#OCaminhoDoCoração Introdução 1 - "Orar e mobilizar as nossas vidas"

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Este livro é propriedade, no seu todo e em cada uma das suas partes, da Rede Mundial de Oração do Papa O seu acesso, total ou parcialmente, é gratuito. O conteúdo não pode ser modificado, total ou parcialmente, sem autorização prévia concedida pelo Secretariado Internacional. A Rede Mundial de Oração do Papa autorizaadistribuição gratuita deste livro. O seu conteúdo pode ser reproduzido total ou parcialmente e apresentado em diversos suportes (virtuais ou físicos), mediante indicação da fonte Rede Mundial de Oração do Papa. É proibida a sua venda ou doação onerosa sem autorizaçãoexpressaemitidapelo Secretariado Internacional

INTRODUÇÃO
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QUERIDOS AMIGOS NO SENHOR

O Caminho do Coração é o itinerário espiritual proposto pela Rede Mundial de Oração do Papa É o fundamento da nossa missão, uma missão de compaixão pelo mundo Inscreve-se no processo iniciado pelo Papa Francisco com a Exortação Apostólica Evangelii gaudium, «A Alegria do Evangelho»

Constitui o resultado de um longo processo impulsionado pelo P Adolfo Nicolás, então Superior Geral da Companhia de Jesus No início elaborou-se um esquema, designado então de marco referencial, com uma equipa internacional liderada pelo P Claudio Barriga SJ Este itinerário foi apresentado ao Papa Francisco num documento intitulado Um caminho com Jesus em disponibilidade apostólica (agosto de 2014) Apresentava-se uma nova forma de compreender a missão do Apostolado da Oração, numa dinâmica de disponibilidade apostólica O Santo Padre aprovou-o em dezembro de 2014

O Caminho do Coração é essencial para a recriação desta Obra Pontifícia como Rede Mundial de Oração do Papa Constitui um aprofundamento, para os nossos dias, da tradição espiritual do Apostolado da Oração, e articula, de uma forma original, elementos essenciais deste tesouro espiritual com a dinâmica do Coração de Jesus É a chave de interpretação da nossa missão Por isso apresentamos em 2017 um comentário a este itinerário espiritual, designado agora «Dinâmica interna do passo», para ajudar as equipas nacionais da Rede Mundial de Oração do Papa a entrar na dinâmica interior do Caminho do Coração e a aprofundá-lo

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Com o desejo de desenvolver o processo de recriação, sentimos a necessidade de ampliar os conteúdos escritos Assim, iniciamos em 2017 um trabalho de elaboração e organização dos materiais que constituem hoje os 11 livros de O Caminho do Coração Este trabalho realizou-se com uma equipa internacional liderada por Bettina Raed, diretora regional da Rede Mundial de Oração do Papa na Argentina e Uruguai Assim, a partir da pátria do Papa Francisco, e com o apoio de diversos companheiros, quer jesuítas quer leigos, foi articulado este trabalho Agradeço de modo particular a Bettina por toda a sua disponibilidade e pelo seu trabalho de elaboração e coordenação

Agradeço também a TeleVid, das Congregações Marianas da Colômbia, pelo seu apoio na conversão deste material num suporte acessível ao nível digital e visual wwwcaminodelcorazonchurch (em castelhano) Espero que estes conteúdos ajudem a propor a missão de compaixão pelo mundo com criatividade (em retiros espirituais, sessões de formação, os encontros das Primeiras Sextas-feiras, etc )

É o fundamento da nossa missão, o nosso modo específico de entrar na dinâmica do Coração de Jesus.

P. Frederic Fornos SJ

Diretor internacional da Rede Mundial de Oração do Papa – inclui o Movimento Eucarístico Juvenil Cidade do Vaticano, 3 de dezembro de 2019, Dia de São Francisco Xavier e dos 175 anos do Apostolado da Oração

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A Rede Mundial de Oração do Papa (RMOP), incluindo o MEJ, lançou, a partir d de 2009, um processo de recriação, tendo-se este concretizado nos novos estatutos, aprovados pelo Papa Francisco em março de 2018. Os estatutos são um ponto de chegada e, ao mesmo tempo, um ponto de partida para uma nova etapa.

O processo de recriação tentou moldar uma forma de viver a proposta do tradicional Apostolado da Oração mais conforme ao nosso tempo. Como é este tempo? Qual será esse modo de ser e de viver procurado pela recriação? O tempo presente requer de nós que estejamos muito mais atentos e despertos para entender os movimentos de Deus e os «sinais dos tempos», se quisermos oferecer ao homem e à mulher de hoje uma alternativa valiosa de vivência da sua fé: um modo de viver que dê resposta aos grandes desafios da humanidade e da Igreja, como propõe mensalmente o Papa mediante as suas intenções Evitar a distração diante da realidade do nosso mundo, por vezes acelerado e individualista

A esse modo de ser e viver demos o nome de O Caminho do Coração O documento, aprovado pelo Papa Francisco em 2014 e denominado Um caminho com Jesus em disponibilidade apostólica, recolhe os frutos do discernimento de quatro anos de trabalho realizado a nível internacional «E Jesus disse-lhes: Todo o escriba instruído nas coisas do reino dos Céus é semelhante a um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas» (Mt 13, 52).

Este documento apresenta o Apostolado da Oração recriado como Rede Mundial de Oração do Papa. Declara que esta terá um «rosto decididamente missionário», oferecendo um serviço de formação e renovação da vida espiritual dos leigos nas paróquias ou em instituições diocesanas, como colégios e escolas Ajuda a centrar a vida em Jesus Cristo, para se viver em cada dia uma relação de amizade com Ele, como apóstolos disponíveis para uma missão de compaixão em prol dos nossos irmãos Missão que se concretiza nas intenções de oração que o Papa nos propõe em cada mês

Ora bem, para sermos apóstolos e missionários, devemos, em primeiro lugar, forjar um coração de discípulos É precisamente aqui que o itinerário espiritual do Caminho do Coração alcança todo o seu valor e beleza. É uma verdadeira escola do coração.

