Publicação semestral do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Pará – nº7
Água para produzir, Cobrança para preservar
Vem aí a Semana Rio Pará 2025 Pelo 3º ano, Comitê promove extensa programação de eventos, debates e integração

Projeto de Mapeamento da Navegabilidade avança com oficinas participativas Págs. 4 e 5
Entrevista: Mauro Cruz e o regime de chuvas em tempos de emergência climática Págs. 8 e 9
Conheça o Museu Sagarana, em Itaguara Págs. 10 e 11
EDITORIAL
O trabalho de um Comitê de Bacia Hidrográfica, em grande medida, é atuar sobre os muitos desafios que temos na gestão descentralizada e participativa dos recursos hídricos.
Dentre os nossos muitos desafios atuais, um particularmente tem exigido atenção especial, não somente do CBH do Rio Pará, mas do sistema de gerenciamento de recursos hídricos como um todo: a inadimplência no pagamento da cobrança pelo uso da água entre os usuários outorgados.
A cobrança é um instrumento que visa dar ao usuário – aquele que capta o recurso hídrico direto das águas superficiais ou subterrâneas – uma indicação de seu real valor, estimulando a economia de água. Os recursos financeiros arrecadados com a cobrança são destinados aos Comitês de Bacias para o desenvolvimento de programas e ações de recuperação hidroambiental.
Apesar dos claros benefícios que a cobrança traz à sociedade como um todo, inclusive aos próprios usuários, que passam a contar com maior oferta de água em melhor qualidade, a inadimplência tem registrado índices preocupantes, na casa dos 70% entre os outorgados, que gera um impacto de 36% dos recursos financeiros destinados ao CBH do Rio Pará. Essa situação nos preocupa e motiva a buscar uma solução para mudar essa rota.
Pensando nisso, a Semana Rio Pará 2025, que será realizada pela terceira vez consecutiva na primeira quinzena de maio, contará com uma ampla programação de eventos, debates e atividades de integração. O tema principal será a cobrança pelo uso da água na bacia do Rio Pará. Uma das ações da Semana será justamente reunir usuários, Comitê, poder público, entidades de representação e outros atores estratégicos para coletivamente buscar formas de solucionar a problemática da inadimplência e, cada vez mais, legitimar a cobrança enquanto ferramenta de recuperação de rios.
Tudo isso para que não sejam comprometidos os nossos muitos projetos e ações conservacionistas ao longo da bacia. Como o Programa de Saneamento Rural, que vai aplicar cerca de R$ 2,5 milhões em sua primeira edição para beneficiar diretamente sete comunidades rurais em seis municípios.
Ou como o Programa de Conservação Ambiental e Produção de Água, que segue a todo vapor, com obras hidroambientais em três microbacias consideradas prioritárias, uma em cada região fisiográfica da bacia: Alto, Médio e Baixo Rio Pará.
Não podemos deixar de citar também o nosso Plano de Educação Ambiental (PEA), com ações sistemáticas acontecendo junto a um público variado: técnicos das prefeituras, comunidade escolar, usuários de recursos hídricos e população em geral.
Além dessas, são tantas as ações que visam, ao fim, à disponibilidade de mais água de qualidade e em abundância, assegurando os usos múltiplos ao longo da Bacia Hidrográfica do Rio Pará.
Túlio Pereira de Sá Presidente do CBH do Rio Pará
Diretoria do CBH do Rio Pará
Presidente: Túlio Pereira de Sá
Vice-presidente: Beatriz Alves Ferreira
Secretário: José Hermano Oliveira Franco
Secretária-adjunta: Vilma Aparecida Messias

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COMITÊ DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO PARÁ
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Redação e Reportagem: Ricardo Miranda, João Alves e Luiz Ribeiro
Revisão: Ísis Ribeiro Pinto
Fotografia: Fernando Piancastelli, João Alves, Leo Boi, Miguel Aun e Museu Sagarana
Diagramação e Finalização: Sérgio Freitas

