AMI Notícias nº 91

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N.º 91 Distribuição Gratuita 4.º trimestre de 2023

Entrevista

Iman Bugaighis "A LÍBIA VIVE NO MEU CORAÇÃO" Reportagem

A VIAGEM DO 'PRÍNCIPE' Declaração Universal dos Direitos Humanos AGORA TAMBÉM EM

FORMATO DIGITAL

UMA HISTÓRIA DE 75 ANOS


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Foto © José Ferreira / AMI

N.º 91 Distribuição Gratuita 4.º trimestre de 2023

Entrevista

Iman Bugaighis "A LÍBIA VIVE NO MEU CORAÇÃO" Reportagem

A VIAGEM DO 'PRÍNCIPE' Declaração Universal dos Direitos Humanos AGORA TAMBÉM EM

FORMATO DIGITAL

UMA HISTÓRIA DE 75 ANOS

04 | A faixa do mundo que perdeu o direito à vida e liberdade

08 | Entrevista, Iman Bugaighis

“Líbia é mais que uma terra, é algo que vive no meu coração”

12 | A viagem do “príncipe” 14 | Bihari, povo de gerações apátridas 16 | Um lugar para chamar meu

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19 | Breves – Nacional, Internacional, Mecenato 22 | Agenda AMI 23 | Voluntariado

Ficha Técnica Este número da AMINotícias foi editado com o especial apoio da TRUST IN NEWS, detentora dos títulos Visão e Visão Júnior (encarte), COMPANHIA DAS CORES, LIDERGRAF e CTT - Correios de Portugal. Autorizada a reprodução de textos desde que citada a fonte. Periodicidade Trimestral Diretor Fernando Nobre Diretora Adjunta Luísa Nemésio Subdiretora Ana Luísa Ferreira Editora Ana Martins Ventura Redação Ana Martins Ventura e e Ana Luísa Ferreira Colunistas Isabel Fernandes, Catarina Neves, Fernando Nobre Branded Content Sandra Leite Coordenador de Fotografia José Ferreira Fotografia Alayoum24, Anas Mohammed, A-One Rawan, José Ferreira, Mohammed Shaat, Timothy Lima, Direitos Reservados Grafismo Alexandre Fernandes Redes Sociais José Guimarães Paginação Companhia das Cores - Ana Gil, Lúcia Antunes Impressão LIDERGRAF Editora, Redação e Administração AMI - Fundação de Assistência Médica Internacional, Rua José do Patrocínio 49, Marvila, 1959-003 Lisboa • T. 218 362 100 • E-mail: aminoticias@ami.org.pt Tiragem média 38.500 exemplares Distribuição Visão, Visão Júnior, AMI Registo ERC 127913 Depósito Legal DL378104/14


APELO URGENTE PELOS 75 ANOS DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

Por ocasião dos 75 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) (1948), lanço um apelo urgente e desesperado para que a DUDH não seja letra morta e espezinhada como está a acontecer há décadas com uma brutal e selvática aceleração nos últimos anos e ainda mais nas últimas semanas! Nasci há 72 anos e, nos últimos 45 anos, enquanto médico, tenho dedicado a minha vida ao serviço dos mais frágeis, famintos e injustiçados do nosso Planeta que já calcorreei de lés a lés, percorrendo mais de 185 países. Vivenciei, in loco, epidemias, guerras, fome, genocídio, catástrofes naturais de todo o tipo possível e imaginável. O Relógio do Apocalipse está a poucos segundos da sua última e apocalíptica badalada. Ou paramos de imediato a louca corrida para o abismo em que alguns querem mergulhar a Humanidade como um todo, verdadeira extinção global da atual Civilização, com todas as suas variantes, que parecia poder atingir a Harmonia … ou então entramos numa época de loucura, de arbitrariedade e de crueldade totais que nos mergulhará na arrepiante e inimaginável Terceira Guerra Mundial que, porque atómica, não deixará pedra sobre pedra!

© Gabriela Nemésio Nobre

SUMÁRIO + EDITORIAL

Fernando de La Vieter Nobre Presidente e Fundador da AMI

Com a distopia total já instalada entre nós e com a ganância, indiferença e intolerância galopantes, receio muito que já seja tarde demais para travar a loucura instalada! Todos os Direitos Humanos, TODOS, a começar pelo Direito à vida, estão a ser menosprezados, esmagados. Com a Força a sobrepor-se à Lei, não há Direitos Humanos, sejam eles Cívicos, Sociais, Económicos, Políticos, Culturais ou Ambientais, que resistam!!! Chegados a este ponto crítico, possivelmente sem retorno, só restará lutar pelas nossas liberdades e “rezar” a Deus, qualquer que Ele seja, que nos religue à Essência da Vida e ao mais sagrado e indubitável dos seus mandamentos: NÃO MATARÁS, NEM ESCRAVIZARÁS seja por que meio for! Este é o meu mais premente e angustiado apelo: respeitemos a Vida, os Valores Universais. Porque somos todos irmãos e essências Divinas oriundos da mesma fonte: AMOR – LUZ – GRATIDÃO! Essa sempre foi, e será até ao fim, a Razão de Ser da minha vida!

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© Anas Mohammed

Cerca de 9.000 civis morreram na Faixa de Gaza e 46% dos edifícios estão destruídos.

A FAIXA DO MUNDO QUE PERDEU O DIREITO À VIDA E LIBERDADE Um ativista na Cisjordânia, uma professora portuguesa e uma médica libanesa têm em comum a luta por direitos humanos que lhes são negados. Descrevem o mundo de hoje como passivo, ditando apenas palavras perante o assassinato de milhares de pessoas, pelas armas, fome e doença. Nunca a aplicação efetiva da Declaração Universal dos Direitos Humanos esteve tão em risco, como no momento em que celebra 75 anos de ratificação pela Organização das Nações Unidas.

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Mughannam Ghannam esperava há uma semana, na Cisjordânia, informações do coordenador da ONG Juhoud for Community and Rural Development Palestine (Juhoud) na Faixa de Gaza, para planear a intervenção no terreno, quando a ajuda humanitária fosse autorizada a entrar. No tom aflitivo de quem está de mãos atadas perante os ataques a um território onde 2,5 milhões de civis estavam retidos, Mughannam Ghannam não sabia se o colega estava vivo. Não havia dúvidas, o mundo já estava a assistir a “um genocídio da Humanidade na Palestina, contra o qual a Organização das Nações Unidas não estava a ter uma atitude assertiva”. A partir de informação reunida pelas ONG, devido à guerra e à fome, o ativista da Juhoud sabia que “na Faixa de Gaza, cinco pessoas morriam a cada cinco minutos”.