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O nosso modo de proceder: atitude de disponibilidade

Os eixos que conferem dinamismo ao documento aprovado pelo Papa são:

1. Relação pessoal e afetiva com Jesus;

2. Disponibilidade apostólica;

3. Colaboração na missão de Jesus;

4. Serviço à Igreja através de uma rede mundial de oração;

5 Desafios da humanidade e da missão da Igreja

Em síntese, poderíamos dizer que a Rede Mundial de Oração do Papa procura ajudar o cristão de hoje a situar-se no coração do mundo, com uma espiritualidade centrada no Coração de Jesus Da relação pessoal e afetiva com Ele brotará a atitude interior de disponibilidade para ser apóstolo na vida quotidiana Homens e mulheres ao serviço da fé e da justiça

O coração do apóstolo não deixa de ser discípulo: está sempre à escuta da voz do Mestre Por isso, o caminho espiritual proposto pela Rede é uma verdadeira escola de formação do coração do discípulo

Na Igreja, e fazendo parte de uma rede mundial de oração, o apóstolo colabora com Jesus na sua missão, dentro do horizonte particular que o Papa Francisco oferece mediante as suas intenções de cada mês.

O que é a atitude?

Quando nos referimos à «atitude» de uma pessoa, geralmente destacamos a sua forma de atuar, de proceder ou de se comportar Mas, na realidade, a atitude encerra um processo mais vasto É a manifestação exterior de uma síntese e de uma compreensão interior A atitude é o resultado de um processo interior e não a mera expressão de gestos isolados A atitude distingue-se da imitação pelo facto de representar o estilo de vida de uma pessoa, ao passo que a imitação é a expressão exterior de alguns gestos que refletem a característica particular e única de outra pessoa

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«Porque, se amais os que vos amam, que recompensa haveis de ter? Não fazem já isso os cobradores de impostos? E, se saudais somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Não o fazem também os pagãos? Portanto, sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste» (Mt 5, 46-48)” (Mt 5: 46-48)

A atitude é, portanto, uma resposta interior, mental e emocional, que se manifesta numa forma concreta de proceder ou agir. É uma predisposição afetiva não diretamente observável. Está relacionada com a ação, embora não a devamos identificar apenas com ela Influencia a perceção e o pensamento, é adquirida mas também se pode aprender É sempre o resultado de uma avaliação afetiva e, por isso, está relacionada com a identidade de uma pessoa A atitude está intimamente ligada à nossa compreensão da realidade ou do mundo

Atitude de disponibilidade

A atitude de disponibilidade que o Caminho do Coração procura desenvolver não consiste em manifestações exteriores, como gestos ou atos de solidariedade isolados, mas num estilo de vida A disponibilidade interior, enquanto estilo de vida, encontra-se expressa nas palavras do Apóstolo Paulo aos Filipenses:

«Nada façais por rivalidade ou vanglória, mas cada um, por humildade, considere os outros superiores a si, não atendendo aos seus próprios interesses, mas aos dos outros Tende entre vós os mesmos sentimentos que havia em Jesus Cristo» (Fl 2: 3-5).

Mais do que uma condição para a missão, a atitude de disponibilidade constitui uma disposição interior para acolher os sentimentos de Jesus e forjar em nós o seu estilo de vida Só assim a missão será uma parte integrante da nossa vida de fé, não se reduzindo, meramente, a atos isolados «Estou pregado com Cristo na cruz; vivo, mas já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim» (Gl 2: 20) A atitude de disponibilidade não é algo acrescentado exteriormente à nossa vida, mas o resultado de um processo interior de relação pessoal e afetiva com Jesus.

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Segundo esta perspetiva, a missão, como parte integrante da nossa fé, adqui horizonte mais vasto e, ao mesmo tempo, mais criativo Ser discípulos significa colaborar com Jesus na missão que Ele recebeu do seu Pai. O apóstolo vive numa comunidade formada por uma Rede Mundial de Oração que reconhece, nos desafios com que a humanidade se confronta e que o Papa formula nas suas intenções, um apelo concreto à oração e à ação. A disponibilidade também se deve entender como a disposição interior para oferecer a própria vida como instrumento de reconciliação, de paz, de consolação e de amor na vida quotidiana, mediante palavras e gestos concretos que contribuam para edificar o Reino de Deus

A atitude de disponibilidade constrói-se sob a ação do Espírito de Deus É uma resposta de amor a Jesus e um compromisso na missão por Ele recebida do Pai. É o resultado de uma relação íntima e pessoal com Ele, cultivada mediante a comunhão, a meditação da sua Palavra e os sacramentos

Revestir-se de Cristo: um caminho do coração

O itinerário espiritual ajuda a aprofundar a espiritualidade do Coração de Cristo no seio de um mundo sem coração Convida-nos a estar «cada vez mais disponíveis para a missão de Jesus». Esta missão concretiza-se no «apoio ao Papa e à Igreja, ao serviço dos desafios da humanidade», mediante a oração e a ação. A missão, na vida quotidiana, inicia-se em cada dia com o oferecimento do dia, que nos dispõe a viver na presença de Deus e que se traduz na nossa predisposição interior para colaborarmos na difusão do Reino de Deus, unidos a uma rede mundial de oração.

Desafios da Humanidade

Nos Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loiola encontramos a meditação sobre o Reino, segundo a qual somos convidados a imaginar «um rei humano, eleito pela mão de Deus, nosso Senhor» [EE 92], que nos convida e chama a fazer parte de um exército que pretende «conquistar toda a terra de infiéis» Em seguida, no nº 93, diz:

«O segundo [ponto], observar como este rei fala a todos os seus, dizendo: "A minha vontade é conquistar toda a terra de infiéis; portanto, quem quiser vir comigo, há de estar contente de comer como eu, e também de beber e vestir, etc.; de igual modo, há de trabalhar comigo de dia e vigiar de noite, etc ; para que, assim, depois tenha parte comigo na vitória, como a teve nos trabalhos”».

