mesma década de 1990, apenas um dos estudos selecionados, o único de outra nacionalidade, busca a teoria da ação comunicativa de Habermas. Esse filósofo herdeiro da Escola de Frankfurt rompe com o paradigma da filosofia da consciência, pelo qual o “sujeito” obtém pleno conhecimento dos objetos, da sociedade e do mundo, e adota o paradigma da linguagem (razão comunicativa), no qual o sujeito é aquele que, durante seu processo de desenvolvimento histórico, é obrigado a se entender junto com outros sujeitos sobre o significado de “conhecer objetos”32,33

No entanto, é na primeira década do século XXI que se localiza o maior número de publicações e elaborações explorando a temática do ator social na saúde coletiva, a partir

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de “novos” veios teóricos. Quando se observa as publicações dos anos 2000, identificase a presença de autores de tradições sociológicas distintas, entre eles: Bourdieu, Touraine, Foucault, Deleuze e Guatarri e Latour.

Para Bourdieu34, a representação realista da ação humana é condição primária de um conhecimento científico social, e a análise sociológica, um poderoso instrumento de conhecimento de si, como ser singular. Considera-se como fundamental em seu trabalho a filosofia da ciência relacional e a filosofia da ação. A primeira atribui primazia às relações, opondo-se ao pensamento substancialista do senso comum, e a segunda está consubstanciada em conceitos fundamentais – habitus, campo, capital – e rompe com noções incorporadas ao discurso acadêmico. Sua crítica dirige-se ao pensamento de que toda ação humana é sempre uma ação consciente, como se os agentes agissem sempre de maneira a obter o máximo de eficiência. Contrapondo esse interesse, Bourdieu apresenta o conceito de illusio – o investimento dos agentes no campo, o interesse pelo jogo social. Dessa forma, considera que as condutas humanas acontecem em espaços de jogo, mas muito raramente estão assentadas em intenções estratégicas verdadeiras35.

Para um entendimento geral do “agente” ativo e do “ator estratégico”, deve-se considerar a perspectiva da autonomia que subscreve a ação estratégica. Teóricos da análise estratégica utilizam o termo ator para referirem-se ao indivíduo “[…] capaz de cálculo e manipulação e que não apenas se adapta, mas inventa, em função das circunstâncias e dos movimentos dos seus parceiros”36:38. Não se trata de redução a um agente individual, produzido por um sistema concreto de ações no qual é incorporado na forma de dispositivos para a ação, e é definido segundo a posição na dinâmica do sistema de relações de poder. Ao revés desse agente da teoria de Bourdieu, o ator estratégico se define por sua situação na e pela estrutura de jogos no qual está inserido, ou pela leitura que dela fará. É, então, concebido pelo contexto vivido como participante de um conjunto coletivo, e é pela leitura das oportunidades deste e neste contexto que o ator explora os recursos para a ação. O que prevalece é a interação coletiva, e não a incorporação individual em um sistema concreto de ação.

Para empreender a análise do jogo das ações e realizar uma análise estratégica, na qual o pesquisador assume a condição de “participante”, é imprescindível o mergulho na subjetividade dos atores e em suas antecipações da dinâmica do sistema. Ou seja, a exteriorização das iniciativas estratégicas utilizadas pelos atores coletivos para modificar o sistema concreto. Para reconstruir o sistema de ação, há que se registrar as vivências expressadas em falas, das escolhas subjetivas e das estratégias efetivas. Esse ator seria uma personagem social engajada em uma ação com um sócio coletivo (categoria, associação etc.).

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Muito se associa a concepção de “sujeito reflexivo” à obra de Alain Touraine. Observa-se uma concepção em transição na perspectiva do sujeito, como ponto de partida da análise política e social, de forma particular para o contexto da América Latina. O autor apresenta um sujeito que objetiva ser reconhecido como ator. Nesse sentido, há uma associação do sujeito social a outros dois pressupostos: democracia e modernidade, que são centrais em seus trabalhos37. A obra de Touraine estabelece um diálogo entre democracia e sujeito social, já que a ampliação de um é também a ampliação do outro38.

O pensamento de Touraine sugere que a ideia de democracia não se materializa unicamente no conjunto de garantias institucionais e formais, mas sim representa a luta dos sujeitos, na sua cultura e sua liberdade, contra a lógica dominadora dos sistemas sociais, e uma “sociedade democrática é uma sociedade que reconhece o outro, não na sua diferença, mas como sujeito”37:1. Porém, que forma de sujeito? Numa perspectiva existencialista, é um sujeito que se sente responsável por si e pela sociedade. Promove-se, então, uma dissociação entre o ator individual e o sistema social pulverizado, entre o indivíduo de múltiplas inserções (plurais) e as instituições sociais. Os indivíduos não podem mais ser reduzidos a categorias coletivas preexistentes, porque “[…] ao se individualizarem os atores, transformados em plurais […] se tornam vagos, problemáticos, desorientados”2:3. Potencialmente transformado em um indivíduo reflexivo, que em sua experiência (entregue ao sociólogo que busca neste o acesso à linguagem sobre si mesmo), descobre um sentimento de estranheza oriundo da distância entre os papéis, o qual se esforça para explicar e justificar, atribuindo-se a obrigação de criar muitas lógicas e de organizar o trabalho de sua experiência. O pesquisador, em geral, busca compreender como a singularidade das argumentações das lógicas do “ator” e das justificativas do “agente” é exposta (construção das ações, reações às políticas, às pressões, aos dispositivos, de se orientar nas organizações). Considera-se o dito, diferentemente de Bourdieu (agente ativo), quase sempre verdadeiro.

Os teóricos de tradição pós-estruturalista, como Foucault, Deleuze e Guattari, possuem abordagens muito próximas, tendo em vista a ressonância que o trabalho de Foucault apresentou na obra de Deleuze e Guattari. Esses teóricos discutem a problemática do “ator social” em um mesmo plano conceitual e temático, a partir de uma perspectiva de autonomia dos “sujeitos”.

Foucault, em sua obra, analisa as formas de constituição dos sujeitos, seja os mecanismos de objetivação, que tendem a fazer do homem um objeto, ou ainda os mecanismos de subjetivação, pelos quais o homem expressa sua identidade. Para o autor, o sujeito do conhecimento é constituído, produzido dentro de uma conjunção de estratégias de poder. Ou seja, o sujeito é um produto das relações de poder, não seu produtor. Não há um sujeito

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essencial que estaria alienado por ideologias, por relações de poder que encobririam sua visão da realidade. O sujeito do conhecimento é produzido pelas relações de poder, ou melhor, o que chamamos sujeito é um enunciado social39

Para esses teóricos, vivemos em sociedades nas quais as subjetividades são normalizadas de forma impositiva, coercitiva, por uma forma hegemônica de poder, que objetiva reduzir permanentemente o risco potencial presente no desenvolvimento dos processos de subjetivação ou singularização, com o intuito de facilitar sua administração sobre os indivíduos40.

Foucault apresenta uma análise histórica da formação do sujeito41. Observa-se, assim, na saúde coletiva, uma aproximação aos trabalhos colaborativos feitos por esses três autores, no que se refere a sujeitos mais individualizados, assim, o sujeito não está dado, entretanto se constitui nas experiências, na aproximação com os acontecimentos42.

A constituição do sujeito, para esses autores, se processa nos diferentes encontros vividos com o outro, exercitando as diferenciações de nós mesmos e dos outros que nos cercam.

“Dependendo dos efeitos produzidos pelos encontros, o sujeito é praticamente ‘forçado’ a questionar e a produzir sentidos àquela experiência que emergiu ao acaso e que, sem consulta, desorganizou um modo de viver até então conhecido”43:115. Dessa forma, o sujeito não pode ser concebido como uma entidade pronta, mas se constitui à medida que é capaz de entrar em contato com essas forças e com as diferenças que elas encarnam, sofrer suas ações e, em alguma medida, atribuir-lhes um sentido singularizado. Nesse movimento, parte delas passa a compor o homem, dando uma forma (provisória) para o “lado de dentro”. Quais são essas relações que compõem o homem? “forças […] de imaginar, de recordar, de conceber, de querer”44:132. Cabe assinalar que a potência de ação dessas forças também é variável. Assim, diante de uma dada experiência vivida, elas podem ou não se manifestar. Portanto, a maneira como esses três autores analisam a produção do sujeito remete a uma aventura que é recorrentemente colocada nessa constituição de si e nas variações produzidas pelos encontros intensivos com o outro. Uma pluralidade de teóricos é apresentada nos estudos em que a noção de ator social está presente. De modo mais recente, a teoria da tradução se apresenta como uma possibilidade teórica para apreciação dessa realidade. Nesse sentido, possibilitando uma apreciação de um referencial pouco explorado no campo da saúde coletiva, apresenta-se uma breve revisão da teoria do ator-rede, para que possa ser utilizada em estudos futuros a respeito do ator social.

NOVA PERSPECTIVA TEÓRICA: A TEORIA DA TRADUÇÃO

A teoria da tradução é uma abordagem sociológica, desenvolvida principalmente por Bruno Latour, Michel Callon e John Law, com origem nos estudos sobre a articulação entre ciência,

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tecnologia e sociedade. Suas contribuições serão sistematizadas a partir dos princípios conceituais e metodológicos fundamentais, a saber: associação livre, agnosticismo e simetria generalizada.

Para compreender o fundamento da associação livre, o autor considera a sociologia do social e a sociologia das associações45. Na primeira, trata-se de explicar o tecido social através da utilização de conceitos que possibilitam o enrijecimento do tecido social e anulam as instabilidades que o compõem. A sociologia das associações, por outro lado, considera que o social é um tipo de conexão entre elementos que, em si mesmos, não são sociais. Os grupos sociais são continuamente recriados nas associações que dinamicamente se estabelecem entre os atores.

O deslocamento dos distintos atores envolvidos no processo social permite contínuas reinterpretações dos papéis desempenhados e dos objetivos pretendidos, contemplando seus respectivos interesses e suas relações de poder46. Essas associações produzidas pelos atores podem ser compreendidas pela noção de tradução, que corresponde ao conjunto de operações pelas quais as entidades são colocadas em relação não somente umas com as outras, uma articulação de elementos díspares e heterogêneos que, de algum modo, modifica os envolvidos nesse processo47.

A noção de tradução está atrelada ao processo de expansão e de consolidação da rede, que consiste em estabelecer conexões entre entidades que não estavam anteriormente conectadas. Uma rede é uma totalidade aberta capaz de crescer através de fluxos, circulações, e alianças, que interferem e sofrem interferência de diversos atores, sendo o processo de tradução necessário para sua consolidação e expansão.

Para examinar esse processo de tradução, Callon 48 estabelece quatro operações interativas:

1) Problematização: colocação em movimento dos atores em torno de um projeto provisório e mínimo, que se constitui na definição do problema. Nesse momento, há a possibilidade de configuração ou reconfiguração de uma rede de atores, a partir da formação de um sistema de alianças ou associações entre eles, que passam a adquirir e articular papéis e identidades em função do problema dado. Os atores passam a compartilhar um mesmo objetivo e atuam em função dele.

2) Interesse: conjunto de dispositivos (estratégias) pelo qual uma entidade (atores) tenta impor e estabilizar a identidade dos outros atores, realinhandoos em torno do objetivo compartilhado, interrompendo todas as associações potenciais concorrentes e construindo um sistema de alianças. O interesse é produzido frequentemente a partir de novas relações ou de novas formas de relações já existentes. É nesse momento do interesse que a problematização é validada ou contestada.

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Revista Baiana de Saúde Pública

3) Envolvimento: refere-se aos mecanismos pelos quais são definidos papéis atribuídos a atores que os aceitam. É o interesse bem-sucedido, que dá lugar a um conjunto de negociações, que por sua vez conduz à aceitação de um determinado papel, permitindo consolidar alianças a fim de fortalecer a rede em busca de uma solução negociada.

4) Mobilização: conjunto de métodos ou negociações para garantir que as entidades possam ser movidas, em função de suas novas funções e de acordo com a orientação dada pelo porta-voz da rede. Ocorre quando os atores se rendem, gradualmente, às proposições apresentadas pelos porta-vozes. A mobilização dos atores anuncia o alargamento das redes. Ao contrário, a falta de solidez dos porta-vozes leva à dissidência, devido às inúmeras controvérsias.

Esses momentos nunca são tão distintos, nem lineares, muito menos as sobreposições se dão sempre nessa ordem. Eles representam um avanço na mobilização dos atores, uma evolução nas associações entre os atores que vai se consolidando à medida que passam a compartilhar os mesmos objetivos. “Traduzir é um processo antes que seja um resultado”48:213.

Ao analisar a dinâmica de traduções e deslocamentos, ressalta-se o segundo princípio metodológico: o agnosticismo. Considera-se que não há explicações prontas ao analisar qualquer dinâmica social. Deve-se abandonar qualquer suposição a priori sobre os fatos49

Ao analisar as alianças que são formadas na constituição das redes, deve-se ser imparcial. Cada ator, em função de seus interesses, pode a qualquer momento contestar essas alianças,uma vez que elas não são definitivas.

Nessa mecânica do poder, onde atores se utilizam das estratégias necessárias para a consecução de seus objetivos, sempre existem riscos e perdas. Latour45 apresenta o poder como situacional e contextual, pelo qual em toda parte os atores encontram resistência, e são capazes de obter maior êxito em face da resistência aqueles que são competentes em arregimentar mais aliados, estender e solidificar suas redes. Os atores conectados à rede têm identidades e interesses que lhe são próprios, mas que se alinham de maneira crescente à medida que a rede se consolida. No momento em que o alinhamento dos objetivos, ou os interesses dos atores, se modifica, a rede pode ser desfeita. Isso é, quanto mais heterogênea a identidade desses atores que compõem a rede, mais instável ela é50,51.

Esse entrelaçamento entre atuantes, compreendido como um emaranhado que nos possibilita pensar não mais em termos de unidade, mas a partir de um dinamismo processual e sempre constante de associações, é denominado Rede Sociotécnica (RST)47,52

A RST é definida por um híbrido da relação entre humanos e não humanos, reintegrando polos que comumente aparecem como opostos53. Não existe diferença ontológica

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entre objetos ou pessoas. Todos são “atores” (ou actantes, ou atuantes), com capacidade de produzir efeitos no mundo. Nesse sentido, atuantes designam seres que nem são puros humanos e nem puros não humanos. A ação é que designa os atuantes, não sendo uma propriedade apenas dos humanos, mas fruto de uma associação entre humanos e não humanos47

Nesse coletivo, no qual humanos e não humanos estão mesclados54, os atuantes não humanos não se restringem a meras ferramentas da ação. Latour e Woolgar49 propõem uma simetria generalizada – último princípio metodológico: os humanos criam objetos interferindo diretamente sobre eles, mas esses objetos também interferem nas formas de viver, de ser e estar no mundo dos homens. A simetria generalizada nos propõe entender que “não há de antemão o mundo das coisas em si de um lado e o mundo dos homens entre si de outro, pois natureza e sociedade são ambos feitos de redes heterogêneas”55:49

Para a compreensão desse fundamento, Latour54 sugere o exemplo da arma de fogo, com duas linhas de argumentação opostas. Na primeira, defensores da proibição da arma de fogo diriam: “armas matam pessoas”. A arma (Agente A) é uma ferramenta que altera o comportamento de quem a porta. Na segunda proposta, dos favoráveis ao uso das armas, as armas são ferramentas neutras e a ação depende das intenções de quem a possui (Agente B).

Contudo, Latour54 nos apresenta outra via, na qual um terceiro agente surgiria da união da pessoa e da arma (Agente C), com um terceiro objetivo que não corresponde ao objetivo de nenhum dos agentes anteriores. Dessa maneira, pode-se argumentar que a arma modifica o atirador na mesma medida que este último a transforma.

Emergem do exemplo acima as noções de intermediário e mediador. De acordo com Latour45, um intermediário é o que transporta significado ou força sem transformação: definir suas entradas é o suficiente para definir suas saídas. Artefatos tecnológicos (computadores, internet etc.) são considerados estáveis (estabilizados), ou caixas-pretas, não sendo problematizados. Por outro lado, para os mediadores, “suas entradas nunca permitem uma boa previsão de suas saídas: a especificidade deles deve sempre ser considerada”45:301 Um mediador é sempre capaz de mobilizar, modificar, potencializar ações dentro de um universo, de uma rede constituída de uma heterogeneidade de mediadores. Na ocorrência de qualquer ação dos diferentes atores envolvidos, é indispensável a mediação54.

Quando são considerados mediadores, os artefatos são vistos em sua complexidade, são problematizados. Suas particularidades influenciam na construção do fato e, portanto, devem ser consideradas na análise. Quando são considerados intermediários, ou caixas-pretas, a multiplicidade dos artefatos pode ser secundarizada na análise, porque são apenas um meio para atingir um objetivo maior.

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O conceito de caixa-preta é utilizado pela RST quando um objeto é considerado por demais complexo, mas, também, quando as conexões entre as diversas entidades são tão fortes que elas desaparecem e não são mais problema. Esse conceito nos permite entender a realidade como uma construção em camadas, um processo de endurecimento da vida em certezas, as quais dependem de amarrações que produzem a solidificação de um determinado acontecimento. Por fim, podemos concluir que as diversas teorias que dialogam com o campo da saúde coletiva buscam explicitar as diversas vertentes de sujeito produtor da ação, mas há muito ainda a ser produzido. Em momentos como os vividos ultimamente na sociedade brasileira, a teoria do ator rede pode ser uma abordagem útil, quando é preciso abrir a caixa preta e desestabilizar as conexões e solidificar novas redes. Teorias da ação social como as apresentadas neste estudo possibilitam uma reflexão para além da saúde, para uma discussão sobre a ação mobilizadora pela luta no Estado democrático e pelos direitos sociais adquiridos na sociedade brasileira, principalmente no que diz respeito à saúde. Repensar o papel do ator como sujeito social promotor da mudança é fundamental no cenário brasileiro.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Sydia Rosana de Araujo Oliveira.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Sydia Rosana de Araujo Oliveira.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Sydia Rosana de Araujo Oliveira.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Sydia Rosana de Araujo Oliveira.

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Recebido: 18.1.2019. Aprovado: 26.2.2021.

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ARTIGO DE REVISÃO

FEBRE DO NILO OCIDENTAL: UMA REVISÃO DA LITERATURA

https://orcid.org/0000-0002-5924-1832

Érika Dayane Leal Rodriguesb

https://orcid.org/0000-0003-1546-7319

Matheus Moreira Reisc

Resumo

A partir de seu primeiro isolamento em Uganda, em 1937, até os dias de hoje, o vírus do Nilo Ocidental (WNV) tornou-se um alarmante agente etiológico em humanos e animais. O WNV é mantido e perpetuado na natureza através de um ciclo enzoótico, entre aves e mosquitos, e ocasionalmente causa surtos epizoóticos em razão de uma doença contagiosa em humanos e cavalos. Este vírus é amplamente difundido no mundo e, embora grande parte das infecções humanas causadas por WNV seja assintomática, a doença pode evoluir para um quadro neurológico grave, resultando em sequelas a longo prazo ou óbito do paciente. Este estudo tem por objetivo analisar a literatura específica sobre o WNV para apresentar uma revisão de artigos científicos, buscando explorar os aspectos mais importantes da doença. Foram realizadas buscas nas bases de dados PubMed e SciELO a partir dos seguintes descritores: “ West Nile virus ”, “ epidemiology ” e “ pathogenesi ’”. A linha temporal pesquisada abrange de 1998 a 2019, o que permitiu a localização de 293 artigos, dos quais, com base na leitura dos resumos, 88 foram selecionados para realização da leitura completa do artigo. Ao final da leitura dos artigos, 33 foram selecionados na análise final, tendo levado à conclusão de que a vigilância epidemiológica e as medidas preventivas são uma necessidade contínua para reduzir os impactos da doença na saúde pública.

Palavras-chave: Vírus do Nilo Ocidental. Epidemiologia. Patogenia.

a Biomédica. Especialista em Saúde Coletiva. Mestre em Virologia. Doutoranda em Biologia Parasitária na Amazônia pela Universidade do Estado do Pará. Belém, Pará, Brasil. E-mail: taiana.freitas@hotmail.com

b Veterinária. Mestre em Biologia dos Agentes Infecciosos e Parasitários. Bolsista no Instituto Evandro Chagas. Ananindeua, Pará, Brasil. E-mail: erika_dayane.lr@hotmail.com

c Veterinário no Hospital Veterinário Municipal Dr. Vahia. Belém, Pará, Brasil. E-mail: mattheusmr42@gmail.com

Endereço para correspondência: Universidade do Estado do Pará. Centro de Ciências Biológicas e da Saúde. Tv. Perebebuí, n. 2.623, Marco. Belém, Pará, Brasil. CEP: 66087-662. E-mail: taiana.freitas@hotmail.com

107 v. 43, n. 4, p. 107-118 out./dez. 2019 107 DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2990
Revista Baiana de Saúde Pública

WEST NILE FEVER: A LITERATURE REVIEW

Abstract

From its first isolation in Uganda, in 1937, up to date, the West Nile virus (WNV) has become a major cause of disease in both humans and animals. Maintained in nature through an enzootic cycle involving birds and mosquitoes, the WNV is liable to occasional epizootic outbreaks, causing diseases in humans and horses. This virus is widely spread in the world and, although most human infections with WNV are asymptomatic, the disease may progress into a severe neurological disorder, resulting in long-term sequelae or death. This study comprises a literature review on scientific articles discussing the theme of WNV. For that, a search was conducted in the databases PubMed and Scientific Electronic Library Online (SciELO) for articles published between 1998 and 2019, using the following descriptors: “West Nile virus”, “epidemiology”, and “pathogenesis”. From the 293 articles found, 88 were selected for full-text reading after abstract screening, 33 of which remained in the final analysis. To reduce the impact of the disease on public health, authorities must conduct epidemiological surveillance and develop preventive measures.

Keywords: West Nile virus. Epidemiology. Pathogenesis.