ATUALIDADE

Os ataques do Hamas e de Israel destruíam o princípio de o governo egípcio abre a fronteira apenas alguns dias para fraternidade entre as nações e os povos, o direito à vida e depois a voltar a fechar. à liberdade. Artigos 1.º e 3.º da Declaração Universal dos Impossibilitados de viver no seu país, para os palestinianos,, Direitos Humanos (DUDH), definidos com o objetivo de nunca sair significa sobreviver e, ao mesmo tempo, uma perda mais se repetir o flagelo da II Guerra Mundial. irreparável. Mughannam Ghannam acompanha desde 7 Passado mais de um mês desde o início do conflito, na de outubro a resistência da população, “os palestinianos Faixa de Gaza ninguém está a salvo e muitas ONG, como não querem partir, sabem que se o fizerem será quase a Organização das Nações Unidas para Alimentação e impossível regressar, pois o território será ocupado”. Agricultura (FAO) não conseguem garantir a ação e segurança das suas equipas. “Escolas, casas, hospitais, mesquitas e também igrejas, DIREITOS HUMANOS OU APENAS PALAVRAS? locais de refúgio, têm sido alvo de ataques e mais de À distância, depois de ter fugido da Líbia onde tentou 9.000 civis perderam a vida, incluindo crianças e idosos”, “mudar o destino das coisas” através da Revolução de garante Hamad Alwahab, coordenador da Juhoud na 2011, a médica e ativista Iman Bugaighis lamenta o Faixa de Gaza. “avanço impune da violência e repressão em Gaza”. Tal Na Faixa de Gaza “46% das habitações estão completacomo viu acontecer na Líbia, durante o regime de Muammente ou parcialmente destruídas, combustível, água mar Gaddafi – Kadhafi – e após a queda do ditador. potável e comida estão a acabar, com a população a Nessa época “a comunidade internacional gerou mais racionar comida e água, com menos de três litros por dia violência do que ajudou a proteger os civis”, acusa Iman por pessoa”. Bugaighis. Hoje, “a Organização das Nações Unidas conDevido à escassez de água e de material médico para dar tinua a falhar, passiva perante o que está a ser feito na assistência à população, “as doenças e o sofrimento estão Faixa de Gaza a 2,5 milhões de pessoas, pouco a pouco a aumentar”, não apenas na Faixa de Gaza, mas, também, eliminadas, desde a sua vida à sua marca histórica e culna Cisjordânia. A capacidade de assistência médica dimitural. Porquê?”. nuiu drasticamente e “é urgente o acesso a kits de higiene, para que se consiga conter a propagação de doenças e diminuir a pressão sobre os hospitais”. Material que nem mesmo o principal fornecedor da Palestinatem disponível. E, apesar de estarem a ser Estamos perante uma grande enviados suprimentos para hospitais, as colunas com falha na atuação dos líderes em ajuda humanitária são constantemente atacadas. todo o mundo, nunca os direitos Hamas e Israel colocaram de parte as regras para humanos [da Declaração Universal] a salvaguarda de civis durante uma guerra. Na estiveram em risco como agora Faixa de Gaza o 3.º artigo da Declaração UniverDeprose Muchena, Amnistia Internacional sal dos Direitos Humanos – “todo o ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal” – já era há anos quase uma utopia. Desde 7 de outubro, tornou-se impossível defender. “As Nações Unidas disponibilizam abrigos e campos de refuIman Bugaighis sonhou a vida toda com educação, saúde giados, mas nenhum local é seguro, zonas civis e de grande e democracia para a Líbia, para o Mundo. Viu ser-lhe cordensidade são constantemente atacadas”, revela Hamad tado o direito a ter um país, incluído na Declaração UniAlwahab e, à data de fecho desta edição, encontravam-se versal que diz alimentar “mais palavras do que ações”. deslocadas mais de 1,4 milhões de pessoas. Para Iman a bússola da Declaração Universal dos Direitos Com o cerco de Israel à Faixa, sair da região para outro Humanos está perdida. “A partir do momento em que ditaponto da Palestina é igualmente impossível sendo eliminado dores como Putin matam milhares de civis e viajam pelo o “direito à liberdade de locomoção e residência dentro mundo, sem serem detidos, é como se disséssemos que das fronteiras de cada Estado” e o direito a “deixar qualqualquer governante pode matar pessoas e reclamar a quer país, inclusive o próprio, e a esse regressar”, do 13.º terra e direitos que quiser”, afirma. Com este grau de impuartigo da DUDH. nidade, “não admira que um certo colonialismo avance a De olhos postos na ‘Passagem de Rafah’ milhares de palespassos largos sobre a Palestina”, valendo o poder sobre a tinianos esperam chegar ao Egito através da única fronterra, mais do que a vida de civis. teira onde ainda é possível tentar uma fuga do inferno, mas

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© A-One Rawan

ria trabalho para todos, democracia” e assim seria “se os interesses económicos não se tivessem sobreposto aos direitos das pessoas”. Para Silvana “o plano falhou, completamente”.

Sem eletricidade e medicação para anestesia, a assistência nos hospitais é quase impossível.

UM PLANO FALHADO? A professora Silvana Pereira cresceu entre conversas “em surdina” da mãe e do pai, feitas de “eram palavras fortes contra a guerra, o silêncio, a tortura, num tempo em que ter ideias e opinião era perigoso”. Quando a guerra chegou a terras, então portuguesas, Silvana já era mulher feita e entrava no Movimento Estudantil consciente do que significava “o silêncio”. Disposta a defender os ideais da Declaração Universal dos Direitos Humanos, recorda que, apesar dele, do silêncio, “ter vinte anos em Portugal, em 1961, não era o mesmo que ter vinte anos hoje: entre a comunidade estudantil havia uma consciência muito profunda sobre política e sobre os direitos que era urgente reivindicar”. O sonho dos direitos humanos era “vivido intensamente e acreditávamos que íamos realmente mudar o nosso mundo”. Em 1978, Portugal ratificou a Convenção Europeia dos Direitos Humanos aceitando dessa forma defender os pressupostos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Passados 45 anos “liberdade e direito à individualidade” são para Silvana Pereira conquistas inegáveis. “Por fazer? Há muito. Temos famílias a dormir na rua. A comida, mais simples que possa existir, uma sopa, uma fatia de pão, não é uma realidade para todos. Há pessoas sujeitas a trabalho escravo, completamente desprotegidas e à margem de qualquer defesa pela lei”, contesta Silvana Pereira. Quando em 1974 a mensagem da revolução portuguesa soou pela manhã de 25 de abril, Silvana pensou “é agora que Portugal vai entrar para o círculo daqueles que defendem acima dos ideais políticos, os direitos humanos”. Demorou mais quatro anos. Finalmente em 1978, Portugal ratificou a Declaração Universal dos Direitos Humanos. “Garantia-se que ninguém mais teria fome, frio, que have06 |

AS ARMAS VS A COMIDA Passados 75 anos, ratificada por 183 países e traduzida em 525 idiomas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948, por si só, nas mãos de alguém, ainda não garante a defesa do direito à vida e dignidade, à nacionalidade, ao livre culto religioso, à habitação e trabalho. Será a paz, causa fundadora da Organização das Nações Unidas e ideal eterno da Declaração Universal dos Direitos Humanos, sempre e somente isso: um ideal sem concretização? Cinco dias antes do Hamas e Israel declararem guerra, durante a 2ª Conferência internacional da Plataforma de Direitos Humanos, realizada na Fundação Calouste Gulbenkian, sob um profundo silêncio da plateia, Deprose Muchena afirmou: “estamos perante uma grande falha na atuação dos líderes em todo o mundo, nunca os direitos humanos [da Declaração Universal] estiveram em risco como agora”. O diretor da Amnistia Internacional para a África Oriental e Austral não tem dúvidas, as guerras estão a causar uma militarização mundial. Relegando o acesso a bens essenciais para segundo plano, “em muitos países, é privilegiado o investimento no fabrico de armas e não na produção de alimentos”. Ao mesmo tempo, a Organização das Nações Unidas anunciou que: nos países da União Europeia, pelo menos 5% das pessoas não têm os seus direitos humanos defendidos, a guerra na Ucrânia despoletou, até ao momento, a maior crise de direitos humanos na Europa do século XXI. As consequências da guerra na Ucrânia vão ainda muito além da Europa. Os consecutivos embargos à comercialização de cereais deixam muitos países de África, que dependem dos cereais da Ucrânia, em risco de uma grande fome. E o apoio da Rússia a células rebeldes em África, que representam fações em diferentes guerras civis, está a causar instabilidade entre países. “A partir do Sudão, o impacto da guerra feita por 120 grupos armados, está a causar instabilidade em todos os países da região, sendo o caso mais grave a República Democrática do Congo”, garante Muchena, Eduardo Pinto da Silva, Chefe da Divisão de Direitos Humanos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, concorda que “a especulação causada pela guerra é, atualmente, um


ATUALIDADE

De onde vêm e até onde chegaram a “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”? 1772 a.C. Código de Hamurâbi é criado na Mesopotâmia para defender o direito à Justiça, punir os difamadores, proteger a família e condenar a violência sexual. 539 a.C. O Cilindro de Ciro, uma declaração do rei persa Ciro II defendia a liberdade religiosa e a abolição da escravatura. 400 a.C. Na Roma antiga havia o conceito jurídico da concessão da cidadania a todos os romanos, como direito base para aceder a outro conjunto de direitos. I d.C. O Cristianismo afirmou a igualdade de todos os homens sob a mesma dignidade. 200 d.C Filósofos cristãos desenvolvem a Teoria do Direito Natural. O ser humano está no centro de uma ordem social e jurídica justa, mas a lei divina tem prevalência. 1215 Magna Carta é assinada pelo rei João de Inglaterra. 1776 Declaração de Independência dos Estados Unidos da América defende: “todos os homens são criados iguais, que são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes são vida, liberdade e busca da felicidade”.