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Esta Rede constitui um caminho espiritual que a Igreja propõe a todos os cri para os ajudar a serem amigos e apóstolos de Jesus Ressuscitado na sua vida diária, mostrando-se sensíveis à realidade do mundo. É este o grande desafio de hoje: sermos sensíveis às necessidades de tantos homens e mulheres que atravessam situações difíceis, deixando para trás a globalização da indiferença. Diante da tendência mundial para seguir a cultura do descarte, diz o Papa Francisco:

«Assim como o mandamento "não matar" põe um limite claro para assegurar o valor da vida humana, assim também hoje devemos dizer "não a uma economia da exclusão e da desigualdade social" Esta economia mata (...) O ser humano é considerado, em si mesmo, como um bem de consumo que se pode usar e depois lançar fora Assim teve início a cultura do "descartável", que aliás chega a ser promovida» (Evangelii gaudium, 53).

As intenções do Papa expressam desafios que nos chamam a sintonizar-nos, como fazia Jesus, com as necessidades de tantos homens e mulheres do nosso mundo, em diversas culturas, línguas e, inclusive, crenças

No convite do Rei a comer, beber e vestir-se está expresso o chamamento profundo à conversão da própria sensibilidade A espiritualidade do Coração de Jesus deve ajudar os cristãos a sentir, compadecendo-se das necessidades de tantos irmãos nossos, tal como fazia Jesus «Vendo aquelas multidões, compadeceu-se delas, porque estavam fatigadas e abatidas, como ovelhas sem pastor» (Mt 9:36) «Tendo-a visto, o Senhor, movido de compaixão para com ela, disse-lhe: "não chores" Aproximou-se, tocou no caixão e os que o levavam pararam Então, disse: "Jovem, Eu te ordeno, levanta-te"»(Lc 7: 13-14).

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A disponibilidade para a missão nasce do coração compassivo, que sente o m segundo as entranhas de Jesus O Caminho do Coração faz-nos entrar numa missão de compaixão pelo mundo.

Orar a vida real Todos conhecemos a antiga tensão entre a oração e a ação, tensão essa que se poderia traduzir assim: o que define a centralidade da vida de fé do discípulo no seguimento de Jesus: a oração ou a ação?

Como resolver a tensão entre oração e ação na vida quotidiana, sem cair no extremo de uma devoção intimista, sem ligação com a vida e com as necessidades da humanidade e da Igreja, ou sem fazer da oração uma coisa «prática e utilitarista», uma mera alavanca para a consecução das boas obras?

Passámos pelos dois extremos e, talvez por isso, na espiritualidade inaciana, é tão comum falar de «contemplativos na ação»

O contemplativo na ação, segundo Santo Inácio de Loiola, não só contempla o mundo ativo e vê coisas maravilhosas, mas também vê nessas coisas maravilhosas sinais da presença e da atividade de Deus. O contemplativo na ação está profundamente consciente da presença de Deus, inclusive no meio de uma vida excessivamente agitada. É uma atitude de consciência, de consciência de Deus. (…) O contemplativo na ação procura nela encontrar a Deus Isso significa que a pessoa contemplativa vê o mundo segundo uma perspetiva de encarnação Deus habita nas coisas reais, nos lugares reais e nas pessoas reais. Não só «lá em cima», mas «à nossa volta»"1

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Em certas ocasiões, a oração cristã corre o perigo de enveredar por um «cam paralelo aos caminhos da vida» Não pode estar desligada ou afastada dos acontecimentos do mundo, porque a Igreja orante não pode esquecer que recebeu o mandato para «ir e fazer com que todos sejam discípulos de Jesus» (cf. Mt 28: 19).

O Papa confia todos os meses à sua Rede Mundial de Oração uma intenção de oração, que exprime a sua preocupação pela humanidade e pela Igreja. Essas intenções tocam a vida de cada homem e mulher do planeta São desafios pelos quais devemos orar Constituem chaves de leitura para entendermos o curso da vida que se desenrola à nossa volta e um chamamento a «viver em coerência com aquilo por que estamos a rezar»

1 JAMES MARTIN, SJ «Más en las obras que en las palabras» Una guía ignaciana para (casi) todo Santander, Mensajero-Sal Terrae, 2011, p 383

A disponibilidade apostólica, de que nos fala o documento aprovado pelo Papa, não é possível sem uma conversão da sensibilidade e sem uma perspetiva profunda, íntima e apostólica da oração A «oração liga-nos ao mundo», porque a vida é concreta «Deus habita nas coisas reais, nos lugares reais e nas pessoas reais» A Igreja orante e apostólica é chamada a estar presente onde quer que seja necessário anunciar a fé, mas também onde quer que haja um abandonado a quem acolher, um «rejeitado» a quem integrar, um faminto a quem alimentar, um nu a quem vestir, um preso a quem visitar, etc Enfim, onde quer que o coração compassivo de Jesus precise de estar presente, mediante a nossa ajuda concreta e eficiente.

Orar e transformar: um caminho do coração

Em primeiro lugar, a oração deve estar orientada para a transformação da vida, para a configuração com Jesus Cristo, pois, de contrário, será uma oração estéril. Quando a nossa oração não dá frutos de boas obras, «mostra que, no coração do homem, não sucedeu nada de real, que o sujeito, sejam quais forem os seus gostos, as suas ideias ou as suas imaginações, não se encontrou realmente com ninguém»2 A oração é o ato relacional com Alguém que produz impacto nos nossos afetos, pensamentos e atitudes. Por isso falamos de um caminho espiritual inspirado no símbolo do coração, que deseja responder às necessidades de vida interior dos nossos contemporâneos.

Para Santo Inácio de Loiola, a transformação da vida verifica-se quando estamos dispostos a «imitar» o modo de viver, de comer, de beber e de vestir de Jesus [EE 93], cultivando os «mesmos sentimentos» do Senhor (Fl 2, 5) No entanto, para seguir o estilo de vida de Jesus, devemos ser dóceis às moções do Espírito de Deus, isto é,

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«fazer-nos indiferentes» [EE 23], disponíveis para receber a sua Palavra, procu encontrar a sua vontade, despojando-nos, «quanto seja possível» [EE 165], dos nossos modos de proceder, para assumir o seu. O Rei Eterno convida-nos a colaborar com Ele na missão que recebeu de seu Pai, mas assumindo a sua própria maneira de proceder.

