Jornal da Praia | 0517 | 23.03.2018

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QUINZENA

23.03 A 05.04.2018 Diretor: Sebastião Lima Diretor-Adjunto: Francisco Ferreira

Nº: 517 | Ano: XXXV | 2018.03.23 | € 1,00

QUINZENÁRIO ILHÉU - RUA CIDADE DE ARTESIA - 9760-586 PRAIA DA VITÓRIA - ILHA TERCEIRA - AÇORES

MEMÓRIAS DO POÇO DA AREIA O som da música atraía a malta do areal e as pessoas que passavam pelo Poço da Areia, quer fosse de carro, de mota ou a pé iam parando para ver, aos poucos juntava-se uma pequena multidão em frente à casa a ouvir os Sombras ao vivo. Aquela pequena casa no Poço da Areia foi por um longo período de tempo, quase como o conservatório musical da Praia da Vitória, a malta nova queria aprender a tocar, por lá passou gente motivada e incentivada para a música e alguns tornaram-se mesmo músicos.

www.jornaldapraia.com

IVO SILVA

REPÓRTER DE AÇÃO DESTAQUE | P. 8 E 9

Por: Luís Dores CRÓNICA | P. 5

PRIMEIRA REUNIÃO DO

CONSELHO MUNICIPAL DE SEGURANÇA

NO CONCELHO | P. 3

ABERTAS INSCRIÇÕES PARA

CURSO DE NADADOR SALVADOR VITORINO NEMÉSIO: DE FÉRIAS NA FAROL DE TERCEIRA: AÇORIANIDADE OS TOUROS DA AREIA

NO CONCELHO | P. 3

ESTE SÁBADO NO ARG

A NOITE DE DONA LUCIANA TEATRO | P. 11 PUB

Era aliciante ver como Nemésio conseguia copular domínios tão díspares, imbricando-os numa tessitura de conhecimentos que nos abriam vastos horizontes e nos davam a sensação de estarmos já vivendo, no universo brasileiro do sertão e caatinga, ou no meio de caboclos, retirantes e senhores de engenho, ou ainda na misteriosa Amazónia, etc, etc. Por: António Neves Leal OPINIÃO | P. 13

O arraial dos toiros da areia é diferente de todos os outros à volta da Ilha: a baía com a Marina e os barcos junto à praia, a muralha e a Avenida cheias de gente dão um enquadramento diferente, com um colorido muito especial. Por: Silveira de Brito OPINIÃO | P. 14


JP | CANTO DO TEREZINHA & OPINIÃO

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ANTES QUE O RATO COMA… Aquando do último descarregamento de cereais no porto da Praia da Vitória, neste caso milho, que terminou na terça-feira de carnaval, foi notada abundância deste cereal nos arruamentos do porto tendo-se estendido igualmente, em grande quantidade à via rápida. O aparecimento de ratazanas atropeladas na via Vitorino Nemésio foi notável, o que significa que a afluência dos roedores ao tão apetitoso e nutritivo alimento, que lá se encontrava, foi evidente. Imagine-se no porto, com a grande quantidade disponível que se verificou, o festim que não foi!. Sem aprofundar cálculos, podemos imaginar quantas barrigas engordámos de ratazanas e as consequências disso mesmo, bem como a contribuição que foi dada para o aumento da sua população.

O veneno fica para depois..., adiante-se que é com muito esforço que é comprado e por esta e por muitas outras razões é um caso sério, por isso é muito importante por um lado, sensibilizar a comunidade para este assunto, e por outro, alertar as entidades envolvidas nesta atividade, exigindo também em certa medida às autoridades que haja uma abordagem semelhante a este problema da mesma forma que o há, no que diz respeito ao acondicionamento e transporte de outros bens... Haverão associações disponíveis para recolher ou receber este alimento que poderá servir para outros animais!? Não tecendo críticas às administrações, às empresas e associações e muito menos às pessoas que nessas instituições assumem cargos e funções diretivas, é perti-

nente alertar todos para que se aplique regulamentação, se determinem as normas e os procedimentos, que haja fiscalização e controle no que diz respeito ao seu efetivo cumprimento e que, na prática, haja a limpeza dos restos de cereais que, atualmente, e em grande quantidade são oferecidos de bandeja aos ratos e ratazanas que abundam no porto da Praia. Pelo que se sabe, que por agora dá algum alento, é que o Governo Regional e a Câmara Municipal da Praia da Vitória já têm conhecimento da situação e irão, de imediato, coordenar medidas com vista à solução deste problema de saúde pública. Haja rapidez na implementação e controle do que for planeado, pois é urgente o contributo de todos no combate a esta praga.

INSTITUIÇÕES PARTICULARES DE SOLIDARIEDADE SOSIAL (IPSS) Por: Sérgio Nascimento

Nestas organizações ninguém é dono, e no Portugal de hoje, muito menos aristocratas. Seria a bem dizer, Raríssimo este poder e privilégio distinto. Deixariam de ter um papel vocacionado para a missão da Instituição, dando lugar a uma das mais promissoras carreiras em Portugal. A de gerir Instituições. Felizmente, existe o lado bom, das outras pessoas, de bem, que diariamente têm o seu papel bem definido na Instituição e que muito dão de si pelos utentes.

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ão muitas as organizações com fins marcadamente sociais com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de solidariedade e de justiça entre os indivíduos. Umas centenárias, outras com alguns anos apenas. Mas todas com o devido valor que a sociedade lhes atribui.

sional dignamente defendida, altamente valorizada e por todos reconhecida. São a alma das Instituições, que têm o contacto directo e próximo com os utentes, desde bebés aos idosos. Que amparam, acarinham, dão conforto e escutam. E que têm uma acção crucial com os grupos mais desfavorecidos.

Nestas organizações ninguém é dono, e no Portugal de hoje, muito menos aristocratas. Seria a bem dizer, Raríssimo este poder e privilégio distinto. Deixariam de ter um papel vocacionado para a missão da Instituição, dando lugar a uma das mais promissoras carreiras em Portugal. A de gerir Instituições. Felizmente, existe o lado bom, das outras pessoas, de bem, que diariamente têm o seu papel bem definido na Instituição e que muito dão de si pelos utentes.

Estes trabalhadores são muitas vezes mulheres, em início de carreira, algumas mães, e outras, senhoras com um longo e precioso percurso na área social, que possuem uma sensibilidade muito própria para os cargos que ocupam, e que nenhuma pode ser alvo de ameaças e assédio moral num ambiente intimidativo, hostil, humilhante e desestabilizador, gerador de instabilidade e inquietação generalizada entre todos. Porque a existir tem de ser denunciado, e quanto mais cedo a denúncia mais rápido o tratamento.

Umas com baixos salários. Outras nem tanto. Mas todos com direitos. Merecedores de uma carreira profis-

Os primeiros sinais vitais têm de vir dos dirigentes, eleitos por escrutínio

secreto, com mais deveres que direitos. Privilégios, zero. Quando o Estado ou Região acordam com as Instituições, apenas e só actividades de interesse público, compete a estas últimas, serem íntegras na execução daquilo que lhes é exigido. As Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) que possuem um papel social muito importante para a sociedade civil, não podem ser geridas por marias-da-fonte gritantes ou por qualquer acto narcisista. Se assim for, a terapêutica tem de ser outra. Felizmente, muitas são as pessoas válidas, sadias, titulares dos órgãos sociais de Instituições, sem medo de se assumir e que colocam a causa social à frente de qualquer manifestação pessoal. Que crescem com a Instituição e não à custa da Instituição. Que não se desviam do horizonte da verdade rejeitando trocas e baldrocas que tudo somado fica sempre distante do alcance da ponderação.

Mas a investigação começou e os serviços da Segurança Social já estão no terreno. É um sinal claro que o dinheiro do erário público, dos mecenas, dos utentes e suas famílias é para ser estimado por todos os que o gerem. E os trabalhadores, para serem honrados. Porque felizmente o estatuto de impunidade não existe, pelo menos nestas Instituições. As IPSS, na sua larga maioria, têm um papel louvável, merecendo o respeito de todos. Apenas os devaneios de alguns que se acham irmanados devem ser balizados. Compadrio, autoritarismo, arrogância e avidez não encaixam no perfil de quem se define ter a intenção mobilizadora de bondade e solidariedade. Que se deixe de fábulas e que se preste a algumas reflexões sobre o que de facto são os valores da vida.

FICHA TÉCNICA PROPRIETÁRIO: Grupo de Amigos da Praia (Associação Cultural sem fins lucrativos NIF: 512014914), Fundado em 26 de Março de 1982 REGISTO NO ICS: 108635 FUNDAÇÃO: 29 de Abríl de 1982 ENDEREÇO POSTAL: Rua Cidade de Artesia, Santa Cruz, Apartado 45 - 9760-586 PRAIA DA VITÓRIA, Ilha Terceira - Açores - Portugal TEL: 295 704 888 DIRETOR: Sebastião Lima (diretor@jornaldapraia.com) DIRETOR ADJUNTO: Francisco Jorge Ferreira ANTIGOS DIRETORES: João Ornelas do Rêgo; Paulina Oliveira; Cota Moniz CHEFE DE REDAÇÃO: Sebastião Lima COORDENADOR DE EDIÇÃO: Francisco Soares, CO-1656 (editor@jornaldapraia.com) REDAÇÃO/EDIÇÃO: Grupo de Amigos da Praia (noticias@jornaldapraia.com; desporto@jornaldapraia.com); Elvira Mendes; Rui Sousa JP - ONLINE: Francisco Soares (multimedia@jornaldapraia.com) COLABORADORES: António Neves Leal; Aurélio Pamplona; Emanuel Areias; Francisco Miguel Nogueira; Francisco Silveirinha; José H. S. Brito; José Ventura; Nuno Silveira; Rodrigo Pereira PAGINAÇÃO: Francisco Soares DESENHO NO CABEÇALHO: Ramiro Botelho ADMINISTRAÇÃO José Miguel Silva (administracao@jornaldapraia.com) SECRETARIADO E PUBLICIDADE: Eulália Leal (publicidade@jornaldapraia.com) LOGÍSTICA: Jorge Borba IMPRESSÃO: Funchalense - Empresa Gráfica, S.A. - Rua da Capela da Nossa Senhora da Conceição, 50 Morelena - 2715-029 PÊRO PINHEIRO ASSINATURAS: 15,00 EUR / Ano - Taxa Paga - Praia da Vitória - Região Autónoma dos Açores TIRAGEM POR EDIÇÃO: 1 500 Exemplares DEPÓSITO LEGAL: DL N.º 403003/15 ESTATUTO EDITORIAL: Disponível na internet em www.jornaldapraia.com NOTA EDITORIAL: As opiniões expressas em artigos assinados são da responsabilidade dos seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião do jornal e do seu diretor.