FIEBRE DEL NILO OCCIDENTAL: UNA REVISIÓN DE LA LITERATURA

Resumen

Desde su primer aislamiento en Uganda en 1937 hasta la actualidad, el virus del Nilo Occidental (WNV) se ha convertido en un importante agente etiológico en humanos y animales. El WNV es un virus mantenido y perpetuado en la naturaleza a través de un ciclo enzoótico, entre aves y mosquitos, y ocasionalmente ocurren brotes epizoóticos, causando enfermedad en humanos y caballos. Es un virus ampliamente difundido en el mundo, que causa infecciones asintomáticas en humanos en la mayoría de los casos, sin embargo, la enfermedad puede evolucionar a un cuadro neurológico grave, ocasionando secuelas a largo plazo o el óbito del paciente. Este estudio tiene por objetivo analizar la literatura específica sobre el WNV para presentar una revisión de artículos científicos referentes al tema. Se realizaron búsquedas en las bases de datos PubMed y SciELO a partir de los siguientes descriptores: “West Nilo virus”, “epidemiology” y “pathogenesi”. La línea temporal de estudio abarcaba de 1998 a 2019, en la cual se encontraron 293 artículos y con base en la lectura de los resúmenes se seleccionaron 88 para realizar la lectura completa. Al final de la lectura de los artículos, 33 artículos fueron seleccionados en el análisis final, lo que se concluye que

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la vigilancia epidemiológica y las medidas preventivas son una necesidad continua a fin de reducir los impactos de esa enfermedad en la salud pública. Palabras clave: Virus del Nilo Occidental. Epidemiología. Patogenia.

INTRODUÇÃO

Descrito pela primeira vez em 1937 a partir de um caso de doença febril em Uganda, o vírus do Nilo Ocidental (WNV) causou surtos pouco frequentes e, geralmente, associados a doenças febris moderadas1. O primeiro surto de doença neuroinvasiva causada por WNV foi relatado entre os idosos em Israel, em 1957, e os surtos subsequentes incluíram casos adultos e pediátricos2.

O WNV é transmitido por mosquitos e causa aos seres humanos uma variedade de sintomas que vão desde uma infecção assintomática até uma encefalite grave e até fatal3 Aves selvagens e domésticas são reservatórios do vírus, e a transmissão ocorre através dos mosquitos Culex, ou seja, de vetores para hospedeiros acidentais, como humanos e equinos. Embora a maioria dos pacientes com infecções por WNV não apresente sintomas ou apresente sintomas leves, semelhantes aos da gripe, há algumas poucas pessoas que desenvolvem a forma grave da doença, que envolve o sistema nervoso central (SNC), incluindo meningite, encefalite e paralisia flácida aguda. Pessoas com mais de 50 anos, imunossuprimidas ou com doenças crônicas têm maior risco de apresentar uma doença grave e às vezes com desfecho fatal4

Quando as condições favorecem a amplificação viral dentro do ciclo de transmissão pássaro-Culex, um número crescente de mosquitos infectados representa um aumento do risco de infecção humana, especialmente no verão5. Isso ocorre porque temperaturas mais altas se correlacionam com o aumento da incidência humana, visto que o aumento da temperatura ambiente encurta o tempo entre a incubação e a infecciosidade em mosquitos e, consequentemente, aumenta a eficiência da transmissão viral para as aves, ambos fatores críticos para a amplificação arboviral6

Fatores de risco para o desenvolvimento da febre do Nilo Ocidental, após a infecção, ainda não são bem definidos. Um estudo de acompanhamento com doadores de sangue virêmico sugeriu que pessoas mais jovens tinham maior probabilidade de desenvolver febre do Nilo Ocidental7. Em contraste, o avanço da idade aumenta profundamente o risco de doença neuroinvasiva, particularmente a encefalite, além disso, históricos de câncer, diabetes, hipertensão, abuso de álcool, doença renal e deficiência de CCR5 no receptor de quimiocinas podem aumentar o risco de contágio8.

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Revista Baiana de Saúde Pública

O WNV foi introduzido na América do Norte em 1998 e se adaptou rapidamente a um ciclo envolvendo mosquitos e pássaros americanos, causando uma epizootia que matou muitos pássaros, acometeu humanos e cavalos e se espalhou por toda a América do Norte em poucos anos. A epizootia entre as aves causada pelo WNV se espalhou para as Américas Central e do Sul, onde também infectou cavalos. Em 2006, foram detectados anticorpos para WNV em cavalos na Colômbia e, neste mesmo ano, o vírus foi isolado em um cavalo na Argentina 9 .

Em 2009, no Brasil, anticorpos neutralizantes para o WNV foram relatados em cavalos da Nhecolândia (MS) e São José da Cruz do Brejo (PB), porém, somente em 2014 foi relatado o primeiro caso de encefalite por WNV na Região Nordeste, no estado do Piauí. Em 2019, o vírus foi isolado no estado do Espírito Santo, na Região Sudeste do Brasil. Assim, apesar das evidências do WNV circulando no Brasil há pelo menos 8 anos, apenas um caso humano foi relatado10

Este estudo tem por objetivo analisar a literatura específica sobre o WNV para apresentação de uma revisão referente ao tema.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa exploratória, bibliográfica, de natureza qualitativa, realizada por meio de coleta de dados para uma revisão sistemática. Foram incluídos trabalhos com foco específico em epidemiologia e patogênia do WNV e estudos com delineamento do tipo experimentais e observacionais e incluídos apenas artigos publicados em português e inglês entre os anos entre 1998 e 2019. Os artigos que não se enquadravam nesses critérios foram excluídos da pesquisa. As seguintes bases de dados foram consultadas: PubMed e SciELO e a busca foi pautada nos seguintes descritores: “ West Nile virus ”, “ epidemiology ” e “ pathogenesi ’’.

O levantamento dos dados bibliográficos foi realizado por dois pesquisadores com base nos critérios de inclusão estabelecidos. Foi realizada a seleção dos artigos mediante a leitura e a análise dos títulos e resumos de todos os artigos identificados. Posteriormente, procedeu-se à leitura na íntegra dos estudos selecionados, permitindo que outros textos também fossem excluídos por não atenderem à proposta da revisão. Por fim, as principais informações dos artigos foram sintetizadas para que pudessem orientar as análises descritivas e críticas dos estudos selecionados.

Esse tipo de pesquisa permite a discussão de informações sobre a doença por meio da aplicação de métodos sistematizados de busca, análise e síntese da informação selecionada.

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RESULTADOS E DISCUSSÃO

Inicialmente foram encontrados 293 artigos, destes, 82 estavam na base de dados SciELO e 211 no PubMed. Com base na leitura dos resumos, 88 foram selecionados para realização da leitura completa do artigo. Após leitura dos artigos, como critério de seleção, foram utilizados aqueles que abordavam a epidemiologia, sintomatologia e patogenia do vírus do Nilo Ocidental. Desta forma, 33 artigos foram selecionados na análise final (Figura 1). A seleção dos artigos possibilitou a apresentação de uma revisão sobre o WNV.

Pesquisa abrangente em bancos de dados eletrônicos resultou em 293 artigos

88 citações foram selecionadas 205 citações foram excluídas por não se enquadrarem nos critérios de inclusão

33 artigos foram selecionados

O VÍRUS

O vírus do Nilo Ocidental (WNV) pertence à família Flaviridae, ao gênero Flavivirus e é envelopado, com genoma de RNA fita simples de polaridade positiva11. O genoma consiste em uma única estrutura de leitura aberta de aproximadamente 11 kb sem cauda de poliadenilação na extremidade 3‘. Ambas as regiões não codificadoras (5‘ e 3‘) do genoma formam estruturas stem-loop, que auxiliam na replicação, transcrição, tradução e empacotamento. O WNV é uma partícula icosaédrica, com a proteína do capsídeo associada ao RNA, formando o nucleocapsídeo, que é circundado por uma bicamada lipídica12. Uma grande proporção de proteína do capsídeo localiza-se no núcleo, enquanto a montagem viral ocorre no citoplasma, e o brotamento ocorre no retículo endoplasmático13

O RNA viral é traduzido como uma poliproteína única que é clivada póstranscricionalmente por ambas as proteases, hospedeiras e virais, resultando em três proteínas estruturais (capsídeo, envelope e pré-membrana) e sete proteínas não estruturais (NS1, NS2A,

111 v. 43, n. 4, p. 107-118 out./dez. 2019
Revista Baiana de Saúde Pública Figura 1 – Critérios de seleção dos artigos para o desenvolvimento do artigo de revisão. Belém, Pará – 2019 Fonte: Elaboração própria.

NS2B, NS3, NS4A, NS4B e NS5). A extremidade 5‘ do genoma codifica as proteínas estruturais, que são necessárias para a entrada e fusão do vírus, bem como para encapsidação do genoma viral durante a montagem13

As proteínas não estruturais possuem diversas funções, o que é compreensível, pois o vírus tem um número muito limitado de proteínas e cada uma delas deve servir a múltiplos propósitos durante a infecção13. A NS1 tem uma forma “celular” e uma forma secretada e é altamente imunogênica, mas o seu papel na montagem ainda não foi descrito, embora tenha sido sugerido que desempenhe um papel na replicação. A NS3 é a protease viral responsável por clivar outras proteínas não estruturais da poliproteína viral e codifica atividades enzimáticas. A proteína NS5 serve como polimerase viral e codifica uma metiltransferase e é necessária para a replicação viral14. Várias das proteínas não estruturais, incluindo NS2A, NS2B, NS4A e NS4B, mostraram inibir um ou mais componentes da resposta imune inata contra a infecção viral15

PATOGÊNIA E SINTOMATOLOGIA

Acredita-se que, após a picada de mosquito, o WNV infecta os queratinócitos e as células de Langerhans, após, migram para os linfonodos regionais, onde ocorre a replicação inicial. O WNV, então, se espalha sistemicamente aos órgãos viscerais, como o rim e o baço, onde ocorre um segundo ciclo de replicação em células epiteliais e macrófagos, respectivamente16. Dependendo do nível de viremia, o WNV pode atravessar da barreira hematoencefálica para o cérebro e causar meningoencefalite, assemelhando-se ao que já foi observado em outros vírus neurotrópicos, como o vírus da encefalite de Saint-Louis, que, em camundongos, a probabilidade de neuroinvasão parece correlacionar-se com o nível e a duração da viremia.

A glicoproteína do envelope (E) do WNV foi associada à neuroinvasividade, particularmente no domínio III da proteína, que constitui o domínio de ligação ao receptor17.

Em humanos, o WNV é mais frequentemente detectado em neurônios do córtex cerebral, tálamo, tronco cerebral, gânglios da base, cerebelo e medula espinhal (principalmente do corno anterior) e, em alguns casos, a infecção foi detectada no bulbo olfatório e no hipocampo17. A apresentação simultânea do vírus em muitos locais do cérebro e da medula espinhal sugere que a disseminação hematogênica é uma maneira óbvia de entrar no SNC. A análise histológica de amostras de casos humanos fatais também forneceu evidências de gliose, indicando o envolvimento de células da microglia e astrócitos durante a infecção pelo WNV18

O período de incubação da doença clínica geralmente varia de dois a 14 dias, mas períodos prolongados de incubação de até 21 dias já foram observados entre pacientes imunocomprometidos. A febre do Nilo Ocidental pode variar de uma leve enfermidade, que

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dura alguns dias, até uma doença debilitante, que dura de semanas ou meses8. Os sintomas são de início súbito e geralmente incluem cefaleia, mal-estar, febre, mialgia, calafrios, vômitos, erupção cutânea, fadiga e dor ocular. A febre pode ser de baixo grau ou ausente. Uma erupção cutânea, que muitas vezes aparece na época da defervescência, tende a ser morbiliforme, maculopapular e não pruriginosa, e predomina sobre o tronco e extremidades, poupando as palmas das mãos e as plantas dos pés7

A meningite causada pelo WNV é semelhante à de outras meningites virais e é caracterizada por início abrupto de febre e dor de cabeça, juntamente a sinais meníngeos e fotofobia. A cefaleia pode ser grave, e o distúrbio gastrintestinal associado pode resultar em desidratação19. A encefalite do Nilo Ocidental varia em gravidade, desde um estado de leve confusão e autolimitado até encefalopatia grave, com coma e morte. Distúrbios extrapiramidais são frequentemente observados, e características do parkinsonismo podem ser observadas20 Pacientes com encefalite do Nilo Ocidental frequentemente desenvolvem tremor, particularmente nas extremidades superiores. A mioclonia, predominantemente nos membros superiores e músculos faciais, pode ocorrer e pode estar presente durante o sono. Ataxia cerebelar, aumento da pressão intracraniana, edema cerebral e convulsões foram descritos, mas são incomuns8.

EPIDEMIOLOGIA

As aves são os principais hospedeiros vertebrados do WNV e, em regiões endêmicas, o vírus é mantido em ciclo enzoótico entre os mosquitos Culex e aves. Espécies de mosquitos de outros gêneros também são suscetíveis à infecção. Há evidências indiretas de que o WNV é transportado por aves migratórias para as áreas temperadas da Europa durante a migração primaverill4. Os mamíferos são menos importantes que os pássaros na manutenção dos ciclos de transmissão do vírus, já que a viremia é muito baixa na maioria das espécies de mamíferos para que seja possível infectar mosquitos. Os seres humanos são considerados hospedeiros finais, visto que a concentração de vírus no sangue da espécie é insuficiente para infectar um mosquito durante o repasto sanguíneo, no entanto, em humanos, o vírus pode se espalhar entre os indivíduos por transfusão sanguínea e transplante de órgãos. Poucos relatos descrevem a possível transmissão de mãe para o recém-nascido por via intrauterina ou por amamentação21

O WNV é reconhecido como o mais difundido dos flavivírus, com distribuição geográfica nos Estados Unidos da América, Austrália, África, Eurásia e América Latina21. O maior surto de WNV na Europa, até o momento, foi na Romênia, em 1996, quando foram notificados 800 casos clínicos de doença neuroinvasiva e em 393 casos a presença de WNV foi confirmada. Um total de 17 mortes foram relatadas durante este surto22.

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Entre 1997 e 2010, na Europa, as infecções por WNV foram observadas esporadicamente em Portugal, Espanha, França, República Checa, Hungria e Itália, sem contar a ocorrência de um grave surto na Rússia em 1999 (318 casos)22. No entanto, em 2010, a situação epidemiológica mudou com o segundo maior surto da doença na União Europeia, ocorrido na Grécia. Durante este surto, 262 casos foram confirmados com 197 pacientes com doença neuroinvasiva causada por WNV e 33 casos fatais23. No mesmo ano, 480 casos de infecções por WNV foram detectados na Rússia e alguns casos foram registrados na Romênia24.

Em 1999, o WNV foi introduzido nas Américas, causando um surto em Nova York, com subsequente propagação em todo os Estados Unidos. Desde a primeira detecção nos Estados Unidos, o WNV causou mais de 12 mil casos de meningite/encefalite e mais de 1.100 casos fatais em humanos. Nos anos seguintes, o vírus se espalhou pelo Canadá, México, América Central, Caribe e América do Sul. A chegada deste vírus tropical africano à cidade de Nova York foi totalmente inesperada e capturou imediatamente a mídia, bem como a atenção científica25. Os impactos na saúde pública, veterinária e na fauna foram sem precedentes, tendo reunido diversos grupos de estudiosos para discutir aplicações de inseticidas para intervenção, além de gerado investimento em novos programas de pesquisa e saúde pública, em parte, pelo financiamento e capacidade laboratorial dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, que expandiram os programas de vigilância, testes e relatórios que rastrearam a doença26

Apesar de causar doenças em mais de 12 mil humanos, pelo menos 25 mil equídeos e centenas de milhares de aves nos Estados Unidos e no Canadá, houve apenas alguns relatos de casos de WNV no Caribe e na América Latina25. O primeiro relatório do vírus na Colômbia é 2005, após pesquisas sorológicas de equinos em área costeira no norte do país. Evidências sorológicas da atividade do WNV foram encontradas em cavalos de duas províncias colombianas, Antioquia e El Meta, localizadas nas regiões noroeste e centro-leste do país27,28

Em 2012, foi realizado o primeiro estudo em que o WNV foi isolado e caracterizado na Colômbia. Esse vírus foi encontrado em aves cativas, mas saudáveis, em uma coleção zoológica de Medellín, sugerindo a possibilidade de circulação de cepas menos virulentas na Colômbia. Há vários anos, há evidências de circulação natural de WNV na Colômbia e em outros países vizinhos. Estudos sorológicos, realizados separadamente em 2005 e 2006, sugeriram a presença do vírus nas áreas costeiras do Norte do país25. Recentemente, foram documentadas evidências sorológicas da atividade do WNV em cavalos de duas províncias centrais colombianas. Um desses locais está localizado na província de Antioquia, 30 quilômetros a sudoeste da coleção do zoológico onde foi identificada a presença do vírus em aves. Com evidências de

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WNV nas regiões central e norte do país, é provável que o vírus esteja circulando em outras regiões e possivelmente se espalhando para novas regiões29.

Um estudo realizado em 2006 isolou e detectou o WNV por técnicas moleculares na Argentina. San Antonio de Areco fornece condições ideais para a detecção de um ciclo enzoótico, uma vez que mais de 9 mil cavalos são criados lá. Cavalos são provavelmente hospedeiros acidentais no ciclo de transmissão do WNV, onde 10% a 20% das infecções resultam em doença clínica e a taxa de mortalidade em equinos varia de 28% a 45%9. Porém, mortes de aves não foram observadas nos locais afetados. Victoria, um município da província de Entre Ríos, na Argentina –o potencial local de infecção de um dos equinos estudados – fica a 100 km a sudeste da cidade do Paraná onde foram diagnosticados casos de encefalite por flavivírus humanos desde fevereiro de 2006, ainda que não tenha sido identificado o agente etiológico30

Em 2003, a Organização Pan-Americana da Saúde emitiu um alerta para epidemias da WNV em países da América do Sul. Evidências sorológicas da circulação viral entre equinos e aves foram encontradas nas regiões do Pantanal e Amazônia brasileira entre 2002 e 2013. Apesar desses resultados, nenhum caso de doença sintomática por WNV havia sido relatado em nenhuma espécie animal ou em humanos no Brasil, e poucos casos de encefalite pelo vírus Saint Louis (SLEV) foram reconhecidos no Brasil. Em dezembro de 2014, a OMS anunciou a confirmação da primeira infecção humana por WNV no Brasil10, caso com características pouco claras. A doença não ocorreu no contexto da morbidade equina ou aviária notificada, ou de um surto de doença febril aguda humana ou síndrome neuroinvasiva, além disso, o interior do estado do Piauí está localizado longe das regiões onde a soropositividade equina foi detectada. No entanto, um programa regional de vigilância da encefalite viral aguda humana já havia sido iniciado quando o paciente foi internado, e um protocolo para investigação de encefalite foi aplicado31.

Por fim, em 2018, foi relatado o primeiro isolado do WNV no Brasil a partir de uma amostra de SNC de um equino, coletado em uma área rural do estado do Espírito Santo10

A análise filogenética do genoma completo mostrou que este isolado de WNV está incluído na linhagem 1a, que compreende cepas isoladas da Europa, África e Américas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta revisão mostra a importância de se conhecer sobre a doença causada pelo WNV e enfatiza que uma vigilância ativa pode permitir a detecção precoce da introdução e dispersão de vírus exóticos ou a ocorrência endêmica de doenças potencialmente alarmantes dentro de uma região.

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A epidemiologia do WNV evidencia que conhecer a distribuição espaçotemporal, patogenia e manifestações clínicas é de suma importância. Desta maneira, os estudos sobre WNV, auxiliam no desenvolvimento de ferramentas para determinação e entendimento dos múltiplos ciclos epidemiológicos e o potencial de transmissão interespécies, desta forma, pesquisas sobre WNV possibilitam o reconhecimento de questões associadas à transmissão, estratégias e elaboração de medidas de controle e prevenção do WNV.

Programas de vigilância baseados na comunidade são fundamentais, particularmente em áreas com histórico de circulação do vírus, existência do vetor competente e populações humanas suscetíveis.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Taiana Andrade Freitas, Érika Dayane Leal Rodrigues e Matheus Moreira Reis.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Taiana Andrade Freitas e Érika Dayane Leal Rodrigues.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Taiana Andrade Freitas, Érika Dayane Leal Rodrigues e Matheus Moreira Reis.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Taiana Andrade Freitas, Érika Dayane Leal Rodrigues e Matheus Moreira Reis.

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Recebido: 21.3.2019. Aprovado: 9.3.2021.

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ARTIGO DE REVISÃO

ESTUDO SOBRE A QUALIDADE DA ÁGUA PARA CONSUMO HUMANO E AS DOENÇAS DIARREICAS NO BRASIL

Bruno Oliveira Souza e Silvaa

http://orcid.org/0000-0001-9229-1164

Alexandre Sylvio Vieira da Costab

http://orcid.org/0000-0001-7251-7816

Resumo

A doença diarreica aguda (DDA) está entre as mais comuns no mundo, acometendo pessoas de todas as idades, mas causando óbitos principalmente em crianças. É a segunda causa de morte em crianças nos países subdesenvolvidos devido à dificuldade de acesso à água potável e à ausência de saneamento básico. A quantidade e qualidade da água disponível relacionam-se à qualidade de vida dos seres humanos. Nas últimas décadas, verifica-se um declínio no número de mortes por diarreia no mundo e no Brasil. Objetivou-se com esse trabalho analisar a relação da qualidade da água de consumo e as doenças diarreicas agudas no país. Foram avaliados estudos sobre o tema e exposição dos direcionamentos de ações futuras que podem impactar positivamente na redução da doença. O método utilizado foi a revisão de literatura a partir das bases de dados MEDLINE , SciELO e LILACS , focada em estudos observacionais correlacionando qualidade da água e saneamento básico com prevalência dos casos de diarreia aguda. A maioria dos artigos demonstrou que investimentos em saneamento básico apresentam bons resultados, e que fatores socioeconômicos influenciam no risco de adoecimento. Sendo assim, maiores investimentos e ampliação das ações de vigilância relacionada à água para consumo, com o padrão de potabilidade estabelecido na legislação, contribuem para a redução da ocorrência de doenças diarreicas.

Palavras-chave: Diarreia aguda. Qualidade da água. Saneamento básico.

a Bacharel em Farmácia. Mestrando no Programa de ensino em Saúde da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Servidor da Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais. Teófilo Otoni, Minas Gerais, Brasil.

