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David Diesendruck

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Jacques Fux

Jacques Fux

ISRAEL NÃO É UM PAÍS IMAGINÁRIO

A atividade do Instituto Brasil-Israel

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Novas pautas surgiram, tais como a desigualdade social, o empoderamento feminino, o racismo, a diversidade de gênero, a sustentabilidade, e estas passaram a ocupar um espaço maior nos corações e mentes de nossos jovens.

David Diesendruck

Judaísmo, Israel e ativismo comunitário sempre estiveram presentes na vida de minha família. Meu avô, o rabino Menahem Diesendruck z”l, foi um sionista fervoroso. Em Lisboa, durante a Segunda Guerra Mundial, além da lideranca espiritual, ocupou o cargo de presidente da Organização Sionista e trabalhou intensamente no auxílio aos refugiados que buscavam imigrar a Israel. No Brasil, também seguiu inspirando sua comunidade a desenvolver maiores vínculos com o Estado judeu, tendo sido um dos idealizadores do movimento juvenil Netsach. Meu pai trilhou um caminho semelhante, assumindo a presidência da Casa de Cultura de Israel, e participando da diretoria da A Hebraica, Macabi e de outras entidades comunitárias. Em 2004, meus pais fizeram aliá, passando a morar na cidade de Netanya, e juntando-se aos meus irmãos e suas famílias, que vivem em Israel há mais de 30 anos. Com esse histórico, mantive a tradição, atuando em Movimento e Conselho Juvenil, Federação Israelita do Estado de São Paulo e em outras instituições.

Entretanto, observo através de meus filhos que o momento atual demanda novas narrativas. Apesar da educação em escola judaica, da vivência dos costumes judaicos em casa e das viagens anuais a Israel, noto que a relação com o judaísmo, com o sionismo e com o ativismo comunitário é outra. Novas pautas surgiram, tais como a desigualdade social, o empoderamento feminino, o racismo, a diversidade de gênero, a sustentabilidade, e estas passaram a ocupar um espaço maior nos corações e mentes de nossos jovens. A atual sensação de segurança do povo judeu, que depois da criação do Estado de Israel passou a usufruir de uma dignidade que jamais possuiu, somada à narrativa sionista convencional

O IBI promove viagens para dialogar sobre a situação atual com israelenses e palestinos.

que fala “de dentro para dentro”, sem buscar uma intersecção com outras comunidades e grupos discriminados, parece mais afastar do que atrair.

A perspectiva exclusivista que apresenta os judeus como o povo mais perseguido entre todos, inclusive por meio da memória da Shoá, e as poucas iniciativas em conjunto com pessoas e grupos em situação de maior vulnerabilidade no Brasil fortalecem este sentimento de indiferença com o sofrimento alheio. O apoio de membros da comunidade judaica e representantes do Estado de Israel a lideranças nacionais com discurso xenófobo e racista contribuíram para esta percepção.

Além disso, temos arraigada em parte de nossa comunidade a ideia de que, quando abordamos temáticas relacionadas a Israel com um pensamento crítico, evidenciando a complexidade de sua história e os desafios de seu governo e de sua sociedade civil, fortalecemos os inimigos. Aqueles que o fazem são considerados “self-hating jews” ou traidores. Deixa-se de ser alguém com uma opinião diferente. Passa-se a ser um inimigo passível, inclusive, de agressões dos mais diversos tipos. São assustadoras as situações de ódio gratuito que presenciamos entre judeus no Brasil.

Inversamente, como parte do mesmo processo, todos aqueles que se declaram amigos de Israel são automaticamente elevados à categoria de amigos dos judeus e, portanto, devem ser isentos de críticas. Os eventos nos EUA que culminaram na invasão do Capitólio evidenciaram esta contradição, uma vez que bandeiras de Israel e slogans antisemitas faziam igualmente parte da simbologia usada pelos manifestantes.

Mais especificamente sobre Israel, os materiais e narrativas que encontramos nas instituições judaicas de educação formal ou não formal raramente trazem a perspectiva “do outro lado”. Ainda encontramos muitos manuais de respostas prontas para perguntas pré-formuladas. Quase não há questionamento. Nas viagens de jovens judeus a Israel, não há encontros com jovens palestinos na Cisjordânia. Ou seja, apesar de contarem com ampla formação comunitá-

Atividade do IBI com jovens de movimentos juvenis.

ria, esses judeus são surpreendidos ao chegarem nas universidades e escutarem narrativas que jamais escutaram. Sentindo-se traídos, alguns abandonam o tema, enquanto outros acabam aderindo a movimentos de boicote.

