Jornal UFG 92

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JORNAL ANO XI – Nº 92 NOV/DEZ 2017

Ingrid Costa

Inteligência Artificial é o futuro da humanidade?

Ramo da ciência da computação cria métodos que possuam ou multipliquem a capacidade de raciocínio do ser humano em resolver problemas. Confira nesta edição os programas desenvolvidos pela UFG que utilizam desta tecnologia em favor da comunidade p. 8 e 9

Em entrevista, reitor Orlando Amaral faz um balanço de sua gestão e fala dos desafios futuros das universidades p. 3

Pesquisa analisa expansão da região metropolitana a partir dos programas de moradia p. 11

Entenda as cotas para pessoas com deficiência e veja as ações para garantir a permanência desses estudantes p. 12


Universidade

2 EDITORIAL

Inteligência humana

Luiz Felipe Fernandes*

A

s obras cinematográficas são bem-sucedidas no papel de representar o devir de uma sociedade permeada pelos avanços tecnológicos. A ficção científica explora desde cenários apocalípticos em enredos que vislumbram uma espécie de rebelião das máquinas, com robôs adquirindo cognição e sentimento, até paraísos quase oníricos em que a humanidade se satisfaz plenamente de aparatos tecnológicos sempre prontos a servi-la.

Essa possibilidade dual tão comum nos filmes parece ficar ainda mais verossímil quando a está associada ao conceito de Inteligência Artificial - esse sim calcado na realidade objetiva, consolidado como campo de estudo acadêmico e que possui grande e variado potencial de aplicação prática para a melhoria da vida de todos nós. Os repórteres Vinicius Paiva e Luciana Gomides foram em busca de pesquisas baseadas em Inteligência Artificial desenvolvidas na UFG e descobriram importantes projetos relacionados às áreas da saúde, da acessibilidade e do marketing, frutos da inteligência humana que constitui a Universidade. Pesquisas como as que destacamos nesta edição do Jornal UFG só são possíveis com investimento e, nesse aspecto, o cenário em todo o país é de retrocesso.

Artigo do professor José Alexandre Felizola Diniz Filho aborda os impactos dos cortes de recursos que atingem o fomento à pesquisa científica no Brasil. Importante destacar que a UFG participou ativamente do Dia C da Ciência, no último dia 25 de outubro, para sensibilizar a sociedade sobre a importância do conhecimento gerado pelas universidades. Os cortes no orçamento dos últimos anos foram uma das principais dificuldades enfrentadas pela gestão 2014-2017 da UFG. O assunto é abordado na entrevista desta última edição do ano, na qual o reitor Orlando Amaral faz um balanço de seu mandato, dos desafios e dos avanços nos quatro anos em que esteve à frente da Universidade. Apesar das dificuldades, o momento, segundo o reitor, é de engajamento na luta em defesa da UFG. E isso é papel de todos nós! *Coordenador de Jornalismo da ASCOM

Vinícius Paiva e Luciana Gomides são bolsistas de Jornalismo da Assessoria de Comunicação da UFG

Erramos Na edição 91, erramos no nome da entrevistada na matéria “Protagonismo para as mulheres negras”, na página 10. A integrante do Núcleo de Pesquisa Pindoba se chama Elisângela Gomes e não Elisângela Oliveira.

COMUNIDADE PERGUNTA Como são aproveitadas as vagas de cotas nas quais não há mais candidatos inscritos ?

RI-PPI-cD → RI-cD → RI-PPI → RI → → RSPPI-cD → RS-cD → RS-PPI → RS → AC

Pergunta enviada via “Fale Conosco” A UFG tem por objetivo principal o preenchimento de todas as vagas reservadas para os optantes pelas cotas e assim, no caso de haver vaga numa determinada cota e não ter candidatos que optaram por ela, a UFG convoca candidatos de outras cotas. A questão que se coloca é: qual a prioridade de candidatos a serem chamados para o preenchimento dessas vagas? Veja no Jornal UFG online tabela completa

RI-PPI, caso ainda não seja suficiente, serão chamados candidatos da cota RI, e assim por diante. O esquema abaixo mostra como serão convocados os candidatos:

Após várias discussões sobre o assunto, a Câmara Superior de Graduação decidiu da seguinte forma: caso sobre vaga na cota RI-PPI-cD, isto é, todos os candidatos optantes pela cota foram convocados, serão chamados candidatos da cota RI-cD, caso ainda não seja suficiente serão convocados os candidatos da cota

RI – renda inferior ou igual a 1,5 salário mínimo per capita PPI – preto, pardo e indígena cD – com deficiência RS – renda superior a 1,5 salário mínimo per capita AC – ampla concorrência

Veja que, caso exista uma vaga das cotas sem candidatos convocados, só após esgotar todas as possibilidades de candidatos cotistas é que a vaga poderá ser ocupada por candidato da Ampla Concorrência (AC). Gisele Gusmão, Pró-reitora de Graduação da UFG

Direto do Instagram @ufg_oficial

JORNAL

Publicação da Assessoria de Comunicação Universidade Federal de Goiás ANO XI – Nº 92– NOV/DEZ 2017 Reitor: Orlando Afonso Valle do Amaral; Vice-Reitor: Manoel Rodrigues Chaves; Pró-Reitora de Graduação: Gisele Gusmão; Pró-Reitor de Pós-Graduação: Jesiel Freitas Carvalho; Pró-Reitora de Pesquisa e Inovação: Maria Clorinda Soares Fioravanti; Pró-Reitora de Extensão e Cultura: Giselle Ferreira Ottoni Cândido; Pró-Reitor de Administração e Finanças: Carlito Lariucci; Pró-Reitor de Desenvolvimento Institucional e Recursos Humanos: Geci José Pereira da Silva; Pró-Reitor de Assuntos da Comunidade Universitária: Elson Ferreira de Morais. – Jornal UFG – Coordenador de Jornalismo: Luiz Felipe Fernandes; Editora: Kharen Stecca; Editora-Assistente: Angélica Queiroz; Conselho editorial: Angelita Pereira de Lima, Cleomar Rocha, Estael de Lima Gonçalves (Jataí), Luís Maurício Bini, Pablo Fabião Lisboa, Reinaldo Gonçalves Nogueira, Silvana Coleta Santos Pereira, Thiago Jabur (Catalão) e Weberson Dias (Cidade de Goiás); Suplente: Mariana Pires de Campos Telles; Projeto gráfico : Reuben Lago; Editoração: Frede Aldama; Fotografia: Carlos Siqueira; Reportagem: Angélica Queiroz, Carolina Melo e Patrícia da Veiga; Bolsistas: Adriana Silva e Ana Fortunato (Fotografia), Luciana Gomides e Vinicius Paiva (Jornalismo); Impressão: Centro Editorial e Gráfico (Cegraf ) da UFG; Revisão: Bruna Mundim, Fabiene Azevedo e Maria Lucia Kons; Tiragem: 6.000 exemplares ASCOM Reitoria da UFG – Câmpus Samambaia Caixa Postal: 131 – CEP 74001-970 – Goiânia – GO Tel.: (62) 3521-1310 /3521-1311 www.ufg.br – www.ascom.ufg.br jornalismo.ascom@ufg.br

