Revista Kéramica n.º 376 Maio/Junho 2022

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Património Industrial Cerâmico

O SECTOR CERÂMICO EM PORTUGAL NA ÉPOCA CONTEMPORÂNEA. CULTURA MATERIAL, ARQUEOLOGIA E PATRIMÓNIO INDUSTRIAIS, CULTURA DAS ORGANIZAÇÕES p o r Jo ã o Pa u l o Av e l ã s Nu n es , UC/ FL / DH E E A A e Ce nt r o d e E s t u d o s Int e rd i s ci p li n are s da UC

João Paulo Avelãs Nunes

1. Introdução No Portugal das últimas décadas, talvez alguns dos mais importantes factores de bloqueio ao potencialmente maior relacionamento entre empresas do sector cerâmico/a APICER, a historiografia (conhecimento científico) e saberes tecnológicos de base científica como o património cultural e a cultura organizacional tenham a ver com representações que não corresponderão a parte substancial da realidade. Por um lado, empresas e associações empresariais observariam a historiografia e o património cultural como conjuntos de discursos sobretudo valorativos e condenatórios acerca do capitalismo e dos empresários; veriam a cultura organizacional essencialmente como instrumento de marketing de organizações ou de publicidade a bens e a serviços. Por outro lado, historiadores e especialistas em património cultural pressuporiam que as empresas e as associações empresariais adoptam quase sempre uma postura defensiva e de secretismo ou uma atitude proactiva e manipuladora

quanto ao conhecimento sobre os respectivos passados; tenderiam a encarar o património cultural como política pública pouco útil e muito dispendiosa, limitadora da liberdade de iniciativa dos agentes económicos. Quer no nível dos princípios abstractos quer no plano das iniciativas concretas, será, no entanto, possível defender outras soluções e observar a presença de práticas menos redutoras, maniqueístas e unilaterais. Tanto do universo das empresas e das associações empresariais como do lado dos investigadores em historiografia, património cultural e cultura organizacional — para já não referir mais actores relevantes como outras organizações da sociedade civil, o sistema político e o aparelho de Estado —, verifica-se, igualmente, a existência de pressupostos deontológicos e epistemológicos, teóricos e metodológicos viabilizadores de uma acrescida cooperação entre gestores de empresas, dirigentes de organizações de cariz socioprofissional (associações empresariais e sindicatos), investigadores em historiografia, património cultural e cultura organizacional. Viso no presente artigo, sumariamente, salientar que, de acordo com o Paradigma Neo-Moderno e com a História Nova, os historiadores devem produzir e divulgar conhecimento tão objectivante quanto possível sobre a realidade (o mais afastado possível do senso comum e da ideologia). Terão, para o efeito, de recorrer aos diversos tipos de documentação — escrita (narrativa ou serial, de arquivo ou publicada), material e gráfica, oral e audiovisual — e a várias metodologias, praticar sincretismo teórico e debate transdisciplinar, envolver-se em actividades de transferência multilateral de saber e de criação/aplicação avaliada de conhecimento tecnológico de base científica também derivado da historiografia (didáctica da História e património cultural, cultura organizacional e diferenciação territorial, lazer e turismo culturais, etc.). 2. Conceitos nucleares A categoria teórica de cultura material contemporâ-

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Maio . Junho . 2022


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