Patologia dos Órgãos Endócrinos I (tireoide)

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Distribuição das glândulas endócrinas

Cefálicas: - hipófise; - pineal;

Cervicais: - tireoide; - paratireoides.

Abdominais: - pâncreas; - suprarrenais;

Pélvicas: - ovários/testículos.

Tireoide

Características morfofuncionais gerais:

- topografia: lobos cercam bilateralmente a laringe, com o istmo situado ânteroinferiormente à cartilagem cricoide;

- irrigação: aa. tireóideas sup. e inf.;

- drenagem venosa: vv. tireóideas sup. médias e inf;

- drenagem linfática: lnn. pré-traqueais ou cervicais laterais profundos sup. ou inf;

- inervação: n. vago e tronco simpático.

A glândula tireoide in situ.

Tireoide

Características morfofuncionais gerais:

- organizada em microcompartimentos poligonais (folículos) revestidos por epitélio simples cuboidal; - os folículos representam a menor unidade morfofuncional da glândula e contêm coloide, fluido gelatinoso produzido pelo epitélio folicular;

- o coloide é formado especialmente por tireoglobulina, uma glicoproteína precursora dos hormônios T3 e T4.

Células parafoliculares

Células foliculares

Microestrutura da glândula tireoide.
Capilar
Folículo tireoidiano Células foliculares
Coloide
Coloide

Tireoide

Características morfofuncionais gerais:

- regula o ritmo metabólico do organismo por meio do T3 (triiodotironina) e T4 (tetraiodotironina) sintetizados pelas células foliculares;

- reduz o Ca2+ plasmático (antagonizando o paratormônio) por meio da calcitonina (↑ deposição e ↓ reabsorção de matriz óssea), sintetizada pelas células parafoliculares;

- regulada pelo hormônio tireoestimulante (TSH) secretado pela hipófise.

Doenças da tireoide

Tireoidite de Hashimoto:

- doença inflamatória crônica de natureza autoimune;

- segunda causa mais comum de insuficiência tireoidiana (hipotireoidismo), sendo a primeira nas regiões não carentes de iodo;

- mais comum em mulheres (10-20:1), em especial após os 40 anos;

- pode haver bócio (tireomegalia) difuso, associado a manifestações variáveis de hipotireoidismo (fadiga, adinamia, sonolência, raciocínio lento, discurso "arrastado", bradipneia/cardia, extremidades frias);

- risco aumentado para outras doenças autoimunes e linfoma tireoidiano.

Doenças da tireoide

Tireoidite de Hashimoto:

- patogênese envolve a ativação de linfócitos T autorreativos (gatilhos desconhecidos), que exercem efeito citotóxico sobre o epitélio folicular e estimulam (INF-γ) macrofagócitos (inflamação crônica);

- o papel de autoanticorpos (anti-tireoglobulina, anti-peroxidase) na patogênese permanece pouco elucidado (ativação do complemento e células NK?).

Doenças da tireoide

Tireoidite de Hashimoto:

- uma deposição de imunocomplexos na membrana basal do epitélio folicular parece ao menos perturbar sua atividade secretória; - a destruição progressiva dos folículos leva à insuficiência hormonal permanente (baixos níveis de T3/T4, apesar de elevado TSH).

Doenças da tireoide

Tireoidite de Hashimoto:

- glândula exibe aspecto vagamente multinodular; - os folículos se exibem rarefeitos, substituídos por maciço infiltrado linfocitário com centros germinativos e fibrose; - células foliculares metaplásicas (de Hürthle) são frequentes.

Aspecto macro e microscópico da tireoidite de Hashimoto.

Doenças da tireoide

Tireoidite de Hashimoto

Espessas traves fibrosas distorcendo a arquitetura glandular na tireoidite de Hashimoto. No detalhe, folículo com células metaplásicas (de Hürthle).

Doenças da tireoide

Tireoidopatia de Graves:

- hiperplasia tireoidiana difusa induzida por autoimunidade, que resulta em tireotoxicose (por hipertireoidismo);

- principal causa de hipertireoidismo;

- mais comum em mulheres (10:1), em especial entre 20 e 40 anos;

- pode haver bócio (tireomegalia) difuso, associado a manifestações

variáveis de hipertireoidismo (taquicardia, arritmias, palpitações, tremores, agitação, insônia, hiperidrose, intolerância ao calor);

- presença de exoftalmia é típica;

- risco aumentado para outras doenças autoimunes.

Doenças da tireoide

Tireoidopatia de Graves:

- patogênese envolve a atuação de autoanticorpos contra múltiplos antígenos tireoidianos (hipers. tipo II), em particular receptores de TSH; - principal autoanticorpo é o TSI (imunoglobulina tireoestimulante), que mimetiza a ação do TSH (superestimulando a glândula); - a estimulação patológica induz hiperplasia (e hipertrofia) difusa dos folículos, levando à tireotoxicose (altos níveis de T3/T4, apesar de um TSH suprimido).