Vem aí a Água para produzir, Cobrança para preservar
SEMANA 2 025


Pelo terceiro ano consecutivo, o CBH do Rio Pará irá desenvolver, na primeira quinzena do mês de maio, uma extensa programação de eventos, debates e integração. É a Semana Rio Pará, que se consolida como momento especial de mobilização, engajamento e pertencimento pela bacia hidrográfica.
Em 2025, o tema principal será a cobrança pelo uso da água na bacia do Rio Pará, instrumento que viabiliza os projetos de recuperação hidroambiental no território, mas que também tem registrado índices de inadimplência preocupantes entre os usuários outorgados. Sob o mote ‘Água para produzir, Cobrança para preservar’, serão realizadas, entre 12 e 16 de maio, Rodas de Conversa em cinco municípios de destaque na bacia – Itaúna, Papagaios, Martinho Campos, Bom Despacho e Pompéu –, reunindo Comitê, poder público, entidades de representação e usuários de recursos hídricos.
Para finalizar a Semana em grande estilo, uma Cicloexpedição percorrerá os Rios Pará e Itapecerica, em Divinópolis, no dia 18 de maio (domingo). Para celebrar essa grande mobilização em favor das águas, o grupo de ciclistas será recepcionado no Teatro Gravatá com uma programação especial, que inclui piquenique, distribuição de materiais educativos sobre a bacia do Rio Pará, coletiva de imprensa, palco aberto (com apresentações musicais, poéticas e teatrais), exposição educativa e exibição de vídeos.
Saiba mais e participe!
A vice-presidente do CBH do Rio Pará, Beatriz Alves, ressaltou a importância da Semana Rio Pará 2025, tendo como foco destacar e discutir os principais problemas que o território enfrenta, e de mobilizar a sociedade na busca por soluções. “Em mais um ano, o Comitê compartilhará com a população questões sensíveis à preservação da bacia e à gestão compartilhada e descentralizada dos recursos hídricos. Esperamos, uma vez mais, que possamos coletivamente obter sucesso e chegar a soluções que nos levem a um lugar melhor que estamos hoje”, falou.
Participe e apoie a Semana Rio Pará 2025! Vamos construir juntos mais esta grande mobilização na busca pelo pertencimento e engajamento em torno da Bacia Hidrográfica do Rio Pará!
Beatriz Alves, vice-presidente do CBH, celebrou mais um ano de atrações em torno da

CBH DO RIO PARÁ PROMOVE
OFICINAS PARTICIPATIVAS
NA SEMANA MUNDIAL DA ÁGUA
Projeto de Mapeamento de Navegabilidade do Rio Pará colhe informações da sociedade

Em celebração à Semana Mundial da Água, o CBH do Rio Pará promoveu, entre 17 e 21 de março, uma série de oficinas participativas que integram o Projeto de Mapeamento de Navegabilidade do Rio Pará. Os encontros – realizados em Passa Tempo, Itaguara, Cláudio, Divinópolis, Conceição do Pará, Pitangui e Pompéu – tiveram como objetivo de apresentar o projeto à população da bacia e colher contribuições para que o estudo reflita as principais demandas do território.
Ao longo dos seis meses de execução do mapeamento, serão realizadas um total de 14 oficinas de mobilização ao longo da bacia – sendo as sete primeiras já concluídas nesta etapa inicial do projeto, e as demais ao final.
A vice-presidente do Comitê, Beatriz Alves, ressaltou a relevância do mapeamento para a compreensão da navegabilidade em diferentes trechos do Rio Pará. “A iniciativa visa justamente verificar como está esse Rio Pará, especialmente em tempos de mudanças climáticas e restrição hídrica. A ideia é entender quais são os pontos que estão mais navegáveis, menos navegáveis, e a partir daí delinear estratégias, de forma participativa, que visem à produção de água em qualidade para o território”, destacou. Segundo ela, o levantamento contribuirá para diversas análises, incluindo a qualidade e a quantidade da água, além de proporcionar uma compreensão mais precisa sobre as variações do nível do rio, como a cheia e a vazante.
Embora o estudo tenha como foco a navegabilidade, Beatriz destacou a importância de considerar os diversos aspectos que surgirão ao longo do levantamento, especialmente aqueles relacionados às comunidades ribeirinhas e às atividades humanas que impactam o rio, como o esgotamento sanitário e a captação de água. “Todas essas questões associadas ao rio vão nos proporcionar um entendimento mais amplo. E de uma forma bastante participativa, que é o mais importante”, ressaltou.
Para ela, o envolvimento de diferentes segmentos da sociedade, desde especialistas até a população local, é fundamental para construir um conhecimento mais rico e abrangente, unindo saberes técnicos e populares.
IMPRENSA LOCAL
A equipe da TV Alterosa Centro-Oeste, afiliada ao SBT em Minas Gerais, esteve presente no evento em Divinópolis e produziu uma reportagem para o telejornal Alterosa Alerta. Com mais de 5 minutos de duração, a matéria destacou o caráter inédito do projeto e enfatizou a importância da participação popular no levantamento da navegabilidade do Rio Pará.