1863 Início da abolição da escravatura nos Estados Confederados da América do Norte. 1935 Leis de Nuremberga retiram às comunidades judaicas da Europa o direito à cidadania, educação, trabalho e habitação. Durante uma década, em 20 países, milhões de pessoas são assassinadas. 1948 Ratificação da Declaração Universal dos Direitos Humanos pela Organização das Nações Unidas. 1978 Portugal ratifica a Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1981 A Organização da Unidade Africana proclama a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, apenas ratificada em 1986. 1990 A Declaração Cairo, para a defesa de direitos humanos, é firmada pela Organização para a Cooperação Islâmica. 1993 Declaração de Bangkok para a defesa dos direitos humanos é emitida na Ásia . 1996 Estados africanos que ratificam a Declaração de Tunes defendem: não pode existir um modelo universal de direitos humanos porque desvincularia realidades históricas e culturais de cada nação e povo.

1789 Revolução francesa sob os ideais Liberté, Éga l ité, Fraternité (Li berdade, Ig ua ldade, Fraternidade).

dos maiores ataques à garantia dos direitos humanos na União Europeia e nos países com os quais mantém negócios e relação diplomática”. Muitos bens alimentares tiveram um aumento de 100%, as casas também, o acesso a cuidados médicos está cada vez mais longe de ser igualitário. O chefe da Divisão de Direitos Humanos do Ministério dos Negócios Estrangeiros defende veementemente a “cria-

ção de mais missões de solidariedade” e Deprose Muchena subscreve que “a velocidade é fundamental na resposta à defesa dos direitos humanos”, seja no oriente ou no ocidente da Europa. Afinal, em Portugal a crise de direitos humanos também é grave: “há casos de tortura em prisões; tráfico e exploração de pessoas na agricultura e pesca, sem esquecer o bloqueio no acesso à habitação, motivo que leva centenas de pessoas a viver nas ruas”. | 07


A professora Iman Bugaighis encontrou em Portugal a segurança para sobreviver à perseguição do Governo na Líbia

“A LÍBIA É MAIS QUE UMA TERRA, É ALGO QUE VIVE NO MEU CORAÇÃO” A professora e investigadora académica, Iman Bugaighis acredita que a maior revolução que um país pode viver é a Educação. Quis concretizar esse sonho na Líbia mas a perseguição política fez dela e da sua filha refugiadas. A partir de Portugal continua a olhar para os diferentes pontos do mundo onde os direitos humanos são derrotados pela guerra e não desiste da Líbia. Texto Ana Martins Ventura / AMI Fotografia José Ferreira / AMI

Para Iman Bugaighis, ser líbia é ser além-fronteiras, viver com o país onde se nasceu no coração enquanto a casa é o mundo. Há quase dez anos deixou a Líbia, depois da sua irmã, Salwa Bughaighis, ser assassinada à queima-roupa, em casa. 08 |

Salwa Bugaighis foi assessora do Conselho Nacional de Transição da Líbia e vice-presidente da Comissão Nacional de Diálogo, mas havia decidido deixar as instituições em protesto por não terem sido nomeadas mulheres para o novo governo. A advogada

também se opôs à proposta do governo que pretendia impor o uso obrigatório hijab, quando, na Líbia, sempre foi uma escolha pessoal. Ao lado de Salwa, Iman participou na Revolução de 2011 e na fundação do Conselho Nacional de Transição da


ENTREVISTA

Depois de serem oprimidas por “ mais de 40 anos as pessoas estavam sedentas de poder. Mas, para mim, a Educação continuava a ser a chave para resolver tudo Líbia que governou o país durante e após a revolta, tornando-se porta-voz da nova instituição. Alguns meses após a queda do regime de Kadhafi, Iman também decidiu deixar o Conselho e regressar à universidade onde dava aulas, acreditando que “a maior revolução seria feita a partir da Educação”. Quando Salwa foi assassinada, Iman percebeu que toda a família envolvida na Revolução de 2011 não estava mais ao lado do Governo. Temendo pela vida rumou à Jordânia, dando início a uma longa viagem que teria Portugal como destino. A Líbia nunca deixou de estar presente na sua vida. Sonha regressar e “lutar pelos direitos e democracia que continuam a ser negados aos líbios”.

Como vive a pertença a um país ao qual pode nunca mais conseguir regressar? Vim para Portugal em 2016 com a minha filha, depois da minha irmã ser assassinada. Nós falámos, lutámos com palavras, em nome dos direitos humanos que nos estavam a ser negados, por liberdade, justiça, por uma constituição, depois do Governo abolir a que tínhamos. Acreditámos na causa, tal como continuo a acreditar hoje. Perdi uma parte da minha família em nome da liberdade e acredito que, um dia, ainda verei a Líbia liberta de tudo o que está a passar. Durante quarenta anos a vida foi muito difícil para nós. Kadhafi destruiu todas as organizações. Nós revoltámo-nos por bens essenciais e claro que ele não aceitou isso, até à morte. Depois da morte de Kadhafi, durante um ano e meio entrámos num tempo

amigável, tudo parecia estar a mudar e a caminhar para a paz. Era uma ilusão. O novo Governo tinha medo da força da revolução e perseguiu os apoiantes. Foi o caos. Quando saí da Líbia, fixei-me na Jordânia. Como tinha a minha filha comigo pensei que era a melhor opção porque ali ficava com visto de residência, devido à ligação política que existe entre os dois países. Nessa altura, a embaixadora Ana Gomes falou-me de Portugal e decidi vir para cá, porque percebi que regressar à Líbia não era possível. A um continente de distância da Líbia há outras lutas a travar? Fiz uma pós-graduação numa universidade do Reino Unido e uma especialização na Hungria, ambas reconhecidas em Portugal. E depois de um processo de avaliação, a minha licenciatura feita na Líbia também teve equivalência em Portugal. Então, fui convidada para dar aulas na universidade, mas não foi uma viagem fácil. Em Portugal a comunidade Líbia é pequena, conheço cinco a seis famílias. Não é um país fácil para os imigrantes, mas estou muito grata e penso sempre que a minha irmã, Salwa, não teve a mesma oportunidade. Mesmo tendo chegado a Portugal com o coração pesado, não queria deixar o meu país. Ainda quero voltar para ajudar, o meu lugar é lá. Apenas ainda não é o tempo certo para regressar. As revoluções levam tempo, levam décadas. Quando percebeu que seria a voz da revolução e mais tarde do Con-

selho Nacional de Transição da Líbia? A revolução foi espontânea. Kadhafi tinha destruído as organizações e o exército, então todo o movimento revolucionário avançou muito rápido. Nós percebemos que éramos responsáveis por aquela revolução e quem podia fazer algo, fez, assumiu a frente. O primeiro levante foi em frente ao porto [de Bengasi]. A maioria das pessoas que lá estavam eram advogados, juízes e professores que se conheciam e queriam formar uma associação [que viria a ser o Conselho Nacional de Transição da Líbia], sem qualquer experiência anterior a fazer algo similar. Como eu falo inglês, o papel de porta-voz da revolução surgiu de forma natural. Depois de serem oprimidas por mais de 40 anos, as pessoas estavam sedentas de poder. Mas, para mim, a Educação continuava a ser a chave para resolver tudo. Regressei à universidade, onde dava aulas, e tentei implementar algumas mudanças. Não foi fácil porque, após décadas de opressão, toda a gente queria a sua liberdade. O tempo era de mudança, mas sem restrições e sem diretrizes. Então veio o caos. VIVER SOB O SILÊNCIO Quando começaram as fações dentro do Conselho Nacional de Transição da Líbia os planos da Revolução de 2011 caíram por terra. O direito à educação e informação ficou comprometido, assim como o acesso igualitário a bens essenciais. O Governo diz que a segurança é a prioridade e continua a apoiar o | 09


