Patologia do Sistema Linfo-hematico

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Organização do sistema linfo-hemático

Órgãos linfáticos primários:

- medula óssea; - timo.

Órgãos linfáticos secundários:

- baço;

- linfonodos (e vasos linfáticos);

- tonsilas (anel linfático faríngeo);

- nódulos linfáticos (tecido linfático associado a mucosas).

Características morfofuncionais gerais:

- órgão amorfo, difuso, acomodado no interior dos ossos;

- rica vascularização (irrigação por ramos de aa. nutrícias, metafisiais, epifisiais e/ou periosteais e drenagem venosa para plexos periosteais);

- exibe lipossubstituição progressiva com a idade.

A medula óssea in situ e os principais sítios de atividade hematógena no adulto.

Medula óssea

Características morfofuncionais gerais:

- compõe-se de tecido linfo-hematopoético sustentado por fibras reticulares, com proporções variáveis de tecido adiposo (conforme idade); - produz as células que compõe os tecidos sanguíneo e linfático (linfócitos T terminam seu desenvolvimento no timo).

Aspecto microscópico da medula óssea em exame citológico de amostra obtida por punção aspirativa (mielograma; à direita, acima) e histológico de fragmento incisional (à direita, abaixo).

Medula óssea

Características morfofuncionais gerais Citologia

A medula óssea é composta por uma variedade de células maduras e imaturas que integram diferentes linhagens de desenvolvimento (1: precursor mieloide eritroide; 2: precursor mieloide granuloide; 3: megacariócito; 4: neutrófilo imaturo).

Medula óssea

Linfo-hematopoese normal

Prof. Fabricio Jacobsen

Doenças neoplásicas

Linfoma de Hodgkin:

- neoplasia maligna derivada de células da linhagem B maduras;

- tumor com características morfopatológicas únicas;

- representa 10% dos linfomas;

- em geral em torno dos 30 anos.

O patologista britânico Thomas Hodgkin, na década de 1830, descreveu a doença que carregaria seu nome.

Doenças neoplásicas

Linfoma de Hodgkin:

- linfonodomegalia cervical é a manifestação clínica mais comum; - sintomas sistêmicos inespecíficos (febre, sudorese noturna, perda ponderal) podem ser observados na doença mais avançada; - em geral bom prognóstico (sobrevida em 5 anos maior que 70%).

Nodulações cervicais podem ser secundárias ao linfoma de Hodgkin.

Doenças neoplásicas

Linfoma de Hodgkin:

- as células neoplásicas teriam origem a partir de linfócitos infectados mutantes (EBV tem sido implicado);

- citocinas e fatores de crescimento produzidos pelas células neoplásicas atraem vigorosamente macrofagócitos, leucócitos e fibroblastos, que compõem mais de 90% da massa tumoral;

- as células tumorais induzem as células recrutadas a produzir fatores que favorecem sua subsistência e proliferação.

Clássica célula de Reed-Sternberg, (aspecto de "olhos de coruja"), cercada por leucócitos.

Doenças neoplásicas

Linfoma de Hodgkin:

- acomete, em geral isoladamente, cadeias linfonodais axiais: cervicais (75% dos casos), mediastinais, para-aórticas ou axilares; - a disseminação costuma respeitar a organização anatômica das cadeias linfonodais (de uma cadeia para a subsequente);

- comprometimento esplênico em 20% dos casos, ao qual tipicamente se sucede o comprometimento hepático e medular;

- doença extralinfonodal primária é rara.

Extenso comprometimento mediastinal no linfoma de Hodgkin (à esquerda) e metástases hepáticas (à direita).

Doenças neoplásicas

Linfoma de Hodgkin:

- à microscopia, as volumosas células de Reed-Sternberg (e suas variantes mononucleadas, células de Hodgkin) permeiam maciço infiltrado inflamatório (cenário patognomônico);

- diversos subtipos histopatológicos podem ser distinguidos (esclerosante nodular é o mais comum).

Aspecto microscópico (panorâmico, à esquerda; em maior aumento, à direita) do linfoma de Hodgkin esclerosante nodular.