Taxa Paga – AVENÇA Publicações periódicas Praia da Vitória


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NO CONCELHO | JP

REUNIÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DE SEGURANÇA

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Conselho Municipal de Segurança para o mandato autárquico 2017-2021 reuniu pela primeira vez no passado dia 05 de março na Casa das Tias de Vitorino Nemésio, nesta cidade. O Conselho Municipal de Segurança é um órgão consultivo, que visa a análise de diversos aspetos de segurança no Concelho, com incidência em problemáticas como a criminalidade, a sinistralidade e a exclusão PUB

social, bem como a concretização de ações que reforcem a segurança no Município e, por conseguinte, melhorem a qualidade de vida da população. Nesta primeira reunião de trabalho que junta entidades que desempenham funções nas vertentes da Saúde, Segurança, Educação, Desenvolvimento e Coesão Rural, procedeu-se à análise das vulnerabilidades existentes no Concelho, a fim de

reforçar as medidas de prevenção e segurança junto da comunidade. No encontro foram abordadas temáticas como a criminalidade, a sinistralidade rodoviária, a segurança das pessoas e animais e a sensibilização da população para a importância da Proteção Civil, assim como os projetos desenvolvidos nesta área. Durante a reunião, também foram referidos o Plano de Atividades do Serviço Municipal de Proteção Civil da Praia da Vitória para 2018 e o plano de intervenção em Zonas de Risco no Concelho da Praia da Vitória.

“Acredito que os contributos deste Conselho são uma mais-valia pela partilha de conhecimentos e opiniões entre as diversas entidades. É importante haver esta união de esforços na identificação e definição de estratégias que contribuam para reforçar a segurança dos nossos munícipes e sensibilizar os mesmos para a necessidade de prevenção nas mais diversas áreas”, evidenciou Tibério Dinis, presidente da Câmara Municipal da Praia da Vitória, no final dos trabalhos, em declarações aos jornalistas. GP-MPV/JP•

ABERTAS INSCRIÇÕES PARA

CURSO DE NADADOR SALVADOR

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ncontram-se abertas, até ao dia 03 de abril, as inscrições para o Curso de Nadador-Salvador na Praia da Vitória. Estas podem ser efetuadas através do endereço de correio eletrónico: fepons@fepons.org, pelo número de fax: 243 618 565 ou remetidas para a Federação Portuguesa de Nadadores Salvadores, localizada em Santo António, 2100-042, Coruche. A ficha de inscrição está disponível em www.fepons.org (opção Centro de Formação). Além da ficha de inscrição, as candidaturas devem incluir uma cópia do cartão de cidadão ou bilhete de identidade, uma fotografia atualizada (tipo passe), o currículo, o certificado de habilitações, um atestado médico que comprove a robustez física e perfil psíquico adequados à atividade, uma cópia do último cartão de nadador-salvador (caso se aplique) e o comprovativo da totalidade do custo da inscrição.

de maio, só poderá ser frequentado por pessoas com idade igual ou superior a 18 anos e com a escolaridade mínima obrigatória completa. Relativamente às provas de admissão, estas são constituídas por corrida (2400 metros num tempo máximo de 14 minutos), natação (100 metros livres num tempo máximo de um minuto e meio), natação subaquática (tempo mínimo de 20 segundos), natação em decúbito dorsal (25 metros, só com batimento de pernas) e recolha de dois pesos a uma profundidade mínima de dois metros. O exame de admissão custa 20 euros e a taxa de inscrição 145, o que perfaz um total de 165 euros por inscrição. Os interessados podem obter mais informações no sítio da Federação Portuguesa de Nadadores Salvadores, acessível em www.fepons.org. GP-MPVJP•

O Curso, realizado de 05 de abril a 18

CASA DO BENFICA DA ILHA TERCEIRA

INAUGURAÇÃO OFICIAL

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om a presença de Luís Filipe Vieira, presidente do Sport Lisboa e Benfica, a Casa do Benfica da Ilha Terceira (CBIT) inaugura oficialmente amanhã, sábado, 24 de março, pelas 18:30, na Praia da Vitória, as suas novas instalações. Após a cerimónia, que contará para além do presidente dos encarnados, com o vice-presidente das Casas do

Benfica, Domingos Almeida Lima, o futebolista profissional, Eliseu Santos e uma equipa de reportagem da Benfica TV, decorrerá 30 minutos mais tarde, nas instalações da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários da Praia da Vitória um jantar convívio abrilhantando por cantigas ao desafio. JP•

FONTINHAS COM CENTRO HÍPICO

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or pproposta do Governo dos Açores, a Assembleia Legislativa aprovou no plenário do mês passado por unanimidade a desafetação de uma parcela de terreno do Núcleo Florestal das Fontinhas, tendo em vista a cedência precária ao Clube Cinegético e Cinófilo da Ilha Terceira para a construção de um Centro Hípico.

A parcela de terreno cedida é constituída por 1,79 hectares de área e vem ao encontro da pretensão do Clube Cinegético e Cinófilo da Ilha Terceira de construir um Centro Hípico no concelho da Praia da Vitória, não dispondo, no entanto, de terreno para o efeito. JP•


JP | EFEMÉRIDE

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JÁCOME DE ORNELAS BRUGES – 2.º CONDE DA PRAIA DA VITÓRIA HISTORIADOR: FRANCISCO MIGUEL NOGUEIRIA

Jácome de Ornelas Bruges foi um importante político terceirense do século XIX, sendo governador civil do distrito de Angra do Heroísmo durante vários anos.

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á exatos 137 anos, a 26 de março de 1881, Jácome de Ornelas Bruges de Ávila Paim da Câmara, 2º visconde de Bruges e 2º conde da Praia da Vitória, terminava o seu 4º mandato como governador civil de Angra do Heroísmo. Jácome de Ornelas Bruges foi um importante político terceirense do século XIX, sendo governador civil do distrito de Angra do Heroísmo durante vários anos, era descendente de uma dinastia de papel indelével no Liberalismo. Jácome de Ornelas Bruges nasceu a 14 de dezembro de 1833, em Angra. Era filho do 1º visconde de Bruges e 1º conde da Praia Teotónio de Ornelas Bruges Paim da Câmara e da sua primeira esposa, Ana Favila Esmeraldo Monteiro. Tornou-se Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra. Seguiu depois para Bruxelas, onde foi adido honorário da legação portuguesa na capital belga. Em 1857, Jácome de Ornelas Bruges regressou a Angra do Heroísmo. Seguindo a linha política do pai, líder progressista, a 1 de janeiro de 1860 foi eleito deputado para as Cortes pelo círculo da sua cidade. Uns meses depois, casou-se com Maria Inácia Pacheco de Melo de Meneses Forjaz Sarmento de Lacerda, irmã do 1º Barão de Nossa Senhora das Mercês e 1º Visconde de Nossa Senhora das Mercês. Como estava em Lisboa, o seu primogénito nasceu na capital portuguesa, homenageando então o pai, chamou o filho de Teotónio (Octávio de Ornelas Bruges). Jácome de Ornelas Bruges foi reePUB

leito deputado a 22 de abril de 1861, mas a sua nomeação para secretário-geral do distrito de Angra do Heroísmo, levou-o a renunciar ao cargo em Lisboa. Pouco tempo depois, a 17 de dezembro de 1861, Jácome de Ornelas Bruges tornava-se pela 1ª vez governador civil do distrito de Angra do Heroísmo, cargo que ocuparia por cinco vezes, não consecutivamente, mas que lhe granjaria fama e apoio político. Um dos acontecimentos sociais mais importantes deste período aconteceu durante o 1º mandato de Ornelas Bruges, quando este ofereceu um baile comemorativo do casamento do Rei D. Luís e de D. Maria Pia, a 27 de novembro de 1862, com cerca de 600 convidados da sociedade angrense. Ainda durante o seu mandato, promoveu a 1ª Exposição de Agricultura, Artes e Indústrias dos Açores. No Natal de 1864 era feito 2º visconde de Bruges, sucedendo a seu pai que tornava-se então o 1º conde da Praia da Vitória. A 25 de setembro de 1865 terminava o seu 1º mandato no governo civil. Em 1866, Jácome de Ornelas Bruges foi sócio fundador da Sociedade Promotora das Artes e Letras de Angra do Heroísmo. Exerceu também o cargo de inspetor dos tabacos. Por alvará de 7 de janeiro de 1867 foi nomeado Fidalgo Cavaleiro da Casa Real. Com o apoio dos progressistas, a 14 de janeiro de 1868 iniciava o seu 2º mandato como governador civil de Angra do Heroísmo, cargo que ocuparia por pouco mais de um ano. A 15 de setembro de 1869, novamente com o apoio do seu partido, Ornelas Bruges era nomeado para governador civil do distrito de

Ponta Delgada, ficando no cargo durante 8 anos consecutivos, até 11 de outubro de 1877, sendo neste mesmo dia nomeado para o seu 3º mandato no governo civil de Angra do Heroísmo. Regressou assim à sua terra natal. Com a morte do pai em 1870, Jácome de Ornelas Bruges foi confirmado como 2º conde da Praia da Vitória, tornando-se chefe da casa mais importante da Terceira. Foi ainda condecorado, por decreto de 14 de junho de 1875, com a Grã-Cruz da Ordem Imperial de Francisco José da Áustria e nomeado comendador da Ordem de Cristo e de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa (setembro de 1876). O 3º mandato de Jácome de Ornelas Bruges duraria apenas escassos meses (até 31 de janeiro de 1878). De 3 de junho de 1979 a 26 de março de 1881, ocuparia o cargo de governador civil de Angra do Heroísmo pela 4ª vez. Durante este período, em 1880, o seu nome foi falado para ocupar o cargo de Ministro Plenipotenciário de Portugal no Império do Brasil, mas o pedido não foi atendido. Ornelas Bruges foi novamente eleito deputado para as Cortes durante a legislatura de 1884-1887. Em Lisboa, deu forte apoio às questões do distrito de Angra do Heroísmo, procurando colaborar no desenvolvimento da sua terra. Entre agosto de 1886 e 11 de outubro de 1888 Jácome de Ornelas Bruges foi nomeado governador civil de Angra do Heroísmo pela 5ª vez. Foi condecorado, em 1886, como Cavaleiro de Mérito Agrícola de França. Ornelas Bruges, já no final de sua

vida, foi ainda indicado superintendente das alfândegas dos Açores e veio a falecer a 20 de janeiro de 1889, no Funchal, na Madeira, terra natal de sua mãe. O 2º Conde da Praia da Vitória teve uma vida político-administrativa preenchida, dedicando a sua vida a Angra do Heroísmo, continuando o trabalho do pai na liderança dos progressistas. Foi um importante governador civil, que deixou trabalho feito. Quando morreu, o partido caiu numa grave crise, tal marca deixou na sua liderança.

Nos dias de hoje, devemos fazer valer a nossa força e a nossa voz como cidadãos. A necessidade de uma cidadania ativa tornou-se num dever. É importante que mesmo em plena crise, ninguém se demita das suas funções, nem dos seus direitos e combata por uma sociedade melhor. Os terceirenses precisam de ter uma atuação mais ativa no desenrolar das próximas etapas da economia da Ilh a. •


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CRÓNICA | JP

MEMÓRIAS DO POÇO DA AREIA Por: Luis Dores (*)

Num cenário de contra luz, as silhuetas negras dos músicos projetavam-se ao fundo nos cortinados brancos, dando um efeito de sombras bem conseguidas, foi por esse motivo que o padre Abílio chamou-lhes de Sombras.