E-mail: brunotokaia@yahoo.com.br

b Engenheiro Agrônomo. Doutor em Fitotecnia. Docente de Recursos Hídricos na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Teófilo Otoni, Minas Gerais, Brasil. E-mail: alexandre.costa@ufvjm.edu.br

Endereço para correspondência: Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Rua do Cruzeiro, n. 1, Jardim São Paulo. Teófilo Otoni, Minas Gerais, Brasil. CEP. 39803-371. E-mail: alexandre.costa@ufvjm.edu.br

119 v. 43, n. 4, p. 119-134 out./dez. 2019 119 DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2979
Revista Baiana de Saúde Pública

STUDY ON DRINKING-WATER QUALITY AND DIARRHEAL DISEASES

Abstract

Acute diarrheal disease is one of the most common illnesses worldwide, affecting people of all ages and causing deaths mainly in children. This disease is the second leading cause of death in children from underdeveloped countries due to challenges in accessing drinking water and basic sanitation, indicating a close association between water quantity and quality and the quality of life of human beings. Over recent decades, the number of deaths from diarrhea decreased in Brazil and the world. This work sought to analyze the association between the quality of drinking water and acute diarrheal diseases. For that, a literature review was conducted in the MEDLINE, SciELO, and LILACS databases for observational studies correlating water quality and basic sanitation with the prevalence of cases of acute diarrhea, as well as for those approaching directions for future actions that help reducing the disease incidence. Most articles show that socioeconomic factor influence the risk of illness, and that investments in basic sanitation show good results for coping with it. Therefore, reducing the incidence of diarrheal diseases requires greater investments and expansion of surveillance actions related to drinking water, according to the standards established in legislation.

Keywords: Acute diarrhea. Water quality. Sanitation.

ESTUDIO SOBRE LA CALIDAD DEL AGUA POTABLE Y LAS ENFERMEDADES DIARREICAS EN BRASIL

Resumen

La enfermedad diarreica aguda es una de las afecciones más comunes en el mundo, afecta a personas de todas las edades y causa muertes principalmente en niños. Es la segunda causa de muerte infantil en los países subdesarrollados debido a la dificultad para acceder al agua potable y la falta de saneamiento básico. La cantidad y calidad del agua están relacionadas con la calidad de vida de los seres humanos. En las últimas décadas ha habido una disminución en el número de muertes por diarrea en el mundo y en Brasil. El objetivo de este trabajo fue analizar la relación entre la calidad del agua potable y las enfermedades diarreicas agudas. Se evaluaron estudios sobre el tema y exposición de los rumbos para acciones futuras que impacten positivamente en la reducción de la enfermedad. El método utilizado fue la revisión de la literatura en las bases de datos MEDLINE, SciELO y LILACS, enfocada en

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estudios observacionales que correlacionan la calidad del agua y el saneamiento básico con la prevalencia de casos de diarrea aguda. La mayoría de los artículos han demostrado que las inversiones en saneamiento básico tienen buenos resultados y que los factores socioeconómicos influyen en el riesgo de la enfermedad. Así mayores inversiones y ampliación de las acciones de vigilancia relacionadas con el agua potable, con el estándar de consumo establecido en la legislación, contribuyen a la reducción de las enfermedades diarreicas. Palabras clave: Diarrea aguda. Calidad del agua. Sanidad básica.

INTRODUÇÃO

Desde a Antiguidade, a relação entre saúde e saneamento desperta interesse científico, sendo uma importante fonte de estudos para ações que envolvem a promoção de saúde e a prevenção de doenças, principalmente as que são transmitidas por meio hídrico. O Norte da Índia é um bom exemplo dessa correlação. Foram encontradas ruínas de uma civilização de aproximadamente 4.000 anos com evidências de práticas higiênicas, incluindo a presença de banheiros, sistemas de coleta de esgoto sanitário nas construções e drenagem nas ruas. Há relatos que os egípcios, na Antiguidade, armazenavam água por determinado tempo para decantação dos resíduos e posterior filtração, mesmo não tendo comprovação científica de que a água continha microrganismos causadores de doenças. Além disso, já dominavam a tecnologia de sistemas de drenagem de água e aquedutos1.

Por volta de 1850, o médico John Snow relacionou a qualidade da água consumida pela população da cidade de Londres com a transmissão da cólera. Snow foi o primeiro cientista/ pesquisador que realizou esse tipo de análise e comprovou que alguns bairros da capital inglesa eram abastecidos por fontes de água contaminadas pelas descargas do esgoto doméstico. Esses bairros apresentavam uma taxa de mortalidade por cólera até seis vezes maior em relação às demais regiões da cidade que também recebiam a água desse rio, entretanto eram abastecidas antes do escoamento dos resíduos do esgoto residencial2.

A qualidade e a quantidade de água estão diretamente relacionadas à qualidade de vida dos seres humanos, e são fatores importantes para o estabelecimento da saúde. A água usada para abastecimento doméstico, principalmente para o consumo humano, deve estar livre de microrganismos patogênicos nocivos à saúde e ter propriedades sanitárias e toxicológicas adequadas3,4

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Revista Baiana de Saúde Pública

A principal forma de transmissão de doenças de veiculação hídrica é a rota fecaloral, principalmente por meio de microrganismos patogênicos de origem entérica – animal ou humana –, provenientes do uso de água ou alimento contaminado5

A doença diarreica aguda (DDA) é uma das doenças mais comuns em crianças em todo o mundo, caracterizando-se pelo aparecimento abrupto. É importante ressaltar que a diarreia atinge pessoas de qualquer faixa etária, mas é na infância que esta afecção causa maior mortalidade. Ela figura como a terceira causa mais comum de doenças em crianças dos países em desenvolvimento e é responsável por cerca de um terço de todas as hospitalizações entre os menores de cinco anos.6:225

Esse artigo se justifica pela relevância da temática, pois a diarreia ainda se configura como um grave problema de saúde pública no que tange às condições de higiene e à qualidade da água utilizada. A desidratação é uma das piores complicações da diarreia.

Os adultos têm maior resistência, porém idosos e crianças apresentam mais facilidade de chegar a essa condição, que leva à perda de sais minerais importantes para o equilíbrio do organismo.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) corroboram tal ponto ao afirmar que 4,5 mil crianças com menos de cinco anos de idade morrem diariamente, no mundo, principalmente por decorrência de desidratação. É a segunda causa de morte mais comum entre crianças de países subdesenvolvidos, devido à dificuldade de acesso à água potável e à ausência de saneamento básico7,8. No Brasil, aproximadamente 20 milhões de habitantes da zona urbana não têm acesso à água e a condições básicas de saneamento, cenário que contribui para a transmissão de doenças de veiculação hídrica, principalmente a doença diarreica aguda (DDA). Essa situação torna o Brasil um dos países mais afetados por tal doença. Aproximadamente 50 mil crianças menores de um ano morrem anualmente em decorrência da diarreia. O impacto é gigantesco, representando a principal causa de internação no período de 1996 a 2003 no país, com média de 90% do total das internações por doenças relacionadas ao saneamento ambiental inadequado. A prevalência da doença nos estados do Nordeste chega a 15,4%, representando a segunda maior causa de consultas médicas, atrás somente das doenças respiratórias agudas1

Nas últimas décadas ocorreram melhorias em relação à infraestrutura em saneamento, sobretudo da qualidade da água consumida pelos humanos, contribuindo com a redução do número de mortes por diarreia no mundo. O Brasil segue essa tendência, registrando queda nas taxas de mortalidade. Porém, mesmo com essas melhorias, o número de

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mortes pelas DDA ainda é alto, sendo necessário tratar esse tema de grande relevância para que deixe de configurar um quadro de problema de saúde pública9.

Sendo assim, este trabalho objetivou realizar uma revisão bibliográfica acerca da relação da qualidade da água para consumo humano e as doenças diarreicas agudas, bem como discutir essa relação e seu impacto na saúde pública, destacando as ações que promovem redução dos casos das DDA.

MATERIAIS E MÉTODOS

Visando aprofundar o conhecimento sobre o tema e ao mesmo tempo evidenciar novas informações, o trabalho se propôs a realizar uma revisão de literatura não sistemática nas bases de dados MEDLINE, SciELO e LILACS, plataformas on-line com grande acervo de fontes científicas (artigos, teses, dissertações). Foram analisados artigos publicados entre 2002 e 2017. As palavras-chave utilizadas na busca foram: “qualidade da água”, “saneamento básico”, “saneamento básico e epidemias”, “diarreia” e “diarreia aguda”. A busca foi focada nos termos (“qualidade da água” or “saneamento básico”) and (diarreia or “diarreia aguda”), “saneamento básico e epidemias” and (diarreia or “diarreia aguda”).

O levantamento bibliográfico focou em estudos observacionais de correlação que apresentavam relação entre qualidade da água e saneamento básico e a prevalência de casos de diarreia aguda. Foram incluídos também estudos longitudinais que analisaram a incidência de DDA nas áreas desprovidas de saneamento básico, estudos de coorte transversal que identificavam a prevalência dos casos de doenças diarreicas agudas e estudos de revisão da literatura sobre o tema proposto.

Os trabalhos foram analisados pelos autores desta pesquisa, que após a leitura dos resumos, selecionaram os estudos que atendiam aos critérios de admissão. Posteriormente, todas as fontes científicas foram analisadas na íntegra. Cada artigo foi avaliado quanto à qualidade metodológica e relevância para o presente estudo. O critério adotado, portanto, foi a avaliação de informações pertinentes ao tema explanado e a probabilidade de comparação com os demais estudos.

RESULTADOS

A partir da busca pelas palavras-chave “qualidade da água”, “saneamento básico e epidemias”, “diarreia” e “diarreia aguda”, foram identificados 19 artigos sobre o tema. Porém, após a leitura dos títulos e resumos, seis foram descartados, já que não apresentavam correlação direta entre a qualidade da água para consumo humano e as doenças diarreicas humanas.

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Dessa forma, foram analisados 13 artigos, que apresentaram enfoque e metodologias que demonstravam tal relação.

No Quadro 1, são apresentados os artigos que foram selecionados e suas autorias, descritas em forma de citação. Foram observados a metodologia e os resultados de cada estudo, com maior ou menor enfoque sobre a relação da qualidade da água para consumo humano e as doenças diarreicas.

Quadro 1 – Relação de publicações com autoria e títulos das pesquisas. Teófilo Otoni, Minas Gerais – 2019

Autores Título da pesquisa

1 Silva, Lira, Lima, 200410 Fatores de risco para doença diarreica no lactente: um estudo caso-controle.

2 Teixeira, Heller, 200511 Fatores ambientais associados à diarreia infantil em áreas de assentamento subnormal em Juiz de Fora, Minas Gerais.

3 Pereira, Cabral, 20086 Diarréia aguda em crianças menores de um ano: subsídios para o delineamento do cuidar.

4 Moutinho, Hacon, Bruno, 200912 Qualidade da água de abastecimento, Estratégia Saúde da Família e incidência de diarréia: uma abordagem em dois bairros do município de Paraty-RJ.

5 Queiroz, Heller, Silva, 20092 Análise da correlação de ocorrência da doença diarreica aguda com a qualidade da água para consumo humano no município de Vitória-ES.

6 Priester, Seidel, 200913 Avaliação da relação da qualidade microbiológica da água de consumo no município de Santa Cecília e doenças veiculadas por água contaminada.

7 Joventino, Silva, Rogerio et al., 20108 Comportamento da Diarreia Infantil Antes e Após Consumo de Água Pluvial em Município do Semiárido Brasileiro.

8 Teixeira, Gomes, Souza, 20111 Análise da associação entre saneamento e saúde nos estados brasileiros –estudo comparativo entre 2001 e 2006.

9 Meisen, Bohn, Tavares et al., 20117 Análise de Correlação da Ocorrência de Doenças Diarreicas Agudas (DDA) com a Qualidade da Água Para Consumo Humano no Município de Pouso Redondo-SC.

10 Moutinho, Carmo, 201114 Doença Diarreica e Condições de Saneamento da População Atendida pelo Programa Saúde da Família no Município de Lima Duarte-MG.

11 Luna, Brito, Costa et al., 20119

12 Rasella, 201315

13 Imadai, Araújo, Muniz et al., 201616

Fonte: Elaboração própria.

Impacto do uso da água de cisternas na ocorrência de episódios diarreicos na população rural do agreste central de Pernambuco, Brasil.

Impacto do Programa Água para Todos (PAT) sobre a morbi-mortalidade por diarreia em crianças do Estado da Bahia, Brasil.

Fatores socioeconômicos, higiênicos e de saneamento na redução de diarreia na Amazônia.

O primeiro estudo analisado foi realizado com base nas informações sobre crianças nascidas a termo e recrutadas nas maternidades das cidades da Zona da Mata Meridional, sul de Pernambuco, de janeiro de 1993 a janeiro de 1994. O desenho adotado para tal estudo foi do tipo caso-controle, aninhado em uma coorte. Os autores perceberam que, em relação à qualidade da água consumida, houve maior ocorrência de doença diarreica entre as crianças que viviam em domicílios sem canalização para a água. A ausência de água encanada foi

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a variável que se mostrou mais forte em relação à presença de diarreia, sendo considerada o fator de risco mais importante. Os autores demonstraram que, para explicar a ocorrência de casos de diarreia adequadamente, é necessário se basear num modelo de multicausalidades, e que as características de cada população estudada determinarão a importância de cada fator10.

Em outra pesquisa, foram selecionados 29 assentamentos em Juiz de Fora (MG), com população estimada em 12 mil pessoas, e aplicados 655 protocolos de entrevista para caracterizar a morbidade por diarreia e identificar os fatores associados em crianças. O resultado obtido foi que, em relação à origem da água de consumo, aquelas provenientes de mina ou de nascente indicaram risco significativo para diarreia, 2,5 vezes maior do que a água fornecida pelo sistema público11.

Pereira e Cabral6, ao pesquisarem um universo de 900 famílias (136 com crianças menores de um ano) da Comunidade Jardim Nova Vida (PA), cadastradas no Programa Saúde da Família (PSF), concluíram que em relação ao saneamento básico, os domicílios tinham cobertura insatisfatória da rede pública de água e não dispunham de acesso ao serviço de esgoto sanitário6. Aproximadamente um terço dessa população recorre a poços a céu aberto, sem proteção e ao mesmo nível do sanitário, o que contribui com o agravo à saúde e aumenta a possibilidade de ocorrência de casos de DDA. Analisando as condições microbiológicas da água oferecida à população de dois bairros do município de Paraty (RJ), no período de agosto de 2003 a julho de 2004, Moutinho e Hacon12 verificaram, a partir de dados disponibilizados pela Secretaria de Saúde do município, que entre 70% e 80% dos casos de diarreia ocorreram em meses nos quais a água de abastecimento estava imprópria para consumo12

Os pesquisadores Queiroz, Heller e Silva analisaram a qualidade da água na cidade de Vitória (ES). As informações foram obtidas a partir dos dados do Controle de Qualidade de Água (CQA), fornecidos pela Companhia Espírito Santense de Saneamento (Cesan); dados do Programa VigiÁgua e dos registros de diarreia do Programa de Monitorização das DDA (MDDA) realizados pela Vigilância Epidemiológica da Secretaria Municipal de Saúde da cidade. Na análise multivariada para os pontos do VigiÁgua, utilizando dados desse programa e do MDDA referentes ao ano de 200412, foram encontradas correlações altas. Isso aponta para a associação estatística da qualidade da água distribuída à população de Vitória pelo sistema público com a ocorrência de diarreia em toda a cidade. Contudo, ao se comparar espacialmente os resultados das análises multivariadas dos programas de qualidade da água CQA e VigiÁgua, verificou-se que os resultados não são os mesmos.

Os pesquisadores Priester e Seidel13 analisaram resultados microbiológicos da água distribuída em Santa Cecília (SC), somados aos dados das doenças transmitidas pela água

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no mesmo período fornecidos pela Vigilância Epidemiológica do município. Foram estudadas 20 amostras de água de diferentes pontos da rede de distribuição de Santa Cecília, no período de janeiro de 2008 a janeiro de 2009, com resultados que demonstraram a possível relação da qualidade da água com as doenças diarreicas13. As semanas nas quais as amostras apresentaram resultados com presença de coliformes totais e E. coli foram as com os maiores números de casos de doença diarreica.

Comparando a ocorrência de internações por diarreia em crianças entre 2000 e 2007 e a construção de cisternas em Canindé (CE), no mesmo período, a taxa de DDA passou de 43,3 para 17,37. O número de cisternas passou de zero, em 2000, para 102 no ano de 2007, configurando uma correlação linear inversamente proporcional. Os critérios de inclusão para o estudo foram: possuir cisterna do Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) e o representante da família, participante do curso de Gestão de Recursos Hídricos, estar no domicílio no momento para ser entrevistado. Além disso, foi consultado o Sistema de Informações de Vigilância Epidemiológica – DDA de Canindé, o banco de dados do Centro de Pesquisa e Assessoria e a organização não-governamental responsável pela implementação do P1MC no município.

Entre 2001 e 2006, pesquisadores testaram a hipótese de que a ampliação da cobertura de serviços de saneamento básico foi um investimento importante para a melhoria nos indicadores de saúde dos estados brasileiros1. A base de dados foi composta por informações secundárias provenientes da publicação “Indicadores e Dados Básicos para a Saúde 2008”, editada pela Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA). Observou-se que, nesse período, houve redução de 11,4% na mortalidade proporcional por DDA entre menores de cinco anos de idade, assim como um decréscimo de 5,45% para 4,92% na taxa de mortalidade proporcional por doenças infecciosas e parasitárias para todas as idades, ou seja, uma redução percentual de 9,7%.

Ao pesquisar a ocorrência de DDA em relação à qualidade da água em Pouso Redondo (SC), Meisen, Bohn, Tavares e colaboradores concluíram que a faixa etária com maior número de registros de casos de diarreia foi a dos maiores de 10 anos de idade, porém, a incidência de casos foi maior na faixa etária dos menores de um ano de idade. Na análise de correlação entre os registros de casos de DDA e a qualidade físico-química da água distribuída, verificou-se que não existe correlação entre os dados utilizados no estudo em questão7

No artigo de Moutinho e Carmo14, verificou-se a associação entre DDA e saneamento em Lima Duarte (MG), de 2004 a 2006. Os dados utilizados no estudo foram

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provenientes do Sistema de Informação da Atenção Básica (Siab), referentes às condições de saneamento, e do Monitoramento das Doenças Diarreicas Agudas (MDDA). Foi constatado que as condições de saneamento da zona urbana (abastecimento de água, esgoto e coleta de resíduos sólidos) apresentaram números superiores aos da zona rural.

Analisando a microrregião Agreste Central de Pernambuco, no que se refere a casos de DDA e sua correlação com a existência ou não de cisternas nas residências do município, Luna, Brito, Costa9 e colaboradores verificaram que os 949 indivíduos com cisternas obtiveram uma redução de risco referente a episódios diarreicos de 73%, quando comparados aos 816 indivíduos sem cisternas. O número médio de casos registrados nos residentes de domicílios sem cisternas foi de 0,48 por mil, contra 0,08 por mil habitantes nos domicílios com cisternas. A duração média dos episódios foi 1,5 vez maior nos domicílios sem cisternas.

Rasella estudou 224 municípios baianos com o intuito de avaliar o impacto do Projeto Água para Todos (PAT) sobre a taxa de mortalidade e internações por diarreia e mortalidade geral entre menores de cinco anos. Verificou-se que todos os serviços tiveram um efeito redutor na mortalidade, incluindo o aumento do número de domicílios ligados à rede de água. Observou também que os municípios com cobertura de abrangência superior a 10% tiveram uma redução de 39% na mortalidade por diarreia, de 14% na taxa de mortalidade entre menores de cinco anos e de 6% nas internações hospitalares, em comparação com municípios sem cobertura ou com índice de cobertura menor15

Por fim, a pesquisa realizada por Imadai, Araújo, Muniz e colaboradores16, através de um estudo transversal de base populacional, utilizou dados de dois inquéritos realizados no município de Jordão (AC), em 2005 e 2012. Foram avaliadas, respectivamente, 466 e 826 crianças menores de cinco anos das áreas urbana e rural em relação às características dos domicílios, do saneamento ambiental e de saúde, cujas informações foram obtidas por aplicação de questionários. Comparando o inquérito de 2005 ao de 2012, a prevalência de diarreia foi reduzida de 45,1% (IC95% 40,5–49,7) para 35,4% (IC95% 32,1–38,7), respectivamente. Em relação à qualidade à procedência da água consumida, nos dois inquéritos foram identificadas maiores probabilidades de desenvolvimento de diarreia entre as crianças que não utilizavam água da rede pública de abastecimento. Em 2005, esse risco foi 1,38 maior e, em 2012, 1,60 maior, quando comparados às crianças que não utilizavam água de poço16.

No próximo item, realizamos uma breve discussão sobre todos os estudos de forma correlacionada. Inserirmos novos autores no debate, que corroboram e confrontam as pesquisas analisadas, a fim de contribuir e enriquecer este estudo.

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DISCUSSÃO

Foi possível observar que a maioria dos artigos selecionados apresentou resultados que demonstram a relação da qualidade da água para o consumo humano com as doenças diarreicas agudas. Além dos fatores de saneamento, que incluem a qualidade da água, os determinantes das DDA abrangem questões de moradia, nutricionais, sociais, culturais, econômicas e de acesso a serviços de saúde, entre outros. Percebe-se, então, que a falta de infraestrutura, até mesmo por conta das condições socioeconômicas de grande parcela da população, contribui negativamente para a incidência da diarreia. Além disso, as condutas e a falta de conhecimento sobre a prevenção das DDA podem estar atreladas aos principais agravos e causas de mortes, principalmente entre crianças6

Corroborando o que foi dito anteriormente sobre a condições da água utilizada para o consumo humano, cinco artigos, direta ou indiretamente, relacionam investimentos em infraestrutura de saneamento básico com a diminuição nas taxas de morbimortalidade por DDA, comparando os números de incidência da enfermidade antes e após a implementação de medidas/programas com intuito de avançar no quesito saneamento.

No Brasil, o saneamento básico é um direito assegurado pela Constituição e definido pela Lei 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, definido como o conjunto dos serviços, infraestrutura e instalações de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana, drenagem urbana, manejos de resíduos sólidos e de águas pluviais.16:2

Da mesma forma, a Lei nº 8080/1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, reconhece em seu terceiro artigo que a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, o saneamento básico. Logo, houve o reconhecimento legal da existência de uma relação de causalidade entre condições inadequadas de saneamento básico e os problemas de saúde pública1

O artigo de Teixeira, Gomes e Souza 1 destaca ainda o aumento de investimentos em saneamento básico no Brasil a partir de 2003, oriundos dos mais variados recursos do Orçamento Geral da União (OGU), Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No estudo, com base nos Indicadores e Dados Básicos de 2003 e 2008, foram encontradas correlações diretamente proporcionais entre mortalidade por DDA em menores de cinco anos entre a população mais carente e os gastos com saneamento. Diversos trabalhos denotam a estreita relação entre saneamento e saúde, corroborando e demonstrando que os estados brasileiros com melhores indicadores

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de saúde e menores taxas de mortalidade e morbidade são aqueles com os maiores índices de cobertura por rede de abastecimento de água 1,17 .

