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Rabino Stephen Lewis Fuchs
uma perspectiva progressista para tisha Be’av
rabino stephen lewis fuchs
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Onono dia do mês hebraico de Av, Tisha Be’av, é um dia no qual os judeus que seguem a tradição mais antiga jejuam lembrandose dos magníficos Templos de Jerusalém, que foram destruídos em primeiro lugar pelos babilônios em 586 aec e posteriormente pelos romanos em 70 dec.
Esse dia também é solene em memória a outras tragédias históricas associadas a essa data. Por exemplo, dizse que o início da primeira Cruzada em 1095, uma época de perseguição e massacre de judeus na Europa, e a expulsão dos judeus da Inglaterra em 1290 ocorreram nessa mesma data. Tisha Be’av também coincide com a expulsão dos judeus da Espanha em 1492 e com o início da Primeira Guerra Mundial em 1914.
As lembranças deste dia de tragédias não costumam ocupar um lugar de destaque na consciência da maioria dos judeus não ortodoxos e isso levanta a questão: como os judeus progressistas de hoje devem tratar Tisha Be’av?
Por um lado, a destruição dos dois Templos e o posterior exílio dos judeus da nossa terra sagrada foram ocasiões que acarretaram enormes sofrimentos e muita tristeza. O mesmo é verdadeiro para as outras tragédias históricas associadas a essa data. Nada disso pode ser esquecido jamais.
Mas, por outro lado, a centralidade do Templo na vida judaica acabou abruptamente com a sua destruição e haveria pouco mérito em reviver na atualidade as suas tradições. Grande parte da relevância do Templo girava em torApesar de ter sido uma tragédia horrível em sua época, a destruição do Segundo Templo libertou o judaísmo e transformou-o no que significa para nós hoje: uma religião baseada no estudo da Torá, oração e atos de bondade e compaixão. Uma religião e uma forma de vida que estão profundamente presentes em tudo que fazemos.
< gravura de gustav Dore, de 1870, mostra a reconstrução do Templo de Jerusalém.
no do papel que este desempenhava como o lugar do sacrifício de animais, que era um sinal de arrependimento, gratidão e celebração.
Depois da destruição e dispersão, o povo judeu encontrou outras maneiras de realizar seus cultos religiosos nas sinagogas e nos lares. Os rabinos emergiram da comunidade no lugar dos sacerdotes e nossas práticas pósTemplo atenderam bem às nossas necessidades em todos os lugares onde fomos pelo mundo.
Assim, não conheço nenhum judeu progressista que deseje ver o Templo reconstruído com a volta dos sacrifícios de animais e devolver o controle da vida judaica às mãos de uma classe sacerdotal hereditária.
Memória reconciliada
A conclusão é que, apesar de ter sido uma tragédia horrível em sua época, a destruição do Segundo Templo libertou o judaísmo e transformouo no que significa para nós hoje: uma religião baseada no estudo da Torá, oração e atos de bondade e compaixão. Uma religião e uma forma de vida que estão profundamente presentes em tudo que fazemos.
A própria vibração e força do povo judeu ao longo dos séculos atesta a sabedoria daquilo em que nos tornamos. Pode parecer esdrúxulo, mas nesse sentido Tisha Be’av, especialmente na era de uma nação judaica renovada em Medinat Israel, pode ser visto tanto como uma ocasião de esperança e otimismo quanto como de lembrança e tristeza.
Depende de nós reconciliarmos a memória de uma grande tragédia com o potencial de crescimento e de desenvolvimento do judaísmo que nos foi transmitido.
Nesse contexto, guardo o jejum em Tisha Be’av até o meio do dia. Durante esse período, estudo o texto tradicional do dia, o livro bíblico das Lamentações. Às treze horas participo de um almoço, agradecendo pelo judaísmo que nos foi passado ao longo dos anos, um judaísmo que já não sacrifica animais, nem asperge seu sangue como sinal de agradecimento ou de súplica a Deus.
Celebro o fato do judaísmo baseado no Templo e a classe hereditária dos sacerdotes terem sido substituídos por um judaísmo ao qual todos temos acesso e no qual nos encontramos imersos, aprendendo as lições que nosso povo colheu ao longo dos séculos: que cada um de nós use os seus talentos individuais segundo a sua própria e justa medida para tornar este mundo um lugar melhor.
Para mim, Tisha Be’av é também o dia em que começo a me preparar para o período de introspecção que culminará com os rituais de Rosh Hashaná e de Iom Kipur. A motivação para iniciar o processo de arrependimento surge do meio do livro das Lamentações. “Procuremos examinar nossos caminhos e retornar para o Eterno!” (Lamentações 3:40).
Para os judeus progressistas, portanto, Tisha Be’av pode ser tanto um dia de luto quanto um dia de alegria. Lamentamos a destruição do Templo, mas nos deleitamos por termos criado meios fortes e resilientes de sobreviver como judeus. Lamentando as tragédias do passado começamos a buscar e examinar o caminho a trilhar, enfrentando o futuro com esperança e coragem.
O Rabino Stephen Lewis Fuchs é ex-presidente da WUPJ – União Mundial pelo Judaísmo Progressista.
Traduzido do inglês por Beatriz Torres, intérprete de conferências e tradutora. Membro da Associação Internacional de Intérpretes de Conferência, da Associação Profissional de Intérpretes de Conferência e do Sintra – Sindicato Nacional de Tradutores.
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