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ertamente devido aos laços familiares que nos unem, passei uma parte da minha tenra idade, na companhia do Luís e dos irmãos Jorge e Roberto Bettencourt, no Poço da Areia, naquela casa que hoje é conhecida como a casa onde o Nuno nasceu. Depois dos trabalhos da escola, corria para lá para jogar à bola com eles e outros amigos da vizinhança, assim como outras brincadeiras habituais de infância, também algumas garotices pelo meio sem importância, enfim, coisas próprias da idade. Às vezes as brincadeiras duravam noite adentro, porque na altura era habitual fazer-se serões familiares. De vez em quando, com a minha mãe e irmãs lá íamos passar um serão a casa da “prima Aureolina” era assim que a chamávamos, por conseguinte, durante esses serões, as brincadeiras duravam até mais tarde. O senhor Ezequiel Bettencourt, era um homem multifacetado, fotógrafo de profissão na base americana, autodidata, afinador de pianos, músico talentoso, não só tocava diversos instrumentos, como fazia reparações. Por esse motivo havia sempre lá em casa (instrumentos) por perto, normalmente violas, mas lembro-me de ver violinos, clarinetes, trompetes, saxofones, banjos, guitarras elétricas, etc. Além disso, também dava aulas de piano. Trazia os instrumentos da escoPUB

la da base americana para efetuar pequenas reparações, e depois, assistíamos aos testes dos mesmos já reparados. Eu ouvia com atenção e surpreso como ele os tocava e a facilidade como os executava. Entretanto, o Roberto e o Luís já dedilhavam as cordas da viola com alguma facilidade. Por essa altura, o Corpo de Escuteiros da Praia da Vitória levava à cena no Salão Teatro Praiense uma peça em dois atos, um drama e uma comédia, orientada e encenada pelo padre Abílio. Foi um êxito de bilheteira atendendo à época, o teatro era algo pouco vulgar, mas graças a um talentoso elenco de praienses, a peça teve um relativo sucesso, tendo regressado à cena por diversas ocasiões. A peça exigia mudanças de cenários, havia a necessidade de preencher esses espaços mortos com algo que entretece a assistência, e então surgiu a ideia de colocar músicos a tocar uns números instrumentais, enquanto por detrás iam mudando os ditos cenários. Escolheram músicos que eram escuteiros, o José Elmiro Nunes e o Ilídio Gomes nas violas, o Carlos Madureira na bateria. Num cenário de contra luz, as silhuetas negras dos músicos projetavam-se ao fundo nos cortinados brancos, dando um efeito de sombras bem conseguidas, foi por esse motivo que o padre Abílio chamou-lhes de Sombras.

voso do que ele, um bocado ansioso. Num desses espetáculos, o Luís foi convidado para tocar uma música instrumental, porque já se falava das suas proezas na guitarra elétrica. Então pela primeira vez em palco, frente a uma plateia repleta, uma criança com pouco mais de dez anos (coisa inédita) ia demonstrar publicamente as suas habilidades musicais. Gerou-se uma certa expectativa e curiosidade acerca do evento, recordo-me de estar na plateia talvez mais ner-

Como vai ele aguentar toda aquela pressão sem borrar a escrita? Pensava eu. Havia chegado o grande momento. Feita a apresentação, entra em palco com uma guitarra elétrica pesada e maior do que ele. Logo que soaram os primeiros acordes dos Sombras o Luís começa a solar “Walk, Don´t Run” dos Ventures que saiu na perfeição, sem enganos. Tudo correra da melhor maneira, um sucesso que foi aplaudido de pé em plena admiração geral. O Luís tinha acabado de cumprir, o seu prematuro batismo musical. A partir desse dia, adivinhava-se um futuro promissor como guitarrista. Da peça de teatro, sobrou apenas os Sombras, que nem conjunto era. Mordidos pelo bichinho de palco, queriam continuar a tocar, e então pensaram em formar um conjunto moderno com o mesmo nome. Necessitavam de um viola baixo, o escolhido foi o Roberto, que nunca imaginou trazer para o seio do grupo, o próprio pai, e ainda bem que foi assim. O Sr. Ezequiel Bettencourt foi tão importante para os Sombras como George Martin foi para os Beatles. Isto é, não querendo fazer comparações ridículas ou absurdas, mas ambos tiveram pontos em comum. (Continua na página 12)


JP | SAÚDE

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o Cantinho do Psicólogo 183

Poucas Exigências e Muito Trabalho

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nunciámos que o segundo equilíbrio necessário para limitarmos as situações de stress tem a ver com o ter poucas exigências, e muito para fazer. Aurélio Pamplona Registe-se para (a.pamplona@sapo.pt) já que ter poucas exigências, não é uma tarefa fácil de cumprir, nomeadamente para todas aquelas que frequentemente aumentam a nossa ansiedade. Seja exemplo o tipo de exigências que se revelam em forma de ´deves`, e de que se apresentam três exemplos (McMahon, 2005): (1) exigências acerca do eu – tenho sempre razão, ou devo ser sempre forte e capaz, porque…, caso contrário, sou um fraco ou até um falhado; (2) exigências acerca dos outros - devem-se comportar bem, ou, devem concordar comigo porque…, caso contrário é terrível, ou errei, e isso também é pavoroso; (3) exigências acerca do mundo - o mundo deverá ser um local seguro e correcto, ou devem tratar-me bem se trabalho muito e faço o melhor, porque…, de outra forma, não é justo. O alívio desta sobrecarga de exigências passa, segundo o autor, por sermos capazes de nos desafiarmos, como se exemplifica: (a) considerar o impacto das exigências na própria pessoa e naquelas que nos cercam; (b) identificar como as exigências são activadas, ao nível dos pensamentos, sentimentos e comportamentos experimentados; (c) pensar como as exigências surgiram, e nas experiências de vida que as sustentam; (d) considerar as vantagens e

desvantagens de as manter; (e) identificar uma forma mais apropriada de as reformular, de forma a as adaptar à vida que se leva no momento; e (f) pensar no que vai fazer para colocar em acção as novas exigências, as que aparecerem após estes raciocínios. Enfim, as exigências que se põem às pessoas são de natureza diversa, e abrangem os mais variados campos, nomeadamente os profissionais, em que sobressaem as relações de trabalho, os conflitos de papéis, e outros que pela sua sobrecarga são susceptíveis de trazer complicações. Mas frequentemente o problema só

negativos, e como vimos, usar a imaginação e a criatividade para se tornar uma pessoa inovadora. Quanto a ter muito para fazer cabe referir que o trabalho é uma das maiores forças promotoras da saúde mental. Assim e de acordo com Davis (1989), já Goethe (1749-1832) defendia no seu tempo que «o emprego era de natureza física e correspondia ao essencial para se alcançar a felicidade humana». E Freud (1856-1939) que «o trabalho do homem tinha mais efeito do que qualquer outra técnica de viver, na união estreita do indivíduo com a realidade, por estar fortemente

va, desafiante e valorativa do esforço humano. Não pode ser exemplo de trabalho árduo o que aconteceu a alguém, que de acordo com Sherrin (2005), comentou: «o meu amigo trabalha muito dois dias por semana, e necessita de cinco dias de fim-de-semana, o que parece normal». Não, não é normal. Normal é a pessoa deleitar-se com o trabalho. Isto verifica-se, fundamentalmente e de acordo com a mesma fonte, porque «há um sentido de alívio e de prazer em conseguir fazer as coisas, um tipo de satisfação não diferente do que goza uma galinha a pôr um ovo». Mas não se assuste caro leitor. Há sempre tempo para mudar a vida quando se quer. E existem outros tipos de equilíbrios a construir, quando se quer evitar o stress, como seja garantir esse equilíbrio entre tarefas demasiado fáceis, e tarefas demasiado difíceis. Portanto, aplique-se na harmonia destes desempenhos, porque ainda de acordo com o citado pela mesma fonte: «um bom profissional é aquele que é capaz de executar tarefas que não lhe são queridas».

Referências: Davis, F. A. (1989). Taber´s cyclopedic medical Dictionary. Philadelphia: F. A. Davis. Company.

aparece para alguns, ou em situações específicas, visto se pensarmos bem é fácil dominar toda esta problemática. Basta a pessoa se capacitar para ser capaz de fazer escolhas para atingir os seus objectivos, libertar-se do medo, da insegurança e da baixa auto-estima, centralizar-se nos aspectos positivos da vida e não nos

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ligado a uma sua parte, a comunidade». Entretanto para assumir a veracidade destas afirmações, e o trabalho se poder traduzir na eficácia e promoção da saúde mental torna-se essencial, de acordo com as mesmas fontes, que a labuta seja significati-

McMahon, G. (2005). No more anxiety! Be your own anxiety coach. London e New York: Karnac. Sherrin, N. (2005). Oxford dictionary of humorous quotations. New York: Oxford University Press.

Foto: A. Pamplona•


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CRÓNICA | JP

MEMÓRIAS DO POÇO DA AREIA (Continuação da página 5)

A idade impunha respeito, os seus conselhos eram ouvidos e reconheciam-lhes experiência e sabedoria musical. Desde início que os Sombras trabalharam com ensinamento, método e disciplina, e isso foi fulcral para o seu desenvolvimento e sucesso futuro. Entretanto, entrava para o conjunto o Jorge Figueiredo nas teclas, e mais tarde ainda, com a saída do José Elmiro entrou o irmão Kiko Figueiredo. Ganhou assim forma, a versão final dos Sombras, que hoje todos conhecemos. Os primeiros ensaios foram feitos na casa do Poço da Areia, sob a orientação do Sr. Ezequiel. Foi ali numa pequena sala entre mobiliário e equipamento, que se ensaiou e se tocou pela primeira vez, músicas dos Beatles, Rolling Stones, Bee Gees e Roberto Carlos. Sim, Roberto Carlos, a onda Jovem Guarda estava ao rubro no Brasil. O Luís, o irmão Jorge e eu, éramos testemunhas diárias do evoluir dos Sombras e aos poucos fomos adquirindo gosto pela música nova que ouvíamos. Quietos, em silêncio num canto, para não sermos expulsos da sala, ali ficavam atentos a ouvir e a aprender. O Nuno ainda não era nascido, mas no ventre da mãe certamente que já ouvia os Sombras noite após noite, enquanto o Paulo e o João vagueavam pela casa de fraldas e de chucha na boca, isto mencionando apenas os mais novos. Naquela época, instrumentos e equipamento, eram escassos e difíceis de encontrar, por isso, havia

todo o cuidado e rigor em os preservar, não era permitido outros tocarem-lhes, especialmente as crianças. Só que eu e o Luís, quebrávamos diariamente as ordens. Durante as tardes sem ninguém por perto, sentava-me na bateria com o meu par de baquetas de fabrico caseiro, o Luís ligava a sua guitarra ao amplificador Selmer e passávamos horas a tocar. Aos poucos e clandestinamente, íamos melhorando a aprendizagem tentando tocar o que os Sombras tinham ensaiado na noite anterior. Devido à minha baixa estatura, era obrigado a fazer alguns ajustes na bateria para chegar com os pés aos pedais, por esse motivo o Madureira quando chegava aos ensaios, notava logo que alguém tinha estado ali a mexer, e sempre com um tom ameaçador avisava-me: – Se um dia te apanho, dou-te um carolo nessa cabeça para aprenderes que nesta bateria não se toca. Felizmente nunca passaram de ameaças. Em adultos, a diferença de idades é pouco relevante, mas na adolescência, seis anos faz muita diferença. Era uma bateria Ludwig dos anos 50, de cor verde-escuro, propriedade da Filarmónica União Praiense, ferrugenta e velhinha de tanto penar, as peles tinham fita-cola a cobrir as zonas rasgadas, mas não havia outra melhor, e não foram poucos, aqueles que aprenderam a tocar nela. Hoje, teria honras de museu. Muitos meses mais tarde já atuávamos nos bailes no salão da Filarmónica com músicos mais velhos e com um reportório reduzido a meia dúzia de músicas que tocávamos rotativa-