Algumas pesquisas apontam que há desproporcionalidade no acometimento por doenças propagadas por meio hídrico, sendo as populações mais carentes as mais vulneráveis. Além disso, as expectativas de melhorias no saneamento básico dependem da condição socioeconômica da região contemplada. Alguns autores tratam das consequências da falta de infraestrutura, de água encanada e de instalações sanitárias, e dos impactos gerados quando há melhorias nos serviços de saneamento básico, principalmente em áreas de maior vulnerabilidade, no que tange às taxas de mortalidade e hospitalizações por diarreia12-15.

Os dois trabalhos que analisaram o P1MC demonstraram impacto positivo do programa e diminuição das taxas de risco de episódios diarreico, confirmando que essa tecnologia é um fator de proteção na ocorrência da enfermidade. Tal tecnologia demonstrou que a água da chuva captada pelo telhado, aliada a uma boa manutenção para minimizar os riscos de contaminação, consegue fornecer água de boa qualidade microbiológica e físicoquímica em áreas mais pobres e desprovidas de saneamento8,9.

Em relação aos resultados da pesquisa de Moutinho e Carmo14, as condições urbanas de abastecimento de água, esgoto e coleta de resíduos sólidos são superiores às da zona rural. Barcellos18 afirma em seu artigo que não há como combater as patologias de veiculação hídrica sem um olhar aprofundado para as comunidades rurais, pois são sabidamente negligenciadas em relação aos centros urbanos18. Esse autor não encontrou correlação entre o saneamento e as DDA. O MDDA considera que as doenças diarreicas estão entre as principais patologias que desequilibram a saúde da população infantil do Brasil, e mesmo assim, os dados sobre a doença são mascarados, pois não se trata de uma doença de notificação compulsória, o que gera subnotificações. Calcula-se que o número de casos é muito maior do que o registrado. Em outros artigos, os resultados usados para demonstrar a relação da qualidade da água com as doenças diarreicas agudas foram obtidos através de dados das análises microbiológicas e/ou físico-químicas realizadas em amostras de água4,7,13

A Portaria nº 2.914, de 12 de dezembro de 2011, que dispõe sobre os procedimentos de controle e de vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade, afirma que “[t]oda água destinada ao consumo humano, distribuída coletivamente por meio de sistema ou solução alternativa coletiva de abastecimento de água, deve ser objeto de controle e vigilância da qualidade da água”19. Para tal, o documento define parâmetros microbiológicos e físico-químicos que garantem a potabilidade da água. Define ainda que a responsabilidade pelo controle de qualidade da água distribuída é da empresa prestadora

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de serviço de abastecimento público de água, ou do responsável pela solução alternativa coletiva de abastecimento, e que fica a cargo do setor de saúde pública a responsabilidade de exercer a vigilância da qualidade da água.

O Programa Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental relacionada à qualidade da água para consumo humano (VigiÁgua), implementado no Brasil no início do século 21, é composto por conjunto de ações executadas pelo setor de saúde pública com o objetivo de garantir que a água consumida pela população atenda ao padrão e às normas estabelecidas na Portaria nº 2.914/2011. A atividade de vigilância deve ser rotineira e preventiva, com o propósito de identificar os fatores de riscos à saúde humana relacionados à água e reduzir a possibilidade de adoecimento pelas enfermidades de transmissão hídrica20

Sobre os artigos que analisam a correlação de ocorrência da DDA com a qualidade da água para consumo humano, os autores Queiroz, Heller e Silva4 apontam que há associação estatística no município de Vitória (ES). Dessa forma, ressaltamos a importância do monitoramento/ vigilância da qualidade da água pelo setor de saúde, ação que se configura como um mecanismo de controle essencial para garantir a qualidade do abastecimento para a população21.

Meisen, Bohn, Tavares e colaboradores7 seguiram a mesma linha e apontaram que não houve correlação entre os registros de casos das DDA e a qualidade físico-química da água distribuída para a população de Pouso Redondo, em Santa Catarina7. No estudo de Carmo22, as variáveis de ocorrência de diarreia em crianças menores de dois anos e a qualidade da água também não apresentaram associações nítidas, porém, o autor afirma que todos os sistemas de abastecimento analisados apresentaram deficiências na amostragem e padrão de potabilidade preconizados pela legislação22.

Em suas pesquisas, Moutinho, Hacon e Bruno12 verificaram que a incidência de diarreia foi maior quando a qualidade da água estava fora dos padrões de potabilidade exigidos, porém, essa variável não foi o único determinante. A incidência da doença em um bairro com maior cobertura pelo PSF e pior qualidade de água foi menor que em outro bairro com menor cobertura pelo PSF e melhor qualidade da água distribuída12. Os municípios com cobertura maior ou igual a 70% pelo PSF reduziram a mortalidade por diarreia em até 61%, com diminuição significativa do número de hospitalizações por essa causa15.

Sobre os resultados obtidos por Priester e Seidel13, não ficou claro se as amostras coletadas correspondiam às ações referentes à vigilância da qualidade da água para consumo humano, mas os parâmetros testados (cloro residual, pH, características organolépticas, características físico-químicas e características microbiológicas) eram similares13. O estudo não conseguiu relacionar a qualidade da água com os casos de diarreia, pois mesmo demonstrado em laudos que vários bairros apresentaram

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água fora do padrão exigido, os dados sobre as doenças diarreicas não foram estratificados por bairro. Além do mais, não foram expressos no estudo os números epidemiológicos de outros períodos para uma posterior comparação, o que prejudicou a relação entre as duas variáveis.

Em três estudos aqui analisados, a relação entre as DDA e a qualidade da água consumida foi encontrada e entendida como um dos principais fatores de risco para o adoecimento. Foi demonstrado anteriormente que as diarreias têm origem multifatorial, mas a temática do saneamento básico, principalmente da qualidade da água consumida pela população, pode ser considerada um dos pilares da cadeia da doença6,10,11.

Podemos observar, a partir desses estudos, que ainda existem muitos domicílios, principalmente na zona rural, cuja infraestrutura está defasada, abaixo do recomendado em relação à rede pública de água e esgotamento sanitário. A utilização da água de poços a céu aberto, sem nenhuma proteção, é realidade para muitas pessoas. Muitas vezes, essas fontes de água são próximas de sanitários, configurando um ambiente propício para o risco de DDA. A situação é ainda mais grave em moradias com ligações clandestinas à rede de água e esgoto, nas quais não há manipulação adequada de higiene, aumentando o risco de contaminação da água por dejetos. Os desafios de saúde pública no Brasil em relação às patologias de veiculação hídrica são grandes. Todo esforço na prevenção da DDA é necessário. Mesmo tendo havido um forte declínio nas taxas de mortalidade no país nos últimos anos, os casos de morbidade diminuem em ritmo muito lento. Logo, a educação em saúde precisa ser mais trabalhada nas escolas, focadas principalmente na prevenção e disseminação de medidas sanitárias.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A quantidade e a qualidade da água consumida estão intimamente ligadas à nossa saúde. Essa relação já era observada desde a Antiguidade, mas foi na metade do século 19 que estudos vincularam uma maior taxa de mortalidade por cólera – até seis vezes maior – a uma região de Londres onde a água consumida pela população era de pior qualidade.

O saneamento básico é um direito assegurado no Brasil, entretanto, aproximadamente 20 milhões de habitantes da área urbana não têm acesso à água e a condições mínimas de saneamento, favorecendo a transmissão de doenças de veiculação hídrica. Nesse contexto, as DDA figuram entre as principais causas de morte evitável em crianças, matando mais de 4,5 mil menores de cinco anos diariamente no mundo e alcançando o posto de segunda causa de morte para essa faixa etária nos países subdesenvolvidos.

Observamos que, apesar de os números das DDA ainda serem preocupantes, as taxas de mortalidade no mundo e no Brasil apresentaram queda nas últimas décadas. Neste

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trabalho, buscou-se realizar uma revisão bibliográfica sobre a relação da qualidade da água de consumo humano e as DDA, com o intuito de demonstrar as ações que mais estão impactando na mudança desse quadro.

Um dos fatores elencados são os programas e investimentos em saneamento básico. Alguns artigos aqui analisados demonstraram grandes avanços e uma considerável baixa na morbimortalidade por DDA com a ampliação da cobertura de abastecimento de água e demais serviços de saneamento básico. Experiências exitosas foram comprovadas na última década, sobretudo na região Nordeste. Medidas simples, como o programa de captação de água da chuva, têm contribuído para fornecer um abastecimento de melhor qualidade para as regiões semiáridas, proporcionando melhora do quadro de uma área que sofre com a escassez desse líquido fundamental para a manutenção da vida humana.

Outro importante ponto demonstrado foi que as DDA devem ser observadas sob um olhar multifocal, e que os investimentos para o combate a esse problema devem ser entendidos da mesma forma. As altas taxas de mortalidade e morbidade por doença diarreica aguda não podem ser devidamente esclarecidas com base apenas em variáveis fixas. Fatores socioeconômicos, como a qualidade da moradia, renda, nível de escolaridade da mãe, acesso ao serviço de saúde, dentre outros, influenciam diretamente o risco de adoecer por diarreia. Foi comprovado também que áreas com maior cobertura da atenção primária, sobretudo do Programa Saúde da Família, conseguiram melhorar as estatísticas da doença.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Bruno Oliveira Souza e Silva e Alexandre Sylvio Vieira da Costa.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Bruno Oliveira Souza e Silva e Alexandre Sylvio Vieira da Costa.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Bruno Oliveira Souza e Silva e Alexandre Sylvio Vieira da Costa.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Bruno Oliveira Souza e Silva e Alexandre Sylvio Vieira da Costa.

REFERÊNCIA

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22. Carmo RF. Vigilância epidemiológica e vigilância da qualidade da água para consumo humano. Desafios para o município: estudo de caso em Barbacena/ MG. [dissertação] [Internet]. Viçosa (MG): Universidade Federal de Viçosa; 2005 [citado em 2018 jan 10]. Disponível em: http://www.locus.ufv.br/ handle/123456789/5024

Recebido: 12.3.2019. Aprovado: 19.3.2021.

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ARTIGO DE REVISÃO

CUIDANDO DO PRAZER NO PRÉ-NATAL: DISFUNÇÃO SEXUAL NA GRAVIDEZ

Maria da Conceição Costa Rivemalesa

https://orcid.org/0000-0001-7773-4772

Mary do Valle Boz Lacavab

Resumo

Durante a gravidez, o exercício da sexualidade pode sofrer alterações, o que gera insegurança e prejudica diretamente a resposta sexual. Este estudo visa investigar a produção bibliográfica sobre a ocorrência de disfunção sexual durante a gravidez. Trata-se de uma pesquisa exploratória e de caráter bibliográfico, realizada nas bases BVS, LILACS e SciELO. Foram incluídos artigos disponíveis on-line na íntegra, escritos no idioma português, com afiliação no Brasil. Utilizou-se como descritores: “gravidez”, “sexualidade” e “cuidado pré-natal”. A gestação interfere nas alterações da função sexual e, consequentemente, no desenvolvimento da disfunção sexual, sendo que as mulheres grávidas evitam a relação sexual principalmente por medo de sentir dor, temor de prejudicar o feto, mal-estar, desconforto corporal e perda do interesse na atividade sexual. O estudo reforça a importância do papel do enfermeiro de identificar e discutir sobre a disfunção sexual durante o cuidado pré-natal. Palavras-chave: Gravidez, sexualidade, cuidado pré-natal. Comportamento sexual. Disfunções sexuais fisiológicas.

CARING FOR ANTENATAL SEXUAL SATISFACTION: SEXUAL DYSFUNCTION IN PREGNANCY

Abstract

The exercise of sexuality may undergo changes during pregnancy, creating insecurities and impairing sexual response. This study aims to investigate the literature on sexual dysfunction during pregnancy. For that, an exploratory bibliographic research was performed a Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: mariarivemales@ufrb.edu.br

b Doutora em Ciências. Docente da Universidade Federal de São Paulo. São Paulo, São Paulo, Brasil. E-mail: rose. lacava@unifesp.br

Endereço para correspondência: Avenida Simon Bolivar, n. 156, Jardim Armação. Salvador, Bahia, Brasil. CEP: 41750-230. E-mail: mariarivemales@ufrb.edu.br

135 v. 43, n. 4, p. 135-145 out./dez. 2019 135
10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2850
Revista Baiana de Saúde Pública
DOI:

at the VHL, LILACS, and SciELO databases using the descriptors ‘pregnancy’, ‘sexuality’, and ‘prenatal care’. Full-text articles, available online, written in Portuguese, and with affiliation in Brazil were included in the study. The results indicate that pregnancy negatively influences sexual function, directly interfering with sexual satisfaction. The presence of sexual disorders interrupting or changing any one of the phases of the sexual response lead to sexual dysfunctions. In this sense, this study reinforces the importance of the role of nurses in identifying and discussing sexual dysfunction.

Keywords: Pregnancy, sexuality, prenatal care. Sexual behavior. Physiological sexual dysfunctions.

CUIDADO DEL PLACER EN PRENATAL: DISFUNCIÓN SEXUAL EN EL EMBARAZO

Resumen

Durante el embarazo el ejercicio de la sexualidad puede sufrir alteraciones, lo que genera inseguridad y perjudica directamente la respuesta sexual. Este estudio busca investigar la producción bibliográfica sobre la ocurrencia de disfunción sexual durante el embarazo. Esta es una investigación exploratoria y de carácter bibliográfico, realizada en las bases BVS, LILACS y SciELO. Se incluyeron los artículos disponibles en línea en su totalidad, escritos en portugués, con la afiliación en Brasil. Se utilizó como descriptores: “embarazo”, “sexualidad” y “cuidado prenatal”. El embarazo influye negativamente en la función sexual, interfiriendo directamente en la satisfacción sexual, ya que las mujeres embarazadas evitan tener relación por temor al dolor, a perjudicar el feto, malestar, incomodidad corporal y pérdida del interés en la actividad sexual. El estudio refuerza la importancia del papel del enfermero para identificar y discutir sobre la disfunción sexual durante el cuidado prenatal.

Palabras clave: Embarazo, sexualidad, cuidado prenatal. Comportamiento sexual. Disfunciones sexuales fisiológicas.

INTRODUÇÃO

A sexualidade ainda é impregnada de normas e dispositivos reguladores. Também é um assunto que envolve a intimidade das pessoas, as relações afetivas e de gênero e a vida privada, permeado por tabus que dificultam a discussão sobre o tema1

136

A vivência da sexualidade e a expressão da prática sexual estão imbricadas nas relações de gênero e no significado/sentido dado a essa experiência. Nesse sentido, a vivência da sexualidade na gestação é uma experiência ímpar na vida do casal, pois está impregnada de sentimentos, incertezas e medo1

Durante a gravidez, a sexualidade pode sofrer alterações que vão desde a abstinência ao aumento da atividade sexual. Muitos casais acreditam que essa fase é imprópria para o ato sexual, fazendo com que os padrões de sexualidade estabelecidos anteriormente sofram mudanças, o que por sua vez pode ocasionar constrangimentos e preocupações 2,3 .

Todavia, estudos que tratam do tema sexualidade relacionando-o ao ciclo gravídico-puerperal são raros, visto que esse assunto ainda causa desconforto, tanto para a gestante quanto para os profissionais que a atendem4. Ocorre que, muitas vezes, a equipe de saúde não se dispõe a ouvir, discutir e orientar os casais grávidos, o que gera insegurança e prejudica o desempenho sexual5.

A resposta sexual é diferente entre homens e mulheres. Durante a gravidez, a função sexual se manifesta de diferentes formas e pode aumentar ou reduzir o prazer a dois6. No caso das mulheres grávidas, pode ocorrer a diminuição de desejo, excitação, orgasmo e lubrificação, provocando consequentemente uma disfunção sexual7

A disfunção sexual é a ocorrência de qualquer alteração (falta, desconforto e/ou dor de forma persistente e recorrente) em uma das fases do ciclo da resposta sexual que interfira de forma negativa em alguma parte desse evento (desejo, excitação, orgasmo e resolução), podendo causar bloqueios e traumas7,8.

Destarte, durante a gravidez, a mulher se encontra emocionalmente lábil e ávida por carinho, apoio e compreensão. Além disso, ocorrem as mudanças corporais, somadas à ansiedade quanto ao parto e maternidade. Todos esses fatores influenciam diretamente na resposta sexual9

Sabe-se que nas gestações de risco habitual o enfermeiro tem papel importante no acompanhamento das gestantes. É mister que esses profissionais reconheçam as modificações no padrão sexual, de modo a serem capaz de identificar e agir frente às alterações que afetam outros aspectos da vida, respeitar as diferenças e individualizar as mudanças da saúde concernentes à sexualidade10.

Por entender que a gestação é um período de intensas transformações, inclusive quanto à sexualidade, desenvolveu-se o presente estudo com o objetivo de investigar a produção bibliográfica sobre a ocorrência de disfunção sexual durante a gravidez.

137 v. 43, n. 4, p. 135-145 out./dez. 2019
Revista Baiana de Saúde Pública

MATERIAIS E MÉTODO

Trata-se de uma revisão integrativa, com caráter exploratório e abordagem qualitativa, desenvolvida com base em material já elaborado, constituído por artigos científicos.

A busca bibliográfica foi realizada a partir da combinação binária dos seguintes descritores: “Gravidez”, “Sexualidade”, “Comportamento Sexual”, “Disfunções Sexuais Fisiológicas” e “Cuidado Pré-natal”, nas bases de dados Scientific Electronic Library Online (SciELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e no portal da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), devendo respeitar o período de publicação entre janeiro de 2013 e dezembro de 2017, no idioma português. Foram selecionados apenas os artigos gratuitamente disponíveis na íntegra.

A questão norteadora utilizada no estudo foi: “Qual a produção bibliográfica sobre a ocorrência de disfunção sexual durante a gravidez?”. Estabeleceram-se como critérios de inclusão: (1) “Gravidez”, “Sexualidade”, “Comportamento Sexual”, “Disfunções Sexuais Fisiológicas” e “Cuidado Pré-natal” entre as palavras-chave/descritores; (2) produções disponíveis on-line e na íntegra; (3) escrito no idioma português; e (4) com afiliação no Brasil.

Os critérios de exclusão foram: (1) artigos que disponibilizavam apenas resumos para leitura e (2) produções nos formatos monografia, dissertação, tese, cartilha, manual, norma técnica e livro. A coleta de dados foi realizada nos meses de março e abril de 2018.

Figura 1 – Processo de seleção dos artigos de acordo com os critérios de inclusão definidos no estudo. Salvador, Bahia – 2018

APLICAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE INCLUSÃO

VERIFICAÇÃO DOS TÍRULOS E RESUMOS.

LEITURA NA ÍNTEGRA DOS ARTIGOS EXCLUÍDOS ESTUDOS DUPLICADOS E QUE NÃO ABORDAVAM SOBRE A TEMÁTICA DE INTERESSE.

138
TOTAL DE ESTUDOS BASES DE DADOS N=2.161
DE ESTUDOS INCLUÍDOS N=12
TOTAL
ESTUDOS EXCLUÍDOS N=1.811 ESTUDOS EXCLUÍDOS N=296
EXCLUÍDOS N=42 N = 350
= 54
= 12
ESTUDOS
N
N
Fonte: Elaboração própria.

135-145

Por se tratar de uma revisão integrativa da literatura, este estudo não obedece às questões éticas previstas nas Resoluções nº 466/2012 e nº 510/2016, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que envolvem pesquisa com seres humanos, e ciências sociais e humanas, respectivamente. Ressalta-se que todas as informações aqui descritas são oriundas de produções de domínio público, não sendo necessário o sigilo e anonimato.

RESULTADOS

Foram selecionados 12 artigos para compor o corpus do estudo. O Quadro 1 descreve os artigos selecionados de acordo com a localização nas bases de dados BVS, LILACS e SciELO.

Quadro 1 – Descrição dos artigos localizados nas bases BVS, LILACS e Sci ELO. Salvador, Bahia – 2018

Título do artigo Autores

1. Estudo comparativo da função sexual em mulheres durante o período gestacional11

2. Disfunção sexual: Avaliação de mulheres durante o terceiro trimestre gestacional12

3. Diagnóstico de enfermagem disfunção sexual em gestantes: uma análise de acurácia10

Bomfim IQM, Melro BCF

Mathias AERA, Arantes ACRP, Alves V, Freitas HGV, Vilela FMF, Dias TG

Queiroz CNSA, Sousa VEC, Lopes MVO

Prado DS, Lima RV, Lima LMMR

Resultados Recomendações/conclusões Base de dados

Constatou-se que o terceiro trimestre gestacional apresenta níveis de função sexual mais baixos.

Participaram do estudo 102 gestantes, das quais 45,1% apresentaram disfunção sexual. Os menores escores de domínios foram em desejo e excitação e houve associação de disfunção sexual com paridade.

A amostra contou 52 gestantes. O diagnóstico estava presente em 65,4% das mulheres e a maioria das características definidoras apresentou associação estatística.

A disfunção sexual entre gestantes foi de 40,4% e entre não gestantes de 23,3%. Houve diferenças significativas entre gestantes e não gestantes no tocante aos escores dos domínios desejo, excitação, lubrificação, orgasmo e satisfação.

A análise fatorial demonstrou a presença de seis domínios: subjetividade, dor e desconforto; frequência e receptividade; desejo; satisfação; orgasmo e estímulo.

A função sexual das gestantes sofreu declínio com o avanço da idade gestacional. BVS; LILACS

Foi evidenciada uma taxa moderada de disfunção sexual no terceiro trimestre gestacional.

É relevante o enfoque de tal diagnóstico durante o pré-natal e de se conhecer a acurácia de seus indicadores.

A gestação influencia negativamente a função sexual feminina, particularmente nos domínios desejo e excitação.

A versão em português do PSFQ pode ser utilizada para avaliar a função sexual durante a gravidez.

BVS; LILACS

BVS; LILACS

Bezerra

Houve diminuição significativa da frequência mensal do relacionamento sexual, que passou de uma mediana de 12 para 4 vezes por mês. A disfunção sexual se mostrou presente em 35,7% das gestantes avaliadas.

A disfunção sexual afetou negativamente a qualidade de vida de mulheres grávidas, devendo ser um aspecto avaliado durante as consultas de pré-natal.

139 v. 43, n. 4, p.
out./dez. 2019
Revista Baiana de Saúde Pública 4. Impacto da gestação na função sexual feminina9 BVS; SciELO 5. Tradução e validação de questionário de função sexual na gravidez (PSFQ)6 Amaral TLM, Monteiro GTR BVS; SciELO 6. Comparação da qualidade de vida em gestantes com disfunção sexual7 IFD, Sousa VPS, Santos LC, Viana ESR
(continua)
BVS; SciELO

Quadro 1 – Descrição dos artigos localizados nas bases BVS, LILACS e Sci ELO.