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Defesa da UFG é papel de todos Kharen Stecca

R

esponsável pela gestão da Universidade Federal de Goiás nos últimos quatro anos, o reitor Orlando Afonso Valle do Amaral teve o desafio de assumir uma universidade em plena consolidação da expansão do Plano de Reestruturação das Universidades (Reuni) em meio a uma crise orçamentária que se agravou paulatinamente desde 2014. Com a necessidade de cortar gastos, o professor explica como se trabalhou para manter a universidade em pleno funcionamento e ainda ser capaz de lidar com todas as mudanças ocorrida no período, como o novo perfil dos estudantes ingressos, mais igualitário, mas também exigindo maior assistência para permanência na universidade, problemas de segurança dentro dos câmpus e até a ameaça da cobrança de mensalidades e privatizações. Para Orlando Amaral, mesmo a crise não será capaz de destruir o projeto das universidades públicas: “o conjunto das universidades brasileiras é tão sólido e enraizado que temos uma força que nos dá alento e otimismo”. Veja a entrevista ao Jornal UFG. Em dezembro termina seu mandato como reitor. Que ações o senhor considera merecerem mais destaque em sua gestão?

Apesar de todas as dificuldades enfrentadas nesses quase quatro anos de gestão, creio que o balanço é positivo. Contrariando visões mais alarmistas, a universidade não parou e continuamos desenvolvendo (com algumas restrições) nossas atividades fins, cumprindo nosso papel de formar pessoas, desenvolver pesquisas e promover a inovação. Sediamos e promovemos centenas de eventos científicos e culturais. Avançamos no processo de consolidação dos novos cursos criados durante o Reuni. As avaliações dos cursos de graduação e pós-graduação oferecidos pela UFG, realizadas pelo Inep e pela Capes, evidenciam a melhoria da qualidade dos nossos cursos. Implantamos o novo Estatuto e avançamos muito na implantação do Sistema Integrado de Gestão Universitária (SIG). A partir do dia 20/09/17, todos os processos abertos na UFG passaram a tramitar de forma eletrônica, evitando a impressão em papel, por meio do Sistema Eletrônico de Informações (SEI). Aprovamos o contrato entre a UFG e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), para a gestão compartilhada do Hospital das Clínicas da UFG. Aprovamos o desmembramento da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação, na Pró-Reitoria de Pós-Graduação e na Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação, dando mais ferramentas de gestão à atividade de pesquisa e inovação da UFG. Aprovamos diversas resoluções importantes, como a Resolução nº 12 de 2017 que tipifica ações que caracterizem assédio moral e sexual e a resolução n° 14 de 2015 que autoriza a utilização do nome social nos documentos internos da UFG. No que se refere à inclusão, avançamos muito. Hoje o perfil do estudante que acessa a universidade é muito diferente do estudante de alguns anos atrás e reflete mais o perfil da sociedade brasileira. Diversas políticas também foram construídas nessa gestão, como a Política de Segurança e a de Acessibilidade da UFG. Várias obras importantes foram concluídas

e/ou estão em fase final de execução. Finalmente, empenhamos integralmente os recursos para o novo Hospital das Clínicas, que se constituirá em um dos maiores Hospitais Universitários do Brasil. Há algo que não foi feito e que gostaria que o próximo reitor tivesse como meta?

A comunidade universitária acompanhou as dificuldades, principalmente orçamentárias, mas não exclusivamente, que tivemos nesse mandato. A universidade vinha de um período de grande expansão nos anos de 2008 a 2013, com certa abundância de recursos que deu suporte a expansão ocorrida nesse período. De 2014 a 2017 o cenário orçamentário mudou radicalmente: os orçamentos anuais não foram reajustados adequadamente e ainda foram contingenciados. No que se refere aos recursos de capital, que são utilizados para construção e compra de equipamentos, a título de exemplo, os recursos alocados em 2017 corresponderam a, aproximadamente, 25% do valor alocado em 2015. Por isso, ficamos limitados em nossa capacidade de dar continuidade ao processo de melhoria da infraestrutura da instituição. No que se refere às despesas de custeio, infelizmente, nossos recursos são insuficientes para honrar integralmente os compromissos da universidade com fornecedores, empreiteiras e empresas terceirizadas. Em termos de estrutura física, gostaríamos de ter construído um novo prédio para a reitoria, uma vez que a demanda por informações e serviços oferecidos pelos órgãos nele instalados ampliaram muito. Também não temos um teatro para atendermos eventos de médio porte, para 700 a mil pessoas. Gostaríamos de ter concluído as obras do novo Câmpus de Aparecida, nos transferindo para as novas instalações, o que só ocorrerá em 2018. Gostaríamos de ter ampliado os recursos destinados à Assistência Estudantil, e atendido a um contingente maior de estudantes em vulnerabilidade econômica e/ou com deficiência. Fica, portanto, uma certa frustração por não termos tido condições objetivas para realizar outras obras e ações necessárias para melhorar a estruturação da UFG. Será necessário avançar mais nas ações e projetos de apoio acadêmico e pedagógico aos estudantes que apresentam lacuna em sua formação anterior e que encontram dificuldades para prosseguir nos cursos. Do ponto de vista da qualificação dos cursos oferecidos pela UFG, avançamos bastante mas essa é uma tarefa permanente de todos nós e de todas as gestões. Destaque-se que, na última avaliação da Capes, tivemos o primeiro curso da UFG avaliado com conceito 7, a Pós-Graduação em Ecologia e Evolução. Gostaríamos de ter avançado ainda mais na cooperação internacional, pois maior inserção da UFG no cenário internacional é essencial para melhorar os conceitos de nossos cursos e programas e para qualificar ainda mais as atividades de pesquisa desenvolvidas pela UFG. A partir da implementação do projeto institucional de cooperação internacional da UFG, submetido à análise da Capes, teremos melhores condições de avançar nesse setor. Em 2017 a UFG viveu episódios di�íceis com relação à segurança. O que a UFG precisa tirar de lição desses episódios e melhorar?