armamento de milícias. Sem investimento na saúde e educação, a ajuda humanitária da comunidade internacional é urgente. Que país é a Líbia hoje? As coisas estão a ficar muito más outra vez. O nível de corrupção é elevado. Temos dois Governos, um a Oeste e outro a Este. Não sabemos quantas pessoas morreram nas cheias, quantos feridos, eles [o Governo] não dão essa informação. O que as pessoas de Derna dizem é que é possível que 30 mil pessoas tenham perdido a vida. Mas o Governo parou a contagem nas 4 mil mortes. É como se essas pessoas nunca tivessem existido, isso ceifa a dignidade humana. Agora há uma grande competição sobre quem ficará encarregue da reconstrução de Derna. O nível de destruição é grande e há famílias a viver na rua e a ajuda humanitária não chega. Na Líbia não estávamos habituados a isso. Havia pobreza, luta por direitos humanos, mas todas as pessoas tinham casa. Hoje, a Líbia tem 7 milhões de habitantes, é o quarto maior país de África, com muito minério e, apesar de todos estes recursos, as pessoas estão a sofrer. Os salários são pagos com dois ou três meses de atraso. O Governo só autoriza o levantamento de 300 a 400 dólares das contas bancárias particulares. Ninguém confia nos bancos, as pessoas que tinham depósitos não vão voltar a ter acesso ao seu dinheiro. Para levantar ou transferir pequenas quantias para o estrangeiro, dentro dos valores autorizados, é preciso fazer um pedido e aguardar em lista de espera, por dois a três anos. Em muitos lugares da Líbia, na zona Este do país, há uma grande opressão. Ninguém pode falar nas redes sociais, na rua ou no trabalho, porque alguém vai aparecer e levá-las ou matá-las ali mesmo onde estão, tal como fizeram à minha irmã. O exército foi destruído, mas o antigo regime tinha o hábito de colecionar armas. No tempo da revolução te10 |

mia-se que as portas dos armazéns fossem abertas e o povo se armasse para uma guerra civil. E as portas foram abertas e vimos as pessoas levarem mísseis antiaéreos para as suas casas e montarem-nos nos telhados, outras levaram tanques. Kalashnikov, toda a gente tem uma em casa. Não há Estado de Direito. Porque a ajuda humanitária não chega? Na Líbia a corrupção tornou-se uma cultura. Ninguém é punido. Já era assim antes da revolução e manteve-se depois. Ver isso é muito duro porque nós temos recursos, então questionamos: qual é o futuro que nos espera? Em vez de ser investido em Educação e Saúde, o dinheiro vai para outras coisas. O Governo foi fazendo algumas obras, aqui e ali, mas quando se tira a limpo, o panorama geral está muito longe do que é necessário construir. E ninguém pode falar. Passou pelos mais de 40 anos do regime de Kadafi, viu a guerra civil começar em 2014. Como esperava que os direitos dos líbios tivessem sido defendidos pela Organização das Nações Unidas? A Itália apoiou o Oeste da Líbia. A França apoiou o Este e o Egito também, porque queria estender as suas fronteiras para a Líbia. No Este do país, as milícias convidaram ainda a Rússia para as apoiar e agora têm bases e estenderam a sua ação ao sul do país. No Sul, a partir das fronteiras com o Níger, Chade e Sudão, a pressão da imigração ilegal foi e continua a ser elevada. A Europa sabe perfeitamente o que está a acontecer, que não há direitos humanos para os imigrantes ilegais. Não há direitos para nós, líbios, como pode haver para quem vem de outro país completamente desprotegido? É grande o interesse no território da Líbia, mais significativo que o interesse em defender e garantir direitos

humanos. Correm boatos sobre dinheiro que vem de diferentes pontos da Europa para as milícias comprarem armas. Em troca elas devem ajudar a travar a imigração ilegal. As milícias dizem que se armaram para combater o antigo regime, mas depois não quiseram entregar as armas. Só existe caos na Líbia por causa dessa força que as milícias foram ganhando, e ninguém faz nada para o impedir. É tudo uma questão de poder. Lentamente, as pessoas do antigo regime começaram a fazer contactos com quem estava no poder e regressaram ao Governo. Esta falta de ação de que fala, estende-se a outros pontos do mundo? Os direitos humanos da Declaração Universal são para quem tem cidadania. Vemos o que se passa entre África e França, na forma como os imigrantes ilegais são tratados. O que está a acontecer na Ucrânia há quase dois anos. Depois, os ataques na Palestina e em Israel onde mais uma vez são os civis que sofrem as consequências. Vemos tudo isto passar impune, sem uma ação firme e percebemos que garantir direitos humanos continua a ser um problema sem fim à vista.

A CULTURA EUROPEIA E A CULTURA ALÉM DO OCIDENTE Líbia, Egito, Palestina, Israel, Síria, Iraque, Irão, Afeganistão, Paquistão, Coreia do Norte, Rússia, Ucrânia, Turquia. O círculo de conflitos que se interligam pelas alianças que cada um destes países mantém exige muito aos recursos das Nações Unidas. As Nações Unidas não conseguem garantir a defesa de direitos humanos dentro da Europa quanto mais fora dessas fronteiras. A Líbia teve uma má experiência com as decisões vindas da Europa. Quando a NATO [Organização do Tratado do


ENTREVISTA

Atlântico Norte] criou uma zona de exclusão, próximo a Bengasi, os bombardeamentos intensificaram-se e muitos civis morreram. O que nos ficou dessa ação é que o Catar e os Emirados Árabes Unidos ficaram autorizados a intervir dentro de território líbio, para ajudar a NATO. Acreditando na diplomacia internacional, as Nações Unidas, a NATO, consideram que estão a criar as melhores alianças, mas, muitas vezes, só estão a deixar um país que está em guerra e devastado ainda mais vulnerável. Como descreveria a ação da Europa na defesa dos direitos humanos? São permissivas. Olhamos para o Direito Penal Internacional e o que vemos? Só palavras e depois silêncio. Acontece algo em plena Europa, Vladimir Putin invade um país, mata civis e ninguém faz nada definitivo para impedir. Incentiva-se que os países enviem, de forma independente, apoio militar para a Ucrânia. Recebem-se refugiados e nada mais, durante anos. Bush também instalou o exército americano em vários países, arrasou o Iraque. As Nações Unidas não fizeram nada. Até hoje ficam em silêncio sobre o assunto. Olhamos para a Palestina, a situação é a mais desesperante. Em Gaza não há abrigos, não há comida. Uma criança disse “eu quero morrer para ir para o céu” e quando perguntaram porquê, ela disse “porque eu quero pão e no céu há pão”. Quando tal acontece, pergunto: isto são direitos humanos a serem defendidos? O silêncio também é uma forma de alimentar o imperialismo. Quando diferentes culturas não encontram entendimento e causam milhares de mortes de civis, não é necessário que outros países intervenham com apoio militar? Tudo é apontado como culpa de conflitos culturais ou religiosos. Isso não é verdade. Na Líbia sempre tive-