mente sem parar. No final da noite como pagamento, davam-nos, uma sandes de iscas de fígado com cebolada e um pirolito. Tempo maravilhoso, bem ou mal nós queríamos era tocar, e toda a gente dançava e divertia-se. Foi uma fase sem dúvida importante para quem estava a começar, um estágio perfeito para se adquirir desenvoltura, calo e experiência. O Luís acusa-me ser responsável, de por vezes ter de fugir de casa para tocar nos bailes, não me lembro, é possível, mas valeu ou não a pena? Estou eternamente grato aos Sombras, se não tivessem ensaiado no Poço da Areia, nunca na vida teria tido a oportunidade, de me tornar baterista, coisa que ainda hoje desfruto com prazer. A propósito das minhas baquetas de fabrico caseiro. Não era hábito os bateristas deixar as baquetas junto da bateria, levavam-nas para casa. Naquela época havia a mania deles circularem pelas ruas com o par de baquetas debaixo do braço, quer fossem ensaiar ou atuar. Compreendo o motivo inicial, era para prevenir da tentação de alguém as utilizar na sua ausência, só que mais tarde, passou a moda nos lugares públicos, especialmente nos cafés. Sempre achei aquilo mais um gesto de vaidade do que outra coisa, mas não deixava de ter a sua piada. Nos fins de semana ao fim da tarde, era vê-los no café bem vestidos e perfumados com as respetivas baquetas debaixo do braço, o que incentivava os curiosos à pergunta habitual:

– Para onde vais tocar? – Vou tocar pró N. C. O. pá! Não havia estabelecimentos onde comprar cordas de viola ou baquetas, (dificilmente conseguia-se da base) tinha-se de encomendar a Lisboa, chegavam semanas mais tarde, e tornava-se caro devido aos transportes. Mais uma razão acrescida para se poupar nos dois pauzinhos de madeira e no encordoamento, vinham para durar o maior tempo possível. Outra curiosidade, os termos “bateria” e “baterista” não eram muito utilizados na altura, chamavam-lhe Jazz. Não sei como se confundia o estilo musical Jazz com o instrumento. (influências da base certamente). Quando perguntavam a um baterista: — Que instrumento tocas? — Eu toco Jazz. Certas tardes de verão, no regresso da praia de banhos, a malta dos Sombras montava o equipamento no pátio da casa devido ao calor, tocavam só pelo prazer de tocar, eu e o Luís também participámos algumas vezes na ausência de algum elemento. O som da música atraía a malta do areal e as pessoas que passavam pelo Poço da Areia, quer fosse de carro, de mota ou a pé iam parando para ver, aos poucos juntava-se uma pequena multidão em frente à casa a ouvir os Sombras ao vivo. (Continua na página 12)

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TALHO BORBA & MENDES


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DIZ IVO SILVA EM ENTREVISTA

HÁ 16 ANOS QUE TRABALHO PARA O Carismático repórter de imagem, Ivo Silva, leva aos quatro cantos do mundo as festividades e tradições da ilha Terceira, em reportagens, que se destinguem pela singularidade dos planos, envolvência na ação e originalidade dos títulos.

C

om o advento das novas tecnologias proliferaram no espectro mediático um conjunto de canais televisivos alternativos aos tradicionais, que mais do que estes, espelham de forma singular a alma deste povo terceirense.

ver com a forma como eu encaro a vida. Eu penso muito na vida e na morte e como só se vive uma vez é fundamental que se viva de forma feliz e intensa, realizando os nossos desejos e aventuras e assim lá vou eu nas minhas aventuras…

Ivo Silva, 57 anos, o repórter de ação, como orgulhosamente se autointitula é um desses criadores, que com imaginação e engenho serve a nossa alcatra nos quatro cantos do mundo, num olhar ilhéu que abraçando esta ilha redonda devota do Pai, do Filho e do Espírito Santo, capia os dogmas dos homens num desígnio de justiça Divina.

JP – O Ivo trabalha então para ser conhecido? IS – Sim, eu trabalho para ser conhecido. Repare, no youtube é muito importante ser-se conhecido porque o youtuber desconhecido está condenado ao fracasso. Eu sou muito conhecido não só na ilha como nos Estados Unidos, no Canadá e por todo o mundo. Há pessoas que dizem que me veem na Austrália, em Espanha, na França. Há poucos dias, um senhor de cá, mas que vive no Alentejo há 40 anos telefonou-me e disse – Sr. Ivo, obrigado por existir, obrigado pelo seu trabalho sobre a nossa terra que muito me agrada – essas mensagens de reconhecimento pelo trabalho desenvolvido são gratificantes, não dá dinheiro, mas dá imensa satisfação.

Jornal da Praia (JP) – O Ivo, repórter de imagem das festas e tradições da ilha Terceira, é o mesmo Ivo do dia-a-dia, ou trata-se de uma personagem? Ivo Silva (IS) – Eu defino-me como uma pessoa com dupla personalidade e nesta perspetiva construo uma personagem que interpreto quando estou no espaço público a filmar. No fundo eu sou tudo aquilo, mas muito naturalmente na minha vida íntima e privada sou muito mais calmo e muito menos extrovertido. Neste tipo de trabalho é importante ser-se notado e então optei por esta teatralidade depois de ter visto há uns anos atrás um chinês que fazia um conjunto de manobras enquanto filmava. Na altura pensei – eh pá, eu adapto-me a isto, tenho capacidade física e mental para o fazer – então criei esta personagem. Depois, esta personagem também tem muito a PUB

JP - O seu trabalho é essencialmente a divulgação da cultura tradicional da ilha Terceira? IS – Sim. Mas também sobre as localidades e construções da nossa terra. Ainda recentemente fiz uma filmagem com drone do Raminho até à estalagem da Serreta. Já fiz programas sobre a estalagem da Serreta – programas históricos, algo que gosto muito – em que digo como a estalagem foi construída, quem a mandou construir, em que ano se deu a cons-

IVO SILVA ”Enquanto os outros filmam nos palanques ou nos poste nalina, e filmo diretamente no caminho onde passa o toiro e estão trução, etc. JP – Há pouco afirmou que esta atividade dava-lhe grande satisfação mas não dinheiro. Como garante a sua subsistência? IS – Hoje a produção de vídeo para venda está completamente “off”, pelo que nós passamos de produtores a youtubers, onde através das visualizações obtemos alguma rentabilização. Hoje agente mete tudo

de borla na MEO e no youtube e quando assim é quem é que vai comprar? – Se te dão batatas, porque é que vais comprar batatas? – Portanto a única fonte de rendimento são as visualizações do youtube. JP – Mas o Ivo apresenta-se como correspondente na ilha Terceira da Rádio e Televisão da Artesia (RTA). IS – Eu sou correspondente na Terceira da RTA há 16 anos, mas de uma


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DESTAQUE | JP

OS EMIGRANTES GRATUITAMENTE tendo tido outras profissões? IS – Tive outras profissões. Comecei a trabalhar quando era novo – já fiz inclusive um programa sobre isso – nos Serviços Florestais. Depois, trabalhei na Electro Neves como chefe da oficina de reparações. Trabalhei também por conta própria como técnico e vendedor de eletrodomésticos. A partir do ano 2000, com a vinda da TV Cabo e durante 7 anos, fui o único técnico da ilha responsável pela instalação da TV-Cabo. Foi precisamente neste período que ganhei o dinheiro que me permite fazer as brincadeiras que faço hoje.

es da luz, eu meto-me nos perigos, porque isto dá-me imensa adreos capinhas”. forma muito particular. Eu posso dizer abertamente que sou o gajo mais amigo dos emigrantes de toda a nossa ilha, porque há 16 anos que trabalho para eles gratuitamente. Ao longo destes 16 anos nunca cobrei um único dólar à RTA. Compro os equipamentos, faço as reportagens e entrego tudo gratuitamente à RTA. Todo o meu equipamento foi comprado por mim, nunca ninguém me deu nada. A RTA é uma estação de televisão fundada pela comunidade emigrante em 1991 na cidade de Artesia. A parPUB

tir de 2002 eu fui um dos seus principais fornecedores de conteúdos. Tudo o que eu filmava aqui na Terceira mandava os DVD(s) para eles passarem lá fora. Como na altura não havia internet isto era também uma grande mais-valia para mim, já que os emigrantes viam na RTA e depois quando cá vinham acabavam por comprar os DVD(s), constituía, digamos assim, uma montra privilegiada dos meus DVD(s). JP – O Ivo sempre se dedicou às filmagens ou isto é algo mais recente

JP – Como passa então de técnico de instalações da TV Cabo a repórter de imagem? IS – Já nos anos oitenta, oitenta e tais, quando trabalhava como responsável da oficina de reparações da Electro Neves, sugeri ao patrão como oportunidade de negócio, que arranjasse uma máquina que eu gostava de filmar uns casamentos e umas touradas para depois vender, mas ele disse – eh pá isso não dá nada, esquece! – e eu esqueci. Mas desde pequeno que eu tinha um enorme fascínio pelas filmagens. Recordo-me de em novinho ir ao cinema e ver os filmes de karaté e de comboys e pensar para mim próprio – gostava de filmar isto – mas nunca realizei antes este gosto por falta de meios. JP – E os canais da MEO e do Youtube, como surgem? IS – O Hildeberto que é o produtor do “Kanal das 12” um dia pediu o meu material para passar no seu canal da MEO – eu nem sabia bem o que era aquilo – mas lá lhe dei o material e durante dois anos fui o principal fornecedor de vídeos do “Kanal das 12”, tanto que ainda hoje em dia, há pessoas que pensam que o “Kanal das 12” é meu. Mais tarde, resolvi criar o

meu próprio canal. Com o canal ganhei mais visibilidade como pessoa mas continuei sem ganhar dinheiro. O meu canal é muito visto na MEO assim como os dos outros, mas contrariamente ao youtube as visualizações na MEO não são rentabilizadas. JP – Sendo muito visualizado poderá rentabilizá-lo através de publicidade, como faz por exemplo o “Kanal das 12”? IS – Sim e eu já fiz alguma publicidade. Fiz com a loja do Michele aqui na Praia e também com o Açor 9 Estrelas nas Lajes, pois essa é a única forma de compensar o tempo que se perde a produzir conteúdos para o canal. Eu perco muito tempo todos os dias em frente ao computador a fazer programas para o canal que é atualizado diariamente. JP - O Ivo auto designa-se de Repórter de Ação. Porquê? IS – Digo que sou um repórter de ação porque faço as minhas reportagens precisamente no centro do que está a acontecer. Por exemplo, nas touradas à corda, enquanto os outros filmam nos palanques ou nos postes da luz, eu meto-me nos perigos, porque isto dá-me imensa adrenalina, e filmo diretamente no caminho onde passa o toiro e estão os capinhas, por isso mesmo já levei três marradas. Ou seja a fama ganha-se pelos atos e não apregoando palavras ao vento. Repórter de ação ainda, porque meto um motor às costas e levante voo fazendo filmagens a partir do ar. JP – Quais são as reportagens que mais gosta de fazer? IS – A grande tradição da ilha Terceira são as touradas à corda e eu gosto de filmar toda aquela ação, não só o movimento do touro mas toda aquela envolvência, mas o que eu gosto (Continua na página segiinte)