Doenças neoplásicas

Linfoma difuso de grandes células B:

- neoplasia maligna derivada de células da linhagem B maduras;

- linfoma "não Hodgkin" mais comum;

- mais frequente em torno dos 60 anos;

- doença de comportamento agressivo (sobrevida variável; pode haver cura em até 50% dos casos).

Doenças neoplásicas

Linfoma difuso de grandes células B: - etiopatogênese permanece em investigação; - EBV parece associado, mas seu potencial papel é incógnito; - mutações no gene BCL6 (controle da diferenciação celular e apoptose) têm sido implicadas.

Doenças neoplásicas

Linfoma difuso de grandes células B: - comprometimento pode ser linfonodal (mais frequente) ou extralinfonodal (é o linfoma extralinfonodal mais comum); - pode haver comprometimento de cadeias linfonodais em topografias diversas (não respeita a hierarquia anatômica);

- sítios extralinfonodais mais comuns são o tubo digestório, tonsilas e baço, seguidos pelo fígado, rins, tireoide, glândulas salivares e ossos.

Aspecto macroscópico do linfoma difuso de grandes células B comprometendo o intestino grosso (à esquerda), o baço (centro) e o rim (à direita).

Doenças neoplásicas

Linfoma difuso de grandes células B: - à microscopia, proliferação de células linfoides volumosas (até 5x o tamanho de um linfócito), com imunofenótipo compatível com a linhagem B (CD19, CD20, CD22).

Aspecto microscópico do linfoma difuso de grandes células B (seta maior: célula neoplásica; seta menor: macrofagócito; cabeça de seta: linfócito)

Doenças neoplásicas

Linfoma difuso de grandes células B:

À imuno-histoquímica, marcação positiva para CD20 (típico de linfócitos B, à esquerda) e negativa para CD3 (típico de linfócitos T, à direita) são característicos do linfoma difuso de grandes células B.

Doenças neoplásicas

Linfoma de Burkitt:

- neoplasia maligna derivada de células da linhagem B maduras; - maioria crianças e jovens; - altamente agressivo, constitui o tumor de crescimento mais rápido conhecido.

Doenças neoplásicas

Linfoma de Burkitt:

- etiopatogênese associada a translocações cromossômicas envolvendo o proto-oncogene MYC e, provavelmente, infecção pelo EBV; - geralmente sítios extralinfonodais, principalmente ossos da face e vísceras abdominais; - à microscopia, células linfocitoides densamente agrupadas permeadas por macrofagócitos de citoplasma amplo (padrão em "céu estrelado"), repletos de corpos apoptóticos; mitoses são frequentes.

Aspecto macro e microscópico do linfoma de Burkitt comprometendo a mandíbula (no detalhe, macrofagócitos com "corpos tingíveis").

Doenças neoplásicas

Leucemia linfoblástica/Linfoma linfoblástico: - neoplasia maligna de células imaturas da linhagem linfoide (linfoblastos), em geral (85% dos casos) pré-linfócitos B; - se envolvimento prioritário da medula óssea, leucemia (maioria dos casos); se de tecidos linfáticos extra-medulares, linfoma; - câncer mais comum da infância; - sinônimos: leucemia linfoide/linfocítica aguda (LLA).

Doenças neoplásicas

Leucemia linfoblástica/Linfoma linfoblástico:

- em geral antes dos 5 anos, como leucemia B; na adolescência (menos frequente), como linfoma T do timo (picos fisiológicos);

- etiopatogênese pouco elucidada (diversas alterações gênicas que comprometem o desenvolvimento normal da linhagem linfoide já foram identificadas);

- associada (10% dos casos) à presença do cromossomo "Filadélfia".

Doenças neoplásicas

Leucemia linfoblástica/Linfoma linfoblástico:

- sintomas (na leucemia) associam-se à falência da hematopoese normal: fadiga (anemia), hemorragias (trombocitopenia), febre (neutropenia e infecções);

- pode haver dor óssea (infiltração periosteal), linfonodomegalias, esplenomegalia e hepatomegalia;

- curso clínico agudo (dias a poucas semanas);

- bom prognóstico na infância (˃ 2 anos), mas desfavorável no adulto.

