V@rvItu Edição 13 - Setembro 2024

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SUMÁRIO

EDITORIAL

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7 J. M. CALLEJA: INTERFACES DA POESIA: ARTES, TECNOLOGIAS E DESIGN GRÁFICO. Jorge Luiz Antonio. pdf Baixar

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O PERCURSO ONOMASIOLÓGICO USADO EM UM DICIONÁRIO DE IDIOMATISMOS REVELANDO A CULTURA POR MEIO DO LÉXICO. Erica Schmidt e Huélinton Cassiano Riva.

REFLEXÕES SOBRE A EXPERIÊNCIA DO CURSO DE EXTENSÃO “ENGLISH TO FACE INEQUALITIES”:

MOBILIDADE SOCIAL E DESENVOLVIMENTO DO CAPITAL CULTURAL DE ALUNOS DA FATEC ITU E COMUNIDADE EXTERNA. Thômas Felipe Rodrigues e Emerson Freire.

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82

USO DE EMBALAGENS DE REFIL COMO PRÁTICAS DE SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL EM EMPRESA BRASILEIRA DE COSMÉTICOS. Dhebora Souza Umbelino Silva, Geysa Aparecida Jacobassi Bortolucci e Jane Regina Costa Souza.

ANÁLISE DAS CONEXÕES ENTRE A AGENDA GLOBAL E A AGENDA NACIONAL NO QUE DIZ RESPEITO À

GARANTIA DA QUALIDADE DE VIDA E AO RESPEITO AO MEIO AMBIENTE. Ana Carolina Ribeiro da Silva.

101 O IMPACTO DA GESTÃO DA POLÍTICA DE COMÉRCIO EXTERIOR SOBRE A ATIVIDADE ECONÔMICA E O MERCADO DE TRABALHO. Cristiane Meire dos Santos, Graziele Viana dos Santos e Thiago Santana Teles

117

FINTECHS: um estudode impactos sobre a satisfação de clientes e funcionários. Áurea Adalgisa da Silva, Mylena Amanda de Souza e Taina Naioma Machado Leal.

138 SUSTENTABILIDADE E TECNOLOGIAS

SOCIOAMBIENTAIS: Desenvolvimento de aplicativo digital para identificação e continuidade de projetos ambientais. Gustavo Henrique Patricio e Juliana Augusta Verona.

154 ESCOPO, POLÍTICA EDITORIAL E NORMAS DE SUBMISSÃO.

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ITU/SP – No . 13, setembro de 2024

EDITORIAL

É com imensa alegria e satisfação que publicamos o número 13 da V@rvItu – Revista de Ciência, Tecnologia e Cultura da Fatec Itu. Em sintonia com seu objetivo de ser um veículo difusor de ideias que favoreçam a reflexão sobre o papel da ciência e da tecnologia, este número nos brinda com textos sobre variados temas. Ao contemplar contribuições da área tecnológica, científica e cultural, esta edição também faz jus ao caráter multidisciplinar da revista, que garante espaço para discussões relativas às diferentes áreas do conhecimento.

Comesteespírito,aediçãoseabrecom consideraçõesarespeitodaobradeJ.M.Calleja, poeta visual espanhol contemporâneo. Com base na comunicação poética, o artigo procurou explicar as diferentes maneiras como Calleja explorou o design gráfico e as tecnologias para performances poéticas de diversas maneiras.

O Artigo 2 analisa a cultura expressa na língua a partir da análise da obra Dicionário das expressões mais usadas no Brasil: organização onomasiológica. Partindo do entendimento segundo o qual a cultura se constitui e se difunde por meio da língua e que é também por meio dela que ocorrem os processos de estruturação de identidades, os autores propõem uma reflexão a respeito da interdependência entre língua, linguagem, identidade e cultura.

O Artigo 3 discute o potencial de um curso de inglês para a mobilidade social e desenvolvimento cultural de alunos de uma Instituição de Ensino Superior, que se utiliza de material didático enquanto instrumento decolonizador e facilitador da mobilidade social. Para além da relevância do tema, compreende-se por meio do texto a necessidade de elaboração de materiais didáticos com recortes temáticos voltados para a decolonização.

Os dois artigos seguintes deslocam a discussão para a questão da sustentabilidade. O Artigo 4 propõe uma análise da percepção dos clientes quanto ao uso de embalagens de refil no setor de cosméticos, por meio do qual revelou uma correlação entre a embalagem comercializada e as ações de sustentabilidade ambiental. O Artigo 5 explora os resultados dos ODM, com foco no Objetivo 7, cuja meta era assegurar qualidade de vida e respeito ao meio ambiente, por meio do qual mostrou avanços em relação a várias das metas estabelecidas, mas mostrou ser imprescindível novas agendas que possam garantir e melhorar os bons resultados e reverter aqueles que deixaram a desejar ou que não foram alcançados.

Os dois artigos seguintes deslocam mais uma vez a discussão, desta feita para questões socioeconômicas. O primeiro avalia o impacto das políticas de comércio exterior sobre a

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atividade econômica e o mercado de trabalho. Além de revisitar teorias do comércio internacional, discute os seus instrumentos e efeitos e faz uma análise da política comercial brasileira, contrapondo a década de 1990 com a década de 2000. O segundo analisa o impacto das Fintechs na transformação do setor bancário brasileiro.

A V@rvItu tem como princípio fomentar a produção de jovens pesquisadores. Neste sentido, fechamos a edição com uma adaptação de um Trabalho de Conclusão de Curso, da área de Desenvolvimento de Sistemas, que reflete a construção de um aplicativo que busca elencar e promover projetos socioambientais com vistas a estimular o desenvolvimento sustentável a partir da Instituições de Ensino Superior.

Convidamos você, caro leitor, a enriquecer seus conhecimentos, por meio destes valiosos textos, com a certeza de que seus horizontes serão ampliados...

Conselho Editorial

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Albano Geraldo Emilio Magrin (UFSCar-Sorocaba)

Alexandre Schuster (FATEC Itu)

Angelina Vitorino de Souza Melaré (FATEC Itu)

Antonio Tadeu Maffeis (FATEC Itu)

Carla Pineda Lechugo (FATEC Sorocaba/UNISO)

Danilo Luiz Carlos Micali (FATEC Itu)

Diane Andréia de Souza Fiala (FATEC Itu)

Eduardo Tadeu Gonçalves (FATEC Itu)

Francisco Bianchi (FATEC Itu)

Francisco Carlos Benedetti (FATEC Itu)

Glauco Todesco (FATEC Itu)

José Henrique Teixeira de Carvalho Sbrocco (FATEC Itu)

Juliana Augusta Verona (FATEC Itu)

Laerte Fedrigo (Fatec Itu)

Lilian de Souza ((Fatec Itu)

Lucimar Canônico de Santi (FATEC Itu)

Luís Cláudio dos Santos (FATEC Itu)

Maria Augusta Constante Puget (FATEC Itu)

Maria Eliana Gomes Cardim de Queiroz Guimarães (FATEC Itu)

Maria Margarida Massignan de Almeida (FATEC Itu)

Paulo César de Macedo (FATEC Itu)

Ricardo Roberto Leme (FATEC Itu)

Rosa Maria Marciani (FATEC Itu)

Silma Carneiro Pompeu (FATEC Indaiatuba)

Vera Márcia Gabaldi (FATEC Itu/Indaiatuba)

Pareceristas deste número

Adalberto Zorzo

Ana Paola Matiasso Cruz

Célio Aparecido Garcia

Diane de Souza Fiala

Evaristo Almeida

Fernanda Conceição Alves Pereira

Giancarlo Aquila

Heraldo Marcio de Aguiar

Janaina Stella de Sousa

Jorge Luiz Antonio

Juliana Augusta Verona

Julio Cesar Zorzenon Costa

Marcio José Pereira de Camargo

Nilvo Aparecido Colucci

Paulo Henrique Leme Ramalho

Sergio dos Santos Clemente Junior

V@rvItu –

Revista de Ciência, Tecnologia e Cultura da FATEC Itu

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Normalização

Laerte Fedrigo e Lilian de Souza

Diagramação

Laerte Fedrigo

Capa

Concepção e Montagem: Jonas de Carvalho Santos e Laerte Fedrigo, a partir de fotos coletadas do Site da Revista Agropecuária, do Instagram de @marcelocaumors e de Kittipong Somklang/Shutterstock.

Ficha catalográfica

Revista V@rvItu – Revista de Ciência, Tecnologia e Cultura da FATEC

Itu. n. 13 (set. 2024) –. – Itu: Faculdade de Tecnologia de Itu Dom Amaury Castanho, 2012–.

Anual

Resumo em português/inglês/espanhol

Modo de acesso: http://www.fatecitu.edu.br

ISSN: 2316-2287 (eletrônica)

1. Ciência. 2. Tecnologia. 3. Cultura. 4. Inovações tecnológicas. I. Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza. II. Faculdade de Tecnologia de Itu.

O teor, a formatação e a revisão textual de cada artigo são de inteira responsabilidade do(s) respectivo(s) autor(es). As ideias e opiniões expressas nos artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo, necessariamente, as opiniões da FATEC Itu. A originalidade dos artigos é de responsabilidade dos autores, que também são responsáveis pela funcionalidade dos links fornecidos e pela qualidade gráfica das figuras e imagens.

Endereço:

V@rvItu – Revista de Ciência, Tecnologia e Cultura da FATEC Itu

Faculdade de Tecnologia de Itu Dom Amaury Castanho

Editor: Prof. Laerte Fedrigo

Av. Tiradentes, 1211 - Bairro Parque das Indústrias -13309-640 Itu - SP

fone/fax: (011) 4013-1872

revista.varvitu@fatec.sp.gov.br

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J. M. CALLEJA:

INTERFACES DA POESIA: ARTES, TECNOLOGIAS E DESIGN GRÁFICO1

Jorge Luiz Antonio2

Resumo. Este artigo aborda aspectos da obra de J. M. Calleja, poeta visual espanhol contemporâneo, procurando compreender sua comunicação poética por intermédio das interfaces da poesia com as artes, as tecnologias e o design gráfico. A pesquisa teve por objetivo apresentar a obra do poeta espanhol para os brasileiros que apreciam poesia experimental. Com acesso a quase totalidade das obras, foi possível fazer uma pesquisa bibliográfica, escolher os aspectos mais importantes, com base na comunicação poética, explicando as maneiras como o poeta experimental trabalhou com o design gráfico, sua profissão (ilustrador de livros), o uso de tecnologias, inclusive digitais, e como explorou performances poéticas de diversas maneiras. Nas obras escritas em catalão, o poeta trouxe contribuições importantes para explicar a arte e a cultura catalãs. Inúmeras ilustrações permitiram a compreensão da obra experimental aos leitores. O desafio de comentar a obra de um autor vivo, com quem se mantém contato pessoal e internético, ofereceu a oportunidade de conversar sobre a criação poética.

Palavras-chave: Literatura Espanhola – Poesia Contemporânea – Séculos XX e XXI - Poesia Experimental – J. M. Calleja

Resúmen. J. M. Calleja: Las interfaces de la poesía: Artes, tecnologías y diseño gráfico. Este artículo aborda aspectos del trabajo de J. M. Calleja, poeta visual español contemporáneo, y busca comprender su comunicación poética a través de las interfaces de la poesía con las artes, las tecnologías y el diseño gráfico. La investigación tuvo como objetivo presentar el trabajo del poeta español a los brasileños que aprecian la poesía experimental. Con el acceso a casi todos los trabajos, fue posible hacer una amplia investigación bibliográfica, elegir los aspectos más importantes, basados en la comunicación poética, explicando las formas en que el poeta experimental trabajó con el diseño gráfico, su profesión (ilustrador de libros), el uso de tecnologías, incluida la digital, y cómo exploró las actuaciones poéticas de muchas maneras. En las obras escritas en catalán, el poeta trajo importantes contribuciones para explicar el arte y la cultura catalán. Numerosas ilustraciones permitieron la comprensión del trabajo experimental para los lectores. El desafío de comentar el trabajo de un autor vivo, con quien se mantiene contacto personal e internético, ofreció la oportunidad de hablar sobre la creación poética.

1 Esta pesquisa não foi possível sem o apoio das seguintes pessoas, as quais agradecemos: In Memoriam - Cesar Horácio Espinosa Vera(1939-2022), poeta experimental mexicano, aquem presto uma homenagempóstuma. Essa pessoa simpática e culta, queme convidou para a Bienal e me permitiu apreciar a arte postal, a poesia experimental mexicana e com que pude trocar ideias sobre poesia experimental durante a última Bienal Internacional de Poesia Visual e Experimental, na Cidade do México, em 2009; Araceli Zùñiga, esposa de Espinosa Vera, que nos recebeu muito bem durante os dias em que estivemos na Cidade do México; J. M. Calleja, que traduziu os poemas com títulos em catalão, língua que leio com dificuldade, sempre com a ajuda de dicionário, e que me autorizou a estudar a sua obra poética; Sabina Calleja, filha do poeta experimental espanhol, que gentilmente cedeu duas fotos para este artigo; Clemente Padin, poeta experimental uruguaio, que me permitiu a oportunidade de conhecer J. M. Calleja durante o II Encuentro de Poesia Experimental (2008), em Montevidéu, Uruguai; John M. Bennett, poeta experimental norte-americano, com quem aprendi muito sobre poesia e cultura mexicanas durante os quinze dias em que estivemos na Bienal do México e em outras oportunidades nos EUA e em Buenos Aires; Catherine M. Bennett, esposa de John M. Bennett, poeta visual e artista; Profa. Me. Maria Beatriz de Souza Almeida Delduque, que trouxe orientações importantes no momento em que redigia o trabalho de conclusão de curso de graduação em espanhol; e Profa. Sueli Heloisa Doriguetto Ferreira, que me orientou na elaboração do projeto de pesquisa. 2 Professor universitário, formado em Letras (Português / Inglês / Espanhol) e Filosofia, lato sensu em Literatura, mestrado e doutorado em Comunicação e Semiótica (PUC SP) e pós-doutorado em Teoria Literária (UNICAMP). E-mail: jlantonio@uol.com.br

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Palabras clave: Literatura Española – Poesía Contemporánea – Poesía Visual – Siglos XX y XXI - J. M. Calleja.

Abstract. J. M. Calleja: The Interfaces of Poetry: Arts, Technologies, and Graphic Design. This article presents aspects of J. M. Calleja's work, a contemporary Spanish visual poet, seeking to understand his poetic communication through the interfaces of poetry with the arts, technologies, and graphic design. The research aimed to present the work of the Spanish poet to Brazilians who appreciate experimental poetry. With access to almost all of his works, it was possible to do wide bibliographic research, choose the most important aspects, based on poetic communication, explain the ways the experimental poet worked with graphic design, his profession (book illustrator), the use of technologies, including digital ones, and how he explored poetic performances in a variety of ways. In the works writteninCatalan,thepoetbroughtimportantcontributionstoexplainCatalanartandculture.Numerous illustrations allowed the understanding of the experimental work to readers. The challenge of commenting on the work of a living author, with whom it is possible to maintain personal and online contact, offered the opportunity to talk about poetic creation.

Keywords: Spanish Literature – Contemporary Poetry – XXth and XXI Centuries – Experimental Poetry – J. M. Calleja

1 Introdução

Esta pesquisa tem um percurso histórico. Desde o início do curso de graduação em Espanhol, em fevereiro/2017, na Universidade de Uberaba (UNIUBE), já tinha em mente dois temas interessantes sobre a Literatura Hispano-Americana Contemporânea para o trabalho de conclusão de curso:

a) breve estudo sobre a contribuição das Bienais Internacionais de Poesia Visual e Experimental, realizadas na Cidade do México, no período de 1985/1986 a 2008/2009, sob a curadoria de Núcleo Post-Arte, César Espinosa Vera (1939-2022), Araceli Zúñiga e outros; e b) um estudo de alguns aspectos da obra de J. M. Calleja, poeta visual espanhol contemporâneo, que conheci no II Encuentro de Poesía Experimental, sob a curadoria de Clemente Padin, em Montevidéu, Uruguai, em 2008.

O contato com esses temas foi o resultado dos estudos durante o doutorado em Comunicação e Semiótica – Signos e Significação nas Mídias, na PUC SP, de 2000 a 2005, sob a orientação da Profa. Dra. Irene de Araújo Machado, e a continuação, que ocorreu durante o pós-doutorado em Teoria Literária no Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP, de 2009 a 2012, com bolsa FAPESP, sob a supervisão do Prof. Dr. Paulo Elias Allane Franchetti. Esses temas são significativos para a compreensão da literatura contemporânea, especialmente da poesia em suas interfaces com as artes, as tecnologias e o design.

A Bienal, em sua décima edição em 2008/2009, reuniu os representantes da poesia experimental e visual contemporâneas de vários países, cujos processos criativos tiveram início a partir dos anos de 1950, com o movimento internacional da poesia concreta. Também houve umaexposiçãodaartepostaldesdeosseusprincípios.Opoetaespanholéumdosrepresentantes

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desse movimento e é um dos poetas que mais participam dos congressos, bienais, encontros e exposições até os dias atuais.

Em virtude das características do curso de graduação e do tempo destinado a cada disciplina, que é bimestral, optei pelo segundo tema: um pequeno estudo das relações da poesia de J. M. Calleja com as artes (artes visuais e performance) e com o design gráfico. Pesou nessa decisão o fato de que Calleja, que conheci em Montevidéu, em 2008, e com quem venho mantendo contínua correspondência até os dias atuais, me convidou para apresentar sua obra mais recente, Huellas (Calleja, 2013), no lançamento que ocorreu na Cidade do México em 2014. Infelizmente não pude comparecer, por motivos acadêmicos (estava lecionando numa instituição de ensino superior e não podia me ausentar das aulas por uma semana). Também foi decisivo na escolha o envio, pelo autor, de uma parcela bastante significativa de suas obras.

J. M. Calleja, nome artístico de Josep Manuel Calleja Garciahttp://www.jmcalleja.com/ - nasceu em Mataró (Barcelona) em 7 de junho de 1952, é poeta visual eperformerqueveio domundo daimagem (fotografiaecinema),pois fezdiversos filmes experimentais (s.8m/m) durante os anos de 1976-1981. Tem participado ativamente em diferentes encontros e exposições nacionais e internacionais de poesia experimental e visual: Barcelona, Valencia, Madrid, Córdoba, Sevilla, Tarragona, Pontevedra, Mérida, Lleida, Roma, Paris,SãoPaulo,México,Seul,Belgrado,Stuttgart,Lisboa,Berlim,BuenosAires,Montevidéu, etc. Tem realizado instalações e exposições individuais, tem coordenado diferentes encontros de criadores, cujos resultados se encontram em catálogos e livros. Também criou e coordenou ações poéticas, cujas principais foram em Mataró (1984 a 1986), Lleida (1985), Prada (1985), Peñíscola (1989), Madrid (1989, 1996 e 1999), México (1990 e 1993), Milão (1990), Barcelona (1991, 1998, 1999, 2000 e 2001), Tarascon (1992), Toulouse (1993), La Rochelle (1994), Girona (1995), Oviedo (1996), Turón (2000), São Paulo (2000), Belo Horizonte (2000) e Rio de Janeiro (2000).

Ilustração 1 – J. M. Calleja

Fonte: Foto de Sabina Calleja, feita em 17.05.2015, gentilmente cedida para este artigo.

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Além do meu interesse pessoal pelo tema e de tempo disponível para a realização do trabalho de pesquisa, trata-se de um estudo que precisa ser mais divulgado no Brasil e além dos limites do que vem sendo realizado nas pós-graduações lato sensu e stricto sensu das universidades públicas e particulares, pois a visualidade e a audiovisualidade são fatores preponderantesnaculturadesdeofinaldoséculoXIXatéosdiasatuais,comodemonstraMoles (2005) em sua obra sobre o cartaz e o anúncio publicitário.

A partir dos conceitos de poesia visual e de poesia experimental, que vem sendo desenvolvido pelos estudiosos desse tipo de poesia contemporânea (Abraham Moles, Clemente Padin, Philadelpho Menezes e Omar Khouri, entre outros), esta pesquisa propõe estudar como J. M. Calleja estabelece as interfaces entre a poesia verbal com as artes, o design gráfico e as tecnologias.

O principal objetivo deste artigo é apresentar a obra de J. M. Calleja aos leitores brasileiros, especialmente para aqueles que não estão familiarizados com a poesia visual, também conhecida como poesia experimental. Para que essa apresentação seja eficiente, faz-se necessário oferecer uma visão de alguns conceitos de poesia visual e de outras denominações, dentre as quais predomina a denominação de poesia experimental, por intermédio de alguns teóricos como Espinosa e Post-Arte (1987), Jackson, Vos e Drucker (1996), Khouri (1996), Menezes (1987,1988,1988b,1990,1991),MilláneGarcíaSánchez(2005),Moles(1973,1974, 1974a, 2005), Padin (2000), Sarmiento (2009), etc. Portanto, estudar a obra impressa de J. M. Calleja com base nos conceitos de poesia visual e de poesia experimental é um caminho válido. Nesta perspectiva, Pignatari (1991) afirma:

A poesia parece estar mais do lado da música e das artes plásticas e visuais do que da literatura. (idem, p. 7) (...)

O poeta é aquele artista que não está no gibi. E é aquele que ajuda a fundar culturas inteiras. Não dá para entender a cultura portuguesa, sem Camões; a inglesa, sem Shakespeare; a italiana, sem Dante; a alemã, sem Goethe; a grega, sem Homero, a irlandesa, sem Joyce.

Poesia é a arte do anticonsumo. A palavra “poeta” vem do grego “poietes = aquele fez”. Faz o quê? Faz linguagem. E aqui está a fonte principal do mistério (idem, p. 8). (...)

Para o poeta, mergulhar na vida e mergulhar na linguagem é (quase) a mesma coisa. Ele vive o conflito signo vs. coisa. Sabe (isto é, sente o sabor) que a palavra “amor” não é o amor – e não se conforma ... (idem, p. 9-10). (...)

A poesia em versos é um corpo analógico dentro de um corpo lógico representado pela palavra e suas relações lógico-gramaticais, que obedecem a um processo linear (causa-efeito, princípio/meio/fim). A poesia concreta, gráfica, sonora, ou gráficosonora, rompe com esse sistema. Uma causa não pode ser um efeito, um efeito não pode ser uma causa? Por que não criar logo uma sintaxe analógica, em que causas e efeitos se confundam e pareçam ocorrer ao mesmo tempo, simultaneamente, em lugar de uma coisa-depois-da-outra? Por que não tratar as palavras como figuras, como imagens que a gente monta no espaço e no tempo (idem, p. 53) (...) Há ainda os chamados poemas semióticos ou “sem palavras” – que podem ser apenas desenhados – ou montados na forma de objetos.

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Ilustração 2 – Eu/Você

Fonte: Pignatari (1991, p. 59).

A comunicação poética, conforme trechos selecionados, é essa poesia que provoca sensações e que se comunica por meio de signos verbais e não-verbais. A partir do ponto de vista da leitura, conforme Adler e Van Doren (19403/2010, p. 25), é possível estender o sentido de comunicação poética de Pignatari para a leitura intersemiótica e multimídia:

O rádio e a televisão acabaram assumindo as funções que outrora pertenciam à mídia impressa, da mesma maneira que a fotografia assumiu as funções que outrora pertenciam à pintura e às artes plásticas. Temos que reconhecer – é verdade – que a televisão cumpre algumas dessas funções muito bem; a comunicação visual dos telejornais, por exemplo, tem impacto enorme. A capacidade do rádio em transmitir informações enquanto estamos ocupados – dirigindo um carro, por exemplo – é algo extraordinário, além de nos poupar muito tempo.

2 O que é poesia visual?

A questão escolhida para ser o objeto de investigação começou a ser pensada a partir do contato com esse tipo de poesia, pelos conceitos que lhe são atribuídos, pela variedade de denominações que recebe, pelos caminhos percorridos por seus criadores, pela crítica que a ela vem sendo feita e pela variedade de tipos de criações.

A primeira questão que permite a compreensão do objeto de estudo é a seguinte: O que é, de fato, poesia visual?

A poesia visual, mesmo que tenha outra denominação (poesia experimental, poesia concreta, poema visual, letrismo, espacialismo, poema-processo, etc.) é um tipo de poesia contemporânea e pode ser considerada como um desdobramento da poesia verbal, pois é o momento em que o poeta, para melhor significar o seu mundo contemporâneo, faz uso de imagens visuais para ampliar o significado das palavras.

3 Primeira edição inglesa da obra, antes da colaboração de Van Doren, que inicia em 1972.

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A Poesia Visual é um movimento sem manifestos ou princípios poéticos específicos, mas que vem sendo praticada por uma grande quantidade de poetas em vários países, que adota procedimentos semelhantes a partir da década de 1970.

Ela recebeu diversos nomes: em Portugal, na década de 1960, de Poesia Experimental (Castro, 1993); na Itália, no mesmo período, de Poesia Visiva; na década de 1970, na Espanha, foi denominada de Poesia Visual ou Poesia Experimental; no Brasil, na década de 70, há várias denominações: poesia visual ou poema visual (Menezes, 1988; Padin, 1988; Khouri, 1996; Pontes, 2001), poesia da Era Pós-Verso (Khouri, 1996), poesia intersemiótica intermultimídia da Era Pós-Verso (idem, p. 15), poema-montagem, poesia de montagem intersígnica ou poesia intersignos (Menezes, 1992, p. 135).

Há outros termos: poesia alternativa, desdobramento da poesia concreta, arte postal, arte gestual, grafismo, letrismo. As várias denominações indicam as negociações da poesia com as linguagens das Artes Visuais, usando imagens, cores, forma, movimento, buscando o espaço físico4 para a comunicação poética, e, também, com as tecnologias contemporâneas: design, vídeo, xérox, diferentes suportes, televisão, cinema, painel luminoso, videotexto, computador, Internet, Web.

Outras questões se mostram como pertinentes ao tema: Como é essa poesia que alia a palavra com a imagem e oferece novos significados e inúmeras interpretações?

Esse tipo de poesia não é somente a união da palavra com a imagem e não se confunde com arte visual com palavras, a exemplos de criações de artistas visuais. É, na verdade, um desdobramento da poesia verbal, que está mais vinculada às artes visuais e à música (visualidade, musicalidade), que usa diretamente da síntese da linguagem visual como forma de expressão mais atualizada, cujo exemplo, guardadas as devidas proporções, pode ser o cartaz, o anúncio publicitário e o design gráfico. Se antes a poesia sugeria imagens e escolhia palavras para produzir sonoridade e musicalidade, hoje a poesia visual traz, para o seu domínio, a imagem e o som para produzir novos significados. Podemos usar o conceito de montagem cinematográfica (Eisenstein) para entender esse tipo de poesia.

De que maneira cada poeta, mesmo dentro da estética que caracteriza esse movimento internacional, usa as relações entre palavras e imagens?

A criação desse tipo de poesia apresenta diferentes resultados, a maior parte deles como recursos do poeta, o que está vinculado à sua formação literária, artística, de design ou tecnológica.

4 Há uma poesia-objeto que dialoga com a escultura, a arquitetura e a tridimensionalidade da instalação, e uma poesia performática que dialoga com as Artes Cênicas, mas esse não é o objeto de nosso estudo, que aborda apenas a poesia visual no meio impresso, ou seja, bidimensional.

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Como identificar elementos estruturais comuns nas diversas teorias e denominações para esse tipo de poesia contemporânea?

Como se trata de um tipo de poesia que continua se desenvolvendo, uma pesquisa quantitativa nos dá inúmeros elementos para se estabelecer elementos estruturais comuns. Uma pesquisa em antologias e estudos teóricos oferece uma tipologia, a partir da qual é possível estabelecer outras.

Esses problemas me levaram a pesquisar as relações entre poesia, artes, design gráfico e tecnologias presentes nos poemas de J. M. Calleja, poeta e artista espanhol contemporâneo. Relações semelhantes podem ser observadas em outros poetas de outros países, que adotaram a estética contemporânea. Esse tema começa a ser identificado como um problema, quando se pensa que cada poeta visual estabelece prioridades nas relações entre poesia, artes, design e tecnologia e, por meio desse entrelaçamento pessoal, produz significados.

3 Delimitações do tema

Em virtude de inúmeros conceitos, usados sob variados enfoques, faz-se necessário conceituar e delimitar, inicialmente, poética e poesia:

La poesía es un arte, se ha desarrollado según sus propias leyes. La Poética es una ciencia, es una rama de la estética que se ocupa del mensaje hablado; está situada en una posición intermedia entre la lingüística y la música; la caracteriza el hecho que su objeto, la poesía, está sometida a un conjunto de limitaciones semánticas mucho más estrechas que el lenguaje ordinario (Moles, 1971, p. 51).

Muitos estudiososecriadores usam poética como um tipodepoesiaquenãoseenquadra nos estudos da poesia contemporânea. Considerar a Poética como a Crítica Literária da poesia, como um ramo da Estética, nos permite pensar na poesia contemporânea como um tipo de criação em que elementos verbais e não verbais buscam abranger novos significados, provavelmente melhor identificado pelos leitores de hoje.

O conceito de poesia experimental, como sinônimo de poesia visual, também pede uma delimitação:

Pero el arte actual, en todas sus formas expresión, experimenta un cambio profundo que está ligado a la civilización tecnológica y al cual es legítimo calificar de “mutación”. Se trata del proceso de reduplicación que hace llegar la obra de arte a millones de consumidores y de la manipulación mecánica de los símbolos, que son responsables, en gran parte, de esta mutación en la cual un análisis hegeliano vería un ejemplo típico de lo cuantitativo a lo cualitativo.

Desde ahora en adelante se concede un lugar a la experimentación en el dominio del arte: la obra ya no emerge toda armada como Atenea del cerebro de Júpiter. La creación es un proceso; ya no es una emanación, el creador ya no está “cercado” por su obra, está en sus orígenes pero interviene un mayor número de operaciones que le son exteriores y que se pueden agrupar bajo el nombre de “realización” (Moles, 1971, p. 51-52).

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A chegada da civilização tecnológica, a partir dos anos de 1950, também denominada de novas tecnologias, considerada por Moles como “mutação”, é responsável pelo processo de reprodução que faz com que a obra de arte chegue a milhões de consumidores, isso sem falar na manipulação dos símbolos que caracterizam as obras de arte. É nesse sentido que a literatura passa a ser considerada como experimental, ou seja, ela usa o processo experimental da ciência para fazer arte.

4 Revisão de literatura

Como faço pesquisas sobre poesia visual desde 1995, a bibliografia teórica (geral) é bastante significativa em várias línguas, além do acervo de obras de poetas visuais em obras impressas e eletrônicas. Isso exige um recorte bastante sucinto para um objeto de estudo particular.

Esta pesquisa bibliográfica terá três grandes eixos temáticos: estudo dos conceitos de poesia experimental e de poesia visual; obras de J. M. Calleja; e as entrevistas e estudos das obras do poeta experimental espanhol.

Do ponto de vista bibliográfico, faz necessário mapear a obra de Calleja e estabelecer uma tipologia, que poderá ser comparada com as tipologias existentes na crítica às suas obras. Essa seleção será estudada a partir da compreensão de alguns títulos em catalão (com a ajuda de um dicionário, do poeta e do meu ex-professor de espanhol), juntamente com uma análise e interpretação com basenos meusestudos depoesiacontemporâneasob oenfoquepredominante da Semiótica da Cultura. Terminado esse levantamento, as entrevistas e estudos de suas obras serão resenhadas e acrescentadas ao estudo.

Um dos problemas para a compreensão da obra de Calleja está ligado ao fato de estar escrito em catalão, língua que não leio, não falo e não escrevo. Para resolver esse problema, além do uso do dicionário, vou contar com a ajuda do poeta e do meu ex-professor de espanhol, Carlos Ragel Cerdan, que é de Barcelona e reside na cidade de Itu, São Paulo, onde moro. Para estabelecer os conceitos, a fundamentação teórica se baseia nos seguintes autores: Cesar Espinosa (1987), em Signos corrosivos: selección de textos sobre poesía visual concreta-experimental-alternativa, curador das Bienais Internacionais de Poesia Experimental do México, que defende uma fusão das poesias de vanguarda: Nueva poesía, alternativa o experimental, concreta o visual, son términos que identifican a una corriente paralela a las rupturas y exploraciones de todas las vanguardias de este siglo, que eventualmente refulge en el marco internacional del grupo brasileño Noigandres, pero las más veces se desarrolla en el laboratorio de los herméticos alquimistas que buscan su materia prima en el lenguaje y sus símbolos (1987, p. 10).

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Clemente Padin, em La poesía experimental latinoamericana: 1950-2000 (2000), também estabelece uma fusão temporal e conceitual entre as poesias de vários países de língua espanhola, incluindo a poesia brasileira, mostrando-as como desdobramentos das poesias de vanguarda do início do século XX.

A obra organizada por Jackson, Vos e Drucker, Experimental – Visual – Concrete Avant-Garde Poetry since the 1960s (1996), reúne estudiosos e criadores das poesias experimental visual e concreta, que debateram o tema no Yale Symphosophia nos dias 5 a 7 de abril de 1995. Tive contato, durante a tese de doutorado, com vários participantes do evento: E. M. de Melo de Castro (1932-2020), Fernando Aguiar, Ana Hatherly (1929-2015), Enzo Minarelli, Eduardo Kac, Claus Clüver, Pierre Garnier (1928-2014), Pedro Reis, Elisabeth Walter-Bense (1922-2018).

Oevento eolivropropõem umacontinuidadedapoesiaconcreta eseus desdobramentos ou denominações posteriores: poesias concreta, experimental, visual e neoconcreta. Quando participei do X Bienal de Poesia Experimental (México, 2009), meu comunicado teve a denominação de “Poesía experimental y poesía electrónica: aproximaciones en cuatro abordajens”5

No II Avant Writing Symposium em Columbus, Ohio, EUA, em 2010, propus “Digital Avant-Garde Experimental Poetry: Another Genre of Contemporary Poetry?”6. Defendi a tese dequeapoesiadigitaléumdesdobramento,continuidadeeatualidadedapoesiadasvanguardas do início do século XX (futurismo, dadaísmo, surrealismo, cubismo, etc.). Vários outros estudiosos e criadores, como Melo e Castro (Portugal/Brasil), John M. Bennett (EUA) e César Espinosa Vera (Espanha), Hugo Pontes (Brasil), também partilham dessa opinião.

Diversas antologias oferecem uma introdução teórica e um conjunto de exemplos para situar a poesia contemporânea em suas relações com as artes, o design e as tecnologias. A revista norte-americana Visible Language, em seu número 27 (1993) sobre Visual Poetry An International Anthology, com uma introdução de Harry Polkinhorn, traz estudos sobre a poesia visual em países como o Brasil, Cuba, Itália, México, Portugal, Uruguai e EUA) e apresenta exemplos. Fernando Millán e Jesús García Sánchez, organizam a Antología de poesía experimental, que contém um texto introdutório com aspectos históricos e conceituais significativos. José Antonio Sarmiento organiza e seleciona documentos, exemplos e teorias sobre Escrituras em libertad: poesía experimental española e hispano-americana del siglo XX (2009), em 520 páginas e complementado por um DVD, obra importante para consulta e compreensão da poesia experimental.

Uma pequena amostra de antologias impressas e eletrônicas brasileiras e estrangeiras nos permite observar algumas características gerais predominantes na poesia visual: A

5 Apontamentos para uma palestra, organizados em PowerPoint, que não se tornaram artigo e continuam inéditos.

6 Apontamentos para uma palestra, organizados em PowerPoint, que não se tornaram artigo e continuam inéditos.

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proposição 2.0I poesia experimental (Castro, 1965, p. 107-110, I-LI), Teoria da Poesia Concreta (A. Campos; Pignatari; H. Campos, 1965), Processo: linguagem e comunicação (Dias-Pino, 1971; 1973), Antologia da Poesia Concreta em Portugal (Marques; Castro, 1973), Vanguarda: produto de comunicação (A. Sá, 1977), 17 (Calleja; Sarmiento, 1980), Poesia de vanguarda no Brasil: de Oswald de Andrade ao Poema Visual (Mendonça; A. Sá, 1983), Poemografias: perspectivas da poesia visual portuguesa (Aguiar; Pestana, 1985), DidEYEtica7 (M. Almeida, 1985, 1987, 1989, 2000), I Mostra Internacional de Poesia Visual de São Paulo (Mostra, I, 1988), Poesia visual na década de 80 (M. Almeida, 1989), Poética e visualidade: uma trajetória da poesia brasileira contemporânea (Menezes, 1991); Visual Poetry: An International Anthology (Polkinhorn, 1993), Saciedade dos Poetas Vivos: Visual (Faustino; Míccolis, 1993), Poesia experimental-93 (Calleja, 1993), Bacana 1: coletânea de poesia visual em postal (Menezes, 1994), Mostra Nacional de Poesia Visual (Araujo; Paulino; Silva; Medeiros, 1995), O poema visual: leitura do imaginário esotérico: da Antiguidade ao século XX (Fernandes, 1996), Poema Visual (Pontes, 1996), Poesia visual brasileira: uma poesia da Era Pós-Verso (Khouri, 1996); Poesia concreta e visual (Menezes, 1998), Poemas visitados versão preto & branco (Frazão, 1999/2000), La Poesia Experimental Latinoamericana (Padin, 2000), Brazilian Visual Poetry (Vater, 2002), Primer Premio de Poesía Experimental (Diputación de Badajoz, 2002), Revistas na Era Pós-Verso (Khouri, 2003), Poesía visual: Las seductoras formas del poema (Espinosa Aguirre, 2004), Antologia da Poesia Experimental Portuguesa: anos 60 - anos 80 (Sousa; Ribeiro, 2004), Poesia Visual e Experimental em Pernambuco (Bruscky, 2005), Mostra Internacional de Poesia Visual e Eletrônica (Mostra Internacional, 2005), VI(r)US (Calleja, 2005), Visual Poetry in the Avant Writing Collection (The Rare, 2008)8, etc.:

a) intervenção em imagens existentes nos mais diversos meios: fotos, jornalísticas ou não, documentais e pessoais, além de imagens de exames clínicos;

b) crítica social e política por meio de propagandas e notícias, principalmente a partir de imagens;

c) releituras das estruturas do soneto;

d) releituras espaciais bidimensionais e tridimensionais das palavras “soneto”, “poema” e “poesia”;

e) interferência manual dos poetas (rabiscos, escritas, grafismos, em preto e branco e em cores) em textos visuais de uso prático e propagandístico;

f) rasgos e dobraduras em papel, indicando intervenções criativas;

7 Há dois subtítulos: uma pós-leitura da Poesia Visual (1985) e uma gramática do olho (2000).

8 Faz-se necessário uma referência às antologias que se encontram em revistas como: Código (1974-1989/1990), Artéria (1975-atualidade), Dimensão Revista Internacional de Poesia (1980-2000), Poema Visual, sítio organizado por Hugo Pontes, DidEYEtica, de Marcio Almeida, etc.

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g) releituras de poemas visuais de outros poetas;

h) uso de carimbos pessoais em grafismos, desenhos, fotografias e xeroxes;

i) elaboração de imagens a partir de letras;

j) exploração da espacialidade e do espaço em branco da folha de papel e uso de diferentes fontes tipográficas;

k) relações entre escrita de palavras e partituras musicais;

l) exploração dos recursos da xérox;

m) uso das palavras "poesia" e "poema" em ambientes em que predominam imagens, mostrando uma intervenção da palavra poética;

n) uso de materiais não comuns como suporte da poesia visual como: pano bordado, conchas, pedras, plásticos, produtos industriais, caixas diversas de uso prático no comércio e na indústria, folhas de plantas diversas, cartas de baralho, produtos comestíveis, latas, ossos, insetos, etc.

o) um constante e contínuo uso da tecnologia computacional na feitura dos poemas; etc.

A Espanha tem apresentado uma vasta produção de poesia visual, o que nos autoriza a afirmar que a obra de J. M. Calleja aborda diversos procedimentos como os enumerados no parágrafo acima.

Dentre as diferentes tendências da poesia visual, há uma negociação com os elementos científicos, tecnológicos e industriais da sociedade contemporânea. Muitas vezes essas experimentações poéticas nem chegam a ter outra denominação, pois são esporádicas, recursos individuais de um poeta ou mesmo de um pequeno grupo, mas que se configuram de forma diferenciada.Optamosporconsiderá-lassobaformadepoesiavisuale(m)...:caligrafia,jornal, fotografia, xérox, propaganda, design gráfico, painel para publicidade, produtos industriais no meio impresso, produtos industriais nos meios tridimensionais, etc.9

5 As Obras de J. M. Calleja

As obras de Calleja são o registro do seu percurso como criador, performer, expositor e participante de antologias como poeta e como organizador. Mesmo com as poesias experimentais que se repetem em obras reunidas e em antologias, há sempre um percurso rico de possibilidades de projetos gráficos variados e diferentes tipos de impressão e de papel, além de dobras de papel que ressignificam a obra, pois permitem a interação do leitor, folheando as páginas e procurando entender as mensagens. O leitor/fruidor de poesia experimental, numa exposição de obras, ficaria entretido por horas, a apreciar o percurso criativo de J. M. Calleja.