MAIS SOBRE O PROJETO
O Comitê vai realizar o mapeamento de quase 300 km do Rio Pará, desde Passa Tempo até a foz, localizada nas proximidades de Martinho Campos e Pompéu. O levantamento vai permitir identificar variações na profundidade e largura do rio ao longo do percurso, definindo possíveis interferências à navegação e determinando o tipo de embarcação mais adequado para circular por cada trecho.
Ao todo, o projeto contará com um investimento de R$ 568 mil. Com os dados obtidos, o Comitê pretende planejar ações a serem realizadas na bacia, incluindo as atividades da Semana Rio Pará e futuras expedições pelo curso d’água. O projeto é uma iniciativa do CBH do Rio Pará, com apoio da Agência Peixe Vivo e viabilizado a partir dos recursos da cobrança pelo uso da água na bacia.


TRANSFORMAÇÕES AMBIENTAIS NA BACIA
Obras do Programa de Saneamento Rural vão ter início em breve
O CBH do Rio Pará vai começar, no segundo semestre deste ano, as obras do Programa de Saneamento Rural. Os levantamentos técnicos para elaboração dos projetos individuais de cada propriedade estão na fase final e, com isso, as ações vão avançar.
O Programa de Saneamento Rural do Comitê tem o objetivo de implementar soluções individuais para tratamento de esgoto doméstico nas comunidades ao longo da bacia. Ao todo o CBH vai investir cerca de R$ 2 milhões nas obras. “O saneamento rural é um ponto muito importante para a bacia, já que auxilia bastante em relação à questão da qualidade da água. Vemos que ainda existem muitas comunidades sem saneamento básico instalado e povoados que possuem fossas negras próximas dos pontos de coleta de água para os moradores. Com esse projeto, queremos mudar esse cenário e garantir qualidade de água para as comunidades, o que vai impactar positivamente também nos nossos rios”, explica Túlio Pereira de Sá, presidente do CBH do Rio Pará.

“O Programa de Saneamento Rural do Comitê do Rio Pará vai desempenhar um papel fundamental na qualidade de vida da população da comunidade aqui em Pompéu”
Breno Ramos, diretor de Meio Ambiente da Prefeitura de Pompéu

Nesta primeira edição do projeto, 34 comunidades se inscreveram no procedimento de manifestação de interesse, publicado em 2023. Sete comunidades foram contempladas, em todas as regiões fisiográficas da bacia. As obras vão acontecer nos povoados de Cajuru e Jacarandira, em Resende Costa, e nos Custódios, em Cláudio, no Alto Pará. No Médio Pará os recursos vão ser aplicados em Branquinhos, na zona rural de Divinópolis, e em Bom Jesus de Angicos, Jacarandá e Olhos d’Água de Angicos, povoados de Carmo de Cajuru. No Baixo Rio Pará, o CBH selecionou a aldeia Kaxixó, em Martinho Campos, e o povoado Antônio Veloso, em Pompéu.
Ao longo dos últimos meses, as equipes da empresa contratada pelo CBH para elaboração dos projetos técnicos individuais de cada propriedade visitaram as comunidades beneficiadas. “Esta fase inicial do Programa de Saneamento está caminhando para sua fase final. Já temos os projetos arquitetônicos para todas as propriedades seguindo o melhor modelo para cada. A próxima etapa será a assinatura do termo de aceite de cada proprietário”, explica Natália Oliveira, analista ambiental da empresa Consominas.
Nas visitas às comunidades, os técnicos da empresa conversaram com os moradores, explicando detalhes do projeto e apresentando os modelos de tratamento de esgoto sanitário e benefícios que as obras vão proporcionar. Foram promovidas reuniões sobre reuso da água, tratamento e manejo dos efluentes, bem como as características específicas de cada localidade. “O Programa de Saneamento Rural do Comitê do Rio Pará vai desempenhar um papel fundamental para a qualidade de vida da população da comunidade aqui em Pompéu, diminuindo a ocorrência de doenças e auxiliando na preservação dos recursos naturais. A população aguarda ansiosamente as próximas