A oração constitui, por si só, uma ação apostólica, visto que o anúncio começa por se dar no próprio coração Somos discípulos, antes de sermos apóstolos Deste modo, o itinerário espiritual chamado O Caminho do Coração torna-se indispensável para viver a fé Orar torna-se indispensável para viver A oração confere à vida o sentido e a orientação, sem os quais o crente ficaria encerrado numa relação intimista, isolada da ligação com o exterior

2 J M Velazco, Orar para vivir Invitación a la práctica de la oración Madrid, PPC, 2008, p 129

Três momentos de encontro com Jesus: a oração que nos liga ao mundo

A vida transforma-se quando reconhecemos, em quaisquer acontecimentos quotidianos, a presença, o sentido, a orientação e a densidade do desígnio amoroso de Deus Os três momentos de oração, da manhã até à noite, traçam o itinerário do coração e estabelecem coordenadas para a vida Permeiam os acontecimentos do dia que depois, no fim do mesmo, se transformam em matéria de oração. A própria vida é o lugar sagrado onde se pode encontrar e reconhecer Deus.

Com Jesus, de manhã, é o momento do encontro pessoal e afetivo com Deus mediante a meditação da sua Palavra, procurando no seu sentido o modo de viver, em cada dia, a intenção do mês Nesse encontro íntimo, enquadramos a vida num horizonte novo e diferente, dia após dia É o momento do oferecimento: «Aqui estou, Senhor» Em cada mês, a intenção do Papa marca um novo percurso espiritual, convidando-nos a «mobilizar» a nossa vida em prol da mesma

Com Jesus, durante o dia, o discípulo torna-se apóstolo na vida quotidiana Dá-se conta da presença de Cristo ressuscitado no ritmo normal dos seus afazeres quotidianos e dispõe-se interiormente a «sentir com a Igreja» (EE 352-370) Isto significa entrar no itinerário do Caminho do Coração, para nos tornarmos disponíveis para a missão de Cristo, sintonizando-nos com a sua maneira de proceder e associando-nos à sua missão de compaixão pelo mundo «Orar pelos anseios do coração do mundo, com as suas alegrias e sofrimentos, fazendo da oração um serviço, acompanhando quem trabalha, dia a dia, por estes desafios» (Carta do P. Adolfo Nicolás, sj). A oração tem uma dupla dimensão apostólica. Começa por

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evangelizar o próprio coração do orante, para depois o refletir na sua vida quotid

Com Jesus, à noite. O terceiro momento do itinerário espiritual oferece àquele que reza a oportunidade de prestar atenção ao curso que a sua vida tem seguido e à forma como tem encarnado o desafio do mês. Se a nossa oração se reduz a ideias abstratas, corre o risco de se transformar em fórmulas estereotipadas e rotineiras. Por isso, a pausa da noite recolhe a jornada do dia, a fim de reconhecer nela a passagem de Deus e as novas coordenadas para o dia seguinte A oração precisa de crescer e de amadurecer em nós Quando é que a oração do homem e da mulher pode ser considerada madura? Quando a vida dos outros não nos é alheia, quando nos tira do «nosso próprio querer e sentir» para nos unir à vida dos outros, quando a vida de todos cabe nesse momento sagrado de diálogo pessoal com Jesus Cristo Para entrar, em cada dia, neste ritmo de oração, convidamos-te a que te integres na comunidade de oração que reza com o Click to Pray, plataforma oficial de oração da Rede Mundial de Oração do Papa https://clicktoprayorg/

Compreender o curso da vida

Para compreender o que nos sucede interiormente ou para tentarmos entender aquilo que acontece na nossa vida, devemos fazer uma pausa. Na espiritualidade dos Exercícios Espirituais de Santo Inácio, chamamos de «pausa» ao tempo do exame ou revisão do dia. É o momento que reservamos para prestar atenção aos outros e a nós mesmos, para entrar em contacto com o nosso interior e, a partir daí, nos conectarmos melhor com os outros Fomos criados para «ser» e para «estar» no mundo, atentos com os sentidos despertos, mas, para isso, precisamos de fazer uma pausa

Para os Judeus, o shabbat, que é uma pedra angular da sua fé, é o momento de «parar e descansar» A pausa da noite cria espaço para o lugar sagrado, para o tempo sem tempo, para o kairos, que é o «momento adequado e oportuno» para que o mistério de Deus se revele, se faça epifania

Temos dificuldade em compreender o que se passa connosco, o sentido daquilo que nos sucede, porque perdemos o valor da pausa, do shabbat, desse momento oportuno em que nos encontramos com a voz de Deus no nosso interior A pausa é o tempo que escapa ao cronos porque é o tempo para «ser», onde o «fazer» volta a receber coordenadas. A pausa é o momento da manifestação de Deus, é o espaço a partir do qual devemos trabalhar, avançar e produzir. É o espaço no qual o ser está em oração, onde nos encontramos com Deus, com os outros e com os

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acontecimentos da nossa vida, à luz do Espírito «que nos ensina tudo» (cf Jo 16,

Durante o tempo de pausa ou de revisão do dia olhamos a nossa vida à luz do Evangelho, mas é também um tempo dedicado a refletir sobre aquilo que «não» fizemos ou «não deixámos de fazer». Por vezes, não somos «melhores» pessoas por nos termos enganado no caminho, mas por aquilo que «não» fizemos ou «não deixámos de fazer».

Orar e mobilizar: o desafio e as suas chaves O destaque, um tanto excessivo, dado ao facto de nos mobilizarmos pelos desafios da humanidade pode fazer da oração um ato pragmático ou utilitarista

«A oração, o encontro com Deus, transformado em mera alavanca para a consecução das boas obras. Deus colocado ao serviço do nosso progresso moral, da tranquilidade da nossa consciência e, talvez, da nossa autocomplacência Há alguma coisa mais oposta à lógica, à verdade da relação com o Mistério, do que essa oração na qual as forças de Deus se somam às nossas para nos permitir alcançar o ideal da nossa perfeição?»”3

O convite feito pela Rede a mobilizarmo-nos pelos desafios da humanidade e da Igreja nada tem que ver com o perigo de cair nos extremos de fazer da oração um ato pragmático ao «serviço do nosso progresso moral, da nossa tranquilidade de consciência e, talvez, da nossa autocomplacência» O chamamento é diferente

A proposta espiritual da Rede, formulada no itinerário espiritual do Caminho do Coração e nos três momentos do dia, é sintonizar com os sentimentos de Jesus. Revestirmo-nos d’Ele (cf. Rm 13, 14), ter os seus sentimentos (Fl 2, 5), contentarmo-nos com comer – assim como beber e vestirmo-nos – como Ele (EE 93), para poder afirmar como o Apóstolo Paulo: «já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim» (Gl 2, 20)

Mobilizar a nossa vida significa, em primeiro lugar, sintonizar-nos interiormente com o desafio do mês, transformar a intenção do Papa em matéria de oração e espaço de

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encontro com Jesus e com o próximo Após esse encontro afetivo e pessoal com a missão na vida quotidiana é resposta de amor e um serviço prestado à Igreja e não uma «alavanca» para a própria realização pessoal.