9 Esse estudo é um dos capítulos do livro / DVD Poesia digital: teoria, história, antologias (Antonio, 2010).

Obras do poeta:

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+Que mai, per als ulls!10 (1988)

Mixtures (1993)

Llibre Anglès (1994)

Transfusions (1996)

7poemesperanoapaivagarla7

C`ö´CTEL (1999)

Paisatges (1999-2000)

Alfàbia11 (2000)

Poemas visuales (2001)

Desfilada (2003)

Altri (2004)

Ombres & Llunes (2004), com Antoni Agra

Poemes dels setanta (2006)

Huellas (2006a)

Transbord12 (2006b)

Homenajes (2007)

Poemes dels vuitanta (2007)

Tiempos verbales [2008]

Pets (2009)

Fragments (2009a)

Nocturnes poemes – (2010)

Poesía visual (2011)

T(i)EMP(o)S VERBAL(e)S (2012)

Arxipèlag – (2012)

Huellas (2013)

Album 013 (2013a)

Masks (2013b)

Finestres (2013c)

ABCDARUM (2013), com Klaus Peter Dencker

AQUIAHORAOTRAVOZ: Poesia Experimental (2021) com Alejandro Thornton

GHROMYT (2022) com Carlota Caulfield

Antologias organizadas pelo poeta e em parceria:

17 – Org. J. M. Calleja e J. A. Sarmiento (1980)

Poesía visual – Org. J. M. Calleja (1992)

Poesía Experimental – 93 – Org. J. M. Calleja (1993)

7 Poemesperanoapaivagarla (1998)

Poemas visuales (2001)

Ombres & Llunes – Coordenação: Antoni Agra e J. M. Calleja (2004)

Altri – (2004)

Poesia visual catalana – Org. J. M. Calleja (2010)

ABCDario – Org. Ariel Gangi, Martín Gubbins, J. M. Calleja e Carlota Caulfield (2015)

VI(r)US – Org. J. M. Calleja (2005)

VI(r)US dos (2020)

A poesia-ação, poesia performática, performance poetry ou poesia viva também é uma prática criativa de Calleja. Um exemplo significativo é Procesión (Ilustração 3), projeto de J. M. Calleja (Espanha), uma poesia-ação que ocorreu nas ruas centrais de Montevideo, Uruguai, no dia 30 de agosto de 2008, das 12h às 13h, por ocasião do Encuentro Internacional de Poesía Experimental, e que ficou registrada nas máquinas fotográficas de algumas pessoas. Calleja fez

10 Tradução do catalão: Tanto faz, para os olhos!

11 Tradução do catalão: alfabeto.

12 Tradução do catalão: transbordo.

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desenhos criativos com as letras do alfabeto e os colocou em camisetas, que foram usadas pelos participantes do evento. Cada participante escolheu uma letra e um objeto que a representasse e caminhou pelas ruas segurando esse objeto numa bandeja.

Ilustração 3 - J. M. Calleja - Procesión (2008) - imagens da ação poética

Fonte: fotos cedidas gentilmente por Clemente Padin.

Em 1999, J. M. Calleja (Espanha) começou a usar o computador na criação de seus poemas visuais e foi reunindo seus poemas animados sob o título de “Net-Art”: http://www.jmcalleja.com/es/poesia/net-art/. Ele começou suas experimentações poéticas em 1972, usando criativamente a colagem e o desenho.

Em Signos Corrosivos: Selección de textos sobre poesia visual concreta-experimentalalternativa (Espinosa; Núcleo Póst-Arte, 198713, p. 94), no artigo “La vanguardia poética en España (1963-1981), datado de dezembro de 1981, José Antonio Sarmiento afirma, no último parágrafo: “Por último, mencionaremos a los autores que realizan un trabajo al margen de los grupos, como J. M. Calleja, Ángel Sánchez, Pablo del Barco, Rafael de Cozar, Xavier Canals”. Nas antologias organizadas por Calleja, esses nomes aparecem com bastante frequência, mostrando o desenvolvimento do poeta espanhol como criador e como organizador de eventos e de antologias.

Em Escrituras en Libertad Poesía Experimental Española e Hispanoamericana del Siglo XX, que é catálogo, antologia de poesias e de estudos, obra organizada por José Antonio Sarmiento (2009), a foto de J. M. Calleja aparece na página 489, juntamente com os poetas

13 O mesmo texto é publicado em língua inglesa, na tradução de Harry Polkinhorn em 1990: “Finally, we shall mention authors who work on the edge of the groups, such as J. M. Calleja, Angel Sánchez, Pablo del Barco, Rafael de Cozar, Xavier Canals ... (Espinosa; Núcleo Post-Arte, 1990, p. 120).

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experimentais que nasceram na década de 1950: Antonio Gómez, José Miguel Ullán, Eduardo Scala, Ángel Sánchez e Bartolomé Ferrando. Na antologia (Calleja apud Sarmiento, 2009, p. 516-519), são transcritas as seguintes obras: Tempus fugit (1982), Efigie (1984), Composició 4 (1986) e Puertas (1995).

Os prefácios das obras de Calleja indicam muitas leituras importantes de estudiosos e criadores, desde 198014 e 199315, que aqui são referidos em ordem alfabética: Albert Calls, Bartolomé Ferrando, Carles Hac Mor, Daniel Giralt-Miracel (2), Gustavo Veja, Jordi Coca, Jordi Marrugat (3), Julien Blaine16, Laura López Fernández, M. dels Àngels Ballbé, Margalida Pons, Mariona Masgrau Juanola, Ramnon Salvo, Victor Infantes (3), Xavier Canals e Xavier Seoane. A leitura desses prefácios, uma recepção estética significativa, é importante para compreender a obra do poeta experimental.

6 Análise de alguns poemas experimentais

Escolhemos alguns poemas de J. M. Calleja para uma leitura com base nas interfaces da poesia com as artes, as tecnologias e o design gráfico. J. M. Calleja explora os recursos do design gráfico na sua poesia visual, entremeando as suas imagens de intervenções manuais com o uso de diferentes tipos de caneta e várias cores. Vários objetos cotidianos, signos contemporâneos, aparecem, em seus poemas, dispostos em uma mesa de trabalho de um designer e poeta. A capa e a contracapa de Transbord (2006), fotografia de Narcís Calleja, é um exemplo, no qual aparecem, dentro de um vidro, uma série de lápis de várias cores. O título, Transbord (transbordo, em catalão), e a imagem mostram a experimentação criativa que transborda o uso profissional de objetos de trabalho num estúdio.

As suas obras em preto e branco e em cores trazem essa marca criativa, cujos exemplos são: Mixtures (1993), Paisatges (1999/2000), Alfàbia (2000), Poemes dels setanta (2006), Transbord (2006), Poemes dels vuitanta (2007) e Homenajes (2007). Paisatges (paisagem, em catalão) (Calleja, 1999/2000) é um catálogo de uma exposição realizada na Casa de Cultura

“Les Bernardes” em Salt (Girona,Espanha), de17 desetembro de1999 a10 dejaneiro de2000. Calleja explora a técnica mista de collage, na fronteira entre o artista plástico, que expõe seus poemas-cartazes em uma galeria de arte, e o poeta, que explora a arte da palavra.

El viatge17(Ilustração 4) é a mais significativa como comunicação poética, pois é a síntese desse conjunto de obras: um envelope com fundo lilás, um mapa, um pedaço de filme e uma escrita semelhante a um resultado de eletroencefalograma. Uma viagem.

14 Introdução de Julian Blaine, poeta francês.

15 Prólogo de Jordi Coca.

16 Poeta francês nascido em 1942.

17 A viagem, em catalão.

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Ilustração 4 – El Viatge

Foto da obra: Antonio Lafuente. Fonte: Calleja (1999/2000, n.p).

A foto de Sabina Calleja para o catálogo da exposição de collages sob o título de Paisatges (paisagens, em catalão), que mostra a mesa de trabalho de J. M. Calleja18 (Ilustração 5), ensejou novo diálogo com o poeta, o que nos permitiu obter uma foto de 2015, com mais riqueza de detalhes:

Ilustração 5 – Mesa de trabalho de Calleja

Fonte: foto de Sabina Calleja, feita em 17.05.2015, gentilmente cedida para este artigo.

Transbord (Calleja, 2006), tanto pela capa (Ilustração 6), fotografia de Narcis Calleja (um vidro cheio de lápis de várias cores), como pelo título (transbordo, transferência, em catalão) nos apresenta a essência do trabalho do poeta, e é o que a Ilustração 5 mostra (a fotografia de Calleja em seu ambiente de trabalho, o seu ateliê): transferir toda a arte da palavra por meio das tecnologias do seu ofício (escrever, pintar, recortar, colar, recriar os elementos da realidade).

18 A foto do catálogo, em preto e branco, de 1999/2000, foi substituída por duas fotos cedidas gentilmente pela Sabina Calleja, filha do artista, para melhor explicar os comentários que fizemos neste artigo.

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Ilustração 6 - Transbord

Fonte: foto da capa: Narcís Calleja (2006, capa).

Homenajes (2007) contém poemas visuais que homenageiam vinte e sete poetas por intermédio de emblemas cujo mote é o nome de sua própria representação, facilmente reconhecíveis sem necessidade de um mergulho no mar da poesia, conforme afirma Víctor Infantes,naapresentação do livro(Calleja,2007,n.p.).Exemplosignificativoé"aFranzKafka" (Ilustração 7):

Ilustração 7 - A Franz Kafka (1883-1924)19

Fonte: Calleja (2007, n.p.).

O prefácio de Victor Infantes (Calleja, 2007, n.p.), sob o título de Huldigung (homenagem, em alemão), é significativo como uma leitura crítica da obra:

Nueve por nueve son ochenta y uno, y ocho y uno suman nueve; nueve por tres son veintisiete, y siete y dos suman nueve; tres por tres son nueve, y nueve es siempre nueve. (Por la cuenta del autor.) Si no bastan los números, con sus combinaciones (nunca) fortuitas, están las letras, todas las letras posibles, con sus aleaciones (siempre) fortuitas.

A imagem de uma caixa de fósforos marca Guarany e a de um mapa (Ilustração 8) compõem a “Homenagem a Philadelpho Menezes20”, em poema visual de J. M. Calleja (Espanha), metaforizando a passagem do poeta em 2000, num acidente automobilístico.

19 Foi nossa intenção mostrar, aos ciberleitores, o espaço em branco da página do livro, pois esse aspecto é muito significativo na obra de Calleja.

20 Philadelpho Menezes (1960-2000), poeta visual e sonoro e professor universitário paulistano.

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Ilustração 8 – Homenagem a Philadelpho Menezes (1960-2000)

Fonte: Calleja (2007, n.p.).

Em 2008, fuipresenteadocom aplaqueta21 Tiempos verbales (Ilustração 9),que Calleja leu em umas das apresentações do II Encuentro, em Montevidéu. A leitura do poeta explorou a quebra de significado que parece haver, ou faz lembrar, a conjugação de verbos, quando se estuda uma língua, estrangeira ou nacional, a partir de aulas de gramática ou de um manual didático. Em YouTube é possível apreciar uma leitura do poema pelo próprio poeta em catalão:

J.M. Calleja recita, Temps verbals - YouTube .

Ilustração 9 – Tiempos verbales, frente e verso da plaqueta.

Fonte: Calleja (2008).

Em 16 de dezembro de 2013, recebi outra plaqueta com o título de T(i)EMP(o)S VERBAL(e)S (Calleja, 2012), com prefácio de Víctor Infantes (apud Calleja, 2012, n.p.), publicação bilíngue (castelhano e catalão):

El verbo se hizo verbo (¡por fin!) y conjugó entre nosotros. Y se dividió en tres flexiones y, además, se ordenó en modos, tiempos, números y personas, y clases. Si tenemos el verbo, con él, mucho ganado, pero también mucho por conseguir; porque hay verbos para todos los gustos. (...) Por todo ello, y con todo ello, aunque todos podemos conjugar con todas las personas, hay que estar atentos a la última persona, porque el que conjuga el último (como el que ríe) tiene la última palabra. Yo conjugo, tú conjugas, él conjuga, nosotros conjugamos, vosotros conjugáis y ellos, bueno, ellos, sí, también conjugan, pero a veces cambian de verbo y son capaces de suplantar toda la conjugación.

21 Livro pequeno de poucas páginas (Dic. Houaiss).

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Os dois poemas em forma estrelada, em castelhano, mais os dois outros, em catalão, com um poema central, que se torna o leitmotiv22, com doze raios, que podem ser entendidos como treze estrofes de um poema, oferecem uma apreciação do leitor que se movimenta para ler cada estrofe de três versos (tercetos), virando a plaqueta, sempre com a mesma surpresa da transgressão poética, no último verso, o que se torna uma gramática poética dos tempos verbais.

AcriaçãodeCalleja(Ilustração10)ofereceoutrapossibilidadedeestudogramaticaldos verbos.

Ilustração 10 - T(i)EMP (o)S VERBAL(e)S

sem número.

Boa parte das intervenções de J. M. Calleja em textos visuais, que ele seleciona para a sua comunicação poética, é manuscrita ou caligráfica, pois o criador, de posse de uma caneta, escreve algo, legível ou não, marcando a presença que interfere e ressignifica o material impresso de finalidade pragmática. A série de marcadores de páginas e cartões postais, que acompanham seus livros, também são representativos para que oleitor se sintaintegradoà obra.

“Il Pleut” é um dos exemplos no qual os traços repetidos, verticais e paralelos, indicam uma sequênciaelembramumareleituraatualizadade“IlPleut”,dofrancêsApollinaire(1880-1918).

22 Leitmotiv (do alemão, motivo condutor) é uma frase musical curta e constantemente recorrente. Em música, é uma técnica de composição introduzida por Richard Wagner em suas óperas, que consiste no uso de um ou mais temas que se repetem sempre que se encena uma passagem da ópera relacionada a uma personagem ou a um assunto. Wagner usou o leitmotiv pela primeira vez na ópera Der fliegende Holländer, sendo que todas as suas óperas seguintes também o utilizaram. Esta técnica foi utilizada também por outros compositores do período romântico, como Giuseppe Verdi, em suas óperas Nabucco e La Traviata, e Georges Bizet, na ópera Carmen (Wikipedia, s.d.)

Fonte: Calleja (2012), plaqueta de cinco páginas

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Ilustração 11 - Il Pleut

Fonte: Calleja (1993, p. 63).

Na série “Valeriegrames”, criada em 1992, que faz parte do livro Mixtures (1993), Calleja cria dez poemas-xéroxes, movimentando a folha de papel por ocasião da cópia, cujo exemplo é “Valerigrames IX” (Ilustração 12).

Ilustração 12 - Valeriegrames IX

Fonte: Calleja (1993, p. 101).

LauraLópez Fernández, noprólogode Huellas23 (Calleja,2013),resumea polivalência do poeta espanhol:

Orden, caos, musicalidad, espectáculo, correspondencias alfanuméricas, disposiciones alfabéticas en el espacio, simbolismo, zoomorfismo, reinos míticos, paisajes imaginarios, escalas invisibles al ojo desnudo, holografía, el principio de incertidumbre, el azar, circularidad, movilidad, neo-Dadá, neocontructivismo, postcollage, ready-mades, neoplasticismo, Bauhaus, Duchamp y la apropiación, la pre y la metamodernidad, Mallarmé, Valery, paragramaticalidades, eclecticismo … son sólo algunos de los múltiples conceptos, principios y técnicas que este versátil artista vincula en sus composiciones visuales (apud Calleja, 2013, p. 7).

23 Tradução: pegadas, em espanhol.

7 Considerações finais

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Procuramos apresentar os aspectos mais importantes da obra de J. M. Calleja, especialmente a poesia experimental em meio impresso. O poema “Els cavalls del guerrer, preparats per al combat”, da obra + Que mai, per als ulls, de 1988, é um exemplo que caracteriza a obra de Calleja:

Ilustração 14 – Els cavalls del guerrer, preparats per al combat

Fonte: Calleja (1988).

Os elementos da realidade oferecem signos visuais e verbais para que o poeta inicie a sua luta com as palavras, parafraseando Drummond, acrescentando a elas as imagens do cotidiano. Esse diálogo se faz com tudo o que sensibiliza os olhos do poeta no seu cotidiano, no seu ambiente de trabalho, nas notícias de jornais e nas propagandas que o tempo presente oferece em sua multiplicidade de signos e significados.

Ter uma parcela significativa das obras de um poeta e poder conversar com ele trazem uma dimensão nova ao entendimento da poesia contemporânea. A análise de procedimentos, projeto quevenhocumprindo desdeoinício demeus estudos literáriosduranteapós-graduação, foi uma forma de absorver o máximo e oferecer ao leitor um vislumbre do que é, de fato, a poesia contemporânea.

8 Referências

ADLER, Mortimer Jerome. A arte de ler: como adquirir uma educação liberal. Tradução: Inês Fortes de Oliveira. Rio de Janeiro: Livraria Agir Editora, 1954.

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______;. Como ler livros: o guia clássico para a leitura inteligente. Tradução: Edward Horst Wollf e Pedro Sette-Câmara. 14. reimpr. São Paulo: É Realizações, 2010.

AGRA, Antoni; CALLEJA, J. M. Ombres & Llunes. Barcelona: Tabelaria Edicions, 2004.

ANTONIO, Jorge Luiz. Poesia digital: Teoria, história, antologias. São Paulo: Navegar; FAPESP. Itu, SP: Autor. Columbus, Ohio, EUA: Luna Bisontes Prods, 2010.

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______. Mixtures. Lleida, Espanha: Pagés Editors, 1993.

______. Llibres anglès. Barcelona: Aire Espai de Pensament Artístic, [1994].

______. 7poemesperanoapaivagarla7. Barcelona, Espanha: LA Cèl.lula Editora Independent, 1998. Exemplar 193/202.

______. C`o´CTEL. Valladolid, Espanha: El Gato Gris, 1999. Exemplar 149/200. Caixa de cd (plástico, 14 cm X 12 cm X 1 cm) contendo 12 cartões postais.

______. Paisatges. Apresentação: Xavier Canals. Catálogo de exposição realizada na Casa de Cultura “Lês Bernardes” em Salto (Girona), Espanha, de 17 dez. 1999 a 10 jan. 2000. 8p.

______. Alfàbia. Tarragona, Espanha: Arola, 2000.

______. Poemas visuales. Apresentação: Gustavo Vega. Catálogo de exposição em La Caraba Taller de Intentos Culturales, Barakaldo, Espanha, de 14 mar. a 16 abr. 2001. 12p.

______. Desfilada. Vic, Espanha: Emboscall, 2003.

______. Altri. Torino, Itália: Visual Editions, 2004. Exemplar 15/35.

______. Poemes dels setanta. Badalona, Espanha: Associació Cultural de Poesia Pont del Petroli, 2006.

______. Huellas: poemas 1974-2004. Barcelona, Espanha: mar. 2006a. Arquivo Microsoft Powerpoint, 15,6 MB.

______. Transbord. Tarragona, España: Arola, 2006b.

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O PERCURSO ONOMASIOLÓGICO USADO EM UM DICIONÁRIO DE IDIOMATISMOS REVELANDO A CULTURA POR MEIO DO LÉXICO

Erica Schmidt1

Huélinton Cassiano Riva2

Resumo. O presente artigo propõe a reflexão sobre a interdependência entre língua, linguagem, identidadeecultura,ressaltandoquetaisconceitosestãointrinsecamenteligados,hajavistaqueacultura se constitui e se difunde por meio da língua e que é também por meio dela que ocorrem os processos estruturação de identidades. Nesse sentido, a língua e a linguagem atravessam e ao mesmo tempo criam os conceitos de cultura e identidade (cf. Chauí, 2000; Bakthin, 1997; Barbosa, 2008; Oliveira; Isquerdo, 1998). Este trabalho, em especial, debruça-se em analisar a cultura expressa na língua a partir da análise da obra “Dicionário das expressões mais usadas no Brasil: organização onomasiológica” (Riva, 2013) pois, trata-se de um dicionário especial que apresenta expressões idiomáticas agrupadas ao redor de conceitos, de noções, por exemplo, “vida” e “morte”, para se chegar às expressões idiomáticas presentes na língua, caso, por exemplo, de “são e salvo” e “estar nas últimas”, com o levantamento, como é apontado na obra em questão, nas valorações positivas, negativas e/ou neutras dos idiomatismos mais usados nos anos 2000.

Palavras-chave: Onomasiologia; Linguística; Idiomatismo; Cultura; Léxico.

Resumen.Elcaminoonomasiológicoutilizadoenundiccionariodemodismosquerevelalacultura a través del léxico. Este artículo propone una reflexión sobre la interdependencia entre lengua, lengua, identidad y cultura, resaltando que dichos conceptos están intrínsecamente vinculados, dado que la cultura se constituye y difunde a través de la lengua y que es también a través de la lengua que los procesos de estructuración de la identidad. En este sentido, lengua y lengua cruzan y al mismo tiempo crean los conceptos de cultura e identidad (cf. Chauí, 2000; Bakthin, 1997; Barbosa, 2008; Oliveira; Isquerdo, 1998). Este trabajo, en particular, se centra en analizar la cultura expresada en la lengua a partir del análisis de la obra “Diccionario de las expresiones más utilizadas en Brasil: organización onomasiológica” (Riva, 2013) por ser un diccionario especial que presenta expresiones idiomáticas. agrupados en torno a conceptos, nociones, por ejemplo, “vida” y “muerte”, para llegar a las expresiones idiomáticas presentes en el idioma, como “sano y salvo” y “estar en las últimas”, con la encuesta, como señaló en la obra en cuestión, en las valoraciones positivas, negativas y/o neutrales de los modismos más utilizados en los años 2000.

Palabras clave: Onomasiología; Lingüística; Idiomatismo; Cultura; Léxico.

Abstract. The onomasiology course that was employed in a dictionary of idioms revealing culture throughlexicon. This paper aimsto bringto light reflections ontheinterdependency between language, speech, identity, and culture, highlighting that such concepts are intrinsically linked, given that culture is constituted and spread through language and that it is also through language that identity structuring processes occurs. In that sense, language, and speech cross over and, at the same time, create the concepts of culture and identity (see Chauí, 2000; Bakthin, 1997; Barbosa, 2008; Oliveira; Isquerdo,

1 Possui Graduação em letras pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Mestrado em Literatura e Crítica Literária pela PUC/SP e Doutorado em Estudos Literários pela UNESP. Docente de Língua Portuguesa e Inglesa no Centro Paula Souza. E-mail: kinhasch@gmail.com.

2 Possui Graduação em Letras com habilitação de Tradutor pela UNESP, Mestrado e Doutorado em Estudos Linguísticos pela UNESP. Docente do Ensino Superior na Universidade UEG, autor do Dicionário das expressões idiomáticas mais usadas no Brasil: organização onomasiológica (Editora Appris) e do Dicionário das expressões idiomáticas brasileiras: anos 2000 (Novas Edições Acadêmicas) e líder do LexCult: grupo de pesquisa sobre léxico e cultura do CNPQ. E-mail: huelinton.riva@ueg.br.

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1998). This work, in particular, focuses on analyzing the culture expressed in the language, based on the analysis of the work “Dicionário das expressões mais usadas no Brasil: organização onomasiológica” (Dictionary of the most used expressions in Brazil: onomasiology organization from Riva, 2013) as it is a special dictionary that presents idioms grouped around concepts and notions. Among those concepts we can mention, as for example, “life” and “death”, that reach idiomatic expressions present in the language, such as “safe and sound” and “being on your last legs”, with the survey, as it is pointed out in the work in question, in a positive, negative and/or neutral valuations of the idioms most used in the 2000s.

Keywords: Onomasiology; Linguistics; Idioms; Culture; Lexicon.

1 Introdução

Aristóteles tinha muitas ideias sobre a linguagem humana entre suas reflexões. Ele acreditava que a linguagem era uma característica distintiva dos seres humanos, permitindolhes expressar pensamentos complexos e comunicar informações de forma elaborada. Dentre algumas destas principais ideias do filósofo (Chauí, 2000) incluem-se:

I) acreditar que a linguagem e o pensamento estavam intimamente relacionados. Ele argumentava que a linguagem não era apenas uma ferramenta para expressar pensamentos, mas também desempenhava um papel crucial na formação e no desenvolvimento do pensamento.

II) ver a linguagem como uma manifestação da capacidade racional única dos seres humanos. Segundo Aristóteles, os humanos têm a capacidade de usar palavras para expressar conceitos abstratos e realizar inferências lógicas.

III) identificar várias funções da linguagem, incluindo a comunicação de informações, a expressão de emoções e a persuasão. Ele reconhecia que a linguagem poderia ser usada de várias maneiras, dependendo do contexto e das intenções do falante.

IV) reconhecer a natureza social da linguagem, argumentando que a comunicação linguística era essencial para a vida em sociedade. Ele via a linguagem como uma ferramenta fundamental para a cooperação e a colaboração entre os seres humanos.

Em seu livro Convite à Filosofia, publicado originalmente em 1994 e revisado em edições subsequentes, Marilena Chauí também discute várias questões relacionadas ao homem e à linguagem.

No que diz respeito à linguagem, a pesquisadora aborda sua importância fundamental na constituição do ser humano como sujeito e na construção do conhecimento. Ela defende que a linguagem não é apenas um instrumento de comunicação, mas também um meio pelo qual os seres humanos compreendem o mundo e se relacionam com ele. Além disso, a autora destaca a dimensão política da linguagem, argumentando que ela é inseparável do poder e das relações de dominação na sociedade.

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Da mesma forma, Chauí ressalta a importância da linguagem como uma via de acesso ao mundo e ao pensamento humano. Ela enfatiza que a linguagem não é apenas um meio de comunicação, mas também uma ferramenta que nos permite pensar e compreender nossos próprios pensamentos, bem como os pensamentos dos outros. A linguagem nos permite acessar significados quejásão conhecidos por outros,assim como descobrirnovos significados durante uma conversa, por exemplo.

A teórica segue sua argumentação frisando ainda que a linguagem é uma parte intrínseca da experiência humana, pois nos envolve e nos habita, assim como nós a envolvemos e a habitamos. Essa interação contínua com a linguagem nos ajuda a desenvolver nossa compreensãodomundo e denós mesmos. Portanto,paraelaa linguagem desempenhaum papel central na vida humana, conectando-nos uns aos outros e ao mundo ao nosso redor, enquanto também nos possibilita explorar e compreender nossos próprios pensamentos e experiências.

De fato, Chauí destaca que a linguagem e a língua não são apenas ferramentas de comunicação, mas sim os alicerces de toda vida social. Elas desempenham um papel fundamental na organização e na subdivisão das diversas camadas que compõem a sociedade, incluindo aspectos afetivos, culturais, econômicos, educacionais, familiares, ideológicos, políticos, religiosos e sociais.

Essa inter-relação entre língua e cultura é indissociável e permeia todos os aspectos da vida das pessoas, tanto individual quanto coletivamente. A língua não é apenas um conjunto de signos linguísticos, mas sim um reflexo e um meio de expressão da cultura de um povo. Ela reflete os valores, as crenças, as normas e as tradições de uma sociedade e, ao mesmo tempo, contribui para (re)estruturar e (re)constituir esses elementos culturais ao longo do tempo.

Assim, para Chauí, entender a linguagem e a língua é essencial para compreendermos não apenas a comunicação humana, mas também a complexidade e a riqueza da cultura de uma sociedade. Essa perspectiva nos convida a considerar a linguagem não apenas como um instrumento de comunicação, mas como um aspecto central da experiência humana e da vida em sociedade.

Portanto, refletir sobre a linguagem e a língua é uma questão que permeia a humanidade há milênios e que, muitas vezes, chegava a respostas complementares e/ou controversas. Citamos, por exemplo, o que Agostinho de Hipona (ou Santo Agostinho) deixou registrado em sua obra “Confissões”, escrita por volta do ano 400 d.C. a respeito da linguagem.

Em suas obras, Santo Agostinho refletiu profundamente sobre a linguagem e seu papel na comunicação e na compreensão da verdade. Em "Confissões" (AGOSTINHO, 1980), ele abordou a relação entre a linguagem e o pensamento, enfatizando que as palavras são apenas símbolos que representam ideias. Ele também discutiu como a linguagem pode ser tanto uma ferramenta de comunicação quanto uma fonte de mal-entendidos.

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Além disso, Agostinho argumentou que a linguagem humana é limitada em comparação com a verdade divina. Para ele, a busca por significado e compreensão vai além das palavras, sendo uma busca por um entendimento mais profundo que está ligado a Deus. Essa visão destaca a importância da intenção e do contexto na comunicação, bem como o papel da graça divina na revelação da verdade.

Essas reflexões fizeram parte de sua abordagem filosófica e teológica, mostrando como a linguagem é um meio crucial na relação entre o ser humano e o divino.

Alguns séculos mais tarde, John Locke também deixou suas reflexões registradas a respeito da linguagem, inclusive retomando o conceito de “mal-entendido”.

Emsuaobra"EnsaiosobreoEntendimentoHumano",publicadaem1689,Locke(1999) discutiu a linguagem de maneira significativa, abordando sua função e limitações. Ele argumentou que a linguagem é uma ferramenta crucial para a comunicação de ideias e que as palavras servem como sinais que representam nossas ideias.

Lockedestacou que alinguagem não é perfeita, pois as palavras podem serinterpretadas de maneiras diferentes, levando a mal-entendidos. Ele enfatizou a importância de esclarecer o significado das palavras para evitar confusão nas discussões filosóficas e científicas.

Além disso, Locke distinguiu entre palavras e as ideias que elas representam, sugerindo quemuitasvezes as palavras podem serusadas sem um entendimentoclarodoquerepresentam. Para ele, a linguagem deveria ser usada com precisão para que se pudesse transmitir nosso pensamento de forma eficaz e se chegar a um conhecimento mais claro.

Essas reflexões de Locke sobre a linguagem são fundamentais para a filosofia moderna, influenciando debates sobre semântica, epistemologia e comunicação.

Em um salto temporal, chegamos ao final do século XIX e início do XX, com Ferdinand deSaussure,considerado opaidalinguísticamoderna.Seutrabalho revolucionouaformacomo entendemos a linguagem. Saussure estudou em várias universidades, incluindo a Universidade de Genebra e a Universidade de Leipzig, onde se interessou por línguas clássicas, filosofia e gramática. Seu interesse pela linguagem foi moldado por um contexto intelectual rico, que incluía o surgimento das ciências sociais e a análise estrutural.

A principal contribuição de Saussure foi a introdução de conceitos fundamentais que mudaram a formadese estudaralíngua. Dentreeles, destacamos: I)osigno linguísticodefinido como a união de um significante (a forma sonora ou escrita) a um significado (o conceito associado); II) langue e parole, distinguindo langue como um sistema abstrato da língua, as regras e convenções, de parole, ou seja, o uso individual e concreto da língua; III) sincronia e diacronia, propondo o estudo da língua em dois níveis, como, o sincrônico, ou seja, o estado da língua em um determinado momento e o diacrônico, a evolução da língua ao longo do tempo.

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Embora Saussure não tenha publicado muitos trabalhos durante sua vida, suas aulas, compiladas postumamente na obra Curso de Linguística Geral (SAUSSURE, 1969), tornaramse fundamentais. Essa obra influenciou não apenas a linguística, mas também diversas áreas como a semiótica, a antropologia e a filosofia.

Saussure estabeleceu as bases para o estruturalismo, que impactou diversas disciplinas, enfatizando a importância das estruturas subjacentes na análise cultural e social. Seu trabalho continua a ser estudado e debatido, refletindo sua importância duradoura na ciência da linguagem.

2 Cultura, língua e léxico

A partir dessas considerações iniciais, pode-se inferir que, no passado, a menção à cultura frequentemente evocava a associação exclusiva com as expressões artísticas, fossem elas eruditas, populares ou de massa (caso do cinema, dança, música etc.). Hoje, é indiscutível queoconceitodecultura seexpandiu muito e eleenglobaalíngua.Aliás, alínguaéconsiderada um dos mais importantes alicerces que estruturam a cultura humana e as etnias. A língua adquiriu status de característica intrínseca à cultura porque, sem ela, é impossível se pensar no surgimentoenamanutençãodetudooqueohomemproduzequeéconsideradoeminentemente humano.

Sobre essa inter-relação entre a língua e a cultura, citamos Barbosa (2008, p. 38) que tão bem discorreu sobre tais conceitos e sobre como os estudos do léxico e da Lexicologia3 integram a noção de cultura:

O léxico passa a ser, assim, abordado como um locus privilegiado não apenas para o conhecimento, mas para o reconhecimento de significados culturais presentes em unidades lexicais culturalmente compartilhadas entre locutores nativos, mas que nem sempre se mostram transparentes para falantes de outras línguas, pertencentes a outras culturas. [...] No nosso entendimento, esse instrumento ajuda-nos a perceber que a língua não pode ser vista como uma estrutura que independe dos seus usuários. Ela confunde-se com a cultura daqueles que a utilizam. Sob esse ponto de vista, as palavras funcionam como receptores de conteúdos culturais que nelas se aderem e a elas agregam outra dimensão para além daquelas apresentadas nos dicionários. (Barbosa, 2008, p. 38).

Na contemporaneidade, a Lexicologia tem defendido que a relação entre língua, cultura e sociedade é, na prática, inseparável, ou seja, em quaisquer situações de comunicação, por trás

3 Segundo o Novo Dicionário Aurélio (1996), léxico é, aqui neste contexto, o “conjunto de vocábulos de um idioma.”. OdicionáriodefineLexicologia como“partedagramática quese ocupa do valoretimológico edasvárias acepções da palavra”, ou seja, o estudo do léxico.

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do léxico usado naquele momento e lugar, há sempre referências à(s) culturas e à(s) sociedade(s), do presente e do passado, que subjazem às escolhas conscientes dos falantes. Por isso, achamos por bem citar o que disseram Oliveira e Isquerdo (1998, p. 07) no que tange à ligação do léxico com valores culturais do ser humano:

O léxico passa a ser, assim, abordado como um locus privilegiado não apenas para o conhecimento, mas para o reconhecimento de significados culturais presentes em unidades lexicais culturalmente compartilhadas entre locutores nativos, mas que nem sempre se mostram transparentes para falantes de outras línguas, pertencentes a outras culturas. [...] No nosso entendimento, esse instrumento ajuda-nos a perceber que a língua não pode ser vista como uma estrutura que independe dos seus usuários. Ela confunde-se com a cultura daqueles que a utilizam. Sob esse ponto de vista, as palavras funcionam como receptores de conteúdos culturais que nelas se aderem e a elas agregam outra dimensão para além daquelas apresentadas nos dicionários. (Barbosa, 2008, p. 38).

O léxico, saber partilhado que existe na consciência dos falantes de uma língua, constitui-se no acervo do saber vocabular de um grupo sócio-linguístico-cultural. Na medida em que o léxico se configura como a primeira via de acesso a um texto, ele representa a janela através da qual uma comunidade pode ver o mundo, uma vez que esse nível da língua é o que mais deixa transparecer os valores, as crenças, os hábitos e costumes de uma comunidade. Isto também se aplicar às inovações tecnológicas, transformações socioeconômicas e políticas ocorridas numa sociedade. Em vista disso, o léxico de uma língua conserva uma estreita relação com a história cultural da comunidade.

Desse modo, o universo lexical de um grupo sintetiza à sua maneira de ver a realidade e a forma como seus membros estruturam o mundo que os rodeia e designam as diferentes esferas do conhecimento. Assim, na medida em que o léxico recorta realidades de mundo, define, também, fatos de cultura. (Oliveira; Isquerdo, 1998, p. 07).

Portanto, os estudos fraseológicos, como os apresentados no Dicionário das Expressões Idiomáticas Mais Usadas no Brasil (Riva,2013),desempenham um papel crucialnaexploração da relação entre léxico e cultura. Eles nos permitem entender como as expressões idiomáticas refletem e contribuem para a construção da identidade cultural de uma comunidade linguística, além de oferecer compreensão sobre a interação entre linguagem e sociedade.

3 Léxico, cultura e expressões idiomáticas

As expressões idiomáticas (EIs) são consideradas, dentre todas as dezenas de tipos de construções fraseológicas, um dos mais eficazes artifícios que tanto revelam a imaginação, a subjetividade, a criatividade e herança cultural do homem, tanto quanto as identidades culturais

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dos povos, numa inter-relação entre léxico e cultura que é indissociável. Além disso, os idiomatismos4 resistem ao tempo, transformando interações entre indivíduos em retratos de momentos históricos, o que nos leva a um encontro entre semântica e pragmática, como assevera a lexicógrafa e lexicóloga Cláudia Maria Xatara, em um artigo publicado em coautoria com suas orientandas à época, Paula Christina Falcão Pastore e Thais Marini Succi. (Xatara; Pastore; Succi, 2006, p. 276)

De fato, a pragmática vem contribuir com a semântica das palavras por meio das interações de fala, supostas intenções, condições sociais, sugestões sutis ou leves oposições, ironias, ditos nas entrelinhas, e assim por diante. Por isso, todo léxico está sujeito às mudanças detempo,de situações, de condições; assim, o significado deuma unidade léxica, longe de ser único e estável, dependerá da interpretação que, por sua vez, não é por todo subjetiva, visto ser fruto de um produto coletivo, resultado das concepções e visões de mundo de uma comunidade (Xatara; Pastore; Succi, 2006, p. 276).

Em muitasconstruções fraseológicas, épossível quese estabeleçaum ativodiálogocom diversos outros componentes da língua, proporcionando maior expressividade e incitando uma relação imediata e espontânea entre língua e sujeito.

A nítida relação entre cultura e os idiomatismos de uma língua é reiterada por Jorge; Jorge (1997, p. 11), porque as autoras veem que nas EIs

[...] se encontram registrados traços de ontem e de hoje que descrevem os homens, as relações entre eles e, no sentido mais lato, a própria sociedade. A idiomaticidade oferece-nos a possibilidade de enriquecer o nosso ideolecto, actualizando-o constantemente. Campo quase infinito de mistérios, de jogos, ironias... selado pelo poder que o povo tem de recriar a sua própria linguagem. (Jorge; Jorge, 1997, p. 11)

Da mesma forma, um idiomatismo inserido em um contexto determinado pressupõe uma construção da língua enquanto elemento social. O uso dessas expressões neutraliza, parcial ou integralmente, os significados das unidades lexicais que as constituem, incutindo sentidos cristalizados e compartilhados por sujeitos de uma mesma comunidade. Além disso, o idiomatismo aumenta o grau de subjetividade, revelando marcas do homem, e não apenas do indivíduo, em um período determinado de sua vida, refletindo características pessoais e coletivas. Ele solidifica valores mais perenes em uma linguagem em constante modificação e, muitas vezes, apresenta, no presente, traços culturais do passado.

Cabe ressaltar que pesquisar sobre idiomatismos é muito rico e revelador. Nem sempre dicionarizadas com precisão, tais unidades fraseológicas estão presentes nos mais variados gêneros discursivos e, quando observadas por esse viés sociológico, confirmam que por meio delas percebemos mais claramente os falares de um povo, numa mistura entre léxico e

4 “Locução, modo de dizer ou construção privativa de uma língua, e muitas vezes de origem popular ou familiar” (FERREIRA, 1996, p. 914).

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cultura. Isto se dá, pois tais falares estão intimamente ligados às tradições orais, o que não significa que sejam menos importantes do que quaisquer outros elementos culturais de uma determinada língua e comunidade.

Trazerde forma estruturadaas EIs em dicionários e registrá-las com concordânciasreais é promover um registro que vai além do registro linguístico. Significa congregar uma mistura de dados culturais e sociológicos para se chegar a um registro histórico de uma época, por meio do léxico, integrando pensamentos que já se perpetuam na forma de EIs àqueles que estão em destaque e caminham para a lexicalização.

4 Expressões idiomáticas, onomasiologia e motivações culturais

Elementos de uma partilha social e sincrônica, mas, também, de uma partilha de gerações, entre passado e presente, entre a língua de ontem e a língua de hoje, as EIs refletem o movimento, a evolução da língua, as metáforas do passado, os desvios lexicais, sintáticos e semânticos (Jorge; jorge, 1997). Por exemplo, fazer nas coxas, que indica serviço malfeito, feito de modo precário ou descuidado e, sem capricho, tem a suposta origem no período da escravidão quando, diz-se que, os escravizados produziam telhas modelando-as em suas coxas, sem a utilização de instrumentos adequados da olaria (Silva, 2002). Embora essa referência cultural esteja presente em diversos dicionários e artigos científicos de diferentes áreas, sua origem é controversa, pois há muitos pesquisadores que discordam da ideia de que os escravizados produziam literalmente telhas nas coxas (Rodrigues, 2013).

E se a própria língua mantém indubitavelmente relação direta com a cultura do povo queautiliza,fazendopartedesuaidentidade, énas EIs queessaidentidadecultural seevidencia mais. E da mesma forma que a língua não é neutra e está repleta de significações que refletem o meio social onde é falada, os idiomatismos devem ser entendidos como referências metafóricas ou figuradas dos aspectos sociais que regem uma comunidade de falantes.

Apenas a título de ilustração, tomamos como exemplo sobre metáforas e expressões idiomáticas aquelas presentes na Bíblia. Mesmo hoje em dia, essas expressões ainda são frequentes, embora suas metáforas originais tenham se tornado opacas devido às suas origens milenares. Isso ocorre, às vezes, por conta das inúmeras traduções já feitas, desde sua criação até edições mais recentes, desse importante conjunto de livros que compõem o Novo e o Velho Testamento. Seja como for, a Bíblia é uma fonte extremamente rica para pesquisas linguísticas e acadêmicas em geral. Além de seu valor religioso e cultural, o texto bíblico oferece uma variedade de aspectos para análise, incluindo história, linguagem, retórica, poder e questões políticas. A diversidade de temas abordados na Bíblia reflete aspectos fundamentais da sociedade e da condição humana, o que a torna uma fonte inesgotável de estudo e reflexão.

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Conforme ressalta Aichele (2000, p. 12), o texto bíblico “fornece elementos sobre a história, a linguagem, a retórica, o poder, como também, questões políticas (gênero, religião, raça, sexualidade, classe)”. Por meio da análise do texto bíblico, os pesquisadores podem examinar não apenas as narrativas religiosas, mas também as dinâmicas sociais, culturais e políticas que moldaram e continuam a influenciar o mundo contemporâneo, inclusive linguisticamente, uma vez que tal texto é bastante profícuo para unidades fraseológicas como provérbios e idiomatismos.

As EIs de origem bíblica, portanto, podem ser vistas como uma ponte que faz ligação do passado com o presente, na medida em que retomam valores e aspectos culturais de milhares de anos atrás e são difundidas atualmente em dezenas de idiomas, preservando, ao menos parcialmente, sua estrutura original e parte de sua conotação. Destacamos, dentre os inúmeros exemplosqueestãononossodicionário, ano (tempo) de vacas magras, beijo de Judas, carregar sua cruz, espírito de porco, jogar pérolas aos porcos, mudar da água para o vinho, onde Judas perdeu as botas, separar o joio do trigo, ser como São Tomé, pregar no deserto etc.