etapas, principalmente os moradores beneficiados, que receberão diretamente os impactos positivos da iniciativa. Além disso, acreditamos que outras comunidades e proprietários rurais vão conhecer os sistemas implantados e replicá-los em suas propriedades, visto que as tecnologias não são complexas e são acessíveis à população”, comenta Breno Ramos, diretor de Meio Ambiente da Prefeitura de Pompéu.
Com a conclusão dos projetos individuais, o CBH do Rio Pará vai poder dar início à contratação da empresa que irá executar as obras. Vão ser beneficiadas 50 famílias em cada localidade, totalizando 350 ao longo da bacia. “Estamos iniciando com 350 unidades, mas a intenção é que a partir do resultado positivo a gente consiga expandir isso para mais comunidades da bacia, sempre investindo o que o Comitê arrecada com a cobrança pelo uso dos recursos hídricos”, finaliza o presidente do CBH do Rio Pará.

ENTREVISTA:
NATUREZA EM ALERTA

Emergências climáticas mudam regime de chuvas e
já
causam impactos no volume dos rios
Até alguns anos atrás, cientistas divulgavam previsões preocupantes sobre mudanças climáticas ao redor do mundo. O que parecia ser transformação futura já faz parte da realidade atual. As mudanças envolvem alterações no regime de chuvas e intensificação dos períodos de estiagem. Como consequência, já é possível perceber impactos nos rios ao redor do mundo e no Brasil, incluindo os da bacia do Rio Pará.
Para entender melhor este cenário, o CBH do Rio Pará conversou com Mauro Cruz, geógrafo e professor da UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais), onde leciona disciplinas nas áreas de Sensoriamento Remoto, Geoprocessamento e Solos. Mauro se define como um entusiasta das inovações tecnológicas e do empreendedorismo, buscando conectar conhecimento científico à aplicação prática para desafios globais e locais.
O regime de chuvas no Brasil mudou significativamente nos últimos anos?
Sim, o regime de chuvas no Brasil sofreu alterações significativas nos últimos anos, assim como em várias partes do mundo, em razão do aquecimento global e das emergências climáticas. Essas mudanças não se limitam apenas ao aumento das chuvas em algumas regiões e à diminuição acentuada em outras, mas também incluem a intensificação de eventos climáticos extremos associados ao regime hídrico.
Tem sido cada vez mais comum a ocorrência de chuvas de alta intensidade, com grande potencial destrutivo e riscos à vida, assim como períodos prolongados de estiagem. Essas variações impactam diretamente a disponibilidade de recursos hídricos, a produção agrícola e a vida nas cidades. Diante desse cenário, é fundamental que medidas urgentes sejam tomadas para conter as mudanças climáticas, ao mesmo tempo em que se desenvolvem estratégias de adaptação e ações de mitigação para reduzir seus impactos.
Quais são os principais causadores das mudanças no regime de chuvas?
Certamente as mudanças nas características no regime das chuvas são intimamente ligadas ao aquecimento global. A principal causa é a intensificação do efeito estufa devido à emissão excessiva de gases como dióxido de carbono (CO2) e metano (CH4), dentre outros. A emissão desses gases é resultante da queima de combustíveis fósseis, desmatamento e processos industriais, entre outros. Esse aquecimento altera os padrões atmosféricos e oceânicos, afetando a circulação global de umidade e provocando desequilíbrios nos ciclos hidrológicos, alterando assim o regime das chuvas. Além disso, fatores regionais, como desmatamento, urbanização desordenada e mudanças no uso do solo, também exercem grande influência.
Minas Gerais enfrentou um período extenso de estiagem em 2024 – na bacia do Rio Pará chegou a ser decretada escassez hídrica, com restrições nas captações. Na sua visão, essa estiagem é uma característica do clima da nossa região ou uma mudança climática?
A estiagem prolongada que afetou a bacia do Rio Pará e parte do Brasil no último ano pode ser atribuída a uma combinação de características climáticas regionais e mudanças climáticas globais. Períodos prolongados de estiagem são historicamente comuns na estação seca na nossa região. Porém, estudos recentes demonstram que essas secas têm se tornado mais intensas e frequentes, sugerindo uma influência significativa das mudanças climáticas. Pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (UFLA) demonstram que, especialmente na última década, alterações climáticas têm impactado fortemente os recursos hídricos de Minas Gerais.