Os desafios formulados pelo Papa tocam a realidade de muitas pessoas, e é a vida dessas pessoas que se converte em matéria de oração para nós. Mediante os desafios, somos convidados à conversão da nossa sensibilidade, a ir contra a cultura do descarte, a compadecermo-nos, como Jesus, das necessidades de tantas pessoas que precisam da nossa oração e ação

As intenções do Papa ajudam-nos a encarnar a oração Quando oramos assim, a vida e os diversos aspetos e elementos que a compõem entram nesse âmbito sagrado do encontro pessoal com Jesus É a vida de muita gente que o Papa encomenda à nossa oração

3 J. M. Velazco, Orar para vivir. Invitación a la práctica de la oración. Madrid, PPC, 2002, p. 129

A nossa oração, pelo Papa e pelas suas intenções, integrando uma Rede Mundial de Oração, constitui uma verdadeira ação apostólica

Orar, integrando uma Rede Mundial

A Rede Mundial de Oração do Papa tem uma identidade definida É uma Rede ao serviço dos desafios da humanidade e da missão da Igreja A sua visão consiste em orar e viver os desafios da humanidade que preocupam o Papa (intenções) através da sua rede de oração Tais intenções constituem chaves para compreender os desafios do mundo que necessitam da nossa oração e ação E é sua missão, sermos apóstolos na vida diária Através do itinerário espiritual do Caminho do Coração, vamos assumindo o estilo de vida de Jesus, sensíveis às necessidades de tantas pessoas que precisam de encontrar um coração compassivo e solidário A nossa vida ao serviço da missão de Cristo, como resposta de amor à sua vida entregue por nós.

A devoção ao Coração de Jesus… uma espiritualidade da vida concreta

Desde o seu nascimento, o Apostolado da Oração tem centrado a sua espiritualidade na devoção ao Coração de Jesus, fazendo dela o seu carisma próprio São três os pilares desta devoção: a Aliança pessoal ou Consagração, a Reparação e a Oração de Comunhão com Jesus Estes elementos constituem a sua essência

Atualmente, a Rede continua a levar no seu seio essa inspiração de Deus que está na

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sua origem E agora, com um novo rosto e uma nova dinâmica, mais adequado a época presente da Igreja, continua a oferecer respostas às necessidades dos homens e mulheres da nossa época.

De um modo criativo e fiel à tradição, a Rede Mundial oferece um caminho renovador aos homens e mulheres que desejam viver uma espiritualidade centrada no Coração de Jesus Ressuscitado.

O processo de recriação constitui uma «verdadeira revolução», uma inspiração do Espírito de Jesus atuante na Igreja, que dá um novo impulso a este serviço eclesial, caracterizado pela oração com base nas intenções do Papa

Aquela bela intuição que o Padre Gautrelet teve, assumida pelo Padre Ramière, é, hoje, a Rede Mundial de Oração do Papa, que se torna presente com um novo rosto e uma nova dinâmica, semelhante a «um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas» (cf Mt 13, 52), mergulhando mais a fundo na sua fonte e renovando o seu serviço na Igreja

Esta dinâmica da Recriação não procura maquilhar nem dissimular as rugas da história, mas «remar mar adentro», introduzir-nos na profundidade da sua inspiração original e deixar-se absorver pela dinâmica do Coração de Jesus, alargando assim o horizonte de missão. Este processo é um convite a pôr de lado as seguranças e a discernir a ação do Espírito, que sopra livremente nos corações e no seio da Igreja.

Esta Rede de Oração, renovada no seu ardor missionário, coloca-se à escuta de tantos homens e mulheres que procuram resposta para as inúmeras perguntas que brotam do vazio e da falta de sentido com que vivem Qual ou quais serão essas perguntas ou primeiras constatações da recriação?

Na sua origem, o Apostolado da Oração foi uma resposta de Deus à inquietude e aos desejos de uns estudantes jesuítas que, em plena etapa de formação, ansiavam por participar na missão da Igreja em lugares muito remotos e necessitados da mensagem de Jesus Nesses desejos soprou o Espírito de Deus, inspirando ao formador daqueles jovens uma proposta inovadora e criativa para a sua época Sem terem necessidade de deixar os estudos nem de abandonar o seu país, podiam ser missionários como aqueles homens que caminhavam anunciando a palavra de Deus, oferecendo as suas vidas, a sua oração e os seus estudos e trabalhos quotidianos como oferenda pelas missões que a Igreja levava por diante. Este modo quotidiano de rezar e de viver não só renovou a sua oração, mas também a conceção das suas vidas. A ação de Deus no desejo daqueles jovens contribuiu para o surgimento de um

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novo modo de «ser missionários» na vida quotidiana, mediante a oferenda da p vida É nesta dinâmica de desejo e inspiração – no qual encontramos o Espírito de Deus a dar resposta aos anseios profundos do ser humano – que se insere toda a recriação, a fim de atualizar o serviço eclesial que presta.

O Espírito de Deus continua a atuar no seio da Igreja e no coração de tantos homens e mulheres que procuram novos caminhos para viver a sua fé, numa unidade cada vez maior com a sua vida quotidiana de estudos, trabalhos e afazeres diários De que maneira a Rede Mundial de Oração encontrou um caminho para recriar o seu serviço eclesial e dar resposta ao desejo sentido por tanta gente de viver, de forma mais integrada, a sua fé e a vida quotidiana? Como é possível encontrar em cada dia um espaço para a oração e a missão? Porventura existe um modelo de oração missionária no nosso tempo? Como aprofundar a aliança com o Coração de Jesus na vida moderna?