Salvador, Bahia – 2018

Título do artigo Autores Resultados Recomendações/conclusões Base de dados

7. Prevalência de disfunção sexual em primigestas, no Município de Rio Branco, Acre, Brasil4

8. Prevalência de dispareunia na gravidez e fatores associados13

Lima AC, Dotto LMG, Mamede MV

Sperandio FF, Sacomori C, Porto IP, Cardoso, FL

Antes da gestação, a prevalência de disfunção sexual foi de 23,9%, a falta de desejo sexual foi de 20,2%, a dispareunia foi de 1,2% e 3,3% tiveram insatisfação sexual. Durante a gravidez, a disfunção sexual foi de 67,7%, a falta de desejo foi de 51%, a dispareunia foi de 14,4%, a insatisfação sexual foi de 10,8%. Houve diminuição da lubrificação vaginal em 29,1% das gestantes.

A prevalência de dispareunia no terceiro trimestre gestacional foi de 48,5%. Os fatores associados foram: constipação no terceiro trimestre da gestação; incontinência urinária e dispareunia antes da gestação.

9. Vivência da sexualidade feminina no período gestacional: à luz da história oral temática14

Viana DF, Barrêto AJR, Fonseca ENR, Costa CBA, Soares MJGO

10. Sexualidade e depressão em gestantes com aborto espontâneo de repetição15

Francisco MF, Mattar R, Bortoletti FF, Nakamura MU

Foram obtidas quatro categorias temáticas: “Comportamento sexual do casal no período gestacional”; “Modificações fisiológicas no decorrer da gravidez e sua influência na atividade sexual”; “Desejo sexual da mulher no período gestacional”; “Influência do pré-natal no comportamento sexual do casal”.

Independentemente de a gestante ter ou não histórico de aborto espontâneo de repetição, quanto maior o escore de depressão, menor o escore de sexualidade.

Os achados indicam que houve maior prevalência de disfunção sexual durante a primeira gravidez do que no período anterior a essa gestação.

A prevalência da dispareunia é alta no período gestacional e está associada a alterações das funções do assoalho pélvico, como incontinência urinária e constipação, além da presença prévia de dispareunia.

A vivência da sexualidade feminina depende de fatores físicos, psicológicos e culturais. A forma como o parceiro compreende e se comporta também constitui fator determinante para uma experiência sexual saudável entre o casal. Outro ponto destacado foi a fragilidade das orientações sobre sexualidade nas consultas de pré-natal.

Gestantes que tiveram aborto espontâneo de repetição apresentam depressão com frequência duas vezes mais elevada e função sexual mais comprometida. Há associação inversa entre depressão e função sexual.

BVS; SciELO

11. Viver a sexualidade feminina no ciclo gravídico16

12. Indicadores clínicos de disfunção sexual em mulheres grávidas: revisão integrativa de literatura17

Rocha MGF, Vieira JLB, Nascimento EGC, Alchiere JC

A vivência da sexualidade feminina no ciclo gravídico é influenciada pelas modificações morfofisiológicas e psicológicas, recebendo interferências de mitos, tabus, aspectos socioculturais, como também do desconhecimento da mulher acerca do próprio corpo e da sexualidade.

BVS,

BVS, LILACS

Carteiro DMH, Sousa LMR, Berenguer SMAC

Foram identificadas nove características definidoras e 16 fatores relacionados, alguns não classificados na NANDA Internacional.

A atenção do pré-natal não tem se constituído satisfatória para atender às necessidades biopsicossociais das gestantes e de seus companheiros.

Indicadores clínicos podem ser adicionados ao diagnóstico de enfermagem, de modo a favorecer um diagnóstico acurado e intervenções efetivas na vigilância da gravidez como um período de vivência sexual saudável.

BVS, LILACS

BVS, LILACS

Fonte: Elaboração própria.

140
LILACS, SciELO
SciELO
(conclusão)

DISCUSSÃO

Os artigos incluídos no presente estudo são congruentes no que diz respeito à discussão sobre a disfunção sexual durante a gravidez. No entanto, a literatura nacional sobre esse assunto ainda é escassa, possivelmente devido à dificuldade em se abordar uma temática que causa desconforto tanto para mulheres grávidas quanto para os profissionais que as acompanham7. Dessa forma, as orientações sobre sexualidade no período gestacional são de suma importância para o desenvolvimento sexual saudável do casal, sendo necessária a formação dos profissionais de saúde para discutirem a temática14.

Em relação à frequência das relações sexuais, foi constatada que antes da gestação havia uma mediana de 12 vezes por mês, entretanto, durante a gestação, a mediana apresentada foi de 4 vezes por mês4,6. A redução apresenta-se mais significativa no primeiro e terceiro trimestres16

Um dos estudos evidenciou que gestantes deprimidas apresentam maior risco de disfunção sexual, havendo uma associação inversa entre depressão e função sexual. Complementarmente, grávidas com história de aborto espontâneo de repetição apresentam frequência duas vezes mais elevada dos sintomas de depressão moderada e grave, e consequentemente, a função sexual dessas mulheres é mais comprometida15.

A frequência das relações sexuais está relacionada ao estímulo e ao desejo6 Os principais motivos que fazem com que mulheres grávidas evitem as relações sexuais são: medo de sentir dor9,10,14,16, temor de prejudicar o feto, mal-estar, desconforto corporal e perda do interesse em atividade sexual. Além disso, o receio em antecipar o parto, incômodos posturais e dor, aumento do volume abdominal e distorção na imagem corporal podem ser também fatores responsáveis pelo declínio da atividade sexual com a progressão da gestação4,6,9,14-16.

Em todos os artigos, foi observada diminuição em relação ao desejo e à excitação durante a gestação4,6,7,9-16. Deve-se considerar que o desejo sexual é o primeiro ponto para a vivência da sexualidade na gestação, pois a mulher se encontra em um momento de transição, mudança e identificação com o próprio corpo. Ademais, foi constatada que a iniciativa para a relação sexual ao longo da gestação foi “sempre do parceiro” e teve um aumento conforme a evolução da gestação4.

As preocupações que afligem a sexualidade durante a gestação são multifatoriais, sendo de âmbito tanto psicológico e sociocultural como fisiológico. Tais preocupações são percebidas distintamente por cada pessoa de acordo com absorção, inserção social e atribuição de valores. Durante a gravidez, pode haver conflitos importantes entre o papel anterior de companheira e amante, permeado do papel de esposa e o status de mãe14

141 v. 43, n. 4, p. 135-145 out./dez. 2019
Revista de Saúde Pública

Por outro lado, com o avanço da gravidez, o cansaço, a ansiedade e o medo natural em decorrência da proximidade do trabalho do parto tendem a tornar a relação sexual sem atrativos para as mulheres grávidas7,14-16. Um dos estudos evidenciou que 91,7% das mulheres sentiam desejo sexual antes da gestação, contudo, durante a gravidez, 56,6% delas tiveram seu desejo sexual diminuído4

Mudanças no padrão de lubrificação foram o segundo problema sexual mais prevalente4,6,7,913, identificado na gravidez pela maioria das mulheres, sendo que a redução da lubrificação vaginal aumenta com a progressão da gestação16 e ocorreu, no primeiro trimestre, em 24,3%, no segundo trimestre, em 25,9% e, no terceiro, em 27,8% das gestantes4.

Com o avanço da gravidez, a redução do desejo, da atividade sexual e do coito vaginal ocorre entre muitas mulheres4,7,9,10,12, pois tanto a mulher quanto seu parceiro têm preocupações sobre complicações na gestação como resultado de relações sexuais7,18. Todavia, em alguns casos, é o parceiro quem perde a libido e decide por não ter relações sexuais9

A maioria dos artigos incluídos no estudo4,6,9-13 também descreve alterações no que tange à satisfação/orgasmo. Estudos demonstram que, nesse domínio, a percepção da imagem corporal está relacionada à autoimagem negativa6,10, evidenciada pelo efeito antierótico da aparência da mulher durante a gravidez7. Esse é um sintoma comum da gestação, existindo uma associação entre imagem corporal e função sexual16,19

Estudo realizado sobre o diagnóstico de enfermagem “Disfunção sexual em gestantes” evidenciou que as características definidoras incapacidade de alcançar a satisfação desejada e a alteração no alcance da satisfação sexual estão relacionadas às três fases da resposta sexual, principalmente em relação à fase do orgasmo, sendo apontada por 34,6% das mulheres participantes do estudo. Somadas a esse achado, as características alteração no alcance da satisfação sexual, alteração percebida na excitação sexual, alterações em alcançar o papel sexual percebido e incapacidade de alcançar a satisfação desejada mostraram os maiores valores de razão de prevalência10

Em relação à identificação dos indicadores clínicos do diagnóstico de enfermagem “disfunção sexual em mulheres grávidas”, foram identificadas nove características definidoras: alteração no desejo sexual; alteração na satisfação sexual; alteração no orgasmo; dispareunia; alteração na atividade/frequência sexual; alteração na excitação sexual; diminuição no desejo sexual; alteração na lubrificação vaginal e alteração no interesse sexual. Quanto aos fatores relacionados, foram identificados 16, sendo alguns não classificados na NANDA Internacional, a saber: fatores sociodemográficos, alterações físicas, psicológicas e relacionais, idade gestacional, história obstétrica, mitos, tabus, preconceitos e crenças, medos, autoestima e autoimagem, fatores religiosos e culturais17

142

Somente um dos artigos7 que fez parte do corpus da pesquisa descreveu que a maioria das gestantes participantes (74,4%) conseguiu atingir o orgasmo e 65,2% apresentaram manutenção ou aumento da satisfação sexual durante a gestação.

A dispareunia foi outro fator que interferiu diretamente na satisfação sexual das gestantes7,10,12,13. Ela é descrita como uma dor genital associada com intercurso sexual, a qual pode ocorrer com maior frequência durante o coito, mas também antes ou após a relação sexual12, de maneira persistente ou recorrente4. Ocorre em cerca de 15% das mulheres entre 30 e 50 anos de idade, varia entre 23% e 41% no terceiro trimestre gestacional e de 30% a 60% entre as mulheres no pós-parto, corroborando a coexistência de sentimentos e/ou atitudes negativas em relação ao sexo nos períodos descritos13,20. Uma das publicações salienta que, antes da gestação, a prevalência da dispareunia nas mulheres era de 16,1%, em contraponto a 48,5% no terceiro trimestre gestacional13

A presença e aumento da dispaurenia no terceiro trimestre de gravidez podem ser explicados pelo fato de as mulheres poderem apresentar irritabilidade consequente às contrações uterinas provocadas pelo orgasmo, desconforto nas posições sexuais, percepção subjetiva de falta de atratividade física ou de diminuição de satisfação por parte do companheiro13. O medo também pode influenciar na dor e desconforto na relação sexual6.

Diante dos dados descritos, ficou evidente que a gravidez influencia negativamente a função sexual, interferindo diretamente na satisfação, felicidade e qualidade de vida das gestantes. A presença de transtornos na sexualidade, seja de interrupção ou de alteração de qualquer uma das fases da resposta sexual, acarretam o surgimento de disfunções sexuais7

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo investigou a produção bibliográfica sobre a ocorrência de disfunção sexual durante a gravidez. Os resultados obtidos revelam que a gestação interfere nas alterações da função sexual e, consequentemente, no desenvolvimento da disfunção sexual.

Esse achado pode estar relacionado à dificuldade das gestantes de discutir sobre sua sexualidade e as alterações na relação sexual, assim como à capacidade dos profissionais de saúde de identificar e tratar desse assunto durante o cuidado pré-natal.

O estudo reforça a importância do papel do enfermeiro no pré-natal e da atenção às gestantes de risco habitual. Para que se discutam de forma aberta as alterações na função sexual, é mister aplicar as tecnologias leves do cuidado, centradas na construção das relações inter e intrapessoais e valorizando o acolhimento, o vínculo, a autonomização e a escuta sensível a essas mulheres.

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Revista Baiana de Saúde Pública

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Maria da Conceição Costa Rivemales.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Maria da Conceição Costa Rivemales e Rose Mary Valle Bóz Lacava.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Maria da Conceição Costa Rivemales.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Maria da Conceição Costa Rivemales.

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Recebido: 21.4.2018. Aprovado: 1.4.2021.

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Revista Baiana de Saúde Pública

RELATO DE EXPERIÊNCIA

PRECEPTORIA COM DISCENTES DE ENFERMAGEM NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA

Fábia Luanna Leite Siqueira Mendes Santosa

https://orcid.org/0000-0001-5977-2679

Fernanda Kelly Fraga Oliveirab

https://orcid.org/0000-0002-9094-6128

Jucielma de Jesus Diasc

https://orcid.org/0000-0002-1969-3180

Resumo

O presente trabalho consiste em um relato de experiência, com base na Estratégia Saúde da Família (ESF), de docentes da disciplina Estágio Curricular Supervisionado II (ECS II) com turmas do décimo semestre do curso de graduação em enfermagem de uma instituição privada de ensino superior em Aracaju, Sergipe. Tem como objetivo descrever a percepção de docentes quanto a seu papel na formação dos graduandos em enfermagem. Trata-se de relato de experiência vivenciada com acadêmicos do ECS II, cursando o décimo semestre do curso de enfermagem, a partir do desenvolvimento e supervisão de atividades pertinentes ao enfermeiro na ESF. O contato dos discentes do curso de enfermagem com a prática assistencial da Atenção Primária à Saúde acontece de forma que os acadêmicos podem identificar a Unidade Básica de Saúde como porta de entrada para os serviços de saúde, reconhecendo o território, conhecendo a população e sendo resolutivos frente aos problemas de saúde da população e da comunidade.

Palavras-chave: Enfermagem. Docente. Discente. Saúde da família.

a Enfermeira. Mestra em Enfermagem pela Universidade Federal de Sergipe. Docente/Professora Assistente na Universidade Tiradentes (UNIT). Aracaju, Sergipe, Brasil. E-mail: fabia_luana@hotmail.com

b Biomédica e Enfermeira. Mestra em Saúde e Ambiente pela Universidade Tiradentes. Enfermeira da Estratégia Saúde da Família na Secretaria Municipal de Saúde. Aracaju, Sergipe, Brasil. Email: fernandadaponte@hotmail.com

c Enfermeira. Mestra em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual de Feira de Santana. Enfermeira na Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (CASSI). Aracaju, Sergipe, Brasil. Email: jucielma.jd@gmail.com

Endereço para correspondência: Avenida Augusto Franco, nº 2000, Condomínio Vivendas de Aracaju, quadra 14, lote 19, Siqueira Campos. Aracaju, Sergipe, Brasil. CEP:49075-100. E-mail: fernandadaponte@hotmail.com

146 146 DOI: 10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2590

PRECEPTORSHIP EXPERIENCE WITH NURSING STUDENTS IN THE FAMILY HEALTH STRATEGY

Abstract

This work reports the experience of professors of the Supervised Curricular Internship II (SCI-II) discipline, taught for tenth-semester students of the undergraduate course in nursing of a private higher education institution in Aracaju, Sergipe. This report aims to describe professors’ perceptions regarding their role in the training of undergraduate nursing students, based on their experience with the development and supervision of activities pertinent to the nurse in the SCI-II. Through the contact of nursing students with practices of primary healthcare (PHC), professors pinpoint the basic health unit as the gateway for health services, recognizing the territory and the people, and addressing the health conditions of the population and the community.

Keywords: Nursing. Teaching. Student. Family health.

PERCEPCIÓN SOBRE LOS ESTUDIANTES DE ENFERMERÍA EN LA ESTRATEGIA DE SALUD FAMILIAR

Resumen

El presente trabajo es un informe de experiencia, con base en la Estrategia de Salud Familiar (FSE), de profesores de la asignatura Prácticas Supervisadas II (ECS II) con clases del décimo semestre del curso de licenciatura en enfermería en una institución privada de educación superior en Aracaju, Sergipe (Brasil). Su propósito es describir la percepción de los profesores sobre su papel en la formación de estudiantes de enfermería. Este es un informe de experiencia sobre la percepción de académicos de ECS II, que dan clases al décimo semestre del curso de enfermería, acerca del desarrollo y la supervisión de actividades relevantes para el futuro enfermero en la ESF. El contacto de los estudiantes del curso de enfermería con la práctica asistencial de la atención primaria de salud ocurre de manera que estos puedan identificar la Unidad Básica de Salud como puerta de entrada de los servicios de salud, reconociendo el territorio, conociendo a la población y resolviendo los problemas de salud de la población y la comunidad.

Palabras clave: Enfermería. Docente. Estudiante. Salud de la familia.

147 v. 43, n. 4, p. 146-152 out./dez. 2019
Revista Baiana de Saúde Pública

INTRODUÇÃO

A Atenção Primária à Saúde (APS) caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação, redução de danos e manutenção da saúde. O objetivo primordial nesse nível hierárquico é desenvolver uma atenção integral que impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas, bem como nos determinantes e condicionantes de saúde das coletividades1.

A Estratégia Saúde da Família (ESF) teve início em meados de 1993, sendo regulamentada em 1994 como uma estratégia do Ministério da Saúde (MS) para mudar a forma de prestação de assistência, visando estimular a implantação de um novo modelo de atenção primária que resolvesse a maior parte (cerca de 85%) dos problemas de saúde. Esse programa tem como objetivo priorizar ações de prevenção, promoção e recuperação da saúde de modo contínuo2

A ESF visa a reorganização da atenção básica no país, de acordo com os preceitos do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo desenhada pelo MS e por gestores estaduais/municipais como estratégia de expansão, qualificação e consolidação da atenção básica. Nesse contexto, a ESF favorece uma reorientação do processo de trabalho com maior potencial para aprofundar os princípios, diretrizes e fundamentos da atenção básica, de ampliar a resolutividade e o impacto na situação de saúde das pessoas e coletividades, além de propiciar uma importante relação custo-efetividade1

É fundamental a compreensão, por parte dos acadêmicos de enfermagem, da importância da APS como orientadora e coordenadora do sistema de saúde do município, que deve assumir a responsabilidade sanitária pela população, criar vínculos e realizar a longitudinalidade e integralidade do cuidado3.

As mudanças no conceito de saúde e a introdução de outro modelo de atenção em saúde – integral, focado na promoção da saúde, organizado a partir do nível primário, que pressupõe um profissional crítico, capaz de lidar com a realidade e a diversidade que compõem os sujeitos – fizeram com que a formação em saúde se transformasse ao longo dos anos. Essa transformação se deu por meio de estratégias que inseriram o aluno da graduação nos serviços de saúde, o que levou os profissionais de área a incluírem em sua prática atribuições de preceptor.

Os termos “preceptoria” e “preceptor” são frequentemente utilizados no âmbito da formação em saúde, porém, carecem ainda de definição consistente. Embora haja definições distintas, chama atenção o fato de a maioria delas carregar um caráter pedagógico: “docenteclínico”, “educador”, “facilitador” ou “apoio pedagógico”4

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Portanto, o preceptor seria o profissional que faz o elo entre a academia e os serviços de saúde, inserindo neles seus alunos, seja pelo simples fato de apresentá-los ao “serviço”, seja por organizar junto a eles, usuários e trabalhadores de saúde o cotidiano de trabalho, para que o discente possa vivenciar seu papel enquanto futuro profissional no campo de estágio.

O objetivo deste relato de experiência é descrever a percepção de docentes quanto ao seu papel na formação dos graduandos em enfermagem.

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um relato de experiência acerca da vivência enquanto docente da disciplina Estágio Curricular Supervisionado II (ECS II) em Unidades Básicas de Saúde (UBS), de segunda a sexta-feira, com discentes do décimo semestre do curso de enfermagem de uma instituição de ensino superior em Aracaju, Sergipe, no ano de 2016.

O ECS II tem carga horária de 440 horas semestrais divididas em 4 horas semanais, de segunda a sexta-feira, das 7h às 11h e das 13h às 17h, totalizando 400 horas. As demais horas podem ser realizadas por meio da participação em eventos institucionais, após aprovação do colegiado de enfermagem, ou em oito turnos de cinco horas no período da manhã, por meio de treinamentos/oficinas para os colaboradores da rede e/ou comunidade3.

Os discentes são preparados para esse estágio curricular através de um curso, de 30 horas, sobre os temas transversais que permeiam a APS. Nesse momento, os alunos desenvolvem habilidades de resolução de quadros clínicos, problemas no território de saúde e revisitam informações importantes para o melhor aproveitamento da atividade em campo.

Na prática, os discentes, acompanhados pelo professor supervisor, desempenham as principais atividades do enfermeiro na APS, perpassando por um processo de amadurecimento técnico, científico, ético, de liderança e de resolução de conflitos.

Depois de cumprida a carga horária estabelecida para essa disciplina, os discentes recebem nota de acordo com o desempenho em todas as atribuições, bem como realizam prova objetiva e entrega de relatório.

EXPERIÊNCIA NA DOCÊNCIA VIVENCIADA NA APS

A vivência na preceptoria é uma forma de ensinar os discentes a desenvolverem na prática diária as diversas atribuições do enfermeiro na APS, que contemplam desde a gerência de processos de trabalho à prática de assistência individual e coletiva. Para que tal atividade seja exitosa, o professor preceptor precisa criar um elo com a equipe de saúde que atua na unidade e com a população adscrita. A prática na UBS permite ao acadêmico desenvolver

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Revista Baiana de Saúde Pública

ações direcionadas a uma diversidade de clientes, desde recém-nascidos a idosos, e em uma gama de ambientes: consultório, unidades produtivas, domicílio, creches, escolas.

Uma das prerrogativas para que o trabalho das equipes de saúde da família seja impactante para a população adscrita é territorializar a área de abrangência pertencente aos cuidados e vigilância das equipes de saúde da família, a fim de desenvolver ações direcionadas para as reais necessidades epidemiológicas, sanitárias, ambientais e de saúde, em geral, da comunidade. Tal necessidade é extrapolada aos discentes por meio da cartografia existente na UBS, para que possam conhecer a área, bem como do contato com os Agentes Comunitários de Saúde (ACS), que são atores sociais em comum entre a comunidade e os profissionais de saúde.

O enfermeiro na APS desenvolve inúmeras atividades com vistas à promoção, prevenção, proteção da saúde e reabilitação de doenças e agravos. Para tal, desempenham ações tais como consultas de enfermagem, visitas domiciliares, reconhecimento do território, dentre outras, adotando uma agenda pessoal a fim de gerenciar os processos de trabalho.

O professor preceptor, em parceria com os enfermeiros da UBS, organiza também uma agenda programática para que o discente possa vivenciar a rotina de trabalho do enfermeiro e desenvolva senso crítico acerca da importância social/política da profissão escolhida.

