
7 minute read
Compartilhando sonhos
Em Curitiba, trës atletas dividem o apartamento, os anseios e a vontade de vencer no esporte e na vida.
Texto: Eduardo Souza, Jaderson Policante, Leonardo Siqueira e Marcio Galan Fotos: Eduardo Souza
ECuritiba, três amigos dividem um apartamento no bairro Boa Vista. Até aí, nada fora do comum. No entanto, um deles é hexacampeão paranaense e bicampeão brasileiro de futebol americano; outro é um lutador experiente de Mixal Martial Art (MMA), vencedor da primeira edição do The Ultimate Fighter Brasil (TUF Brasil) e tem contrato com o Ultimate Fighting Championship (UFC); e o terceiro é uma revelação do MMA oriundo de Minas Gerais, com alguns títulos em seu currículo.
Henrique Timóteo de Loiola Pucca, 26 anos, é natural de Curitiba, mas a família é de Londrina. Pucca nasceu em Curitiba, mas logo pequeno voltou a morar em Londrina. Lá, praticava vários esportes, dentre eles o hipismo. Henrique foi campeão paranaense com 11 anos, mas um revés financeiro fez com que o esporte, de alto custo, tivesse que ser deixado de lado. “Infelizmente, a empresa do meu pai quebrou, e eu fui forçado a partir pra outra.” A escolha, ainda em Londrina, já foi por um esporte jogado com a bola na mão, o handebol.
Retornando a Curitiba, Henrique entrou em um colégio que não tinha handebol , e, assistindo a uma partida de futebol americano, tomou conhecimento de um time local. “O pessoal da transmissão mandou um abraço para o Barigui Crocodiles (nome do Coritiba Crocodiles em 2006), dei uma pesquisada e fui treinar no sábado. No outro final de semana, já estava jogando.”
Ao lado, Pucca com a camisa de um dos vários títulos pelo Crocodiles. Abaixo, com a camisa 67, em ação por mais uma partida.


Pucca
sempre sonhou em representar o seu país de alguma maneira e guarda com orgulho a camisa da seleção brasileira de futebol americano.
O futebol americano cresceu muito no Brasil. Pucca lembra que, no começo, as coisas eram difíceis, principalmente pelo alto custo dos equipamentos. “Na época ainda era off-pads (box à direita), né? Logo no meu primeiro jogo, teve gente que quebrou o nariz, teve convulsão em campo”.
As dificuldades financeiras podem ser consideradas um dos maiores obstáculos para os atletas de futebol americano, ou para qualquer praticante de esportes amadores no Brasil. Tanto no começo, com o alto custo dos equipamentos, como tratamento de lesões devido à prática do esporte, e, atualmente, com a expansão do esporte pelo Brasil, o custo das viagens para os jogos são bancados pelos próprios jogadores.
Geralmente o dinheiro dá, economizando um pouco aqui e ali. Mas, em sua última convocação para a seleção brasileira, para a disputa por uma vaga no campeonato mundial, não teve jeito: Pucca teve que pedir aos amigos, e até fazer um empréstimo. “Fiz um financiamento no banco, de R$ 3 mil. Parcelei em 16 vezes. O complicado dessa história é que eu trabalho no banco, eu não posso ter nome sujo nem cheque devolvido. Então, se eu atrasar uma parcela, eu estou na rua”, relembra rindo. Pucca é formado em Direito e trabalha em uma grande rede de bancos. Mesmo assim, ainda é difícil aliar os custos da vida pessoal com a do futebol americano. Quando os seus pais decidiram voltar para Londrina, Henrique decidiu ficar em Curitiba e teve que ir morar sozinho. Na academia em que malhava, patrocinadora do Coritiba Crocodiles, conheceu Arthur, que tinha chegado de Minas Gerais há pouco tempo, e ainda não tinha lugar fixo para morar. Os dois viraram amigos e, ambos sem lugar para ficar, decidiram alugar um apartamento e dividir os custos.
Off-pads
Off-pads é como os jogadores chamam a época em que se jogava sem os equipamentos de segurança. Pads são as ombreiras de proteção usadas pelos jogadores, e, atualmente, indispensáveis em qualquer partida oficial no Brasil.