A Rede Mundial de Oração encontrou um caminho para viver, na atualidade, aquela inspiração primordial que deu origem ao Apostolado da Oração, mediante o qual espera continuar a oferecer um serviço na Igreja.

Uma oração inscrita na vida real: uma tensão sempre presente É bem sabido que a nossa vida de oração e a nossa vida quotidiana correm o risco de enveredar por caminhos paralelos, sem nunca chegarem a articular-se de forma ajustada De tal modo que uma coisa é o que rezamos e outra, muito diferente, é o que vivemos No entanto, também é certo que a nossa vida espiritual se deve apoiar nalguma espécie de articulação entre ambas, para que o trabalho não se transforme num ativismo doentio e a oração numa ilusão vazia e sem conteúdo

A oração é, na vida das pessoas, um encontro com o Criador, que transforma a vida a partir das suas próprias entranhas. Um encontro que nos convida a entrar no mundo de Deus, para transformar o nosso.

Assim foi a oração de Jesus, uma relação profunda com o Pai, que o introduziu no mundo que Ele amava, nos desejos e motivos do seu Coração. O amor que sentiu de seu Pai impeliu-o a agir como Ele o faria, em prol dos mais frágeis e vulneráveis do seu tempo

A oração de Jesus foi uma oração «cheia» do rosto do Pai, impregnada da sua misericórdia e da sua compaixão Fruto do encontro com o seu Pai na oração, aproximou-se das situações mais dolorosas da sua época e empenhou-se em dar respostas concretas, de alívio, de cura, de acolhimento, de abundância, segundo o desejo do seu Pai

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Através da oração, Jesus foi fazendo seus os sentimentos e gestos de seu ponto de chegar à identificação total e completa com Ele Jesus é, na terra, o rosto misericordioso do Pai. «Jesus disse-lhes: "Em verdade, em verdade vos digo: o Filho não pode por si mesmo fazer coisa alguma, mas somente o que vir fazer o Pai; porque tudo o que fizer o Pai o faz igualmente o Filho"» (Jo 5, 19).

A oração verifica-se no amor ao próximo. Assim se comprova que a oração não é um momento de autocentramento egocêntrico, mas um crescimento no ser Na oração há uma porção extra de ser, porque o amor cresce nas suas três dimensões, para Deus e para toda a criação, para si mesmo e, como é evidente, para o próximo A oração sintonizada com o Coração do Mestre faz brotar em nós os seus gestos, as suas atitudes e o seu modo de proceder

Nesta dinâmica de crescimento no ser, suscitada pela oração, a nossa vida transforma-se num lugar de encontro com Deus, onde continuamos a rezar A oração e a vida quotidiana não são duas experiências separadas ou em tensão, mas uma mesma realidade em que ambas se integram e potenciam mutuamente Uma oração que se faz vida e uma vida que se faz oração Oramos com a nossa própria vida, com o que cada dia nos toca viver, para procurar no silêncio da oração o modo de proceder que Jesus nos indicar. Encontrando Deus em todas as coisas e todas as coisas n’Ele. A nossa vida quotidiana é o altar da nossa entrega.

O nosso oferecimento diário é o modo de nos fazermos «oferendas vivas», entregues ao Pai, em que a Oferenda por excelência é o próprio Jesus E unindo-nos a Ele e oferecendo-nos com Ele, tornamo-nos disponíveis para a sua missão de compaixão pelo mundo, ainda hoje o centro da sua vida

O Caminho do Coração ajuda-nos a entrar nesta dinâmica de oração que transforma a nossa vida Uma transformação que será progressiva e revolucionária Devemos transformar o nosso modo de orar se quisermos, verdadeiramente, sintonizar-nos com o Mestre Devemos aprender o diálogo com um Deus que nos ultrapassa infinitamente, que é mais íntimo do que a nossa própria intimidade e a quem não controlamos, mas que é um verdadeiro Outro que nos acolhe A oração insere-nos no mundo de Deus e não ao contrário, é a possibilidade de entrarmos na sua lógica, no seu estilo, nos seus esquemas, nas proporções da nossa vida limitada, não pretendendo, ao invés, encaixar o Amor infinito nas nossas ideias tão mesquinhas.

A presente proposta é um convite a entrar nesta nova compreensão da oração, para que esta nos ajude a sintonizar-nos com o Coração de Jesus, com o seu mundo

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interior E, a partir dessa sintonia com Ele e com o seu mundo, ser colaborado apóstolos da sua missão Uma missão que se concretiza para nós nos desafios ou intenções que o Papa nos propõe em cada mês e que o Espírito inspira no seio da Igreja.

Este itinerário espiritual convida-nos a entrar numa dinâmica de oração apostólica que nos ajude, como discípulos, a sintonizar-nos com o Coração do Mestre e a lançar-nos no mundo com Jesus, a partir de uma profunda transformação das nossas atitudes É um convite a uma oração de oferecimento, de entrega, de saída de nós mesmos, mediante a qual não vamos pedir, mas sim oferecer-nos Uma resposta agradecida ao Amor primordial de Jesus, que nos abraça na mesma oração Amados no Amor de Deus e no mundo de Deus, ao seu modo e ao seu estilo, brotam gestos concretos de resposta missionária e apostólica na nossa vida Na experiência desse Amor, o coração deseja ser como e estar perto de quem nos ama

O modo como se entende a devoção ao Coração de Jesus consiste em entrar numa nova compreensão da dinâmica deste Coração: uma dinâmica missionária O amor do seu Coração convida-nos a entrar em comunhão com o seu Corpo-Eucaristia e faz-nos sair para o mundo onde esse mesmo Coração está vivo e atuante na vida concreta das pessoas, das coisas e das situações reais, numa missão de compaixão. São duas faces da mesma moeda, pois não é possível desligar a Eucaristia da entrega que Jesus fez de si mesmo durante toda a sua vida, simbolizada na Última Ceia, nem do gesto supremo de se colocar ao serviço dos irmãos, lavando os pés aos seus discípulos Eucaristia, entrega e serviço constituem um único gesto de compaixão pelo mundo, com o qual Jesus ficou entre nós e nos mostrou a dinâmica do seu Coração