Tais agendas são organizadas de acordo com as necessidades prioritárias, levandose em consideração grupos de vulnerabilidade, agravos de maior prevalência na área, faixa etária que necessite maior cobertura, segundo as pactuações estabelecidas pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Os grupos delineados são atendidos conforme os programas existentes na APS, sendo os de maior prevalência hipertensos e diabéticos, saúde da mulher em seu ciclo completo de vida, saúde da criança e do adolescente, portadores de tuberculose e hanseníase.

A consulta de enfermagem realizada de maneira holística é de extrema importância na formação do acadêmico. Permite relacionar a teoria adquirida durante os anos de graduação à prática de maneira integral e exercer a liberdade de atuar gerenciando processos de trabalho e de qualidade da própria assistência prestada, convidando, diariamente, a um processo autocrítico, reflexivo, que culmina em autoavaliações, por vezes ásperas e que incitam a necessidade de buscar melhoria constante. Destaca-se a oportunidade constante de realizar consultas de prénatal, citologia oncótica e exame clínico das mamas, bem como acompanhamento do usuário hipertenso e diabético, no qual o acadêmico tem a oportunidade de aprimorar técnicas que o permitem concluir o curso universitário mais preparado para atender tais demandas enquanto futuro enfermeiro.

As prerrogativas da APS de promover saúde e prevenir agravos exige que os profissionais de saúde tracem estratégias inovadoras para cumpri-las com êxito. Nesse sentido,

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os discentes participam ativamente da educação em saúde, com ideias inovadoras e atraentes para a comunidade, abordando diversos temas ditados por datas comemorativas ou campanhas de saúde municipais/nacionais/internacionais: prevenção de câncer de colo de útero e mama, cuidados com o pé diabético, incentivo ao aleitamento materno, alimentação saudável, cuidados com o recém-nascido, combate ao mosquito Aedes aegypti, dentre outros.

As atividades educativas desenvolvidas pelos discentes são de extrema importância para a comunidade, e diversas vezes reacendem o entusiasmo da equipe de saúde para que eventos tão importantes continuem sendo promovidos.

A visita domiciliar está inserida na ESF e faz parte da agenda programática dos enfermeiros de cada equipe de saúde. Deve ser realizada semanalmente, de acordo com a necessidade da clientela adscrita e que não pode se deslocar até a UBS. Os discentes do ECS II participam também dessa atividade sob supervisão do professor preceptor, acompanhados do ACS. Em parceria com os enfermeiros da UBS, as necessidades apontadas são atendidas, permitindo ao acadêmico avaliar o núcleo de apoio do indivíduo, as condições socioeconômicas em que vive, colher anamnese detalhada acerca do problema de saúde em questão, além de prestar atenção em saúde in loco.

Os acadêmicos de enfermagem vivenciam outra ação em saúde no último semestre do curso: o Programa Saúde na Escola (PSE), que envolve atividades como avaliação nutricional, análise da situação vacinal, saúde bucal e triagem oftalmológica, além de ações educativas voltadas à promoção e prevenção da saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, fica evidente o quanto é importante para o crescimento do profissional em formação todo o conhecimento adquirido e praticado durante os meses do estágio. Além do papel assistencial, o enfermeiro da APS também desenvolve atividades gerenciais, e para tal, deve-se ter olhar crítico. Esse aspecto também é vivenciado pelos acadêmicos com a realização do plano de gerenciamento, no qual devem elucidar um problema da UBS e criar um planejamento estratégico, bem como cinco normas e respectivas rotinas para solucionar tal situação.

O preceptor age como um facilitador e ordenador de atividades, com o objetivo de proporcionar ao discente uma visão holística da saúde coletiva.

Portanto, o ECS proporciona aos estudantes conhecimentos, habilidades e atitudes pertinentes à prática profissional, além de fomentar o pensamento crítico e raciocínio clínico para alcançar a excelência do cuidado.

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Revista Baiana de Saúde Pública

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Fábia Luanna Leite Siqueira Mendes Santos, Fernanda Kelly Fraga Oliveira e Jucielma de Jesus Dias.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Fábia Luanna Leite Siqueira Mendes Santos, Fernanda Kelly Fraga Oliveira e Jucielma de Jesus Dias.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Fernanda Kelly Fraga Oliveira.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Fábia Luanna Leite Siqueira Mendes Santos, Fernanda Kelly Fraga Oliveira e Jucielma de Jesus Dias.

REFERÊNCIAS

1. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional da Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção básica no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União, Brasília (DF), 2017 set 21, Seção 1.

2. Silveira YMSC, Ramires JCL, Silva TP. Estratégia de Saúde da Família: Cultura e saúde na construção de um novo modelo de atenção básica no bairro Morrinhos em Montes Claros – Minas Gerais/Brasil. Rev Geo de América Central. 2011;2(47E):117.

3. Santa Rosa MPR, Lucon DR, Lima DM, Bocardi MIB. Protocolo de Estágio curricular e TCC: graduação em enfermagem. Aracaju (SE): EDUNIT; 2015.

4. Autonomo FROM. A preceptoria em saúde a partir das publicações brasileiras [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca; 2013.

Recebido: 6.3.2017. Aprovado: 15.4.2021.

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RELATO DE EXPERIÊNCIA DA FORMAÇÃO AO EXERCÍCIO DA TUTORIA EM EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE

Juleimar Soares Coelho de Amorima

https://orcid.org/0000-0003-3218-1769

Fernanda de Freitas Mendonçab

https://orcid.org/0000-0002-3532-5070

Mariana Bertol Lealc

https://orcid.org/0000-0002-1453-6100

Helvo Slomp Júniord

https://orcid.org/0000-0001-5346-0965

Rossana Staevie Baduye

https://orcid.org/0000-0003-4914-653X

Resumo

Este artigo tem como objetivo relatar uma experiência de percurso histórico-metodológico da formação e da tutoria em educação permanente em saúde (EPS). Trata-se da vivência na formação e atuação como tutor, na modalidade de ensino semipresencial, no curso destinado a trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS). Envolveu seis docentes organizadores, 60 formadores, 600 tutores e 6 mil alunos. Foram 18 meses de curso, mediado por uma plataforma virtual, ao longo dos quais discuti o papel da EPS nos serviços de saúde, rastreei cenários de aprendizado e vivi relatos de experiência da EPS. Inicialmente, houve estranhamento com a proposta metodológica, com o exercício de identificar a partir da prática as bases teóricas do processo de trabalho, a construção coletiva do

a Fisioterapeuta. Doutor em Saúde Coletiva. Docente no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: juleimar@yahoo.com.br

b Enfermeira. Doutora em Saúde Coletiva. Docente Universidade Estadual de Londrina. Londrina, Paraná, Brasil. E-mail: fernanda0683@gmail.com

c Sanitarista. Doutora em Saúde Coletiva. Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Brasília, Distrito Federal, Brasil. E-mail: marianabertolleal@gmail.com

d Médico. Doutor em Saúde Coletiva. Docente na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: helvsj@gmail.com

e Enfermeira. Doutora em Saúde Coletiva. Docente Universidade Estadual de Londrina. Londrina, Paraná, Brasil.

E-mail: robaduy@gmail.com

Endereço para correspondência: Instituto Federal do Rio de Janeiro. Rua Professor Carlos Wenceslau, n. 143, Realengo. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. CEP: 21715-000. E-mail: juleimar@yahoo.com.br

153 v. 43, n. 4, p. 153-168 out./dez. 2019 153 DOI:
Revista Baiana de Saúde Pública
10.22278/2318-2660.2019.v43 n4.a2754

conhecimento em EPS e com o trabalho cotidiano e a lentidão na utilização da plataforma. A experiência constituiu-se em incentivo para a participação em novas iniciativas de EPS na modalidade de ensino a distância e presencial.

Palavras-chave: Educação em saúde. Educação a distância. Sistema Único de Saúde. Saúde pública. Política de educação superior.

TRAINING THE EXERCISE OF TUTORING IN PERMANENT HEALTH EDUCATION

Abstract

This article aims to report a historical-methodological experience with training and tutoring in permanent health education (PHE), through a blended course for workers of the Brazilian Unified Health System (SUS). Throughout the 18-month course mediated by a virtual platform and comprising six organizers, 60 teachers, 600 tutors, and 6,000 students, I discussed the role of EPS in health services, tracked learning scenarios, and lived experience reports of EPS. Initially, the methodological proposal addressed some strangeness in regard to identifying the theoretical basis of the work process from the practice and the collective construction of knowledge in EPS, as well as in our daily work and struggles in using the platform. In conclusion, the experiment encouraged participation in new EPS initiatives, be it at distance or in person.

Keywords: Health education Education, distance. Unified Health System. Public health. Higher education policy.

DE LA FORMACIÓN AL EJERCICIO DE TUTORÍA EN LA EDUCACIÓN PERMANENTE EN SALUD

Resumen

Este artículo propone relatar una experiencia de formación histórico-metodológica y de tutoría en educación permanente en salud (EPS). Esta es una experiencia de formación y actuación como tutor en la modalidad semipresencial en el curso para los trabajadores del Sistema Único de Salud (SUS). Participaron seis profesores organizadores, 60 entrenadores, 600 tutores y 6.000 alumnos. La duración del curso fue de 18 meses, mediado por plataforma virtual en el cual se discute el papel de EPS en los servicios de salud, seguindo escenarios de aprendizaje y relatos de experiencias de EPS. Inicialmente hubo distanciamiento con la propuesta metodológica, con el ejercicio de identificación práctica de la base teórica del proceso de trabajo, la construcción

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colectiva del conocimiento en EPS y en el trabajo diario y lento uso de la plataforma. La experiencia consistió en incentivos para la participación en nuevas iniciativas de EPS en la modalidad de enseñanza remota y presencial.

Palabras clave: Educación en salud. Educación a distancia. Sistema Único de Salud. Salud pública. Política de educación superior.

INTRODUÇÃO

Conforme as diretrizes operacionais para a constituição e funcionamento da Educação Permanente em Saúde (EPS) para os trabalhadores para o Sistema Único de Saúde (SUS), o conceito de EPS permeia a ideia de articular as necessidades dos serviços, as possibilidades de desenvolvimento dos profissionais, a capacidade resolutiva dos serviços e a gestão social das políticas públicas de saúde1. A educação permanente é aprendizado no trabalho, no qual o aprender e o ensinar se incorporam ao cotidiano da organização2.

De forma distinta da educação continuada, fundamentada em saberes estruturados e processos formais de educação, promovidos por meio de métodos pedagógicos ou técnicas de trabalho, o aprendizado não se baseia na transmissão de conhecimento para atualização de enfoques de forma fragmentada, o que pode resultar em uma desconexão do saber como solução dos problemas da prática3. Segundo Ceccim4, a EPS pode permear a formação profissional e a própria educação continuada, no entanto, é mais potente quando opera junto à educação no serviço, possibilitando mudanças institucionais em dado tempo e lugar, compondo-se como processo produtivo singular ao construir cotidianos enquanto campos de aprendizagem individual, coletiva e institucional.

Frequentemente, nas organizações de saúde, as especializações se associam a processos de capacitação dos profissionais (cursos, treinamentos, aperfeiçoamentos, atualizações), construindo uma linha de reprodução do papel das áreas técnicas e dos níveis centrais ao governar princípios e diretrizes para as políticas em cada um dos núcleos específicos de acumulação em saúde5. A partir daí, em lugar de se estabelecer apoio solidário aos serviços que se desdobram em atos políticos, por vezes desfiam-se cursos e treinamentos pontuais.

O Ministério da Saúde (MS), por sua vez, instituiu a política de EPS como estratégia de transformação das práticas de saúde e de formação dos profissionais6. Para tanto, inicialmente houve a criação dos polos de EPS como instâncias locorregionais. O segundo momento se referiu à formação de tutores e facilitadores de EPS em todo o país5. Logo, seus

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produtos foram recolhidos, a exemplo de como esses atores lidaram com a responsabilidade de produzir mudanças no processo de trabalho7.

O presente estudo inscreve-se em uma etapa posterior dessa genealogia, chamada Educação Permanente em Saúde em Movimento (EPSM), de cuja primeira turma de tutores-alunos os autores participaram, mediados pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em parceria estabelecida como o MS e a Rede Governo Colaborativo em saúde.

Há uma demanda historicamente reprimida por educação permanente na área do sistema público de saúde que se compara à imperiosa educação continuada. O desejo de um contingente expressivo de profissionais de incorporar o aprendizado no ambiente de trabalho torna necessários avanços e garantias na implementação das diretrizes da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde5,8. Nesse sentido, o presente trabalho objetivou relatar uma experiência de percurso histórico-metodológico da formação e da tutoria em EPS do curso de Formação Integral Multiprofissional EPSM. A partir de uma experiência singular, busca-se discutir os desafios e os avanços da construção coletiva do curso, as ferramentas pedagógicas, bem como algumas limitações relacionadas ao projeto em si, aos participantes e aos modelos de educação na saúde no mundo do trabalho.

MÉTODOS

O percurso histórico-metodológico decorreu a partir do amplo processo de formação em EPS, realizado nas 435 regiões de saúde do país, mediante a especialização de atores sociais do trabalho em saúde, especialmente tutores, formadores e trabalhadores. Desde o primeiro desses encontros, adoto uma posição autorreflexiva de minha experiência.

A programação do curso de especialização EPSM teve início em maio de 2014, com oferta inicial para 6 mil trabalhadores, abrangendo todo território nacional. Os tutores e especializandos foram selecionados por meio de seleção pública realizada pelo MS. O curso contou com a participação de seis docentes organizadores e cerca de 60 formadores para 600 futuros tutores, todos profissionais do SUS. Esse momento foi o primeiro passo para alinhar conceitos, perspectivas e a organização estrutural e pedagógica da formação. No ensejo, procedi ao trabalho loco-regional singular entre tutores e os formadores, até dezembro de 2014, com encontros presenciais e virtuais.

Em sequência ao período especialmente dedicado à aproximação da EPS (denominado de formação) e qualificado como tutor, contribuí para a especialização de dez trabalhadores. Em minha turma, foram selecionados servidores do pronto-atendimento, urgência e emergência, especialidades, atenção básica, instituições de ensino e profissionais

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que atuam no gerenciamento dos serviços de saúde em nível central. O exercício da tutoria foi realizado no mesmo formato (semipresencial), com momentos de aprendizagem presencial trimestrais e apoio de um ambiente virtual de aprendizagem (AVA). A interação com os alunos deu-se: por momentos de concentração, com interação direta e presencial, totalizando quatro encontros presenciais ao longo dos 12 meses do curso; por momentos de dispersão no ambiente de trabalho; e mediada pelo AVA, utilizando-se a plataforma Otics (Observatório de Tecnologia em Informação e Comunicação em Sistemas e Serviços de Saúde).

A interação a distância no curso não foi apenas complementar, mas compôs as atividades e a carga horária previstas, bem como a avaliação do especializando e do tutor. Uma vez que nós, trabalhadores do SUS, somos compreendidos como sujeitos em ato do nosso processo de aprendizagem9, a opção pedagógica foi baseada na postura proativa de cada educando de incorporar o aprendizado ao trabalho e articular prática e teoria10, nessa ordem. A lógica norteadora do processo ensino-aprendizagem fundamentou-se nos princípios da aprendizagem significativa, da problematização, das pedagogias histórico-construtivistas e do referencial da EPS.

FERRAMENTAS PEDAGÓGICAS

Inicialmente, a estratégia foi realizar um primeiro encontro de forma presencial, em um ambiente acadêmico (espaço da sala de aula), para evitar quaisquer problemas na interação com a plataforma. O grupo se reuniu para iniciar as atividades a serem desenvolvidas ao longo dos meses seguintes. Nesse primeiro momento, havia especializandos mais experientes, outros mais teóricos, bem como alguns que ainda estavam se descobrindo naquele espaço. A construção dos encontros e as discussões foram sempre coletivas, de forma que cada participante foi protagonista na definição de eixos temáticos, centralizados em torno da EPS vivida no cotidiano.

Os temas norteadores dos encontros presenciais abrangeram: (1) produção do cuidado em saúde; (2) narrativas do trabalho; (3) estratégias de rastreamento de EPS no ambiente de trabalho; (4) papel da educação na saúde; e (5) ampliação do olhar sobre o processo de trabalho em saúde. Nos encontros entre tutores-formadores e tutores-tutores, discutimos: (1) organização das turmas de especializandos e tutores; (2) Desafios na condução na modalidade EAD do curso de EPS; e (3) o estabelecimento de redes de apoio em EPS. Todas as proposições se tornaram subsídios para debate nesse espaço aberto.

Tutor e aluno eram convidados a desenvolverem narrativas para os encontros presenciais de acordo com as temáticas propostas, estimulados a contemplar cenas do cotidiano

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em que experimentaram EPS em si e/ou em sua equipe de trabalho, conforme orientação política de reconhecimento e cooperação para construir encontros na rotina das práticas de saúde11. Na ocasião, lemos e discutimos todas as narrativas como estratégia para possibilitar novos olhares sobre os problemas do dia a dia e possibilidades de mudança no contexto inserido, dando visibilidade a conceitos-ferramenta.

A plataforma Otics foi a grande articuladora entre alunos e tutor, tutor-tutor e tutor-formador no curso EPSM. Foi uma ferramenta essencial para compartilhar experiências de EPS (no formato de narrativas), afecções relacionadas a essas vivências e troca de saberes entre os diferentes atores. Através das formas de comunicação síncrona e assíncrona, a plataforma promoveu interação e mediação, que trouxeram em seu bojo a concepção pedagógica norteando a aprendizagem no curso12. Privilegiando a interação, a interatividade e a aprendizagem colaborativa, e levando em consideração todo o processo de aprendizagem, a construção se deu em sintonia com o desenvolvimento da prática de trabalho do especializando9

Foram propostas diferentes “Ofertas” que subsidiaram a experimentação do tutor, do aluno e do formador, incluindo textos científicos, vídeos, imagens, fotografias, relatos de experiência e textos disparadores para reflexão sobre a EPS. Através das “Entradas” na plataforma de aprendizagem, se acessa os conteúdos teóricos, documentos formativos e textos de problematização. Há também um material didático disponível previamente ao início do curso, ofertado pela equipe gestora, com situações-problema comuns aos trabalhadores do SUS e que encorajava novas produções no grupo de discussão.

Um dispositivo pedagógico se mostrou potente: trata-se de um espaço para escrever sobre si e sobre o mundo do trabalho, denominado “Diário Cartográfico”13. Sucede também para o tutor conversar com o aluno e o formador com o tutor, por meio desse instrumento que, por sua vez, retroalimenta outras ferramentas, como a “Caixa de Afecções”.

Com essa ferramenta, propôs-se um espaço de arquivo para os objetos relacionais, cujas funcionalidades foram: (1) favorecer uma apropriação sobre a própria produção, a partir do lugar de pertença, em seus mais variados aspectos e sutilezas; (2) interrogar as experiências, abrindo outras conexões para o vivido, favorecendo a produção de deslocamentos e dando passagem aos afetos; (3) transver o vivido, recontextualizando a experiência; (4) colocar em funcionamento ludicamente ideias/pensamentos sobre o vivido; (5) convocar à recriação coletiva dos saberes da experiência. Importantes experiências foram depositadas, vasculhadas, embaralhadas e fisgadas pelos participantes na caixa de afecção dos tutores-formadores e tutores-alunos. A caixa de afecções foi um importante interlocutor entre os diferentes atores do cenário da EPS, em alguns momentos mais acessado que o Diário Cartográfico ou o Fórum.

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A plataforma também possui um “Varal”, que apresenta grande diversidade de cenas, músicas, vídeos e convites à ação-experimentação14. As cenas auxiliam a reflexão e o debate sobre situações vivenciadas no cotidiano dos serviços e do sistema de saúde, servindo também como dispositivo para aprendizagem. As encenações foram narradas a partir de temas que envolveram a gestão, o processo de trabalho, a educação permanente em saúde e outros, a partir de histórias que fazem um convite à reflexão e ao diálogo por meio de questões problematizadoras.

Os “Fóruns” foram mecanismos usados para promover as interações entre colegas de turma, estampar a diversidade de opiniões frente às informações e vivências do cotidiano, além de fomentar a reflexão e o debate. Assim, os conhecimentos foram construídos e reconstruídos numa ação proativa dos participantes do grupo, com abertura de espaços para questionamento e oferecendo, em vez de certezas, oportunidades para o exercício da dúvida e do diálogo produtivo.

Além das cenas já organizadas na plataforma, os próprios participantes (formador, tutor e aluno) foram estimulados a compartilhar as suas. Os panoramas do cotidiano foram escolhidos e postados, evocando reflexões, por exemplo, sobre: (1) a EPS na prática; (2) o desafio da implementação da EPS; (3) a gestão do serviço e a prática de EPS; (4) conceitos, metodologias e instrumentos de EPS no trabalho; (5) a EPS e outros modos de aprender; (6) a construção coletiva do trabalho e do saber; (7) as redes de cuidado em saúde, entre outros. Certamente, essas vivências obtiveram maior atenção dos participantes, uma vez que envolviam problemas reais, desafios cotidianos, afecções concretas e não somente problematização. Dessa maneira, os participantes se fortaleciam em cooperação e compreensão mútua sobre o próprio fazer e aprender.

O “Trabalho de Conclusão de Curso” consistiu em uma produção escrita individual, contemplando reflexões sobre experiências de EPS vivenciadas pelo aluno (momento da especialização) e tutor (momento da formação). Os autores elaboraram escritas reflexivas a partir do conteúdo do diário cartográfico, a “Caixa de afecções”.

Os tutores, no momento de formação, eram avaliados quanto à frequência e uso interativo do ambiente virtual, realização de atividades apresentadas pelo formador, estabelecimento de interações propositivas e cooperativas (feedbacks) e quanto ao domínio no uso das ferramentas interativas utilizadas. Ao mesmo tempo, avaliavam os especializandos em relação ao acesso ao ambiente virtual de aprendizado, à participação regular e significativa na plataforma, frequência nos encontros presenciais, expressão e produção sobre o reconhecimento de processos de EPS no cotidiano do trabalho, reflexos de movimentos de coadjuvação em processos e vivências de EPS em si e no outro durante o percurso formativo. As avaliações carregavam caráter mais formativo que somativo.