Ansiosa por defender os direitos humanos e a democracia pelos quais lutou, Iman afirma que as Nações Unidas precisam agir

mos boas relações com a comunidade judaica. O problema foi quando a Europa decidiu recuperar uma zona de influência no Médio Oriente, que tinha perdido há centenas de anos. Deram terra a um povo e depois disseram, se tiverem problemas defendam-na. Isto é imperialismo e colonização. Ninguém fala sobre o facto de a Polónia incentivar a compra de vistos na Palestina. Há muitos judeus da Polónia a comprar vistos e a empurrar os palestinianos para fora das cidades, para campos de refugiados. Imaginem que alguém vai às vossas casas e depois de lá estar diz que as vai tomar. A seguir, mata as vossas crianças e vocês têm que ficar pacíficos, “portar-se bem”. No mundo de hoje considera que a Declaração Universal dos Direitos Humanos concretiza o propósito para o qual foi criada? Há uma grande diferença entre a ratificação da Declaração Universal

dos Direitos Humanos e a sua implementação. A Declaração Universal dos Direitos Humanos criou alicerces para a Humanidade, mas não tem em conta diferenças culturais entre povos. Implementa um modo de vida ocidental que não funciona em todos os lugares do mundo. Quando estas ideias ocidentais são impostas ou implementadas em países com uma grande diferença cultural, causam grande instabilidade. A Declaração foi feita sem consultar países fora da esfera ocidental. E a partir daí, até hoje, tem sido usada não só como a cartilha que o Mundo deve seguir, mas como uma arma para apontar e atacar. É quase como um show de civilização, o que a Declaração promove. Se és civilizado pertences ao grupo, se não és, ficas à margem da diplomacia mundial.

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A VIAGEM DO ‘PRÍNCIPE’

Criança-soldado na guerra civil da Libéria, Prince Tito ficou adulto nas ruas da cidade de Monróvia. Pensou que em Portugal conseguiria esquecer o passado.

Numa corrida contra o tempo, Prince Tito precisa renovar o passaporte para um dia, talvez, regressar à Libéria. Por agora, o documento é a chave para não se tornar invisível em Portugal. Texto Ana Martins Ventura / AMI Fotografia José Ferreira / AMI

“Agora, o meu país sou só eu! Não há muito que pensar, onde ir. E, na verdade, como iria?”. Prince Tito perdeu tudo quando acabou o trabalho prometido por quem o trouxe da Libéria para Portugal. Com o passaporte caducado, mesmo que um dia queira, não poderá regressar, e, em Portugal, tornar-se-á invisível. O Consulado da Libéria indica a renovação do documento deve ser feita em França. Uma viagem impossível. Talvez termine em Lisboa, a viagem 12 |

do ‘Príncipe’, que surpreende os companheiros de rua pelo nome e pela história. De casa ficarão apenas “memórias que se apagam” e talvez seja melhor. Na mais antiga república africana, “a vida também nem sempre era boa”. Vinte anos de guerra civil deixaram cicatrizes para outros vinte. “Não havia trabalho, nem comida”. Tal como Prince, uma geração inteira de príncipes e princesas, apenas no nome, formaram um exército de

crianças-soldado que serviram os reis da guerra e foram abandonadas nas ruas de Monróvia. Carpinteiro de profissão, Prince chegou a Portugal em 2009, para trabalhar na construção civil. “Trabalho pesado e pouco dinheiro lembrava a Libéria”. Só que, mesmo curto, o salário de pouco mais de 600,00 euros dava para alugar um quarto e até enviar algum dinheiro à família. Teve o primeiro contacto com o Centro Porta Amiga das Olaias há mais de uma década. Em 2022, começou a ser acompanhado em proximidade pela Equipa de Rua da AMI.


REPORTAGEM

Prince não tem condições para ir a “França renovar o passaporte e nem o poderia fazer desacompanhado ” Flávia Ricardo, assistente social, AMI

A covid-19 fez parar os “biscates” que ainda fazia na construção civil. Sem contrato e sem documentos de residência regularizados, esperou. Esperou e não voltou a ser chamado para o trabalho. Em pouco tempo, “sem dinheiro, a rua foi a única solução”. Quis procurar ajuda mas, “por estar sem documentosl, não conseguia apoios”. Prince “via o tempo passar” pelas ruas de Lisboa, quando umas pessoas chegaram e começaram a falar com o seu amigo Mateus. Era a Equipa de Rua da AMI. Mateus contou a história do ‘Príncipe’ que veio da Libéria e não tinha para onde ir. Trocaram as primeiras palavras em inglês e pela primeira vez em meses caiu a barreira linguística que deixava Prince isolado. Com a Equipa de Rua da AMI, Prince iniciou um processo junto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) para regularizar a sua situação no país. Enquanto o processo não fica concluído, a morada do Centro Porta Amiga das Olaias é a referência de Prince para ter acesso ao Rendimento Social de Inserção. Na longa viagem de Prince falta a conquista que o levará até uma nova casa, talvez até a recuperar o trabalho. “Se não deixar o consumo de álcool não conseguirá aceder a uma vaga num abrigo. É uma das condições”, explica Flávia Ricardo, assistente social que integra a Equipa de Rua da AMI em Lisboa. Mas, mesmo sem consumir, não poderá avançar no plano de vida sem renovar o passaporte.

IGUALDADE PERANTE A LEI A Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece nos artigos 7.º e

15.º que “todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei” e “todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade”. Parecem premissas inegáveis, mas estão longe da concretização para cerca de 10 mil imigrantes em situação irregular em Portugal sem possibilidade de regressar ao país de origem, seja devido a asilo ou questões financeiras. O passaporte, único documento de identificação que restou a Prince, está caducado e “o SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras] não responde, não é possível fazer uma marcação”, explica Flávia Ricardo. Em contacto com o Consulado da Libéria, a assistente social que acompanha o caso de Prince, foi informada pelo cônsul António Ferreira Carvalho que “é preciso ir a França, à embaixada mais próxima, para fazer o passaporte”. Sem dinheiro e apenas sabendo algumas frases em inglês, a assistente social tem a certeza, “Prince não tem condições para ir a França renovar o passaporte e nem o poderia fazer desacompanhado”. Em alternativa, a Equipa de Rua da AMI espera conseguir junto do Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) um Passaporte para Cidadãos Estrangeiros. Mas, para obter esse documento, o IRN exige que seja apresentado um título de residência.

Documento que Prince perdeu. Apenas tem uma cópia. E, “para pedir um novo título de residência, é preciso um passaporte válido”... Nos últimos meses, Beatriz Ferreira, psicóloga da Equipa de Rua da AMI, tem encontrado Prince de “semblante ainda mais carregado”. O fim da validade do passaporte “dificultará tudo ao Prince e deixará sem ação as equipas de intervenção social que o acompanharem”. Para Beatriz Ferreira tem sido “muito difícil ver uma pessoa ainda jovem a degradar-se de semana para semana, sem que nada mais possa ser feito”, pelo menos no momento. Perder o documento de identificação significa perder a continuidade do processo no SEF, o registo na Segurança Social e no Serviço Nacional de Saúde. Em pouco tempo, será como se Prince não existisse em Portugal. Entre 2020 e 2022, centenas de imigrantes ficaram em situação sem-abrigo na cidade de Lisboa devido a questões ligadas direta e indiretamente à pandemia. “Novos sem-abrigo”, assim foram chamados na época. Um ano e meio depois da pandemia ser dada como controlada em Portugal, estes imigrantes ainda não recuperaram casa ou trabalho e não conseguem regressar aos países de origem.

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UM LUGAR PARA CHAMAR MEU A histórias de vida de José Albino, Marta, Prince Tito e Mateus cruzam-se com a história do Centro Porta Amiga das Olaias. Aliás, ali encontraram respostas quando quase tudo falhou nos lugares onde antes procuraram ajuda e compreensão Texto Ana Martins Ventura / AMI Fotografia José Ferreira / AMI

Abrem-se portas. Quem chega traz no “bom-dia” a familiaridade de anos. No Centro Porta Amiga das Olaias (CPA) muitas histórias vão e voltam, na impossibilidade de encontrar outras soluções. Em 29 anos de portas abertas no coração do bairro “Portugal Novo”, mais de 20.000 pessoas encontraram no CPA Olaias apoio para momentos difíceis das suas vidas. 14 |

Um banho quente e uma muda de roupa para amenizar a aspereza da rua. Almoço sentado à mesa. Uma conversa para curar a solidão. Entregam-se cabazes alimentares. Há decisões a tomar sobre documentos que os beneficiários não têm e precisam, acompanhamento para consultas médicas. Apagam-se luzes, fecham-se portas. Amanhã tudo se repete.