A questão da segurança na UFG esteve presente em nossa pauta de preocupações e debates durante toda a gestão. Acredito que avançamos bastante nesse período mas, dada a complexidade do tema, há muito o que se fazer ainda, sendo um tema de permanente debate. Nessa área, também, o cenário de escassez de recursos nos impõe sérias limitações para a ampliação do quadro de servidores especializados e para a aquisição de equipamentos. A universidade está dentro de uma sociedade com muitas carências, extremamente desigual e injusta, não sendo, portanto, uma ilha. As áreas de nossos câmpus são muito extensas e abertas, o que agrega complexidade ao problema. Recebemos diariamente um grande fluxo de pessoas da comunidade universitária e da sociedade em geral que frequentam cursos, palestras e shows, utilizam serviços de cantinas, de instituições bancárias e correios. Queremos manter esse caráter de espaço aberto. Temos tentado adequar nossa equipe de segurança, com ações mais ostensivas, com rondas de moto e carro, instalação de câmeras e de uma central de videomonitoramento. Temos também debatido o tema com a comunidade, nos conselhos e em outras reuniões, para juntos definirmos as melhores abordagens para lidar com essa questão tão complexa. Estabelecemos também contatos com os órgãos de segurança (Polícia Federal e Polícia Militar) visando ao estabelecimento de protocolos claros para a ação dos agentes de segurança pública no interior de nossos câmpus, naquelas situações em que a presença de pessoas violentas, com vínculos com traficantes e assaltantes, possam representar um risco à integridade física das pessoas que convivem em nossos câmpus. A nossa perspectiva ao abordar este tema é a de garantir a preservação do espaço universitário como um espaço plural, aberto ao debate e à crítica, de respeito à diversidade e às manifestações democráticas e, sobretudo, um espaço de aprendizagem, de convivência, de respeito, no qual as pessoas se sintam seguras.

Entrevista Reitor Orlando Afonso Valle do Amaral

Carlos Siqueira

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Que mensagem deixa para os leitores do Jornal UFG?

A minha perspectiva diante dos inevitáveis problemas enfrentados por qualquer gestor, sobretudo no setor público, sempre foi a de procurar entender a real dimensão deles, evitando análises que os maximizem ou os minimizem. Problemas devem ser encarados de frente, sem subterfúgios, com determinação e alguma dose de otimismo. O pessimismo e visões apocalípticas não podem nortear a ação dos gestores. É fato que estamos vivenciando vários retrocessos nas políticas públicas, o que tem afetado de maneira muito dura as universidades federais, alvo de muitos ataques que tentam desqualificar o trabalho que é desenvolvido por essas instituições. Com a adoção da EC 95, que congela os gastos públicos pelo período de 20 anos, corremos sérios riscos de não serem alcançadas as metas do Plano Nacional de Educação (PNE). Por isso, cabe a todos nós, gestores, membros da comunidade universitária, professores, técnico-administrativos e estudantes, bem como suas entidades representativas, o engajamento na luta em defesa da UFG. Temos de aprimorar o nosso diálogo com a Sociedade, de forma especial com os nossos representantes no Congresso, visando ampliar os nossos canais de comunicação. É preciso divulgar de forma mais clara e objetiva tudo o que fazemos em prol do desenvolvimento do país, é preciso ampliar as parcerias na execução de projetos de interesse social e interagir mais com o setor produtivo, como forma de ter a sociedade ao nosso lado. Esses quase quatro anos à frente da gestão da UFG foram, para mim e para os componentes de nossa equipe, anos de muita dedicação, muito trabalho e de muita luta. Na medida de nossas possibilidades, encaramos e vencemos grandes desafios. Tudo o que conseguimos em termos de avanços se deve também à competência e compromisso de todos os membros da comunidade universitária. Que este seja também o espírito que prevaleça nos próximos anos, na gestão do professor Edward Madureira e da professora Sandramara Chaves, de forma que eles possam também enfrentar e superar todos os desafios da próxima gestão.

Confira mais na versão on line


Lícitas e ilícitas, as substâncias interferem no organismo humano, para bem ou para mal. Educar sobre o uso e olhar para a vulnerabilidade social é preciso! Vinícius Paiva

Confira os cinco videos da série Accumbens

“E

u comecei a beber e fumar com 12 anos, quando tive o meu primeiro ‘porre’! Fumei a primeira maconha aos 17. Aos 19, comecei a usar outras drogas, como a cocaína e o ácido, e até os 28 o uso foi quase diário”, afirmou um ex-dependente de drogas em entrevista à equipe do Programa de Educação Tutorial (PetBio) da Universidade Federal de Goiás (UFG). Segundo ele, no começo o uso era para diversão, mas com o passar do tempo, não havia mais diversão sem o uso. “Eu seria hipócrita em dizer que a droga só me trouxe lembranças ruins, muito pelo contrário, tenho muitas lembranças boas. Mas uma hora a conta vem, e mais cedo ou mais tarde o seu corpo vai cobrar essa conta”.

As drogas fazem parte da sociedade desde os seus primórdios. Na Grécia antiga, por exemplo, o ópio era utilizado como remédio. Em certos grupos sociais, o uso de drogas é visto como algo natural, pois em alguns momentos alivia dores e sofrimentos, e em outros produz estímulos e entusiasmos. Segundo o médico Elisaldo Carlini, “drogas são todas as substâncias que podem ter efeito sobre o corpo humano”, o que inclui os remédios utilizados medicinalmente. O Brasil classifica essas substâncias em lícitas, permitidas para consumo acima de 18 anos, como o álcool e o cigarro, e ilícitas, não permitidas no país, como a cocaína e o crack.