O mesmo ocorre com as EIs que têm origem na Mitologia ou na História. Ainda que o usuário de tais idiomatismos não saiba com clareza a origem dos termos constituintes dessas expressões, justamente por conta do prevalecimento do sentido conotativo sobre o denotativo, as referências ao passado estão cristalizadas e podem ser retomadas em estudos históricos. Por exemplo, a EI de origem histórica agradar a gregos e troianos relaciona-se à rivalidade histórica entre os povos gregos e os troianos (dessa rivalidade também nasceu a EI presente de grego, uma referência ao cavalo de Tróia). Outros exemplos são as EIs de origem na Mitologia como, pomo da discórdia, trabalhos de Hércules e voto de Minerva Para identificar os temas mais recorrentes na motivação das expressões idiomáticas (EIs), as possíveis inferências culturais que influenciam seu surgimento e as variações admitidas e frequentes, acreditamos que observar as particularidades dos idiomatismos listados em torno de um mesmo conceito é fundamental. Compartilhar, ao menos em parte, o mesmo campo semântico pode nos ajudar a enxergar com maior clareza as regularidades que regem sua gênese. Ou seja, é importante saber se elas foram construídas com base em substantivos, verbos e adjetivos, se nasceram com referências culturais claras à Bíblia, História, Mitologia, ou a assuntos mais contemporâneos como os memes, reality shows, bordões de personagens e/ou deinfluenciadores digitais etc.Assim surgiuapossibilidadedeagrupamento deexpressões idiomáticas por meio da onomasiologia.

Onomasiologia é um ramo da linguística que se concentra no estudo dos conceitos e na busca de palavras ou expressões para representar esses conceitos. Em outras palavras, a onomasiologia investiga como os falantes de uma língua escolhem palavras ou termos para descrever objetos, ações, emoções, ideias, entre outros elementos do mundo ao seu redor.

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Essadisciplinaanalisaquestões como acriaçãodeneologismos5,mudanças semânticas, sinônimos, antônimos e a relação entre palavras e conceitos. A onomasiologia também pode examinar os fatores sociais, culturais e psicológicos que influenciam as escolhas linguísticas dos falantes.

Em resumo, a onomasiologia é o estudo das palavras e expressões a partir de uma perspectiva conceitual, investigando como os falantes atribuem significado às coisas e como selecionam termos para se comunicar. Em outras palavras, da mesma forma que Borba (2006) defende que a arquitetura onomasiológica pode nos dizer muito das relações do léxico com o conjunto das criações humanas de quaisquer naturezas, material (objetos, lendas) ou nãomaterial (hábitos, ideias, ideologias), acreditamos que organizar onomasiologicamente as EIs usuais de uma língua pode nos ajudar a observar mais nitidamente essas unidades fraseológicas em sua relação com a cultura em geral.

Por fim, atestamos que o recurso à onomasiologia das EIs pode disponibilizar informações que permitem a observação clara das diferenças culturais em uma mesma língua, falada em um só país ou países diferentes. E também entre línguas diferentes, em estudos contrastivos, embora, ao longo da história da Lexicografia, a onomasiologia tenha sido questionada, e muitas vezes deixada de lado, uma vez que se supunha que os dicionários onomasiológicos (analógicos, ideológicos) não representavam a objetividade dos dicionários semasiológicos, organizados em uma estrutura alfabética.

Defendia-se, assim, que na onomasiologia havia certa abstração, uma subjetividade idiossincrática, na classificação extralinguística e tais críticas negligenciavam as vantagens epistemológicas de uma obra organizada onomasiologicamente que, de certa forma, incita-nos a uma análise linguística mais profunda da língua. Cabe lembrar, portanto, que esse tipo de estruturação do léxico é muito rico e abrangente porque disponibiliza informações para análise das unidades lexicais quando agrupadas por meio de temas, campos semânticos, conceitos mais genéricos ou mais específicos.

O trabalho que apresentamos é o resultado de uma pesquisa detalhada sobre esse tema, conforme documentado nos estudos conduzidos por Riva (2009).

5 A onomasiologia para evidenciar valores culturais nos idiomatismos

Toda a tessitura construída pelos sentidos das EIs de uma língua fica mais evidente por meio da onomasiologia, pois percebemos que esse fenômeno linguístico é passível de ser organizado de tal forma que nos permite revelar informações semânticas e/ou pragmáticas a seu

5 “Palavra, frase ou expressão nova, ou palavra antiga com sentido novo.” (FERREIRA, 1996, p. 1189)

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respeito. No entanto, essa organização requer certos cuidados e pode ser aplicada na organização das mais diversas unidades fraseológicas existentes como, por exemplo, num dicionário de provérbios.

Uma obra que ilustra tal observação é o dicionário de provérbios chamado Adagios portuguezes reduzidos a lugares communs (Delicado, 1651). Trata-se de um trabalho que apresenta cerca de 4 mil provérbios (ou adágios) “reduzidos a lugares comuns”, ou seja, agrupados ao redor de temas e com o intuito de listar, mesmo que subjetivamente, esse tipo de fraseologismo.

Essa possibilidade de organizar também outras unidades fraseológicas por meio de conceitos já ocorre há muitas décadas e, como se observa na obra de Antonio Delicado, tratase de uma maneira de se pensar e estruturar a cultura por meio de uma língua. Na obra citada, por exemplo, há conceitos como BONDADE, estabelecido para provérbios como, Cada cuba cheira o vinho que tem; POBREZA, para Neste mundo mesquinho quando ha para pam, nam ha para vinho; VERDADE, para A verdade ainda que amarga se traga etc. (Delicado, 1651).

Em alguns casos, retomando o caso das EIs na pesquisa de Riva (2009; 2013), nota-se que, apesar de determinados idiomatismos terem elementos comuns em sua constituição (uma ou mais palavras), isso não significa que se refiram a um mesmo tema e possam ser agrupadas ao redor de um mesmo conceito, de um mesmo campo semântico. Por exemplo, a expressão de tirar o chapéu concerne à ADMIRAÇÃO. Por outro lado, passar o chapéu indica NECESSIDADE e fazer caridade com o chapéu alheio, OPORTUNISMO.

Todas essas EIs trazem o substantivo chapéu em sua constituição, mas os sentidos conotativos são bem diferentes. Se se tratasse de uma organização semasiológica, muito provavelmente tais idiomatismos estariam dispostos dentro de um mesmo verbete, no caso de se tomar a lexia chapéu como entrada do dicionário e/ou palavras-chave.

Oidiomatismo armar o barraco,porsuavez,ou a variante registradano Houaiss (2001) armar uma barraca, refere-se ao conceito ESCÂNDALO, sendo usado para descrever desordem, tumulto, confusão, incitação à briga ou quebra da ordem estabelecida. Porém, se mudarmos o gênero do substantivo, do masculino para o feminino, teremos um idiomatismo com um sentido totalmente diverso: armar a barraca, que é menos frequente, é uma EI usada em referência a SEXO, mais especificamente, à excitação sexual masculina, e nada tem a ver com o conceito de ESCÂNDALO.

Também observamos que há referências muito comuns entre as EIs agrupadas em cada conceito. O substantivo mais recorrente, por exemplo, para se tratar de maneira positiva ou negativa dos múltiplos desdobramentos que dizem respeito à emotividade do homem é

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coraçãoem GENEROSIDADE, de bom coração ou coração de ouro, em EMOÇÃO, falar ao coração, emTRISTEZA, de cortar o coração ou de partir o coração,em INSENSIBILIDADE, coração de gelo ou coração de pedra. O mesmo ocorre com cabeça quando o assunto é tratar do intelecto, do discernimento ou da falta dele, em IMPRUDÊNCIA, perder a cabeça, em oposição à PRUDÊNCIA, ter a cabeça no lugar. Outra observação pertinente é a maior recorrência das EIs com nomes de animais na descrição pejorativa das pessoas, por exemplo, para o conceito APARÊNCIA, nariz de tucano, olho de peixe morto, perna de saracura, para IGNORÂNCIA, besta quadrada, burro como uma porta, mula manca, para LENTIDÃO, passos de tartaruga etc.

No conjunto das EIs usuais no português brasileiro, se levarmos em consideração suas definições e contextos de uso, podemos encontrar expressões positivas, negativas ou neutras. Assim, temos a EI fazer jogo duplo, lágrimas de crocodilo e ter duas caras, por exemplo, confirmando um valor negativo que as reúne no conceito FALSIDADE. Aliás, os idiomatismos mais frequentes no Brasil têm motivação negativa, manifestando ideias referentes a situações desagradáveis em suas múltiplas possibilidades de expressão, desde a pré-disposição de alguns indivíduos pelo olhar desfavorável, pelo pior, como no conceito de PESSIMISMO, achar-se um lixo ou nem tudo são flores, até conceitos que são vistos na cultura brasileira, mas não em todas as culturas do mundo, como negativos, caso de MORTE, com a rara exceção eufemística, passar desta para uma melhor

Gráfico 1: Conjunto total de Expressões Idiomáticas

Positivas Negativas Neutras

Fonte: Riva (2009, p. 278)

No Gráfico 1, que representa o número total de expressões idiomáticas pesquisadas por Riva (2009; 2013), compreendendo um total de 1.562 idiomatismos frequentemente encontrados na web na época, podemos observar que 6% desse total corresponde às expressões consideradas neutras. Essas expressões estão agrupadas em conceitos, como FAMÍLIA, JUVENTUDE, MADRUGADA, MANHÃ, MASTURBAÇÃO, SEXO e TEMPO, cuja motivação não envolve juízo de valor.

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É interessante observar ainda que há certas diferenças entre a porcentagem das motivações negativas, positivas e neutras encontradas nas EIs e no número total de conceitos (cf. Gráfico 2) em relação à valoração negativa. Verificamos 62% de EIs de prosódia semântica negativa e apenas 46% de conceitos dentro deste mesmo tipo de valoração; no que diz respeito à valoração positiva, observamos porcentagens equiparadas, com 32% de EIS e 32% de conceitos, respectivamente; e no que diz respeito ao valor dito neutro, encontramos apenas 6% de EIs mas 22% dos conceitos.

Tal fato éexplicado porqueexistem conceitos que abrangem EIs positivas, como sangue azul, e EIs negativas, como Zé mané. O mesmo ocorre com o conceito SURPRESA, que pressupõe um fato inesperado e imprevisto, mas que, a depender do contexto, pode ser classificado como neutro, como em cair de costas, de queixo caído, ou apenas positivo, como em de tirar o fôlego, ou apenas negativo, como ficar com cara de tacho.

Gráfico 2: Conjunto total de conceitos

Positivas Negativas Neutras

Fonte: Riva (2009, p. 279).

Vejamos oGráfico2,apresentadoporRiva(2009), sobreo conjunto total deconceitos. Nele, observa-se uma predominância de expressões idiomáticas de caráter negativo relacionadas a aspectos humanos e ações. Essa constatação é resultado da análise onomasiológica das EIs do português do Brasil, revelando a representação figurada de aspectos negativos do ser humano e de suas ações como o tema central. Esta predominância indica uma tendência para expressões que transmitem juízos de valor negativos. Pode-se inferir que, no contexto da pesquisa de Riva (2009), havia uma preponderância para idiomatismos relacionados aos conceitos de AGRESSIVIDADE - e que foi desmembrado em conceitos mais específicos e também negativos - como AGRESSÃO, CRÍTICA, IRRITAÇÃO, RAIVA, VIOLÊNCIA.

Outro aspecto observado quanto à valoração das EIs é que há conceitos que apresentam, por si só, uma relação de oposição, como HONESTIDADE e DESONESTIDADE. Desse modo, todas as EIs positivas agrupadas em HONESTIDADE se opõem às EIs negativas agrupadas em DESONESTIDADE.

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A pesquisa sobre a organização onomasiológica das Expressões Idiomáticas (EIs) do português do Brasil, conforme abordada na obra 'Dicionário das Expressões Mais Usadas no Brasil: Organização Onomasiológica' (Riva, 2013), revelou um predomínio da representação figurada de aspectos negativos do ser humano e de suas ações. Notavelmente, identificamos que o conceito mais produtivo em relação ao número de EIs abordadas foi AGRESSIVIDADE. Entre os verbos mais frequentemente empregados para caracterizar agressões, tanto verbais quanto físicas, ou o agressor, destacam-se: acabar, acertar, amassar, baixar, bater, esfolar, esmagar, espumar, esquentar, meter, moer, morder-se, pegar, quebrar, rachar, ranger, rosnar, sair, sentir, soltar, tirar, tratar e xingar, entre outros. Além disso, notamos uma recorrência de partes do corpo humano em tais expressões, como braço, cabeça, cara, couro, dente, mão, nervo, osso, pele, pescoço, rosto e unha, assim como substantivos característicos, como cabresto, cavaco, chicote, couro, faca, faísca, foice, guerra, lenha, pau, pedra, porrete, raiva, rédea, sarrafo e vara, presentes em diversas EIs, como 'baixar o sarrafo', 'descer a lenha', 'espumar de raiva', 'pé de guerra', 'soltar faísca' e 'quebrar o pau', entre outras. Outros conceitos negativos predominantes são MORTE, em bater as botas, a sete palmos debaixo da terra etc., em detrimento de VIDA, são e salvo, ou EMBRIAGUEZ, encher a cara, entornar o caneco, em detrimento de SOBRIEDADE, estar limpo. E outros tantos dentre os quais se destacam: IGNORÂNCIA, IMPOSSIBILIDADE, IMPRECISÃO, IMPRUDÊNCIA, INATIVIDADE, INCERTEZA, INCOMPETÊNCIA, INCOMPREENSÃO, INDECISÃO, INDISCRIÇÃO, INFELICIDADE, INFERIORIDADE, INGRATIDÃO, INIMIZADE.

6 Valores brasileiros e valores emprestados

Ainda que as línguas troquem referências e as reconstruam, remodelando ao mesmo tempo as identidades culturais de cada nação, isso ocorre por meio da globalização. O aumento significativo dos tipos de veículos de comunicação e mídias que registram e reproduzem a língua contribui para esse fenômeno. Além disso, o aumento das migrações internas e externas que ocorrem no mundo todo dificulta uma delimitação das fronteiras no que diz respeito às mudançaslinguísticas eculturais.Noentanto,mesmodiantedessecenáriocomplexo,épossível distinguir elementos específicos da identidade cultural brasileira nos idiomatismos descritos. Existem inúmeras EIs de caráter racista, tais como, serviço de preto ou a cor não nega, ambas adjetivando pejorativamente as etnias das pessoas afro-brasileiras. Esses idiomatismos são frequentes na modalidade oral e são proferidos ou por pessoas declaradamente racistas ou por aquelas que reproduzem o racismo estrutural existente na sociedade brasileira. No geral, a maioria dos brasileiros vai responder que conhece ao menos um idiomatismo racista.

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Contudo, não é tarefa fácil encontrar esses idiomatismos publicados em textos reais, ou publicados por pessoas e/ou perfis reais na modalidade escrita, seja em jornais, revistas, na internet etc., uma vez que o racismo no Brasil é crime inafiançável. Desta forma, as pessoas evitam expor esta forma de preconceito e discriminação para não serem punidas. Retifica-se, porém, que isso não quer dizer que não existe racismo no Brasil.

Tal fenômeno é explicável. Há na Constituição da República Federativa do Brasil (Brasil, 1988) uma proibição de manifestação de ideias preconceituosas, “XLII – a prática de racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”, e se refere à lei n° 8.081, de 21 de setembro de 1990, que estabelece os crimes e as penas aplicáveis aos atos discriminatórios ou de preconceito de raça, cor, religião, etnia ou procedência nacional praticados pelos meios de comunicação ou por publicação de qualquer natureza.

Assim, embora se encontrem na web idiomatismos racistas, sua presença está ligada à explicação de seus significados, em sites que difundem ideias de tolerância e banimento do racismo em nosso país, ou em blogs, caixas de textos, perfis em redes sociais etc., na grande maioria das vezes, anônimos. Portanto, confirma-se que as EIs de cunho discriminatório, sobretudo na escrita, podem levar o usuário a ser punido, a depender da interação e contexto de uso dessas expressões.

Com a aplicação dos direitos das minorias, citamos os exemplos da busca por equidade de direitos pleiteados pelos LGBTQIAPN+6 no Brasil. É possível que sejam punidos usuários de expressões e/ou gírias de conotação pejorativa LGBTfóbicas, subordinado aos contextos de usos dessas EIs, como agasalhar o croquete, arrolhar uma mandioca, dar ré no quibe, queimar a rosca, sentar na boneca etc. Tais observações mostram que, por conta da evolução das leis e a busca real por igualdade, algumas restrições também já ocorrem na língua, lugar no qual o costume e a expressão se encontram, positiva ou negativamente. É preciso lembrar que as unidades lexicais não têm significado absoluto. Toda materialidade lexical da língua está a serviço da semântica, da pragmática eda interação,oquesignifica queos sentidos seconstroem no uso. Desse modo, não se deve condenar essas unidades isoladamente. Elas praticamente não existem fora do uso.

Riva (2009) constatou que as unidades fraseológicas revelam que brasileiros utilizam metáforas emprestadas de outras culturas, como por exemplo as metáforas bíblicas, e que ainda hoje são utilizadas, como nas EIs e provérbios nada de novo sob o sol, que atire a primeira pedra, um cego guiando outro cego, a fé move montanhas, a união faz a força e a carne é

6 Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros / Transexuais / Travestis, Queers / Questionando, Intersexuais, Assexuais / Agêneros, Pansexuais / Não binários e mais, “+”. (Silva; Lopes, 2023; Ferreira, 2023)

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fraca. Outras EIs trazem elementos alheios ao nosso território, como olhos de lince e fome de leão, ambos animais nãopresentesem nossafauna. Háainda,metáforas universais, como partes do corpo humano, boca ou língua, para o campo semântico COMUNICAÇÃO ou estereótipos, com referências exclusivas daculturabrasileira, caso de rodar a baiana equeapareceagrupada no conceito ESCÂNDALO, jogar confetes, que faz parte do conceito BAJULAÇÃO, boi de piranha, expressão de origem pantaneira e que consta no conceito VÍTIMA e que divide o mesmo campo semânticocom bode expiatório,oumesmos traços presentes em EIs querevelam oolhardobrasileirosobreoutrospovosouelementosculturaisdeoutrospaíses,casode negócio da China, do conceito VANTAGEM, sair à francesa, do conceito DISCRIÇÃO, para inglês ver, referente a APARÊNCIA, presente de grego, do conceito INCÔMODO (RIVA, 2009).

Nãopoderíamosdeixardemencionarofato dopredomíniodeEIsdeconotaçãonegativa para descrever situações brasileiras sobre temas como violência, injustiça, impunidade, descrença no país, pobreza etc. O brasileiro busca se referir a si próprio e sobre os aspectos negativos da vida na atual circunstância, ou diretamente, como EI menino de rua, POBREZA, ou por meio da ironia, acabar em pizza, IMPUNIDADE, de eufemismo, estar nas últimas, MORTE, da hipérbole, olhos da cara, DINHEIRO.

7 Considerações Finais

Evidentemente, não se pretendeu aqui fornecer todos os elementos para se identificar a culturabrasileira reveladapelas EIs usadas nopaís, dada a complexidadeintrínseca a esse tema. Coube-nos, apenas, demonstrar que os idiomatismos, de fato, manifestam sentimentos arraigados, constantemente à busca de uma maior expressividade, em nossa língua e em nossa cultura.

Acreditamos, pois, que a rigorosa observação de grande parte das peculiaridades concernentes às EIs e à identidade cultural brasileira permitirá, em pesquisas futuras, a elaboração de trabalhos mais amplos e que venham a contemplar o maior número possível de EIs ou de outras unidades fraseológicas, apresentando, de modo mais abrangente, como os idiomatismos se organizam dentro da língua portuguesa do Brasil, nos outros países lusófonos e em trabalhos contrastivos.

As EIs mostram diretamente a expressividade existente na língua, pela manifestação de sentimentos como a afetividade, emotividade, sensibilidade e subjetividade. Trata-se, portanto, de um importante objeto de estudo da estilística, porque congrega denotação e conotação, criando uma imagem abstrata construída a partir de unidades lexicais individuais. Cada idiomatismo traz em si, em alguma instância, uma carga de valor, um aspecto valorativo

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positivo, negativo ou neutro dependendo das escolhas individuais do falante. No entanto, isso não exclui o valor socialmente compartilhado, cristalizado e constante em cada EI.

As EIs, particularmente, podem ser consideradas uma clara evidência da cultura expressa nalíngua porquetrazem, em diversos casos, motivações, opacas ounão,de referências culturais do passado ou reflexos atuais que identificam uma cultura.

O agrupamento de idiomatismos ao redor de conceitos revela uma intrínseca relação entre cultura e língua. Portanto, as Expressões Idiomáticas (EIs) são fenômenos linguísticos diretamente relacionados à cultura. A identidade de um indivíduo se constrói na língua e por meio dela. Os idiomatismos disponibilizam, por meio de suas metáforas, informações não apenas sobre a organização social e os costumes de um povo, mas também sobre seu contexto histórico e a natureza psicológica das escolhas dos falantes.

Conclui-se, também, que os dados das pesquisas indicaram que, em grande parte dos idiomatismos brasileiros, há uma predominância de expressões idiomáticas (EIs) com motivação negativa a respeito do homem ou da sociedade. Além disso, observou-se uma frequência de EIs relacionadas à proibição, ironia, provocando efeito contrário ao esperado, nocividade, prejuízo, entre outros. Também foram encontradas EIs eufemísticas, que suavizam ou minimizam uma acepção menos agradável, mais grosseira ou tabuística.

Referências

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REFLEXÕES

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SOBRE A EXPERIÊNCIA DO CURSO DE EXTENSÃO “ENGLISH TO FACE INEQUALITIES”:

MOBILIDADE SOCIAL E

DESENVOLVIMENTO DO CAPITAL CULTURAL DE ALUNOS DA FATEC ITU E COMUNIDADE EXTERNA

Thômas Felipe Rodrigues1

Emerson Freire2

Resumo. A proposta de uma breve reflexão acerca do potencial de contribuição de um curso intitulado “English to Face Inequalities” para a mobilidade social e desenvolvimento do capital cultural de alunos da Fatec Itu e comunidade externa, se dá através da análise de referenciais bibliográficos que visam conceituar os pilares deste curso, a saber-se o Inglês enquanto Língua Franca e o material didático enquantoinstrumentodecolonizadorefacilitadordamobilidadesocial dosestudantes.Abreveretomada acerca do papel da Extensão Universitária e do Desenvolvimento da Cultura no âmbito das instituições de Ensino Superior faz-se necessária para contextualizar o debate sobre a mobilidade social, partindose para tal, da reflexão acerca da função das Fatecs para a promoção da extensão, sob a ótica das contribuições de Bourdieu acerca do capital cultural. Ainda se desenvolve neste texto a compreensão da importância da representatividade dos integrantes de grupos minorizados nos materiais didáticos, assim como os desafios para a promoção da representatividade nos processos de geração de imagens neste curso específico, dado o fenômeno aqui livremente traduzido enquanto “vieses codificados”, o que implica na sub-representação de pessoas pertencentes a grupos minorizados em bancos dados utilizados por inteligências artificiais. Compreende-se através deste estudo, não apenas a relevância do tema, mas a urgência de estudos que abordem com profundidade os assuntos aqui apresentados, assim como a elaboração de materiais didáticos que considerem a urgência de recortes temáticos voltados para a decolonização no âmbito do fomento à extensão e à cultura no Ensino Superior Tecnológico.

Palavras-chave: extensão; mobilidade; representatividade; decolonização; ensino tecnológico

Resumen. Reflexiones sobre la experiencia del curso de extensión “Inglés para enfrentar las desigualdades”: movilidad social y desarrollo del capital cultural de los estudiantes de Fatec Itu y la comunidad externa. La propuesta de una breve reflexión sobre el potencial aporte de un curso titulado “Inglés para enfrentar las desigualdades” para la movilidad social y el desarrollo del capital cultural de los estudiantes de Fatec Itu y la comunidad externa, se realiza a través del análisis de referencias bibliográficas que tienen como objetivo conceptualizar los pilares de este curso, a saber, el inglés como lengua franca y el material didáctico como instrumento descolonizador y facilitador de la movilidad social de los estudiantes. Un breve repaso del papel de la Extensión Universitaria y el Desarrollo Cultural dentro de las instituciones de Educación Superior es necesario para contextualizar el debate sobre la movilidad social, a partir de una reflexión sobre el papel de las Fatecs en la promoción delaextensión,desdelaperspectivadelosaportesdeBourdieusobreel capital cultural.Lacomprensión de la importancia de la representación de miembros de grupos minoritarios en los materiales didácticos aún está en desarrollo en este texto, así como los desafíos para promover la representación en los

1 Formado em Letras com Licenciatura Plena para o ensino das línguas portuguesa e inglesa pelo CEUNSP, Graduado em Pedagogia pela Intervale, Pós-Graduado em Coordenação Pedagógica pela Ufscar Sorocaba e Mestrando em Gestão e Desenvolvimento da Educação Profissional do CEETEPS. É coautor do Curso de Inglês para a Diversidade Lift, oferecido em parceria entre o Conselho Britânico e a Revista Nova Escola. Atualmente é Professor de Língua Inglesa na Fatec Itu, atuando na docência e em projetos de extensão voltados para a música e a diversidade. E-mail: thomas.felipe@fatec.sp.gov.br.

2 Possui doutorado em Sociologia pela Unicamp e realizou pós-doutorado em Sociologia da Tecnologia também na Unicamp. Ganhador do Prêmio Rumos Pesquisa do Instituto Itaú Cultural. É Professor no Programa de PósGraduação em Educação Profissional do CEETEPS e na Fatec Jundiaí, onde também coordena o Núcleo de Estudos de Tecnologia e Sociedade. É pesquisador do grupo Conhecimento, Tecnologia e Mercado. Email: emerson.freire@cpspos.sp.gov.br.

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procesos de generación de imágenes en este curso específico, dado el fenómeno aquí traducido libremente como “codificado”. sesgos”, lo que implica la subrepresentación de personas pertenecientes agruposminoritariosenlasbasesdedatosutilizadasporlainteligenciaartificial.Atravésdeesteestudio se entiende no sólo la relevancia del tema, sino la urgencia de realizar estudios que aborden en profundidad los temas aquí presentados, así como el desarrollo de materiales didácticos que consideren la urgencia de apartados temáticos dirigidos a la descolonización en el ámbito de la desarrollo a la extensión y la cultura en la Educación Tecnológica Superior.

Palabras clave: extensión; movilidad; representatividade; descolonización; enseñanza tecnologíca.

Abstract. Reflections on the experience of the extension course “English to face inequalities”: social mobility and development of cultural capital of Fatec Itu students and the external community.Theproposalforabriefreflectiononthepotentialcontributionof acourseentitled“English to Face Inequalities” for social mobility and development of cultural capital of Fatec Itu students and the external community, is carried out through the analysis of bibliographical references that aim to conceptualize the pillars of this course, namely English as a Lingua Franca and the teaching material as a decolonizing instrument and facilitator of students' social mobility. A brief review of the role of University Extension and Cultural Development within Higher Education institutions is necessary to contextualize the debate on social mobility, starting with a reflection on the role of Fatecs in promoting extension, from the perspective of Bourdieu's contributions on cultural capital. The understanding of the importance of representation of members of minority groups in teaching materials is still being developed in this text, as well as the challenges for promoting representation in the image generation processes in this specific course, given the phenomenon here freely translated as “coded biases”, which implies the underrepresentation of people belonging to minority groups in databases used by artificial intelligence. Through this study, not only the relevance of the topic is understood, but the urgency of studiesthataddressindepththesubjectspresentedhere,aswellasthedevelopmentofteachingmaterials that consider the urgency of thematic sections aimed at decolonization within the scope of development to extension and culture in Higher Technological Education.

Keywords: extension; mobility; representation; decolonization; technological teaching

1 Introdução

A superação das desigualdades sociais é um desafio inerente a todas as sociedades e perpassa inevitavelmente os espaços de formação acadêmica. No Brasil, apenas em 1988 a constituição trouxe de forma mais ampla e clara a educação como direito de todos (Brasil, 1988). No âmbito do Ensino Superior, por conta de diversos desvios da sua função social, entende-se que muito há que se discutir e investir para que, de fato, o desenvolvimento cultural e a promoção da igualdade sejam contemplados com a relevância que merecem nas instituições, sobretudo nas públicas, a fim de que se ofereçam cursos que formem cidadãos para o gozo da autonomia e de maior dignidade, assim como para que propicie, através da formação, o acesso aos mais diversos bens sociais. Silva e Fonseca (2018) apresentam esta problemática trazendo à luz a deficiência das políticas públicas para a educação, sobretudo no contexto da Educação Profissional e Tecnológica de nível de graduação, em desenvolver de maneira conjunta e equitativa as três dimensões correlativas e essenciais para a formação neste nível, o ensino, a pesquisa e a extensão, caracterizando os que os autores intitulam como tripé manco, dado que

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geralmente, as instituições de ensino superior privilegiam apenas uma das dimensões no ensino superior, a do ensino.

O curso “English to Face Inequalities”, em desenvolvimento na Fatec Itu, constitui-se de uma ação integradora entre as dimensões ensino, pesquisa e extensão, por meio da elaboração de um curso de Inglês e sua aplicação para a comunidade externa e alunos necessitem de suporte extra para desenvolvimento da Língua. Partindo-se do pressuposto de que a aprendizagem efetiva demanda o respeito à realidade dos aprendizes (Freire, 1987) e considerando as habilidades em língua inglesa como um indicador de mobilidade social (Graddol, 2006), o curso que é objeto desta pesquisa, tem como intencionalidades principais constituir-se enquanto instrumento para o desenvolvimento linguístico e cultural dos estudantes, corroborando com o aumento da mobilidade social destes, para tanto, tem-se o cuidado durante o desenvolvimento do curso, de promover a curadoria para escolha de textos e elementos gráficos que melhor representem o público alvo, assim como a pesquisa para averiguação da efetividade deste em cumprir seus propósitos.

O presente artigo propõe-se, a partir de um breve estudo bibliográfico pautado em referenciais voltados para a compreensão da cultura decolonizada, da mobilidade social e da representatividade em materiais didáticos, promover a reflexão acerca de como os diversos elementos culturais presentes no processo de elaboração de um curso de Inglês intitulado “English to Face Inequalities”, em desenvolvimento no contexto da Fatec Itu, tendo como premissa a concepção do Inglês como Língua Franca e, portanto, uma língua disseminada globalmente, possui o potencial para a promoção do desenvolvimento do capital cultural dos alunoscomoelemento facilitadordamobilidadesocialdestes,constituindo-seassimcomoparte de um processo decolonizador e de um instrumento importante para o desenvolvimento integral das funções das instituições de Ensino Superior, no âmbito da Fatec Itu.

O problema que se coloca é o da necessidade de ações extensionistas no âmbito das Instituições de Ensino Superior Tecnológico e da demanda pela produção de materiais para o Ensino de Língua Inglesa nos diversos elementos linguísticos e visuais sejam desenvolvidos de forma a representar, intencionalmente, integrantes de grupos minorizados, como proposta para promoverodesenvolvimentocultural emobilidadesocialdosestudantes.Aconcepçãodocurso em desenvolvimento parte do pressuposto de que a cultura, conforme enfatizado por Vygotsky (1988),temumpapelessencialparaodesenvolvimentodopensamentoedalinguagemhumana. Sendo assim, entende-se, a partir da concepção do materialismo histórico-dialético, que serve como base para a pesquisa de diversos autores como Paulo Freire, Frantz Fanon, aqui citados, entre outros, que a correlação entre os conteúdos abordados no contexto educacional com o contexto de vida dos alunos, sobretudo aqueles adultos, é essencial para a suas aprendizagens.

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Sabendo-se que o curso que serve como objeto de estudo apresentado no presente artigo tem como público alvo estudantes que não tiveram oportunidades de aprender a Língua Inglesa previamente, pretende-se explicitar o potencial dessa experiência para o desenvolvimento do capital cultural dos estudantes, o que segundo Bourdieu (2007), constitui-se como forma importante de poder social, visto que a cultura se constitui dos recursos culturais possuídos por um sujeito, o que pode incluir a educação, habilidades, conhecimentos, comportamentos, gostos e a capacidade de apreciar obras culturais, para tanto, há de se considerar as três dimensões do capital cultural, a saber: i) o capital cultural incorporado, que se refere à cultura internalizada pelos indivíduos; ii) o capital objetivado, que diz respeito aos bens físicos possuídos como livros e obras de arte, iii) o capital institucionalizado, que se refere às credenciais e qualificações educacionais formalmente reconhecidas. Portanto, o objetivo geral deste texto é analisar o potencial dos elementos culturais em um curso de inglês para o enfrentamento das desigualdades para o desenvolvimento cultural dos estudantes e da comunidade participante no projeto, visto que se entende que o presente curso ofereça, a partir da análise do seu processo de construção, importantes elementos que desvelam as nuances presentes no processo de desenvolvimento do material didático abordado pelo texto.

2 A relevância da promoção da Extensão nas Fatecs

Sendo a Fatec Itu o espaço onde o curso “English to Face Inequalities” é desenvolvido e aplicado, faz-se necessário retomar o papel da instituição para a promoção de práticas extensionistas, sobretudo aquelas voltadas para a promoção da cultura e da diversidade. No Brasil, a educação superior tem seu início com a chegada dos Jesuítas, por volta de 1553, períodoestedemuitainfluênciadas Universidades Europeias.Dentre os primeiroscursos oferecidos nas faculdades, estavam os que formavam em assuntos de guerra. Com a Independência do Brasil em 1822, há a descentralização do Ensino Superior, e em 1827 são criados cursos de Direito em São Paulo e Olinda, ainda apresentando um caráter extremamente elitizado. Após a Proclamação da República, em 1889, há uma nova expansão da Educação como demanda de latifundiários que desejavam que os filhos fossem bacharéis e doutores. Em 1901, se dava a reestruturação do Ensino Básico que permitia, mediante submissão à fiscalização federal, que instituições públicas e privadas tivessem as mesmas prerrogativas que asfaculdades federais,sendoassim,umaveztendoseusestudosconcluídos,osalunospoderiam se inscrever em quaisquer cursos superiores no país sem a exigência de estudos preparatórios (Cunha, 2007, p. 158).

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Cunha (2007) aponta que após a Revolução de 30, em 1931, é promulgado o Estatuto da Universidade Brasileira e, em 1934, é criada a Universidade de São Paulo. Ainda em 1931, é promulgado o Decreto nº 19.851 (Brasil, 1931), intitulado Estatuto das Universidades Brasileiras, que determina que o ensino universitário tem por finalidade elevar a cultura geral, estimular a investigação científica em quaisquer domínios dos conhecimentos humanos, habilitar ao exercício de atividades que requerem preparo técnico e científico superior, assim como favorecer a coletividade harmônica entre os objetivos de professores e alunos.

Em 1961, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação permite a criação de novos cursos de graduação. A Universidade Federal de Brasília é criada neste período, tendo o enfoque no desenvolvimento da cultura e tecnologia. Em 1968, é promulgada a chamada Lei da Reforma Universitária, que propõe a pesquisa, o desenvolvimento das ciências, letras e artes e formação profissional como objetivos do Ensino Superior, além de reforçar a autonomia das universidades. Em 1971, após o golpe de 1964, há ampliação da educação básica para 8 anos e a estruturação do ensino secundário profissionalizante e apenas em 1996, a Lei nº 9.394/96 (Brasil, 1996) ressalta a importância e a indissociabilidade entre o ensino, a cultura e a extensão universitária.

As Faculdades de Tecnologias (Fatecs) surgiram em 15 de janeiro de 1968, tendo como sua maior missão atender a demandas inerentes ao mercado de trabalho. Em sua criação, o Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza (CEETEPS), que administra as Fatecs e Etecs, fora denominado inicialmente de Centro Estadual de Educação Tecnológica, passando ao nome atual somente em 1973. Com a criação da UNESP em 1976, o CEETEPS é transformado em autarquia em regime especial, vinculada à Universidade, constituindo a Fatec enquanto instituição essencial para a promoção da mobilidade social de seus estudantes e egressos, visto que seu público alvo é formado por estudantes, em sua maioria advindos de escolas públicas, que obtém maiores possibilidades de ingresso no mercado de trabalho através da instituição e os cursos nela oferecidos.

O ensino, a pesquisa e extensão são constituintes dos currículos da Fatec, porém, sofrese do mesmo problema do tripé manco sinalizado por Silva e Fonseca (2018). Dado o contexto não apenas institucional, mas econômico, político e cultural do país, ainda há importantes passos a serem dados de forma a garantir que estas dimensões do tripé ocorram de forma integrada, sobretudo no que se refere à extensão. Uma pesquisa recente de Silva e Machado (2022)propõeo estudo sobreas práticas extensionistas noâmbito das Fatecs, identificando que, de acordo com professores(as) entrevistados(as), apenas 50% das unidades possuiriam um plano ou política de extensão e que, ainda que compreendam a importância desta dimensão do ensino superior, existem dificuldades atreladas ao tempo dos seus contratos, a recursos e à ausência de uma política institucional para tal.

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Ao realizar uma pesquisa documental acerca do desenvolvimento da dimensão cultural nos Cursos Superiores de Tecnologia (CSTs), Oliveira, Freire e Batista (2020) constatam que as práticas extensionistas constituem-se elementos essenciais para a formação integral dos estudantes do Ensino Superior, visto que não há evidências dos benefícios de um currículo focado estritamente na dimensão técnica, em detrimento da pesquisa e da extensão e cultura. Antes, ao contrário, a literatura e os estudos apontam os diversos benefícios das práticas culturais para o desenvolvimento dos estudantes. A produção dos autores oferece fortes subsídios para a compreensão da necessidade do desenvolvimento de práticas extensionistas e fomento à cultura e à extensão, tendo sobretudo, o contexto das Fatecs.

3 A relação entre Educação Profissional e Tecnológica, Mobilidade Social e Empregabilidade

A compreensão do termo mobilidade social é essencial para a discussão do Ensino Superior como elemento para a melhoria da qualidade de vida de alunos e egressos. De acordo com Oliveira (2010), o termo mobilidade social é entendido como o movimento de indivíduos ou das unidades familiares entre categorias socioprofissionais, podendo ocorrer dentro de uma classe ou entre diferentes classes.

Martins (2016) contribui significantemente para a contextualização do termo mobilidade social no Brasil, embasando-se em Bourdieu e Souza para tal. Para a autora, as Instituições de Ensino Superior possuem um papel essencial para a promoção do acesso de seus estudantes adiferentes espaços sociais daquelespropiciados porseus pais, oqueé caracterizado enquanto inserção vertical. À luz de Bourdieu, a autora ressalta a importância do Ensino Superior para o desenvolvimento dos capitais cultural, social e econômico dos estudantes.

Corroborando com as proposições de Martins (2016), dados apontam que possuir formação superior é um elemento chave para que pessoas consigam alcançar novos patamares sociais. De acordo com a pesquisa de Veloso, Barbosa e Peruchetti (2022), o aumento da oferta educacional após o início da década de 90 tem influência direta na diminuição da informalidade no mercado detrabalho, umavezquepessoasmais bem formadas setornam capazes deoferecer mão de obra especializada. O estudo também comprova que trabalhadores que possuem entre 9 e15 anos de estudo têm gradativamentemenos chances deestarem desempregados, tais dados devem ser analisados considerando a recessão ocorrida entre 2014 e 2017 e o período de pandemia por conta de sua influência no mercado de trabalho.

A pesquisa de Martins (2016), ainda que realizada no contexto da Cidade de Porto Alegre, traz elementos que comprovam que o ensino superior permite a inserção no mercado

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de trabalho mais qualificante, o que implica na possibilidade de o egresso atuar em atividades que mobilizem os saberes de sua área de conhecimento, em condições adequadas para o desenvolvimentodeseutrabalho,oqueinclui,contrataçãoportempoindeterminado,osdireitos trabalhistas, a adequação de seu salário e demais benefícios.

Martins (2016) ainda apresenta uma importante contribuição metodológica para a compreensão da mobilidade social no Brasil, ao promover a análise de dados inerentes à inserção profissional e à mobilidade social de alunos e egressos de instituições no Ensino Superior Tecnológico na região de Porto Alegre, a autora postula, à luz dos referenciais, e comprova, através dos resultados da pesquisa, que o acesso ao ensino superior corrobora com o acesso dos egressos e estudantes a espaços que não frequentavam, o que serve como parâmetro para mensuração do desenvolvimento de seus capitais social e cultural. Ainda é defendido que a despeito do tempo para ingresso no mercado de trabalho, a remuneração daqueles que possuem formação superior, tende a ser mais alta, assim com sua inserção mais qualificante, o que implica que o acesso ao Ensino Superior permite a atuação em empregos para os quais os egressos se formaram. Entende-se também que o acesso ao conhecimento científico e às experiências culturais no âmbito do Ensino Superior, sejam essenciais para o desenvolvimento do capital cultural dos estudantes e egressos.

Dados fornecidos pela Assessoria de Avaliação Institucional do Centro Paula Souza, ao repórter Casimiro (2023, n.p.), publicados no site “O Atibaiense”, apontam a empregabilidade de 90% dos egressos da Fatec, sendo que “os números mostram que, entre os tecnólogos empregados, 95,7% têm vínculo formal de trabalho, considerando 71% com carteira assinada, 15,8% enquanto servidores públicos, 3,7%, microempresários, e 3,7%, autônomos regulares.

Ainda que para esta reflexão não se disponha de uma análise profunda dos dados, o confronto com os elementos apresentados por Martins (2016) possibilita a percepção da mobilidade social desses egressos nos itens capital social e capital econômico, o que configura fortemente evidências de mobilidade social.

4 O inglês como língua global e o seu papel para a promoção da mobilidade social

A escolha da metodologia para a elaboração do curso “English to Face Inequalities” corrobora com duas vertentes de materiais para o Ensino da Língua Inglesa, a saber a metodologia Content and Language Integrated Learning (CLIL) que consiste na utilização da Língua Inglesa para o Ensino dos mais diversos componentes, e o conceito de English as a Lingua Franca, que diz respeito ao papel do Inglês enquanto uma língua globalmente utilizada,

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porém com um enfoque maior na diversidade desta língua e na necessidade do respeito às características culturais dos países que falam a língua e os falantes, o que tem implicações profundas dos processos de colonização e descolonização atravessados por países não anglófonos, onde a língua inglesa se estabeleceu ou enquanto primeira língua ou enquanto segunda língua, assunto este amplamente discutido pela literatura em linguística aplicada. Também há de se compreender a importância do Inglês enquanto língua global, dada a correlação do termo com elementos ligados à mobilidade social dos falantes da Língua Inglesa. Jenkins (2007, p. 02) argumenta que “o inglês como língua franca deve ser visto como um meio de comunicação internacional utilizado por falantes de diferentes línguas maternas, e não apenas como uma língua de propriedade dos países anglófonos”. Visto que, por sua característica decolonizadora, no presente curso se opta pela representação priorizada de sujeitos falantes da Língua Inglesa que não sejam oriundos de países hegemônicos, buscando representar ao máximo a visão destes sujeitos sobre sua própria cultura e seus hábitos, entendese a relevância de conceber o uso do Inglês como Língua Franca enquanto elemento central para o desenvolvimento do curso.

