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Câmara de curitiba recebe projetos bizarros
by eba_pucpr
Câmara de Curitiba

recebe projetos bizarros



A visibilidade nos meios de comunicação, com o objetivo de obter votos, induz políticos a inventar e multiplicar projetos de lei, mesmo se desnecessários, segundo a opinião pública.

Por Mário Spaki

“Nada mais me surpreende na políti-
ca brasileira.” - Jean Lima, Agência de Marketing Político
as últimas semanas, a Câmara Municipal da Capital Paranaense tem sido palco de apresentações de ideias inusitadas. Uma delas é do vereador Chico do Uberaba (PMN), que prevê a realização de velórios virtuais, que funcionariam por um sistema de transmissão de imagem do velório via internet. Outra, que propõe o sepultamento de animais de estimação junto a seus donos, em cemitérios públicos da cidade, é do vereador Professor Galdino (PSDB). Num tempo em que a tecnologia digital é responsável por grandes transformações da sociedade e o virtual se entrelaça com o real no cotidiano das pessoas, por que não, nas ondas do processo da digitalização, propiciar a quem está distante, acompanhar o velório de um ente querido através da internet? O vereador Chico do Uberaba afirma que a ideia não é fruto de um insight, mas que
Ntomou conhecimento “no contato com amigos de outros lugares, como Estados Unidos e Japão”. E acrescenta: “Procurei descobrir como funciona nesses lugares e lancei o projeto”. Mas o vereador não esperava que essa ideia encontraria tanto receptividade em vários veículos de comunicação que a noticiaram e procuraram saber o que o povo pensa através de enquetes. A opinião pública sensibilizada pela onda das manifestações de junho do ano passado, que pediam melhorias na área da Saúde, Educação e Segurança, rechaçou por completo a proposta. Comprovam isso os inúmeros comentários que inundaram as redes sociais fazendo com que o fato local repercutisse em outras regiões. Quanto à apresentação de projetos nas áreas da Saúde, Educação e Segurança, Chico do Uberaba enfatiza o fato de tê-los sempre realizado, “mas quando se lança um projeto diferente há pessoas que são a favor e outras que criticam e não medem os seus comentários, fazendo críticas destrutivas”.

“Há pessoas que são a favor e outras que criticam e não medem os seus comentários.” - Chico do Uberaba (PMN), vereador
Cão, o melhor amigo do homem
Professor Galdino também se diz promotor de projetos sociais que visam à Saúde, Educação e Segurança. Mas ele se tornou mais conhecido pela proposta de enterrar animais em cemitérios humanos. “A ideia veio de São Paulo, onde um projeto com tal teor foi aprovado na Câmara Municipal, e também

“Quando ocorre o falecimento de um animal muito amado, há dificuldades para se dar o encaminhamento respeitoso.” - Professor Galdino (PSDB), vereador.
da demanda de cidadãos que reivindicam o direito de sepultar seus animais de estimação consigo”, ressalta Galdino.
Se as novas tecnologias se caracterizam como tendência nos dias de hoje, o mesmo se deve dizer a respeito do cuidado e respeito com os animais. Esse é o foco de Galdino: “Quando ocorre o falecimento de um animal muito amado, há dificuldades para se dar o encaminhamento respeitoso ao cadáver. Os cemitérios e crematórios particulares existentes cobram altas taxas, o que inviabiliza que pessoas com menos recursos financeiros possam dar um bom encaminhamento ao animal falecido.”
Então a sua sugestão é enterrar os animais junto a pessoas das quais eles foram amigos. Mas isso carece de uma legislação. Na qualidade de representante do povo, o vereador entende ser “importante respaldar legalmente tal possibilidade, beneficiando o elo de amor entre seres humanos e não humanos, estreitando cada vez mais os laços entre todos os seres”.
Nenhum dos dois projetos conseguiu adesão na Câmara e nem mesmo pela população. Acabaram por gerar um má impressão da imagem dos parlamentares por um determinado tempo.
Os dois casos referidos acima se inserem em um momento em que a população brasileira está desacreditada com a política, sensível às questões sociais e indignadas com o desperdício dos recursos públicos. Para Guilherme de Mello Simão, estudante de Filosofia na Pontifícia Universidade Católica de Curitiba (PUCPR), “a sociedade civil organizada precisa promover a educação política e cidadã do povo, para quem esse indo além do voto, acompanhe o mandato de seus representantes”.
Comentário profissional
Jean Lima, sócio-proprietário da agência de comunicação W3ol, ressaltou que “já faz parte do folclore da política do país, a existência de parlamentares desqualificados para o exercício da função”. Lima comparou a política com telenovela: “O que a TV mostrou há muito tempo (1973) na novela O Bem Amado, de Dias Gomes, com o divertido prefeito Odorico Paraguaçu, criativo, safado, cheio de artimanhas e neologismos para se promover junto ao eleitorado de Sucupira, se repete ainda hoje com Tiriricas e Galdinos”.
“Tenho a impressão que vários vereadores, mais do que buscar seriamente o bem comum, ser esforçam por ser criativos e assim permanecer debaixo dos holofotes e em alta nos meios de comunicação. Desse modo, eles garantem
o querem: a reeleição. O povo? Que se dane!”, desabafou Márcia Tucunduva, assistente administrativo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
No Brasil, tornar-se político, significa aceitar ser catalogado pelas pessoas, muitas vezes, de imediato, como corrupto. Muitos cidadãos de índole correta não estariam se distanciando da política devido a isso? O fato é que os políticos são funcionários públicos, representantes do povo num país democrático e se espera deles coerência. E isso o povo quer.
Projetos inusitados como os que foram apresentados na Câmara Municipal de Curitiba extrapolam o cotidiano do universo político e, quem sabe, podem, devido à indignação, instigar o povo a se aproximar da política, pois é grande o desinteresse, segundo Lima: “É só você mesmo tentar saber de qualquer eleitor o nome de pelo menos dez vereadores da cidade. De quantos vereadores temos na Câmara e do que realmente eles debatem na casa legislativa. Eu mesmo tenho dificuldade para associar aos vereadores que conheço quais são os projetos relevantes que eles estão debatendo para a cidade. Isso explicita o enorme abismo existente entre a classe política e o eleitorado”.
Parece sintomático que ambos os projetos apresentados falem de morte, enquanto que a população pede vida.
Outros projetos inusitados da Câmara de Curitiba (a maioria, arquivados) nos últimos anos
- Proibir o uso de minissaias e shorts durante a quaresma.
- Proibir que policiais e guardas municipais e suas viaturas sejam fotografados, principalmente, se eles ficarem em segundo plano na foto.
- Obrigar motéis a colocarem duas camisinhas, uma embaixo de cada travesseiro, para estimular o uso de preservativos.
- Autorizar o uso de pilchas em estabelecimentos públicos, visto que os gaúchos participaram da colonização do Paraná, sem que o usuário seja constrangido por isso.
- Proibir que cachorros sejam amarrados em hidrantes, postes de luz ou árvores.
- Construir um monumento turístico para Curitiba se equiparar a outras capitais mundiais, como a Torre Eiffel e a Estátua da Liberdade.