Arthur Vieira
Arthur Vieira, 23 anos, é natural de Boa Esperança, Minas Gerais. Começou cedo no mundo das lutas: aos 10 anos, ingressou no jiu-jitsu e, a partir dai, as conquistas vieram. Títulos brasileiros em algumas categorias e uma participação no Pan-Americano, em Brasília, alavancaram a sua carreira, e os convites para lutar no octógono começaram a chegar. Aos 20 anos, aconteceu sua estreia no MMA no evento Jaula Fight em Minas Gerais, conquistando o cinturão. Com o destaque, surgiu a oportunidade de vir para Curitiba treinar com o mestre André Dida, que já treinou com grandes nomes do MMA brasileiro, como Shogun Rua e Wanderlei Silva.
Contudo, uma difícil decisão teve de ser tomada. Arthur estava no segundo ano da faculdade de Educação Física em Minas Gerais e não seria possível conciliar Acima, Mestre Dida supervisiona e da dicas durante os treinos na Evolução Thai. Ao lado, Arthur Vieira durante os treinos.

Pride
O Pride Fighting Championships, popularmente conhecido como Pride, foi um evento de MMA realizado no Japão nos anos 90.

Ao lado, Arthur Vieira (esq.) e Rony Jason (dir.) durante treino na Evolução Thai.
os treinos e o estudo na capital paranaense. E, em maio de 2013, Arthur resolveu deixar tudo para trás e correr atrás de seu sonho. E foi treinando na Evolução Thai, com o professor Dida, que ele conheceu Rony Jason.
Rony Jason
Rony Mariano Bezerra de Lima, 31 anos, é natural de Quixadá, no Ceará. Jason é faixa preta de jiu-jitsu e pratica sua especialidade desde os 15 anos de idade. O cartel (seu retrospecto) é de dar inveja: de 110 lutas, são 106 vitórias. O apelido também vem da mesma época, em referencia a um lutador dos tempos do Pride (ver box à esquerda). “O Sakuraba sempre entrava de uma maneira divertida nas lutas dele. E, na final de um campeonato estadual, incorporei a brincadeira, comprei uma máscara do Jason (assassino da série de filmes Sexta-feira 13), ganhei o campeonato e nunca mais larguei a máscara.”
Rony conta que seu começo no mundo do MMA se deu por acaso. “Eu não cheguei (ao MMA), eu fui empurrado. Cai de paraquedas”, comenta aos risos. Em 2006, com a lesão de um colega, Jason fez sua estreia como profissional contra o lutador Alessandro Cabeça. E mesmo com apenas duas semanas de preparação, venceu seu oponente por nocaute técnico no segundo round. Mas foi só em 2012 que o reconhecimento chegou.
Jason foi um dos 32 escolhidos para participar da primeira edição do TUF Brasil e, em 23 de junho de 2012, fez a final da categoria dos pesos penas (de 62 a 66 kg) contra Godofredo Pepey no UFC 147. Como premiação, Rony assinou um contrato de seis lutas com a franquia. Nas primeiras cinco lutas foram três vitórias e duas derrotas, e foi na preparação para a última luta (realizada no dia 30 de maio de 2015, com vitória de Rony Jason), que surgiu
o convite do mestre Dida para vir a Curitiba. “Coincidentemente um dos meus treinadores no TUF, foi o André Dida. Criamos um vínculo de amizade que cresceu com o passar do tempo e decidi fazer minha preparação aqui.”
Rony ainda relata que alguns fatores, além da amizade com o treinador, pesaram na decisão de vir para a capital paranaense, mas que o principal deles foi de “sair da área de conforto” que ele tinha em Natal. “Lá, eu tenho meu apartamento, meu carro, tenho uma certa estabilidade, mas eu me sentia saturado. Esse brilho no olhar que o Arthur (Vieira) tem na hora de ir treinar, eu não tinha mais.”
Curitiba se tornou para Jason não só um novo local para treinar, mas também serviu como fonte de renovação pelo amor que ele sente pelo esporte. “Eu vim pra tomar tapa na cara mesmo, andar a pé, treinar três, quatro períodos por dia. Não vou dizer que passo necessidade, mas as coisas têm sido um pouco mais desafiadoras. Ainda mais com o frio que faz aqui”, conclui o lutador.
Ao lado, Rony Jason traz na pele as lembranças da vitória no TUF Brasil e o desenho da inspiração para o seu apelido. Abaixo, mesmo longe de casa, Jason con-
serva sua paixão pelo Fortaleza, seu time do coração.