A compreensão da Língua Inglesa enquanto língua Global, nos termos de Crystal (2012), que precede a discussão sobre Inglês com Língua Franca, apresenta uma grande contribuição para a compreensão das habilidades na língua inglesa como elementos possibilitadores da interação em um mundo globalizado. A necessidade do uso do inglês como língua global tem sido amplamente discutida por estudiosos como David Graddol. Em seu relatório "The Future of English?" Graddol (1997), aponta que o inglês se tornou a língua franca devido a uma combinação de fatores históricos, econômicos e culturais, assim, o inglês não é apenas uma ferramenta de comunicação internacional, mas também um meio de acesso ao conhecimento científico e tecnológico. Graddol (1997) argumenta que a competência em inglês ofereceumavantagem competitivanomercado detrabalho globalizadoeéessencialpara a mobilidade social e econômica visto que para ele, o inglês não é mais visto como a língua de um único país ou grupo de países. Ele é uma língua global que está em constante evolução e adaptação, sendo moldada pelas necessidades e usos dos falantes ao redor do mundo. Esse papel do inglês como língua global é reforçado por outros pesquisadores. Segundo Crystal (2012), a disseminação do inglês está ligada à sua adoção em diversas áreas do conhecimento e da economia, fazendo com que ele seja essencial para o desenvolvimento pessoal e profissional.

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5 Sobre o curso “English to Face Inequalities” e a demanda por cursos voltados para a diversidade

Considerando o pressuposto de que a linguagem se desenvolve dentro de um contexto cultural e histórico, há de se entender também que uma vez que a história e a cultura estão constantemente em movimento e em processos recíprocos de transformação, através da ação humana sobre mundo, é necessário igualmente conceber que as metodologias de ensino e pesquisa de Línguas, hão de assumir a flexibilidade necessária para buscar desenvolver conhecimentos linguísticos de maneira crítica, considerando-se a maior gama possível de aspectos que interfiram na aprendizagem de uma Língua.

Em seu prefácio para Language and Thought, Kozulin (1986) comenta a importância da cultura, alegando que a maior contribuição de Vygotsky para a compreensão da Linguagem e do Pensamento não se dera por conta dos aspectos meramente psicológicos do desenvolvimento, antes, se dão por conta da consciência cultural atribuída ao objeto de pesquisa, ainda que mantendo a psicologia enquanto ferramenta conceitual.

Kalantzis e Cope (2004, p. 49) apontam duas condições que impactam a aprendizagem, a saber-se o engajamento da identidade dos sujeitos sua subjetividade ou senso de si e o potencial do engajamento para ampliar os horizontes de conhecimento e capacidade, o que corrobora profundamente com a ideia de que este curso de Línguas, voltado para aspectos decolonizadores, possui o potencial para o desenvolvimento do capital cultural dos participantes assim como, de ser um elemento motivador para a aprendizagem da Língua Inglesa. Kalantzis e Cope (2004, p. 40) ainda oferecem preciosas contribuições para a compreensão de como a representatividade serve como elemento motivador para as aprendizagens dos estudantes, visto que se constituem como elementos que propiciam a identificação do estudante com aquilo que ele estuda.

O curso “English to Face Inequalities” surge da necessidade de se ter, no âmbito da Fatec Itu, um material didático gratuito que propicie aos estudantes o aumento do repertório cultural elinguísticodestes, aopasso quepermitaa suaautoidentificaçãoenquanto pertencentes ao universo das pessoas falantes de Língua Inglesa, o que se faz por meio da representação e respeito à diversidade. A equipe de desenvolvimento do curso “English to Face Inequalities” é formada inicialmente pelo professor autor e quatro alunos estagiários do curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas da Fatec Itu. O professor autor é responsável pelos scripts e seleções de textos utilizados nas unidades do curso, assim como da elaboração das sequências didáticas, explicações gramaticais e demais elementos inerentes à estrutura didática deste, pela coordenação do programa de iniciação científica voltado para o estudo e compreensão da

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efetividade da proposta deste curso e de sua aplicação e o programa de monitoria, voltado para o desenvolvimento técnico e aplicação do material. Na primeira etapa do projeto foram estabelecidos personagens de diferentes etnias, sendo estes estudantes de um curso de letramento paraadiversidade. Para contextualizar omaterial, assim como suaidentidadevisual, houve a colaboração de três alunos estagiários voluntários. Para a segunda etapa do projeto, a iniciar-se em agosto de 2024, haverá o suporte de 3 alunos monitores, 2 alunos estagiários voluntários e uma aluna bolsista de iniciação científica.

Naprimeiraetapado curso,os estagiáriosforam responsáveis por auxiliarnaelaboração e revisão do design do curso, elaboração de vozes artificiais através da plataforma Eleven Labs e elaboração de ilustrações. Sempre que necessário utilizou-se histórias em quadrinhos, valendo-se para tal de mesas digitalizadoras ou tablet e aplicativos de edição de desenhos. Há também o processo de desenvolvimento de um aplicativo que visa propiciar, ao final de cada unidade do curso, a prática dos conhecimentos desenvolvidos através da simulação de aplicações presentes no cotidiano, que mobilizem o conteúdo estudado, como minis aplicativos integrados para compras em supermercados, redes sociais, entre outros. No final da primeira etapa do processo de escrita do curso, finalizada em julho de 2024, um novo estagiário, aluno de Análise e Desenvolvimento de Sistemas, professor e fluente em inglês, ficou responsável pela revisão ortográfica do curso.

O curso constituir-se-á de seis níveis baseados no Common European Framework, que compreende uma escala amplamente utilizada para a identificação dos níveis de inglês de falantes nativos e não nativos, havendo em cada nível quatro unidades, sendo que cada unidade conteráquatro aulascom conteúdosnovos eumaauladerevisão.Até opresentemomento, duas unidades do primeiro nível foram aplicadas. As seções do material didático são divididas em: Integration, In Context, A world of words, On tip of the tong, Grammar Spot, Grammar Practice e Your turn, havendo subseções para ampliação do vocabulário e explicação de subtópicos linguísticos ou culturais.

A seção Integration apresenta um contexto através de histórias em quadrinhos autorais, no qual são apresentados os integrantes de um curso de letramento para a diversidade, advindos de países falantes do Inglês como segunda língua, ou falantes do inglês como Língua Franca.

A elaboração desta seção é um elemento importante no sentido de promover a pesquisa sobre hábitos dos personagens representados que variam desde as maneiras como se cumprimentam até as histórias de seus países e continentes. A elaboração das primeiras unidades demandou reescrita de personagens, visto que algumas nacionalidades escolhidas não possuíam representações de sua pronúncia em inglês nos aplicativos pesquisados, problema este que será aprofundado em textos futuros.

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A seção In Context, vale-se de textos autênticos, autorais, ou adaptados, para o aprofundamentodosassuntosapresentadosnaseção Integration,podendoostextosseremorais, escritos ou multimodais. Toda seção In Context vale-se de ilustrações geradas com uso de Inteligência Artificial, a princípio, pelo professor autor, e que têm o objetivo de representar grupos minorizados. Durante processo de criação das imagens para as primeiras unidades do material, constatou-se vieses digitais, o que se deu através da sub-representação de pessoas oriundas de grupos sociais minorizados, termo brevemente abordado neste artigo, o que demandou diversas tentativas de geração de imagens para a representação adequada da diversidade de gênero, raça e nacionalidades que se pretende alcançar neste material.

As seções Grammar focus e Grammar Practice têm a função de contextualizar a gramática, a partir dos textos. Todas as atividades são realizadas considerando-se o campo de vocabulário apresentado nos textos de abertura de cada lição. As seções A world of words e On the tip of the tongue, aprofundam o vocabulário alvo de cada lição, sempre respeitando o contexto apresentado. Em ambas as seções, a princípio, são utilizadas imagens do banco de imagens Canva, que apresenta uma grande diversidade de fenótipos.

Para a primeira etapa do projeto, foram selecionados dez estudantes, através de candidatura via Google Forms, sendo 7 estudantes da comunidade interna e três estudantes da comunidade externa. Todos os estudantes do curso são pertencentes a grupos minorizados, ou engajados em causas voltadas para estes grupos. Há durante a interação informal com os estudantes, a percepção de que o design do curso tem cumprido seu papel de engajar estas pessoas. Há grande interesse dos participantes pelos elementos culturais presentes nos textos, tais como especificidades como diferença dos significados dos gestos em diferentes culturas, as atividades de expansão em que por exemplo, a partir de um texto se solicita a pesquisa e o compartilhamento dos significados dos nomes dos alunos, entre outros.

Para a além do desenvolvimento de habilidades em Língua Inglesa, o que já é considerado capital cultural e social, através do curso, os estudantes têm se engajado em demais atividades oferecidas pelo Núcleo de Música Arte e diversidade da faculdade, tais como rodas de conversa e visita à Universidade de Campinas para roda de conversa sobre a diversidade. Ainda que em sua fase inicial, tendo apenas 4 meses de aplicação, percebe-se o potencial do curso para promoção, através a língua, do amplo desenvolvimento dos estudantes.

Ao decorrer do curso há de se analisar o efetivo desenvolvimento dos estudantes na Língua Inglesa e a presença do conteúdo cultural apresentado em suas produções, confirmando então, o quanto a dimensão decolonial do presente curso, corrobora com o desenvolvimento do pensamentocríticodos alunos ealunasecom oaumentodesuaautonomia,através deprocessos dialógicos de leitura do mundo e compreensão das práticas sociais que permeiam o urso do inglês em diferentes partes do mundo.

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6 A compreensão das desigualdades como elemento para a promoção das aprendizagens

A compreensão das injustiças sociais estabelece-se enquanto ponto de partida para a promoção de uma educação que valorize as culturas menos privilegiadas e que promova a igualdade. Dussel (2010) caracteriza a concepção educação moderna como resultado de um processo eurocêntrico e que parte de um falso pressuposto de que esta cultura estaria acima das demais cultura, para que então houvesse apropriação e usurpação destes espaços e corpos.

Fanon (1968) apresenta uma importante contribuição teórica e biográfica para a compreensão das desigualdades sociais e as suas consequências para o indivíduo que enfrenta a violência da exclusão, como para as culturas que são intencionalmente apagadas pelos processos colonizadores. O autor postula que “A imobilidade à qual o colonizado está condenado só poderá ser revertida se ele decidir pôr fim à história da colonização, à história da pilhagem, para fazer existir a história da nação, a história da descolonização.” (Fanon 1968, p. 38).

O autor apresenta inúmeras contribuições que fogem os limites desse texto e que podem ser mais desenvolvidas em futuros trabalhos como, por exemplo, ao aprofundar as consequências do colonialismo para a descaracterização dos sujeitos, em busca de uma subjetividadequenãolhesépertinente,sendoassimenvolvidosnabuscadeumaideiademérito que mascara os abusos pelos quais os menos privilegiados são submetidos. Para Fanon (1968, p. 198) “nos processos colonizantes, a cultura nacional é, sob o domínio colonial, uma cultura contestada, cuja destruição é empreendida de maneira sistemática e muito rapidamente uma cultura condenada à clandestinidade”. A proposição do autor remete ao apagamento diversas culturas, crenças, religiões, costumes, entre outros, em detrimento às culturas de países hegemônicos impostas para que se atenda ao que Bourdieu define enquanto habitus, ou seja, os modos de fazer e agir dos grupos aos quais alguém pertence ou deseje pertencer. Compreender os elementos históricos e sociais inerentes à decolonização faz-se essencial para as práticas propostas no curso “English to Face Inequalities”, como se verá adiante, dado que assim como Fanon apresenta a resistência como elemento inerente à prática educativa, Freire (1987, p. 30) argumenta que "não é na resignação, mas na rebeldia em face das injustiças que se afirma a mulher ou o homem". Essa perspectiva revela a importância de se reconhecer o contexto dos alunos e sua posição social para a efetividade da educação, especialmente na educação de adultos. Ainda segundo Freire, a conscientização crítica é fundamental no processo educativo, pois permite aos indivíduos reconhecerem a sua realidade e atuarem para transformá-la. Freire destaca que "a educação autêntica não se faz de A para B ou de A sobre B, mas de A com B, mediatizados pelo mundo" (1987, p. 41). Isso implica que o educador, e os recursos utilizados em ambientes educativos, devem levar em consideração a

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vivência, as experiências e a realidade dos alunos como ponto de partida para o processo educacional.

Se através do curso “English to face inequalities” pretende-se promover práticas educativas para o enfrentamento das diferenças, há também de se estabelecer no processo de produção deste curso parâmetros para que os recursos audiovisuais empregados no material desenvolvido corroborem para a representatividade dos sujeitos participantes do curso e dos sujeitos e realidades retratados através do curso, uma vez que de acordo com a literatura a discriminação perpassa os diversos âmbitos de comunicação e produção cultural, seja através da não representatividade ou através da subpresentatividade que é abordado pela tese de doutorado de Campos (2019). Para além da constatação da deficiência da representatividade nas mídias impressas, há de considerar a transposição dos vieses invisíveis para as tecnologias da informação, visto que o curso “English to face inequalities” tem como parte do seu processo criativo a geração e utilização de imagens por inteligência artificial, o que tem revelado deficiências, principalmente ao buscar-se representar grupos minorizados. O documentário Coded Bias, dirigido por Shalini Kantayya (2020), explora as implicações éticas esociais douso de inteligência artificiale reconhecimento facial, destacando como esses sistemas frequentemente perpetuam e amplificam preconceitos raciais e de gênero.

A narrativa centra-se na pesquisa de Joy Buolamwini, do MIT Media Lab, que descobre que muitos sistemas de reconhecimento facial falham ao identificar corretamente rostos de pessoas não brancas e mulheres. Buolamwini e outros especialistas entrevistados no documentário argumentam que esses vieses resultam de dados desiguais e práticas de programação que refletem as discriminações existentes na sociedade. O documentário enfatiza a necessidade urgentede regulamentaçãoesupervisão mais rigorosas dessastecnologias paragarantirquenão reforcem desigualdades estruturais.

Os elementos presentes no documentário também se revelam no processo de produção deste material, visto que durante a etapa de produção dos capítulos iniciais do material, demorou-se em algumas lições um tempo consideravelmente maior para que se conseguisse gerar imagens que representassem a diversidade, principalmente quando os prompts incluíam elementos que atrelassem características de prestígio social a pessoas pretas ou pessoas transgênero.

Os cuidados na elaboração de um curso de Inglês para a diversidade podem tornar-se ineficientes caso não se conceba a relação intrínseca entre o desenvolvimento técnico e estético deste e o aspecto cultural que este material assume, ainda mais considerando-se o contexto da extensão universitária em um curso de tecnologia e o problema brevemente contextualizado das lacunas nas práticas de extensão e pesquisa nas Instituições de Ensino Superior (IES) do Brasil.

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Em Cultura e Técnica, Simondon (2009, p. 170) traz à tona a discussão sobre a necessidade de superação da dicotomia cultura e técnica, entendendo que o desenvolvimento técnico não deve ignorar as subjetividades dos sujeitos que se fazem valer de uma ferramenta tecnológica, tais como o relacionamento destes sujeitos com determinados objetos técnicos enquanto instrumentos, as possibilidades de reinvenção da aplicabilidade destes instrumentos, assim como, e sobretudo, os aspectos estéticos que comportam, e, portanto, afetivos da produção. Não por acaso, Simondon alertava uma entrevista que “faltam-nos poetas técnicos”, conforme lembra Freire (2018).

Entende-se, portanto, que a construção de um curso de língua inglesa, enquanto uma atividade que contém aspectos técnicos e estéticos. Considerando o material enquanto instrumento para a facilitação do desenvolvimento da linguagem, há de se considerar, também, a relação dialógica do texto com seus leitores e as infinitas ressignificações que surgem da exploração do conteúdo apresentado, dado a sua forma, conteúdo e organização, via as ilustrações propostas, imagens e sons criados analogicamente ou por inteligência artificial, e demais recursos didáticos que se façam presentes no material.

Aindaem Simondon (2009,p.09),vale ressaltarqueanão“reconciliação entrea cultura e a técnica”, por meio da formação de uma cultura técnica que considera a dimensão estética, traz perigos semelhantes aos observados por Fanon (1968, p.199) acerca da deturpação da estética pelos movimentos colonizadores.

A negação cultural, o desprezo pelas manifestações nacionais motoras ou emocionais, o banimento de qualquer especialidade de organização concorre para engendrar condutas agressivas no colonizado. Mas tais condutas são do tipo reflexo, mal diferenciadas, anárquicas, ineficazes.

Considere-se adicionalmente que Fanon (1968, p. 198) ainda alerta:

Enquanto as massas mantêm intactas as tradições mais heterogêneas para a situação colonial, enquanto o estilo artesanal se solidifica num formalismo cada vez mais estereotipado, o intelectual lança-se freneticamente na aquisição furiosa da cultura do ocupante, tendo o cuidado de caracterizar pejorativamente sua cultura nacional, ou encastela-se na enumeração circunstanciada, metódica, passional e rapidamente.

Com isso mente e voltando ao âmbito das discussões sobre a representatividade de grupos minorizados em materiais didáticos, Campos (2019) apresenta importantes contribuições para a compreensão da importância dessa representatividade, assim como das graves consequências de sua não existência. De acordo com Frenette (1999, p. 88-89, Apud Campos 2019, p. 30):

Através de um terrorismo estético diluído por todas as camadas de nossa sociedade, vai-se humilhando toda uma raça dizendo ostensivamente que a beleza é branca. E uma das faces mais evidentes desse terrorismo, que age na surdina, é a exclusão da estética negra nos mais influentes setores da sociedade, passando sobretudo pela mídia, que, num processo ininterrupto de ausência, vai desprezando aqueles que não nasceram brancos.

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Assim, a dimensão estética na construção técnica de um “simples” curso de língua estrangeira tem implicações sociopolíticas de extrema relevância para o aprendizado sobre processos decolonizadores.

7 Considerações finais

A breve revisão bibliográfica acerca dos conceitos de mobilidade social, cultura decolonizada e Inglês enquanto Língua Franca comprovam o potencial e a relevância do desenvolvimento de um curso de Inglês para o Enfrentamento das Desigualdades no contexto inicial da Fatec Itu, visto que os referenciais apontam tanto a carência da representatividade de pessoas pertencentes a grupos minorizados em mídias e materiais de ensino, como o potencial motivador que estes materiais têm.

Ademais, compreende-se que o fortalecimento da identidade e da subjetividade dos sujeitos envolvidos no processo de construção do curso, constituem-se elementos essenciais, quando atrelados à formação acadêmica e em língua oferecidas pelo curso, para a mobilidade social destes, tendo o acesso à faculdade em si, como elemento de mobilidade, visto que para muitos destes participantes, estar no ambiente acadêmico já constitui-se uma quebra de ciclos e um sinal de mobilidade transgeracional.

Compreende-se igualmente que o presente projeto propicia a compreensão do potencial do curso para o desenvolvimento da extensão universitária, para a melhora das habilidades em inglês dos alunos, para o entendimento de elementos ligados à mobilidade social dos alunos, paraapromoçãodainclusãosociale cultural eadescentralizaçãodacultura noensinodeinglês. Pretende-se na continuidade desta pesquisa, valendo-se para tal da coleta de dados dos estudantes, estagiários, monitores e alunos de iniciação científica envolvidos neste, compreendercom mais profundidade eformaisolada,os elementos apresentados deformamais geral neste primeiro texto como a problemática dos vieses codificados e os aspectos tecnoestéticos presentes no processo de construção deste curso, assim como a análise da efetiva mobilidade social dos estudantes e egressos deste curso.

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USO DE EMBALAGENS DE REFIL COMO PRÁTICAS DE SUSTENTABILIDADE

AMBIENTAL EM EMPRESA BRASILEIRA DE COSMÉTICOS

Dhebora Souza Umbelino Silva1

Geysa Aparecida Jacobassi Bortolucci2

Jane Regina Costa Souza3

Resumo. No intuito de expressar um posicionamento em prol da sustentabilidade ambiental e considerando que o público está mais consciencioso, as empresas brasileiras de cosméticos têm direcionado parte de suas atividades para atender tais práticas. Uma das ações adotadas têm sido a mudança em embalagens com a venda de produtos com refil. Do mesmo modo, a criação de campanhas publicitárias direcionadas ao argumento ecológico, também indicam uma postura sustentável, contudo, cabe ao consumidor final a absorção dessas comunicações para o estabelecimento de vínculos de confiança entre o que se comunica e o que se entrega nos produtos comercializados pelas marcas. Neste cenário, objetivando conhecer a percepção do público consumidor de cosméticos que utilizam embalagens de refil, e compreender se assimilam estas ações como práticas ambientalmente responsáveis, este estudo propõe uma pesquisa que analisa a percepção dos clientes quanto ao uso de embalagens de refil por uma empresa brasileira de cosméticos relevante no setor. Com o desígnio de identificar o posicionamento do grupo pesquisado, a pesquisa de campo do tipo survey, qualitativa e com propósito exploratório, também utilizou o levantamento bibliográfico para revisão da literatura. Os participantes definidos como persona do estudo representam uma amostragem do público total de adquirentes de cosméticos com embalagens de refil. Como principais resultados, revelou-se uma correlação significativa entre a embalagem comercializada com as ações de sustentabilidade ambiental, conforme apontamentos identificados pelos clientes de que a empresa procura conscientizar a sociedade sobre o uso de cosméticos com refil e demonstra suas ações nos meios de divulgação.

Palavras-chave: Sustentabilidade ambiental; Empresa brasileira; Consumo sustentável; Cosméticos; Embalagens de refil.

Resumen. Uso de envases de recarga como prácticas de sostenibilidad ambiental en una empresa brasileña de cosméticos Con la intención de expresar un posicionamiento a favor de la sostenibilidad ambiental y considerando que el público está más concienzudo, las empresas brasileñas de cosméticos han dirigido parte de sus actividades para cumplir con estas prácticas. Una de las medidas adoptadas ha sido el cambio de embalajes con la venta de productos con recarga. Del mismo modo, la creación de campañas publicitarias dirigidas al argumento ecológico también indica una postura sostenible, sin embargo, es responsabilidad del consumidor final la absorción de estas comunicaciones para establecer vínculos de confianza entre lo que se comunica y lo que se entrega en los productos comercializados por las marcas. En este escenario, con el objetivo de conocer la percepción del público consumidor de cosméticos que utilizan embalajes recargables y comprender si asimilan estas medidas como prácticas ambientalmente responsables, este estudio propone una investigación que analiza la percepción de los clientes con respecto al uso de embalajes de recarga por parte de una empresa brasileña de cosméticos relevante en el sector. Con el fin de identificar la postura del grupo estudiado, la investigación de campo de tipo survey, cualitativa y exploratoria, también utilizó la encuesta bibliográfica para revisar la

1 Possui Graduação em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda – e Mestrado em Educação pela UNIMEP. É Doutoranda em Comunicação pela UNESP e membra do grupo de pesquisa Mídia e Tecnologia da UNESP, nas áreas de Comunicação, Consumo, Cultura e Sociedade. Docente na Faculdade de Tecnologia de Araras. dhebora.silva@fatec.sp.gov.br.

2 Graduada em Gestão Empresarial pela Faculdade de Tecnologia de Araras. geysa_bortolucci@hotmail.com.

3 Pós-Graduanda em Gestão de Pessoas pela USP. janereginacsouza@gmail.com.

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literatura. Los participantes definidos como personas del estudio representan una muestra del público total de compradores de cosméticos con embalajes recargables. Como principales resultados, se reveló una correlación significativa entre el embalaje comercializado y las acciones de sostenibilidad ambiental, según los comentarios identificados por los clientes de que la empresa busca concienciar a la sociedad sobre el uso de cosméticos con embalajes recargables y muestra sus acciones en los medios de difusión.

Palabras clave: Sostenibilidad ambiental; Empresa brasileña; Consumo sostenible; Cosméticos; Embalajes recargables.

Abstract. Use of refill packaging as environmental sustainability practicesin aBrazilian cosmetics company. In order to express a stance in favor of environmental sustainability and considering that the public is becoming more conscious, Brazilian cosmetics companies have directed part of their activities towards meeting these practices. One of the actions adopted has been a change in packaging with the sale of refill products. Similarly, the creation of advertising campaigns directed towards the ecological argument also indicates a sustainable approach. However, it is up to the final consumer to absorb these communications in order to establish trust in what is being communicated and what is delivered in the products marketed by the brands. In this scenario, aiming to understand the perception of cosmetic consumers who use refillable packaging and to comprehend whether they perceive these actions as environmentally responsible practices, this study proposes a research that analyzes customers' perception regarding the use of refillable packaging by a relevant Brazilian cosmetics company in the industry. With the aim of identifying the positioning of the surveyed group, this survey-type field research, qualitative and exploratory in nature, also utilized a literature review. The participants, defined as the study's target persona, represent a sample of the total audience of cosmetics purchasers with refillablepackaging.Themainresultsrevealedasignificantcorrelationbetweenthemarketedpackaging and environmental sustainability actions, as identified by customers who stated that the company seeks to raise awareness in society about the use of cosmetics with refillable packaging and demonstrates its actions through various communication channels.

Keywords: Environmental sustainability; Brazilian company; Sustainable consumption; Cosmetics; Refillable packaging.

1 Introdução

Pautas voltadas ao desenvolvimento sustentável são cada vez mais discutidas no ambiente empresarial, e para se posicionar nessa direção e em consonância com as diretrizes dispostasnosObjetivosdeDesenvolvimentoSustentável(ODS)-Agenda2030daOrganização das Nações Unidas (ONU), as empresas buscam formas de mitigar os efeitos dos resíduos sólidos no meio ambiente na tentativa de reduzir colapsos ambientais do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, e também, do ponto de vista comercial, atrair o público consumidor ampliando a imagem da marca como ambientalmente responsável. Para Neto (2015, p. 17) “ser sustentável hoje é necessário para uma empresa de qualquer setor”. Vale ressaltar que a sustentabilidade ambiental é um dos três pilares da sustentabilidade, que também contempla os aspectos econômico e social, e que através das boas práticas nestas frentes, as empresas buscam constantemente melhorar seu desempenho (Revista Exame, 2023).

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Para tanto é possível observar que a empresa brasileira objeto desse estudo, possui cases de sucesso relacionados à sustentabilidade ambiental e prêmios pela comercialização de embalagens sustentáveis. A organização está no mercado desde 1977 e atua no segmento de cosméticos, detém em seu grupo mais de 5 marcas e oferece atendimento em vários canais: lojas multimarcas, venda direta, marketplace e outros.

Ao buscar implementar políticas de preservação de recursos naturais, a empresa brasileira de cosméticos estudada, tem diversificado e ampliado suas linhas de refis visando a sustentabilidade e para estar em conformidade com o mencionado no item 5 da ODS que diz que “até 2030, reduzir substancialmente a geração de resíduos por meio da prevenção, redução, reciclagem e reuso” (Brasil, 2022).

A abordagem deste trabalho será relacionada às questões ambientais, pois para que uma empresa seja realmente sustentável, precisa atingir os pilares ambiental, social e de governança, conciliar o tripé para que promova suas ações de forma transparente, traga benefícios à sociedade por meio de ações sociais e ao meio ambiente, neste pensamento, Santos (2023) reforça que “empresas que adotam políticas ambientais, sociais e de governança (ESG4) ajudam a mitigar riscos e aproveitam oportunidades de crescimento sustentável. Essas práticas elevam seus lucros, e podem recompensar os investidores”.

Ao desenvolver linhas mais amplas com recipientes retornáveis, a empresa pode atrair uma parcela maior do mercado e obter preços mais atrativos em relação aos concorrentes, o que pode ser um diferencial competitivo, pois além dos benefícios proporcionados ao meio ambiente, contribuirá para a parcimônia do público, visto que a procura por esses produtos ambientalmente corretos vem crescendo exponencialmente em relação aos tradicionais e segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE, 2022) é possível verificar que os brasileiros estão entre os maiores consumidores mundiais de cosméticos, principalmente entre as classes sociais D e E.

Mesmocomoconsumismo,Ramos(2021)explicaqueparamuitosbrasileiros“proteger o meio ambiente é prioridade, mesmo que signifique menos crescimento econômico e geração de empregos”, isso demonstra que o público está mais exigente e prudente na aquisição dos produtos, a empresa precisa desenvolver ações de consciência ambiental, não basta ter somente bonsprodutos,énecessáriotransmitirvaloresvoltadosàsustentabilidadeaosseus stakeholders

Consumo verde é aquele em que o consumidor, além de buscar melhor qualidade e preço, inclui a variável ambiental, dando preferência a produtos e serviços que não agridam o meio ambiente, tanto na produção, quanto na distribuição, no consumo e no descarte final (Gregório, 2021, n.p.).

4 A sigla ESG do inglês (Environmental, Social and Governance), traduzida para o português (Ambiental, Social e Governança)

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Para Vieira (2022), os consumidores estão buscando por marcas mais comprometidas com o meio ambiente, atentos com as embalagens desenvolvidas e os impactos ambientais causados. Nessa abordagem, é possível trabalhar na hipótese de que o consumidor associa os refis comercializados como uma prática do pilar ambiental da sustentabilidade, impactando na decisão de compra.

Outro ponto que se destaca é a redução dos custos nos produtos de refil, tendo em vista estes levantamentos, questiona-se, com as práticas ambientais voltadas à comercialização de embalagens de refis, os consumidores associam a empresa como uma instituição ambientalmente sustentável?

Considerando uma amostra do público consumidor da marca, esta pesquisa tem como objetivo identificar a percepção destes clientes, na associação do uso de produtos de refil da empresa com práticas de sustentabilidade ambiental.

2 Fundamentação teórica

Para que as empresas sejam sustentáveis, precisam atingir os parâmetros do ESG, adotando uma postura que promova em equilíbrio ações sociais, de governança e relacionadas ao meio ambiente no intuito de obter certificações. De acordo com Sion e França (2021, n.p.)

“a implementação dos critérios ESG garante o surgimento de oportunidades para a empresa, tanto em relação ao recebimento do investimento e financiamento, quanto em relação à construção da imagem empresarial perante aos consumidores”.

É percebido um movimento de mercado em que o perfil do consumidor está em constante transformação a medida em que a própria sociedade se modifica, a exemplo da influência ocasionada pela ascensão da tecnologia que pôs à prova a relação entre clientes e marcas, ao passo que do mesmo modo em que gerou uma aproximação, também possibilitou aos usuários – consumidores conhecerem por exemplo toda a cadeia de produção de um determinadoproduto, oquepodeafastaredesmotivaracompracaso algum aspecto doprocesso não dialogue com os valores deste público. Conforme apontado por Dias (2024, p. 167),

Esse novo consumidor ecológico manifesta suas preocupações ambientais no seu comportamento de compra, buscando produtos que considera que causam menos impactos negativos ao meio ambiente e valorizando aqueles que são produzidos por empresas ambientalmente responsáveis.

Nesta direção, as empresas, em especial as de cosméticos, vêm adotando posturas ambientais em relação às embalagens de seus produtos que podem ser observadas com maior frequência através dos canais institucionais, TVs, redes sociais, entre outros e a divulgação dos refis ganham destaque, fomentam o reuso, e ainda é possível observar a logística reversa de

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coleta de embalagens vazias, diminuindo a quantidade de lixos a serem descartados. Segundo Correa (2023, n.p.),

A sustentabilidade ambiental, inserida na gestão empresarial consciente e responsável, se torna uma forma de garantir a continuidade dos negócios – devido à finitude dos recursos naturais -, refletindo positivamente na sociedade e contribuindo, igualmente, para a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, com a promoção do desenvolvimento socioeconômico.

Essa estratégia de coleta pode ser vista como uma vantagem competitiva, pois agrega valores ambientais a marca por se tratar de reciclagem, incentivo à reutilização do plástico e redução de impacto ambiental proveniente dos resíduos sólidos do material, Filippe (2022, n.p.), destaca que em 2021, 23,4% dos resíduos plásticos pós-consumo foram reciclados no país. Rodrigues (2021, n.p.) aponta:

O Relatório de Progresso sobre o Compromisso Global 2021, recém-lançado, para os plásticos, mostra que depois de décadas de crescimento, o uso de plástico virgem por marcas e varejistas parece ter atingido o pico em 2021 e diminuirá em quase 20% até 2025. [...]. Este progresso, em grande parte, é impulsionado pela reciclagem, mas isso não é suficiente para solucionar o problema da poluição por plástico – deve-se dar muito mais atenção à eliminação de embalagens de uso único com urgência.

As ações que empresas de cosméticos vêm desenvolvendo através da comercialização dos produtos com embalagens reutilizáveis e sustentáveis enfatizam a relevância de que é preciso ser consciente ambientalmente, onde reaproveitar os frascos diminui a necessidade de utilização de material virgem.

2.1 Marketing verde

A definição de Kotler (2005) para marketing está atrelada à demanda e necessidade do público que a empresa deseja atingir, onde é preciso captar os seus desejos, desenvolvendo assim boas ações para que o seu produto seja atrativo e esteja no interesse do consumidor.

Com tantas empresas conhecidas por ter bons produtos no segmento de cosméticos, àquelas que almejam o sucesso e reconhecimento, precisam ser comprometidas, trabalhar de forma ética para que seu público-alvo seja atendido de forma efetiva, sempre pensando em inovação, avaliando o que seu concorrente tem de diferencial e que possa ser superado, ter preços justos e competitivos na tentativa da fidelização do consumidor e principalmente ser responsável ambientalmente, sobre isso, Guedes (2021, n.p.) ressalta que

A consciência ecológica não é somente uma estratégia de marketing, é também uma forma de atender às demandas do mercado consumidor que está cada vez mais exigentearespeitodesseassunto.Écomumpessoasdeixaremdecomprardeempresas que não possuem atitudes ecológicas.

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Com base nesse pensamento estratégico, as empresas estão desenvolvendo ações de marketing segmentado e expondo cada vez mais suas ações ambientais para atender as necessidades do consumidor. Para Alves (2017, p.143) “as atividades de marketing ambiental desenvolvidas por uma empresa podem ser fortalecidas por meio do estabelecimento de uma marca verde que seja reconhecida, aprovada e preferida pelos consumidores.”

Com ações efetivas de marketing verde à empresa além de promover seus produtos, acaba criando alternativas sustentáveis, através do reuso das embalagens o que acaba gerando interesse do público.

2.2 Consumo consciente

As organizações que dão destaque à preservação ambiental podem ter vantagem competitiva no mercado, Oliveira (2021) salienta que este é um ponto observado pelos clientes e que pode ser crucial na decisão de compra, pois os consumidores estão mais atentos e a pesquisaconduzidapela International (2022,n.p.)indicaque“67%dosconsumidoresmundiais tentaram causar um impacto positivo no meio ambiente por meio de suas ações cotidianas em 2021”, com isso as organizações precisam se adequar conforme às demandas do seu público. De acordo com estudos dirigidos pelo SEBRAE (2023, n.p.),

Empresas responsáveis pelas suas ações e impactos são aquelas que se conectam com as necessidades e as questões sociais. Elas geram valor e relacionamento duradouro com consumidores cada vez mais exigentes e com o mercado em geral. Nesse contexto, a agenda de ESG (práticas ambientais, sociais e de governança) deve ser fundamento de uma empresa responsável e preocupada com os desafios da sociedade global.

É possível notar que o perfil do consumidor está em constante mudança, e que estão cada vez mais observadores e atentos aos efeitos ambientais causados pelas empresas, e para se manterem competitivas as organizações precisam desenvolver ações que tragam benefícios positivos para a sociedade. Para Silva (2021, n.p.),

A evolução do consumo tem seguido de forma paralela a própria evolução do consumidor, nas suas exigências e necessidades, e será certamente esta constante evolução que obrigará as empresas e obviamente o marketing a adaptar-se às novas exigências dos consumidores. Novas gerações, mais exigentes do ponto de vista da responsabilização das marcas na gestão correta do planeta e da produção dos seus produtos e serviços, darão certamente uma nova aceleração à redução da nossa influência ecológica e ambiental.

Essa máxima é reafirmada no argumento de Branco (2023, p. 123), ao dizer que “os consumidores estão cada vez mais conscientes e demandando uma nova postura”, com isso as boas práticas da organização, podem incentivar o consumo de produtos sustentáveis", Alves et al. (2012. n.p.), diz que “a empresa também pode contribuir para que os indivíduos se tornem

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consumidores mais conscientes, identificando necessidades e fabricando produtos que os atendam da melhor forma possível, minimizando impactos à sociedade e ao meio ambiente”. Neste contexto, a embalagem de refil pode ser explorada como uma ferramenta de comunicação sustentável, e não é somente como um meio para proteger o produto, passando a ser um quesito essencial que contribuirá para que a marca consiga impactar positivamente na sociedade, estimulando e encorajando de forma indireta que o seu público explore alternativas sustentáveis.

3 Metodologia da pesquisa

Para conduzir o estudo, foram empregados os métodos de pesquisa bibliográfica e de campo, com a utilização de questionário eletrônico - survey. Prodanov e Freitas indicam que “esse tipo de pesquisa ocorre quando envolve a interrogação direta das pessoas cujo comportamento desejamos conhecer através de um tipo de questionário” (2013, p. 57).

O formulário foi elaborado na plataforma Google Form e compartilhado por intermédio das redes sociais: WhatsApp e Instagram com 176 respondentes, sendo que 2 não aceitaram participar e 174 responderam à pesquisa, que ficou disponibilizada no período de 22/02/2023 a 20/03/2023. Para os critérios de inclusão foram selecionados os respondentes que compram os produtos de refil e de exclusão àqueles que não os consomem para posteriormente realizar a tabulação de dados, através de tabelas e gráficos.

A amostra do estudo consistiu em pessoas que compram produtos cosméticos com embalagem de refil, seja para uso pessoal ou para outros propósitos, com uma abordagem exploratória e qualitativa, com o intuito de validar a pesquisa. Para Moretti (2020, n.p.),

No levantamento, o pesquisador não coleta os dados de todos os integrantes da população investigada. Ele seleciona apenas uma amostra significativa […]. As análises feitas a partir dos dados da amostra são projetadas na totalidade do universo, sem desprezar a margem de erro.

Para este estudo foram empregados recursos visuais – imagens, de campanhas publicitárias da empresa brasileira de cosméticos, e optou-se pela sua não identificação na discussão dos resultados a fim de não ferir os direitos da marca5, considerando ainda que a pesquisa é de opinião pública com participantes não identificados e para assegurar o sigilo das informações, como condição para a participação o respondente deveria aceitar os termos

5 Para a construção do artigo o nome da empresa – objeto de estudo – foi preservado, contudo, na aplicação da pesquisa survey foram utilizadas peças publicitárias para que os clientes pudessem fazer as associações entre ações de comunicação da marca e posicionamento para a sustentabilidade ambiental.

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indicados para iniciar o preenchimento, para tal, foi empregado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), que informou o caráter sigiloso de quaisquer dados que pudessem identificar o respondente, e também que a apuração dos resultados seria utilizada para fins acadêmicos e científicos.

4 Resultados e discussão

Os resultados divulgados representam a opinião dogrupo de respondentes, selecionados de acordo com os critérios de inclusão e exclusão de amostra estabelecidos na pesquisa. E, portanto, não englobam todo o público consumidor de produtos de refil em nível nacional.

Gráfico 1 - Quantidade de pessoas que participaram da pesquisa

Fonte: Autoria própria (2023).

O estudo realizado foi dirigido aos consumidores da marca que fazem o uso de seus produtosquecontémembalagenssustentáveis,visandoidentificarseestasaçõesdaorganização são percebidas como ambientalmente corretas. Foram obtidas 176 respostas com média de idade de 34 anos, sendo que 43 dos entrevistados eram homens, o que representa 24,7% do total, enquanto 131 eram mulheres, correspondendo a 75,3% e duas pessoas não deram o aceite ao TCLE e optaram por não participar, de acordo com o Gráfico 1 e a Tabela 1.

Tabela 1 - Média de idade e sexo dos entrevistados

Fonte: Autoria própria (2023).

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Com relação à apresentação dos dados da amostra, a pesquisa foi divulgada em nível nacional, porém não houve retorno de pessoas de todos os Estados, mas por se tratar de uma amostragem, foi possível ter a compreensão de diversos públicos dispersos geograficamente. De acordo com o Gráfico 2, os membros do grupo investigado estão localizados nos estados de MinasGerais,RiodeJaneiro,RioGrandedoSuleSãoPaulo.Importantedestacarqueonúmero de participantes não configura o total de consumidores de refil a nível nacional, sendo considerado uma amostragem.

Gráfico 2 - Respondentes por Estado

Fonte: Autoria própria (2023).

A pesquisa obteve como persona 107 consumidores de produtos com embalagem de refil que é objeto deste estudo. Foi indagado o motivo pelo qual optaram pela compra de produtos com estas embalagens, com escala de importância de 1 a 5, no qual o número 1 determina a resposta de menor destaque e o 5, de maior relevância. O participante poderia pontuar mais de uma questão com notoriedade similar, para que não tivesse a obrigatoriedade de indicar somente um item como de maior ou menor significância. Sendo assim, levou-se em consideração a somatória com as indicações demonstradas na tabela abaixo, sendo exibida da maior para menor pontuação.

Como mostram os dados da Tabela 2, foi constatado que o preço interfere na decisão de compra, sendo este o quesito mais votado pelo grupo, com média de 3,87 de importância e somatória de 414, além de indicarem como terceiro lugar a promoções de kits mostrando que considerarem vantajoso adquiri-los por valor mais acessível.

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Tabela 2 - Somatória do nível de notoriedade da compra de produtos com embalagem de refil

Quantidade de participantes

Somatória de notoriedade

Fonte: Autoria própria (2023).

(1 a 5)

Motivo de comprar produtos com embalagem de refil

Menor preço

Preocupação com a preservação ambiental

Promoções de Kits

Propaganda relacionada a sustentabilidade e meio ambiente

Utilização de frasco para outros fins

Em segundo lugar, o público identificou a preocupação com a preservação ambiental com 3,71, com nível de notoriedade de 397 pontos, reforçando que os critérios de compra dos clientes estão cada vez mais exigentes, podendo dizer que a embalagem interfere na decisão da compra e que também impacta nos preços praticados.

Embora as propagandas relacionadas à sustentabilidade e meio ambiente tenham sido o quarto item menos votado, ainda assim é factível afirmar que os pesquisados consideram a sua relevância, pois entre este tópico e o primeiro, a diferença é de apenas 51 pontos.