Essa construção enviesada consolida o que costumamos chamar de um “Israel Imaginário”, um lugar excepcional, para o bem ou para o mal, que parece não possuir características que fazem dele um país normal.

Esse “Israel Imaginário” é concebido tanto por alguns daqueles que são considerados “amigos”, como por alguns daqueles que são considerados “inimigos”, dentro de sua conveniência e interesses geopolíticos ou ideológicos. Pelos dois extremos, Israel é visto como como um país conservador, religioso e militarizado. Enquanto uns acham isso bom, entendendo Israel como um polo avançado do Ocidente no Oriente Médio, que opera como barreira de contenção frente ao avanço do islamismo, outros acham isso ruim, entendendo Israel como um país imperialista e colonizador de terras que não lhe pertencem.

Ambas as versões desumanizam Israel. Não levam em conta a complexidade de sua sociedade civil. Simplificam o debate. Leva-o para os extremos, polarizando e inviabilizando a conversa. A outra consequência é o afastamento de um capital humano valiosíssimo do seio comunitário, que não encontra espaço para falar sobre Israel apesar de tê-lo presente na sua formação identitária.

É neste contexto de pautas mais inclusivas, do olhar para o outro, da valorização da escuta e do diálogo sobre Israel e sionismo que o Instituto Brasil-Israel - IBI nasceu e vem atuando.

Nossa missão é combater a visão preconceituosa e excepcionalizante sobre os judeus e Israel no Brasil, manifestada independentemente de corrente ideológica, dentro e fora da comunidade judaica.

Temos como públicos prioritários os formadores de opinião, alunos, professores e lideranças das universidades e a imprensa. Mas também atuamos junto a lideranças comunitárias, grupos jovens e a sociedade civil brasileira.

Os nossos pilares de atuação são: • Formação: Cursos, viagens, palestras, laboratórios, grupos de estudos e seminários, independentes e em parceria com instituições de formação. • Produção de conteúdo: Desenvolvimento de pesquisas científicas para o público acadêmico, além da publica-

ção de livros. E produção de materiais jornalísticos para o público geral em mídias sociais (podcast, vídeos, site, lives), com divulgação na imprensa. • Diálogo: Promoção e enriquecimento do diálogo com grupos discriminados da sociedade civil brasileira e contato com a mídia, influenciadores e stakeholders estratégicos.

• Acolhimento construído em rede

(ativismo): Estimulando a criação de comunidades e espaços de representatividade para identidades judaicas diversas.

• Combate ao antissemitismo

Para cada um destes pilares atuamos com acolhimento, inclusão e diálogo com as vozes discordantes, buscando manter sempre uma linguagem criativa, sem renunciar à qualidade da mensagem.

O impacto de nossas iniciativas tem sido estimulante. E não faltaram atividades em 2021. Alguns destaques: • O IBI no Campus, projeto nacional e online de estudo e pesquisa acadêmica sobre judaísmo, sionismo, Israel e Palestina, contou com a participação de 140 estudantes de 54 universidades de 14 estados brasileiros. • O Projeto Imaginários, realizado em parceria com a União do Judaísmo Reformista – UJR e com o apoio da Fundação Gênesis, levou discussões sobre o conflito entre israelenses e palestinos a escolas de ensino médio de todo o país. • Ainda na área de formação, para aqueles que preferiram seguir os estudos no seu próprio ritmo, disponibilizamos o curso online “Precisamos falar sobre Israel e Palestina”. • Tivemos também uma presença impactante na imprensa e na TV. Foram dezenas de entrevistas, artigos e notas sobre temas como o conflito entre israelenses e palestinos, o sucesso da campanha de vacinação em Israel, as eleições locais, antissemitismo e os usos da simbologia judaica e sionista no Brasil. • Fomos destaque em jornais e revistas nacionais e internacionais, como Folha de S. Paulo, Estadão, O Globo, Valor Econômico, El País, Piauí, Nexo, UOL, Poder 360, Metrópoles, Antagonista, The Intercept Brasil, Jota, Haaretz, Le Monde. E em vários canais de televisão: Globo, Band, Cultura, GloboNews, CNN Brasil, além das rá-

Esse “Israel Imaginário” dios CBN, BandNews e Jovem Pan. é concebido tanto por • Também produzimos dezenas de alguns daqueles que são webinars e lives, que vieram junto com a oportunidade de se discutir com mais considerados “amigos”, apuro a complexidade de temas como o como por alguns daqueles entrelaçamento do antissemitismo com que são considerados o racismo, o lugar de fala da mulher no