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DIZ IVO SILA EM ENTREVISTA. NA RTP-AÇORES

“GASTAM MILHÕES POR ANO E FAZEM MUITO POUCO” (Continuação da página anterior)

mais de fazer são as reportagens históricas. Mas também gosto de filmar a partir do asa delta sobretudo num dia de bom tempo em que junto à adrenalina de voar o prazer de ver belas paisagens e a tranquilidade de espírito quer sinto ao voar. JP – Como repórter de ação, não gostaria de fazer uma reportagem num cenário de guerra? IS – Sim, gostava de estar num cenário de guerra. Já pensei várias vezes nisso, se por exemplo uma estação de televisão de nível nacional me que dissesse – eh pá vens trabalhar para agente e nós vamos mandar-te para aqui ou para ali…

JP - Gostava de estar na Síria neste momento? IS - Olha agente tem que morrer alguma vez, não é? Eu quero viver mais uns dias, mas dá-me enorme adrenalina um cenário como aquele supercomplicado e muito perigoso. Eu gosto de fazer coisas difíceis. No último verão, ao ver os fogos que infelizmente aconteceram no país e ao ver o pessoal ali a filmar eu pensava para mim – gostava de estar ali – enfrentar aquelas dificuldades de um terreno em chamas, e entrar na mata à procura disto e daquilo. JP – O Ivo como único responsável pelo canal desempenha vários papéis, que vão de repórter de ima-

gem, a editor, redator, locutor, etc. Como é desempenhar todas estas funções? IS – É difícil. Eu faço um enorme esforço para fazer tudo isso e claro que às vezes isso é cansativo e envolve muita aprendizagem. Por vezes quero fazer algo, mas não sei como utilizar os programas que disponho para o fazer e então vou pesquisar e perco muitas horas a aprender como fazê-lo. Mas sim eu mantenho o meu canal sozinho e com muito poucos meios. Se eu tivesse os meios da RTP – Açores, se por exemplo eu fosse convidado para ir trabalhar um ano para a RTP-Açores, a RTP-Açores dava uma volta que você nem imagina.

JP – Aumentaria as visualizações atualmente baixas da RTP Açores? IS – Passava a ter muitas mas mesmo muitas mais visualizações. Subiria nas audiências de uma forma terrível. Eles diziam: vens para aqui mandar, vens fazer assim e assim… JP – Iria mandar e não filmar? IS – Era para mandar e pôr o pessoal a trabalhar. A RTP Açores tem uma estrutura muito pesada e burocrática e não têm autonomia programática. Andam por ali, cada “macaco” no seu galho e não apresentam nada. Nada se sabe dos Açores através da RTP Açores. Gastam milhões por ano e fazem muito pouco. Eles que metam lá para verem… JP•

NOTAS D’O RAPAZ DAS ILHAS (VI)

PASSOS COELHO VAI DAR AULAS NO ISCSP. E ENTÃO? Se por um lado se possa dizer que Portugal não viveu os seus melhores dias quando governado por Passos Coelho – bem pelo contrário até, como todos sabemos –, por outro é preciso ter consciência de que o país era obrigado a cumprir exigências austeras devido à intervenção externa. PPC governou numa época especialmente difícil.

T

Rodrigo Pereira

ornou-se público há dias que Pedro Passos Coelho, ex-primeiro-ministro, como certamente sabem, foi convidado pela reitoria do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), da Universidade de Lisboa, a dar aulas no mestrado e doutoramento de Administração Pública. Desde esse dia várias têm sido as críticas a esta notícia. Seja porque não admiram

PPC, são militantes de partidos opostos ao seu, não admitem o facto de lecionar sem ter doutoramento, ou, pura e simplesmente, entendem que a sua presença no corpo docente da faculdade não dignifica a instituição.

da instituição. E vejamos, o homem não aparece do nada só por ter uma grande cunha. Andou a governar o país, caramba. Não é ótimo que alguém com experiência, mais que teórica, prática possa ensinar?

O que me importa esclarecer em primeiro lugar é a dúvida e erro daqueles que se têm mostrado indignados por Passos Coelho lecionar numa instituição de ensino superior sem ser doutor. Se olharmos para as outras melhores faculdades do país vamos encontrar docentes na mesma situação que o ex-primeiro-ministro e não é nada grave. As direções das faculdades são livres de convidar a dar aulas profissionais com percursos notáveis que possam enriquecer o percurso académico dos alunos e

Se por um lado se possa dizer que Portugal não viveu os seus melhores dias quando governado por Passos Coelho – bem pelo contrário até, como todos sabemos –, por outro é preciso ter consciência de que o país era obrigado a cumprir exigências austeras devido à intervenção externa. PPC governou numa época especialmente difícil. Um primeiro-ministro, seja de que partido for e em que altura governe, nunca pode ser visto como um polí-

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tico qualquer e terem essa ideia é o que mais confusão me tem feito nas várias publicações que leio nas redes sociais. Um chefe de governo é um político distinto e sempre notável – a menos que comprovadamente corrupto – pela confiança depositada pelo povo na sua coragem e determinação em gerir a “saúde” de um país. É, para mim, o mais difícil cargo político que se pode assumir. Não cabe a um primeiro-ministro apenas falar aos jornalistas e ir ao Parlamento responder aos deputados, apesar de ser o que nos chega aos olhos e ouvidos, mas também gerir tudo o que diz respeito à nação (finanças, economia, saúde, cultura, solidariedade social, etc.), e é ainda ele que muito contribui para a visão externa do país. Seja de direita ou de esquerda só honra e contribui para o bom nome de uma faculdade a presença de um anterior primeiro-ministro como seu docente. Aliás, como também de ministros ou até secretários de Estado, embora nestes casos possa ser muito mais discutível o seu valor.

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TEATRO | JP

ESTE SÁBADO NO AUDITÓRIO DO RAMO GRANDE

A NOITE DE DONA LUCIANA Peça escrita numa fase terminal da vida de Copi, apesar disso ou por isso, apresenta um estilo muito mais livre, luminoso e fluído.

A

companhia “Teatro Do Eléctrico” leva a efeito este sábado, pelas 21:30, no grande palco do Auditório do Ramo Grande o espetáculo “A Noite de Dona Luciana” de Copi.

culo em poucas semanas, como conseguimos apresentá-lo a um maior número de pessoas e conseguimos fazer com que os atores continuam a evoluir o espetáculo a cada vez que o apresentam”.

Estreada em 2016 em Lisboa, a peça escrita pelo dramaturgo, caricaturista e romancista franco-argentino Raul Damonte Botana, conhecido por Copi, traduzida por Isabel Alves e encenada por Ricardo Neves-Neves tem feito várias digressões um pouco por todo o país ao longo dos dois últimos anos, num caso raro de espetáculo que não se esgota em poucas semanas, quando por noma os espetáculos têm temporadas curtas que rondam as três a dez apresentações. Está ainda previsto para o segundo semestre deste ano, a reposição do espetáculo de novo na capital e vária outras atuações no resto do país.

Desafiado a abrir um pouco o pano, Ricardo Neves-Neves adianta: “Aquilo que nós vamos encontrar é uma resposta à loucura de Copi. Copi escreve de uma forma completamente louca e livre e nós tentamos responder a essa loucura e liberdade de cena que Copi cria. O texto acontece num ensaio. Num ensaio de madrugada na véspera de estreia e aquilo que seria um ensaio normal dentro dos atrasos normais do teatro, transforma-se num policial quando percebem que o teatro foi invadido por uma figura ameaçadora que é desempenhada por Custódia Gallego”. Elucida ainda que “A noite de Dona Luciana” é “a última peça de Copi e Copi escreveu essa peça já a saber que teria poucos meses de vida e conseguiu, ainda assim, fazer a sua maior comédia ou aquela que é considerada a sua maior comédia, num estilo muito mais livre, lumino-

A propósito desta longa temporada de presentações, Ricardo Neves-Neves, o encenador, diz ao JP tratar-se de uma “sorte, pois por um lado nós não esgotamos o espetáPUB

so e fluído do que era na verdade habitual nos seus textos”. A peça “A Noite de Dona Luciana” tem recebida uma crítica muito favorável. O Jornal “O Público” referenciou-a como um dos espetáculos de teatro do ano de 2016 e a Sociedade Portuguesa de Autores (SPA) nomeou-a como um dos melhores espetáculos do ano. Rita Cruz, pelo papel desempenhado na peça foi ainda nomeada pela SPA como uma das melhores atrizes do ano. Sobre o trabalho de encenação Ricardo Neves-Neves, confidencia-nos que “encenar este espetáculo foi divertido do primeiro ao último dia”. E acrescenta: “Entrar na loucura do autor e conseguirmos juntamento com a equipa de atores e restante equipa procurar o que será dar resposta a este humor tão particular foi um desafio, mas foi um desafio em constante divertimento. Depois, entramos numa zona mais séria que também é necessário. O espetáculo ao mesmo tempo é muito rigoroso na execução, na forma como o texto é dito, na forma como os atores se movimentam no palco, e nós acrescentamos uma coisa ao texto do autor que é a personagem do técnico, que é normalmente feita por um ator e na nossa versão é feita por dois

atores em simultâneo. Isto é essencialmente um desafio sonoro muito ligado à noção do coro grego. Desta vez, nós apenas usamos dois atores que ainda assim é um coro e eles existem num género de coabitação constante do mesmo espaço e do mesmo texto o que é também uma resposta ao tipo de encenações que eu costumo fazer que estão muito ligados à música, estão muito ligados ao trabalho sonoro do texto. Não só um tratamento do texto relacionado com uma dramaturgia com significados mas também à forma como o texto nos chega aos ouvidos. Nós trabalhamos sempre um lado em que damos um tratamento do texto como um espetáculo para ouvir e depois também para ver, mas a zona sonora é sempre muito importante nos nossos espetáculos”. Ricardo Neves-Neves é diplomado em teatro pela Escola Superior de Teatro e Cinema (ESTC) e pós-graduado em estudos de teatro pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É fundador e dirigente da companhia “Teatro do Eléctrico” onde escreve e encena. Há duas semanas estreou no teatro São Luís, em Lisboa, o seu mais recente espetáculo “Banda Sonora”. JP•


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“VOLTANTO À VACA FRIA” (I)

E DITORIAL

A MODOS DE UMA INTRODUÇÃO… COMO FOSSE DE PROPÓSITO “As mudanças nas nossas vidas assemelham-se às variações da natureza, podem ser penosas, mas são extraordinárias.” Sebastião Wanderley

Ranking Escolar

Açores, local legislativo e de defesa dos interesses dos Açores e das suas gentes que muitos negam o “epiteto” de Povo. Enganados estão os que pensam assim.