Para Govatto (2019, n.p.), “a propaganda proporciona visibilidade para as empresas, com o propósito de influenciar suas vendas e sua performance no mercado”, partindo deste princípio, é de extrema importância levar em conta a confiabilidade das propagandas relacionadas à sustentabilidade e meio ambiente, como o consumidor identifica as ações expostas e se tais divulgações condizem com o que é praticado pela organização, se realmente entrega os produtos conforme as embalagens divulgadas.

Conforme opinião do público, observa-se que a utilização dos frascos para outros fins foi a questão que menos se destacou e teve a média abaixo de três, mas pode-se concluir que por se tratar de reutilização, o número de notoriedade ainda é significante o que indica que o consumidor cogita a possibilidade do reaproveitamento da embalagem.

No Gráfico 3, ao serem indagados sobre a percepção da preocupação com as ações de sustentabilidade, de acordo com o posicionamento da marca, podendo ser selecionado mais de uma alternativa, obteve-se 97 respostas, onde identificam tais práticas através das embalagens, o que reforça o segundo item da Tabela 2 sobre a preocupação da preservação ambiental e 75 pessoas indicam o posicionamento através das propagandas da empresa.

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Gráfico 3 - Percepção dos consumidores sobre o posicionamento da marca com ações de sustentabilidade

Fonte: Autoria própria (2023).

É possível observar que o consumidor sabe diferenciar a embalagem sustentável de uma convencional, optando por aquelas que trazem benefícios ao meio ambiente, tenham maior durabilidade e que podem ser reutilizadas. Esses pontos evidenciam a exigência do público para o cuidado com a natureza.

Outro ponto que pode ser identificado é que as pessoas analisam os rótulos das embalagens, buscando pelos selos verdes que garantam que àquela embalagem possui certificação, demonstrando e reforçando a idoneidade da marca. Para 58 pesquisados, os conceitos de sustentabilidade estão presentes nas embalagens da empresa que contém os selos verdes. Como abordado por Camilo et al. (2023, n.p.),

Os símbolos nas embalagens e rótulos têm o poder de educar os consumidores sobre a importância da separação dos resíduos e reaproveitamento dos materiais. Eles promovem o consumo consciente, incentivando-os a aprender mais sobre o impacto ambiental de suas escolhas no ponto de venda.

Dos entrevistados, 5 não associam a sustentabilidade com a utilização de embalagens de refil e este é um número baixo comparado com as pessoas que reconhecem a postura através das propagandas, embalagens reutilizáveis, nos selos verdes e os depoimentos dos usuários refletem essa concepção, como apresentado a seguir: Segundo a pesquisa (2023) as campanhas de reutilização de embalagens da empresa são visíveis, evidenciando a preocupação com a sustentabilidade e o compromisso verde. “A percepção mais forte é pelas embalagens e em campanhas envolvendo sustentabilidade”, “por meio de ações ecológicas com o enfoque em diminuir as embalagens descartáveis produzidas em seus produtos”, “divulgação nas redes sociais”, “logística reversa”, “embalagens que ressaltamaimportânciadareciclagem”,“epontos decoletasdasembalagensusadas"(Pesquisa, 2023).

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Foram pontuadas pelaPesquisa(2023)questõesreferentes àutilizaçãodematéria-prima considerada natural pela empresa ao utilizar frutos e frutas na composição dos produtos, além de não fazer os testes de experimentações dos cosméticos em animais.

A pesquisa (2023) revela que os consumidores estão mais conscientes e que existem vantagens para o consumidor conscienciosos, como ganhos derivados da logística reversa, onde entregar as embalagens vazias garante descontos em novas compras.

Osconsumidoresexpressamsuavisãosobreoconceitosustentável,atravésdoqueveem nas propagandas, instruções nas embalagens, logística reversa e pontos de coleta, loja sustentável, benefícios gerados aos clientes como vales presentes, preocupação com o meio ambiente e matéria-prima. Como apontado por Irigaray e Lourenço (2019, n.p.), “a embalagem deve desempenhar muitas tarefas de vendas: atrair a atenção, descrever os aspectos do produto, criar confiança no consumidor e transmitir uma imagem favorável. ”

Além das empresas utilizarem material reciclável e incentivar o reuso, foi destacado pelo pesquisado uma preocupação e ação macro que é “a construção de lojas sustentáveis utilizando plástico reciclável das embalagens” (Pesquisa, 2023).

Sendo assim, a organização objeto deste estudo, foi classificada como “uma empresa preocupada, que faz com que seus consumidores também contribuam para um mundo melhor, com pequenos gestos, contribuindo para o todo” (Pesquisa, 2023).

A pesquisa (2023) também salientou pontos em que podem ser trabalhados pela marca, pois ainda é ineficiente a quantidade de refil comercializada, podendo ser expandido para mais produtos e melhorar a divulgação das ações nas lojas físicas, pois ainda é limitada essa exposição e o consumidor sente essa falta de comunicação presencial, sendo indicado que “vejo poucas ações sobre a sustentabilidade. Sinto que a informação referente a ação fica escondida. Deveria ser algo mais visual para o consumidor, algo que deveria chamar mais atenção” (Pesquisa, 2023).

Para um respondente, não fica claro a ideia de que a empresa seja sustentável pela comercialização de produtos com embalagens de refil, dizendo que: “somente identifico a sustentabilidade da marca por suas propagandas. As embalagens ainda não me passam tal conceito” (Pesquisa, 2023).

As concepções dos sujeitos da pesquisa foram tratadas com devida significância, pois é o cliente final que pode validar as ações promovidas pela empresa e optar por comprar dela ou das concorrentes, em um caso, foi pontuado que “na verdade, essas informações da sustentabilidade não chegam até mim” (Pesquisa, 2023). Esse comentário expressa, talvez, a necessidade de ter ações com mais enfoque na comunicação para a sustentabilidade, chegando

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a um grupo maior de pessoas, também na tentativa de estimular mais o consumidor a procurar o conhecimento dos dados divulgados pela marca.

5 Considerações finais

Com o intuito de verificar se a empresa brasileira de cosméticos assume um posicionamento ambientalmente sustentável, através da comercialização de produtos com embalagens de refis, foi realizado o presente estudo com uma amostragem do público que consome este tipo de produto e buscou-se resposta para a questão central: com as práticas ambientais voltadas à comercialização de embalagens de refis, os consumidores consideram a empresa como sustentável?

Mediante a pesquisa, foi exequível avaliar a percepção da amostra do público consumidor de produtos de embalagens reutilizáveis e explorar o seu comportamento perante a imagem que fazem sobre a marca e se a assimilam como uma empresa ambientalmente correta. Apesar de uma parte dos respondentes informaram que compram os produtos com refil devido a preços mais acessíveis e promoções dos Kits, ainda assim apontam que a empresa “está no caminho” de transparecer tais práticas sustentáveis, contudo, a marca precisa ampliar a gama de produtos comercializados e ter propagandas de maior comunicação com o público.

Ao examinar as respostas, a postura sustentável pode ser identificada com maior ênfase quando o grupo reconhece que a empresa incentiva os consumidores a serem conscientes, fazendo o descarte do material dos produtos através da logística reversa, com o apontamento de que existem lojas construídas com materiais recicláveis, na publicidade, produtos que tem frutos em sua composição e ainda, que não fazem testes dos cosméticos em animais.

Ponderando os pontos positivos e de melhorias apontados pelos pesquisados em consideração as vendas de produtos com embalagens de refil, e ações de marketing desenvolvidas em torno do argumento sustentabilidade, é possível inferir que os consumidores identificam valores ambientais na comunicação da empresa, como uma postura que expressa parte do seu branding. Deste modo, para os clientes pesquisados, as ações posicionam a organização como ambientalmente correta, com ações sustentáveis que agregam prestígios à marca e fazem com que a persona opte pela compra dos seus produtos.

A pesquisa ainda aponta para um público mais consciencioso no quesito ambiental e este é um fator que contribui para que novas práticas empresariais envolvendo o meio ambiente possam ser desenvolvidas, gerando benefícios à sociedade. Este estudo reflete a percepção da

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amostragem pesquisada e por se tratar de uma amostra, futuras dissertações podem ser realizadas, para maior aprofundamento acerca desta temática.

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ANÁLISE DAS CONEXÕES ENTRE A AGENDA GLOBAL E A AGENDA NACIONAL NO QUE DIZ RESPEITO À GARANTIA DA

QUALIDADE DE VIDA E AO RESPEITO AO MEIO AMBIENTE

Resumo. O objetivo deste trabalho foi explorar os resultados dos Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODM), com foco no Objetivo 7, cuja meta era assegurar qualidade de vida e respeito ao meio ambiente. O trabalho foi estruturado em três partes. A primeira parte abordou o aquecimento global, contemplando suas características, causas, consequências e alternativas pautadas pelas conferências e tratados internacionais sobre a temática, considerando diagnóstico, medidas, objetivos e metas, bem como os compromissos assumidos pelo Brasil; a segunda parte avaliou os resultados obtidos em termos global e nacional; e a terceira e última parte aprofundou a análise sobre os resultados alcançados pelo Brasil em relação ao ODM 7. Por meio da pesquisa bibliográfica e documental, o estudo mostrou que o Brasil alcançou várias das metas estabelecidas pelos ODM, especialmente quanto à redução da extrema pobrezaedamortalidadeinfantil,bemcomoquantoaoaumentodapopulaçãocomacessoaáguapotável e a estruturas de saneamento básico. Quanto aos Gases de Efeito Estufa, o país alcançou a meta e reduzir o nível de emissão por toneladas, mas não alcançou um resultado favorável em relação uso de energias mitigadoras dos efeitos do aquecimento global, o que torna imprescindível novas agendas que possam garantir e melhorar os bons resultados e reverter aqueles que deixaram a desejar ou que não foram alcançados.

Palavras-chave: Meio Ambiente; Aquecimento Global; ODM; Sustentabilidade; Qualidade de Vida.

Resumen. Análisis de las conexiones entre la agenda global y la agenda nacional en materia de garantizar la calidad de vida y el respeto delmedio ambiente El objetivo de este trabajo fueexplorar los resultados de los Objetivos de Desarrollo del Milenio (ODM), centrándose en el Objetivo 7, cuya meta era garantizar la calidad de vida y el respeto al medio ambiente. El trabajo se estructuró en tres partes. La primera parte abordó el calentamiento global, abarcando sus características, causas, consecuencias y alternativas guiadas por conferencias y tratados internacionales sobre el tema, considerando diagnósticos, medidas, objetivos y metas, así como los compromisos asumidos por Brasil; la segunda parte evaluó los resultados obtenidos en términos globales y nacionales; y la tercera y última parte profundizó el análisis de los resultados alcanzados por Brasil en relación al ODM 7. A través de investigaciones bibliográficas y documentales, el estudio mostró que Brasil alcanzó varias de las metas establecidas por los ODM, especialmente en lo que respecta a la reducción de la pobreza extrema y la mortalidad infantil, así como el aumento de la población con acceso a agua potable y a instalaciones sanitarias básicas. En cuanto a Gases de Efecto Invernadero, el país logró la meta de reducir el nivel de emisiones por tonelada, pero no logró un resultado favorable en relación al uso de energía para mitigar los efectos del calentamiento global,lo que hacesurgirnuevasagendas que puedangarantizar ymejorar. buenos resultados y revertir aquellos que dejaron que desear o no se lograron.

Palabras clave: Medio Ambiente; Calentamiento Global; ODM; Sostenibilidad; Calidad de Vida.

Abstract. Analysis of the connections between the global agenda and the national agenda with regard to guaranteeing the quality of life and respecting the environment. The objective of this work was to explore the results of the Millennium Development Goals (MDG), focusing on Goal 7, whose goal was to ensure quality of life and respect for the environment. The work was structured in three parts. The first addressed global warming, covering its characteristics, causes, consequences and alternatives guided by international conferences and treaties on the subject, considering diagnosis, measures, objectives and goals, as well as the commitments assumed by Brazil; the second part evaluated the results obtained in global and national terms; and the third and final part deepened the

1 Tecnóloga em Gestão Comercial pela Fatec Santana de Parnaíba. E-mail: ana003ribeiro@gmail.com.

Ana Carolina Ribeiro da Silva1

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analysis of the results achieved by Brazil in relation to MDG 7. Through bibliographic and documentary research, the studyshowed that Brazilachieved several of the goals establishedbythe MDGs,especially regarding tee reduction of extreme poverty and infant mortality, as well as the increase in the population with access to drinking water and basic sanitation facilities. As for Greenhouse Gases, the country achieved the target of reducing the level of emissions per ton, but did not achieve a favorable result in relation to the use of energy to mitigate the effects of global warming, which makes new agendas that can guarantee and improve good results and reverse those that left something to be desired or that were not achieved.

Keywords: Environment; Global Warming; MDG; Sustainability; Quality of Life

1 Introdução

Faz algum tempo que especialistas e agentes públicos e privados se deram conta que a terra passa por um processo de aumento da temperatura, fenômeno comumente chamado de aquecimento global, cujas consequências se manifestam em todas as partes, o que coloca em risco, inclusive, a continuidade de vida no planeta.

Ao constatar que se trata de um problema grave, causado especialmente pelas ações humanas, aOrganização das Nações Unidas (ONU)passou arealizarumasériedeconferências, cujo objetivo principal tem sido amenizar os impactos das mudanças climáticas. Entre as conferências realizadas, destaca-se a Conferência de 1992, também conhecida como Eco 92. Realizada no Rio de Janeiro, entre outros fatores, a Eco 92 foi importante porque estabeleceu os chamados ODM, num total de oito, também conhecidos como 8 jeitos de mudar o mundo, entre os quais o ODM 7, que propõe garantir qualidade de vida e respeito ao meio ambiente. É neste contexto que se insere a presente pesquisa, cujo problema a enfrentar é identificar possíveis impactos das políticas implementadas no Mundo e no Brasil relacionadas à garantia da qualidade de vida e ao respeito ao meio ambiente (ODM 7). A hipótese é que, embora as metas não tenham sido alcançadas integralmente, os avanços foram significativos tanto do ponto de vista global quanto nacional.

Nestes termos, o trabalho buscou analisar as conexões existentes entre a agenda global e a agenda nacional no que tange à garantia da qualidade de vida e ao respeito ao meio ambiente (ODM 7). Do ponto de vista específico, buscou analisar as características, causas e consequências do aquecimento global, as conferências da ONU sobre mudanças climáticas, incluindo metas e resultados, o contexto em que se deu a propositura dos ODM, com as respectivas metas, com destaque para o ODM 7, e avaliar os resultados relacionados aos ODM, com ênfase ao ODM 7. Para atingir os objetivos propostos, as técnicas utilizadas foram a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental.

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O trabalho foi estruturado em três partes. A primeiro aborda o aquecimento global, contemplando suas características, causas e consequências, bem como as alternativas pautadas pelas conferências, considerando diagnóstico, medidas, objetivos e metas, e os compromissos assumidospeloBrasil.Asegundoparteavaliaosresultadosalcançados,relacionadosaosODM.

A terceira e última parte aprofunda a análise dos resultados nacionais quanto ao ODM 7 - a garantia da qualidade de vida e o respeito ao meio ambiente.

2 Aquecimento global

Nas últimas décadas tem sido observado um aumento da temperatura do planeta terra, um fenômeno denominado aquecimento global. O cientista climático Hawkins elaborou uma plataforma que mostra a variação de temperatura dos locais procurados com gráficos de fácil entendimento, inclusive sobre a variação de temperatura global. De acordo com a plataforma, quanto mais forte a tonalidade da cor azul, mais fria é a temperatura média do planeta; quanto mais vermelha, maior a temperatura média do planeta. A Figura 1, baseada nesta metodologia, mostra com nitidez esse aumento da temperatura do planeta, especialmente a partir da década de 1980.

Figura 1 - Faixas do aquecimento do globo de 1850 a 2019

Fonte: Hawkins (2020, n.p ).

Esses números são corroborados também por Alves (2018, n.p.), segundo o qual a temperatura média do planeta sofreu uma elevação de 0,18ºC por década entre 1980 e 2016. Neste ritmo, segundo ele, o limite estabelecido pelo acordo de Paris de se manter o aumento em 1,5°C será ultrapassado antes de 2040 e o limite de 2,0°C antes de 2070.

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Quanto às causas do aquecimento global, há um amplo consenso entre grande parte da comunidade científica que acredita que o aquecimento global é proveniente de ações antrópicas (Paula; Silva, 2009, p. 47). Estimativas elaboradas pelo Painel Intragovernamental de MudançasClimáticas(IPCC),conformemostraoGráfico1,revelamqueasatividadeshumanas já causaram o aumento de 1°C na temperatura do planeta acima dos níveis pré-industriais, número que pode chegar a 1,5° C entre 2030 e 2052 se medidas para conter esse avanço não forem tomadas.

Gráfico 1 - Aquecimento global referente a 1850-1900 (Cº)

Fonte: IPCC (2018, p. 09).

Outras estimativas são ilustradas no Gráfico 2, onde o aumento crescente de emissões e aquecimentos esperados de 2020 a 2100 estão divididos em três previsões: seguindo as atuais promessas é esperado um aumento de 2,5ºC a 2,8ºC; seguindo as atuais políticas de 2,8º.C a 32ºC; e, se os países não agirem, de 4,1ºC a 4.8ºC.

Gráfico 2 - Aquecimento esperado até 2100

Fonte: Climate Action Tracker (apud BBC NEWS BRASIL, 2020, n.p.).

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As principais causas do aquecimento global estão relacionadas às atividades humanas, que vêm aumentando os gases de efeito estufa intensificando o fenômeno natural de aquecimento da terra, pois, quando ultrapassa os limites de retenção destes gases na atmosfera eles retêm a radiação refletida pela terra e aquece o planeta (Miranda; Silva; Oliveira, 2012).

Gráfico 3 - Mudança na temperatura da Superfície global, relativa a 1850-1900

Fonte: IPCC (2021, p. 09).

No gráfico 3, elaborado com dados do IPCC, observa-se que após o período de 1850, que marcou o início da Revolução Industrial, a temperatura média global aumentou drasticamente. À direita, o gráfico ilustra uma simulação de como a temperatura superficial do planeta teria se comportado no decorrer dos últimos 170 anos com base em fatores naturais, ou seja, sem a participação das atividades antrópicas, indicados pela faixa verde. Já a faixa marrom demostra a temperatura do planeta com as ações naturais somada as ações humanas e a linha preta, demonstra a realidade, constatando assim que a simulação está correta do ponto de vista do que poderia ter acontecido e do que aconteceu de fato.

Como afirma Sousa (2016), o desmatamento de áreas naturais contribui significativamente para o aquecimento global. De um lado porque uma das funções da vegetação é controlar os regimes de chuva, de modo que o desmatamento contribui tanto para o aumento da temperatura média do planeta, quanto para a redução dos índices pluviais.

As queimadas também contribuem para o aquecimento global, pois os desmatamentos gerados em grande massa pela demanda por terras agrícolas na conversão das florestas em plantações e pastagens resultam na emissão direta de Gás Carbônico (CO²), que é produzido por meio das queimadas ou decomposição da madeira e com isso acaba aumentando a concentração de CO² na atmosfera, ocasionando aquecimento no planeta. (Scott; Monks; Spracklen, 2018).

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Após a revolução industrial, a produção de lixo também passou a exercer impactos negativos sobre o ambiente, pois para a produção, visando praticidade e um custo-benefício maior, tem sido utilizado o plástico, material que possui uma difícil e exigente decomposição, que acaba não acompanhando as produções de novos itens, gerando assim lixo em grande escala. Outra problemáticas relacionada ao lixo é o seu descarte inadequado, que causa infortúnios, como a obstrução de vias públicas, contaminação do solo e lençóis freáticos e poluição visual, dentre outros (Gomes, 2022).

A poluição das águas também contribui para com o aquecimento global. De acordo com Sousa (2016), nos oceanos existem seres vivos que absorvem CO2, como os fitoplânctons e as algas marinhas. Ao destruir os habitats desses seres, a poluição interfere na temperatura global.

Outra causa para as mudanças climáticas diz respeito a atividades humanas que implicam na emissão de gases de efeito estufa, como o CO², óxido nitroso (N²0), dióxido de enxofre (SO²) e material particulado em menor quantidade, que são resultantes da queima de combustíveis fósseis (Miranda; Silva; Oliveira, 2012).

Especialistas e agentes públicos e privados se preocupam cada vez mais com as consequências do aquecimento global pois, à medida que as ações do homem em relação ao meio ambiente ficam visíveis, trazem à tona incertezas sobre a vida humana em um futuro próximo. Algumasdas consequênciasestudadas eexploradas sãoadesertificação,desgelo, seca e chuva intensa, lixo em excesso e extremos de frio e calor.

A desertificação se caracteriza pela degradação das terras que podem ser ocasionadas por variações climáticas e atividades humanas. A variação climática é o processo natural realizado de forma concentrada para o equilíbrio do ecossistema, já a atividade gerada pelo homem potencializa a desertificação deixando ela intensa de forma a causar um desequilíbrio gerando a perda de biodiversidade e a perda da capacidade de absorção de carbono pelas plantas, mantendo o carbono na atmosfera. E além, o impedimento da vegetação de atuar na conservação do solo, na regularização da infiltração de água, escoamento superficial do clima local dentre outros (Tavares; Arruda; Silva, 2019).

Segundo Alves (2018), os danos devido ao aquecimento global nas próximas décadas irão crescer constantemente, dentre eles, secas, aumento de temperatura, tempestades, furacões e acidificação oceânica, o que poderá dizimar ecossistemas marinhos, que também já sofrem com as atividades de comercialização pesqueira e poluição. Outros impactos já observados são o aumento da frequência de fogos incontroláveis, a deterioração dos recifes de corais, descargas fluviais extremase inundações, perdas edanos apropriedades einfraestruturas eperdadevidas, ferimentos ou outros impactos para a saúde, dentre outros (IPCC, 2014).

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Em face desses males, a sociedade vem ampliando gradativamente a importância das responsabilidades sociais e ambientais atreladas aos processos de produção de bens e serviços. Qualquer movimento a favor da formulação de modelos de desenvolvimento mais equilibrados, capazes de sustentar uma relação harmônica entre fatores econômicos, sociais e ambientais, vemsedestacandonosúltimosanos. Issoémaisrelevanteconsiderandoas alteraçõesclimáticas que vêm ocorrendo em todo o mundo e os seus reflexos nas condições de vidas no planeta (Dapper; Spohr; Zanini, 2016).

Neste aspecto, a Conferência de Estocolmo ou Conferência das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente Humano, que ocorreu em junho de 1972, em Estocolmo, capital da Suécia, foi um marco histórico, que contou com 113 países e 400 organizações governamentais e nãogovernamentais com o objetivo de debater sobre questões ambientais de maneira global, priorizando a preservação do meio ambiente como nunca antes discutida com os dirigentes do mundo (Bezzerra, 2020, p.s.n). Essa reunião lançou luz à necessidade de discussão das mudanças climáticas, edanecessidadedeproteção do meioambiente,em buscadeuma solução com ajuda global para o benefício das futuras gerações.

A discussão não foi bem aceita por todos já que o pensamento de alguns era “desenvolver primeiro e pagar os custos da poluição mais tarde”. No entanto, foi feito uma declaração reconhecendo que os recursos naturais necessitavam de gestão e soluções o quanto antes para não serem esgotados. Iniciou-se assim, uma trilha rumo ao objetivo geral de contenção das ações antrópicas, gerando a agenda mundial de discussões ambientais e a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Bezzerra, 2020). Com a força desta convenção, deu-se origem também ao documento intitulado Relatório de Brudtland, Nosso Futuro Comum (Schrer; Franco; Fernandes, 2016).

Vinte anos depois da Conferência de Estocolmo, em 1992, foi realizada a segunda conferência mundial das nações unidas sobre o meio ambiente, no Rio de Janeiro, comumente chamada de Rio 92, que teve o propósito de discutir problemáticas emergentes do meio ambiente e do desenvolvimento socioeconômico e que, com uma força moral maior, levou a uma verdadeira propagação do direito internacional do meio ambiente (Passos, 2009, p. 14). A Rio 92, também conhecida como Cúpula da terra, contou com a participação de representantes de 178 países, incluindo 108 chefes de Estado e Governos, organismos internacionais e organizações não-governamentais para discussão da construção de uma nova visão para o meio ambiente e para o desenvolvimento (Schrer; Franco; Fernandes, 2016, p. 01). A reunião apresentou a sustentabilidade ambiental relacionada às questões sociais de classe, gênero, etnia e raça. Também sobre degradação ambiental, perda da biodiversidade, contaminação da água e do solo, dentre outros. O resultado da reunião foi o documento intitulado Agenda 21, que

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orientou medidas de sustentabilidade a nível nacional e global, com alternativas para um novo modelo de desenvolvimento: o sustentável (Passos, 2009).

Depois das metas estabelecidas pela Agenda 21, confirmou-se a necessidade de um novo encontro, já que não se tinha parâmetros para serem comparados e analisados, encontro esse que foi realizado em setembro de 2000, em Nova York, que refletiu a preocupação de uma centenadeChefesdeEstadoedeGovernosdequase200países,consubstanciadanaDeclaração do Milênio das Nações Unidas, que foi elaborada ao longo de meses por dirigentes mundiais preocupados com a falta de avanços das propostas, e por meio desta, reforçar o apelo de compromisso com ações sustentáveis em relação ao meio ambiente e à população em geral, principalmente os mais necessitados, definindo alvos concretos. Surgiram assim, os Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM) (ONU, 2021), contemplando oito objetivos, conhecidos também como oito jeitos de mudar o mundo, a serem alcançados até 2015, segundo o relatório da ONU (apud Lima; Graciano, 2022, p. 12), a saber:

• Objetivo 1 - Erradicar a pobreza extrema e a fome. As metas para atingir este objetivo consistiram em reduzir para metade a proporção da população cujo rendimento era inferior a USD1,25 por dia, alcançar o emprego produtivo e completo e trabalho decente para todos, incluindo mulheres e jovens, e reduzir para a metade, a proporção de população afetada pela fome;

• Objetivo 2 - Alcançar a educação primária universal, com o objetivo de garantir que todas as crianças, de ambos os sexos, tenham a oportunidade de completar um plano de estudos de escolaridade primária, proporcionado assim mais oportunidades em seus futuros;

• Objetivo 3 - Promover a igualdade de gênero e capacitar as mulheres, com a meta de eliminar a disparidade entre géneros no ensino primário e secundário, até 2005 e em todos os níveis de ensino até 2015;

• Objetivo 4 - Reduzir a mortalidade infantil em dois terços;

• Objetivo 5 - Melhorar a saúde materna, com o objetivo de reduzir em três quartos a taxa de mortalidade materna, e alcançar o acesso universal a serviços de saúde reprodutiva;

• Objetivo 6 - Combater o VIH/SIDA, a malária e outras doenças, visando parar e começar a inverter a propagação do VIH/SIDA, atingir o acesso universal ao tratamento do VIH/SIDA para todos aqueles que necessitam e parar e inverter a incidência da malária e de outras doenças graves;

• Objetivo 7 - Assegurar a sustentabilidade ambiental, com a meta de integrar os princípios do desenvolvimento sustentável nas políticas e programas dos países e

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inverter a perda de recursos ambientais, reduzir a perda da biodiversidade, reduzir para metade a percentagem da população sem acesso sustentável a água potável e a saneamento básico e alcançar uma melhoria significativa nas vidas de pelo menos 100 milhões de habitantes de bairros precários; e

• Objetivo 8 - Desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento, de forma a tornar acessíveis os benefícios das novas tecnologias e facultar o acesso dos países em vias de desenvolvimento a medicamentos essenciais a preços acessíveis.

3 Impactos das ações impetradas para alcançar os ODM

3.1 Impactos globais

Na análise dos resultados globais relacionados ao objetivo de erradicar a pobreza extrema e a fome (ODM 1), cuja meta era reduzir a pobreza extrema à metade dos níveis de 1990 até 2015, a mesma foi alcançada cinco anos antes, pois os indivíduos que sobreviviam com menos de 1,25 USD por dia diminuíram de 36% em 1990 para 15% em 2011; em 2015, a taxa chegou a 12% (ONU, 2015, p. 15). No período, como mostram os dados do Gráfico 5, o número de indivíduos em situação de extrema pobreza diminuiu de 1.926 milhão para 896 milhões. Apesar dos avanços, a fome ficou longe de ser erradicada, já que em 2015 cerca de 780 milhões de pessoas ainda eram vitimadas pela fome (ONU, 2015, p. 20).

Gráfico 5 - Pessoas que viviam com menos de 1,25 USD/dia no mundo - 1990 – 2015 (em milhões)

No que diz respeito à busca por emprego produtivo e decente para todos, o avanço foi pouco promissor: impactada pela Crise de 2008, a população em idade ideal para trabalhar empregada diminuiu pouco, de 62% para 60% entre 1991 e 2015 (ONU, 2015, p. 17), mas a proporção daqueles trabalhadores em empregos vulneráveis diminuiu nas diferentes regiões e de forma mais acentuada na Ásia Oriental, onde o emprego precário caiu de 71,2% para 39,6%

Fonte: ONU (2015, p. 15).

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entre 1991 e 2015 (ONU, 2015, p. 19). Por sua vez, a proporção de pessoas subnutridas nas regiões em desenvolvimento caiu de 23,3% em 1991 para 12,9% em 2015, percentual próximo da meta estabelecida (ONU, 2015, p. 20).

Com relação ao objetivo de universalizar a educação primaria, (ODM 2), o progresso foi significativo, embora a meta não tenha sido cumprida. De acordo com dados da ONU (2015, p. 24–25), nas regiões em desenvolvimento a taxa de matrícula líquida no ensino primário, cuja meta era alcançar 97%, aumentou de 80% em 1990 para 91% em 2015; no período, o número de crianças não escolarizadas com idade para frequentar o ensino primário diminuiu de mais de 100 milhões para cerca de 54 milhões. Com relação aos jovens entre 15 e 24 anos a taxa de alfabetização aumentou de 83% para 89%, sendo que a meta era de 93% para os jovens do sexo masculino e de 90% para os do sexo feminino (p. 27).

Quanto ao objetivo de promover a igualdade de gênero e capacitar as mulheres (ODM 3), as disparidades diminuíram significativamente. Os dados indicam que houve melhora em todos os níveis de ensino, especialmente no ensino primário. Com relação ao mercado de trabalho, ente 1990 e 2015, enquanto a proporção de mulheres com emprego remunerado subiu de 35% para 41% a de mulheres com emprego vulnerável caiu de 59% para 46%, mas as mulheres continuaram ganhando em média 24% menos do que os homens (ONU, 2015, p. 2930). Quanto à representação política das mulheres, a proporção de mulheres no parlamento passou de 11% para 22% (p. 31), mas os cargos de lideranças parlamentares e de ministros de governo ocupados por mulheres não passaram de 16% e de 18%, respectivamente (p. 31).

No que diz respeito à redução da mortalidade infantil (ODM 4), a taxa em crianças abaixo de cinco anos caiu de 90 para 43 mortes por 1000 nascidos vivos, mas cerca de 5,9 milhõesdecrianças continuammorrendoacadaano,emsuamaioriaporcausasevitáveis,sendo 1 milhão no dia em que nasceu, 1 milhão na primeira semana e cerca de 2,8 milhões durante os 28 dias (ONU, 2015, p. 33). A luta contra o sarampo foi positiva: entre 2000 e 2013, cerca de 15,6 milhões de mortes foram evitadas com a vacinação contra o sarampo; no mesmo período as mortes diminuíram de 544.200 para 145.700 (ONU, 2015, p. 36).

Quanto à taxa de mortalidade materna (ODM 5), no período 1990 – 2013, a queda foi de 45% e a oferta de assistência por profissionais qualificados da saúde aumentou de 59% em 1990 para 71% em 2014 (ONU, 2015, p. 39). Em 2014, 52% das mulheres gestantes nas regiões em desenvolvimento receberam pelo menos quatro consultas pré-natais durante a gravidez, número recomendo pela Organização Mundial da Saúde (p. 41).

Quanto ao combate à VIH/SIDA, à malária e outras doenças, os resultados foram positivos. Segundo dados da ONU (2015, p. 45), entre 2000 e 2013, as infecções pelo VIH caíram cerca de 40%. Entre 2000 e 2015 a taxa global de malária diminuiu em 37% e a taxa de mortalidade em 58% (p. 47). A taxa de mortalidade por tuberculose caiu 45% (p. 49).

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Em relação ao ODM 7, que buscou assegurar a sustentabilidade ambiental, os números indicam que houve uma diminuição da perda líquida de área florestal, de 8,3 milhões de hectares em 1990 pra 5,2 milhões em 2010, mas o desmatamento continuou elevado (ONU, 2015, p. 52). Entre o período de 1990 e 2012 as emissões mundiais de dióxido de carbono aumentaram em mais de 50% (p. 53). A escassez de água continuou afetando mais de 40% da população mundial e as estimativas são de aumento da escassez o que compromete a sustentabilidade de recursos naturais e o desenvolvimento econômico e social (p. 55). Por seu turno, no período 1990 - 2015, a proporção mundial da população com acesso a uma fonte de água potável melhorada aumentou de 76% para 91%, ultrapassando a meta estabelecida, e a proporção da população mundial com acesso a uma estrutura de saneamento melhorada aumentou de 54% para 68% (p. 58). A meta de melhorar a vida de pelo menos 100 milhões de habitantes residentes em bairros precários foi ultrapassada, já que cerca de 320 milhões de pessoas se beneficiam de condições de sobrevivência melhores (p. 60).

Quanto à busca por uma parceria global para o desenvolvimento (ODM 8), percebe-se que houve um aumento de 66% da ajuda dos países desenvolvidos para aqueles em desenvolvimento entre 2000 e 2014 (ONU, 2015, p. 63). 79% das importações dos países em vias de desenvolvimento foram isentas de impostos (p. 64). No período 2000 – 2013, o peso da dívida externa dos países em desenvolvimento caiu de 12% para 3,1% (p. 66). Do lado da acessibilidade a novas tecnologias, em especial da informação e comunicação, entre 2001 e 2015, a população com acesso a rede móvel 2G aumentou de 58% para 95% e a penetração da internet de 6% para 43% (p. 67-68).

3.2

Impactos nacionais

O Brasil se comprometeu de forma ousada em algumas das ODMs para além das metas globais, como aconteceu com o ODM 1, onde o mundo propôs reduzir a pobreza extrema a metade do nível de 1990 e o Brasil se comprometeu a reduzi-la a um quarto do nível de 1990, o que foi alcançado uma vez que a população nestas condições caiu de 13,4% para 3,6%, razão pelaqualfoiconsideradoumdospaísesquemaiscontribuiparaoalcancedametaglobal(IPEA, 2014, p. 16-17).

Com relação ao ODM 2, o Brasil se empenhou para tornar a educação primária e o ensino fundamental completo obrigatório e de forma gratuita, de tal sorte que, em 2012, 81% dos alunos com 12 anos estavam cursando o sétimo ou sexto ano na idade certa. Com relação aos alunos de 7 a 14 anos, a taxa de escolarização na idade certa passou de 81,2% para 97,7%, sendo que o Programa Bolsa família teve forte influência nestes resultados, uma vez que condicionou o benefício à frequência das crianças na escola (IPEA, 2014, p. 38-39).

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Quanto ao objetivo de eliminar as disparidades entre os sexos em todos os níveis de ensino, os dados indicam que os homens ficaram em desvantagem, já que embora no ensino fundamental tenha sido alcançada a paridade entre os sexos, no ensino médio e superior, enquanto a escolarização de homens ficou em 100 a das mulheres, que já era maior, subiu de 126 para 136 (IPEA, 2014, p. 50). Enquanto o desemprego atingia 50% das mulheres, entre os homens era de menos de 26% (p. 54). A baixa representatividade das mulheres nos postos de comando do Legislativo, do Executivo e do Judiciário demonstra a necessidade de aumentar as políticas que contribuam para participação ativa das mulheres na política, já que são mais de 50% do eleitorado, mas com poucos cargos eletivos (p. 58).

Com relação ao ODM 4, que buscou reduzir a mortalidade na infância a dois terços do nível de 1990, os resultados alcançados entre 1990 e 2012 foram importantes: a redução da taxa de mortalidade na infância caiu de 90 para 48 mortes por mil nascidos vivos, abaixo da meta global firmada (IPEA, 2014, p. 66). O Brasil também atingiu a meta em relação aos óbitos de crianças menores de 1 ano, que no período caiu de 47,1 para 15,3 óbitos por mil nascidos vivos, para uma meta global de 15,7 óbitos por mil nascidos vivos (p. 68).

O compromisso com a melhoria da saúde materna (ODM 5), com a redução da mortalidade materna a ¾ do nível de 1990 e da universalização do acesso à saúde sexual reprodutiva, os dados indicam uma queda da taxa de mortalidade materna para 55%, 99% dos partos foram assistidos em hospitais e estabelecimentos de saúde, aproximadamente 90% das gestantes realizaram quatro ou mais consultas pré-natais e a mortalidade materna por motivos obstétricos caiu 21% (IPEA, 2014, p. 78 - 79).

Gráfico 6 - Coeficiente de mortalidade por aids (por 100 mil habitantes)

Fonte: Adaptado da ONU (2014, p. 89).

Com relação ao ODM 6, o compromisso reduzir a incidência da VIH/SIDA e da malária e outras doenças como tuberculose, os dados indicam que a taxa de detecção de VIH/SIDA na população em geral se estabilizou e caiu entre os menores de 5 anos, fazendo cair a mortalidade pela doença, de 6,3 mortes por 100 mil habitantes para 5,5, conforme ilustra o Gráfico 6; a incidência da malária caiu de 3,9 para 1,3 casos por mil habitantes; da tuberculose, de 51,8 para

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37 casos por 100 mil habitantes e, assim, permitindo que o Brasil alcançasse com sucesso a meta das doenças antes do prazo (IPEA, 2014, p. 88).

No que diz respeito ao ODM 7, que buscou assegurar a sustentabilidade ambiental, o Brasil reduziu o desmatamento em 83,5%, após o lançamento do plano de ação para Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia legal, (IPEA, 2014, p. 101). O país reduziu também as emissões de gases de efeito estufa em 38,7% (p. 103) e zerou o consumo do agrotóxico brometo de metila, alcançando a meta antes do prazo. Por seu turno, no período de 1990 a 2012, a percentagem da população com abastecimento de água potável aumentou de 70,1% para 85,5%, a quantidade de pessoas sem acesso a água potável caiu de 29,9% para 14,5% (p. 113), aquela sem acesso ao saneamento básico caiu de 47% para 23% e aquela com acesso ao esgotamento sanitário aumentou de 53% para 77% (p. 114).

Por fim, quanto ao ODM 8, embora a meta tenha sido voltada para os países desenvolvidos, o Brasil aumentou sua participação ativa para garantir o êxito da rodada de desenvolvimento da Organização Mundial do Comércio (OMC), com o objetivo de formar uma nova geografia do comércio mundial, com ênfase em um sistema mais aberto, previsível e menos discriminatório, e promover o desenvolvimento socioeconômico (IPEA, 2014).

4 O ODM 7 – Garantia da qualidade de vida e respeito ao meio ambiente

No que diz respeito ao alcance da meta da garantia da qualidade de vida e ao respeito ao meio ambiente (ODM 7) foi determinado quatro metas a serem alcançadas, sendo duas referente a proteção dos recursos ambientais e da biodiversidade e duas voltadas ao acesso de água potável e ao saneamento básico, e à melhoria das condições de vida da população urbana em assentamentos precários. De acordo com o IPEA (2014), em relação às duas primeiras metas, os resultados foram de difícil mensuração, mas, ainda assim, foram observados avanços, com um importante declínio do desmatamento em todos os biomas.

Gráfico 7 - Taxa estimada de desflorestamento bruto anual em relação à área total das Unidades da Federação que formam a Amazônia Legal (%) – Brasil 1991 - 2015

Fonte: IBGE/IDS (2017, tab. 896).

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Devido ao desafio do combate ao desmatamento crescente na Amazônia, o governo elaborou um plano de contenção a partir de estudos e de análises, que entrou em vigor a partir de 2003, com medidas e coordenação de ações na busca da diminuição das taxas de desmatamento, surgindo assim o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento naAmazôniaLegal (PPCDAm),que levoua umaquedaexpressiva nodesmatamento da região. Conforme demonstra o Gráfico 7, a taxa estimada de desfloramento bruto anual da Amazônia Legal, que vinha crescendo, caiu significativamente a partir de 2003, em comum acordo, portanto, com a meta estabelecida para o período.

Gráfico 8 - Área das unidades de conservação terrestres (Km2) – Brasil – 1992 -2015

Fonte: IBGE/IDS (2017, tab. 5619).

No que se refere à proteção das áreas de conservação terrestre, o Brasil alcançou um excelente resultado entre 1992 e 2015, que pode ser observado no Gráfico 8, segundo o qual as áreas de conservaçãoaumentaram de457.708km2 para1.498.231km2.Áreas mais monitoradas e protegidas contém o desmatamento para atividades como construção e pecuária.

Gráfico 9 - Número de focos de calor (Unidades) - Brasil 2000 – 2016

Em contraposição à redução da taxa de desmatamento e ampliação das áreas protegidas, observa-seque houveum aumento nos focos de calornoperíodo.Conforme podeser observado no Gráfico 9, eles passaram de 101.537 em 2000 para 236.371 em 2015, um aumento de mais

Fonte: IBGE/IDS (2017, tab. 5805).

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de 100% no período, o que indica que a temperatura das regiões brasileiras está aumentando, quando o objetivo era reduzi-la. Uma das consequências desse processo é o aumento do número de espécies ameaçadas de extinção, que passou de 494 em 2008 para 2.366 em 2014 (IBGE/IDS, 2017, tab. 3884).

Gráfico 10 - Volume de esgoto coletado e tratado por ano (Mil m3) – Brasil 1995 - 2015

Fonte: IBGE/IDS (2017, tab. 3856).

Em relação ao esgotamento básico, o Brasil alcançou a meta estabelecida. Como pode ser observado no Gráfico 10, o volume de esgoto coletado e tratado por ano no país aumentou de 2,40 bilhões de metros cúbicos em 1995 para 5,20 bilhões em 2015, um aumento de 117%.