Mateus (à esq.) e Prince Tito (centro), acompanhados pela Equipa de Rua da AMI

A rotina do CPA das Olaias é movimento contínuo na vida de José Albino. Naquela casa com 29 anos, instalada no centro do bairro “Portugal Novo”, o ex-militar encontrou o afeto e cuidado que procurou desde a infância e “um lugar para chamar meu”. Marta encontrou ali o apoio psicológico que precisava para “não desistir e continuar a tentar reunir a família”, depois de ter perdido a casa. Prince Tito espera, com a ajuda da equipa de intervenção social, conseguir renovar o documento que comprovará a sua identidade. Mateus vem pela refeição e banho quente, por uma muda de roupa. Pequenas coisas que valem muito nos seus dias.


REPORTAGEM

José Albino nunca “ teria passado a vida entre quartos alugados e a rua se a sua saúde mental tivesse sido devidamente acompanhada e a família estivesse presente

Flávia Ricardo, assistente social

SEM FAMÍLIA, ATÉ ENLOUQUECER A maior parte dos casos acompanhados pelo CPA das Olaias seriam evitáveis se as pessoas tivessem uma rede familiar. A assistente social Flávia Ricardo acredita que José Albino “nunca teria passado a vida entre quartos alugados e a rua se a sua saúde mental tivesse sido devidamente acompanhada e a família estivesse presente”. Hoje, representa um dos oito beneficiários a receber apoio psicológico regular no CPA das Olaias. No dia-a-dia, o serviço chega a muitos mais beneficiários, entre pedidos regulares e extraordinários, de janeiro a outubro foram realizados 121 acompanhamentos pelo serviço de psicologia. José Albino chega de manhã ao CPA, toma o seu banho, escolhe uma muda de roupa que seleciona com esmero porque sempre gostou de ter “bom ar”. Enquanto espera pelo almoço a que se seguirá uma consulta, puxa do cigarro e começa a contar: “Tenho 54 anos, estou farto da rua e dos hospitais. Perdi o quarto alugado e estou, novamente, na rua. Só depois de uma vida de surtos é que fui diagnosticado com Borderline”. O ex-militar tinha doze anos quando a mãe o colocou “fora de casa”, porque “era muito agressivo. Quando essas crises aconteciam “o companheiro da minha mãe fechava-me

numa arrecadação e dava-me a comida na tigela do cão. A vida era difícil. Vivíamos numa barraca no Lumiar”, conta José Albino. Procurou ajuda na Santa Casa da Misericórdia de Lisboa onde entregou a irmã, também colocada na rua pelos pais, e dali foi encaminhado para “uma instituição de rapazes, onde ficaria a morar e aprenderia o ofício de sapateiro”. Aos dezoito anos com “ordem de saída” sentiu-se “livre e, ao mesmo tempo, perdido na rua”. Começou a “roubar e traficar droga para comer, ter roupa e sapatos”. Depois de reencontrar um irmão, José Albino ainda dividiu casa com ele, mas “contrariado”. Não queria ver o irmão a obrigar a namorada a prostituir-se. Quando foi chamado para cumprir o serviço militar, pensou “nunca mais voltar”. Na recruta prestou provas para “ganhar uma boina verde” e assim ingressou na Força Aérea, colocado na Base das Lajes, nos Açores. A dureza do treino militar assemelhou-se a “uma tortura”. Afirma ter sido “treinado para matar” e foi durante esses treinos que entrou em surto psicótico. Quis disparar contra um oficial e foi enviado para o Hospital Júlio de Matos onde o diagnosticaram com “um esgotamento”.

Após a alta, José Albino fugiu para Espanha, onde perpetrou crimes de roubo e tráfico de droga, cumprindo penas em cinco estabelecimentos prisionais, de Sevilha, Barcelona e Madrid, até regressar a Portugal. Cada vez que cruza a porta do Centro Porta Amigas das Olaias, José Albino renova a esperança de ter uma casa e vai perguntando, “é agora que é a minha vez?”.

“DE REPENTE, FIQUEI SEM CASA” Marta representa o novo perfil das pessoas que desde 2022 começaram a recorrer a apoio alimentar. Não estão na rua, mas, por pouco. A especulação do mercado imobiliário mudou as suas vidas. Se antes conseguiam pagar contas e manter uma casa, hoje precisam de apoio para não chegarem ao ponto de passar fome. A partir do CPA das Olaias, 348 pessoas recebem apoio alimentar através de cabazes, o que representa 113 agregados familiares. Vítima da crise no mercado do arrendamento imobiliário em Portugal, onde “ninguém controla os astronómicos arrendamentos”, Marta ficou sem casa em dezembro de 2022. O proprietário do apartamento que arrendava disse que “não renovaria o | 15


Há muitas pessoas a morrer, “ na sombra, de fome e desprezo ” Marta, beneficiária do CPA Olaias

contrato porque precisava habitar a casa”. Mas, logo a seguir, o apartamento foi entregue a quem estava disposto a pagar o dobro. “E foi assim que, de repente, fiquei sem casa”, lamenta. “Teria ficado na rua, não fosse a solidariedade da mulher para quem trabalho hoje”. Pagou os 300,00 euros da renda de casa “sempre, sem falhar”. Mais do que isso era impossível. Ser prestadora de cuidados é o único trabalho que Marta consegue manter. A saúde deteriorou-se por causa de décadas de esforços nas limpezas, onde fazia turnos duplos, das 6h00 às 18h00, para não ganhar apenas 500,00 euros. Quando ficou sem casa, a sua nova empregadora disse que a podia hospedar, assim como ao neto. Outras netas ficaram em casa de uma amiga e a filha teve que dormir na rua. “O medo de ficar na rua de um momento para o outro é grande”, afinal a pessoa para quem Marta trabalha pode, a qualquer momento, suspender o vínculo. Para “não ser um peso para os outros” Marta pediu apoio alimentar, que recebe a partir do Centro Porta Amiga das Olaias. Também recebe pouco mais de 180,00 euros de Rendimento Social de Inserção e o abono do neto. Está à espera da reforma, mas aos 60 anos ainda deve esperar, para não ser muito penalizada. O seu trabalho de hoje é feito a troco de alojamento.

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Viver assim “é o fim, uma situação que nunca tinha considerado possível”, porque sempre trabalhou. Na sua vida, as palavras “direitos humanos” são apenas isso, palavras. Há muito tempo que não pensa naquilo a que tem direito e nunca conseguiu alcançar. Os netos, a filha, o medo, ocupam todos os pensamentos do dia. Portugal não está em guerra, não se disparam tiros, mas “há muitas pessoas a morrer, na sombra, de fome e desprezo”.

NOVOS PEDIDOS DE AJUDA, TODOS OS DIAS De janeiro a outubro de 2023, o Centro Porta Amiga das Olaias acompanhou 1.607 pessoas. No refeitório do CPA das Olaias são servidas, diariamente, refeições para 158 pessoas, o que representa 7.482 refeições de janeiro a outubro de 2023. O serviço de roupeiro, de janeiro a outubro, foi requerido para 484 pessoas, número que representa 224 agregados. E os balneários são utilizados regularmente por 94 pessoas. Nas ruas de Lisboa, mais tendas e outros abrigos improvisados surgem a cada semana, nos ângulos cegos das ruas, onde quem passa parece indiferente à nova paisagem urbana. Se em 2021 os Censos contabilizaram 241 pessoas em situação sem-abrigo na Grande Lisboa, em 2022, mesmo com o fim da pandemia e alguma recuperação económica, o número não diminuiu.