A

Ilha Terceira, volta a ser noticia por aspectos negativos que devem envergonhar a todos, ou seja o ranking das Escolas Terceirenses comparadas com as demais escolas do país, é um desastre. Por exemplo a Escola Secundária Vitorino Nemésio, no concelho da Praia da Vitória ocupa 498º lugar dos rankings elaborados em 2017, com base nas médias dos exames do ensino secundário e básico, não apresenta média positiva em exames nacionais em disciplinas v.g. português, matemática, física, química, etc. A Escola Vitorino Nemésio ocupa o lugar 807 a nível das escolas secundárias. Mas isto de facto não se limita às escolas sucundárias, também o aspecto é negativo a nivel de ensino básico, e de acordo com as estatisticas últimamente divulgadas ocupam lugares indesejáveis, o que demonstra por si só que algo vai muito mal na educação escolar dos Terceirenses em particular e dos Açoreanos em geral. Hoje a fonte de riqueza mais importante é o conhecimento, e só se consegue conhecimento evoluído que possa proporcionar uma base material de felicidade com boas escolas apetrechadas de bons docentes, examinados e classificados de acordo com o mérito. Se os alunos têm problemas de atenção, se sentem pressionados e têm notas baixas deve-se culpar os métodos desadequados de ensino, as turmas numerosas e o ritmo de vida anormalmente acelerado, por isso deve-se mudar as escolas para que ensinem os alunos, preparando-os para que possam vingar no futuro. A autonomia politica e administrativa foi criada para lançar o desenvolvimento da nossa região, e não há desenvolvimento sem um conhecimento eficaz e eficiente da população, nomeadamente para assegurarem um futuro prospero para as familias e para a sociedade. Em nosso modesto entender o mal não reside nos alunos, os alunos não podem ser culpados do enorme fracasso, são os adultos, os governantes, os pais, os professores a quem se deve assacar responsabilidades, e conciencializá-los para se dar a volta a tão negro quadro quando nos comparamos com as restantes escolas do país. Na educação e na formação é que está plasmado o futuro da nossa terra, e por isso a politica educacional regional, tem de ser reformada, melhorada, para que possam surgir bons frutos. O Diretor Sebastião Lima diretor@jornaldapraia.com

José Ventura*

S

im! Não fosse de propósito, o Horóscopo de hoje (21 de Fev.) para Caranguejo, (meu signo) publicado no jornal Correio dos Açores pelo nosso amigo e astrólogo Luís Moniz rezando o seguinte “Explique bem as suas intenções para evitar mal-entendidos e, certos assuntos podem ser ultrapassados através da compreensão de todos os envolventes” veio o mesmo confirmar a minha intenção de hoje, iniciando o esquema previsto para a sequência do propósito do “Título” escolhido. Assim, antes de desenvolver o mesmo nos prossupostos referidos na publicação do mote “Voltando à Vaca Fria”, penso fazer alguns considerando sobre o José Ventura pois é justo que os nossos leitores saibam do mesmo que, e de conformidade com quem alguns pensam da sua atitude, da sua maneira de escrever ou de agir é a de: (*) um revoltado, um “burro” teimoso”, um visionário, um fantasista, um septuagenário inexperiente defendendo de forma enganosa a independência dos Açores, conforme opinião de um senhor deputado da Assembleia Regional que para mim, é será sempre designada como Assembleia Legislativa dos

Já afirmamos nessas páginas não ser politólogo licenciado, nem melhor nem pior do que qualquer cidadão interessado na defesa e no progresso da sua terra natal o que obriga a sermos honestos connosco e com os outros. Não vamos desenvolver nenhum currículo académico que não o temos ninguém o poderá negar que dentro das nossas actividades de cidadania não temos deixado por mãos alheias o que temos nos proposto defender. Exemplos é quantos o basta. Bebemos na nossa juventude, a Doutrina Social da Igreja com o ensinamento de grandes figuras, como Joseph Leo Cardijn, fundador da JOC, dos sacerdotes micaelenses assistentes do mesmo movimento a quem presto a minha homenagem, Padre António Almeida Maia, Padre Artur Botelho de Paiva, Padre Doutor Manuel António Pimentel assistente do Movimento dos Trabalhadores Cristãos, - Bruxelas. O exemplo de vida e acção de Carlos Bouchard, jovem “boxeur” belga que perante todas as adversidades na vida foi um exemplo de quem sempre lutou pela divisa de “combater o bom combate” ensinando-nos como criar um” perfil de lutador” Na Encíclica “Rerum Novarum de SS. Leão XIII” aprendemos a verdadeira condição dos operários. Começamos cedo temos a experiência que nos permite encarar os problemas relacionados com o trabalho, coisa diferente do “emprego” o sublinhado é

propositado. Questionando-nos, pois, do que podem alguns sobre as atitudes ou maneira de escrever ou agir apontados (*), respondemos assim: - Revoltado? Sim! Revoltado contra a injustiça mal aplicada, às respostas sociais devidas ás necessidades do “homem”, à subjugação dos povos e à falta de cumprimento das normas constitucionais e aceitação da Carta dos Direitos do Homem. “Um Burro Teimoso” quiçá, “Teimoso” pois de “Burro” no depreciativo pensamos não ser até porque o jumentinho foi escolhido por S. Francisco de Assis para uma das figuras principais do Presépio, talvez como exemplo da serenidade aparente e enquanto não escoucinhar. Um “visionário, um fantasista”? Não …um idealista, isso sim, no verdadeiro sentido da palavra. Acredito. que poderemos acordar para a realidade que somos. Com maior peso na idade, não acreditamos em histórias que apelidamos de “carochinha” fantasiadas por intervenções mediáticas usando aquilo que a nós e só a nós povo açoriano nos é dado administrar. Não podemos, não queremos continuar a acreditar, em historietas centralizadoras (quer lá quer por cá) contadas por criaturas com um único olho, mitologicamente chamados de Ciclopes e que se inclinando numa vénia hipócrita, só olham para uma direcção. Para o seu umbigo. Por opção, o autor não respeita o acordo ortográfico. (*)

MEMÓRIAS DO POÇO DA AREIA (Continuação da página 7)

Era uma casa cheia de vida e acima de tudo, cheia de música, não havia outra como aquela, graças ao Sr. Ezequiel e família. Foi também lá em casa que vimos pela primeira vez na Tv. Americana os Beatles no Ed Sullivan Show em 1964, a chegada dos astronautas à Lua em 69 entre muitos outros acontecimentos históricos. Hoje, com informação a mais, tudo isto parece banal, mas na altura, eram novidades excitantes, o mundo estava a mudar, e de que maneira. E nós na Praia da Vitória éramos os únicos no país a desfrutar deste privilégio de informação em primeira mão. A década de 60 tinha estoirado com um Big Bang. Foi ótimo ter crescido neste ambiente. No meio deste turbilhão musical,

nasceram os Míni Sombras, que limitavam-se a imitar as músicas que os Sombras tocavam, com o Luís (viola solo), Jaime Pacheco (viola ritmo), eu na (bateria) e o Kiko Figueiredo na (viola baixo). A nossa estreia foi num espetáculo no Salão Teatro Praiense. Durou relativamente pouco tempo, o Jaime imigrou para o Canadá e o Kiko foi para os Sombras. O Sr. Ezequiel teve muita pena dos Míni Sombras terem terminado, e então, com muita paciência foi ensinando em simultâneo, a filha Teresa a tocar viola baixo, o Jorge Marques a tocar teclados e o Holbeche a tocar viola ritmo, e assim, ao fim de muitos meses de ensaios, surgiram os novos Míni Sombras, que rapidamente se tornaram populares, não só pelo fato de já terem reportório próprio, mas também por ser um grupo mui-

to jovem e com músicas de arrasar. Atuávamos normalmente nos intervalos dos Sombras especialmente nos bailes de verão na esplanada do Sport Clube Praiense, embora não tivéssemos idade suficiente para tocar em ambientes noturnos. É claro, que tudo isto aconteceu numa fase inicial. Tal como diz a canção de Maria Bethânia “O que é bom demais, tem quase sempre um fim.” Entretanto, os Sombras emanciparam-se e zarparam para outro local de ensaios. Aquela pequena casa no Poço da Areia foi por um longo período de tempo, quase como o conservatório musical da Praia da Vitória, a malta nova queria aprender a tocar, por lá (Continua na página seguinte)


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OPINIÃO | JP

CRÓNICA DO TEMPO QUE PASSA (XXIV)

VITORINO NEMÉSIO: FAROL DE AÇORIANIDADE Meus amores flutuantes eram as rosas-dos-ventos, Eu fui tu cá tu lá com sargaços e cúmulos, Tratei aves, pintou-me a moreia malhada, Um goraz na mão lesa do Lestinho Deu-me fósforo aos versos (...) Vitorino Nemésio, Canada Flight.

F

António Neves Leal

oi com profunda mágoa que soubemos, no Centro Cultural Português, aqui em Paris, da morte do maior vulto das Letras açorianas e uma das mais ricas e importantes personalidades da Cultura Portuguesa contemporânea. Quem vos escreve estas linhas é um dos muitos discípulos que o esplendor da sua inteligência, a afabilidade do seu trato, o seu vastíssimo saber e, no nosso caso pessoal, o seu entranhado amor à Terra Açoriana, marcaram, indelevelmente, para sempre. Conhecemos, fisicamente, o grande Mestre, em 1965, na Faculdade de Letras de Lisboa e, ainda, recordamos com saudade o cumprimento que o insigne açoriano nos fez, a nós, um pobre e incógnito caloiro da Faculdade, que ali arribava em regime de «part-time», por não ter o privilégio de recursos financeiros de outros estudantes. No entanto, somente em 1970, tivemos Nemésio como professor de Literatura Brasileira, estando nós então no 5.º ano de Filologia Românica. O Mestre, apesar de estar à porta da aposentação, e do natural declínio de alguns dos seus dotes físicos, o seu espírito, esse, continuava sempre lúcido e fulgurante, não deixava de impressionar-nos pela sua enciclopédica cultura e vasta erudição, a sua verve e versatilidade invulgares, pelo calor

que imprimia ao seu discurso, aqui e ali, salpicado pelo seu humor congénito, ou condimentado com a sua perspicaz ironia. A sua extraordinária facilidade de comunicação e o seu manejo do léxico luso, com suprema mestria, tornavam-no um autêntico prestidigitador da palavra. O Catedrático-poeta detestava os lugares comuns e a erosão da palavra usada apenas numa denotação rotineira e banalizada. Era aliciante ver como Nemésio conseguia copular domínios tão díspares, imbricando-os numa tessitura de conhecimentos que nos abriam vastos horizontes e nos davam a sensação de estarmos já vivendo, no universo brasileiro do sertão e caatinga, ou no meio de caboclos, retirantes e senhores de engenho, ou ainda na misteriosa Amazónia, etc, etc. Ao contrário de outros colegas universitários, o autor do “Paço do Milhafre” e de “A Casa Fechada” nunca se sentava, e o entusiasmo levava-o a distrair-se do tempo que fluía fugazmente. Um dia, o seu ardor foi mais forte e esqueceu-se, no fim da lição, do seu inseparável secretário – o seu relógio de bolso, de ouro, que deixava sempre sobre a mesa – para controlar o tempo de cada conferência (sim, as suas aulas eram autênticas palestras). Foi então que este seu discípulo e admirador lhe levou essa relíquia de seu pai. Foi a única vez que vimos embaraçado o fulgurante improvisador. «Oh! Valha-me Deus... Nunca tal me aconteceu... Isto é toda a minha riqueza». Além da recordação do seu extremoso pai, aquele objecto de estimação era certamente a Vila, a Ilha, o Arquipélago natal, donde se exilou sem nunca dele ter saído o seu pensamento mais profundo. Nemésio foi um desterrado