Percepções de dependentes

Para entender as percepções de 39 dependentes em tratamento contra o crack, o Núcleo de Estudos Qualitativos em Saúde e Enfermagem (Nequase) da Universidade Federal de Goiás (UFG) realizou um estudo num hospital psiquiátrico de Goiânia. Segundo a pesquisadora Sheila Pedrosa, o primeiro passo para entender essas pessoas é ampliar a própria percepção sobre o assunto e escutar o que eles têm a dizer. “Eu percebi que eles eram indivíduos comuns em busca de ajuda. Classificá-los somente como ‘usuários’ começou a me incomodar, pois isso desconsidera o fato de serem também pais, mães, trabalhadores e favorece que sejam rotulados por uma condição potencialmente transitória”. Dos participantes, 34 são homens e cinco são mulheres, com média de 32 anos. Quase metade relatou ter filhos e condição socioeconômica desfavorável, por não ter moradia ou emprego, por exemplo. Para os sujeitos da pesquisa, mesmo o crack não sendo a primeira escolha de uso, ela é a que mais impacta na vida de cada um deles, pois o uso é permeado por sofrimento e perdas

em diversas áreas da vida. “Eu já fiquei fumando na rua porque não tinha dinheiro para pagar o hotel entendeu? Eu tinha que fazer a opção: ou eu comprava mais droga, ou eu pagava o hotel... eu falei: eu vou comprar mais droga!”, conta um dependente em tratamento na época.

“Meu pai morreu, eu com sete anos, minha mãe criou seis filhos sozinha, então, até por isso, às vezes eu fui tendo essa curiosidade de usar esses certos tipos de droga” Dependente em tratamento

No geral, a curiosidade na juventude, a busca de um alívio para as decepções da vida e os conflitos familiares foram relatados como fatores para o consumo da droga. Contexto de violência e falta de apoio emocional e/ou financeiro na infância e adolescência também podem, muito provavelmente, tê-los deixado vulneráveis ao consumo, ao uso nocivo e à dependência, explica Sheila. Além disso, outros ainda relataram o desejo de matar o pai por presenciarem graves agressões contra suas mães: “Meu pai e minha mãe eram alcoólatras [...] meu pai já esfaqueou a minha mãe, já colocou a mão da minha mãe no fogo umas três, quatro vezes, meu pai já abandonou a gente [...]”.

Outro estudo, também realizado pelo Nequase, buscou compreender a vulnerabilidade social vivida por vinte adolescentes de 13 a 18 anos, que são atendidos em um Centro de Referência em Assistência Social (Cras) de Aparecida de Goiânia. Segundo a pesquisadora Patrícia de Oliveira, os adolescentes estavam ali por vínculo, como uma forma de se integrar na sociedade.

“Mas a vida deles é marcada pela negligência de instrumentos sociais básicos não ofertados, como a saúde, a educação, o lazer e segurança pública. Muitas vezes eles são vistos de uma forma preconceituosa, como possíveis agressores, delinquentes, e isso começa a gerar mais violência”.

Crítica conservadora

É muito difícil entender a realidade do outro, principalmente quando os sujeitos vivem em um contexto social diferente. Uma pessoa que mora no centro de uma capital, não conseguirá entender a realidade de uma periferia, por exemplo, se não conferir aquela realidade de perto, deixando seus preconceitos de lado. Patrícia de Oliveira relata: “eu demorei muito para compreender o significado que a maconha tem para aqueles adolescentes. Para eles, a erva não é entendida como uma substância ilícita, porque ela faz parte daquele convívio social deles, de onde eles vivem. Se torna algo natural, isolado do critério de legalidade”.

Vulnerabilidade Social

“Inicialmente nos salta aos olhos o que a gente quer enxergar, é o nosso olho em cima das informações. É preciso retirar nossas lentes culturais para entender o que as pessoas estão nos mostrando, mas cada um tem seu tempo pra conseguir isso.” Patrícia de Oliveira.

Você precisa disso? “É possível as pessoas terem uma relação positiva com as drogas, a gente esquece que é uma realidade, se as drogas não dessem prazer, as pessoas não usariam”. André Contrucci. O álcool e o tabaco são substâncias que, apesar de terem o consumo legalizado, provocam prejuízos à saúde. Outras drogas também possuem capacidade de produzir sensações tão potenciais de prazer quanto as drogas legalizadas, ou mais que elas, contudo, a todo o momento pauta-se combatê-las. Mas será que esse é o real problema? A professora da UFG, Renata Mazaro, acredita que não. “A droga não é nada sem a pessoa! A gente tem de mostrar que o problema é o comportamento em cima do uso. É por isso que precisamos educar. Se você vai fazer o uso, é preciso pensar como consumir, sem trazer os demais danos para a sua vida!”

Segundo o psiquiatra Dartiu Xavier, uma pessoa é considerada dependente quando ela não tem controle sobre o uso da substância. E essa é a diferença entre o usuário ocasional e o dependente. A maioria dos usuários não se torna dependente, mas alguns sim. Para o coordenador do projeto “É de lei”, associação que trabalha pela redução de danos sociais e à saúde associados ao uso de drogas no Brasil, André Contrucci, é importante que as pessoas saibam dos riscos, mas de maneira honesta. “Não adianta mentir achando que vai proteger. A gente protege sendo sincero e abrindo diálogos. Se você usar maconha, você terá esses riscos, e se você fizer uso de álcool, também poderá ter consequências graves. Essas reflexões devem existir, e não campanhas sensacionalistas em torno das drogas”, afirma. “O núcleo accumbens é a região responsável pelo processamento dos circuitos de recompensa. Ele também é ativado por outras experiências como amor, sexo, jogo, música, religião e, inclusie, pelo uso de drogas.”

O QUE AS PESSOAS ACHAM DO ACESSO ÀS DROGAS

Ilustração: Johnathan Jesus

Drogas: entre o prazer e as consequências

Dados SENAD 2010 - Ilustração NUTE - UFSC - 2016

Sociedade

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5 Pesquisa

Pequi do Tocantins é menos calórico Pesquisa da UFG constata que a variação nutricional existe em frutos da mesma espécie e de áreas diferentes do Cerrado Carolina Melo

F

ruto nativo do Cerrado, o Pequi está presente na vegetação de quase todas as regiões do país. O que pouca gente sabe é que, dependendo de sua origem, ele pode apresentar diferenças nutricionais. Pesquisa realizada pela Universidade Federal de Goiás (UFG) analisou pequis de áreas dos estados de Tocantins, Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais, e concluiu que o fruto coletado no Tocantins é o menos calórico e contém mais cálcio. Já os pequis coletados no norte de Minas Gerais e oeste de Mato Grosso apresentam polpa mais gordurosa.