Embora seja verdade que Minas Gerais possui um período seco característico, a severidade e a duração das estiagens recentes não podem ser explicadas apenas por padrões climáticos naturais.
A combinação de menor recarga hídrica, aumento da demanda por água e mudanças no uso do solo tem potencializado os impactos das secas, tornando cada vez mais evidente a influência das mudanças climáticas na hidrologia da região.
As mudanças no regime de chuvas têm potencial para impactar a disponibilidade hídrica necessária para os usos múltiplos de água?
Sim, as mudanças no regime de chuvas têm um impacto direto sobre a disponibilidade hídrica da bacia do Rio Pará, afetando os diversos usos da água, como abastecimento urbano, irrigação, pecuária e geração de energia. A redução da regularidade e do volume das precipitações interfere na recarga dos cursos d’água superficiais e dos aquíferos subterrâneos, que desempenham um papel essencial na manutenção do equilíbrio hídrico da região.
A precipitação desempenha um papel essencial para a recarga dos mananciais, pois a água das chuvas infiltra-se no solo e alimenta os lençóis freáticos e aquíferos, que por sua vez liberam água lentamente para os rios ao longo do ano, garantindo a perenidade dos cursos d’água. No entanto, as alterações no regime pluviométrico, como a redução das chuvas na estação chuvosa e o prolongamento das estiagens, prejudicam essa recarga natural, reduzindo a vazão dos rios e comprometendo o abastecimento hídrico da região.
Considerando a situação atual, o que você apontaria como sendo os principais desafios para a manutenção da disponibilidade dos recursos hídricos no Brasil, em Minas e na bacia do Rio Pará?
A manutenção da disponibilidade dos recursos hídricos exige um olhar equilibrado entre proteção ambiental e desenvolvimento econômico sustentável. Os desafios são muitos, e não há uma solução única, mas sim um conjunto de estratégias que precisam ser fortalecidas e aplicadas de forma coordenada.
Em Minas Gerais, diversas iniciativas reforçam esse compromisso com o uso sustentável dos recursos hídricos. O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Pará tem se empenhado na gestão participativa da água, promovendo ações voltadas à recuperação de nascentes e proteção dos mananciais, garantindo que a água seja utilizada de forma racional por todos os setores. Além disso, programas de regularização ambiental vêm incentivando produtores rurais a restaurar Áreas de Preservação Permanente e Reservas Legais, fortalecendo a resiliência das bacias hidrográficas frente às mudanças climáticas.
CONHECENDO A BACIA DO RIO PARÁ:
UMA
VIAGEM AO PASSADO
Museu Sagarana: conheça a cidade da bacia do Rio Pará que inspirou
Guimarães Rosa a escrever um dos livros mais famosos do país