A oração, na vida real, é a oração de comunhão com o Ressuscitado, reconhecendo-o na vida concreta O mesmo que apareceu a Santa Margarida Maria Alacoque, que falou com a Samaritana, que apareceu aos Apóstolos e que eles não puderam reconhecer Neste novo tempo, somos convidados a descobrir o Ressuscitado com um novo rosto, o do próprio Jesus que, com as suas chagas, nos diz «Sou Eu» e nos convida a que o encontremos também nas chagas dos que sofrem, dos marginalizados, dos vulneráveis

Só poderemos alcançar a compreensão da lógica dos desafios da humanidade e da missão da Igreja se pudermos fazer oração da nossa vida e vida da nossa oração. Porque os desafios se inscrevem na vida real, as chagas de Jesus são, hoje, as chagas dos nossos irmãos. Só quem pode continuar a sua oração na vida corrente poderá

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sintonizar-se com os desafios que o Espírito inspira, hoje, no coração da Igr oferecer a própria vida para colaborar com Ele na sua missão de compaixão pelos irmãos.

Hoje, na Rede de Oração, damos continuidade a esta dinâmica da oração de comunhão com o Coração de Jesus. Uma oração que convida a uma maior identificação com a sua vida e com o seu modo de proceder. Adoramos e oramos a Jesus feito Eucaristia, e oramos também na nossa vida quotidiana, fazemos vida a nossa oração e oração a nossa vida A vida de oração é o caminho para conhecer Jesus e para fazermos nossos os seus gestos e atitudes, acolhendo o seu convite a encontrá-lo no mundo real, onde Ele habita e continua a atuar em prol da vida Ali, no coração do mundo, convida-nos a juntar-nos à sua missão de compaixão Nesta mesma compreensão se inscreve a reparação como outro dos pilares do Apostolado da Oração A reparação ao seu Coração não é diferente da que Ele inspirou a Santa Margarida Maria Alacoque

A maneira adequada para repararmos o seu Coração é mediante a nossa resposta ao seu Amor incondicional A nossa resposta de amor dá-se no oferecimento das nossas vidas para colaborar na sua Missão de compaixão em prol dos nossos irmãos e irmãs. Jesus chama-nos a encontrar-nos com Ele, Vivo, e a agir em favor dos nossos irmãos e irmãs, onde quer que haja sofrimento e dor. É nas suas vidas, onde Ele habita, que podemos reparar, levando alívio, compreensão, misericórdia e ajuda. O oferecimento das nossas vidas em seu favor é verdadeira reparação, pois Ele habita nos pequenos.

Assim, também, a Aliança íntima ou Consagração na Rede Mundial é, além de uma união com o seu Corpo-Eucaristia, uma união de comunhão no serviço aos outros Podemos entrar em intimidade com Ele assumindo o seu estilo de vida, os seus gestos e as suas opções, e entrar na comunhão do seu Corpo, e sobretudo na comunhão com os nossos irmãos, mediante o serviço que prestarmos às suas vidas A consagração das nossas vidas coloca-nos numa relação de serviço e entrega ao próprio Jesus que habita a vida concreta

Este tempo de renovação é um convite a recuperar a história e a tradição do centro do nosso carisma: o Coração de Jesus É um convite a entrar na dinâmica deste Coração, do seu amor infinito entregue a todos Uma dinâmica missionária, ao serviço da sua Missão de compaixão pelos nossos irmãos. Somos convidados, assim, a aprofundar e alargar o nosso campo de missão a qualquer pessoa, circunstância ou realidade em que o Coração do Ressuscitado habita e trabalha, convidando-nos a juntar-nos à sua missão de compaixão pelo mundo. O convite do Caminho do

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Coração é uma proposta para entrarmos nesta nova compreensão e din missionárias e para nos encontrarmos com Ele, atuante no coração do mundo Destinatários. Este livro dirige-se a todas as pessoas que desejem fazer o Caminho do Coração e a quem deseje ajudar os outros a percorrê-lo.

Uma meditação sobre o itinerário espiritual da Rede Mundial de Oração do Papa O Caminho do Coração é o itinerário de formação da Rede Mundial de Oração do Papa É um itinerário que convida o nosso coração a estar mais perto do Coração de Jesus, a fim de se configurar com os sentimentos, desejos e anseios de Cristo Convida-nos a unir-nos à missão que Ele recebeu do Pai Ser amigos de Jesus, profundamente unidos a Ele, percebendo as suas alegrias e sofrimentos pelo mundo, conduz-nos a empenhar-nos com Ele diante dos desafios com que se confronta a humanidade e a missão da Igreja Tais desafios, que o Papa nos confia em cada mês, dão-nos a conhecer como se concretiza a missão do Pai confiada a Jesus, hoje O Caminho do Coração ajuda-nos, portanto, a perceber os desafios do mundo com os olhos de Jesus, a fim de nos mobilizarmos em cada mês, dóceis ao Espírito Santo, mediante a oração e o serviço É assim que este itinerário nos vai transformando, dia após dia, em apóstolos da oração, «discípulos missionários», em missão de compaixão pelo mundo.

O itinerário da Rede Mundial de Oração do Papa (RMOP) e as temáticas da nossa proposta espiritual apresentam-se como uma escola do coração Desenvolvido em nove passos, este itinerário conduz-nos à identificação com o pensar, o querer e os projetos de Jesus

As citações da Palavra de Deus e outras que acompanham cada parágrafo narram-nos o amor desmedido de Deus por cada um de nós e pela humanidade inteira Devem ser acolhidas em silêncio, orante e maravilhado, pois falam da nossa história com Ele É-nos proposta uma aliança de amor pessoal com o Ressuscitado e o oferecimento da nossa disponibilidade diária para colaborar com Ele na sua missão, como seus apóstolos Colocados ao serviço da sua Igreja, somos enviados para tornar presente, no mundo, o amor misericordioso de Deus Estas páginas apresentam a proposta espiritual do caminho da Rede Mundial de Oração do Papa, o seu mapa interior, convidando-nos a entrar numa dinâmica de disponibilidade interior e de oferenda da nossa vida à missão de Jesus de compaixão pelo mundo.