As variações foram encontradas em frutos da mesma espécie (Caryocar Brasiliense), porém oriundos de áreas diferentes do Cerrado. Segundo a responsável pelo estudo e professora da Faculdade de Nutrição da UFG, Maria Margareth Veloso Naves, é raro existir esse tipo de diferença em frutos da mesma espécie: “É mais comum que isso ocorra com micronutrientes, como vitaminas e minerais, e não com macronutrientes, como lipídios ou proteínas, por exemplo. Mas no pequi, identificamos essa peculiaridade”. De acordo com os dados da pesquisa, três caroços de pequi do Tocantins somam 24 kcal, valor energético duas vezes menor do que o encontrado nos frutos coletados em Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais. Por outro lado, os frutos procedentes do Tocantins possuem teor de cálcio duas vezes maior do que o observado nas polpas dos frutos das outras áreas. Se

comparado com outros frutos nativos como cupuaçu e graviola, a quantidade de cálcio chega a cinco vezes mais.

A boa notícia é que mesmo os pequis do norte de Minas Gerais e oeste de Mato Grosso, que têm maior quantidade de lipídios, podem contribuir para a promoção e manutenção da saúde. Segundo o estudo, 60% dos lipídios do fruto são gorduras saudáveis, que reduzem o risco cardiovascular.

Mais coloridos e gordurosos

Maionese de pequi?

A pesquisa também observou a coloração dos frutos, que varia de acordo com a quantidade de carotenoides (pigmentos responsáveis pela coloração). Os pequis coletados no norte de Minas Gerais e em Mato Grosso são mais laranja-avermelhados, enquanto frutos procedentes do Tocantins têm polpa amarela mais clara, quase branca. Ao relacionar a quantidade de lipídios com a cor e o teor de carotenoides, a pesquisa concluiu que os pequis gordurosos são também os com coloração mais forte e com mais carotenoides.

Angélica Queiroz

Agora, o próximo passo do estudo é avaliar os tipos de carotenoides presentes no fruto. “Queremos saber, conforme a cor da polpa, se os carotenoides presentes são antioxidantes, que contribuem para retardar o envelhecimento das células e reduzir o risco de doenças crônicas, ou se são pró-vitamina A, essencial a vários processos vitais como crescimento, reprodução, sistema imune e visão”, afirma Maria Margareth Veloso Naves.

Mesmo abundante, o pequi não tem comercialização expressiva no cenário nacional diante de outras espécies frutíferas. Pensando em alternativas para ao consumo do fruto, uma pesquisa da Escola de Agronomia da UFG desenvolveu uma maionese à base do azeite de pequi. Maionese, emulsão do tipo óleo em água, é um molho com alto teor de lipídios muito apreciado e consumido em todo o mundo. A pesquisa de mestrado de Mara Lina Rodrigues mostrou que as características da maionese elaborada com azeite de pequi são compatíveis com as da maionese elaborada com óleo de soja. Mara Lina relata que, durante a pesquisa com o azeite, percebeu que o aquecimento do azeite de pequi degradava os seus carotenoides, que são os compostos responsáveis por sua coloração alaranjada. “Como esses compostos têm propriedades funcionais para o corpo humano, atuando como potentes antioxidantes, buscamos uma alternativa que aproveitasse o azeite de pequi sem que ele passasse por aquecimento. Então pensamos na maionese, que é um alimento à base de óleo e que não tem aquecimento no processo de fabricação”, explica. Segundo a pesquisadora, como o ponto de fusão do azeite de pequi difere bastante do ponto de fusão do óleo de soja, além de outras características que diferem também, não foi possível obter uma formulação com 100% de azeite de pequi, porque a emulsão da maionese quebrava nos testes de previsão de utilização pelo consumidor (abrir a embalagem, usar uma porção, fechar a embalagem e guardar sob refrigeração, retirar da refrigeração e utilizar mais uma porção, voltar para refrigeração e assim sucessivamente). A formulação final evidencia o máximo possível do sabor do azeite de pequi sem comprometer as características tecnológicas da maionese. “No final obtivemos uma maionese de cor amarela intensa e sabor bem característico do azeite de pequi”, afirma Mara Lina. Esse trabalho foi escolhido no Congresso Brasileiro de Processamento de Frutas e Hortaliças como o melhor do evento, porque a maionese é um produto de grande consumo em todas as faixas etárias e, nesse caso, aproveita o azeite de pequi, derivado de um fruto típico do Cerrado, produzido pelos agricultores familiares dessa região, sem comprometer as características funcionais que esse azeite possui.

Fotos: Divulgação


minosa como a terceira mais rentável do mundo, ficando atrás apenas do comércio de armas e drogas. Vale lembrar que todos os países são origem, trânsito ou destino do tráfico humano. Todas as estatísticas afirmam e nossa experiência comprova que as mulheres são sempre o maior grupo para a exploração sexual, seguidas das crianças; os homens se destacam no segmento do trabalho forçado. Recentemente, o grupo LGBT tem aparecido nos relatórios como um segmento que vem crescendo como vítimas para exploração sexual. O estado de Goiás, por várias vezes, foi incluído como sendo rota de origem e passagem de vítimas desse crime. Porém, com o passar do tempo, a intensificação das campanhas e uma ação mais presente dos órgãos de repressão, essas ocorrências têm diminuído.

Proposta irrecusável? Desconfie!

Antônio Maciel – No Brasil, cerca de 40 mil pessoas desaparecem anualmente. Desses, há uma grande incidência de adolescentes. Os motivos que levam as pessoas a desaparecerem ou serem traficadas são a fuga de casa, por maus tratos, violência doméstica, ou drogas.