Um olhar poético sobre o interior de Minas Gerais, mostrando situações cotidianas contadas de um jeito único, misturando a linguagem popular com a erudita. Um universo repleto de lendas, mitos e personagens marcantes. Características do livro “Sagarana”, uma das maiores obras do escritor mineiro João Guimarães Rosa. E o que muita gente talvez não saiba é que paisagens e histórias ocorridas na bacia do Rio Pará inspiraram o autor a escrever o livro.
Guimarães Rosa nasceu em Cordisburgo, na região Central de Minas Gerais, em 1908. Na juventude, mais precisamente entre os anos de 1931 e 1933, o escritor viveu em Itaguara, na região do Alto Pará. Pesquisadores afirmam que apesar de breve, o período em que viveu na cidade rendeu boas histórias ao escritor. Lá ele conheceu pessoas e fez amigos, que o inspiraram a criar os personagens de “Sagarana”.
A passagem de Guimarães Rosa por Itaguara é motivo de orgulho para a cidade, principalmente por ter sido uma das inspirações para o livro. O escritor se tornou uma figura tão importante para o município que um museu foi criado para homenageá-lo. “O Museu Sagarana é um museu público municipal que tem o objetivo de valorizar a relevância histórica de Guimarães Rosa ter vivido aqui em Itaguara, mesmo que por apenas dois anos e alguns meses”, explica Maria Rita de Oliveira, coordenadora do espaço.
O museu foi inaugurado em 2013 e é vinculado à Secretaria Municipal de Cultura de Itaguara. Milhares de visitantes já estiveram no local e tiveram a oportunidade de conhecer um pouco sobre a história da cidade e sobre a relação do município com Guimarães Rosa e com o livro. Ao todo são 751 peças já inventariadas e outras ainda em processo de catalogação.
GUARDIÃO DA CULTURA E DA HISTÓRIA
O Museu Sagarana convida os visitantes para uma viagem no tempo. O acervo está dividido em quatro galerias, pensadas para proporcionar ao turista uma experiência imersiva. Em cada espaço, objetos, documentos e fotografias que oferecem um olhar único sobre a cultura e a história de Itaguara, além da relação da cidade com Guimarães Rosa.
O passeio começa pela galeria “Conquista”, que reúne documentos e itens que remetem ao passado, da época do surgimento da cidade, com o distrito de Nossa Senhora das Dores de Conquista. “São objetos que contam um pouco da nossa memória. Destacamos a história dos nossos sapateiros, um dos ofícios mais importantes da nossa cidade. Daqui, saíam sapatos para Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Inclusive, Tancredo Neves calçava botinas fabricadas aqui”, conta com entusiasmo a coordenadora do museu.
Nesta primeira galeria também estão expostos itens da centenária Banda de Música Nossa Senhora das Dores, eternizada por outro escritor nacionalmente famoso, Manuel Bandeira, que escreveu uma crônica sobre o grupo. Também são lembrados os homens de Itaguara que estiveram na Segunda Guerra Mundial, além de um espaço dedicado ao rico artesanato do município, que ainda hoje é fonte de renda para alguns moradores.
Já a galeria Relembramentos está diretamente ligada à passagem de Guimarães Rosa por Itaguara, e é um dos espaços mais especiais do museu. “Sabemos que fatos ocorridos aqui em Itaguara inspiraram o grande escritor em Sagarana. No acervo, temos fotos de amigos, de personagens, livros, documentos e outros objetos. Além de itens pessoais de Guimarães Rosa, como a casaca, os óculos e a gravata borbo-
leta que ele costumava usar”, complementa Maria Rita. Nesta parte do museu também há uma homenagem a Vilma Guimarães Rosa, filha de João, e também escritora, que ao escrever a biografia do pai dedicou um capítulo especial ao Museu Sagarana.
Ainda na galeria Relembramentos, temos o cantinho do Compadre Meu Quelemém, personagem de “Grande Sertão: Veredas”, uma das maiores obras de Guimarães Rosa. O personagem foi inspirado em Manoel Carvalho, amigo do escritor, morador da zona rural de Itaguara. Cartas trocadas entre eles estão expostas no acervo.
O visitante continua a viagem no tempo na galeria Emancipação, que narra a história da emancipação política do município em 1943. O acervo é composto por documentos do movimento da emancipação do município, que à época pertencia à Itaúna. Além disso é destaque a galeria dos prefeitos com fotos de todos administradores. A outra sala é chamada de Caixa de Botica, onde são homenageados profissionais de saúde do passado, como farmacêuticos, médicos e parteiras que atuaram em Itaguara. O público pode ver de perto medicamentos, produtos e instrumentais que eram usados na época em que a cidade surgiu. “Através destas galerias, um pouco do nosso passado está eternizado. Servimos deste equipamento público para reverenciar nossos ancestrais por nos ter legado a pertença que somos hoje”, enfatiza a coordenadora do espaço.
O Museu Sagarana está funcionando temporariamente na rua D. Dinha, 75, no centro da cidade, enquanto o prédio original do museu passa por reformas. A entrada é gratuita, de segunda a sexta-feira, de 7h às 13h, e não é preciso fazer agendamento.