sem deixar a sua terra. Quem nos provará o contrário? O seu espírito universalista e pendor regionalista coexistiram nele 109 ao longo da sua trajectória de poeta e ficcionista. Debateu-se sempre numa multiplicidade de domínios: poesia, ensaio, história, crónica, romance, jornalismo. Porém, a pedra angular que sustentava uma tal construção e dava unidade ao espírito nemesiano era o seu apego telúrico. Este último era a força centrípeta que impedia que o intelectual caísse num incontrolado sincretismo. Funcionava como o cronómetro que lhe dava a noção do tempo. Foi graças a um tal apego que ele se tornou o grande embaixador em Coimbra, Montpellier, Bruxelas, Lisboa, Rio de Janeiro e em tantas terras por onde passou como conferencista notável. Nos últimos anos, foi nos órgãos de comunicação social que deu a conhecer ao grande público o nome dos Açores. Quem não se lembra da seu popular programa “Se bem me lembro...”, dos programas radiofónicos (Ondas Médias), do Observador e de tantos outros jornais, sem esquecer os açóricos como os leitores de “A União” e de outros diários bem sabem. Assim, foi Vitorino Nemésio, «o homem das ilhas», um farol a bruxulear a sua açorianidade, e desde as obras juvenis às mais amadurecidas. Dizemos bem, a sua, pois não foi ele quem introduziu o termo pela primeira vez já lá vão quatro décadas?! Nemésio utilizou sempre o seu açorianismo como um lenitivo saudosista da infância, perdida pela Praia e Porto Martim, para onde o poeta pretendia instalar-se num moinho da Ponta Negra, à semelhança de Alphonse Daudet, em França.

Mais tarde, essa evocação da infância fundir-se-ia com a da juventude de Angra e Horta e atingiria uma dimensão universal com a sua obra-prima “Mau Tempo no Canal”, epopeia das nossas grandezas e tristezas, o primeiro romance português contemporâneo e «o mais complexo, mais denso e subtil de toda a nossa literatura», na opinião de David Mourão-Ferreira. Tantas coisas tínhamos para dizer do autor da «Varanda de Pilatos»: as honras recebidas (Prémio Montaigne, Miscelânea de Estudos na sua jubilação, e o recente e serôdio título de “Officiel de la Légion d’Honneur”, outorgado pela França, para citarmos apenas as últimas; e ainda a sua simplicidade, os seus ensaios sagazes, etc. O essencial é que estava, sempre presente, o seu “back-ground” 110 ilhéu, indestrutível, como inapagáveis eram certas inflexões do seu sotaque terceirense, que o cultivava, adrede, e com sentida satisfação. Nemésio não morreu nem morrerá, enquanto a luso-açorianidade continuar vicejante pelas plagas atlânticas, mesmo que haja, uma vez por outra, alguma borrasca no canal. Mas do Penedo da sua e nossa Saudade, e desse Parnasso-Olimpo de Coimbra, continuaremos a ouvir ecoar o canto da sua voz. Estará para mim sempre presente, porque os Mestres e os poetas não morrem dentro de nós.

fê-lo três tons acima do habitual. Quando o Luís abriu a boca para cantar, apercebe-se de que o tom era demasiado alto, era tarde demais, debitou um grito qualquer que o pôs em bicos de pés num gesto de esforço e pânico proporcionando uma risada geral. Uma coisa é certa, se o olhar do Luís matasse, o Jorge teria sido fulminado naquele instante.

(in Varanda de Paris, pág. 107 a 110. Escrita há 40 anos, no dia 24 de Março de 1978)

Nota: No passado dia 20 de fevereiro de 2018, foi comemorado no Auditório do Ramo Grande, como noticiado oportunamente, o 25º aniversário da Escola Secundário da qual Vitorino Nemésio é muito ilustre patrono.

MEMÓRIAS DO POÇO DA AREIA (Continuação da página anterior)

tas histórias dos Miní Sombras.

para a despesa.

passou gente motivada e incentivada para a música e alguns tornaram-se mesmo músicos.

1-Os Míni Sombras foram atuar numa matiné ao clube de Santa Rita. Era dia de inauguração pós-ré modulação, pintado de fresco, palco e teto novo, revestido com umas placas isoladoras de alcatrão por baixo das telhas, uma novidade (material da base americana).

2-Os Míni Sombras são convidados para tocar ao vivo e em direto no Rádio Clube de Angra no programa Mundo dos Pequeninos transmitido aos sábados à tarde.

Já agora, a terminar deixo três curPUB

Estávamos em pleno verão, muito sol e muito calor, durante a atuação, o alcatrão aqueceu, e mesmo por cima das nossas cabeças começou a chuviscar pingos de alcatrão quente (eram efeitos especiais made in Santa Rita) a pobre Teresa ficou com o seu vestido novo estragado, assim como as nossas cabeças, camisas e equipamento manchados. No final do dia, nós e o salão tresandava a alcatrão, deram cinquenta escudos a cada um, e para não falarmos mais nisto. Escusado será dizer, que não deu

Mesmo na primeira canção, quando o Luís se preparava para cantar, encosta a boca ao microfone, leva de imediato um choque enorme nos lábios, e ao som de um gemido, dá um pulo para trás com um estrondo, como tivesse levado um coice de uma mula. Só ele sabe o que sentiu naquele momento, mas mesmo assim, desorientado, amarelo e a tremer, conseguiu tocar e cantar, mas sempre longe do microfone. Tudo isso em direto na rádio, imaginem na televisão, teria sido espetacular. 3-Num baile na esplanada do Sport Clube Praiense, Jorge Marques começa nas teclas a introdução de Dear Eloise dos Hollies, só que desta vez,

E são estas, algumas das memórias que guardo para sempre do Poço da Areia, naquela casinha virada pró mar.

(*) Escrevi este texto há quase um ano a pedido da Maria Bettencourt para oferecer ao pai pelos anos num livrinho de memórias escrito por familiares e amigos. Com algumas alterações, hoje decidi partilhar com todos aqueles que tenham paciência em ler.


JP | OPINIÃO

2018.03.23

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DE FÉRIAS NA TERCEIRA: OS TOIROS DA AREIA Foi uma tarde bem passada, gostei. O arraial dos toiros da areia é diferente de todos os outros à volta da Ilha: a baía com a Marina e os barcos junto à praia, a muralha e a Avenida cheias de gente dão um enquadramento diferente, com um colorido muito especial.

L

Silveira de Brito

ogo que cheguei à Terceira com a minha gente, no dia 9 de Agosto, revimos o Programa das Festas da Praia da Vitória que indicava para o dia 13, às 18 horas: “Tourada à corda com a Ganadaria Ezequiel Rodrigues, Local: Areal da Praia Grande”. Os meus filhos disseram imediatamente: “não podemos perder este espectáculo!”, e começaram a recordar a tourada de 2000, quando foram lá de férias pela primeira vez; nesse ano viram a corrida no barco do amigo Francisco Ferraz da Rosa. Por unanimidade ficou, então, decidido que no dia 13 o programa seria irmos aos touros. Sem nada lhes dizer, imediatamente comecei a pensar: onde vou colocar esta gente toda (com bebés eramos 13) para poderem ver a tourada em lugar seguro? Nos dias seguintes nunca mais parámos a visitar a Ilha e só na véspera dos toiros voltei à questão do palanque. Depois de colocar algumas hipóteses, fui ao Restaurante Bar Garça, mas um dos empregados logo me disse que seria muito difícil, porque havia pessoas que reservavam mesa de um ano para o outro; que telefonasse na manhã seguinte. Imaginei logo que não ia ter sorte. Resolvi falar com os meus sobrinhos que tinham vindo do Canadá para as Festas, para ver se eles tinham uma ideia. O meu sobrinho Arlindo disse-me que iam aos toiros para casa de uns primos, que ia falar com eles. Explicou-me onde era: a casa encostada ao “Miradouro António Ázera”, um dos melhores sítios do arraial. Reagi dizendo que éramos muitos, que não queria incomodar. Para me convencer que valia a pena falar, explicou-me de quem era a casa. Não fui capaz de chegar lá; mais de 50 anos fora tem consequências: não somos capazes de recordar parentescos, nomes de amigos, etc., o que é muitas PUB

vezes mal interpretado por quem continuou a viver na terra. Quem regressa todos os anos vai seguindo os passos dos que são próximos, parentes e amigos; quem volta poucas vezes, vai ficando com imagens cada vez mais ténues na memória e, quando quer recordar pessoas, tem dificuldades. Foi o que me aconteceu. Mas o Arlindo disse-me que não me preocupasse, que ia falar. Algum tempo depois telefonou-me a dizer que contavam connosco. À hora combinada, encontrámo-nos junto à casa onde íamos ver os touros e toquei a campainha. Quando a porta abriu, vi uma cara que logo reconheci: era o Fernando, que no meu tempo trabalhava no “Basílio Simões”, na Rua Serpa Pinto, filho do Eduardo Barcelos, mais conhecido pela alcunha da família: Eduardo Quilhabras. Quando eu era músico, quantas vezes o Fernando foi porta-estandarte da Filarmónica. Disse-lhe imediatamente: “é o Fernando, a sua cara não mudou!” Era! Foi logo um abraço caloroso. Subimos ao primeiro andar, ele apresentou-me a filha e o genro, os donos da casa, e conduziu-me ao terraço, foi buscar umas minis e celebrámos o nosso reencontro: não nos víamos há mais de 53 anos… Como o tempo passa! Logo me resumiu o seu percurso: terminado o serviço militar no Ultramar, tinha regressado aos Açores e entrado na Polícia; depois, como muitos outros praienses, tinha emigrado para o Canadá; para sublinhar a nossa proximidade disse que meu irmão Ramiro e os meus sobrinhos, também imigrantes no Canadá, tinham estado em casa dele. Da minha parte descrevi-lhe brevemente as minhas andanças e, de imediato, foi um relembrar estórias do nosso tempo de juventude. Foi uma tarde bem passada. A primeira surpresa foi saber que uma estação de televisão canadiana estava no terraço, a transmitir em directo para o Canadá. No seu trabalho de reportagem, o operador filmou-nos, os meus sobrinhos e a mim. Pouco tempo depois uma das sobrinhas recebia um telefonema de alguém no Canadá a dizer que nos tinha visto. Como o mundo está mais pequeno, graças às novas tecnologias. Outra surpresa foi encontrar um irmão de um meu colega e amigo de escola e dos escuteiros que vive nos Estados Unidos,