Ministério da Justiça

Mesa-redonda

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Ascom e Rádio Universitária

Todos os anos milhares de pessoas são traficadas no mundo para trabalho forçado ou exploração sexual. Há no Brasil, entre ações na justiça, inquéritos policiais e investigações do Ministério Público Federal, cerca de 225 casos de tráfico de pessoas na mira das autoridades. Esse ainda é um número muito pequeno se considerarmos as demais formas de exploração no tráfico interno. No ano passado, por exemplo, o Disque 180 recebeu 317 denúncias sobre tráfico interno e externo. Para falar sobre esse assunto, a mesa-redonda convidou o gerente do Instituto de Identificação da Polícia Civil de Goiás, Antônio Maciel Aguiar Filho, o secretário-executivo no Brasil do Projeto Resgate Brasil, Marco Aurélio de Souza e o membro do Comitê Estadual de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Polícia Rodoviária Federal, Fabrício Rosa.

O que é o tráfico de pessoas? Marco Aurélio – A Organização das Nações Unidas (ONU), no Protocolo de Palermo, define que o tráfico de pessoas ocorre por meio do recrutamento, transporte, transferência, abrigo e guarda de pessoas quando por meio de ameaças, uso da força, coerção, fraude, enganação, abuso de poder ou vulnerabilidade. A pessoa recebe pagamento ou benefícios que facilitem o consentimento para que uma tenha o controle sobre a outra com a finalidade de explorá-la. Isso pode ser desde a exploração da prostituição por terceiros ou outras formas de exploração, como sexual, trabalho, serviços forçados, escravidão, servidão por dívidas, casamento

servil, adoção ilegal ou remoção de órgãos. O fato de a pessoa ter seus documentos retidos ou sua liberdade cerceada para a restituição de supostas dívidas contraídas por ela já constitui uma evidente forma de cárcere mesmo que no local não haja cercas ou grades. Porém, em alguns casos, as vítimas chegam a ficar trancafiadas em espaços com grades ou algemas. Afinal, aquela vítima é uma fonte de recursos, um “bem adquirido” e o aliciador precisa se certificar de que não a perderá. Fabrício Rosa – É muito importante que as pessoas saibam que o tráfico de pessoas está mais próximo do que imaginamos. Ele aconteceu e acontece no país com muita frequência, desde aquela menina que é retirada do interior e trazida para ser explorada pelas famílias da capital, adolescentes que são levados para pequenos clubes de futebol e ali são explorados, até meninas que são convencidas de que vão ser modelos em outro país, tudo isso é tráfico de pessoas. Antônio Maciel – O papel, sobretudo da Polícia Civil, é tentar gerar a identificação dessas pessoas. O que facilita esse tipo de mercado, que é muito lucrativo, é que o país não possui um sistema integrado de informações biométricas. Em Goiás, agora temos um projeto chamado Goiás Biométrico, em que pretendemos colocar todo mundo em um banco de dados e isso vai possibilitar maior controle. O nosso objetivo é tecnicamente, na atividade pericial, garantir a identificação dessas pessoas. É possível estimar quantas pessoas são vítimas do tráfico humano? Existe um perfil de pessoas que são traficadas?

Marco Aurélio – O tráfico de seres humanos é quase sempre subterrâneo, feito no escuro, o que o torna quase invisível. Dessa forma, quantificar com números exatos é impossível, mas a OIT, a ONU e todas as grandes organizações de luta contra essa escravidão moderna afirmam que existem cerca de 21 milhões de pessoas traficadas em todo o mundo e que essa exploração geraria valores de lucros perto de 40 bilhões de dólares por ano, colocando essa modalidade cri-

Antônio Maciel

Os motivos que levam as pessoas a desaparecerem ou serem traficadas são a fuga de casa, por maus tratos, violência doméstica, ou drogas

Fabrício Rosa – A principal vítima com certeza é a mulher. E Goiás figura em um ranking lamentável como sendo um dos estados com mais tráfico de mulheres no país. O que percebemos é que existe uma rede doméstica, informal, de amigas, vizinhas e irmãs de igreja, inclusive, especialmente no norte de Goiás, que acaba influenciando essas mulheres que estão em busca de um sonho legítimo, porque é legítimo sonhar e correr atrás do que a gente acredita ser melhor para nós. Mas os homens também são vítimas, mais para a finalidade trabalhista, especialmente trabalho escravo. Participamos de muitas operações de combate ao trabalho escravo e Goiás é mais um estado que recebe trabalhadores escravos dos bolsões de pobreza do Nordeste e um pouco do Norte. Pará e Mato Grosso figuram entre os estados onde há mais casos de trabalho escravo em fazendas, carvoarias e mineradoras. As pessoas se esquecem que há um tráfico intenso de mulheres e homens também dentro do país. Já fizemos operações em motéis de Aparecida de Goiânia e quase a totalidade daquelas mulheres e travestis foram trazidas de outros municípios e de outros estados brasileiros.


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Como a polícia e outras organizações se empenham no combate ao tráfico humano? Antônio Maciel – Uma das medidas mais adotadas na investigação é exatamente tentar identificar corpos que são encontrados porque se não identificamos, não há como iniciar uma investigação. Infelizmente a legislação brasileira ainda permite o reconhecimento facial, o que tem gerado muitos transtornos porque qualquer pessoa pode se passar por parente e liberar o corpo. O que temos tentado fazer por meio da perícia é garantir a identificação e não o reconhecimento, que é muito falho. Temos cerca de 700 pessoas enterradas como indigentes. É um número muito expressivo que pode estar associado ao tráfico de pessoas, porque muitas vezes essas pessoas são mortas depois de exploradas por muito tempo. Marco Aurélio – O tráfico de pessoas ainda é um “crime invisível”. As autoridades de repressão trabalham de acordo com as denúncias que chegam a elas. Uma forma de ampliar esse combate é a união de forças entre todos os envolvidos. O Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas está constituído sobre um tripé que envolve a prevenção, repressão e atenção à vítima. Quem são e como agem os aliciadores?

Marco Aurélio – O tráfico de seres humanos é um crime que se alimenta da vulnerabilidade das vítimas. Todos possuem sonhos, desejos, ilusões que, de repente, por meio de uma proposta tentadora tem a possibilidade de serem realizados. Esse é o grande fator motivador. As redes que se estabelecem para o tráfico quase sempre são “caseiras”, são pessoas próximas que oferecem a possibilidade da realização do sonho. Quando você não tem a máquina do Estado por perto, oferecendo lazer, esporte, cultura e educação para uma melhor projeção de vida dos vulneráveis, o aliciador entra nessa brecha. Em outros casos, como conflitos armados e crises humanitárias que levam pessoas ao desespero para sair do lugar em que vivem, elas acabam assumindo um risco maior de serem vítimas, tanto para a exploração sexual e o trabalho forçado, quando para a remoção de órgãos, a servidão e outras formas de exploração.