Ao número de pessoas que ficaram a viver na rua durante a pandemia, acrescem agora novos casos, gerados pela especulação imobiliária e pelo aumento exponencial do custo de vida. Uma população à qual a AMI dedica diariamente grande parte da sua atuação, enfrentando os desafios do número crescente de casos, sem desistir do alerta social para que sejam tomadas mais medidas e de forma mais assertiva. “Estamos perante uma população em situação sem-abrigo que há muito tempo comporta diferentes grupos da sociedade, mostrando-nos que esta problemática pode, a todo o momento, acontecer na vida de qualquer pessoa”, afirma Flávia Ricardo, assistente social da Equipa de Rua da AMI, em Lisboa. De janeiro a outubro, a Equipa de Rua da AMI de Lisboa acompanhou 223 casos, a quem realizou 862 atendimentos e encaminhamentos. Destes. 215 representam apoio à habitação. Prince habituou-se a ficar na sombra desde que partiu da Libéria para trabalhar em Portugal. Recorda como “as coisas correram mal, correram especialmente mal, durante a pandemia”, até que, sem trabalho, sem dinheiro, restou outra vez a rua. Depois o álcool. “É assim que ficamos”, descreve Prince, “anestesiados, para não pensarmos na família que não voltámos a ver, no julgamento ou descaso das pessoas que passam por nós na rua”. Sem dinheiro, sem acesso ao trabalho “não somos cidadãos, não temos como contribuir para a sociedade e somos deixados à margem”.


Fotografias © Timothy Lima

MUNDO

BIHARI, POVO DE GERAÇÕES APÁTRIDAS O Paquistão recusa-se a receber os Bihari no país que um dia consideraram seu. Hoje, sentem-se pessoas sem terra, sem raízes. Tentam conseguir a nacionalidade no Bangladesh e, só depois de mais de cinquenta anos, estão dispostos a assumir a língua bengali para superar barreiras culturais. Tareque Jabed, fundador da ONG Bangladesh Integrated Social Advancement Programme (BISAP), trabalha desde 1978 com o empoderamento da comunidade Bihari, desenvolvendo projetos educativos, de formação profissional e de assistência à saúde materno-infantil. Desde a pandemia, sente que “a vida desta comunidade no Bangladesh está finalmente a mudar, de forma profunda, com a abertura à aprendizagem do bengali e o incentivo para que as crianças sejam integradas nas escolas”. Depois de mais de cinquenta anos refugiados no Bangladesh, “os Bihari não têm opção, não há como voltar atrás,

ao antigo Paquistão, e não podem continuar a manter a distância no Bangladesh”. Em causa está o futuro das novas gerações, em suspenso, quando tanto o governo paquistanês como o governo indiano não aceitam a comunidade de volta, continuando a considerá-la traidora da pátria, mesmo as crianças, que nunca conheceram nada além dos muros dos bairros de lata de Chitaggong, a segunda maior cidade do Bangladesh, onde vivem cerca de 9 milhões de pessoas, a maior parte Bihari. “Para aqueles que já nasceram no Bangladesh, é aqui que a vida está a acontecer e, nos últimos anos, assistimos a uma grande mudança na vontade de integração, o que nos deixa felizes”, assume Tareque Jabed. Nos últimos cinco anos, a BISAP encaminhou 5.000 crianças da comunidade para escolas bengali. Através do projeto “Providenciar acesso inclusivo e fortalecimento económico aos refugiados e deslocados dos bairros de lata de Chitaggong”, com o apoio da AMI, a BISAP espera até fevereiro de 2025 mudar também a vida de mais 3.200 pessoas. | 17


Os Bihari não “ têm opção, não há como voltar atrás, ao antigo Paquistão, e não podem continuar a manter a distância no Bangladesh Tareque Jabed

Para já, o projeto de empoderamento económico através da preparação para o mercado de trabalho com formações na área da costura e das competências digitais e literacia em saúde “já chegou a 2.000 famílias”, garante Tareque Jabed. A intervenção da BISAP com o apoio da AMI é feita nos bairros de lata urbanos, nomeadamente em quatro campos de refugiados Bihari e nas comunidades de acolhimento locais à volta dos campos. Unidas com o propósito de mudar o destino de uma comunidade onde a extrema pobreza não permite um planeamento de vida além da sobrevivência diária, a BISAP e a AMI querem aumentar a resiliência dos Bihari, para que consigam enfrentar situações de crise extrema, como a que a Covid-19 provocou. Depois da pandemia, a literacia em saúde é tão urgente quanto o empoderamento económico e profissional. A situação das mulheres e crianças é particularmente preocupante: além da malnutrição, outras causas da mortalidade infantil são o tétano, as infeções respiratórias, doenças diarreicas e sarampo. AMI e BISAP defendem que a prevenção e cura desta elevada morbi-mortalidade deve ser realizada através da vacinação, melhor higiene e alimentação adequada, bem como cuidados de saúde direcionados. Por isso, o projeto bilateral. que une uma vez mais Portugal e Bangladesh, inclui ainda a deslocação de um médico em clínica móvel e a distribuição de ajuda alimentar. 18 |

PELA CULTURA PAQUISTANESES, PELA SOBREVIVÊNCIA BENGALIS Muçulmanos indianos, os Bihari emigraram para a área Oriental do Paquistão durante a Guerra indo-paquistanesa, em 1971, e logo nessa época começaram a ser discriminados. A língua tornou-se uma grande barreira à integração social. Pela língua urdu ainda estavam ligados ao Paquistão Ocidental, mas estavam no Paquistão Oriental de língua bengali. Com o fim da guerra, essa região passou a integrar o Bangladesh e os Bihari passaram a ser ainda mais discriminados e atacados, considerados como traidores da pátria. Alvo de violência política, perderam os seus bens, o trabalho e tornaram-se sem-abrigo e apátridas. Além da discriminação por serem considerados como traidores da pátria, a língua foi uma das grandes barreiras à integração da comunidade. Mais de cinquenta anos depois, continuam a viver em campos de refugiados sem condições de habitação, higiene e saúde pública.


BREVES

© José Ferreira / AMI

Nacional_

Aumentam de forma crítica os pedidos de bens essenciais e os casos de pessoas em situação sem-abrigo No primeiro semestre de 2023 o número de novos beneficiários da AMI aumentou 33%, reflexo da “vulnerabilidade vivenciada pelas famílias que tem vindo a ser agravada pelo aumento das despesas com alimentação”, afirma Ana Ramalho, diretora do Departamento de Ação Social da AMI. Foram 8.661 os atendimentos, acompanhamentos e encaminhamentos realizados no primeiro semestre de 2023 a 6.772 pessoas, das quais 1.154 procuraram o apoio da AMI pela primeira vez, o que representa o aumento de 33% em relação ao período homólogo de 2022. Também no primeiro semestre de 2023, a AMI acompanhou 1.020 pessoas em situação sem-abrigo, número que representa um aumento de 8%. Destas, 278 representam novos casos, o que significa um aumento de 57% face ao primeiro semestre de 2022.

Candidaturas Linka-te aos Outros Estão abertas, até 20 de dezembro, as candidaturas ao Prémio “Linka-te aos Outros”, uma iniciativa dirigida a todos os jovens que estejam a frequentar a escola entre o 7º e o 12º ano de escolaridade, e que consiste na apresentação de propostas para resolução de problemas locais que os jovens detetem na sua comunidade. Todas as propostas devem incluir uma componente de voluntariado. A AMI selecionará os projetos mais consistentes (no máximo 5) e financiará 90% dos mesmos, até um total de 2.000,00 euros Os restantes 10% do orçamento apresentado terão de ser conseguidos pelos próprios jovens através do apoio de colegas, professores, pais, na escola e também junto de empresas, instituições comércio local. Mais informações em ami.org.pt ou através do email linkateaosoutros@ami.org.pt

Fundo Universitário AMI atribui 50 bolsas de estudo A 9ª edição do Fundo Universitário AMI, uma bolsa de apoio social no valor de €700, que se destina a apoiar o pagamento de propinas de estudantes que estejam a frequentar cursos de licenciatura ou mestrado em instituições de ensino superior públicas, atribuiu 50 bolsas de estudo, das quais 36 licenciaturas e 14 mestrados. Inscritos em estabelecimentos de ensino de norte a sul do país, os bolseiros são de nacionalidade portuguesa,

angolana, cabo-verdiana, equatoriana e guineense e frequentam cursos nas áreas do Ambiente, Arquitetura, Artes, Ciências Sociais, Ciências, Engenharia, Saúde e Tecnologias da Informação. Desde 2015 já foram apoiados mais de 400 estudantes universitários.