“inimigos”, dentro de sua conveniência e conflito israelense-palestino e a discriminação contra a diversidade sexual, entre outros. Fernando Haddad, Henrique Cyinteresses geopolíticos merman, Lilia Schwarcz, e Thiago Ampaou ideológicos. ro foram alguns dos participantes, ao lado de uma seleção de acadêmicos, jornalistas e especialistas, em parcerias estratégicas com instituições como a Universidade Zumbi dos Palmares. • Lançamos três livros: Israel e Palestina: um ativista em busca da paz, do negociador israelense Gershon Baskin, com prefácio do psicanalista Christian Dunker; Conflitos e religiosidades: Israel, Palestina e estudos judaicos no Brasil, reunindo artigos de pesquisadores do IBI no Campus; e Antissemitismo: uma presença atual, de Francisco Carlos Teixeira da Silva e Karl Schurster. • Nosso podcast “E eu com isso?” alcançou a marca de 146 episódios e ultrapassou as 70 mil reproduções, entrando na lista dos 50+ do Spotify. • Já o GA’AVAH, coletivo judaico LGBTQIA+ do IBI, trouxe visibilidade sobre a temática em Israel e na comunidade judaica brasileira, através de materiais, cursos, seminários e eventos. • 2021 foi também o ano do início de uma parceria com a Quatro Cinco Um, a revista literária de maior alcance no Brasil. Apoiamos a criação de uma seção fixa de literatura israelense, que apresentou textos cobrindo um arco que foi do humor, em ensaio assinado por Gregório Duvivier, à investigação dos sonhos de israelenses e palestinos em áreas deflagradas pelo conflito, passando pelos diários de Kafka e muito mais. • O IBI também criou uma programação em parceria com a Festa Literária Internacional de Paraty – FLIP, com a série Diálogos Literários Brasil-Israel, contando com a participação dos israelenses Amos Gitai, Gershon Baskin e Orly Castel-Bloom, e dos brasileiros Flávia de Castro, Luiz Eduardo Soares e Mel Duarte. • E seguimos apoiando o Centro de Estudos Judaicos da USP, de forma que possa permanecer realizando

Semanalmente, cerca de 30 jovens de diversas universidades se reúnem virtualmente no grupo IBI no Campus para debater sobre Israel.

congressos, palestras, grupos de estudo e publicações. O destaque no ano passado foi a realização do Congresso Nacional de Pesquisadores de Estudos Judaicos, com 18 mesas de debate e 86 palestrantes, em mais de 30 horas de programação.

Nesta nossa jornada o aprendizado é constante. O alinhamento e a integração entre equipe voluntária e profissional é fundamental e buscamos este objetivo com determinação. Um trabalho que demanda convicção, coerência e consistência.

Para finalizar, importante reforçar que notamos situações em que reações precipitadas ou emotivas contra supostos ataques antissemitas ou antissionistas acabam transformando em inimigos pessoas ou organizações que fizeram colocações mais por ignorância do que por preconceito. Procuramos em primeiro lugar a veracidade da informação e, na sequência, a busca do diálogo. Com instituições, nossa estratégia tem sido a de encontrar parceiros, pois sabemos que elas não são homogêneas e herméticas. Assim, em vez de criar tensões desnecessárias entre a comunidade judaica e a imprensa, as universidades ou os partidos políticos, atuamos ao lado de quem compartilha os valores da democracia.

Este caminho, na maioria das vezes, tem se provado transformador para construção de pontes. Como nos inspirou o filósofo israelense Micah Goodman: “Precisamos passar do julgamento para a curiosidade. Isso não significa concordar ou aceitar”

Em vez de criar tensões desnecessárias entre a comunidade judaica e a imprensa, as universidades ou os partidos políticos, atuamos ao lado de quem compartilha os valores da democracia.

Agradeço a oportunidade de poder compartilhar um pouco do nosso trabalho nesta revista tão qualificada a uma comunidade da relevância da ARI. Fica o convite para você, leitor, acompanhar e participar do IBI. Siga nossas redes sociais e cadastre-se para receber nosso newsletter semanal através do e-mail contato@institutobrasilisrael.org David Diesendruck é Presidente do Instituto Brasil-Israel-IBI, empresário e CEO da Redibra – Agência de Licenciamento e Extensão de Marcas. Membro do Conselho da Licensing International, Fundação Abrinq, Hospital Albert Einstein e Diretor da Fisesp.

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