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À sombra do Dólar

Com a desvalorição do real e a alta da moeda norte-americana, é possível visualizar efeitos distintos na economia brasileira. Enquanto alguns veem uma oportunnidade para lucrar com exportações, outros sofrem com a diminuição das vendas e o aumento dos gastos

Beatriz Lima com a colaboração de Camila Costa e Lana Gillies

Asúbita alta do dólar em 2015 pegou todos de surpresa. Nem mesmo os economistas especializados no assunto conseguiram prever tal elevação. Em julho, a moeda acumulou alta de 10,16% e avança quase 29% no ano, causando diversos tipos de impacto para empresas e consumidores em geral.

Em 2014, o Federal Reserve (FED), o Banco Central dos Estados Unidos, começou a retirar gradualmente o estímulo monetário da economia do país, isto é, implantou um conjunto de medidas que, entre outros efeitos, reduziu a quantidade de moeda em circulação. Dessa forma, o dólar se valorizou, como explica o economista Gastão Balaban.

“A cotação do dólar varia da mesma maneira que o preço de qualquer produto comercializado: seguindo a lei da oferta e da procura. Quando existe dólar demais em circulação, o valor dele diminui e vice-versa. Esse modelo vale para qualquer mercado internacional e é capaz de influenciar especialmente aqueles que investem ou comercializam em moeda estrangeira”, esclarece.

Além disso, com a expansão econômica de países como o Japão e a crescente recuperação da Europa, os capitais, que estavam vindo para

países emergentes como o Brasil, começaram a ir para essas economias, o que contribui para a desvalorização do real.

Entretanto, Balaban afirma que nem todas as resultantes são negativas. Com o dólar cotado a mais de R$ 3,50, muitos brasileiros optam por utilizar produtos fabricados no Brasil e por viagens nacionais. Dessa forma, é possível gerar benefícios para a economia do país. “Para a indústria nacional, pode significar um aumento das exportações, o que ajuda o Brasil a equilibrar a balança comercial”, diz.

Em julho, a moeda acumulou alta de 10,16% e avança quase 29% no ano.

Mas, para quem já tinha as datas marcadas para sair do Brasil e o cancelamento da viagem estava fora de cogitação, foi necessário repensar alguns planos para não acabar saindo no prejuízo. A estudante Carolina Sartorio (foto abaixo) está planejando sua ida aos Estados Unidos desde o início deste ano. A carioca, que passou em um processo seletivo para trabalhar no Walt Disney World Resort, no estado da Flórida, afirma que as preocupações que ela já tinha em relação ao valor do dólar, só aumentam.

Segundo a estudante, ela terá de pagar as passagens aéreas, aluguel e alimentação e, com o salário de U$ 10 por hora, não sobrará quase nada para gastos extras com entretenimento. “Existe um período em que eu posso ficar nos EUA passeando antes de trabalhar, mas eu desisti dessa parte por conta dos gastos”, relata.

Carolina conta que já está tomando algumas medidas preventivas para não acabar ficando sem dinheiro durante a viagem. “Eu estou fazendo alguns trabalhos free lance aqui no Brasil para poder levar dinheiro e, quando eu estiver lá, pretendo fazer o máximo possível de horas extras. Fora isso, só dá para torcer para o dólar abaixar.”

Alexandre Cicconi é diretor da agência de viagens TZ em Curitiba. Apesar de afirmar que o que mais afeta o mercado do turismo é a constante oscilação do valor do dólar e não o seu aumento em si, como costuma se pensar, ele mostra-se preocupado com a diminuição nas vendas de pacotes de viagens. “O mercado se torna difícil com essa oscilação. Os brasileiros não estão mais viajando para fora, porque as agências de viagem não podem garantir que o preço feito hoje será o mesmo de amanhã”.

Cicconi afirma que, como estratégia para não ficarem no prejuízo, as companhias aéreas trabalham com um preço mais acessível de passagens. “Há alguns anos, a passagem aérea era vendida a U$ 900. Hoje, essa passagem custa U$ 320. Então, o valor da tarifa em dólar diminuiu, embora o câmbio tenha subido. Se fizermos uma análise hoje, a tarifa em reais está saindo igual ou mais barata do que ela saía antes da alta do dólar, porém, os brasileiros

A oscilação do dólar nos últimos 5 anos

Setembro 2010 R$ 1,80 Setembro 2011 R$ 1,60 Setembro 2012 R$ 2,06

têm o espírito de compra. Isso quer dizer que a tarifa pode estar baixa, mas mesmo assim ainda existe o custo da viagem que envolve a alimentação, os passeios, a compra de roupas, entre outras despesas”, relata o empresário.

O diretor da TZ viagens afirma que a agência não teve tantos prejuízos com o aumento do dólar, contudo houve uma queda considerável de vendas. Aproximadamente 85% do movimento da agência eram pacotes de viagem e passagens aéreas internacionais. Após a alta do dólar, cerca de 50% das vendas caíram em comparação a seis meses atrás. É difícil definir o que ocorrerá na economia mundial nos próximos meses, mas Gastão Balaban lista algumas das possíveis consequências caso o dólar permaneça em ascendência. “No Brasil, pode ocorrer a desaceleração da economia, aumento da inflação e, em consequência, um possível racionamento de água e energia. Já no exterior, há preocupações com a crise na Grécia e a possível elevação da taxa básica de juros nos EUA, o que geraria uma redução de fluxo de capitais no Brasil.”, finaliza.

A oscilação do dólar nos últimos 5 anos

Setembro 2013 R$ 2,24 Setembro 2014 R$ 2,25 Setembro 2015 R$ 3,45

E o euro?

Com a desvalorização do real, Mariana Benevides (foto abaixo), estudante fluminense que está fazendo intercâmbio na Espanha, aumentou suas preocupações com a contenção de gastos. Apesar de utilizar o euro como moeda, a alta do dólar também tem afetado diretamente sua vida no país em que vive.

Antes mesmo de embarcar, Mariana foi aconselhada a trocar o máximo possível de reais por euro, já que uma crise era esperada. Quando chegou à cidade de Vic, no início deste ano, a cotação do euro estava pouco acima de R$ 3. Hoje, apenas alguns meses à frente, o valor da moeda europeia está quatro vezes maior do que o real. “A valorização do dólar e do euro afeta não só meu lazer, mas principalmente coisas como o meu aluguel e o supermercado. Agora fico aqui na torcida para [o euro] não chegar a R$ 5, porque eu não tenho nem passagem de volta comprada ainda”, relata a estudante.

Cautelosa, a brasileira vem juntando um pouco de dinheiro todo mês para se prevenir de outras eventuais desvalorizações do real, o que dificultaria ainda mais o envio de dinheiro por seus pais. Segundo ela, a mesma técnica de economizar previamente foi utilizada para seu mochilão. “Eu já havia juntado grande parte do dinheiro para o meu mochilão quando estava no Brasil, mas se não fosse por isso, acredito que não conseguiria fazer metade da rota de países que percorri”, confessa a intercambista.

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