Gráfico 11 - Distribuição percentual da oferta de energia, segundo as fontes - Brasil 2005 – 2015

Energianãorenovável Energiarenovável

Fonte: IBGE/IDS (2017, tab. 6377).

Já o tipo de energia consumida demonstra um cenário negativo, quando comparado ao alcance de várias outras metas. Como abordado na primeira parte, a energia não-renovável é uma das causas do aquecimento global. É o caso do combustível fóssil, que aumenta a concentração de CO2 na atmosfera e aquece a temperatura do planeta, trazendo diversas dificuldades e desequilíbrios ambientais. Como pode ser observado no Gráfico 11, entre 2005 e2015,autilizaçãodeenergianão-renovávelnoBrasilcresceude55,9%para58,8%eaenergia renovável, que deveria ter uma taxa maior de distribuição, caiu de 44,1% para 41,2%.

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Por outro lado, o Brasil reduziu o consumo de substâncias que destroem a camada de ozônio, de cerca de 10.000 toneladas em 1995, para zero em 2010, cumprindo assim a meta estimada pelo protocolo de Montreal (IPEA, 2014, p. 105). Além disso, zerou o consumo do agrotóxico brometo de metila, com quase uma década antes do prazo da meta (IPEA, 2014, p. 106). Como pode ser observado no Gráfico 12, o consumo de substâncias que depredam a camada de ozônio geral caiu de 13.198 em 1995 para 1.026 em 2015, uma queda exorbitante e deveras positiva para conter o aumento dos desequilíbrios ambientais.

Gráfico 12 – Consumo de substâncias destruidoras da camada de ozônio (Em toneladas de potencial de destruição da camada de ozônio) – Brasil 1995 – 2015

1995 2000 2005 2010 2015

Fonte: IBGE/IDS (2017, tab. 3843).

No que diz respeito à meta de reduzir pela metade, até 2015, a proporção da população sem acesso permanente sustentável à água potável, o Brasil aumentou o abastecimento de água potável por rede geral de distribuição entre o período de 1990 a 2012, de 70,1% para 85.5% e a redução de porcentagem de indivíduo sem acesso a água de 29,9% para 14,5%; no período, o aumento de pessoas extremamente pobres no acesso da água subiu de 32,6% para 67,5% entre o período de 1990 a 2012 (IPEA, 2014, p. 113).

Quanto ao objetivo de alcançar uma melhora significativa na vida de pessoas vivendo em assentamentos precários, embora fosse uma meta global, a contribuição do Brasil foi significativa, já que a queda da população urbana nessas condições, ou seja que vivia em ambientes com ausência de abastecimento de água adequado, esgotamento sanitário adequado e em imóvel com aluguel de até 30% da renda domiciliar, dentre outros, caiu 16,7%, passando de 53,3%, em 1992, para 36,6% em 2012 (IPEA, 2014, p. 100).

5 Considerações finais

O objetivo deste trabalho foi de analisar as conexões existentes entre a agenda global e a agenda nacional, no que tange à garantia da qualidade de vida e ao respeito ao meio ambiente

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(ODM 7), considerando o período de 1990 a 2015. A hipótese foi que, embora as metas não tenham sido alcançadas integralmente, os avanços foram significativos tanto do ponto de vista global quanto do ponto de vista nacional.

A primeira parte do trabalho discutiu o aquecimento global com suas causas, consequências e alternativas de enfrentamento. Asegundaparte apresentou os resultados global e nacional, mostrando quais metas foram alcançadas e quais deixaram lacunas que exigiram a continuação nas próximas agendas. Os dados mostraram que o Brasil alcançou vários dos ODM estabelecidos: reduziu a população que vivia em extrema pobreza, universalizou o acesso ao ensino fundamental e melhorou o acesso ao ensino superior, reduziu a mortalidade infantil e materna e a taxa de incidência e de mortalidade devido à malária, reduziu grande parte da população que vivia em moradias precárias e cumpriu com as metas relativas ao acesso a água potável e às estruturas de saneamento básico.

Aterceira parteaprofundouareflexãosobreos resultados noBrasil em relaçãodo ODM 7 - a garantia da qualidade de vida e o respeito ao meio ambiente. Nestes termos, quanto à meta de assegurar a responsabilidade ambiental, o Brasil alcançou bons resultados seja em relação à proteção da biodiversidade, à redução do desmatamento, principalmente da Amazônia Legal, e ao aumento das áreas protegidas. Quanto a redução da população sem acesso a água potável e saneamento básico, o Brasil também cumpriu sua meta, assim como a meta de melhorar significativa a vida de pessoas em assentamentos precários. Quanto a emissão de GEE, o país alcançou a meta de reduzir o nível de emissão por toneladas, mas não alcançou um resultado favorável em relação ao uso de energias mitigadoras dos efeitos do aquecimento global. Somase o fato que as espécies ameaçadas de extinção aumentaram em todos os biomas do país.

Para futuros pesquisadores, vale considerar os retrocessos do Brasil em relação aos objetivos de desenvolvimento, em especial no tocante à questão ambiental, inclusive as mudanças no código florestal brasileiro. É imprescindível a continuação da segurança do respeito ao meio ambiente nas futuras agendas, para que possam evoluir os bons resultados alcançados e reverter os objetivos que ficaram insatisfatórios. Nesta perspectiva, seria oportuno também desenvolver o estudo em relação a aspectos regionais e locais.

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O IMPACTO DA GESTÃO DA POLÍTICA DE COMÉRCIO EXTERIOR SOBRE A ATIVIDADE ECONÔMICA E O MERCADO

DE TRABALHO

Cristiane Meire dos Santos1

Graziele Viana dos Santos2

Thiago Santana Teles3

Resumo. Este estudo analisou o impacto da gestão das políticas comerciais sobre a atividade econômica e o mercado de trabalho. Além de revisitar teorias do comércio internacional, discutiu os seus instrumentos e efeitos e fez uma análise da política comercial brasileira em dois períodos distintos. A revisão bibliográfica mostrou que os liberais defendem o livre comércio e os keynesianos a imposição debarreirastarifáriasenão-tarifárias.Apesquisadocumentalevidenciouquenoperíodoemqueagestão da política comercial brasileira esteve sob a égide de iniciativas liberalizantes, houve desequilíbrio das contas externas, baixo crescimento do PIB e elevação do desemprego e da informalidade do trabalho, ao contrário do que ocorreu quando esteve sob a égide de políticas protecionistas. A conclusão foi que a gestão da política de comércio exterior tem impactos sobre a atividade econômica e o mercado de trabalho.

Palavras-chave: Teoria Liberal; Teoria Keynesiana; gestão; atividade econômica; emprego.

Resumen. El impacto de la gestión de la política comercial exterior en la actividad económica y el mercado laboral. Este estudio analizó el impacto de la gestión de la política comercial en la actividad económica y el mercado laboral. Además de revisar las teorías del comercio internacional, discutió sus instrumentos y efectos y analizó la política comercial brasileña en dos períodos distintos. La literatura revisada mostró que los liberales defienden el libre comercio y los keynesianos defienden la imposición de barreras arancelarias y no arancelarias. La investigación documental mostró que durante el período en que la gestión de la política comercial brasileña estuvo bajo la égida de iniciativas liberalizadoras, hubo un desequilibrio en las cuentas externas, un bajo crecimiento del PIB y un aumento del desempleo y de la informalidad del trabajo, contrariamente a lo que ocurrió cuando estaba bajo la égida de políticas proteccionistas. La conclusión fue que la gestión de la política de comercio exterior tiene impactos en la actividad económica y el mercado laboral.

Palabras clave: Teoría Liberal; teoría keynesiana; gestión; actividad económica; trabajo.

Abstract. The impact of foreign trade policy management on economic activity and the job market.This study analyzed the impact of trade policy management on economic activity and the labor market. In addition to revisiting theories of international trade, it discussed its instruments and effects and analyzed Brazilian trade policy in two distinct periods. The literature reviewed showed that liberals defend free trade and Keynesians defend the imposition of tariff and non-tariff barriers. The documentary research showed that during the period in which the management of Brazilian commercial policy was under the aegis of liberalizing initiatives, there was an imbalance in external accounts, low GDP growth and an increase in unemployment and informality of work, contrary towhat occurred when it was under the aegis of protectionist policies. The conclusion was that the management of foreign trade policy has impacts on economic activity and the job market.

Keywords: Liberal Theory; Keynesian Theory; management; economic activity; job.

1 Tecnóloga em Gestão Comercial pela Fatec Santana de Parnaíba. E-mail: cristiane.santos34@fatec.sp.gov.br.

2 Tecnóloga em Gestão Comercial pela Fatec Santana de Parnaíba. E-mail: graziele.santos4@fatec.sp.gov.br.

3 Tecnóloga em Gestão Comercial pela Fatec Santana de Parnaíba. E-mail: thiago.teles01@fatec.sp.gov.br.

I Introdução

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Adam Smith criou a Teoria das Vantagens Absolutas, por meio da qual afirmou que cada país deveria se especializar na produção daquilo que possui vantagens sobre os outros países. David Ricardo, por sua vez, elaborou a Teoria das Vantagens Comparativas, segundo a qual mesmo aquele país que não possua uma vantagem absoluta deve se especializar na produção daquelas mercadorias que produz com custos menores. Se todos os países assim o fizessem e exportassem os excedentes, a tendência seria a universalização do desenvolvimento. Essa Teoria do Comércio Internacional fundamentou a Tese Liberal Clássica do Livre Comércio, que vigorou por décadas.

A Grande Depressão, crise econômica iniciada nos EUA, mas que se espalhou pelo mundo e que teve como consequência o desemprego em massa, colocou em xeque a Teoria Liberal Clássica e fez surgir a Teoria Keynesiana, que propôs a intervenção do Estado por meio de políticas econômicas para promover a retornada do crescimento econômico e a busca do pleno emprego; uma delas, a política de comércio exterior protecionista.

É neste contexto que se insere o problema desta pesquisa, qual seja identificar qual seria o impacto da gestão de política de comércio exterior sobre a atividade econômica e o mercado de trabalho. A pesquisa tem por objetivo geral avaliar o impacto da gestão de política de comércio exterior sobre a atividade econômica e o mercado de trabalho. A hipótese é que a política de comércio exterior protecionista, conforme formulada por Keynes, tende a estimular o crescimento da economia e a geração de emprego.

Em termos específicos, a pesquisa busca revisitar as teorias do comércio internacional, em especial a liberal clássica e a keynesiana; discutir os instrumentos da política de comércio exterior protecionista e seus possíveis efeitos; e avaliar os resultados da política de comércio exterior, considerando dois períodos históricos, um sobre a égide de políticas liberais e outro sob a égide de políticas protecionistas.

OBrasil viveum períododedefesa eretomadado pensamentoliberal. Estudaros efeitos da gestão da política de comércio exterior protecionista, em contraposição à política de cunho liberal, permitirá elucidar fatos, de modo a contribuir com este expressivo e importante debate socioeconômico.

Paraatingiros objetivos propostos,as técnicas utilizadas foram apesquisabibliográfica, por meio de leituras de livros e artigos científicos relacionados ao tema, e a pesquisa documental, por meio da consulta de institutos especializados em dados estatísticos sobre comércio exterior, atividade econômica e emprego.

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O trabalho foi desenvolvido em duas partes. A primeira parte destinada ao estado da arte do tema, ou seja, a abordagem sobre as teorias liberal e keynesiana do comércio internacional contemplando os instrumentos da política de comércio exterior protecionista e os seus possíveis efeitos sobre a atividade econômica e o mercado de trabalho. A segunda parte destinada à análise comparativa dos resultados da política de comércio exterior brasileira, considerando dois períodos históricos, um sob a égide de políticas comerciais liberais (década de 1990) e outro sob a égide de políticas comerciais keynesiana (década de 2000).

2 A Teoria Liberal Clássica e a Teoria Keynesiana do comércio internacional

Com o advento do capitalismo, surgiu o liberalismo econômico, uma doutrina que, de acordocomBezerra(2011),defendiaalivreconcorrência,ocâmbiolivre,apropriedadeprivada e a não intervenção governamental na economia. Segundo pensadores como Thomas Hobbes e Jeremy Benthan (apud Hunt; Sherman, 2004), os homens eram egoístas, frios e calculistas e todas as suas decisões tomadas com base em avaliações racionais, frias, imparciais e originadas na busca pelo prazer ou pelo alívio da dor. Para Adam Smith (apud Hunt; Sherman, 2004), que é considerado o pai da economia, o mercado age como uma “mão invisível” que conduz os estímulos egoístas dos homens para práticas que resultam no bem-estar da sociedade. Foi dessa forma que se fundamentou a doutrina do Laissez-faire, que se baseava na ideia de que o Estado deveria ser mínimo, dedicando-se ao objetivo de manter e preservar a ordem, a paz, a proteção e a segurança interna e externa, mas sem nunca interferir na atividade econômica.

Surgido no século XVIII, quando ocorreu a Revolução Industrial Inglesa, o liberalismo econômico fundamentou as bases para o sistema capitalista, consolidando de vez o pensamento econômico e social. De acordo com Hunt e Sherman (2004), essa doutrina, que acabou se constituindo na primeira teoria genuinamente econômica, a Teoria Liberal Clássica, defendia que, no ambiente interno, a tendência da economia seria o crescimento econômico com o mais perfeito equilíbrio das forças produtivas, pois o mercado seria autorregulado ao ponto de resolver rapidamente qualquer desajuste, de tal sorte que, como afirma Carvalho e Silva (2002), a economia capitalista estaria desprovida da possibilidade de crises econômicas e desemprego que não fosse voluntário. No ambiente externo, ou seja, no que diz respeito ao comércio exterior, a Teoria Liberal Clássica abrigou duas importantes teorias: a Teoria das Vantagens Absolutas, de Adam Smith, e a Teoria das Vantagens Comparativas, de Davi Ricardo. Como diria Santos at al. (2015), a crença de Adam Smith era que a riqueza de uma nação não se origina do estoque de metais preciosos, como diziam os mercantilistas, mas sim do trabalho; ou seja, o valor de um bem depende da quantidade de trabalho necessária para produzi-lo. Nesta perspectiva, Smith (apud Santos et al., 2015) argumentou que o livre

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comércio poderia incentivar a geração de riqueza, contanto que cada país se especializasse na produção de mercadorias e serviços nas quais conseguisse produzir com mais eficiência e menores custos que outros países, trocando os excedentes com países cuja produção desses mesmos bens fosse menos eficiente e mais cara. Para Smith (apud Santos et al., 2015), em prevalecendo esse processo de especialização e trocas, a tendência seria o desenvolvimento econômico de todos os países.

Segundo a perspectiva de Smith, portanto, a prosperidade de uma nação está ligada ao aumento da eficiência do trabalho, que é impulsionada pela divisão das tarefas. Como destaca Marinho (2011), no comércio internacional, um país exporta bens que pode fabricar a um custo mais baixo do que outros e importa aqueles que seriam mais caros de produzir localmente; cada país deve se especializar na fabricação dos produtos que pode produzir de forma mais eficiente.

O entendimento de que a essência da teoria do comércio internacional de Smith reside no princípio da vantagem absoluta é compartilhada também por Carbaugh (2004), segundo o qual, para Smith, em um cenário com dois países e dois produtos, o comércio internacional e a especialização serão vantajosos quando um país consegue produzir um determinado bem com uso menor de mão de obra do que o outro país, enquanto o segundo país tem essa vantagem na produção de outro tipo de bem. Marinho (2011) alerta, porém, que para a divisão internacional do trabalho beneficiar o mundo todo seria necessário que cada nação fosse mais eficiente na produção de pelo menos um bem, em comparação com seu parceiro comercial, de modo que, por consequência, uma nação importaria os bens nos quais não possuísse essa vantagem de custo absoluto e exportaria aqueles para os quais teria uma produção mais eficiente.

David Ricardo, por sua vez, aperfeiçoou a teoria de Adam Smith sobre o comércio exterior ao desenvolver a Teoria das Vantagens Comparativas. Para Ricardo (apud Carvalho; Silva, 2002), ocomércio entrepaíses seriafavorável em qualquer circunstância,ou seja,mesmo um país que não possua vantagem absoluta na produção de mercadorias e serviços deveria se especializar na produção daquelas mercadorias ou serviços que produz com os menores custos de produção. Ao se especializar na produção de bens que possua esta vantagem comparativa, a produção cresceria e o país poderia trocar os excedentes dessa produção com outras mercadorias produzidas de forma mais eficiente e com menores custos por outros países. Com isso, Ricardo reforça a tese de Smith, de que a especialização e o livre comércio provocariam a universalização do desenvolvimento econômico (Ricardo apud Fedrigo, 2010).

A Teoria Liberal Clássica do Comércio Internacional fundamentou, portanto, a tese do Livre Comércio, que vigorou por décadas. Como afirma Fedrigo (2010), do mesmo modo que no ambiente interno o Estado não deveria interferir na atividade econômica, no ambiente internacional, o Estado não deveria interferir nas relações de trocas entre os países, seja por meio da taxa de câmbio, de barreiras tarifárias ou barreiras não-tarifárias.

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Apesar da força dos argumentos da Teoria Liberal Clássica, o capitalismo foi levado a umaprofundacriseeconômica,comumentechamadadeAGrandeDepressão.Iniciadaem1929 nos EUA, com a quebra da bolsa de valores de New York, ela contaminou toda a economia dos EUA e se espalhou pelo mundo capitalista. Como descreve Huberman (2004), essa crise trouxe várias consequências, entre as quais a queda na atividade econômica, a falência de inúmeras empresas e o aumento do desemprego. A título de exemplos, no período, a atividade industrial e agrícola foi reduzida a cerca de 50%, mais de 5 mil bancos suspenderam as suas atividades e 85 mil empresas registraram falência (Hunt; Sherman, 2004). Por decorrência, o desemprego chegou a 25 % na Inglaterra e nos EUA, a 31% na Dinamarca e na Noruega e a 44% na Alemanha (Hobsbawn apud Fedrigo, 2009, p. 131).

Nestecontexto, obritânicoJohn MaynardKeynes formulou aTeoria Geral doEmprego, do Juro e da Moeda, quando defendeu a intervenção do Estado na economia. Conforme descrito por Reis (2023), Keynes sustentava que, ao contrário do que defendiam os economistas liberais, a economia não possuía mecanismos automáticos de ajuste e que a livre concorrência e o livre comércio não podiam garantir o pleno emprego das forças produtivas, de modo que o governo deveria tomar medidas ativas para promover o crescimento econômico e garantir o pleno emprego, razão pela qual recomendou a implementação de políticas econômicas que estimulassem a demanda, a produção e a criação de empregos. Reis (2023) enfatiza que o intervencionismo defendido por Keynes se daria por meio de políticas econômicas; a política fiscal, a política monetária e a política de comércio exterior.

Como argumentam Viceconti e Neves (2013), no que diz respeito à Política Fiscal, a proposta foi que o governo aumentasse os seus gastos, por meio de investimentos em ações voltadas para a sociedade, como obras públicas de infraestrutura; no que diz respeito à Política Monetária, que o Banco Central administrasse a oferta da moeda e a taxa de juros, de modo a facilitar o crédito; quanto à Política de Comércio Exterior, que envolve as transações de mercadorias e serviços entre países, a proposta foi a adoção de políticas protecionistas, como desvalorização cambial, imposto sobre importações e subsídios às exportações, com a finalidade de fomentar as exportações e restringir as importações. Em conjunto, essas medidas estimulariam o consumo, o crescimento econômico e a geração de emprego, além de evitar possíveis instabilidades e crises na economia e no mercado de trabalho.

A Política Econômica, portanto, nada mais é do que um conjunto de ações praticado por um determinado país. Essas ações podem envolver medidas fiscais, monetárias e comerciais, com o intuito de alcançar objetivos macroeconômicos, como crescimento econômico, redução do desemprego e equilíbrio externo. Este é um tema de extrema importância, e está relacionado à forma como o governo conduz a economia do país.

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3 Os instrumentos da política de comércio exterior protecionista e seus possíveis efeitos

No que diz respeito à gestão da Política de Comércio Exterior, segundo formulação de Keynes, o Estado teria a disposição um conjunto de instrumentos, a começar pela taxa de câmbio. O aumento da taxa de câmbio, por exemplo, é uma estratégia que implica na desvalorização da moeda nacional frente à moeda estrangeira. Como explica Marinho (2011), a medida torna os produtos nacionais relativamente mais baratos para os compradores estrangeiros e os produtos estrangeiros mais caros para os consumidores domésticos. Assim, sempre que o país aumenta a taxa de câmbio, a tendência é um aumento nas exportações e uma redução nas importações, o que melhora o desempenho da sua balança comercial. O oposto tende a ocorrer quando o governo reduz a taxa de câmbio.

Outro instrumento da Política de Comércio Exterior protecionista é o imposto aplicado sobre o valor dos produtos importados. De acordo com Marinho (2011), a exemplo do aumento da taxa de câmbio, o imposto sobre importações4 encarece os produtos estrangeiros para o consumidor nacional, de modo que se o país cria ou aumenta um imposto sobre importações, a tendência é uma redução das importações, o que melhora o desempenho da sua balança comercial. O oposto tende a ocorrer quando o governo reduz o imposto sobre importações.

Um terceiro instrumento da política de comércio exterior protecionista é o subsídio às exportações, que funciona como um imposto negativo. Marinho (2011) relata que subsidiar exportações incentiva os produtores a vender no exterior, tornando mais lucrativa a exportação do que a venda no mercado doméstico. Com isso, as exportações tendem a crescer, o que também pode melhor o desempenho da balança comercial do país.

As barreiras não tarifárias são aquelas que não envolvem impostos a serem pagos de importação/exportação e que controlam ou dificultam a entrada de mercadorias no país. Segundo Marinho (2011), são decorrentes da necessidade de cumprimento de exigências técnicas estabelecidas em regulamentos e surgem de acordo com as características de determinados produtos. Como relata Carvalho e Silva (2002), dentre as barreiras não tarifárias existe a imposição de cotas que se trata do controle quantitativo dos produtos, ou seja, limitam a quantidade de bens importados que podem entrar no país durante um determinado período. Como destaca Salvatore (2000), sua utilização pode ter como objetivo a proteção da agricultura doméstica ou a melhora do Balanço de Pagamentos do país que as impõem. Regulamentações sanitárias, de saúde, inspeção, padrões de segurança, problemas com documentação, dentre outros procedimentos que impeçam ou dificultam o comércio, também são utilizadas como barreiras não-tarifárias.

4 Cabe esclarecer que o imposto sobre importações pode ser ad valorem (percentual sobre o valor do produto) ou específico (valor fixo por unidade importada). O primeiro é normalmente aplicado sobre produtos industriais, de modo que protege o produto final, enquanto os segundo é aplicado sobre produtos de primeira necessidade e commodities, de modo que protege as matérias-primas locais. Para maiores detalhes ver Marinho (2011).

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Ao estimularem as exportações e restringirem as importações, esses instrumentos da Política de Comércio Exterior acabam protegendo a economia nacional e estimulando a produção doméstica, o consumo interno e a geração de empregos (Carvalho; Silva, 2002).

4 Resultados da política de comércio exterior brasileira

Como abordado anteriormente, existem duas teorias importantes do comércio exterior: a liberal, que defende a especialização e o livre comércio, e a keynesiana, que propõe medidas protecionistas. Esta parte do trabalho tem por objetivo fazer uma análise comparativa dos resultados da política de comércio exterior, tomando por base a economia brasileira, considerando dois períodos históricos: um sob a égide de políticas comerciais liberais (década de 1990) e outro sob a égide de políticas comerciais keynesiana (década de 2000).

4.1 A política de comércio exterior brasileira na década de 1990

Na década de 1990 o governo brasileiro começou um extenso procedimento de liberalização econômica, marcado pela valorização da moeda nacional e pela redução do imposto sobre importações. Como adverte Fedrigo (2010), além da estabilização dos preços, esperava-se com as medidas a retomada do crescimento econômico e do desenvolvimento, mas os dados indicam que houve deterioração das contas externas brasileiras, refluxo da atividade econômica e aumento das taxas de desemprego e de informalidade do trabalho.

Do ponto de vista do imposto sobre importação, os dados indicam que houve uma redução significativa da tarifa média incidente sobre os produtos importados pelo Brasil. Como pode ser visto no Gráfico 1, a tarifa média caiu de 39,5% em 1989 para 13% em 1995, tarifa esta que se mantive estável nos anos seguintes.

Gráfico 1 - Alíquotas nominais médias de importação Brasil 1989-1996

Fonte: Lacerda (apud Fedrigo, 2010, p. 59).

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No que diz respeito à taxa de câmbio não foi diferente. Os dados indicam uma redução de cerca de 50% na taxa real efetiva de câmbio, já que ela passou de um índice de 120 em 1988 para pouco mais de 60 em 1998, como ilustra o Gráfico 2.

Gráfico 2 - Índices da taxa de câmbio (1992=100) Brasil 1988-1998

Fonte: Indicadores DIESP (apud Fedrigo, 2010, p. 60).

A política de Comércio exterior brasileira do período incorporou outras iniciativas liberalizantes. Uma delas foi a extinção da maior parte das barreiras não-tarifárias herdadas de períodos anteriores. Como relata Averbug (1999), em conjunto, essas medidas reduziram significativamente o grau de proteção da economia local.

Essa liberalização comercial causou um desajuste nas contas externas brasileiras. Como é possível verificar na Tabela 1, o Balanço de Transações Corretes (BTC) do Brasil acumulou déficits crescentes no período 1989 – 1998, com exceção do ano de 1992, que teve um superávit de US$ 6,1 bilhões. Além da queda no saldo da balança comercial, o déficit no BTC foi provocado pelo aumento significativo do déficit no Balanço de Serviços, que passou de US$ 15,3 em 1989 para US$ 25,8 bilhões em 1999.

Tabela 1 - BTC - Resultados líquidos - Brasil

BalançodeTransaçõesCorrentes

BalançaComercial

BalançodeServiços

TransfrênciasUnilaterais

Fonte: Conjuntura Econômica (2004, p. XVI – XVII).

– Em US$ bilhões

É importante lembrar que o déficit no BTC só não foi maior porque as exportações cresceram sob o efeito da Lei Complementar 87 de 1996. Conhecida como Lei Kandir, a referida lei instituiu isenção do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre exportações de produtos primários, especialmente agrícolas e semielaborados. No caso desses produtos, a redução da taxa de câmbio foi compensada, portanto, pela redução do ICMS (Brasil, 1996).

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Gráfico 3 - Participação % do Brasil no comércio mundial 1989-1998

Fonte: BACEN (apud Fedrigo, 2010, p. 70).

A liberalização comercial impactou também sobre a participação brasileira no comércio mundial. Como pode ser visto no Gráfico 3, a participação das exportações brasileiras no comércio mundial caiu de 1,18% em 1989 para 0,91% em 1998. A participação das importações, por seu turno, praticamente dobrou no período, já que passou de 0,66% em 1989 para 1,11% em 1998.

Tabela 2 - Taxa de variação anual do índice de volume do PIB em relação ao ano anterior - Brasil 1989-1999 – Em %

Variação realdo PIB em %

Média do período

Fonte: Conjuntura Econômica (2004, p. XIX).

Obviamente, a enxurrada de importados trouxe dificuldades para a economia nacional. Como ilustra a Tabela 2, além de ter oscilado bastante, a taxa anual média de crescimento do PIB entre 1989 e 1998 foi de apenas 2,0%. Como lembra Fedrigo (2010), menos do que a média da década anterior, considerada perdida pelo baixo desempenho do PIB que apresentou.

Gráfico 4 - Desemprego aberto - Variação anual média em % da PEA - Brasil 1989-1998

– No . 13, setembro de 2024

Fonte: Conjuntura Econômica (2004, p. IX).

Do ponto de vista do mercado de trabalho, o impacto da liberalização também foi negativo. Como pode ser visto no Gráfico 4, o desemprego no Brasil aumentou rapidamente, passando de 3,3% para 7,6% entre os anos de 1989 e 1998, o equivalente a 120% de aumento.

Mas não parou por aí. Associada ao desemprego, a informalidade do trabalho também teve grande elevação, visto que o emprego com carteira assinada diminui de 56% para 46% no período1989– 1988.ComomostramosdadosdoGráfico5,noperíodo,oempregosem carteira assinada passou de 20% para 25%; o por conta própria de 20% para 24%.

Gráfico 5 - População ocupada por posição na ocupação em % - Brasil 1990-1998

(

4.2 A política de comércio exterior brasileira na década de 2000

A partir de 1998, o Brasil passou por uma nova mudança do ponto de vista da política de comércio exterior. A começar pela taxa de câmbio, que passou de 1,16 em 1998 para 3,08 em 2003. Como ilustra o Gráfico 6, a partir de então ela caiu paulatinamente, mas, ainda assim, permaneceu bem acima daquela de 1998.

Gráfico 6 – Taxa nominal de câmbio (R$/US$) – Posição Dezembro - Basil 1999 - 2008

Fonte: IBGE
apud Fedrigo, 2010, p. 80).
Com carteira assinada Por conta própria Sem carteira assinada Empregadores

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Fonte: IPEADATA (2023a, n.p.).

Além da elevada taxa de câmbio, no período entraram em cena outras ações governamentais, que ajudaram a ampliar os fluxos comerciais com o exterior. De acordo com Fedrigo (2010), houve, por exemplo, uma importante diversificação do destino das exportações brasileiras, especialmente para a China, Índia, Japão e países da América do Sul. Por decorrência, houve uma sensível melhora das contas externas brasileiras. Como pode ser visto na Tabela 3, não só o saldo da BC se recuperou, mas também o saldo do BTC, que passou de um déficit de US$ 33,4 bilhões em 1998 para US$ 4,2 bilhões em 2003. E continuou positivo até 2007. De acordo com BACEN (2010), o déficit no BTC registrado em 2008 foi resultante especialmente do déficit US$5,6 bilhões na conta de viagens internacionais e de US$33,9 bilhões a título de remessa líquida de lucros e dividendos.

Tabela 3 - BTC - Resultados líquidos - Brasil 1998 – 2008 - Em US$ bilhões

BalançodeTransaçõesCorrentes

BalançaComercial

BalançodeServiços

TransfrênciasUnilaterais

Fonte: BACEN (2000 – 2010, quadro 01).

Em face da política comercial adotada no período, o Brasil melhorou a sua participação nas exportações mundiais. Como pode ser visto no Gráfico 7, a participação do Brasil nas exportações mundiais passou de pouco mais de 0,8% em 1999 para 1,4% em 2011. Um crescimento a ordem de 0,6% no período.

Gráfico 7 – Participação percentual do Brasil nas Exportações Mundiais 1999 -2011

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Fonte: WDI apud Garcia (2019. p. 19).

Comoeradeseesperar,amelhoranascontasexternasprovocouumaligeirarecuperação da atividade econômica. Com mostram os dados do Gráfico 8, os investimentos produtivos, por exemplo, medido pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), passaram de 16% para 20% do PIB entre 1999 e 2009. Um crescimento de 25% no período.

19

Gráfico 8 – Investimento em FBCF em % do PIB – Brasil 1999 - 2009 15

Fonte: IBGE/CNA (2003 – 2009, tab. 1846).

O PIB, cujo crescimento anual médio tinha sido de 2,0% no período anterior, também cresceu entre 1999 e 2008, em média 3,5% ao ano, como permitem deduzir os dados do Gráfico 9. Observa-se, como era de se esperar, que o PIB cresceu na esteira da melhora das contas externas brasileiras a partir de 2003.

Gráfico 9 – Variação % do volume do PIB – Posição do IV Trimestre - Brasil 1999 – 2008

Fonte: IBGE/CNT (1999 – 2009, tab. 5932).

Com a recuperação da atividade econômica, o desemprego, que tinha crescido 120% no período1989–1998,voltouacairatéatingir7,8% em 2008,como ilustram os dados doGráfico

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10. Em síntese, melhoraram as contas externas e com elas os investimentos privados. Com mais investimentos, caiu a taxa de desemprego.

Gráfico 10 - Desemprego aberto - Variação anual média em % da PEA - Brasil 1999-2008

Fonte: IPEADATA (2023b, n.p.).

Associada à queda no desemprego, melhorou também a qualidade do emprego. Como pode ser visto no Gráfico 11, a partir de 2003 o grau de informalidade, medida pela relação entre a população ocupada sem registro em carteira ou por conta própria e o total da população ocupada, que vinha subindo desde o início da década anterior, caiu ininterruptamente a partir de 2003, alcançando 42,8% em 2009. Na contramão desse processo, obviamente, cresceu a proporção da população empregada com carteira assinada, ou seja, com os direitos trabalhistas assegurados.

Gráfico 11 - Informalidade do trabalho em % da população ocupada – Brasil 1998 - 2009

Fonte: IPEADATA (2023c, n.p.).

Como previa Keynes, portanto, as políticas comerciais governamentais de caráter protecionistas têm o mérito não só de melhorar as contas externas, mas também, e por decorrência, estimular a atividade econômica e a geração de empregos, o que estimula o consumo e novos investimentos privados, conduzindo a economia para um ciclo virtuoso,

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marcado por crescimento econômico e redução do desemprego, com a consequente melhoria das condições de trabalho.

5 Considerações finais

O objetivo deste trabalho foi analisar o impacto da gestão de política de comércio exterior sobre a atividade econômica e o mercado de trabalho. A hipótese foi que a política de comércio exterior protecionista, conforme formulada por Keynes, tende a estimular o crescimento da economia e a geração de emprego. Para tanto, além de revisitar as teorias do comércio internacional, em especial a liberal clássica e a keynesiana, discutiu os instrumentos da política de comércio exterior protecionista e seus possíveis efeitos.

A primeira parte discutiu o estado da arte do tema, ou seja, abordou as teorias liberal e keynesiana do comércio internacional, contemplando os instrumentos da política de comércio exterior protecionista e os seus possíveis efeitos sobre a econômica e o mercado de trabalho. Por meio da pesquisa bibliográfica, demostrou que Adam Smith e David Ricardo, dois importantes economistas liberais clássicos, foram defensores de uma divisão internacional do trabalho pautada pela especialização e pelo livre comércio, segundo a qual se cada país se especializasse na produção daquilo que o faz de forma mais eficiente, com menor custo, e trocasse entre si os excedentes produzidos, a tendência seria o crescimento econômico e a universalização do desenvolvimento.

Com a Grande Depressão, John Maynard Keynes contestou a Teoria Liberal Clássica e defendeu a intervenção do Estado na economia por meio de políticas econômicas, entre as quais a política de comércio exterior protecionista. Ao contrário de Smith e Ricardo, Keynes defendeu que por meio da imposição de barreiras tarifárias e não tarifárias, o governo poderia estimular o consumo, o crescimento econômico e a geração de emprego, além de evitar instabilidades e crises.

A segunda parte fez uma análise comparativa dos resultados da política de comércio exterior brasileira, tomando por base dois períodos históricos distintos: um sob a égide de políticas comerciais liberais e outro sob a égide de políticas comerciais keynesiana.

No primeiro caso, os dados indicam que na década de 1990 o governo brasileiro implementou uma ampla liberalização econômica, por meio da redução da taxa de câmbio e do imposto sobre importações. Os resultados da política comercial foram a deterioração das contas externas, queda na atividade econômica e aumento no desemprego e da informalidade do emprego. A situação só não foi pior porque em 1996 foi implantada a Lei Kandir que, ao isentar as exportações de produtos primários, manteve as exportações em alta.

No segundo caso, os dados mostram que na década de 2000 o Brasil passou por uma reviravolta em sua política de comércio exterior. A taxa de câmbio subiu consideravelmente e o governo tomou medidas que diversificaram o destino das exportações, o que resultou em uma

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melhora significativa nas contas externas brasileiras. Os investimentos produtivos e o PIB cresceram. O desemprego diminuiu e com ele a informalidade do trabalho.

A conclusão foi que a gestão da política de comércio exterior pode ter impactos significativos sobre a atividade econômica e o mercado de trabalho. No Brasil, as políticas liberais implementadas na década de 1990 trouxe oportunidades, já que provocou uma competitividadeentreprodutosnacionaiseimportados,mastambémmuitosdesafios.Asperdas de divisas e o ônus em termos do passivo externo herdado são incalculáveis. Por sua vez, embora mais eficazes na promoção do crescimento econômico e na redução do desemprego, as políticas protecionistas podem criar um ambiente menos propício a inovações e ganhos de produtividade.

É importante frisar que os resultados dos períodos históricos analisados podem ter sido influenciados por outras variáveis, como instabilidade econômica, mudanças na legislação e outras políticas econômicas, em especial a taxa de juros, que quando alta desestimula os investimentos produtivos e a geração de empregos e, por dedução, quando baixa, exerce efeito contrário; tema para próximos estudos.

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FINTECHS

Um estudo de impactos sobre a satisfação de clientes e funcionários

Áurea Adalgisa da Silva1

Mylena Amanda de Souza2

Taina Naioma Machado Leal3

Resumo. O mundo passa por um profundo processo de inovações, consubstanciado pela Indústria 4.0, que permitiu o surgimento do chamado capitalismo de plataforma, que se caracteriza por conectar os consumidores às empresas por meio de aplicativos digitais. As mudanças em curso atingiram em cheio o setor financeiro, que passou a atuar cada vez mais por meio de Fintechs, um tipo de instituição financeira baseada em tecnologia. É neste contexto que se insere a presente pesquisa, cujo objetivo geral foianalisaroimpactodessanovamodalidadedebancosobreclientesefuncionários.AlémdaRevolução Industrial e a sua importância para a formação do capitalismo de plataformas, a revisão bibliográfica permitiu analisar o surgimento, a evolução e o papel das Fintechs na transformação do setor bancário brasileiro e a pesquisa de campo possibilitou avaliar o impacto dessa transformação sobre o grau de satisfação de clientes e funcionários. O estudo mostrou que os clientes de bancos digitais apresentam maior satisfaçãoem comparaçãoaosclientesdebancostradicionais,especialmenteentreosmaisjovens. Da mesma forma, funcionários de bancos digitais demonstraram maior satisfação com a digitalização dos serviços bancários. A conclusão sugere que para aumentar a satisfação dos clientes e dos funcionários, os bancos tradicionais devem investir na melhoria do atendimento presencial e na digitalização, proporcionando suporte adequado e treinamento, implementar modelos de trabalho flexíveis e desenvolver programas de capacitação para o ambiente digital.

Palavras-chave: Revolução Industrial; Indústria 4.0; Plataformas Digitais; Bancos; Fintechs.

Resumen Fintech: um estúdio de impactos em la satisfacción de clientes y empleados Resumen. El mundo atraviesa un profundo proceso de innovación, plasmado en la Industria 4.0, que permitió el surgimiento del llamado capitalismo de plataforma, que se caracteriza por conectar a los consumidores con las empresas a través de aplicaciones digitales. Los cambios en curso han golpeado duramente al sector financiero, que ha comenzado a operar cada vez más a través de Fintechs, un tipo de institución financiera basada en tecnología. Es en este contexto que se inserta esta investigación, cuyo objetivo general fue analizar el impacto de este nuevo tipo de banca en los clientes y empleados. Además de la Revolución Industrial y su importancia para la formación del capitalismo de plataforma, la revisión bibliográfica permitió analizar el surgimiento, la evolución y el papel de las Fintechs en la transformación del sector bancario brasileño y la investigación de campo permitió evaluar el impacto de esta transformación en el grado de satisfacción de clientes y empleados. El estudio mostró que los clientes de los bancos digitales tienen una mayor satisfacción en comparación con los clientes de los bancos tradicionales, especialmente entre los más jóvenes. Asimismo, los empleados de los bancos digitales demostraron una mayor satisfacción con la digitalización de los servicios bancarios. La conclusión sugiere que para aumentar la satisfacción de clientes y empleados, los bancos tradicionales deben invertir en mejorar el servicio presencial y la digitalización, brindar soporte y capacitación adecuados, implementar modelos de trabajo flexibles y desarrollar programas de capacitación para el entorno digital.

Palabras clave: Revolución Industrial; Industria 4.0; Plataformas Digitales; Bancos; Fintech.

1 Tecnóloga em Gestão Comercial pela Faculdade de Tecnologia de Santana de Parnaíba. E-mail: aurea.conf@gmail.com.

2 Tecnóloga em Gestão Comercial pela Faculdade de Tecnologia de Santana de Parnaíba. E-mail: Mylena.souza@fatec.sp.gov.br.

3Tecnóloga em Gestão Comercial pela Faculdade de Tecnologia de Santana de Parnaíba. E-mail: taina.leal@fatec.sp.gov.br.

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Abstract. Fintechs: a study of impacts on customer and employee satisfaction. The world is going through a profound process of innovation, embodied by Industry 4.0, which allowed the emergence of so-called platform capitalism, which is characterized by connecting consumers to companies through digital applications. The ongoing changes have hit the financial sector hard, which has increasingly started to operate through Fintechs, a type of financial institution based on technology. It is in this context that this research is inserted, whose general objective was to analyze the impact of this new type of bank on customers and employees. In addition to the Industrial Revolution and its importance for the formation of platform capitalism, the bibliographic review made it possible to analyze the emergence, evolution and role of Fintechs in the transformation of the Brazilian banking sector and field research made it possible to evaluate the impact of this transformation on the degree of customer and employee satisfaction. The study showed that digital bank customers have greater satisfaction compared to traditional bank customers, especially among younger people. Likewise, digital bank employees demonstrated greater satisfaction with the digitalization of banking services. The conclusion suggests that to increase customer and employee satisfaction, traditional banks must invest in improving face-toface service and digitalization, providing adequate support and training, implementing flexible work models and developing training programs for the digital environment.

Keywords: Industrial Revolution. Industry 4.0. Digital Platforms. Traditional Bank. Fintechs.

1 Introdução

O mundo passa por um profundo processo de inovações. Está em curso uma nova revolução tecnológica, que vem sendo comumente chamada de Indústria 4.0. Neste contexto, os novos processos de produção, distribuição e controle permitiram o surgimento do chamado capitalismo de plataforma, que se caracteriza por conectar os consumidores às empresas por meio de aplicativos digitais.

As mudanças em curso atingiram em cheio o setor financeiro, que passou a atuar cada vez mais por meio de Financial Technology (FINTECHS), um tipo de instituição financeira baseada em tecnologia, que se propõe a fornecer serviços e produtos financeiros de maneira ágil e desburocratizada com o propósito de facilitar o acesso dos clientes aos principais meios financeiros, utilizando-se de aplicativos ou sites para realizar funções que antes só eram possíveis em bancos físicos, como abertura de contas, empréstimos, aplicações e solicitação de cartões, entre outras. Vale dizer, portanto, que as Fintechs se apresentam como uma mudança em relação à forma como as instituições financeiras tradicionais operam e como os consumidores interagem com os serviços financeiros.