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RESULTADOS E DISCUSSÃO

Da prática à teoria, a experiência tem nos ensinado que a EPS é uma aposta para se caminhar entre a metodologia científica oficial, de um lado, e a produção do conhecimento a partir do mundo do trabalho, de outro, mas sempre priorizando este último. Mehry11 refere que a EPS, ao mesmo tempo que disputa pela atualização cotidiana das práticas segundo os mais recentes aportes teóricos, metodológicos, científicos e tecnológicos disponíveis, inserese em uma necessária construção de relações e processos que vão do interior das equipes de atuação conjunta às práticas organizacionais e interinstitucionais e/ou intersetoriais. Nesse sentido, o período de formação dos tutores foi importante para a apreensão da temática, compreensão dos contextos e para despertar “radares” para a EPS nos cenários do trabalho, conforme a inserção dos trabalhadores do SUS.

Deparamo-nos com estranhamento da temática ao compreendê-la como percurso do trabalho. Esse estranhamento decorre do modelo hegemônico de educação em saúde, fundado na hierarquização entre professor e aluno, dicotomia entre prática e teoria e dificuldade de construção coletiva dos diferentes saberes. O ponto de partida da aprendizagem desse curso foi a realidade concreta, com seus determinantes e condicionantes históricos, sociais, culturais, políticos e ideológicos, em especial as forças políticas e relacionais que a delineiam, e não um exercício de abstração. A realidade para os tutores foi o exercício da própria tutoria. A formação aproveitou, organizou e potencializou movimentos de prática. Mesmo na qualidade de tutor, o exercício da profissão não cessou, a produção do cuidado e do ensino para o SUS permaneceu como base para colocar o próprio cotidiano no centro do processo de ensinoaprendizagem. Em via dupla, o método utilizado possibilitou olhar para minha própria prática do trabalho, problematizando-a por meio de atividades de ação-reflexão-ação15.

A repelência ao modo de aprendizado pode ser identificada ao analisar os temas que nortearam os encontros já citados. Observa-se a preocupação dos integrantes em compreender a abordagem para conduzir a formação de aprendizes, em vez de vivenciar o aprendizado construído a partir das próprias experiências. Esse percurso é natural quando, aparentemente, o sentido de aprendizado tende a ser da teoria para a prática, da sala de aula para o mundo do trabalho, da leitura científica para a execução do trabalho.

De certo modo, o “modelo escolar” é soberano nas capacitações3, entretanto, nesse período, os tutores foram desafiados a praticar a lógica inversa, ou ambas, o tempo todo. Enquanto facilitadores, exercemos função reciprocamente produtiva – ora dedicávamos a desenvolver a EPS no mundo singular do trabalho, ora experimentava a tutoria com dez trabalhadores da saúde. O maior desafio foi sempre o de buscar na prática a fundamentação

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para elaboração de novos aprendizados teóricos, e ao mesmo tempo conduzir um grupo de especializandos por essa mesma lógica.

A teorização, o diálogo, a troca, a busca e a produção de saberes almejam a elevação da capacidade de análise crítica sobre a veracidade e a construção de entendimentos, soluções, relações e possibilidades de intervenção nessa realidade, visando uma ação social transformadora15. Dobras de movimentos paralelos e contínuos (presencial e virtual, individual e coletivo) formaram a base para o exercício da tutoria, quando a maior parte da carga horária e a distância se tornaram desafios para ativar mudanças nos locais de trabalho e inserir os alunos em sua locorregião. Os debates sobre as relações de trabalho oportunizadas pelo curso em si expressam uma conquista, uma vez que tais discussões são escassas nos ambientes profissionais. Enquanto tutor, foi imperioso o estabelecimento de um diálogo customizado com os participantes, além de conhecer as diferentes práticas e inserções profissionais do trabalho discorrido na plataforma, auxiliando-os no processo de construção do conhecimento a partir das próprias práticas (conjunto de experiências e vivências) e identificando fendas para a ativação de movimentos de vicissitudes. Ao mesmo tempo, o duelo também foi permeado pelo desenvolvimento da grupalidade, da coesão, a partir de elementos para uma cartografia conjunta16. Desenvolvemos assim o eixo da coletividade, que favoreceu a construção de saberes a partir das trocas de experiência e das reflexões com apoio do material teórico do curso13,16. Exemplo disso foi a discussão dos temas “Produção de Cuidado em Saúde” e “Institucionalização da EPS”.

Os movimentos simultâneos e complementares de afastamento e aproximação, de foco no individual e no coletivo, da prática para a teoria, dos encontros reais e virtuais foram de grande incitação para o exercício da tutoria. Foi necessário lançar mão de um conjunto de conhecimentos (rigor conceitual), saberes e experiências acumulados na trajetória profissional (docente ou técnica); resgatar os próprios conceitos de educação, de trabalho em saúde (enquanto aprendizado), de saúde, de produção do cuidado e de integralidade para rastrear momentos de EPS em nossos cenários de trabalho.

Foram frequentes as queixas dos especializandos e tutores (no período de formação) sobre o projeto pedagógico não ser propositivo nas atividades rotineiras teóricas, no modo pergunta e resposta, leitura de textos ou produção de trabalhos acadêmicos. Os espaços criados na plataforma estiveram abertos e coletivos, gerando uma sensação de vazio. No entanto, exigiram dos formadores, tutores e alunos ativações para torná-los atrativos e significativos para as experiências. Justamente nesse âmbito, a EPS busca produzir, pedagogicamente, certo desconforto com o que se sabe, um incômodo ante a necessidade de saber para agir.

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Esse processo de aprendizagem pretende mobilizar e desafiar os alunos em direção à busca e à abertura para o novo e para a ação17.

A liberdade proposta no projeto pedagógico e vivenciada na plataforma encontrou inicialmente até mesmo uma desmotivação por parte dos participantes. Aos tutores, outro desafio estabelecido foi o de rompimento com a “educação bancária”, mediante distintas estratégias pedagógicas elencadas para uma harmonia entre o que se pratica e o que se ensina. Tradicionalmente, os cursos de capacitação são centrados no “modelo escolar” de ensinoaprendizagem, em que primeiramente são transmitidos os comportamentos corretos, a rotina de trabalho e a contingência científica sobre determinado tema18,19. Depois de estabelecidos os protocolos, prevê-se a aplicação prática do conteúdo teórico aprendido. Culturalmente, estamos habituados a aprender em sala de aula, em laboratórios de prática, em auditórios, sempre com alguém falando ou demonstrando e outro ouvindo e anotando18,19. Entretanto, a estratégia pedagógica adotada na iniciativa desse curso foi exatamente contrária, o que vai de encontro com a proposta da Política Nacional de EPS1.

O encontro presencial, por tradição, tem maior aceitabilidade e melhores aportes discursivos, pois há diálogo síncrono, além de aproximar todos os envolvidos. Cada momento presencial foi iniciado com uma questão, a um só tempo de aprendizagem e de ação, que mediou o diálogo entre o tutor e o grupo de especializandos, de forma a proporcionar novas reflexões e aprendizado. Reunidos em rodas, foi possível se relacionar com o outro, sentir o outro e ajudar mutuamente no refletir e no lidar com as potencialidades e limitações do grupo. Os principais temas foram a institucionalização da EPS, a educação continuada versus a educação permanente, as metodologias de ensino e aprendizagem, as dificuldades do serviço (prática) em atender as necessidades da academia (a universidade-teoria), enfim, o reconhecimento da EPS no dia a dia do trabalho.

Os encontros presenciais ofertados na EPS valorizaram o “ambiente escolar de aprendizagem” para agregar as pessoas em torno da discussão de uma temática, estabelecer pactuações para o desenvolvimento do curso e avaliar os recursos da plataforma virtual e os próprios participantes. Ao final de cada encontro presencial, o curso, a turma e os tutores eram colocados à prova. Realizamos avaliações formativas desses eixos que estruturavam o aprendizado coletivo. Os encontros foram importantes para fomentar o desejo de criar movimentos de EPS no ambiente de trabalho.

Segundo Foucault20, é necessário anotar e escrever as ações e os movimentos do cotidiano, como se a escrita fosse um operador da transformação da verdade em ato, uma matéria-prima para a redação de tratados sistemáticos, nos quais são fornecidos argumentos e

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meios para se lutar contra este ou aquele defeito ou ultrapassar esta ou aquela circunstância difícil. A caixa de afecções, por exemplo, foi uma ferramenta do curso à distância que convidou os participantes à narratividade, à escrita de si, ao compartilhamento de saberes, de práticas, de questionamentos, de desafios, de proposições. Por meio do diário cartográfico, a escrita se transformou no próprio escritor, num princípio racional-efetivo de ação. Foi o momento em que descrevi e li reflexivamente cenas do cotidiano do trabalho e formalizei, em princípio, as ações e os aprendizados. As indagações, a tomada de decisão, a construção do trabalho coletivo, os registros dos encontros presenciais e as sínteses dos textos lidos foram postados no diário com a possibilidade de construir o percurso durante o desenvolvimento do curso, material que serviu de base para este artigo.

A plataforma Otics foi um espaço mediador entre todos os participantes para exposição das experiências do cotidiano. Por excelência, possibilitou a navegação nas diversas ferramentas pedagógicas, como o varal de cenas, ofertas, entradas, caixa de afecções, diário cartográfico, fórum e chat. Percebi que o ambiente promoveu uma potente ligação em meio à flexibilização da aprendizagem. Conforme Gouvêa e Oliveira17, é preciso haver autonomia dos alunos em relação à organização do tempo de estudo, emprego dos recursos, espaços e participação. Tanto a flexibilização das aprendizagens como a autonomia do estudante fazem com que esse sujeito se mova pelo “entre” das pactuações coletivas marcadas nos encontros presenciais.

A plataforma era simples de manusear, mas pouco facilitava a interatividade, mesmo com apoio de equipe técnica. Não foi possível estabelecer uma rede de conversação síncrona entre os tutores-tutores, tutores-formadores e tutores-alunos, pois cada participante acessava em um momento distinto e houve lentidão na velocidade de processamento dos dados. Essa dificuldade desmotivou o grupo e repercutiu, por algum período, em poucos acessos. Para que atitudes de interesse e motivação fossem despertadas nos sujeitos, foi preciso que se identificassem com o objeto de conhecimento. Por um instante, tomei como responsabilidade realizar esse processo de motivação como exclusivo do tutor, porém, exercitei permitir a capacidade crítica e reflexiva dos especializandos. Para isso, contei com os momentos presenciais intercalados e, para não perder a essência do curso, foi necessário despertar os especializando por meio de outras ferramentas tecnológicas, como redes sociais e aplicativos de telefone celular, a fim de estabelecer a conversação on-line.

Identifiquei limitações relacionadas à modalidade EAD e ao uso do computador, como no manuseio da tecnologia disponibilizada, o que resultou em mais tempo despendido para aprender a utilizá-la do que propriamente para encaminhar o processo de EPS. Consequentemente, isso foi alvo de queixas nas avaliações de alunos e tutores. A lentidão na

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velocidade de processamento e as mudanças que ocorreram na organização e estruturação da plataforma durante o percurso fizeram com que nós (tutores e os alunos) compartilhássemos menos as experiências e frequentássemos menos o ambiente virtual, e, assim, o partilhar das experiências e o interagir em grupo foram comprometidos. Grande parte dos cursos estruturados para essa modalidade reproduz a pedagogia tradicional, não alcançam essas dificuldades dos alunos ou até mesmo selecionam somente candidatos que tenham habilidade em manusear essas tecnologias.

Quantos aos materiais disponibilizados na plataforma, foram de suma importância, mas foram as lacunas que naturalmente surgiram do conteúdo que serviram para o desenvolvimento do trabalho da turma, pois foram as experiências do dia a dia, muito mais que o material, que propiciaram a troca de saberes. Conforme Paim21, os especializandos trabalhadores do SUS não são apenas sujeitos curiosos participantes de um curso lato sensu e interessados em aprender mais sobre um tema de interesse; são trabalhadores da gestão. São sujeitos implicados com a resolução dos problemas concretos e com a produção das ações necessárias para o desenvolvimento da saúde pública em seu lugar de inserção social e técnicopolítica. É esse o desafio que motiva, para além do curso, a buscar e produzir saberes e fazeres que melhor operem o cotidiano da produção de saúde.

Ao reconhecermos as necessidades e o poder criativo de cada um, inicialmente cheios de valores e de significados, os quais, muitas vezes, se perdem pelo caminho, podemos vencer o desafio de romper com a lógica da pura e simples compra de produtos pré-formatados de treinamento técnico. A proposta da EPSM foi mudar as estratégias de atenção construídas na prática das equipes, voltando-se para a organização dos serviços, e não somente a partir das necessidades individuais de atualização, que são infinitas.

Analisando os trabalhos dos especializandos, percebi que foi um momento de demonstração sobre as aquisições durante todo o percurso. Interpretei como um momento em que os educandos mostraram aos demais colegas os novos desafios da EPS no cenário de prática do SUS, estando aptos a contribuir para a próprio cotidiano e da equipe. Os trabalhos suscitaram o emprego de todos os saberes assimilados ao longo da imersão no curso. Os temas que se destacaram foram: (1) rastreamento da EPS no cenário de trabalho; (2) narrativa de percurso e vivência de EPS; e (3) proposta de projeto de educação em saúde. Podemos considerar que os assuntos abordados têm viés de condução do grupo, dado que estão conectados às proposições elencadas logo no início da formação. Por outro aspecto, talvez sejam realmente demandas da política da EPS. Contudo, são necessárias outras produções científicas que relatem experiências de formação em EPS.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O curso EPSM permitiu o desenvolvimento do aprendizado no próprio cenário de prática: o exercício da tutoria. Concluímos que essa experiência foi exitosa, desafiadora e duplamente produtiva, constituindo-se em incentivo à participação em outras iniciativas de EPS, na modalidade de ensino semipresencial. Destaco a importância do primeiro encontro presencial para a constituição do vínculo e da grupalidade. Os encontros em espaço acadêmico, intercalados aos mediados pela plataforma virtual e interações informais em redes sociais, merecem destaque em relação à coesão e à harmonia no compartilhamento das vivências. O exercício da narrativa sobre o cenário de trabalho auxiliou os participantes a construírem uma nova prática pedagógica. Os fóruns e a abertura da caixa de afecções otimizaram a aproximação de cada um dos alunos, dialogando com as necessidades, experiências isoladas e a ativação de movimentos que favoreceram a construção coletiva de saberes. É necessário considerar as habilidades de manusear as tecnologias da informática, assim como divulgar as experiências de formação em EPS.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Juleimar Soares Coelho de Amorim, Fernanda de Freitas Mendonça, Helvo Slomp Júnior e Rossana Staevie Baduy.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Juleimar Soares Coelho de Amorim, Helvo Slomp Júnior e Mariana Bertol Leal.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Juleimar Soares Coelho de Amorim e Rossana Staevie Baduy.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Juleimar Soares Coelho de Amorim e Helvo Slomp Júnior.

REFERÊNCIAS

1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Política Nacional de Educação Permanente em Saúde. Brasília (DF); 2009. (Série B. Textos Básicos de Saúde).

2. EPS em Movimento. Educação e trabalho em saúde: a importância do saber da experiência [Internet]. 2014 [citado em 2015 ago 8]. Disponível em: https://livrozilla.com/doc/1631264/educa%C3%A7%C3%A3o-e-trabalhoem-sa%C3%BAde---eps

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3. Pinheiro R, Ceccin RB, Mattos RA, organizadores. Ensinar Saúde: a integralidade e o SUS nos cursos de graduação na área da saúde. Rio de Janeiro (RJ): IMS/UERJ; 2005.

4. Ceccim RB. Educação Permanente em Saúde: desafio ambicioso e necessário. Interface. 2005;9(16):16177.

5. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gest ã o do Trabalho e da Educa çã o na Sa ú de. Departamento de Gest ã o da Educa çã o na Sa ú de. Política de Educação e Desenvolvimento para o SUS – caminhos para a Educação Permanente em Saúde. Brasília (DF); 2004. (Série C, Projetos, Programas e Relatórios).

6. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Glossário temático: gestão do trabalho e da educação na saúde. 2a ed. Brasília (DF); 2012.

7. Mendonça FF. Formação de facilitadores de educação permanente em saúde: percepções de tutores e facilitadores [dissertação]. Londrina (PR): Universidade Estadual de Londrina; 2008.

8. Merhy EE, Feuerwerker LCM, Ceccim RB. Educación Permanente em Salud: uma Estrategia para Intervir em la Micropolítica del Trabajo em Salud. Salud Coletiva. 2006;2(2):14760.

9. Oliveira MAN. Educação à Distância como estratégia para a educação permanente em saúde: possibilidades e desafios. Rev Bras Enferm. 2007;60(5):5859.

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11. Mehry EE. Educação Permanente em Movimento – uma política de reconhecimento e cooperação, construindo encontros no cotidiano das práticas de saúde. 2013 [citado em 2016 jan 14].

12. Merhy EE, Feuerwerker LCM. Novo olhar sobre as tecnologias de saúde: uma necessidade contemporânea. In: Mandarino ACS, Gomberg E, organizadores. Leituras de Novas Tecnologias e Saúde. São Cristóvão (SE): Editora UFS; 2009. p. 2956.

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15. EPS em movimento. Uma possibilidade de fazer diferente [Internet]. 2014 [citado em 2015 dez 12].

16. Pelbart PP. Elementos para uma cartografia da grupalidade [Internet]. 2014 [citado em 2016 jan 14]. Disponível em: http://desarquivo.org/sites/default/ files/pelbart_peter_elementos.pdf

17. Gouvêa G, Oliveira CI. Educação a Distância na formação de professores: viabilidades, potencialidades e limites. 4a ed. Rio de Janeiro (RJ): Vieira e Lent; 2006.

18. Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo (SP): Paz e Terra; 1996.

19. Morin E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2a ed. São Paulo (SP): Cortez; 2000.

20. Foucault M. A escrita de si. In: Foucault M. O que é um autor?. Lisboa: Passagens; 1992. p. 12960.

21. Paim MC, Alves VS, Ramos AS. Projeto EAD SUS/BA: incorporação do ensino a distância aos processos de educação permanente para profissionais do sistema único de saúde do Estado da Bahia. Rev Baiana Saúde Pública. 2009;33(1):10412.

Recebido: 27.2.2018. Aprovado: 19.4.2021.

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DIRETRIZES PARA AUTORES

A Revista Baiana de Saúde Pública (RBSP), publicação oficial da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab), de periodicidade trimestral, publica contribuições sobre aspectos relacionados aos problemas de saúde da população e à organização dos serviços e sistemas de saúde e áreas correlatas. São aceitas para publicação as contribuições escritas preferencialmente em português, de acordo com as normas da RBSP, obedecendo a ordem de aprovação pelos editores. Os trabalhos são avaliados por pares, especialistas nas áreas relacionadas aos temas referidos.

Os manuscritos devem destinar-se exclusivamente à RBSP, não sendo permitida sua apresentação simultânea a outro periódico, tanto no que se refere ao texto como às ilustrações e tabelas, quer na íntegra ou parcialmente. Os artigos publicados serão de propriedade da revista, ficando proibida a reprodução total ou parcial em qualquer meio de divulgação, impresso ou eletrônico, sem a prévia autorização da RBSP. Devem ainda referenciar artigos sobre a temática publicados nesta Revista.

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2 Artigos Originais de Tema Livre:

2.1 pesquisa: artigos apresentando resultados finais de pesquisas científicas (10 a 20 páginas);

2.2 ensaios: artigos com análise crítica sobre um tema específico (5 a 8 páginas);

2.3 revisão: artigos com revisão crítica de literatura sobre tema específico, solicitados pelos editores (8 a 15 páginas).

3 Comunicações: informes de pesquisas em andamento, programas e relatórios técnicos (5 a 8 páginas).

4 Teses e dissertações: resumos de dissertações de mestrado e teses de doutorado/ livre docência defendidas e aprovadas em universidades brasileiras (máximo 2 páginas). Os resumos devem ser encaminhados com o título oficial da tese/ dissertação, dia e local da defesa, nome do orientador e local disponível para consulta.

5 Resenha de livros: livros publicados sobre temas de interesse, solicitados pelos editores (1 a 4 páginas).

6 Relato de experiência: apresentando experiências inovadoras (8 a 10 páginas).

7 Carta ao editor: comentários sobre material publicado (2 páginas).

8 Documentos: de órgãos oficiais sobre temas relevantes (8 a 10 páginas).

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Como parte do processo de submissão, os autores são obrigados a verificar a conformidade da submissão em relação a todos os itens listados a seguir. As submissões que não estiverem de acordo com as normas serão devolvidas aos autores.

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ARTIGOS

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Segunda folha/Metadados: iniciar com o título do trabalho, sem referência a autoria, e acrescentar um resumo de no máximo 200 palavras, com versão em inglês (Abstract) e espanhol (Resumen). Trabalhos em espanhol ou inglês devem também apresentar resumo em português.

Palavras-chave (3 a 5) extraídas do vocabulário DeCS (Descritores em Ciências da Saúde/ www. decs.bvs.br) para os resumos em português e do MESH (Medical Subject Headings/ www.nlm. nih.gov/mesh) para os resumos em inglês.

Terceira folha: título do trabalho sem referência à autoria e início do texto com parágrafos alinhados nas margens direita e esquerda (justificados), observando a sequência: introdução – conter justificativa e citar os objetivos no último parágrafo; material e métodos; resultados, discussão, conclusão ou

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considerações finais (opcional) e referências. Digitar em página independente os agradecimentos, quando necessários, e as contribuições individuais de cada autor na elaboração do artigo.

RESUMOS

Os resumos devem ser apresentados nas versões português, inglês e espanhol. Devem expor sinteticamente o tema, os objetivos, a metodologia, os principais resultados e as conclusões. Não incluir referências ou informação pessoal.

ILUSTRAÇÕES E TABELAS

Obrigatoriamente, os arquivos das ilustrações (quadros, gráficos, fluxogramas, fotografias, organogramas etc.) e tabelas devem ser encaminhados em arquivo independente; suas páginas não devem ser numeradas. Estes arquivos devem ser compatíveis com o processador de texto “Microsoft Word” (formatos: PICT, TIFF, GIF, BMP).

O número de ilustrações e tabelas deve ser o menor possível. As ilustrações coloridas somente serão publicadas se a fonte de financiamento for especificada pelo autor.

Na seção resultados, as ilustrações e tabelas devem ser numeradas com algarismos arábicos, por ordem de aparecimento no texto, e seu tipo e número destacados em negrito (e.g. “[...] na Tabela 2 as medidas [...]).

No corpo das tabelas, não utilizar linhas verticais nem horizontais; os quadros devem ser fechados.

Os títulos das ilustrações e tabelas devem ser objetivos, situar o leitor sobre o conteúdo e informar a abrangência geográfica e temporal dos dados, segundo Normas de Apresentação Tabular do IBGE (e.g.: Gráfico 2 – Número de casos de aids por região geográfica. Brasil – 1986-1997).