Petéquias, gengivorragia e hematúria são possíveis manifestações da leucemia linfoblástica.

Doenças neoplásicas

Leucemia linfoblástica/Linfoma linfoblástico:

- à microscopia, proliferação de células com aspecto imaturo (blastoide) e imunofenótipo compatível com a linhagem linfoide (CD45+, TdT+); - distinção entre linhagens B e T por imunomarcadores.

Medula óssea repleta de células linfoblastoides (à esquerda), também presentes em esfregaço de sangue periférico (à direita).

Doenças neoplásicas

Leucemia linfocítica (crônica)/Linfoma linfocítico de pequenas células:

- neoplasia maligna de células maduras da linhagem B;

- se envolvimento prioritário da medula óssea, leucemia; se de tecidos linfáticos extra-medulares, linfoma;

- leucemia mais comum do adulto;

- maioria em torno dos 60 anos;

- sinônimos: leucemia linfoide/linfocítica crônica (LLC).

Doenças neoplásicas

Leucemia linfocítica (crônica)/Linfoma linfocítico de pequenas células: - etipatogênese permanece em investigação (mutações de genes implicados na proliferação de linfócitos B foram identificadas); - à microscopia, adensamentos de células linfocitoides vagamente organizadas em pseudofolículos (centros de proliferação).

Densas proliferações linfocitoides em medula óssea (à esquerda) e linfonodo (à direita), exibindo aspecto heterogêneo, com áreas empalidecidas (pseudofolículos) coalescidas de permeio.

Doenças neoplásicas

Leucemia linfocítica (crônica)/Linfoma linfocítico de pequenas células: - no sangue periférico, linfocitose com presença de "manchas de Gumprecht" (linfócitos esmagados, por sua fragilidade característica na doença).

Sangue periférico com linfocitose e manchas de Gumprecht (setas).

Doenças neoplásicas

Leucemia linfocítica (crônica)/Linfoma linfocítico de pequenas células: - a identificação do imunofenótipo (imuno-histoquímica ou citometria de fluxo) corrobora com o diagnóstico.

Imuno-histoquímica com característica expressão concomitante (aberrante) de CD5 (à esquerda) e CD20 (à direita).

Doenças neoplásicas

Leucemia linfocítica (crônica)/Linfoma linfocítico de pequenas células: - em geral assintomática ao diagnóstico (investigação motivada pela linfocitose, em média em torno de 50.000 células/ml), mas pode haver sintomas inespecíficos (fadiga, perda ponderal, inapetência); - prognóstico variável; sobrevida em média ultrapassa 5 anos.

Doenças neoplásicas

Leucemia mieloblástica:

- neoplasia maligna de células imaturas da linhagem mieloide (mieloblastos);

- múltiplos subtipos, conforme a sublinhagem comprometida e defeitos genéticos subjacentes;

- maioria após os 60 anos;

- tabagismo dobra do risco para a doença;

- sinônimos: leucemia mieloide/mielógena/mielocítica aguda (LMA).

Doenças neoplásicas

Leucemia mieloblástica:

- etiopatogênese pouco elucidada, associada a mutações em genes que regulam a diferenciação da linhagem mielocítica; - à microscopia, proliferação de células com aspecto imaturo (blastoide) e imunofenótipo compatível com células da linhagem mieloide (CD45+, TdT-).

Medula óssea repleta de células mieloblastoides (à esquerda), também presentes em esfregaço de sangue periférico (à direita).

Doenças neoplásicas

Leucemia mieloblástica:

- os sintomas relacionam-se à falência da hematopoese normal: fadiga (anemia), hemorragias (trombocitopenia), febre (neutropenia e infecções);

- curso clínico agudo (semanas);

- 60% dos casos tratados evoluem com remissão, porém, recorrências são frequentes.

Doenças neoplásicas

Leucemia mieloide (crônica):

- neoplasia maligna de células relativamente imaturas da medula, da linhagem mieloide (patamar mielocítico/metamielocítico);

- 15-20% das leucemias do adulto;

- maioria após os 40 anos;

- sinônimos: leucemia mielógena/mielocítica crônica (LMC).