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Internacional_

Fundo Emergência Catástrofes O mundo está em ebulição e não há como ignorar, nem olhar para o outro lado, porque não existem lados. Existem apenas vítimas. “A cada cinco minutos morrem cinco pessoas.” É a estimativa do impacto do conflito israelo-palestiniano na Faixa de Gaza, segundo a organização Juhoud, nosso parceiro em Gaza. Alimentos, água, medicamentos e outros bens básicos são escassos ou já não estão disponíveis. Face a este contexto, a AMI decidiu apoiar a organização palestiniana Juhoud for Community and Rural Development, sedeada em Ramallah na Cisjordância, mas com uma equipa local em Gaza. A ajuda consiste, numa primeira fase, na distribuição de água, alimentos, kits de higiene, kits menstruais e outros bens de primeira necessidade, no valor de 10.000,00 euros.

Países de expressão portuguesa_

Marrocos_

Academia da AMI promove inovação e diálogo sobre Saúde

Entre os dias 15 e 28 de setembro, a AMI realizou uma campanha de angariação de fundos devidamente autorizada pelo MAI para apoiar as vítimas do sismo que assolou Marrocos a 8 de setembro. A campanha permitiu angariar 180 euros na conta à ordem PT50 0007 0015 0040 0000 0067 2, durante o período autorizado, aplicados na aquisição de casas modulares (num montante total de 39.270,04 euros doados à AMI, dos quais 33.315 euros através dos pontos dos clientes MEO) para as famílias que estão a viver provisoriamente em tendas, e que foram asseguradas através da associação parceira no terreno, Alofoq. A organização Alofoq presta apoio a famílias carenciadas, contribui para a escolarização das crianças (distribuem refeições para que não faltem à escola), e presta apoio também ao nível da saúde.

A decorrer até junho de 2025, o projeto Academia de Inovação e Diálogo by AMI promove a partilha de conhecimento entre organizações que desenvolvem projetos na área da saúde e direitos sexuais e reprodutivos em países de expressão portuguesa. Até 20 de dezembro estão abertas as inscrições para o Ciclo de Formação da Academia de Inovação e Diálogo by AMI sobre “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, “Saúde e Direitos Sexuais e Reprodutivos”, “Gestão de Projetos”, e “Inovação Social”. Uma iniciativa para organizações de países de expressão portuguesa, com intervenção na área da Saúde e Direitos Sexuais e Reprodutivos, a Academia de Inovação e Diálogo by AMI tem um orçamento de 125.370,00 euros, a partir do qual será possível financiar cinco projetos inovadores. As candidaturas para financiamento de projetos estão previstas de maio a junho de 2024 e a implementação dos projetos está planeada de setembro de 2024 a maio de 2025.

Campanha de angariação de fundos

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BREVES Mecenato_

Missão Natal 2023 Neste Natal, a AMI quer continuar a estar presente na vida de todos aqueles que precisam do seu apoio ao longo de todo o ano. Há várias formas de apoiar esta Missão, desde financiar um cabaz de bens alimentares e parte do acompanhamento social para 1.991 famílias em Portugal; apoiar uma missão internacional; concretizar um desejo a uma ou mais crianças ou idosos em Portugal; contribuir de forma regular para apoiar um projeto da AMI em Portugal (Continente e Ilhas) através da doação de bens, dinheiro ou tempo; ou comprar um presente solidário na loja online da AMI. Um agradecimento especial a todos os parceiros que,

até à data de fecho desta edição, já contribuíram para esta Missão, nomeadamente, Brandcare, Continente, CPDI, CP, Creativeminds, Esporão, Fundação Ageas Agir com o Coração, Fundação EDP, Gavex, Gavdi Portugal, Grace, Hipoges, Horto do Campo Grande, Imperial, Infraestruturas de Portugal, Maxdata Software, Petrotec, Plural+Udifar, RAR, Sage, Sovena, Teifil e Unicre.

Reflorestar o Pinhal de Leiria através do projeto Ecoética “Vamos pintar Portugal de verde” é o desafio lançado pela AMI com o projeto Ecoética, que, ao longo de mais de uma década, já permitiu reabilitar e reflorestar mais de 400.000 m² de terreno com cerca de 30.000 árvores, sobretudo em áreas devastadas por incêndios florestais. A dedicação do Ecoética como veículo para a reflorestação de áreas ardidas teve início em 2017, após os grandes incêndios que devastaram a região centro do País. A próxima ação de reflorestação na Mata Nacional de Leiria está agendada para o primeiro trimestre de 2024, com o objetivo de reflorestar cinco hectares de floresta destruída por incêndios, o que equivale à plantação de 5.000 árvores. A recuperação de 1 m2 quadrado de terreno custa aproximadamente 1 euro e com 10 euros, é possível plantar uma árvore e fazer a sua manutenção durante os primeiros 5 anos de vida.

AMI promove cuidados de saúde para famílias O Cartão de Saúde AMI proporciona um conjunto de vantagens aos seus aderentes em medicina dentária, exames médicos, cirurgia geral ou estética e assistência de ambulatório, parto, incluindo, ainda uma rede de cuidados de saúde animal. E, independentemente do número de pessoas agregadas ao cartão, o valor é sempre o mesmo, sendo possível escolher a modalidade trimestral de 53,25€, 100,50€ semestrais ou a anuidade de 189,00€. As regalias do cartão de saúde AMI são todas extensíveis aos elementos do agregado familiar, num máximo de 6 pessoas por cartão. As condições de adesão ao Cartão Saúde AMI podem ser consultadas em ami.org.pt. As receitas deste produto solidário contribuem para financiar as missões da AMI em Portugal e no mundo. | 21


AGENDA AMI 14 A 22 DEZ Entrega dos cabazes de Natal

AVENTURAS SOLIDÁRIAS 2024 • 26

Senegal • 27

ATÉ 20 DEZ Candidaturas Linka-te aos Outros

ABR A 5 MAI OUT A 2 NOV

Açores • 26

NOV A 5 DEZ

Guiné-Bissau

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INFORMAÇÕES

NECESSIDADES ATUAIS DE VOLUNTARIADO Voluntariado Nacional Lisboa Feira de Natal - Lisboa, dias 16 e 17 Dezembro CPA, Abrigos e Apoio Domiciliário Médicos medicina geral, psiquiatria, psicologia. Enfermeiros e informáticos CPA Cascais Atividades de férias de Natal, Páscoa e verão CPA Chelas Lecionar aulas de canto à comunidade sénior CPA Porto Distribuição alimentar Lisboa, Almada, Cascais, Coimbra, V. N. Gaia e Porto Apoio na recolha de bens essenciais 2 e 3 de março de 2024 nos supermercados ALDI

Voluntariado à Distância Confeção de Taleigos Amigos

Teambuilding Empresarial CPA Almada, Angra do Heroísmo, Cascais, Coimbra, Funchal, Lisboa, Porto e V. N. Gaia Financiamento e distribuição de cabazes natalícios aos beneficiários da AMI no âmbito da Missão Natal Peddy Paper ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável Delegação da AMI Porto Reciclagem e Triagem de Radiografias Pinhal de Leiria Financiamento e participação em ação de reflorestação no primeiro trimestre de 2024

Para apresentação de propostas, por favor, contacte-nos através do e-mail

voluntariado@ami.org.pt

[FICHA DE CANDIDATURA ONLINE]

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