É neste contexto que se insere a presente pesquisa. As instituições bancárias sempre se mostraram pouco eficientes em relação aos processos e à burocracia que envolvem o sistema financeiro. Ao que parece, por meio da conexão à alta tecnologia, as Fintechs podem obter uma compreensão mais ampla dos hábitos e necessidades dos clientes e assim desenvolver diversos produtos e serviços financeiros ligados ao digital. Não obstante, a questão a saber é se os

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clientes e os funcionários do sistema bancário brasileiro estão mais ou menos satisfeitos com a digitalização dos bancos.

Nestes termos, o objetivo geral desta pesquisa foi analisar a crescente influência das Fintechs no cenário financeiro brasileiro e compreender como elas atuam e sua relação com clientes e funcionários. Em termos específicos, buscou reunir informações e dados para analisar o surgimento, a evolução e o papel das Fintechs e avaliar o seu impacto sobre o grau de satisfação de clientes e funcionários do sistema bancário brasileiro.

Paraatingiros objetivos propostos,as técnicas utilizadas foram apesquisabibliográfica, por meio da revisão de artigos e levantamento de dados e informações junto a órgãos públicos e privados, e a pesquisa de campo, por meio da aplicação de um questionário com questões fechadas, respondido por clientes e funcionários do sistema bancário. O trabalho foi desenvolvido em duas partes, de forma que a primeira versa sobre a revolução industrial e sua importância para a formação do capitalismo de plataforma e sua relação com as Fintechs, contemplando a evolução dessa modalidade de banco no Brasil, e a segunda avalia o impacto dessa nova tecnologia sobre clientes e funcionários do sistema bancário.

2 A Revolução Industrial, as plataformas digitais e as Fintechs

A inovação tecnológica é um fator marcante da economia capitalista. Desde que surgiu, este modo de produção já passou por três revoluções tecnológicas e há quem diga que está transitando para a quarta, comumente chamada de indústria 4.0, que estaria permitindo o surgimento e expansão de empresas que atuam por meio de plataformas digitais, inclusive no mercado financeiro, a partir das chamadas Fintechs. Nestes termos, esta parte do estudo tem como objetivo versar sobre as diferentes fases da Revolução Industrial, sua contribuição para a formaçãodocapitalismodeplataformaesuarelaçãocomas Fintechs,contemplandoaevolução desse processo no Brasil.

2.1 As diferentes etapas da Revolução Industrial

Dos primórdios até os dias atuais, a revolução industrial já passou pelo menos por três fases distintas. A primeira, que se iniciou na Inglaterra a partir de meados do século XVIII, caracterizada pela mecanização do processo produtivo com o desenvolvimento da máquina a vapor; a segunda que se iniciou nos EUA no século XIX, caracterizada pela eletrificação e a produção emsérieedemassa;eaterceiranoséculoXX,marcadapelaautomaçãodosprocessos

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produtivos e pelo uso da tecnologia da informação. Como descreve Bezerra (2019), essas fases históricasmoldaram omundocontemporâneo,estabelecendopadrõesdeprodução,organização social e interconexão global que continuam a influenciar nossa sociedade.

Antes da era industrial, a produção era baseada em trabalhos manuais de baixo rendimento. No entanto, com a chegada da Revolução Industrial e a implementação de processosdeproduçãomaiseficientes,ocorreuumamudançasignificativaeradical,quealterou a maneira como a sociedade produzia bens e organizava o trabalho (Hobsbawm, 2012). Como relata Boettcher (2015), no cerne da Primeira Revolução Industrial estava a máquina a vapor, que, ao permitir a mecanização de tarefas anteriormente realizadas manualmente, transformou a indústria têxtil, a mineração e a manufatura, levando à expansão e ao crescimento acelerado das cidades industriais. Esse processo marcou uma mudança no paradigma, com a divisão do trabalho e a produção em larga escala, que resultou em um aumento sem precedentes na produtividade e deu início a transformações tecnológicas e econômicas, que se espalharam pelo mundo, moldando a era das máquinas a vapor (Hobsbawn, 2012).

Originária na Grã-Bretanha no final do século XVIII, a Primeira Revolução Industrial se estendeu até meados do século XIX e teve também implicações na urbanização. Para Bezerra (2019), as fábricas, agora equipadas com máquinas a vapor, exigiam uma mão de obra crescente, o que atraiu trabalhadores em busca de emprego e transformou a estrutura demográfica e social da Inglaterra da época, com a formação de grandes cidades industriais.

À medida que a Revolução Industrial progredia e a mecanização se tornava cada vez mais difundida, um novo paradigma tecnológico surgiu, consubstanciando a transição da energia a vapor para a energia elétrica. De acordo com Martins (2020), esse marco representou não apenas uma mudança nos meios de produção, mas também uma transformação profunda na própria natureza das operações industriais, o que levou o mundo à Segunda Revolução Industrial. Portanto, a Primeira Revolução Industrial, com suas raízes na mecanização e máquinas a vapor, forneceu o cenário e as bases para a transição para a era da eletricidade e das telecomunicações, o que, segundo Ramos (2023, n.p.), fez da segunda metade do século XIX um período transformador, [...] “caracterizado por mudanças sociais, políticas e econômicas significativas [...], que teve impactos de longo alcance [...]”.

Além da energia elétrica, o Fordismo e o Taylorismo foram duas abordagens fundamentais que surgiram nesse contexto e desempenharam papeis cruciais na transformação das práticas industriais. Conforme descreve Sousa (2023), o Fordismo e o Taylorismo são duas abordagens fundamentais que surgiram nesse contexto e desempenharam papeis cruciais na transformação das práticas industriais. O Taylorismo, proposto por Frederick Taylor, buscava otimizar a eficiência do trabalho por meio da análise científica dos processos produtivos, a fim

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de aumentar a produtividade. enquanto o Fordismo, desenvolvido por Henry Ford, introduziu a ideia de linha de montagem, onde os trabalhadores desempenhavam tarefas específicas em uma sequência padronizada. Como relata Campos (2024), estas abordagens, que permitiram a produção em série e de massa, não apenas redefiniram os métodos de produção, promovendo eficiência, aumento da produtividade e redução de custos, mas também estimularam o crescimento econômico e a rápida urbanização.

No período subsequente à Segunda Guerra Mundial, a dinâmica da economia global passou por uma série de transformações substanciais, delineando o surgimento da Terceira Revolução Industrial, que, segundo Venturelli (2021), se distingue das duas revoluções industriais anteriores devido à sua amplitude, uma vez que incorporou uma gama de inovações e mudanças que transcenderam as transformações meramente industriais, tendo como maior protagonista, a internet, “[...] consolidada entre as pessoas como um grande canal de comunicação convergente de todas as tecnologias, agora sendo colocado dentro da indústria com seus conceitos, adaptados a máquinas e equipamentos” (Afonso, 2017, n.p.).

Como salientam Sakurai e Zuchi (2018), a Terceira Revolução Industrial é um amplo processo de inovação tecnológica que vai da informática à nanotecnologia, passando pela robóticaepelas telecomunicações. Nessecontexto,adisseminaçãodatecnologiadainformação e das redes de comunicação desempenhou papel fundamental. Aas redes de comunicação em constante expansão tornaram possível a globalização das operações comerciais, a conexão instantânea e a colaboração em escala global, o que permitiu que empresas pudessem buscar praticidade em diferentes lugares do planeta e atingissem mercados internacionais de uma forma que antes não era possível. Além disso, funções que eram exercidas por humanos foram substituídas por robôs, que produzem mais em menos tempo, gerando economia de tempo, aumento a produção e do lucro das empresas (Silveira, 2016).

2.2 A indústria 4.0, as plataformas digitais e as Fintechs

Além das três fases anteriores da Revolução Industrial, está em curso uma quarta fase, comumente chamada Indústria 4.0, caracterizada pelo rápido avanço da inteligência artificial e da automação, que trouxe a convergência de tecnologias digitais. Os avanços contínuos na inteligência artificial estão revolucionando o modo como realizamos tarefas, permitindo a automação de uma variedade cada vez maior de atividades que dependiam exclusivamente da intervenção humana. Máquinas interconectadas conversam e trocam comandos entre si, armazenam dados na nuvem, identificam defeitos e fazem correções sem precisar de ajuda. Uma nova forma, portanto, de lidar com a produção que está transformando fundamentalmente a forma como as empresas operam.

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Apesar de não haver consenso entre os especialistas sobre o início da Indústria 4.0, a maioria dos autores cita a década de 1970 como determinante para alavancar esse período no mundo da indústria. Este é o caso de Silva (2023), para o qual ao disseminar o uso da computação e da tecnologia da informação, a Terceira Revolução Industrial desempenhou um papel crucial na preparação do terreno para o surgimento da Indústria 4.0, fornecendo as bases para a transformação tecnológica em curso. Tendo como característica fundamental a interligação entre os mundos digital e real, a Indústria 4.0 abraçou a automação e a robótica avançada, de tal modo que máquinas autônomas e robôs desempenham um papel central na produção, auxiliando na manufatura ágil e personalizada, alinhada com as demandas dos clientes, consubstanciando um universo de possibilidades para diferentes fabricantes.

Mas as mudanças não se limitam ao campo da produção. Ao permitir o surgimento de plataformas digitais, que conectam produtores e consumidores de forma sem precedentes, verdadeiros “ecossistemas econômicos” foram criados, “em que participantes individuais podem interagir de maneira eficiente e acessível, aumentando a produtividade e o alcance de seus negócios” (Smith, 2018, n.p.). Com a evolução tecnológica, empresas de diferentes setores seviram obrigadas ase adequarem com o objetivo de facilitar a comunicaçãocom seus clientes. Como decorrência, desenvolve-se uma espécie de “economia da atenção”, já que, conforme destacado pela Fundação Instituto de Administração (FIA, 2023), plataformas digitais competem pela atenção de usuários, uma vez que os acessos às plataformas permitem relações comerciais com mais velocidade e alcance global para qualquer tipo de produto.

Este verdadeiro capitalismo de plataforma alcançou também a esfera comercial. Conforme argumenta Silveira (2016), os consumidores estão cada vez mais exigentes e para satisfazer as suas expectativas, as empresas precisam oferecer um processo de compra mais ágil,oquetemsido facilitadopelasplataformasdigitais.Nestecontexto,astransações businessto-business assumem certa relevância no comércio eletrônico, evidenciando a importância na busca por eficiência e oportunidades de negócios no ambiente digital (Silveira, 2016).

Gráfico 1 – Evolução do e-commerce – Brasil 2018 - 2023 (R$ Bilhões)

Fonte: ABCOMM (2024, n.p.).

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No Brasil, por exemplo, embora o comércio físico continue determinante nas relações comerciais entre fornecedores e consumidores, o e-commerce tem se tornado cada vez mais presente. A título de exemplo, como ilustra o Gráfico 1, as vendas por meio desta modalidade de comércio saltaram de R$ 69,9 bilhões em 2018para R$ 185,7 bilhões em 2023. Um aumento da ordem de 166% no período.

Gráfico 2 – Composição % das transações bancárias por tipo de canal – Brasil 2016 - 2022

Fonte: FEBRABAN (2023, n.p.).

As plataformas digitais estão cada vez mais presentes também no sistema bancário brasileiro. De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE, 2022), a tecnologia da Indústria 4.0 permitiu que os bancos se tornassem cada vez mais automatizados, inclusive com a implementação de assistentes virtuais para auxiliam os clientes, que realizam operações sem a necessidade de se deslocar até uma agência para ser atendidoporumfuncionário.Emboraaindaoperemcomagênciasfísicas,osbancostradicionais passaram a oferecer serviços digitais que facilitam o acesso dos clientes a serviços que antes só eram possíveis nas agências. Tanto é verdade que, em 2022, o número de transações por meios digitais representou quase 80% do total de transações feitas por clientes da rede bancária, como ilustra o Gráfico 2, elaborado com dados da Federação Brasileira dos Bancos (FEBRABAN).

Gráfico 3 – Número de agências bancárias principais Bancos – Brasil 2015 – 2022

Canais Digitais
Canais Físicos

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A mudança no formato do atendimento à clientela por parte dos bancos foi tão ampla, que eles têm diminuído de tamanho, em se tratando da estrutura física para atendimento. Não por acaso, o número de agências bancárias dos cinco maiores bancos do Brasil caiu significativamente, passando de 20.073 unidades em 2016, para 13.895 em 2022. Foram 6.178 agências a menos, o que representou um corte de 31% do total de agências existentes em 2016, com pode ser deduzido a partir dos dados do Gráfico 3.

O impacto social desse processo foi grande. A título de exemplo, estudo da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro da Central Única dos Trabalhadores (CONTRAF-CUT), em parceria com o SEBRAE, aponta que o número de vínculos empregatícios do sistema bancário brasileiro caiu 13,7% entre 2012 e 2021, quando passou de 512.835 para 442.560 (CONTRAF-CUT/SEBRAE apud SINDIGRAF, 2023, p.s.n,), o que indica uma reestruturação no setor bancário, com impactos no mercado de trabalho. Enquanto isso, o lucro líquido dos cinco maiores bancos cresceu 112,5%, passando de R$ 50,2 bilhões em 2012, para R$ 106,7 bilhões em 2022 (DIEESE, 2017 – 2023, n.p.).

Neste contexto de reestruturação do setor bancário, surgiram as Fintechs, que são instituições bancárias totalmente digitais, onde todas as transações e operações com a clientela são feitas por meio de aplicativos. Instituições financeiras, portanto, que se beneficiam da tecnologia digital em prol do sistema bancário. Originária da junção das palavras “Financial” e “Technology”4, não se trata apenas de uma empresa que utiliza tecnologias avançadas: ela é a própria tecnologia avançada, de modo que pode otimizar os serviços, tornando-os mais acessíveis e rápidos. Por assim dizer, tem como propósito principal proporcionar soluções e serviços digitais como uma nova forma de acesso aos principais meios financeiros, eliminando tradicionais processos e a burocracia que envolve o sistema bancário. No Brasil, as primeiras Fintechs surgiram em 2013 e, de acordo com Brito e Pereira (2022, p. 03), elas chegaram “[...] trazendo modelos inovadores, de baixo custo e com distribuiçãodigital,totalmentefocadas emreformularaexperiênciadocliente”.Nestecontexto, como reforça a CNN Brasil (2023), as Fintechs conseguiram visualizar uma grande oportunidade diante do mercado financeiro brasileiro na era digital, já que, por meio da inovação conectada à alta tecnologia pode obter uma compreensão mais ampla dos hábitos e necessidadesdosclienteseassimdesenvolvereoferecediversosprodutoseserviçosfinanceiros ligados ao digital, além de contar com incontáveis formas de apoio para disponibilizar fácil acesso à rede de conhecimento voltada para consultorias, desenvolvimento pessoal, entre

4 O termo Fintech surgiu nos anos 1980, quando o jornalista Peter Knight juntou as palavras Financial e Technology para batizar uma coluna sobre negócios no jornal britânico The Sunday Times. Para maiores detalhes, ver Distrito (2021).

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outros, de tal sorte que podem oferecer serviços personalizados, inovadores, rápidos e desburocratizados, algo que é fortemente apreciado pelos usuários.

Vale dizer, portanto, que as Fintechs se apresentam como uma mudança em relação à forma como as instituições financeiras tradicionais operam e como os consumidores interagem com os serviços financeiros. É senso comum que as instituições bancárias sempre se mostraram pouco eficientes em relação aos processos e à burocracia, ao contrário das Fintechs, que por meio da conexão à alta tecnologia, podem obter uma compreensão mais ampla dos hábitos e necessidades dos clientes e oferecer produtos e serviços financeiros digitais.

Não obstante, os avanços tecnológicos não estão isentos de desafios e dilemas, que precisam ser explorados e compreendidos. As instituições bancárias sempre se mostraram pouco eficientes em relação aos processos e à burocracia que as envolvem. Resta saber se os clientes e os funcionários do sistema bancário brasileiro estão mais ou menos satisfeitos com a digitalização dos bancos, o que será objeto de análise no tópico a seguir.

3 Processo metodológico: o impacto das Fintechs sobre clientes e funcionários

Como abordado na parte anterior, o mundo passa por um profundo processo de inovações com o surgimento e difusão da chamada Indústria 4.0, cujos processos de produção, distribuição e controle permitiram o surgimento do capitalismo de plataforma, que se caracteriza por conectar os consumidores às empresas por meio de aplicativos digitais. Além das indústrias e do comércio, este processo atingiu também o setor financeiro, que passou a atuar cada vez mais por meio de Fintechs, que se propõe a facilitar o acesso dos clientes aos principais meios financeiros, utilizando-se de aplicativos ou sites para realizar funções que antes só eram possíveis em bancos físicos. Nestes termos, esta parte tem como objetivo avaliar o impacto dessa nova tecnologia sobre usuários e funcionários do sistema bancário.

Para alcançar o objetivo proposto foi realizada uma pesquisa de campo por meio da aplicação de dois questionários junto a clientes e funcionários do sistema bancário, com uso da ferramenta Google Forms. O primeiro, elaborado para atender ao objetivo de avaliar o grau de satisfação dos clientes do sistema bancário, continha 25 perguntas fechadas, sendo 11 dirigidas a usuários de banco tradicional, 11 dirigidas a usuários de banco digital e três de contexto geral. O segundo, elaborado para atender ao objetivo de avaliar o grau de satisfação dos funcionários do sistema bancário, continha 31 perguntas fechadas, sendo 14 dirigidas a funcionários de banco tradicional, 14 dirigidas a funcionários de banco digital e três de contexto geral. Em ambos os casos, cada uma das questões tinha 11 alternativas que variavam de zero a dez.

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A análise dos dados foi feita com base no modelo de pesquisa Net Promoter Score (NPS), uma ferramenta métrica usada para avaliar o grau de satisfação de um determinado público, considerando três grupos. Como explica Alonso (2020), o primeiro refere-se àqueles que atribuem às respostas notas entre 0 e 6, considerados insatisfeitos (detratores); o segundo reúne aqueles que atribuem notas7ou8, considerados neutros; e oterceiro formadopor aqueles que atribuem notas 9 ou 10, considerados promotores (satisfeitos).

3.1 O impacto das Fintechs sobre clientes

Quanto ao objetivo de avaliar o grau de satisfação dos clientes do sistema bancário, 140 usuários responderam ao questionário. Desse total, 22% afirmaram ter de 15 a 25 anos de idade, 19% de 26 a 35, 27% de 36 a 50 e 31% acima de 51 anos. Como ilustram os dados da Tabela 1, 32% afirmaram ter conta apenas em banco tradicional, 4% apenas em banco digital e 64% em ambas as modalidades de banco. Os dados indicam que a preferência por contas em banco tradicional é maior entre os mais velhos.

Tabela 1 – Distribuição por modalidade de banco que tem conta e idade

Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

No que diz respeito ao grau de satisfação quanto ao tipo de atendimento, se presencial ou online, os dados da Tabela 2 mostram que a maioria dos clientes de são detratores, ou seja, estão descontentes com o atendimento nas agências, porcentagem que diminuiu em se tratando do atendimento online. No caso dos usuários que têm conta em banco tradicional, o percentual de detratores em relação ao atendimento presencial é de 69%; no caso dos que têm conta em banco digital, 72%. Quanto ao atendimento por meio de aplicativos, apenas 39% dos respondentes que têm conta em banco tradicional se mostram detratores; percentual que é menor em relação aos que têm conta em banco digital: 22%. No extremo opostos, quando se considera os usuários promotores, ou seja, satisfeitos com o atendimento, esse número é maior entre aqueles que têm conta em banco digital e são atendidos por meio de aplicativos: 55%.

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Tabela 2 – Distribuição do grau de preferência entre atendimento presencial e online

Pergunta/NotaAtribuída

Emumaescala de 0a 10,sendo 0nunca

e 10 sempre, o quanto você prefere ter atendimento presencial (na agência) do bancotradicionalquemais utiliza?

Emumaescala de 0a 10,sendo 0nunca e 10 sempre, o quanto você prefere ter atendimento online (por meio de App) do bancotradicionalquemais utiliza?

Emumaescala de 0a 10,sendo 0nunca e 10 sempre, o quanto você prefere ter atendimento presencial (na agência) do bancodigitalquemais utiliza?

Emumaescala de 0a 10,sendo 0nunca e 10 sempre, o quanto você prefere ter atendimento online (por meio de App) do bancodigitalquemais utiliza?

Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

Os dados da pesquisa também revelam que entre os clientes promotores, há uma diferençaquanto selevaem contaaidade,pois quanto mais velho ousuário,maiora preferência pelo atendimento presencial; entreos mais jovens,maiorapreferênciapelo atendimentovirtual. Como pode ser visto no Gráfico 4, o atendimento presencial é preferível por 41% dos classificados como promotores com mais de 51 anos de idade, número que cai para 21% em se tratando da preferência para atendimento online. Entre os usuários promotores de 15 a 25 anos, o atendimento online é preferível por 29%, contra 15% que preferem atendimento presencial.

Gráfico 4 - Distribuição % de clientes promotores, segundo a idade e o tipo de atendimento

Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

A posição dos clientes quanto ao tipo de atendimento pode ser observada com maior nitidez quando se considera o grau de satisfação com a digitalização dos bancos. De acordo com os dados da Tabela 3, 41% dos clientes de banco tradicional e 51% dos clientes de banco digital são promotores, ou seja, partilham da opinião que a digitalização dos bancos os beneficiou. Em contraste, 30% dos respondentes com conta em banco tradicional e 21% daqueles com conta em banco digital são detratores: afirmam que a digitalização não os beneficiou. Tal constatação condiz com a pesquisa realizada pela FEBRABAN (2022, p. 8), segundo a qual, os mais velhos apresentam maior dificuldade na adaptação ao sistema digital,

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seja por desconhecimento ou falta de familiaridade com as ferramentas digitais (apontado por 38% dos respondentes) ou por medo de não saber usá-las (apontado por 19%).

Tabela 3 – Distribuição do grau de satisfação com a digitalização dos bancos

Pergunta

Emumaescalade0a10, sendo 0 prejudicou totalmente e 10 beneficiou totalmente, quanto você acredita que a digitalização dos bancos prejudicou ou beneficiou o usuário/cliente?

Notas atribuidas pelos que têmcontaembancotradicional

NPS(em%)

Notas atribuidas pelos que têmcontaembancodigital

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Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

Os dados da Tabela 4 ilustram o grau geral de satisfação dos clientes que têm conta em banco tradicional. Observa-seumainsatisfação generalizada,jáque56%delessãoclassificados como detratores e apenas 17% como promotores. As maiores taxas de insatisfação foram com a taxa de juros e às tarifas cobradas pelos bancos, com 83% e 69%, respectivamente. Apesar de contraditório, embora baixo, o melhor índice de satisfação dos clientes de banco tradicional foi com o atendimento online: 24% classificados como promotores.

Tabela 4 – Distribuição do grau de satisfação geral dos clientes de banco

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto aos serviços prestados pelo banco tradicionalque maisutiliza?

NPS (em%)

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto àburocracia nosserviçosprestadospelo banco tradicionalque maisutiliza?

NPS (em%)

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto às tarifas cobradas nos serviços prestadospelo banco tradicionalque maisutiliza?

NPS (em%)

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto à taxa de juros cobrada pelo banco tradicionalque maisutiliza?

NPS (em%)

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto ao atendimento presencial (na agência) efetuado pelo banco tradicionalque maisutiliza?

NPS (em%)

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto ao atendimento online (por meio de App)efetuado pelo banco tradicionalque maisutiliza?

Emuma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente ineficaz e 10 plenamente eficaz, como você avalia a eficácia dasequipesde suporte do banco tradicionalque mais utiliza, ao lidar comsuaspreocupações ouproblemas relacionadosaossistemasbancários?

TOTAL

Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

(em%)

NPS (em%)

NPS (em%)

Totalde notas atribuídas
NPS

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Já em relação aos clientes que têm conta em banco digital, observa-se que o grau de insatisfação geral é menor que dos clientes com conta em banco tradicional. Enquanto 56% daqueles são classificados como detratores, entre os clientes de banco digital o número é de 37%, como ilustra a Tabela 5. Por outro lado, o grau de satisfação medido pelo percentual de clientes promotores foi maior entre clientes de banco digital: 31% contra 17% entre clientes de banco tradicional.

Tabela 5 – Distribuição do grau de satisfação dos clientes de banco digital

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto aos serviços prestadospelobancodigitalquemaisutiliza?

NPS

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto à burocracia nos serviçosprestadospelobancodigitalquemaisutiliza?

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto às tarifas cobradasnosserviçosprestadospelobancodigitalquemais

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto à taxa de juros cobradapelobancodigitalquemaisutiliza?

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto ao atendimento presencial(naagência)efetuadopelobancodigitalquemaisutiliza?

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, como você se sente quanto ao atendimento online(pormeiodeApp)efetuadopelobancodigitalquemais

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente ineficaz e 10 plenamente eficaz, como você avalia a eficácia das equipes de suporte do banco digital que mais utiliza, ao lidar com suas preocupaçõesouproblemasrelacionadosaossistemasbancários?

TOTAL

Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

Como mostra a Tabela 5, os maiores índices de insatisfação dos clientes de banco digital estão relacionados ao atendimento presencial e à taxa de juros cobrada pelos bancos, com 68% e 52%, respectivamente. O melhor índice de satisfação dos usuários de banco digital foi com o atendimento online, com 44% classificados como promotores, bem maior que aquele dos usuários de banco tradicional, que teve 24% classificados como promotores.

Tabela 6 – Distribuição quanto à disposição de indicar o banco que tem conta

Pergunta/NotaAtribuída

Porquemtemcontaembancotradicional Porquemtemcontaembancodigital

Em uma escala de0 a 10, sendo 0 não recomendo em hipótese alguma e10 recomendo inteiramente, quanto você recomendaria para outra pessoa o banco tradicionalquemaisutiliza? NPS(em%)

Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

(em%)
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Quando questionados se indicariam o banco que tem conta para outras pessoas, 49% dos clientes de banco tradicional foram classificados como detratores, contra 21% daqueles que têm conta em banco digital. Como mostra a Tabela 6, 21% dos primeiros foram classificados comopromotores,contra51%dossegundos.Comoograudeinsatisfaçãodosusuáriosdebanco digital é menor, eles se mostram mais dispostos a indicar o banco que têm conta para outras pessoas que aqueles que têm conta em banco tradicional, que se mostram menos satisfeitos.

3.2 O impacto das Fintechs sobre funcionários

Quanto ao objetivo de avaliar o grau de satisfação dos funcionários do sistema bancário, 35 funcionários responderam ao questionário, atribuindo notas de zero a dez a cada uma das questões. Como ilustra a Tabela 7, desse total, 11% tinham de 15 a 25 anos de idade, 26% de 26 a 35, 54% de 36 a 50 e 9% acima 51 anos. 86% afirmaram trabalhar em banco tradicional e 14% em banco digital. A maioria dos que trabalham em banco tradicional tem idade maior do que 36 anos; os que trabalham em banco digital têm menos de 35 anos de idade.

Tabela 7 – Distribuição por modalidade de banco que trabalha e idade

Fonte: Elaborado pelas autoras (2024).

Noquedizrespeitoaograudepreferênciaquantoaotipodetrabalho,osdadosdaTabela 8 mostram que a maioria dos funcionários de banco tradicional preferem o trabalho presencial, já que 60% deles são detratores em relação ao trabalho home office, contra 43,3% e 40% em relação ao trabalho presencial ou híbrido, respectivamente. Contrariamente, quem trabalha em banco digital prefere o trabalho home office: 60% são promotores em relação a este tipo de trabalho e 100% detratores em relação ao trabalho presencial.

Tabela 8 – Distribuição do grau de preferência trabalho presencial, home office ou híbrido

Pergunta/NotaAtribuída Porfuncionáriode bancotradicional

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 nunca e 10 sempre, quanto você prefere trabalhar de forma presencial (naagência)?

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 nunca e 10 sempre, quanto você preferetrabalhar deforma remota(da suaresidência)?

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 nunca e 10 sempre, quanto você preferetrabalhardeformahíbrida?

Fonte: Elaborada pelas autoras (2024).

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A posição dos funcionários quanto ao tipo de trabalho pode ser observada com maior nitidez quando se considera o grau de satisfação com a digitalização dos bancos. De acordo com os dados da Tabela 9, a parcela dos funcionários de banco tradicional classificada como neutra foi de 50%, mas a parcela dos que foram classificados como detratores, ou seja, que a digitalização os prejudicou, foi menor (23%) que aquela classificada como promotores (27%) para os quais a digitalização os beneficiou. Contrariando as expectativas, a parcela dos funcionários de banco digital classificada como como detratores (40%) foi maior do que aquela classificada como promotores (20%).

Tabela 9 – Distribuição do grau de satisfação com a digitalização dos bancos

Pergunta/NotaAtribuída

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 prejudicou totalmente e 10 beneficiou totalmente, quanto você acredita que a digitalização dos bancos prejudicou ou beneficiouos funcionários dos bancos?

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 de maneira totalmente negativa e 10 de maneira totalmente positiva, quanto a digitalização dos serviços bancários afeta as demandas e expectativas em relaçãoaoseutrabalho?

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente negativa e 10 totalmente positiva, como você avalia que as fintechs (bancos virtuais) impactaram o sistemafinanceirobrasileiro?

Fonte: Elaborada pelas autoras (2024).

Quando a pergunta é se a digitalização dos serviços bancários foi positiva ou negativa, 40% dos funcionários de banco tradicional foram classificados como promotores, contra 23% classificados como detratores, o que indica uma avaliação positiva da digitalização dos serviços bancários por parte de funcionários de banco tradicional. De acordo com os dados da Tabela 9, em relação aos funcionários de banco digital, a posição é dúbia, já que 40% foram classificados como promotores, mesmo percentual daqueles classificados como detratores.

Ao responderem se as Fintechs impactaram positivamente ou negativamente o sistema financeiro brasileiro, para a maioria dos funcionários de banco tradicional, a resposta foi que o impacto foi neutro (50%), mas a parcela dos que foram classificados como detratores foi menor (23%) que aquela classificada como promotores (27%), como ilustram os dados da Tabela 9. Contrariando as expectativas, a parcela dos funcionários de banco digital classificada como como detratores (40%) foi maior do que aquela classificada como promotores (20%).

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Porquemtrabalhaembancodigital
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Ao responderem sobre o grau de satisfação em relação ao ambiente de trabalho, os funcionários de banco digital foram mais otimistas, já que 40% foram classificados como promotores, contra 20% classificados como detratores. Como mostram os dados da Tabela 10, a maioria daqueles funcionários de banco tradicional foi classificada como neutra (53%), mas a parcela dos que foram classificados como detratores, insatisfeitos portanto com o ambiente de trabalho, foi maior (23%) que aquela dos que foram classificados como promotores (20%) e se mostram satisfeitos, portanto, com o ambiente de trabalho.

Tabela 10 - Distribuição do grau de satisfação com o ambiente de trabalho

Pergunta/NotaAtribuída

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente insatisfeito e 10 totalmente satisfeito, qual a sua avaliaçãoquanto ao ambiente de trabalho no banco paraoqualtrabalha?

Fonte: Elaborada pelas autoras (2024).

Ainsatisfaçãosemostratambémquandosetratadosinvestimentosemdesenvolvimento e tecnologia e da eficácia das equipes de suporte. Como ilustram os dados da Tabela 11, neste caso, a insatisfação é maior entre os profissionais de banco tradicional, já que 57% se mostram detratores com relação aos investimentos em desenvolvimento e tecnologia e 37% quanto à eficácia das equipes de suporte. Dos profissionais de banco digital, 60% se mostram satisfeitos com os investimentos em desenvolvimento e tecnologia e 40% quanto à eficácia das equipes de suporte ao lidarem com suas preocupações ou problemas relacionados ao sistema bancário.

Tabela 11 – Distribuição do grau de satisfação com os investimentos em desenvolvimento e tecnologia e com a eficácia das equipes de suporte

Pergunta/NotaAtribuída

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmenteinsuficientee10totalmente suficiente, como você classificaria o investimento em desenvolvimento e tecnologianobanco quetrabalha?

Em uma escala de 0 a 10, sendo 0 totalmente ineficaz e 10 plenamente eficaz, como você avalia a eficácia das equipes de suporte do bancoque trabalha?

Porquemtemcontaembancotradicional

Porquemtemcontaembancodigital

%)

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Fonte: Elaborada pelas autoras (2024).

Apesar do elevado grau de insatisfação dos funcionários de banco tradicional, ainda assim, quando questionados se indicariam o banco que trabalham para outras pessoas trabalharem, 47% foram classificados como promotores, ou seja, recomendariam para outras pessoas o banco que trabalham. Neste caso, como ilustra a Tabela 12, apenas 20% foram classificados como detratores: sem disposição, portanto, para recomendarem o banco que

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trabalham para outras pessoas trabalharem. Já em relação aos funcionários de banco digital, quandoquestionadosserecomendariamobancoquetemcontaparaoutras pessoastrabalharem, 40% foram classificados como promotores, ou seja, recomendariam. Neste caso, como ilustram os dados da Tabela 12, apenas 20% dos respondentes foram classificados como detratores, ou seja, não recomendariam o banco digital que trabalham para outras pessoas trabalharem.

Tabela 12 – Distribuição quanto à disposição de indicar o banco que trabalha

Por quemtemtrabalhaembancotradicional Pergunta/NotaAtribuída

Em uma escala de0 a 10, sendo 0 não recomendo em hipótese alguma e10 recomendo inteiramente, quanto você recomendaria para outra pessoa trabalharobancotrabalha?

Fonte: Elaborada pelas autoras (2024).

A contradição entre o grau de insatisfação dos funcionários que trabalham em banco tradicional e a disposição de recomendar o banco que trabalham para outras pessoas trabalharem, o que se repete entre os clientes das instituições bancárias, a explicação parece lógica. Como demonstrado pelas Tabelas 1 e 7, a maior parcela dos respondentes que têm conta ou trabalham em banco tradicional são mais velhos, parte de uma geração que tende a ser mais fiel às organizações; mais propensos, portanto, a recomendarem o banco que trabalham ou têm conta para outras pessoas. Os mais jovens, por seu turno, além de dominarem as tecnologias e a informatização, o que os tornam conectados ao mundo digital, buscam autonomia e flexibilidadeporpartedasorganizações (Comazzettoetal.,2016).Essesaspectosparecemmais comuns no ambiente remoto, o que pode explicar o maior grau de satisfação de funcionários e clientes de banco virtual, bem como a maior propensão a indicá-lo para outras pessoas.

Tabela 13 – Distribuição da avaliação quanto à possibilidade da digitalização dos bancos tornar funções obsoletas x criação de oportunidades

Pergunta/NotaAtribuída

Em umaescalade0à10,sendo0 nunca e 10 sempre, quanto você avalia que a digitalização dos bancos podetornarcertas funções obsoletas?

Em umaescalade0à10,sendo0 nunca e 10 sempre, quanto você avalia que a digitalização dos bancos pode criar novas oportunidades decarreira?

Porquemtemcontaembancotradicional

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Fonte: Elaborada pelas autoras (2024).

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Uma análise relevante da pesquisa diz respeito à percepção dos funcionários quanto à possibilidade de tornar certas funções obsoletas, em contraposição ao surgimento de novas

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oportunidades. Ao que parece, há quase que um consenso de que a digitalização dos bancos irá tornar certas funções obsoletas, mas criará novas oportunidades. Como mostra a Tabela 13, 50% dos funcionários de banco tradicional foram classificados como promotores em relação a ambas as questões, de modo que acreditam na obsolescência de certas funções, mas se mostram otimistas com a possibilidade de surgimento de novas oportunidades de trabalho. Esse percentual foi maior ainda entre os funcionários de banco digital: 80%.

4 Considerações finais

O objetivo geral desta pesquisa foi analisar a crescente influência das Fintechs no cenário financeiro brasileiro e compreender como elas atuam e sua relação com clientes e funcionários. A hipótese foi que as Fintechs elevam o grau de insatisfação de clientes e funcionários, quando comparado ao sistema bancário tradicional.

A revisão bibliográfica e a pesquisa documental permitiram reunir informações e dados por meio dos quais foi possível analisar o surgimento, a evolução e o papel das Fintechs na transformação do setor bancário brasileiro. Porquanto, na primeira parte foi feita uma análise em perspectiva história sobre a Revolução Industrial e sua importância para a formação do capitalismo de plataforma e sua relação com as Fintechs, contemplando a evolução dessa modalidade de banco no Brasil.

O estudo mostrou que a inovação tecnológica é um fator marcante do Modo Capitalista de Produção, visto que desde que surgiu, ele já passou por três revoluções tecnológicas e está transitando para a quarta, comumente chamada de indústria 4.0, que está permitindo expansão deempresas dos mais variadossetores daeconomiaqueatuam pormeiode plataformasdigitais, sendo que foi esse verdadeiro capitalismo de plataformas que permitiu o surgimento das Fintechs, instituições bancárias totalmente digitais, nas quais as transações e operações com a clientela são todas feitas por meio de aplicativos.

A revisão bibliográfica mostrou também que no Brasil as primeiras Fintechs surgiram em 2013, quando visualizaram a oportunidade de fazer uso da alta tecnologia para obter a compreensão dos hábitos e necessidades dos clientes e desenvolver e oferecer serviços financeiros digitais, personalizados, inovadores, rápidos e desburocratizados, algo apreciado pelos usuários.

O estudo permitiu ainda avaliar o impacto dessa transformação do setor bancário brasileiro sobre o grau de satisfação de clientes e funcionários. Por assim dizer, na segunda

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parte foi feita a sistematização e análise da pesquisa de campo. Neste caso, ao contrário da hipótese levantada, a pesquisa demonstrou que os clientes de banco digital apresentam, em média, maior grau de satisfação em comparação aos clientes de banco tradicional, em especial os mais jovens, do mesmo modo que os funcionários de banco digital se mostraram mais satisfeitoscomadigitalizaçãodosserviçosbancáriosemcomparaçãoaos funcionáriosdebanco tradicional. Enquanto os funcionários de banco digital se mostram menos insatisfeitos com o ambiente de trabalho, seja em relação às instalações, à eficácia das equipes de suporte ou em relação aos investimentos em desenvolvimento e tecnologia, entre aqueles que trabalham em banco tradicional a insatisfação é considerável em relação a esses aspectos.

A conclusão foi que para aumentar a satisfação dos clientes, os bancos tradicionais devem investir na melhoria do atendimento presencial e intensificar os esforços de digitalização, proporcionando suporte adequado e treinamento para clientes e funcionários, especialmente os mais velhos e os resistentes à mudança. Para melhorar a satisfação dos funcionários e a eficácia das equipes de suporte, devem aumentar os investimentos em desenvolvimento e tecnologia e implementar modelos de trabalho mais flexíveis, como o home office ou híbrido, especialmente para atrair e reter talentos mais jovens e tecnologicamente adeptos. Por fim, desenvolver e aperfeiçoar programas de capacitação, visando preparar os funcionários para as novas oportunidades de trabalho que surgirão com a digitalização dos serviços bancários.

Cabedestacar queo númerode respondentesdos questionáriosfoipequeno, em especial defuncionários de banco digital.Nestestermos, ficacomo sugestãoa necessidadede ampliação da pesquisa. Oportuno também seria uma análise por banco. Em conjunto, tais inciativas permitiram aprofundar a análise e contribuir para a compreensão do impacto das Fintechs e oferecer novas ideias para melhorar a satisfação de clientes e funcionários e para a evolução do setor bancário, um ambiente que se torna cada vez mais digital.

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SUSTENTABILIDADE E TECNOLOGIAS SOCIOAMBIENTAIS

Desenvolvimento de aplicativo digital para identificação e continuidade de projetos ambientais

Gustavo Henrique Patricio1

Juliana Augusta Verona2

Resumo. O debate em torno da sustentabilidade vem ocorrendo desde o final do século XX e a Agenda 21 foi o Documento que definiu metas e objetivos a serem cumpridos pelos países envolvidos, com a preocupação de reduzir os impactos ambientais negativos sobre o meio ambiente. A evolução desse Documento na atualidade é a Agenda 2030, que traz os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Vários projetos, com enfoque em tecnologias socioambientais ou na busca de soluções inovadoras na área da sustentabilidade, são desenvolvidos em Instituições de Ensino Superior, mas muitos deles com grande potencial, que poderiam ser divulgados para busca de apoio financeiro e implantados na sociedade para benefícios coletivos, são abandonados e, grande parte, esquecidos. Desta forma, esta pesquisa visa demonstrar a construção de um aplicativo com a finalidade de identificar projetos relacionados à área socioambiental desenvolvidos por alunos dos Cursos Superiores de Tecnologia da Fatec Itu e pela Secretaria de Meio Ambiente do Município, tendo como destaque as experiências dos usuários (UX). O aplicativo desenvolvido busca elencar os projetos relacionados à área ambiental, demonstrando o que cada projeto propõe, com a finalidade de divulgar para toda comunidade internaeexterna,paraquepossamimplantá-losnosespaçosondevivem,bemcomo,napromoçãodestes projetos para obtenção de apoiadores para o desenvolvimento dos mesmos. Espera-se que o aplicativo possa estimular o desenvolvimento sustentável nas instituições de ensino superior, incorporando a temática socioambiental nos currículos e nas práticas acadêmicas.

Palavras-chave: Sustentabilidade; Tecnologias Sociambientais; Aplicativos e Experiências dos Usuários (UX).

Resumen. Sostenibilidad y Tecnologías Socioambientales: desarrollo de una aplicación digital para la identificación y continuidad de proyectos ambientales. El debate en torno a la sostenibilidad ha estado ocurriendo se viene dando desde finales del siglo XX y la Agenda 21 fue el documento que definió metas y objetivos a cumplir por los países involucrados, con la preocupación de reducir los impactos ambientales negativos. La evolución de este documento hoy es la Agenda 2030, que trae los 17 Objetivos de Desarrollo Sostenible (ODS). Varios proyectos, centrados en tecnologías socioambientales o la búsqueda de soluciones innovadoras en el área de la sostenibilidad, se desarrollan en Instituciones de Educación Superior, pero muchos de ellos, con gran potencial, podrían difundirse parabuscar apoyofinancieroeimplementarseenlasociedadporbeneficioscolectivos,sonabandonados y, en su mayor parte, olvidados. De esta manera, esta investigación tiene como objetivo demonstrar la construcción de una aplicación com el objetivo de identificar proyectos relacionados com el área socioambiental desarrollados por estudiantes de los Cursos Superiores de Tecnología de Fatec Itu y por la Secretaría Municipal de Medio Ambiente, destacando las experiencias de los usuarios (UX). La aplicación desarrollada busca enumerar proyectos relacionados com el área ambiental, demostrando lo que propone cada proyecto, con el propósito de difundirlo a toda la comunidad interna y externa, para que puedan implementarlos en los espacios donde viven, así como promover estos proyectos para obtener apoyos para su desarrollo. Se espera que la aplicación pueda estimular el desarrollo sostenible

1 Discente do Curso Superior de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas pela Faculdade de Tecnologia de Itu. gustavo_hp@hotmail.com.