Ilustrações e tabelas reproduzidas de outras fontes já publicadas devem indicar esta condição após o título.

ÉTICA EM PESQUISA

Trabalho que resulte de pesquisa envolvendo seres humanos ou outros animais deve vir acompanhado de cópia escaneada de documento que ateste sua aprovação prévia por um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), além da referência na seção Material e Métodos.

REFERÊNCIAS

Preferencialmente, qualquer tipo de trabalho encaminhado (exceto artigo de revisão) deverá listar até 30 fontes.

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As referências no corpo do texto deverão ser numeradas em sobrescrito, consecutivamente, na ordem em que sejam mencionadas a primeira vez no texto.

As notas explicativas são permitidas, desde que em pequeno número, e devem ser ordenadas por letras minúsculas em sobrescrito. As referências devem aparecer no final do trabalho, listadas pela ordem de citação, alinhadas apenas à esquerda da página, seguindo as regras propostas pelo Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas (Requisitos Uniformes para Manuscritos apresentados a periódicos biomédicos/Vancouver), disponíveis em http://www.icmje.org ou http://www.abeceditores.com.br.

Quando os autores forem mais de seis, indicar apenas os seis primeiros, acrescentando a expressão et al.

Exemplos:

a) LIVRO

Acha PN, Szyfres B. Zoonosis y enfermedades transmisibles comunes al hombre y a los animales.

2ª ed. Washington (DC): Organizacion Panamericana de la Salud; 1989.

b) CAPÍTULO DE LIVRO

Almeida JP, Rodriguez TM, Arellano JLP. Exantemas infecciosos infantiles. In: Arellano JLP, Blasco AC, Sánchez MC, García JEL, Rodríguez FM, Álvarez AM, editores. Guía de autoformación en enfermedades infecciosas. Madrid: Panamericana; 1996. p. 1155-68.

c) ARTIGO

Azevêdo ES, Fortuna CMM, Silva KMC, Sousa MGF, Machado MA, Lima AMVMD, et al. Spread and diversity of human populations in Bahia, Brazil. Hum Biol. 1982;54:329-41.

d) TESE E DISSERTAÇÃO

Britto APCR. Infecção pelo HTLV-I/II no estado da Bahia [Dissertação]. Salvador (BA): Universidade Federal da Bahia; 1997.

e) RESUMO PUBLICADO EM ANAIS DE CONGRESSO

Santos-Neto L, Muniz-Junqueira I, Tosta CE. Infecção por Plasmodium vivax não apresenta disfunção endotelial e aumento de fator de necrose tumoral-α (FNT-α) e interleucina-1α (IL-1α). In: Anais do 30º Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. Salvador, Bahia; 1994. p. 272.

f) DOCUMENTOS EXTRAÍDOS DE ENDEREÇO DA INTERNET

Comissão de Residência Médica do Hospital Universitário Professor Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia. Regimento Interno da Coreme. Extraído de [http://www.hupes. ufba.br/coreme], acesso em [20 de setembro de 2001].

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Não incluir nas Referências material não publicado ou informação pessoal. Nestes casos, assinalar no texto: (i) Antunes Filho FF, Costa SD: dados não publicados; ou (ii) Silva JA: comunicação pessoal, 1997. Todavia, se o trabalho citado foi aceito para publicação, incluí-lo entre as referências, citando os registros de identificação necessários (autores, título do trabalho ou livro e periódico ou editora), seguido da expressão latina In press e o ano.

Quando o trabalho encaminhado para publicação tiver a forma de relato de investigação epidemiológica, relato de fato histórico, comunicação, resumo de trabalho final de curso de pós-graduação, relatórios técnicos, resenha bibliográfica e carta ao editor, o(s) autor(es) deve(m) utilizar linguagem objetiva e concisa, com informações introdutórias curtas e precisas, delimitando o problema ou a questão objeto da investigação. Seguir as orientações para referências, ilustrações e tabelas.

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The Public Health Journal of Bahia (RBSP), a quarterly official publication of the Health Secretariat of the State of Bahia (Sesab), publishes contributions on aspects related to population’s health problems, health system services and related areas. It accepts for publication written contributions, preferably in Portuguese, according to the RBSP standards, following the order of approval by the editors. Peer experts in the areas related to the topics in question evaluate the papers.

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2 Free theme original articles:

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6 Experiments’ report: presenting innovative experiments (8 to 10 pages).

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GUIDELINES TO THE AUTHORS

CHECK ITEMS FOR SUBMISSION

As part of the submission process all the authors are supposed to verify the submission guidelines in relation to the items that follow. The submissions that are not in accordance with the rules will be sent back to the authors.

GENERAL INSTRUCTIONS FOR SENDING MATERIAL

The editors must evaluate the papers and the revisers will follow the order of receipt and shall abide by the following criteria of submission:

a) all the submissions must be made by the publisher online submission system (SEER). The metadata must be filled in. Failure to do so will result in the nonevaluation of the article;

b) the text pages must be formatted in 1.5 spacing, with 2 cm margins, Times New Roman typeface, font size 12, A4 standard page, numbered at top right;

c) drawings and digital pictures will be forwarded in separate files;

d) the maximum number of authors per manuscript is six (6).

ARTICLES

Cover sheet/Metadata: inform the title (with an English and Spanish version), name(s) of the author(s), main institutional connection of each author, funding organization(s) and postal and electronic address of one of authors for correspondence.

Second page/Metadata: Start with the paper’s title, without reference to authorship and add an abstract of up to 200 words, followed with English (Abstracts) and Spanish (Resumen) versions. Spanish and English papers must also present an abstract in Portuguese. Keywords (3 to 5) extracted from DeCS (Health Science Descriptors at www.decs.bvs.br) for the abstracts in Portuguese and from MESH (Medical Subject Headings at www.nlm.nih.gov/mesh) for the abstracts in English.

Third page: paper’s title without reference to authorship and beginning of the text with paragraphs aligned to both right and left margins (justified), observing the following sequence: introduction –containing justification and mentioning the objectives in the last paragraph; material and methods; results, discussion, conclusion or final considerations (optional) and references. Type in the acknowledgement on an independent page whenever necessary, and the individual contribution of each author when elaborating the article.

VII
Revista Baiana de Saúde Pública

ABSTRACTS

The abstracts must be presented in the Portuguese, English and Spanish versions. They must synthetically expose the topic, objectives, methodology, main results and conclusions. It must not include personal references or information.

ILLUSTRATIONS AND TABLES

The files of the illustrations (charts, graphs, flowcharts, photographs, organization charts etc.) and tables must forcibly be independent; their pages must not be numbered. These files must be compatible with “Microsoft Word” word processor (formats: PICT, TIFF, GIF, BMP).

Colored illustration will only be published if the author specifies the funding source.

On the results section illustrations and tables must be numbered with Arabic numerals, ordered by appearance in the text, and its type and number must be highlighted in bold (e.g. “[...] on Table 2 the measures […]).

On the body of tables use neither vertical nor horizontal lines; the charts must be framed.

The titles of the illustrations and tables must be objective, contextualize the reader about the content and inform the geographical and time scope of the data, according to the Tabular Presentation Norms of IBGE (e.g.: Graph 2 – Number of Aids cases by geographical region. Brazil – 1986-1997).

Illustrations and tables reproduced from already published sources must have this condition informed after the title.

RESEARCH ETHICS

Paper that results from research involving human beings or other animals must be followed by a scanned document, which attests its previous approval by a Research Ethic Committee (REC), in addition to the reference at the Material and Methods Section.

REFERENCES

Preferably, any kind of paper sent (except review article) must list up to 30 sources.

The references in the body of the text must be consecutively numbered in superscript, in the order that they are mentioned for the first time.

Explanatory notes are allowed, provided that in small number and low case letters in superscript must order them.

VIII

References must appear at the end of the work, listed by order of appearance, aligned only to the left of the page, following the rules proposed by the International Committee of Medical Journal Editors (Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals/ Vancouver), available at http://www.icmje.org or http://www.abec-editores.com.br.

When there are more than six authors, indicate only the first six, adding the expression et al.

Examples:

a) BOOK

Acha PN, Szyfres B. Zoonosis y enfermedades transmisibles comunes al hombre y a los animales. 2ª ed. Washington (DC): Organizacion Panamericana de la Salud; 1989.

b) BOOK CHAPTER

Almeida JP, Rodriguez TM, Arellano JLP. Exantemas infecciosos infantiles. In: Arellano JLP, Blasco AC, Sánchez MC, García JEL, Rodríguez FM, Álvarez AM, editores. Guía de autoformación en enfermedades infecciosas. Madrid: Panamericana; 1996. p. 1155-68.

c) ARTICLE

Azevêdo ES, Fortuna CMM, Silva KMC, Sousa MGF, Machado MA, Lima AMVMD, et al. Spread and diversity of human populations in Bahia, Brazil. Hum Biol. 1982;54:329-41.

d) THESIS AND DISSERTATION

Britto APCR. Infecção pelo HTLV-I/II no estado da Bahia [Dissertação]. Salvador (BA): Universidade Federal da Bahia; 1997.

e) ABSTRACT PUBLISHED IN CONFERENCE ANNALS

Santos-Neto L, Muniz-Junqueira I, Tosta CE. Infecção por Plasmodium vivax não apresenta disfunção endotelial e aumento de fator de necrose tumoral-α (FNT-α) e interleucina-1α (IL-α). In: Anais do 30º Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. Salvador, Bahia; 1994. p. 272.

f) DOCUMENTS OBTAINED FROM INTERNET ADDRESS

Comissão de Residência Médica do Hospital Universitário Professor Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia. Regimento Interno da Coreme. Extraído de [http://www. hupes. ufba.br/coreme], acesso em [20 de setembro de 2001].

Do not include unpublished material or personal information in the References. In such cases, indicate it in the text: (i) Antunes Filho FF, Costa SD: unpublished data; or Silva JA: personal communication, 1997. However, if the mentioned material was accepted for publication,

IX
Revista Baiana de Saúde Pública

include it in the references, mentioning the required identification entries (authors, title of the paper or book and periodical or editor), followed by the Latin expression In press, and the year.

When the paper directed to publication have the format of an epidemiological research report, historical fact report, communication, abstract of post-graduate studies’ final paper, technical report, bibliographic report and letter to the editor, the author(s) must use a direct and concise language, with short and precise introductory information, limiting the problem or issue object of the research. Follow the guidelines for the references, illustrations and tables.

The editors and reviewers will only accept the contribution sent for evaluation if they comply with the standards of the journal.

Contact us

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X

DIRECTRIZES PARA LOS AUTORES

La Revista Baiana de Salud Pública (RBSP), publicación oficial de la Secretaria de la Salud del Estado de la Bahia (Sesab), de periodicidad trimestral, publica contribuciones sobre aspectos relacionados a los problemas de salud de la población y a la organización de los servicios y sistemas de salud y áreas correlatas. Son aceptas para publicación las contribuciones escritas preferencialmente en portugués, de acuerdo con las normas de la RBSP, obedeciendo la orden de aprobación por los editores. Los trabajos son evaluados por pares, especialistas en las áreas relacionadas a los temas referidos.

Los manuscritos deben destinarse exclusivamente a la RBSP, no siendo permitida su presentación simultánea a otro periódico, tanto en lo que se refiere al texto como a las ilustraciones y tablas, sea en la íntegra o parcialmente. Los artículos publicados serán de propiedad de la revista, quedando prohibida la reproducción total o parcial en cualquier soporte (impreso o electrónico), sin la previa autorización de la RBSP. Deben, también, hacer referencia a artículos sobre la temática publicados en esta Revista.

CATEGORÍAS ACEPTAS:

1 Artículos Temáticos: revisión crítica o resultado de investigación de naturaleza empírica, experimental o conceptual sobre un asunto en pauta, definido por el Consejo Editorial (10 a 20 hojas).

2 Artículos originales de tema libre:

2.1 investigación: artículos presentando resultados finales de investigaciones científicas (10 a 20 hojas);

2.2 ensayos: artículos con análisis crítica sobre un tema específico (5 a 8 hojas);

2.3 revisión: artículos con revisión crítica de literatura sobre tema específico, solicitados por los editores (8 a 15 hojas).

3 Comunicaciones: informes de investigaciones en andamiento, programas e informes técnicos (5 a 8 hojas).

4 Tesis y disertaciones: resúmenes de tesis de maestría y tesis de doctorado/ libre docencia defendidas y aprobadas en universidades brasileñas (máximo 2 hojas). Los resúmenes deben ser encaminados con el título oficial de la tesis, día y local de la defensa, nombre del orientador y local disponible para consulta.

5 Reseña de libros: libros publicados sobre temas de interés, solicitados por los editores (1 a 4 hojas).

6 Relato de experiencias: presentando experiencias innovadoras (8 a 10 hojas).

7 Carta al editor: comentarios sobre material publicado (2 hojas).

8 Documentos: de organismos oficiales sobre temas relevantes (8 a 10 hojas).

XI
Revista Baiana de Saúde Pública

EDITORIAL

De responsabilidad de los editores, también puede ser redactado por un invitado, mediante solicitación del editor general (1 a 3 páginas).

ORIENTACIONES A LOS AUTORES

ITEM DE VERIFICACIÓN PARA SUMISIÓN

Como parte del proceso de sumisión, los autores son obligados a verificar la conformidad de la sumisión en relación a todos los item descritos a seguir. Las sumisiones que no estén de acuerdo con las normas serán devueltas a los autores.

INSTRUCCIONES GENERALES PARA ENVIO

Los trabajos apreciados por los editores y revisores seguirán la orden de recibimiento y deberán obedecer a los siguientes criterios de presentación:

a) todos los trabajos deben ser enviados a través del Sistema de Publicación Electrónica de Revista (SEER). Completar obligatoriamente los metadatos, sin los cuales el artículo no será encaminado para evaluación;

b) las páginas deben ser formateadas en espacio 1,5, con márgenes de 2 cm, fuente Times New Roman, tamaño 12, página patrón A4, numeradas en el lado superior derecho;

c) los diseños o fotografías digitalizadas serán encaminadas en archivos separados;

d) el número máximo de autores por manuscrito científico es de seis (6).

ARTÍCULOS

Página de capa/Metadatos: informar el título (con versión en inglés y español), nombre(s) del(los) autor(es), principal vinculación institucional de cada autor, órgano(s) financiador(es) y dirección postal y electrónica de uno de los autores para correspondencia.

Segunda página/Metadatos: iniciada con el título del trabajo, sin referencia a la autoría, y agregar un resumen de 200 palabras como máximo, con versión en inglés (Abstract) y español (Resumen). Trabajos en español o inglés deben también presentar resumen en portugués. Palabras clave (3 a 5) extraídas del vocabulario DeCS (Descritores en Ciências da Saúde/ www. decs.bvs.br) para los resúmenes en portugués y del MESH (Medical Subject Headings/ www. nlm.nih.gov/mesh) para los resúmenes en inglés.

Tercera página: título del trabajo sin referencia a la autoría e inicio del texto con parágrafos alineados en las márgenes derecha e izquierda (justificados), observando la secuencia: introducción – contener justificativa y citar los objetivos en el último parágrafo; material y métodos; resultados, discusión, conclusión o consideraciones finales (opcional) y referencias. Digitar en página independiente los agradecimientos, cuando sean necesarios, y las contribuciones individuales de cada autor en la elaboración del artículo.

XII

RESÚMENES

Los resúmenes deben ser presentados en las versiones portugués, inglés y español. Deben exponer sintéticamente el tema, los objetivos, la metodología, los principales resultados y las conclusiones. No incluir referencias o información personal.

ILUSTRACIONES Y TABLAS

Obligatoriamente, los archivos de las ilustraciones (cuadros, gráficos, diagrama de flujo, fotografías, organigramas etc.) y tablas deben ser independientes; sus páginas no deben ser numeradas. Estos archivos deben ser compatibles con el procesador de texto “Microsoft Word” (formatos: PICT, TIFF, GIF, BMP).

El número de ilustraciones y tablas debe ser el menor posible. Las ilustraciones coloridas solamente serán publicadas si la fuente de financiamiento sea especificada por el autor.

En la sección de resultados, las ilustraciones y tablas deben ser enumeradas con numeración arábiga, por orden de aparecimiento en el texto, y su tipo y número destacados en negrita (e.g. “[...] en la Tabla 2 las medidas [...]).

En el cuerpo de las tablas, no utilizar líneas verticales ni horizontales; los cuadros deben estar cerrados.

Los títulos de las ilustraciones y tablas deben ser objetivos, situar al lector sobre el contenido e informar el alcance geográfico y temporal de los datos, según Normas de Presentación de Tablas del IBGE (e.g.: Gráfico 2 – Número de casos de SIDA por región geográfica. Brasil – 1986-1997).

Ilustraciones y tablas reproducidas de otras fuentes ya publicadas deben indicar esta condición después del título.

ÉTICA EN INVESTIGACIÓN

Trabajo resultado de investigación envolviendo seres humanos u otros animales debe venir acompañado con copia escaneada de documento que certifique su aprobación previa por un Comité de Ética en Investigación (CEP), además de la referencia en la sección Material y Métodos.

REFERENCIAS

Preferencialmente, cualquier tipo de trabajo encaminado (excepto artículo de revisión) deberá listar un máximo de 30 fuentes.

XIII

Las referencias en el cuerpo del texto deberán ser enumeradas en sobrescrito, consecutivamente, en el orden en que sean mencionadas la primera vez en el texto.

Las notas explicativas son permitidas, desde que en pequeño número, y deben ser ordenadas por letras minúsculas en sobrescrito.

Las referencias deben aparecer al final del trabajo, listadas en orden de citación, alineadas apenas a la izquierda de la página, siguiendo las reglas propuestas por el Comité Internacional de Editores de Revistas Médicas (Requisitos uniformes para manuscritos presentados a periódicos biomédicos/ Vancouver), disponibles en http://www.icmje.org o http://www.abeceditores. com.br.

Cuando los autores sean más de seis, indicar apenas los seis primeros, añadiendo la expresión et al.

Ejemplos:

a) LIBRO

Acha PN, Szyfres B. Zoonosis y enfermedades transmisibles comunes al hombre y a los animales.

2ª ed. Washington (DC): Organización Panamericana de la Salud; 1989.

b) CAPÍTULO DE LIBRO

Almeida JP, Rodriguez TM, Arellano JLP. Exantemas infecciosos infantiles. In: Arellano JLP, Blasco AC, Sánchez MC, García JEL, Rodríguez FM, Álvarez AM, editores. Guía de autoformación en enfermedades infecciosas. Madrid: Panamericana; 1996. p. 1155-68.

c) ARTÍCULO

Azevêdo ES, Fortuna CMM, Silva KMC, Sousa MGF, Machado MA, Lima AMVMD, et al. Spread and diversity of human populations in Bahia, Brazil. Hum Biol. 1982;54:329-41.

d) TESIS Y DISERTACIÓN

Britto APCR. Infecção pelo HTLV-I/II no estado da Bahia [Dissertação]. Salvador (BA): Universidade Federal da Bahia; 1997.

e) RESUMEN PUBLICADO EN ANALES DE CONGRESO

Santos-Neto L, Muniz-Junqueira I, Tosta CE. Infecção por Plasmodium vivax não apresenta disfunção endotelial e aumento de fator de necrose tumoral-α (FNT-α) e interleucina-1α (IL-1α). In: Anais do 30º Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. Salvador, Bahia; 1994. p. 272.

f) DOCUMENTOS EXTRAIDOS DE SITIOS DE LA INTERNET

Comissão de Residência Médica do Hospital Universitário Professor Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia. Regimento Interno da Coreme. Extraído de [http://www.hupes. ufba.br/coreme], acesso em [20 de setembro de 2001].

XIV

No incluir en las Referencias material no publicado o información personal. En estos casos, indicar en el texto: (i) Antunes Filho FF, Costa SD: datos no publicados; o (ii) Silva JA: comunicación personal, 1997. Sin embargo, si el trabajo citado es acepto para publicación, incluirlo entre las referencias, citando los registros de identificación necesarios (autores, título del trabajo o libro y periódico o editora), seguido de la expresión latina In press y el año.

Cuando el trabajo encaminado para publicación tenga la forma de relato de investigación epidemiológica, relato de hecho histórico, comunicación, resumen de trabajo final de curso de postgraduación, informes técnicos, reseña bibliográfica y carta al editor, el(los) autor(es) debe(n) utilizar lenguaje objetiva y concisa, con informaciones introductorias cortas y precisas, delimitando el problema o la cuestión objeto de la investigación. Seguir las orientaciones para referencias, ilustraciones y tablas.

Las contribuciones encaminadas a los editores y revisores, solo serán aceptadas para apreciación si atienden las normas de la revista.

Dirección para contacto:

Revista Baiana de Saúde Pública Centro de Atenção à Saúde (CAS)

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XV
Revista Baiana de Saúde Pública

SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DA BAHIA – SESAB

REVISTA BAIANA DE SAÚDE PÚBLICA – RBSP

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XVI
i

Revista Baiana de Saúde Pública

ARTIGO ORIGINAL DE TEMA LIVRE CARACTERIZAÇÃO DE PACIENTES COM ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO EM ATENDIMENTO FISIOTERAPÊUTICO EM UMA UNIVERSIDADE PÚBLICA MORTALIDADE E INTERNAÇÕES POR DOENÇAS CARDIOVASCULARES EM MUNICÍPIOS DA REGIÃO NORTE DO ESPÍRITO SANTO PREVALÊNCIA E CARACTERIZAÇÃO DE ENTEROPARASITOS EM ANÁLISES DE FEZES EM UM DISTRITO DA BAHIA, BRASIL DIREITO À SAÚDE: DEMANDA POR SUPLEMENTOS ALIMENTARES NO RIO DE JANEIRO – UM ESTUDO DE CASO ARTIGO DE REVISÃO FRAGILIDADES NA ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DAS EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA DESCRITAS NA LITERATURA ATOR SOCIAL E AS INVESTIGAÇÕES EM SAÚDE: OLHAR PARA NOVA CONTRIBUIÇÃO TEÓRICA FEBRE DO NILO OCIDENTAL: UMA REVISÃO DA LITERATURA ESTUDO SOBRE A QUALIDADE DA ÁGUA PARA CONSUMO HUMANO E AS DOENÇAS DIARREICAS NO BRASIL CUIDANDO DO PRAZER NO PRÉ-NATAL: DISFUNÇÃO SEXUAL NA GRAVIDEZ RELATO DE EXPERIÊNCIA PRECEPTORIA COM DISCENTES DE ENFERMAGEM NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA DA FORMAÇÃO AO EXERCÍCIO DA TUTORIA EM EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE

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