Doenças neoplásicas

Leucemia mieloide (crônica):

- associada (90% dos casos) à presença do gene BCR-ABL, no cromossomo "Filadélfia" (produto de uma translocação entre os cromossomos 9 e 22); - o gene BCR-ABL associa-se a maior atividade mitogênica, insensibilidade a citocinas inibidoras do crescimento celular e resistência à apoptose.

Crom. 9

Crom. 22

Translocação

Crom. 9 alterado

Cariograma com presença do cromossomo Filadélfia.

Crom. 22 alterado (Filadélfia)

ABL
BCR
BCR-ABL

Doenças neoplásicas

Leucemia mieloide (crônica): - marcada hipercelularidade medular às custas de precursores granulocíticos é característica, com presença de micromegacariócitos; - no sangue periférico, importante leucocitose (com desvio mieloide à esquerda, mas não mais de 10% de blastos), que pode superar 100.000 células/ml.

Aspecto da medula óssea (à esquerda) e esfregaço de sangue periférico (à direita) na leucemia mieloide crônica.

Doenças neoplásicas

Leucemia mieloide (crônica):

- fase crônica marcada por hipercelularidade medular, mas sem aumento de células imaturas (blastos);

- fase blástica (após alguns anos) marcada por significativo aumento de células imaturas (blastos) na medula (assemelhandose à leucemia mieloblástica).

Doenças neoplásicas

Leucemia mieloide (crônica):

- em geral assintomática ao diagnóstico (investigação motivada pela leucocitose);

- evolução lenta (anos), com manifestações inespecíficas (fadiga, inapetência, perda ponderal);

- esplenomegalia importante é comum, associada ou não à hepatomegalia (hematopoese extramedular compensatória à substituição medular);

- pacientes jovens tendem a responder bem ao transplante (ao menos na fase crônica).

Doenças neoplásicas

Mieloma múltiplo:

- neoplasia maligna de plasmócitos (linhagem B);

- representa 15% das neoplasias hematopoéticas;

- maioria após os 60 anos;

- compromete a medula óssea em múltiplos sítios (5% das neoplasias plasmocitárias são solitárias: mielomas solitários ou plasmocitomas).

Doenças neoplásicas

Mieloma múltiplo:

- etiopatogênese parcialmente compreendida; - alterações envolvendo os genes MYC e TP53 podem ser identificadas (associam-se a pior prognóstico); - a proliferação das células neoplásicas é especialmente dependente de IL-6 (produzida pelo próprio tumor) e altos níveis séricos se associam a pior prognóstico.

Doenças neoplásicas

Mieloma múltiplo:

- sítios mais comuns: crânio, vértebras, costelas (ossos axiais), pelve, fêmur, clavícula, escápula; - neoplasia osteolítica (ativadora de osteoclastos, inibidora de osteoblastos), progride da cavidade medular aos tecidos periosteais; - a destruição óssea (hipercalcemia) promove dor e favorece fraturas patológicas.

Lesões osteolíticas à radiografia (setas), ao exame macroscópico do crânio e à dissecção da coluna vertebral, no mieloma múltiplo.

Doenças neoplásicas

Mieloma múltiplo:

- hipercelularidade medular às custas de células plasmocitoides; - presença de elevadas concentrações séricas de imunoglobulina monoclonal (mais comumente IgG) é característica;

- uma queda na produção de imunoglobulinas normais leva à debilidade humoral e favorece infecções recorrentes;

- prognóstico em geral reservado (sobrevida menor que 5 anos).

Aspirado medular exibindo múltiplas células plasmocitoides (neoplásicas); à direita, eletroforese de proteínas plasmáticas sinalizando hipergamaglobulinemia monoclonal.

Referências bibliográficas

Gerais:

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Sugestão de leitura extracurricular

Os Analectos de Confúcio (551-479 AEC)

"Estudar sem refletir é perda de tempo; refletir sem estudar é perigoso".

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