Quais são as principais dificuldades de se tratar esse problema? E o retorno dessas pessoas a suas famílias?

Antônio Maciel – Um assunto que ainda não abordamos e é muito preocupante é o tráfico de bebês e o tráfico de órgãos. Uma operação da Polícia Federal feita entre 1985 e 1988 estima que 12 mil crianças foram traficadas no Brasil, na região Sul, porque o perfil dos bebês loiros e de olhos azuis era exatamente o que esses aliciadores procuravam. Eles compravam de pessoas de baixa renda por cerca de um salário mínimo e vendiam por até 40 mil cada criança. Não é fácil combater esse tipo de prática, mas acho que o tema exige uma manifestação da sociedade cobrando maior atenção dos órgãos públicos. Por exemplo, estamos criando uma proposta de lei propondo uma forma de minimizar isso com a identificação biométrica do bebê e do polegar da mãe. Essa é uma solução técnica para combater esse tipo de crime.

Marco Aurélio – Talvez a principal dificuldade de se tratar do tema no sentido das investigações seja a ausência ou as poucas denúncias confirmadas pelas próprias vítimas. Por parte delas, há sempre medo, insegurança sobre o que acontecerá se ela confirmar a denúncia. Por se tratar de um crime quase sempre praticado por alguém próximo da vítima ou com quem ela mantém laços afetivos e/ou amorosos, o temor da denúncia se confirma. Além disso, existe a vítima que não se vê como tal, pois o aliciador acaba por fazê -la entender que ele a está ajudando, tirando-a de uma situação de miséria e que agora sua vida é muito melhor do que se ela ainda estivesse no local de origem. De repente, o explorador se torna a “mãezinha” ou o “protetor”, fazendo com que ela não se reconheça ou se enxergue como uma vítima. Temos de ressaltar a ação dos órgãos da justiça. Goiás, por exemplo, se destaca como o Estado que mais penalizou os criminosos, mesmo diante de leis tão frágeis quanto as que se imputam a esse tipo de crime. Nossa esperança é que as novas leis de migração e repressão ao tráfico de pessoas tragam mais poder e condições para a justiça penalizar com severidade os criminosos. Fabrício Rosa – É importante entendermos que não é fácil regressar. Pense numa mulher que foi para a Europa trabalhar na prostituição, lembrando que é lícito trabalhar na prostituição na maior parte dos países do mundo, inclusive no Brasil. Ela vai voltar com dívidas, problemas psiquiátricos, sofrer

Fotos: Carlos Siqueira

Quando se fala de tráfico de drogas, todo o sistema funciona e vai atrás, mas quando é a própria pessoa que é traficada, muitas vezes os órgãos públicos não se sensibilizam

preconceitos talvez da própria família, os mesmos preconceitos que a levaram a ir para esses locais. Falando em preconceito, podemos falar das travestis: como é que elas voltam para casa se é de lá que foram expulsas? As travestis que encontramos na situação de tráfico de pessoas muitas vezes foram expulsas de casa, da escola, do sagrado, das relações trabalhistas, então, como essas pessoas retornam? Com relação ao trabalho escravo, conseguimos encontrar casos de retorno, inclusive, nas operações que fazemos, levamos essas pessoas de volta e elas têm direito a receber seguro desemprego. Mas não é simples retornar, é muito difícil na prática.

Mesa-redonda

Fabrício Rosa

Fabrício Rosa – É muito importante dizer que o aliciador não tem cara de traficante internacional. É uma pessoa que tem uma cara normal, que inicialmente goza da confiança daquela pessoa que vai ser aliciada. Pode ser uma mulher que se passa por amiga, ou um homem, que, no caso do trabalho escravo, chamamos de gato. Imagine um rapaz do interior do Maranhão, que ganha um Bolsa Família de 130 reais. Chega um gato e oferece para ele 800 reais para trabalhar em uma lavoura em Goiás, o que significa uma modificação enorme na vida dele, e ele acredita. Mas é importante dizer que o aliciador não é só essa pessoa. Todos podemos ser aliciadores à medida que somos negligentes com essa situação. O tráfico de pessoas é permanente e a gente tem de alertar e sensibilizar o nosso olhar. Há muito desconhecimento e muito preconceito a respeito do assunto, principalmente quando se trata de mulheres. Quando se fala de tráfico de drogas, todo o sistema funciona e vai atrás, mas quando é a própria pessoa que é traficada, muitas vezes os órgãos públicos não se sensibilizam. Precisamos melhorar o funcionamento dos órgãos públicos e isso vale para toda a cadeia do sistema de justiça criminal. São pouquíssimas as pessoas punidas neste país por tráfico de pessoas, especialmente porque muitos casos envolvem grandes políticos e empresários.

Marco Aurélio

“Todos possuem sonhos, desejos, ilusões que, de repente, por meio de uma proposta tentadora tem a possibilidade de serem realizados.”

Como identificar alguém que está nessa situação e fazer uma denúncia? Antônio Maciel – Esse é um grande problema porque muitas vezes a pessoa não fala para a família que está indo com aliciador, fala simplesmente que vai viajar e desaparece. O que acontece é que os aliciadores tomam os passaportes e as pessoas não podem mais entrar em contato com seus familiares. Mas as pessoas geralmente não fazem isso até porque muitas delegacias não estão capacitadas para esse tipo de situação, considerando outras ocorrências mais importantes. É por isso que estamos discutindo a criação de uma delegacia especializada para pessoas desaparecidas, preparando os próprios policiais para lidar com a informação. Fazer a ocorrência do fato é muito importante para combater esse tipo de delito.