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CHAVES DE LEITURA

O texto que tens nas mãos é uma ajuda para percorreres o Caminho do Coração São materiais que te permitirão fazer esta experiência profunda de encontro com Jesus. Neles encontrarás os nove passos ou etapas deste itinerário desenvolvidos mediante textos que mergulham profundamente no tema de cada passo, a partir de diferentes prismas ou perspetivas, a que chamámos entradas.

Cada livro desta coleção é uma etapa ou passo do caminho, que poderás percorrer no tempo pessoal em que o Espírito do Senhor te vá conduzindo Santo Inácio diz-nos que «não é o muito saber que sacia e satisfaz a alma, mas o sentir e gostar as coisas interiormente» (EE, anotação 2) Por isso, recomendamos-te que não estugues o passo, nem te apresses no caminho Não amontoes as orações nem as leituras Caminha ao compasso do coração, de modo descontraído, saboreando e sentindo no coração este itinerário espiritual Uma boa maneira de te dares conta de qual é o ritmo mais adequado para ti, é teres o cuidado de não passar ao passo seguinte enquanto não sentires que aprofundaste o suficiente o passo em que te encontras, e que já não te resta mais nada do mesmo para percorrer, até sentires que encontraste aquilo que procuras e desejas e te sentires aberto ou disposto a dar mais um passo

Os livros que constituem cada etapa têm uma estrutura comum. Neles encontrarás idênticos títulos ou entradas. Estas entradas são perspetivas ou prismas segundo os quais se pode orar e meditar cada passo, que propõe um único tema para a oração, mas focado a partir de ângulos diferentes. Apresentamos-te algumas «chaves» que te facilitarão o uso deste material e que te ajudarão a rezar em cada etapa

O que é a palavra-chave?

É a palavra que constitui o eixo e o centro em torno do qual gira cada passo É a palavra que identifica a realidade central que se desdobra em cada passo Servir-te-á de guia para ler cada uma das entradas, como uma lente que te permite ler e orar É uma bússola que orienta a oração e a experiência

O que são os objetivos?

São as luzes que orientam a caminhada, nesta etapa do caminho São como guias que têm a função de marcar o rumo Poderão ser metas a alcançar, mas o importante é que orientem o processo que levas por diante e não que se convertam em algo a conseguir. Devemos tomar os objetivos como orientações que nos conduzam no processo e como graça a pedir, e não como êxitos a obter.

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O que são as atitudes?

São as respostas interiores que se espera que despertem nas pessoas mediante a experiência vivida em cada passo. São respostas da pessoa que envolvem os sentimentos, os pensamentos e as ações e que se refletem no comportamento exterior. As atitudes são os comportamentos que manifestam o estilo interior que se vai forjando ao percorrer o itinerário proposto. A experiência de cada passo apela a uma resposta concreta, que ajuda a forjar em cada um o estilo do Senhor.

O que é o marco referencial?

É o enquadramento da experiência a que as pessoas são convidadas em cada passo É a delimitação temática da experiência que orienta o caminhar do peregrino

O que é a dinâmica interna do passo?

É a primeira apresentação geral do tema, em que as pessoas são convidadas a tomar contacto com a proposta, com os seus conteúdos, eixos e traços mais gerais É uma forma de entrar em contacto, pela primeira vez, com o passo É uma entrada geral, uma primeira apresentação do tema e da sua orientação

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ENTRADAS

O que é a entrada bíblica?

É um percurso do tema do passo a partir de uma proposta bíblica, para que cada participante possa entrar no tema mediante um determinado itinerário da Palavra de Deus. É um modo de apresentar o tema tal como o podemos encontrar nos diversos livros da Bíblia..

O que é a entrada segundo a perspetiva da fé?

É uma abordagem do tema do passo apresentado segundo uma perspetiva teológico-espiritual simples e acessível É uma proposta para convidar a razão a discorrer sobre o passo Um olhar reflexivo

O que é a entrada espiritual?

É a apresentação do passo a partir da espiritualidade em que se desenrola um tema espiritual, em íntima relação com o tema central do passo É uma perspetiva que permite orar e fazer a experiência a partir de determinado tema em relação com o tema que constitui o eixo do passo

O que são as Palavras do Papa?

Nesta entrada apresentamos-te o pensamento do Papa Francisco em relação ao tema do passo proposto. É um modo de orar, de fazer experiência e de iluminar e ajudar a entender, mediante o magistério da Igreja.

O que é a entrada a partir da oração?

É uma proposta orante Uma apresentação do tema do passo orientada, mais propriamente, para a meditação e a reflexão silenciosa e pausada. É uma perspetiva que te convida a deixar que o tema ressoe e faça eco no teu interior.

O que é a proposta de Exercícios?

É um convite a pôr em prática a oração, a inseri-la na vida quotidiana e a realizar atos concretos que permitam exercitar, fazer exercício da experiência. Poderás repetir o

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exercício proposto até sentires que este se esgota e enquanto precisares E po encontrar a tua própria dinâmica e o teu próprio modo de inserir a oração na vida

O que é o Apêndice?

Nesta secção encontrarás escritos simples que te permitirão ampliar, aprofundar e encontrar novas perspetivas do tema proposto em cada passo. É um material complementar que te ajudará, se for conveniente, a entrar com mais profundidade e de forma mais luminosa na proposta de oração

Encontrarás estas chaves de leitura a partir do Passo Um do itinerário e ao longo de todo o seu percurso No entanto, para iniciar um caminho, é necessário assentar os pés nele, colocar-se no ponto de partida do itinerário Este «assentar os pés» permite reconhecer o caminho, reservar para si esse tempo necessário para se dispor a caminhar, estabelecendo a dimensão do itinerário a seguir e calibrando os esforços que teremos de envidar Chegámos, por fim, ao convite da disposição inicial É a preparação para este itinerário que te convidamos a realizar

Os onze livros do Caminho do Coração foram escritos e supervisionados pela equipa da Rede Mundial de Oração do Papa, na Argentina, Uruguai, e no Secretariado Internacional. Os textos teológicos foram supervisionados por professores da Faculdade de Teologia da Universidade Católica de Córdova, Argentina.

Bom itinerário! Bom caminho! Que o Senhor de bondade te encontre neste percurso!

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