Doenças da tireoide

Tireoidopatia de Graves:

- a típica protrusão ocular decorre da infiltração inflamatória da região retro-orbital e mm. oculares, bem como de uma produção acentuada de matriz extracelular nos tecidos moles retro-orbitários; - especula-se que fibroblastos retro-orbitais exibam receptores de TSH que, quando superestimulados, ativam linfócitos T os quais, em resposta, induzem (citocinas) fibroplasia no local.

Exoftalmia típica na tireoidopatia de Graves.

Doenças da tireoide

Tireoidopatia de Graves:

- glândula exibe aumento difuso, geralmente simétrico; - os folículos se exibem adensados, com apinhamento das células foliculares (formando micropapilas), em torno de um coloide pálido e marcado por focos de reabsorção (hiperatividade folicular);

- um infiltrado linfocítico variável, que pode exibir centros germinativos, é comumente observado.

Aspecto macro e microscópico da tireoidopatia de Graves.

Doenças da tireoide

Hiperplasia folicular nodular:

- proliferação policlonal dos folículos tireoidianos, tipicamente sem hipertireoidismo associado;

- mais comum em jovens e adultos, em especial mulheres (8:1);

- inicialmente cursa com um aumento difuso da glândula, que em longo prazo adquire aspecto multinodular;

- outras manifestações, quando presentes (como desconforto ao deglutir/disfagia), em geral se devem à compressão de órgãos adjacentes.

Doenças da tireoide

Hiperplasia folicular nodular:

- deficiência de iodo é a principal causa;

- a tendência à queda dos hormônios circulantes (deficiência de iodo) acompanha-se do aumento do TSH, que induz hiperplasia compensatória (que em geral mantém a glândula normofuncionante);

- em longo prazo, alguns folículos podem tornar-se hiperfuncionantes ou "tóxicos" (configurando a tireoidopatia de Plummer, que gera hipertireoidismo e queda do TSH);

- não se associa à incidência aumentada de câncer na tireoide (não é fator de risco).

Doenças da tireoide

Hiperplasia folicular nodular:

- a glândula exibe-se difusamente aumentada, com áreas micro e macronodulares;

- observa-se acúmulo variável de coloide nos folículos, havendo áreas predominantemente celulares (aspecto adenomatoide) ou císticas;

- áreas hemorrágicas, fibroplásicas e/ou calcificadas podem ser identificadas (ciclos crônicos de evolução-involução dos folículos hiperplásicos, favorecendo as nodulações).

Aspecto macro e microscópico da hiperplasia folicular nodular.

Doenças da tireoide

Hiperplasia folicular nodular

A hiperplasia folicular nodular pode manifestar-se com tireomegalia difusa simétrica ou assimétrica, por vezes com aspecto grosseiramente multinodular, inclusive com projeção intratorácica (bócio "mergulhante").

Doenças da tireoide

Adenoma folicular:

- neoplasia benigna derivada do epitélio folicular;

- pode ser subclínico (achado incidental) ou manifestar-se com aumento localizado da glândula (bócio nodular), por vezes associado a desconforto à deglutição;

- alguns tumores podem ser funcionantes, levando à tireotoxicose;

- diagnóstico corroborado por estudo radiológico e citopatológico (mas somente confirmado pelo exame histopatológico).

Doenças da tireoide

Adenoma folicular:

- nódulos tóxicos exibem mutações envolvendo a via de transdução do TSH, levando à sua ativação mesmo na ausência do estímulo hormonal (produção autônoma de T3/T4);

- uma minoria dos casos exibe mutações da RAS ou PI3K (risco de transformação em carcinoma folicular?).

Doenças da tireoide

Adenoma folicular:

- em geral nódulo solitário, delimitado por cápsula fibrosa, medindo em torno de 3 cm (mas pode ultrapassar 10 cm);

- áreas císticas, hemorrágicas e calcificadas são comuns;

- células neoplásicas bem diferenciadas compõem folículos densamente agrupados, contendo pouco ou nenhum coloide.

Aspecto macro e microscópico de um adenoma folicular.

Doenças da tireoide

Carcinoma papilar:

- neoplasia maligna mais comum da tireoide (>85% dos casos), derivada do epitélio folicular;

- maioria em mulheres (tireoide é o 6º sítio mais comum de câncer no sexo feminino [OMS, 2020]);

- em geral entre 25 e 50 anos;

- subclínico ou manifesto (tipicamente) como bócio nodular, sem sintomas associados (em geral não funcionantes);

- pode haver disfagia, rouquidão, tosse ou dispneia (doença avançada);

- em geral bom prognóstico (sobrevida em 10 anos de 95%).

Doenças da tireoide

Carcinoma papilar:

- são comuns alterações envolvendo os proto-oncogenes RET e NTRK1, resultando em receptores, implicados na sinalização pró-crescimento, intrinsecamente ativos;

- alterações do proto-oncogene BRAF são frequentes e se correlacionam com comportamento mais agressivo;

- histórico de exposição à radiação ionizante, especialmente na infância, é fator de risco.

