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Sedução à espanhola
Sedução à espanhola
Manhã de domingo. Praia de Barra de São Miguel, no litoral Sul de Alagoas. Céu azul, apesar da chuva que caia algumas horas antes. O sol começa a esquentar. Na superfície do mar, a água reflete diferentes tonalidades que variam do verde oliva ao azul turquesa. Ainda é possível avistar um arco-íris que, na linha do horizonte, se funde ao oceano atlântico. Ao meu redor, o espaço vai se tornando cada vez menor para tanta gente que se move de um lado para o outro, em busca da felicidade.
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Da minha espreguiçadeira alugada de um ambulante que está atento aos desejos do cliente, solicito uma bebida bem gelada. O líquido amarelado e espumante desce pela garganta sedenta, refrigerando meu corpo e acalmando minha alma. Penso comigo mesmo: salve Gambrino! Por acaso, esse sujeito foi o inventor da fórmula original da cerveja, esse líquido feito da fermentação do lúpulo com a cevada, trigo ou centeio, que no passado era privilégio apenas dos nobres e reis do Império Romano. Hoje se tornou popular e faz a alegria do povo.
Ao meu lado, deitada sobre a toalha estampada, encontra-se uma espanhola de corpo torneado e bronzeado, esparramada na areia. Olha disfarçadamente para ela e, mentalmente, faço uma operação matemática: somo, divido, multiplico e subtraio. Mas não consigo achar a raiz quadrada daquela escultura de carne e osso (muito mais carne do que osso).
Fico com meus pensamentos matemáticos, admirando disfarçadamente aquela figura geométrica perfeita. Um triângulo retângulo onde o quadrado da hipotenusa é igual à soma do quadro dos catetos. Retomo o pensamento para o contexto das relações sociais à beira mar, não sem antes refletir sobre o papel aparentemente desnecessário da matemática na arte da sedução. Fiquei a imaginar a possibilidade de, num possível aprofundamento do diálogo com ela, citar Miguel de Cervantes e
seu Dom Quixote de La mancha.
Sedutora, ela me olha com um cigarro na mão e faz um gesto me perguntando se tenho fogo. Utilizando-me de meu portunhol básico, digo quer fogo eu tenho, mas não serve para o que ela está precisando naquele momento. Ela diz não entender nada do que digo e que precisa apenas de um isqueiro ou fósforo para acender seu cigarro. Ela insiste e volta a perguntar: “Tens fuego?”.
Dessa vez, disse claramente que não e logo me ofereci para conseguir fósforo ou isqueiro. Ela me entendeu e, provocante, sorri, me agradeceu e guardou a cigarreira. Desistiu de fumar e me perguntou: “Não tragas?” Ao que respondi não ter o hábito de fumar. Disse a ela que o hábito de beber já era mais que suficiente. Ofereci um copo de cerveja, ela recusou. Disse não ter o hábito de beber e fumar já era mais que suficiente. E logo voltou a tomar sol. Não sei por que, pouco tempo depois, solicitei que o vendedor recolhesse o recipiente com a cerveja e desisti de beber. Porém, continuamos a trocar olhares...
Não me contive. Levantei, fui até ao lado dela, me agachei e perguntei se ela aceitaria almoçar comigo. Ela disse que sim, desde que eu aceitasse jantar com ela. Aceitei a contraproposta sem titubear. Almoçamos um prato típico em um restaurante rústico situado na orla lacunar. Após o almoço, por volta das 17 horas, a deixei no hotel. Não sem antes darmos uma curta caminhada à beira mar, onde aproveitei para acertar os detalhes para o jantar. Combinamos que eu passaria às 20 horas para pegála. Despedimo-nos com desejo de continuarmos juntos. À hora marcada, nos reencontramos. Jantamos um prato a base de frutos do mar. Eu tomei vinho, ela um suco de mangaba. Após o jantar, ela acendeu o cigarro. Eu pedi um cálice de licor de laranja. Passamos a nos olhar sedutoramente. Beijamo-nos demoradamente e trocamos carícias ardentemente. Saímos do restaurante direto para o motel. Na cama, nos entregamos apaixonadamente.
Já relaxados, ela se levantou e foi ao banheiro. Ansioso, abri sua bolsa, peguei um cigarro, acendi e comecei a tragar. Ela voltou para a cama e deitou-se ao meu lado. Mais uma vez a achei deslumbrante. Fui ao banheiro. De volta, a encontrei com uma cerveja na mão. Há cinco anos estamos juntos. Ela bebe quase todos os dias. Eu fumo obsessivamente. Para ela, caímos nas teias do destino. Para mim escravidão à primeira vista. O amor é assim!