2 Possui Graduação, Mestrado e Doutorado em Geografia pela UNESP e Pós-doutorado pelo Instituto de Geociências da UNICAMP. É Professora de Gestão Ambiental e Responsabilidade Socioambiental no Centro Paula Souza e membro do Núcleo de Estudos em Tecnologia e Sociedade. juliana.verona@fatec.sp.gov.br.

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en las instituciones de educación superior, incorporando temas socioambientales em los planes de estúdio y las prácticas académicas.

Palabras clave: Sostenibilidad; Tecnologías socioambientales; Aplicaciones y Experiencias de los usuarios (UX).

Abstract. Sustainability and Socio-environmental Technologies: development of a digital application for the identification and continuity of environmental projects. The debate around sustainability has been occurring since the end of the 20th century and Agenda 21 was the document that defined goals and objectives to be met by the countries involved, with the concern of reducing negative environmental impacts on the environment. The evolution of this document today is the 2030 Agenda, which brings the 17 Sustainable Development Goals (SDGs). Several projects, focusing on socio-environmental technologies or the search for innovative solutions in the area of sustainability, are developed in Higher Education Institutions, but many of them have great potential, which could be disseminatedtoseek financial support andimplemented insociety forcollective benefits,are abandoned and, for the most part, forgotten. In this way, this research aims to demonstrate the construction of an application with the purpose of identifying projects related to the socio-environmental area developed by students of Higher Technology Courses at Fatec Itu and by the Municipal Environment Secretariat, highlighting the users’ experiences (UX). The application developed seeks to list projects related to the environmental area, demonstrating what each project proposes, with the purpose of disseminating it to the entire internal and external community, so that they can implement them in the spaces where they live, as well as promoting these projects for obtaining supporters for their development. It is expected thattheapplicationcanstimulatesustainabledevelopmentinhighereducationinstitutions,incorporating socio-environmental themes into curricula and academic practices.

Keywords: Sustainability; Socioenvironmental Technologies; applications and user experiences (UX).

1 Introdução

O desafio que se coloca neste estudo é de possibilitar que a instituição pública de ensino superior, no caso a Fatec Itu, seja reconhecida pela comunidade interna e de seu entorno como promotora de projetos na área socioambiental. A ideia é que, a partir do desenvolvimento e, posteriormente, utilização de um aplicativo móvel, que retrata e identifica essa Instituição e os seus projetos realizados nas áreas socioambientais, de modo a ampliar a divulgação e aplicação dos mesmos, contribuindo para a conquista de alguns objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS) propostos na Agenda 2030.

Entendendo que essa proposta está intimamente relacionada às atividades de extensão universitária, vale destacar que as Instituições sabem o que é pesquisa e ensino, mas não há clareza do que seja extensão conforme revela Silva (2002 apud Carbonari; Pereira, 2017, p.25):

Para umas é “função”, semelhante ao ensino e a pesquisa, que realiza compromissos sociais da universidade; para outras, é comunicação, em que a extensão divulga e complementa as funções de ensino e pesquisa; e, para outras, ainda é princípio, uma vez que todas as outras atividades passam a ser definidas a partir da extensão.

Entendemos que é fundamental proporcionar parcerias entre comunidade e universidade, destacando o processo de responsabilidade socioambiental, fortalecendo o tripé

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pesquisa-ensino-extensão, além de, proporcionar melhorias na comunidade, a partir da apropriação dos projetos desenvolvidos pelos docentes e discentes da Fatec Itu de forma compartilhada e colaborativa, onde o meio para essa apropriação ocorre inicialmente através de um aplicativo móvel que identifica os projetos realizados nas áreas socioambientais, com potenciais para continuidade para além da Instituição.

Desta forma, esta pesquisa visa demonstrar a construção de um aplicativo com a finalidade de identificar projetos relacionados às áreas socioambientais desenvolvidos por alunos dos cursos superiores de tecnologia da Fatec Itu e região e pela Secretaria de Meio Ambiente do Município de Itu, tendo como destaque as experiências dos usuários (UX).

Para alcançar os objetivos propostos, foi realizada revisão teórica, tendo como foco central a sustentabilidade e as tecnologias socioambientais. Posteriormente, foram levantados projetos realizados na Fatec Itu e no Município de Itu, por meio da Secretaria de Meio Ambiente. Denominamos de “incubadora de projetos”, onde, a partir do uso do aplicativo, possibilita dar continuidade ao seu desenvolvimento e execução, tendo como apoio a escolha realizada pelos docentes-orientadores dos diversos cursos. As outras etapas para o desenvolvimento da pesquisa foram (i) o desenvolvimento de um aplicativo que apresentasse projetos relacionados às áreas ambientais e demonstrasse o que cada projeto propusesse; (ii) a escolha de usuários para que utilizassem o aplicativo e pudessem responder os questionários quanti-qualitativos, com finalidade de avaliar se o aplicativo estava atendendo aos objetivos da pesquisa e quais experiências estava proporcionando e (iii) análise e discussão dos resultados.

2 Sustentabilidade e Tecnologias Sociais

A sociedade passou por grandes mudanças, especialmente, após a Revolução Industrial, que provocam intenso processo de migração das pessoas do meio rural para o meio urbano. O desenvolvimentotécnico, científico eas inovações tecnológicas, juntamente com ocrescimento populacional, contribuíram para o estabelecimento da sociedade de consumo.

Essa sociedade de consumo provocou em grande parte a degradação do meio ambiente. Assim, conforme revela Jacobi (2003) surge a necessidade de uma transformação social, a qual requer a formação de articulações com a educação ambiental, envolvendo a capacitação de profissionais, juntamente com a comunidade e formando níveis de educação voltados às responsabilidades do ser humano.

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Mudar a forma de exploração dos recursos naturais e passar a viver verdadeiramente a sustentabilidade é fundamental e as ações para a sustentabilidade podem estar presentes nas atitudes cotidianas mais simples das pessoas ou até nas tarefas mais complexas, que devem ser realizadas por grandes empresas, por isso, a conscientização da problemática ambiental deve envolver a todos para que a redução dos impactos ambientais seja efetiva.

Para Torresi et al (2010, n.p.) sustentabilidade vai muito além da diminuição da emissão de gases tóxicos na atmosfera, definindo sustentabilidade como “um conjunto de paradigmas para o uso de recursos que visam atender as necessidades humanas”. Para esse autor, sustentabilidade ambiental, econômica e sociopolítica andam juntas.

Para que mudemos a forma de exploração dos recursos naturais é importante que o ser humano se enxergue como parte integrante do meio ambiente e não apenas corno um observador que retira da natureza o que lhe interessa, não importando com os impactos negativos que causa nestes ambientes. Entender que os sistemas se inter-relacionam é de extrema importância para a permanência da vida no nosso planeta, e, a busca deste equilíbrio, é um dos grandes desafios da humanidade. Segundo Boff (2012), sustentabilidade é algo tão essencial que somente dessa forma a espécie humana pode garantir seu futuro no planeta terra.

Este estudo está diretamente relacionado à chamada Tecnologia Social (TS), já que propõe elencar projetos nas áreas ambientais que terão a possibilidade de terem continuidade pelos docentes e discentes, como também, integrados à comunidade do entorno, a partir da identificação dos mesmos no aplicativo que será desenvolvido. Cabe lembrar que existe uma diversidade de elementos que estão relacionados à construção e ao desenvolvimento de uma TS, entre as quais

Pode-se citar a transformação social, a participação direta da população, o sentido de inclusão social, a melhoria das condições de vida, o atendimento de necessidades sociais, a sustentabilidade socioambiental e econômica, a inovação, a capacidade de atender necessidades sociais específicas, a organização e sistematização da tecnologia, o diálogo entre diferentes saberes (acadêmicos e populares), a acessibilidade e a apropriação das tecnologias, a difusão e ação educativa, a construção da cidadania e de processos democráticos, a busca de soluções coletivas, entre outros, que são sustentados por valores de justiça social, democracia e direitos (Fernandes; Maciel, 2010, p. 09).

Para Bava (2004), TS são como técnicas e metodologias inovadoras, as quais contam com o envolvimento da comunidade a fim de aumentar a inclusão social. Podem promover uma mudança tanto para o indivíduo, quanto para o meio em que vive, como por exemplo, um sistema de coleta de água de chuva, onde um pesquisador, por meio de testes e estudos, desenvolve uma técnica inovadora para a coleta, filtragem e armazenamento de água. Ao disponibilizar essa tecnologia desenvolvida para a população, estará transformando-a em uma

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TS, que poderá ser replicada por uma pessoa ou comunidade, ajudando famílias que sofrem com estiagens prolongadas.

Construir uma cultura de conscientização ambiental, compartilhando saberes entre toda a comunidade da Faculdade de Tecnologia "Dom Amaury Castanho"- Fatec Itu e do entorno, possibilita fortalecer a ideia de que o ambiente de ensino deve servir como verdadeiro laboratório de transformação e autonomia social, principalmente na busca de soluções às problemáticas socioambientais dos diferentes espaços onde vivemos.

O primeiro capítulo do livro de Dagnino (2014), inicia-se com uma pergunta fundamental que é: "por que é necessário conceber tecnologia social (TS)"? A resposta reflete o posicionamento deste estudo, porque considera que a tecnologia convencional, a mais utilizada nos dias atuais, que a empresa privada utiliza, são eficientes o propósito de maximização do lucro privado, que limitam sua eficácia para a inclusão social. E, apresenta outro aspecto, onde

Percebe que as instituições públicas envolvidas com a geração de conhecimento científico e tecnológico (universidades, centros de pesquisa etc.) não parecem estar ainda plenamente capacitadas para desenvolver uma tecnologia capaz de viabilizar a IS e tornar autossustentáveis os empreendimentos auto gestionários que ela deverá alavancar. Isso torna necessário um processo de sensibilização dessas organizações e deoutras,situadasemdiferentespartesdoaparelhodeEstadoedasociedadeemgeral, a respeito do tema. (Dagnino, 2014, p. 19)

Levantamento realizado diretamente com a direção da Fatec Itu, identificou a existência de uma Política Ambiental construída desde 2012, com ações de coleta seletiva, coleta de lixo eletrônico e desenvolvimento de projetos a partir da seleção de materiais provenientes desta coleta. Além disso, projetos voltados à área ambiental, como por exemplo, o funcionamento de uma Horta Comunitária e o uma máquina de fabricação de sabão ecológico a partir de óleo de cozinha usado, desenvolvida pelos discentes do Curso de Mecatrônica Industrial. Desta forma, a criação de um aplicativo possibilita que a comunidade externa tenha acesso as informações referentes a esses projetos, podendo replicá-los se assim desejarem.

3 Aplicativos e Experiência do Usuário (UX)

Atualmente, plataformas como Google Play da Google e App Store da Apple, concentram milhares de aplicativos móveis. De acordo com Rocha (2015, n.p.), no final de 2014,a App Store possuía1,21milhõesdeaplicativos(apps),enquantosuaconcorrente, Google Play, possuía 1,43 milhões, totalizando 2,64 milhões. Em 2024, esse número chegou a 5,7

e Cultura da

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milhões(RankMyApp,2024, n.p.). Sabe-sequeestesaplicativos oferecem incontáveis funções, podendo ser algo simples como a leitura de uma notícia, até algo mais complexo, como as compras que ocorrem de forma online, por exemplo. Este fato possibilita aos usuários terem acesso aos mais variados tipos de informação a partir da palma de suas mãos. Evidentemente, como argumentam Baldo e Ahlert (2017), os smartphones ocuparam um espaço perdurável no cotidiano das pessoas. Este foi um dos motivos que levou à escolha da plataforma móvel para o desenvolvimento de um aplicativo como base para esta pesquisa. No que diz respeito ao desenvolvimento do aplicativo móvel, que faz parte das tecnologias de informação e comunicação (TICs), vale destacar Castells (1999), quando diz em sua trilogia “A era da informação: economia, sociedade e cultura”, que estamos vivendo a chamada Era da Sociedade em Rede, onde as relações humanas se conectam em rede através de suas organizações sociais, tendo como base os avanços da tecnologia. Nesse sentido Giaretta e Di Giulio (2015) colocam:

Quando o olhar se volta para aplicativos digitais que apresentam como objetivos a melhoriadacidadaniapormeiodaparticipaçãodasociedadedemodoativonoprocesso de governança, alguns exemplos interessantes surgem nos cenários internacionais e nacionais que, na maior parte das vezes, são parte das ações contempladas nos projetos já existentes de Smart Cities. (Giaretta; Di Giulio, 2015, p. 07)

No que se refere ao termo de Experiência do Usuário (UX), Agni (2016) o define como arelaçãoqueousuáriotemcomumdeterminadoproduto,asuaexperiênciaindividualedestaca que não se trata apenas da aparência. Em uma entrevista disponível no YouTube dada ao canal NNgroup, Donald Norman (2016), criador do termo UX a descreve da seguinte maneira:

Uma vez, há muito tempo atrás, eu estava na Apple e nós estávamos conversando como a experiência de usar esses computadores é ruim. A experiência da descoberta, quando você vê ele pela primeira vez em uma loja, quando você compra ele, quando não consegue colocar ele no carro porque a caixa é grande demais e não cabe, e quando finalmente chega em casa e abre a caixa e “Ooh! parece assustador, não sei se me atreveria a montar esse computador...". Tudo isso é experiência do usuário, é tudo relacionado a sua experiência com o produto e talvez nem precise estar perto dele, talvez quando você está conversando com alguém sobre ele. (Norman, 20216, entrevista youtube)

De acordo com Grant (2019), UX não se trata apenas de uma aparência bonita. A aparência deve contribuir para a experiência, sem prejudicar o funcionamento do aplicativo, ou seja, não adianta nada um aplicativo ser bonito, se as pessoas não conseguem utilizá-lo. Santana (2016) relata que para se implementar uma estratégia de UX, existem 8 pontos chaves que devem ser levados em conta. São eles:

• Design de Interações: a forma como ocorre a interação homem-máquina (rolagens, swipes, cliques, etc);

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• Interface de Usuário (UI): os componentes com os quais o usuário irá interagir. Uma boa UI deve guiar o usuário, sendo uma das partes mais importantes da sua experiência;

• DesignVisual:aaparênciadetudoqueousuáriovêdeveseresteticamenteagradável;

• Tipografia; é preciso escolher o tipo de fonte ideal, afinal será por meio de textos que a informação será transmitida;

• Usabilidade: a forma como os usuários utilizam a interface, deve ser simples e intuitiva;

• Arquitetura da Informação: responsável pela criação de uma estrutura que proporciona ao usuário informações necessárias para navegar dentro de um app ou site;

• Conteúdo: aforma como ainformação é transmitidaaousuário(texto, imagens, sons, vídeos); e

• Funcionalidade: a forma como o produto funciona. O produto deve funcionar, realizando as tarefas para qual foi projetado.

Vale destacar também notícia publicada no site da Universidade de São Paulo (USP, 2013), segundo a qual, estudo desenvolvido pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto com 100 indivíduos com mais de 65 anos apontou que a maior parte dessa população está aberta ao aprendizado de uma nova tecnologia, mas possui dificuldades com idiomas estrangeiros e letras pequenas e tem medo de não aprender a utilizar o celular ou não conseguir memorizar funções. Entendemos que por meio da UX, é possível atenuar ou até mesmo eliminar muitos destes problemas, principalmente ao focarmos em um design simples e funcional, atendendo pessoas que possuem algum tipo de dificuldade com uso de tecnologias ou até mesmo com idade avançada, que poderão utilizar o aplicativo sem dificuldades, o que incentiva a inclusão social destes indivíduos.

Desta forma, para o desenvolvimento deste estudo, a UX foi essencial, contemplando desde o design do ícone e do logotipo utilizado para identificar o aplicativo, passando pelo tipo de layout até a experiência final que usuário obteve ao utilizar o aplicativo desenvolvido.

4 Desenvolvimento do aplicativo

Nos primeiros quatro meses de desenvolvimento desta pesquisa, foi realizado levantamento dos principais autores que trataram sobre os temas em análise, oferecendo a possibilidade de maior compreensão sobre os assuntos abordados e amadurecimento para o desenvolvimento do aplicativo proposto.

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Outro aspecto em questão, refere-se ao fato de que no projeto original era previsto no cronograma a realização do levantamento de projetos das áreas ambientais em trabalhos de graduação realizados nos cursos da Fatec Itu, ao longo dos últimos cinco anos. No entanto, como os trabalhos não estão digitalizados e em função do momento de pandemia que vivenciamos, oprojeto sofreu algumas adequações. Ofato denãopodermos utilizarabiblioteca da Fatec Itu presencialmente, nos levou a decisão de realizarmos levantamento de projetos já realizados, com enfoque na área ambiental, junto aos coordenadores de Curso e Direção, como também, projetos realizados pela Secretaria de Meio Ambiente do Município de Itu, já que a Fatec Itu possui parceria com a mesma.

Sobre o desenvolvimento do aplicativo, a primeira etapa diz respeito ao desenvolvimento de seu logotipo. O logotipo foi criado usando o programa de desenho vetorial, Corel Draw X6. Ele é composto por um quadrado da cor preto-passas com as arestas arredondadas da cor preta. Sua cor varia azul-elétrico e azul-carolina. Suas arestas também são arredondadas,tudoparadarumasensaçãodedinamismo,dealgomodernoearrojado,conforme Figura 1.

Figura 1 - Logotipo do aplicativo

Fonte: Próprios autores (2024).

O site Adobe Color foi utilizado para gerar a paleta de cores, que será utilizada pelo aplicativo. A cor azul-carolina (#01A4ED), presente no logotipo, foi reutilizada na paleta de cores como cor de base. A Figura 2 é uma representação da paleta de cores parcial.

Figura 2 - Círculo cromático e cores geradas pelo site Adobe Color

Próprios autores (2024).

Fonte:

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A prototipação do aplicativo foi feita na plataforma Figma. Por meio desta prototipação foi possível criar as interfaces das telas do aplicativo, assim como obter a percepção de como será a experiência do usuário. As telas são separadas em camadas, sendo possível fazer a interação entre elas, sem a necessidade de programação, o que torna o desenvolvimento do protótipo muito mais rápido do que se fosse feito diretamente pelo framework Flutter. É possível exportar o template gerado no Figma posteriormente para o Flutter, por meio de um plugin, o que, novamente poupa tempo no desenvolvimento e permite ao desenvolvedor focar em outros pontos do aplicativo. É possível criar também, um guia de estilo, com as cores principais geradas pelo Adobe Color, cores neutras (utilizadas para cor do texto por exemplo) e cores de utilidade (utilizadas para avisos de sucesso ou erro). A Figura 3 evidencia a paleta com todas as cores que serão utilizadas dentro do aplicativo.

Figura 3 - Paleta de cores completa

Fonte: Próprios autores (2024).

Durante o período de prototipação, foi realizado um estudo da interface de usuário dos aplicativos mais utilizados atualmente, conforme Koetsier (2021) relata em seu artigo. Entre eles estão: Whatsapp, Facebook, Messenger e Instagram. Por meio deste estudo, foram sendo feitas modificações nodesign daUI,com aintençãodeexibiroconteúdodaformamais simples possível. Durante esta fase, foi descartada a necessidade de login para obter acesso às informações do aplicativo. Isso pode ser visto como uma barreira por pessoas que possuem algum tipo de dificuldade em relação à tecnologia. A Figura 4 mostra a evolução do layout da

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tela inicial conforme o estudo avançava. Vale destacar que a paleta de cores final ainda não estava em uso.

NaFigura5, observa-seo layout final criadodentro do Figma.Estefoiolayout utilizado durante o desenvolvimento do aplicativo. Nela estão presentes a tela inicial, a tela de detalhes do projeto e a tela de configurações. As cores presentes representam as cores da paleta de cores.

Figura 4- Evolução da interface da tela inicial
Fonte: Próprios autores (2024).
Figura 5- Interface final do aplicativo
Fonte: Próprios autores (2024).

e

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A criação do front-end do aplicativo (parte do aplicativo com a qual o usuário interage) foi feito no framework de desenvolvimento mobile do Google, o Flutter. Vale ressaltar que framework se refere a um conjunto de componentes e bibliotecas que são utilizadas na criação da base do aplicativo, assim o desenvolvedor pode focar no desenvolvimento da solução do problema. O Flutter permite criar aplicativos nativos, ou seja, específicos para um determinado sistema operacional utilizando a linguagem Dart. Desta forma, é possível criar um sistema simples e eficiente em um curto espaço de tempo.

O back-end, parte do aplicativo que o usuário não vê, foi feito em Hypertext

Preprocessor (PHP), que cuida da parte do processamento de dados. O PHP possui mais de 20 anos, sendo amplamente utilizada no mercado. Trata-se de uma linguagem de programação totalmente gratuita, que possui diversas frameworks como Laravel e Zend. Para o armazenamento de dados, foi utilizado o Gerenciador de Banco de Dados (SGBD) MySQL. Ele é totalmente gratuito e sua sintaxe é parecida com a do Structured Query Language Server.

Foram criadas apenas duas tabelas: “projeto” e “imagem”. Enquanto as informações referentes a cada projeto ficam armazenadas na tabela “projeto”, as informações relacionadas às imagens pertencentes a cada projeto ficam armazenadas na tabela “imagem”. Para que o aplicativo consiga obter dados de uma forma dinâmica, ou seja, sem que o desenvolvedor precise inserir manualmente tais dados a cada atualização da base de dados, ele faz uma requisição HTTP a uma API REST.

De acordo com Antunes (2019), uma Interface de Programação de Aplicativos (API) pode ser definida como padrões de programação e conjuntos de instruções, que tem como principalobjetivoproverinformaçõesqueserãoutilizadosporumaaplicação. ATOTVS(2020) estabelece que a arquitetura Transferência de Estado Representacional (REST) permite a comunicação entre aplicações por meio de requisições HTTP. Para que os dados sejam obtidos, é necessário estabelecer uma conexão TCP/IP com um servidor. Em seguida, a requisição é enviada.Oservidorinterpretaestarequisição,faz umabuscanobancodedadose,caso encontre os dados solicitados, retorna uma resposta em um formato específico. No caso, o formato escolhido para o projeto foi o JSON, que, segundo Antunes (2019), é considerado o formato padrão do mercado devido à sua compatibilidade com um grande número de frameworks e linguagens de programação. Como se trata de um projeto de pequeno porte, optou-se por hospedar o banco de dados em um servidor da empresa Webhost000. A programação feita em PHP faz a ponte entre o aplicativo e o banco de dados, recebendo as requisições HTTP e permitindo exportar os dados no padrão especificado.

O Aplicativo Pluvo funciona da seguinte maneira: ao acessar a área principal, é feita uma requisição ao servidor para que retorne todos os dados dos 20 primeiros projetos

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cadastrados na tabela projeto no formato JSON. Esses dados são interpretados pelo aplicativo e apenas alguns dados são exibidos na interface. Caso o usuário deseje consultar detalhes a respeito de um projeto, não será feita outra requisição, pois os dados necessários para o carregamento da página já foram obtidos na consulta anterior, eles apenas não foram exibidos. Após o carregamento da área de detalhes, é feita uma nova requisição referente às imagens pertencentes ao projeto. Caso o projeto possua imagens, elas serão exibidas em uma área específica.

5 Desenvolvimento do Website

Durante o desenvolvimento do projeto, surgiram os seguintes dilemas: quem irá fazer o cadastro dos projetos na base de dados após término do trabalho? Como será feito este cadastramento? Caso estes problemas não fossem resolvidos, este projeto provavelmente teria o mesmo destino dos outros que em sua base estão cadastrados. Para solucionar este problema, um website foi desenvolvido em PHP para possibilitar o cadastro de projetos por instituições parceiras. Isto possibilita que a base de dados continue sendo alimentada sem depender dos autores deste projeto. Sua hospedagem foi feita no mesmo local do backend, sendo possível reaproveitar parte da estrutura desenvolvida para o mesmo.

Figura 6 - Interface do Website

Fonte: Próprios autores (2024).

Este site possui algumas informações relacionadas ao objetivo e metodologia, com o intuito de ser o mais transparente possível com as instituições que realizarão o cadastro de seus projetos. Caso seja necessário algum tipo de suporte, o site também conta com um formulário

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de contato para possibilitar a resolução do problema de forma simples e rápida. Com esta abordagem é possível que a própria instituição faça modificações ou até mesmo exclua um projeto cadastrado por ela da base de dados, conforme é possível observar na Figura 6.

6 Testes com o público-alvo

Os testes foram realizados com 11 usuários, com idades entre 14 e 72 anos. Os usuários instalaram o aplicativo por meio de um arquivo .apk. Vale ressaltar que este não é o método padrão para instalação de apps em um dispositivo Android e só foi utilizado durante este teste. Futuramente, os usuários poderão baixar, por meio de um link na loja do Google, a Play Store

O tempo de utilização de cada usuário foi de aproximadamente 15 minutos, após o qual, foi solicitado que respondessem a um questionário com 8 perguntas, sendo 3 alternativas e 5 dissertativas. A primeira questão foi referente ao sexo dos usuários. Neste caso, 64% se declararam do sexo masculino e 36% do sexo feminino.

A segunda questão teve como objetivo verificar se o usuário conseguiu identificar o tema em comum dos projetos listados no menu principal. Dos 11, Apenas 1 usuário não conseguiu acertar.

A terceira questão procurou saber se o usuário foi estimulado a colocar o projeto em prática após a leitura. 10 usuários (91%) responderam que sim e apenas 1 respondeu que não.

A quarta questão foi referente a uma função do aplicativo que transforma o texto em fala (Text to Speech/TTS) 5 usuários (45,5%) utilizaram a função e gostaram. Os demais (54,5%) não a utilizaram, e porquanto, não opinaram a respeito.

Figura 7 – Avaliação dos usuários quanto à interface (em %)

Fonte: Próprios autores (2024).

A Figura 7 destaca as respostas dos usuários sobre a quinta questão, que teve como objetivo saber a opinião deles a respeito da interface do aplicativo. “Excelente” foi escolhido

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por 63,6% dos usuários, enquanto “ótima” ficou com 36,4%. Nenhum a considerou ruim ou regular.

A sexta questão teve como objetivo saber a opinião dos usuários sobre as cores da interface. Para 54,4% elas foram consideradas excelentes; para 36,4% ótima e para 9,1% boa, conforme ilustram os dados da Figura 8.

Figura 8 – Avaliação dos usuários quanto às cores da interface (em %)

Fonte: Próprios autores (2024).

A sétima questão abriu a possibilidade de os usuários fazerem sugestões que pudessem agregar funções ao aplicativo. Neste caso, apenas um deles sugeriu um sistema de likes como forma de identificar os melhores projetos.

A oitava e última questão teve como objetivo saber se os usuários indicariam o aplicativo para alguém, caso o mesmo estivesse disponível para download. Todos os usuários responderam que indicariam o aplicativo se pudessem.

Por meio deste teste foi possível determinar que apesar de algumas falhas, o aplicativo foi bem recebido pelos usuários e cumpriu seu objetivo. A função referente ao Serviço de Suporte Técnico (TSS) deverá ser melhorada, tanto em funcionamento, quanto em interface.

7 Considerações Finais

Esta pesquisa discorreu sobre a importância do acesso e conhecimento dos projetos socioambientais que são desenvolvidos dentro de uma Instituição de Ensino Superior Tecnológica, bem como, secretarias de meio ambiente e sociedade civil, a partir do desenvolvimento de um aplicativo que pudesse servir como “incubador de projetos socioambientais”. 0

Excelente

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Verificou-se que essa iniciativa é capaz de favorecer não apenas a preservação do meio ambiente, mas também a melhoria da qualidade de vida das comunidades e a promoção de uma economia mais eficiente e responsável, já que ter acesso a projetos socioambientais, sobretudo projetos que contemplem as tecnologias socioambientais, podem provocar movimentos positivos na construção de comunidades mais sustentáveis, ao replicá-los em diferentes localidades.

Outro aspecto que merece destaque, diz respeito ao uso do próprio aplicativo pela comunidade em geral, pois com a evolução tecnológica e as demandas dos usuários por experiências de consumo significativas e de fácil interação, destaca-se a necessidade de as organizações adotarem projetos de UX Design em seus produtos e serviços. A UX Experience, ao projetar a experiência do usuário, atende às necessidades dos consumidores, considerando aspectos físicos e emocionais na relação produto-usuário.

A busca pela sustentabilidade implica em adotar práticas que sejam ecologicamente corretas e socialmente justas, contribuindo para um equilíbrio entre o crescimento econômico e o cuidado com o meio ambiente. Nesse sentido, a parceria entre universidades, governos, empresas e a sociedade em geral é fundamental para integrar a sustentabilidade nas instituições de ensino e promover a disseminação de tecnologias sustentáveis. A conscientização e a adoção de práticas ambientalmente responsáveis permitem avanços significativos na preservação do meio ambiente e na promoção do desenvolvimento sustentável, refletindo um compromisso com as atuais e futuras gerações.

Referências

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V@rvItu – Revista de Ciência, Tecnologia e Cultura da FATEC Itu

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ESCOPO DA REVISTA V@RVITU

V@rvItu, Revista de Ciência, Tecnologia e Cultura da Fatec Itu almeja ser um veículo difusor de ideias que favoreçam a reflexão sobre o papel das tecnologias em seus variados campos de aplicação. Abre-se à publicação de textos diversos – artigos científicos, resenhas, e relatos de experiência/pesquisa – visando a divulgação do conhecimento produzido. O seu caráter multidisciplinar se estende além do viés tecnológico, havendo espaço para discussões relativas às diferentes áreas do saber, de maneira que ciência, tecnologia e cultura caminham juntas neste periódico.

POLÍTICA EDITORIAL

V@rvItu - Revista de Ciência, Tecnologia e Cultura da Fatec Itu terá publicação eletrônica anual e abrangência multidisciplinar, com a possibilidade de edição de suplementos e números temáticos. O número de Chamadas para publicação é indeterminado, devendo ser um número suficiente para atingir uma quantidade razoável de artigos/resenhas para compor uma Edição.

Os trabalhos enviados devem ser originais e inéditos, destinados exclusivamente à V@rvItu. Antes de serem enviados para avaliação pelo Conselho Editorial e consultores ad hoc, os manuscritos passarão por uma análise preliminar (triagem) em que serão observados os seguintes aspectos: escopo do trabalho; formatação; apresentação do texto segundo as Normas da Revista; adequação das citações às referências bibliográficas e qualidade das tabelas e figuras.

Passada a fase inicial, os manuscritos serão encaminhados, sem identificação da autoria, a dois Pareceristas, que analisarão aspectos como: coerência metodológica; significância dos resultados obtidos; consistência na conclusão, entre outros traços qualitativos do artigo a ser publicado. Com a aplicação desses parâmetros, se o número de trabalhos aprovados exceder a capacidade anual de publicação, os manuscritos serão publicados por ordem de chegada.

O Parecerista deverá ser consultado previamente (por e-mail) quanto à possibilidade de avaliação do manuscrito, tendo o prazo de até três dias para manifestar sua disponibilidade. Em caso de impossibilidade, poderá indicar outro especialista da área. Decorrido os três dias e ele não se manifestar, outro avaliador será consultado.

Os pareceres serão emitidos sem que o Avaliador tenha informação da autoria (AVALIAÇÃO CEGA). Em caso de pareceres divergentes, um terceiro Parecerista deverá ser consultado. Os autores não serão informados sobre os Pareceristas e ao Parecer emitido não caberá recurso.

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NORMAS DE SUBMISSÃO - INSTRUÇÕES AOS AUTORES

Normas gerais

Os trabalhos (artigo, resenha e relato de experiência/pesquisa) devem ser enviados digitalmente, com a identificação do(s) autor(es). Junto com o manuscrito, o(s) autor(es) deve(m) remeter o Formulário de Identificação do(s) Autor(es), que acompanha estas normas de submissão.

Os manuscritos submetidos à publicação devem ser originais e inéditos, redigidos em língua portuguesa ou espanhola, conter resumo em português, abstract e resumen

A correção ortográfica e gramatical de todas as partes do manuscrito, incluindo a língua estrangeira, é de responsabilidade do(s) autor(es), pois não haverá correção textual dos manuscritos, apenas avaliação técnica.

O nome do arquivo referente ao manuscrito submetido deverá obedecer ao seguinte formato: sobrenome do primeiro autor_instituição_ano_semestre, grafados sem acentos gráficos ou cedilha. Exemplo: <goncalves_fatecitu_2016_2>. Este mesmo nome deverá ser indicado no campo apropriado do Formulário de Identificação do Autor. Normas específicas para a redação/formatação do manuscrito

1 Artigo

Título do Artigo: centralizado, Times New Roman 14, em negrito.

Nome(s) do(s) autor(es): escrito(s) por extenso (sem abreviações), dois espaços de 1,5 abaixo do título, alinhado(s) na margem direita, Times New Roman 12, negrito, seguido(s) de nota de rodapé numerada com algarismo arábico, na qual deve constar a afiliação profissional e e-mail. Neste caso, utilizar uma linha para cada nome. Os rodapés devem ser grafados em Times New Roman 10. No Formulário de Identificação do(s) autor(es) deve constar o endereço físico completo da Instituição para correspondência, e o endereço eletrônico (e-mail) de todos os autores nos campos específicos.

Resumo: todo artigo deve apresentar um resumo informativo em português e sua versão em inglês (Abstract) e espanhol (Resumen). A palavra Resumo negritada deve vir seguida de ponto, com apenas a 1ª letra maiúscula (Resumo.). O resumo deve variar entre 150 palavras (mínimo) e 250 palavras (máximo) num único parágrafo. Deve vir em letra Times New Roman 11, ter espaçamento simples entre as linhas e ser seguido de três a cinco palavras-chave, separadas por ponto-e-vírgula, permitindo-se palavras compostas. O mesmo se aplica ao Resumen/Abstract.

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Abstract/Resumen: os resumos em inglês e em espanhol são obrigatórios e devem seguir as mesmas orientações do item resumo, incluindo palavras-chave em inglês e em espanhol. O título do manuscrito vem logo após a palavra Abstract/Resumen, negritado no respectivo idioma estrangeiro, seguido de ponto final, após o qual segue o texto do Abstract/Resumen propriamente dito e as palavras-chave.

Os manuscritos devem ter o mínimo de 10 e o máximo de 25 páginas numeradas (a numeração deve vir no rodapé, na margem inferior direita). Este limite compreende todo o texto a ser submetido: o corpo do texto propriamente dito, o título, os resumos em português e em língua estrangeira, as palavras-chave em português e em língua estrangeira, e as referências bibliográficas. Devem ser encaminhados apenas na versão eletrônica, em formato compatível com Word para Windows.

Os textos devem ser redigidos em página formato A4, numa única coluna, com margem superior de 3,0 cm; inferior 2,0 cm; esquerda 3,0 cm; e direita 2,0 cm. A fonte deve ser Times New Roman 12, também usada para título e subtítulo de seção, que devem aparecer negritados e numerados. O espaçamento entre parágrafos é igual ao espaçamento entre as linhas (1,5), sem espaço antes ou depois do parágrafo. Já entre tópicos e subtópicos serão 2 espaços de 1,5. Tópicos e subtópicos em negrito, numerados sequencialmente, sem ponto (conforme a ABNT), apenas com a 1ª letra maiúscula, alinhados à esquerda sem parágrafo. O adentramento da primeira linha do parágrafo deve ser de uma tabulação (1,25 cm).

Os manuscritos devem ser organizados com base no modelo geral das publicações científicas, contendo introdução (apresentando problematização, hipóteses, justificativa, objetivos, metodologia e estrutura do artigo), desenvolvimento (apresentando revisão de literatura, resultados e discussões), considerações finais e referências, admitindo-se ainda o acréscimo ou a supressão de itens desde que não comprometa a sequência lógica do texto. Anexos, apêndices e dados brutos não são desejáveis.

Elementos gráficos, quadros e tabelas

Os artigos podem conter elementos gráficos (gráficos, figuras e ilustrações), além de quadros e tabelas. Os elementos gráficos, assim como os quadros e tabelas, devem obrigatoriamente ser referidos no corpo do texto e numerados consecutivamente em algarismos arábicos, travessão e encabeçados por suas respectivas legendas na parte superior (fonte Times New Roman 11), conforme as normas da ABNT (NBR 14724 de abril de 2011). A indicação da fonte de consulta, no caso de dados secundários, se houver, deverá aparecer na parte inferior

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do elemento gráfico, quadro ou tabela (fonte Times New Roman 10), como demonstrado a seguir:

Gráfico 1 – Carga tributária bruta em % do PIB – Brasil 1988 – 2012

Fonte: IPEA (2013, p. 35).

Figura 1 – Exemplo de material utilizado na alfabetização em LIBRAS

Fonte: CSS (2009).

Tabela 1 - Carga tributária por base de incidência – Brasil 1991 – 2012

Fonte: KPMG apud Khair (2013, p. 20).

Camada de Entrada

Camada de Saída

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Quadro 1 – Tipos de camadas de uma RNA

É a camada responsável pelo recebimento de dados, sinais, característica ou medições advindas do meio externo, sendo que tais entradas (amostra ou padrões) são geralmente normalizadas em relação às faixas de variações dinâmicas produzidas pelas funções de ativação. Esta normalização implica numa melhor precisão numérica frente às operações matemáticas realizadas pela rede.

Esta camada é também constituída de neurônios, sendo responsável pela produção e apresentação dos resultados finais da rede, os quais são advindos dos processamentos efetuados pelos neurônios das camadas anteriores.

Fonte: Silva; Spatti; Flauzino (2010).

O autor é responsável pelo seu manuscrito no que se refere ao teor, à formatação e à revisão textual, bem como pela qualidade das figuras e demais elementos gráficos. Manuscritos com figuras de qualidade inferior a VGA serão rejeitados. Fotos monocromáticas e coloridas são admitidas, desde que nítidas e que permitam impressão com qualidade.

Elaboração de citações

As citações (diretas ou indiretas) devem estar de acordo com o padrão da ABNT (NBR 10520/2023). Na citação indireta, caso o nome do autor não esteja citado no texto, deverão ser acrescentados ao final da referida citação, entre parênteses, o sobrenome do autor (com a 1ª letra maiúscula), seguido de vírgula, espaçamento e o ano da publicação. Ex: Neste caso, dizse que... (Silva, 2014). Caso o nome do autor esteja citado no texto, deverá ser acrescentado o ano da publicação entre parênteses. Ex: Neste sentido, Silva (2014) chama atenção para ...

Toda citação literal de até três linhas deve ser transcrita diretamente no texto, mantendo a grafia, o idioma e a pontuação originais, entre aspas e inseridas no parágrafo. Citações diretas longas (superiores a 3 linhas) deverão estar em parágrafo isolado de espaço simples, com recuo de margem à esquerda de 4 centímetros, fonte Times New Roman 10, sem aspas. Nestes casos, a indicação da(s) página(s) é obrigatória. Nas citações, as referências devem vir após a citação literal entreparênteses, com o(s)sobrenome(s)do(s)autor(es) com a1ª letra maiúscula, seguido de vírgula, espaçamento e o ano de publicação, também seguido de vírgula, e a(s) página(s), precedida(s) de p., com espaçamento. Ex: (Silva, 1996, p. 220).

As referências bibliográficas devem aparecer no final do texto (e não em nota de rodapé), em uma seção própria, intitulada “Referências”. Para o rodapé devem ficar apenas as notas explicativas. As citações de diversas obras de um mesmo autor, publicadas no mesmo ano, deverão ser discriminadas por letras em ordem alfabética, após a data, sem espaçamento (Santos, 1996a; 1996b). Quando a obra tiver dois autores, ambos deverão ser indicados, ligados

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por ponto e vírgula (Santos; Silveira, 2001). No caso de mais de três autores indica-se o primeiro, seguido da expressão et al. (Santos et al., 1995).

Elaboração das referências

As citações que aparecem ao longo do texto devem ser listadas (referenciadas) em ordem alfabética na seção Referências no final do manuscrito e devem obedecer ao padrão da ABNT ((NBR 10520/2023). Não serão aceitos trabalhos com a seção Bibliografia Consultada, pois isso é um pressuposto obrigatório para se redigir.

2 Relato de Experiência ou Pesquisa

As normas para elaboração de Relato de Experiência ou Pesquisa são as mesmas descritas para Artigo.

3 Resenha de livro

O formato da Resenha deve ser o seguinte: título da resenha sobre a obra a que se refere, em Times New Roman 14, centralizado, em negrito. Dois espaços de 1,5 abaixo do título, nome do(a) autor(a) alinhado à direita, com nota de rodapé indicando a afiliação profissional a qual pertence, com respectiva titulação, cargo e e-mail. Dois espaços de 1,5 abaixo do nome do autor inserir a referência bibliográfica completa da obra, de acordo com a ABNT ((NBR 10520/2023), em Times New Roman 12, justificado.

Em seguida, dois espaços de 1,5 abaixo, iniciar em parágrafo o texto da resenha propriamente dita, em Times New Roman 12, espaço entrelinhas de 1,5. A Resenha deve se limitar a cinco páginas (no máximo) e a sua estruturação é livre, mas de maneira a permitir um fluxo narrativo coerente e coeso.

Observações importantes

1 Em todas as etapas do trâmite dos manuscritos, trabalhos com vários autores devem necessariamente passar pelo crivo do autor/coautor mais experiente, seja ele líder do grupo de pesquisa, seja orientador de projetos ou de TCC.

2 Os autores deverão reenviar o manuscrito revisado ao editor (de acordo com as sugestões dos pareceristas) no menor prazo possível. Caso o artigo seja reenviado desformatado, o editor poderá recusá-lo para publicação ou devolvê-lo para as devidas correções, desde que haja tempo hábil para ser incluído no número em curso.

3 Os manuscritos aceitos não serão devolvidos.

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