DA ALDEIA PARA A MEDICINA
Primeiro médico da etnia Kaxixó e a luta pela preservação do Rio Pará
“É nosso!”, gritou Otávio Kaxixó ao receber o diploma da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Um momento inesquecível para o primeiro médico da etnia Kaxixó, que descreve a conquista como um dos capítulos mais importantes da luta dele por direitos e reconhecimento para o povo indígena.
Otávio Kaxixó tem 30 anos de idade e uma longa história na defesa do povo dele, os indígenas da etnia Kaxixó. É o filho ilustre da Reserva Capão do Zezinho, a cerca de 30 km de Martinho Campos, na região do Baixo Pará, onde morou até a adolescência. É filho de uma merendeira e de um trabalhador rural –lembrados por ele com orgulho no discurso durante a cerimônia para receber o diploma da UFMG.
A infância de Otávio foi em meio ao povo dele. “Temos três aldeias às margens do Rio Pará, bem na divisa entre Martinho Campos e Pompéu. Nasci na Criciúma, que hoje não existe mais, porque foi engolida pelos fazendeiros. Mas carrego com orgulho as raízes de onde vim e onde cresci, junto ao meu povo Kaxixó”, comenta Otávio.
É com orgulho e nostalgia, mas também com certo lamento, que Otávio relembra momentos de sua infância na aldeia. “Foi uma infância marcada pelas manifestações culturais e folclóricas do meu povo, com rituais religiosos e muito simbolismo. Me lembro, por exemplo, dos três cemitérios que existiam na aldeia: um exclusivo para os caciques, outro para os indígenas adultos e outro para as crianças. Também carrego as lembranças de brincar e nadar no rio com meus amigos. Por outro lado, não consigo me esquecer dos momentos de luta pelo reconhecimento da nossa identidade e das várias dificuldades que enfrentamos por conta disso”, relembra.

Ainda na infância Otávio precisou aprender que nem todos respeitavam as origens dele. E já criança vivenciou momentos tensos de luta pelo reconhecimento da identidade Kaxixó. “Não foi fácil. A luta pelo reconhecimento do nosso povo começou por volta de 1985 e só terminou em 2001. Enfrentamos muitas ameaças, disputas por nossas terras. Vi nossa aldeia ser engolida por fazendeiros e tivemos que migrar para outra aldeia, a Capão do Zezinho, também às margens do Rio Pará, onde havia um contingente maior de indígenas”, conta o primeiro médico indígena formado pela UFMG.
Apesar do contexto de luta pelo reconhecimento do povo Kaxixó, Otávio diz que a infância dele foi marcada por um sentimento de liberdade. “Éramos livres para pescar e até nadar nus no rio. Me lembro bem dos rituais que fazíamos, tanto culturais quanto religiosos. O sentimento de liberdade e plenitude era incrível”, destaca. Entretanto, o contexto mudou rapidamente, segundo Otávio, à medida que a disputa pela terra tomou proporções tensas e até perigosas, com ameaças à vida dos indígenas que viviam nas aldeias da região. “Vimos nossas terras serem invadidas. Fomos obrigados a readaptar nossos costumes, ficamos mais sujeitos a doenças, sofremos racismo e éramos vistos como um povo incapaz. Passamos a ser explorados por fazendeiros e muitos do meu povo trabalhavam em troca de comida para conseguir sobreviver”, relembra com tristeza.

Leia a matéria completa em: bit.ly/aldeiaparaamedicina