o Jorge Coelho, por quem perguntei; o irmão disse-me que estava de visita à Graciosa, de onde é natural a esposa. Há uma estória do pai do Jorge, o senhor Coelho, que nunca mais esqueci. O senhor era continental, tinha ido parar à Terceira com o Regimento de Infantaria 10, de Aveiro, durante a Segunda Guerra Mundial. Casou na Praia, com uma filha do senhor Almeida, que morava na esquina da Rua de Jesus com a Rua da Graça; foi chefe dos escuteiros e foi num acampamento que lhe ouvi a estória. Durante o serviço militar, o senhor Coelho entrou numa venda, no Cabo a Praia, e pediu dois escudos e meio da linguiça. Para grande espanto seu, o dono da venda sacou do metro, mediu não sei quantos centímetros de linguiça, cortou o pedaço, embrulhou-o e deu-lho. O senhor Coelho ficou estarrecido, nunca na vida tinha comprado chouriço a metro. Foi a magicar naquilo até à Praia e resolveu entrar numa venda e pedir ao dono para lhe pesar aquela linguiça e dizer-lhe quanto custava. O homem pesou e disse: custa dois escudos e meio! Pouco depois da nossa chegada ao terraço, saiu o primeiro toiro. E lá tivemos as cenas do costume: correr na areia é difícil, mais para o homem do que para o toiro pois que, como ouvi uma vez a um pastor, o toiro “puxa a quatro”. Naquelas correrias, nem sempre as distâncias são bem medidas por parte dos capinhas, o que provoca situações de suspense; se a marrada não se concretiza, a gargalhada é geral; se a colhida acontece, percebe-se no ar a aflição, que logo desaparece quando o capinha recomeça a correr. Foi o que aconteceu; de vez em quando, lá vinha o “ai! ai! ai!... Escapou!” Ou a percepção da angústia pela colhida que, felizmente terminava com um brado de alívio ao ver o capinha de novo a fugir. Neste capítulo, tudo correu bem, ninguém se “pisou”, como se diz na Terceira. Como sempre acontece nos toiros na areia, tivemos capinhas em fato de banho no mar e outros vestidos com trajo de passeio que, a fugir em caso de aperto, tiveram que mergulhar para não apanharem uma marrada, motivando gargalhada geral da assistência. Foi uma tarde bem passada, gostei. O arraial dos toiros da areia é diferente de todos os outros à volta da Ilha: a baía com a Marina e os barcos junto à praia,

a muralha e a Avenida cheias de gente dão um enquadramento diferente, com um colorido muito especial. Há 17 anos que não via esta tourada, de que tenho recordações ainda de muito miúdo: ainda me lembro dos toiros virem a pé e de se improvisar um touril com chapas junto à muralha da Avenida; lembro-me de ver o António Patrício dentro do touril, a laçar os toiros com a ajuda de uma aguilhada, há, pelo menos 65 anos, e das barracas que as pessoas improvisavam ao longo da muralha. Os meus gostaram de ver o arraial e, acima de tudo, do modo como foram recebidos em casa do genro do meu amigo Fernando. Como eu, devem ter chegado um pouco constrangidos; eramos um grupo grande e íamos ver toiros para casa de pessoas que não conheciam. Mas logo ficaram mais à vontade quando viram o grande abraço que dei ao Fernando, a prova provada da verdade da afirmação de Victor Rui Dores, no seu texto A ARTE DE SER TERCEIRENSE: “a Terceira […] é a hospitalidade da porta aberta e luz acesa - a casa aonde chego, vou abrindo e entrando: “Dão licença”? Resposta: “É entrar p’ra dentro” (https://www.youtube.com/ watch?v=OaBar57DlSs&t=15s). Os meus nunca mais esquecerão o modo como, no intervalo da tourada, foram convidados a dirigirem-se à sala, para se servirem de comes e bebes, com aquela liberalidade que caracteriza os terceirenses; o modo próximo e largueza de coração com que os donos da casa insistiam para se servirem à vontade calou fundo nos meus filhos e noras. Os miúdos, por seu lado, acharam um piadão a tudo, ao ar de festa que se respirava no arraial e, em especial, na casa que nos recebeu. Gostaram imenso de tudo, até dos toiros. O meu neto Afonso, que tem agora três anos, quando vem cá a casa e ponho um vídeo do Youtube com toiros à corda, fala-me logo da tourada da Praia; ficou-lhe na memória. Em contrapartida, a minha nora Sofia, bailarina e professora de dança, não achou graça; dizia-me: “pobre do bicho, amarrado pelo pescoço!” Sou aficionado, não fosse terceirense, criado a ouvir desde o berço estórias de toiros, mas também tenho cá por casa alguns antitaurinos, o que não perturba nada a nossa convivência.


2018.03.23

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INFORMAÇÃO | JP MISSAS DOMINICAIS NO CONCELHO

SÁBADOS

FUTEBOL

CAMPEONATO DE PORTUGAL SÉRIE “D”

26.ª JORNADA | 25.03.2018 Torreense

-

SC Praiense

Caldas

-

Vilafranquense

1º Dezembro

-

Loures

Lusitânia

-

Alcanenense

Mafra

-

Pêro Pinheiro

Fátima

-

Coruchense

Eléctrico

-

Guadalupe

Sacavenense

-

Sintrense

27.ª JORNADA | 31.03.2018 Alcanenense

-

Torreense

SC Praiense

-

Caldas

Vilafranquense

-

1º Dezembro

Pêro Pinheiro

-

Lusitânia

Guadalupe

-

Mafra

Sintrense

-

Fátima

Coruchense

-

Eléctrico

Loures

-

Sacavenense

II FASE GRUPO “A” - PROMOÇÃO

5.ª JORNADA | 25.03.2018 -

GD Fontinhas

Marítimo Gra.

-

SC Angrense

6.ª JORNADA | 31.03.2018 CD Rabo Peixe

-

GD Fontinhas

Prainha FC

-

SC Angrense

GRUPO “B” - MANUTENÇÃO

5.ª JORNADA | 25.03.2018 FC Flamengos

-

SC Vilanovense

CU Micaelense

-

CD São Roque

6.ª JORNADA | 31.03.2018 FC Vale Formoso

-

SC Vilanovense

FC Flamengos

-

CD São Roque

CAMPEONATO FUTEBOL DA ILHA TERCEIRA

- São Brás - Vila Nova, ENS Ajuda - Lajes, Ermida Cabouco - Cabo da Praia (1) - Biscoitos, S Pedro - Agualva - Casa Ribeira (1) - Santa Rita - Lajes - São Brás - Cabo da Praia (2) - Porto Martins - Casa da Ribeira (2) - Biscoitos, IC Maria - Vila Nova - Fontinhas - Matriz Sta. Cruz (1) - Quatro Ribeiras - Sta Luzia - Fonte Bastardo - Matriz Sta. Cruz (2) - Lajes, ES Santiago - Lajes - Matriz Sta. Cruz (3) - Matriz Sta. Cruz (4)) (1) Missas com coroação (2) Missas sem coroação (3) De outubro a junho (4) De julho a setembro

Farmácia Silva Largo Conde da Praia da Vitória, 26 ( 295 512 905

SÁBADO (24/03)

SÁBADO (24/03)

Farmácia da Misericórdia Avenida Paço do Milhafre, 18 ( 295 540 290

DOMINGO (25/03)

Farmácia Cabral Praça Francisco Ornelas da Camâra ( 295 512 814

SEGUNDA (26/03)

Farmácia Silva Largo Conde da Praia da Vitória, 26 ( 295 512 905

TERÇA (27/03)

Farmácia da Misericórdia Avenida Paço do Milhafre, 18 ( 295 540 290

QUARTA (28/03)

TEATRO A NOITE DA DONA LUCIANA Local: Auditório do Ramo Grande Hora: 21H30 Classificação: M/16

DOMINGOS

CAMPEONATO FUTEBOL DOS AÇORES

Prainha FC

HOJE (23/03)

- Lajes - Fontinhas (1) - Casa da Ribeira - Cabo da Praia - Matriz Sta. Cruz - Vila Nova - Fontinhas (2) - São Brás - Porto Martins - Sta Luzia, BNS Fátima - Quatro Ribeiras - Lajes - Agualva - Santa Rita - Fonte do Bastardo - Biscoitos, IC Maria (3) - Biscoitos - São Pedro (4) (1) Enquanto há catequese (2) Quando não há catequese (3) 1.º e 2.º sábados (4) 3.º e 4.º sábados 15:30 16:00 16:30 17:00 17:30 17:30 18:00 18:00 18:00 18:00 18:00 19:00 19:00 19:00 19:00 19:30 19:30

08:30 09:00 10:00 10:00 10:00 10:30 10:30 10:30 11:00 11:00 11:00 11:00 11:00 11:00 12:00 12:00 12:00 12:00 12:00 12:15 12:30 13:00 19:00 19:00 20:00

Farmácia Cabral Praça Francisco Ornelas da Camâra ( 295 512 814

QUINTA (29/03)

Farmácia Silva Largo Conde da Praia da Vitória, 26 ( 295 512 905

SEXTA-FEIRA (30/03)

SEXTA (30/03)

Farmácia da Misericórdia Avenida Paço do Milhafre, 18 ( 295 540 290

SÁBADO (31/03)

Farmácia Cabral Praça Francisco Ornelas da Camâra ( 295 512 814

DOMINGO (01/04)

Farmácia Silva Largo Conde da Praia da Vitória, 26 ( 295 512 905

SEGUNDA (02/04)

Farmácia da Misericórdia Avenida Paço do Milhafre, 18 ( 295 540 290

TERÇA (03/04)

ASSINE

Farmácia Cabral Praça Francisco Ornelas da Camâra ( 295 512 814

CINEMA A AGENTE VERMELHA Local: Auditório do Ramo Grande Hora: 21H00 (*) Classificação: M/12 (*) Sessão também no sábado.

QUARTA (04/04)

Farmácia Silva Largo Conde da Praia da Vitória, 26 ( 295 512 905

QUINTA (05/04)

Farmácia da Misericórdia Avenida Paço do Milhafre, 18 ( 295 540 290

SÁBADO (31/03) CINEMA

BISCOITOS

16.ª JORNADA | 25.03.2018 Marítimos

-

Lajense

Barreiro

-

NSIT

Boavista

-

São Mateus

Posto da Misericórdia ( 295 908 315 SEG a SEX: 09:00-13:00 / 13:00-18:00 SÁB: 09:00-12:00 / 13:00-17:00

VILA DAS LAJES

VOLEIBOL

Farmácia Andrade Rua Dr. Adriano Paim, 142-A ( 295 902 201 SEG a SEX: 09:00-18:30 SÁB: 09:00-12:30

II DIVISÃO SENIORES FEMININOS II FASE GRUPO “PRIMEIROS”

VILA NOVA

7.ª JORNADA | 25.03.2018 CD Aves

-

GC Santo Tirso

ADRE Praiense

-

Esc. P. E. Lobato

Farmácia Andrade

ASSINATURA ANUAL 15,00 EUR

desporto@jornaldapraia.com

assinaturas@jornaldapraia.com

A IDADE DA PEDRA Local: Auditório do Ramo Grande Hora: 18H00 (*) Classificação: M/6 (*) Sessão também no domingo às 15:00 Gratuito para menores de 12 anos

Caminho Abrigada ( 295 902 201 SEG a SEX: 09:00-12:00 / 16:00-18:00 Farmácias de serviço na cidade da Praia da Vitória, atualizadas diáriamente, em: www.jornaldapraia.com


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