Doenças da tireoide

Carcinoma papilar:

- nódulo sólido-cístico solitário ou multifocal (disseminação do foco primário ou multicentricidade), por vezes bem circunscrito e até mesmo encapsulado;

- formações papilares com eixos vasculares, ramificadas e, por vezes, com ápices calcificados (resultando em psamomas), são características;

- núcleos grandes e ovoides, frequentemente pálidos, por vezes com dobramentos e invaginações citoplasmáticas, são característicos; - metástases a cadeias linfonodais cervicais são comuns (podem abrir o quadro clínico). Aspecto macro e microscópico de um carcinoma papilar.

Doenças da tireoide

Carcinoma papilar

Corpos psamomatosos (à esquerda) e aspecto nuclear característico ("olhos da órfã Annie") do carcinoma papilar.

Doenças da tireoide

Carcinoma folicular:

- segunda neoplasia maligna mais comum da tireoide (~10% dos casos), derivada do epitélio folicular;

- maioria em mulheres, em geral após os 40 anos;

- deficiência de iodo é fator de risco;

- subclínico ou manifesto (tipicamente) como bócio nodular, sem sintomas associados (em geral não funcionantes);

- pode haver disfagia, rouquidão, tosse ou dispneia (doença avançada);

- sobrevida geral em 10 anos em torno de 95%.

Doenças da tireoide

Carcinoma folicular:

- patogênese envolve alterações dos proto-oncogenes RAS e PIK3CA, bem como o gene (supressor tumoral) PTEN; - nódulo em geral solitário, tipicamente bem circunscrito e encapsulado, com áreas císticas e hemorrágicas; - à microscopia, folículos neoplásicos densamente agrupados ou blocos celulares sólidos, com focos de invasão/transposição capsular e/ou embolização vascular.

Aspecto macro e microscópico de um carcinoma folicular.

Foco de invasão capsular

Pseudocápsula

Doenças da tireoide

Carcinoma anaplásico:

- neoplasia maligna derivada do epitélio folicular;

- pouco comum (<5% dos casos), mas extremamente agressivo;

- em geral em torno dos 65 anos;

- manifesto como bócio nodular de rápido crescimento;

- invasão de estruturas adjacentes e metástases são comuns ao diagnóstico (disfagia, rouquidão, tosse, dispneia são frequentes);

- mortalidade de quase 100%, em geral no curso de poucos meses.

Doenças da tireoide

Carcinoma anaplásico:

- patogênese envolve alterações dos proto-oncogenes RAS e PIK3CA, bem como do gene (supressor tumoral) TP53, dentre outros;

- glândula em geral difusamente infiltrada/substituída pelo tumor, com franca invasão de órgãos adjacentes;

- à microscopia, células com marcado pleomorfismo e aspecto indiferenciado formam blocos sólidos difusamente infiltrativos;

- áreas necróticas, embolização vascular e mitoses são frequentes;

- focos com diferenciação papilar ou folicular costumam ser observados;

- fenótipo molecular epitelial à imuno-histoquímica.

Invasão traqueal por carcinoma anaplásico (seta) e aspecto à microscopia.

Doenças da tireoide

Carcinoma medular:

- neoplasia maligna derivada de células parafoliculares;

- pouco comum (~5% dos casos);

- maioria entre 40-50 anos; - tumor funcionante (calcitonina e outros hormônios, como ACTH); - subclínico ou manifesto (tipicamente) com bócio nodular, a que podem associar-se fenômenos paraneoplásicos (p. ex., Cushing);

- pode haver disfagia, rouquidão, tosse ou dispneia (doença avançada).

Doenças da tireoide

Carcinoma medular:

- são comuns alterações envolvendo o proto-oncogene RET (porém distintas das observadas no carcinoma papilar);

- em geral nódulo solitário, com áreas de necrose e hemorragia;

- blocos celulares pouco coesos, tipicamente interpostos por material amiloide (material proteico amorfo e eosinofílico, neste contexto derivado da calcitonina);

- estudo imuno-histoquímico corrobora com o diagnóstico.

Aspecto microscópico de um carcinoma medular, com típica reação imuno-histoquímica para calcitonina.

Material amiloide

Doenças da tireoide

Citopatologia dos nódulos tireoidianos:

- nódulos solitários palpáveis são encontrados em 5% da população (prevalência aumenta com a idade);

- causa de base engloba desde fenômenos inflamatórios e hiperplásicos até neoplasias benignas e malignas (<5%);

- o exame citopatológico de material obtido por punção aspirativa com agulha fina (PAAF) guiada por ultrassonografia representa importante método de estudo.

PAAF de nódulo tireoidiano.

Doenças da tireoide

Citopatologia dos nódulos tireoidianos:

- os achados ao exame são convencionalmente reportados conforme o Sistema de Bethesda, organizado em seis categorias:

-- I: amostra insatisfatória (p. ex., material hemático);

-- II: achados benignos (hiperplasia folicular nodular, tireoidites);

-- III: atipias celulares de significado indeterminado (5-10% malignos);

-- IV: achados suspeitos para neoplasia folicular (até 45% malignos);

-- V: achados suspeitos para malignidade (75% de acurácia);

-- VI: achados malignos (99% de acurácia).

Exemplos das categorias II (hiperplasia folicular nodular, à esquerda) e VI (carcinoma papilar) de Bethesda.

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