Fabrício Rosa – Existem vários números de emergência no Brasil, inclusive o nosso país é desorganizado quanto a isso. São dezenas de números. Mas existe um número que tenta unificar questões relativas ao tráfico de pessoas ou a direitos humanos em geral, que é o Disque 100. Em todos eles a pessoa pode ligar, não precisa se identificar, mas é muito importante que traga a maior quantidade de elementos possíveis para que a polícia possa trabalhar. Então, se você souber, Disque 100. As pessoas precisam de fato sensibilizar o seu olhar e parar de acreditar em propostas absurdas. Essas coisas maravilhosas não caem assim tão fácil não. Se alguém da sua família recebeu uma proposta para trabalhar na Europa e ganhar não sei quantos mil euros por mês, desconfie, denuncie, ligue para a polícia.

Confira programa da TV UFG sobre o tema


Tecnologia

8 diferente, a IA está presente em grande parte delas, possibilitando intervenções em diversas áreas do conhecimento, desde o Marketing até a Medicina.

Divulgação

Cardiograma facilitado

O futuro da tecnologia Saiba um pouco mais sobre a Inteligência Artificial, conceito fundamental da evolução computacional, além de conhecer projetos de pesquisadoras que tem a IA como ferramenta base Vinicius Paiva e Luciana Gomides

A

evolução das ferramentas e a mudança na forma como pessoas e empresas se relacionam com a tecnologia são constantes. A chegada dos computadores pessoais, smartphones e documentação em nuvem mostram que a Inteligência Artificial (IA), um novo conceito que faz parte dessa onda de inovação, leva o usuário aonde ele quer chegar. Mas, afinal, o que é essa tal Inteligência Artificial? Como funciona? Como pode ser aplicada no dia a dia? Ao longo desta matéria, o Jornal UFG descreve os princípios básicos desse conceito e mostra alguns projetos de pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG) que, usando a IA, podem trabalhar a serviço da comunidade.

Desvendando a Inteligência Artificial

A Inteligência Artificial está mais presente em nossas vidas do que imagina nossa vã filosofia! Sempre que pegamos um smartphone para uma simples “checada” nas nossas redes sociais, presenciamos o que a IA pode fazer por nós. Mas, por trás de cada recomendação personalizada, existe uma série de combinações tecnológicas que a fazem funcionar. É por meio dessas combinações que, basicamente, se ensina um computador a pensar e interagir com os dados fornecidos. Conheça algumas: Machine Learning – é a simples definição de aprendizado da máquina, na qual são envolvidos computadores que usam dados para aprender o mínimo de programação. Com a machine learning, em vez de esperar o resultado após a programação de regras em uma máquina, é pos-

sível deixar que ela aprenda, por conta própria, através dos dados alimentados. Trata-se do principal impulsionador da IA. Um exemplo prático? As recomendações personalizadas da Netflix!

Deep Learning – o aprendizado profundo, em tradução literal do inglês, é a parte em que a máquina utiliza algoritmos (lista de ações que devem ser executadas sequencialmente) complexos para imitar a rede neural do cérebro humano, aprendendo determinada área do conhecimento com alguma ou nenhuma supervisão. De forma prática, no deep learning, a máquina detém o aprendizado para, posteriormente, decifrar, sozinha, a linguagem natural, relacionando termos e palavras para inserir significado através dos dados fornecidos. É como funciona o Google Translator. Processamento de Linguagem Natural – este conceito usa as técnicas de machine learning a fim de encontrar padrões em conjuntos de dados puros e, assim, reconhecer a linguagem natural. É com base neste conceito que é possível promover a análise de sentimentos nas redes sociais. Através de algoritmos, são procurados padrões em postagens para analisar a percepção de clientes em relação a marcas, serviços ou produtos.

Inteligência Artificial na UFG

De olho na IA, vários pesquisadores da UFG desenvolvem projetos e protótipos que ultrapassam os limites acadêmicos, sendo inovações importantes para nosso uso cotidiano, solucionando problemas enfrentados em situações corriqueiras. Sabe aquelas coisas que, quando vê, pensa: “como não pensei nisso antes”? Pois bem, alguém pensou! E, como não poderia ser

Com uma interface simples e intuitiva, o DeepCardio é um sistema que, por meio de Inteligência Artificial, encontra anomalias nas válvulas cardíacas. O objetivo é facilitar o atendimento médico e assegurar uma verificação rápida e acessível para diagnosticar problemas cardiovasculares, que segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) mata 300 mil brasileiros por ano. O aplicativo capta o som emitido pelo coração, por meio de um microfone comum acoplado num estetoscópio médico, e o converte em espectrograma. Em seguida, uma rede neural nomeada convolucional Inception V3 analisa o áudio e exibe a classificação “normal” ou “anormal”, indicando a possibilidade de um problema cardíaco.

Segundo o pesquisador responsável pelo projeto, Sandro Moreira, a solução proposta apresentou precisão de 86%, e se mostra uma ferramenta alternativa bastante acessível à população. “O exame poderá ser realizado em consultório, em casa, por cuidadores, por enfermeiros e até por agentes de saúde. Como base da avaliação, o aplicativo analisa uma base de dados disponibilizados pelo site Physionet Challenge 2016, que armazena diversas gravações de sons de coração de indivíduos de todo o mundo, saudáveis ou com doenças patológicas, coletados não só em ambientes médicos. “Foram usadas mais de 4 mil gravações de mais de 1.700 pessoas no treinamento da rede”. Após uma triagem, 300 gravações foram selecionadas especificamente para os testes”, afirma.

Classificação de Câncer de Mama

Para evitar exames desnecessários, que podem até mesmo originar novas doenças como o câncer de tireóide, por excesso de radiação, o Projeto miRNAs Câncer - Breast criou uma nova forma de classificação de tumores. O laudo médico da mamografia classifica os tumores das pacientes numa escala de 0 a 6, seguindo uma padronização internacional. Mas, diferentemente dos resultados classificados de 0 a 3 (geralmente benignos) e de 5 a 6 (sendo a maioria maligna), a escala 4 carece de precisão quanto à malignidade tumoral. Para classificar esses tumores, o projeto, desenvolvido pelo Instituto de Informática da UFG, categoriza o material recolhido do paciente por meio de dados dos ácidos ribonucleicos (RNAs). Para identificar as informações do tumor, utiliza-se uma técnica de inteligência artificial que projeta as instâncias de uma base de dados organizada pelos pesquisadores e as compara com os do paciente, destacando quais informações de-

vem ser consideradas na análise. De acordo com o pesquisador do Instituto de Informática da UFG, Rafael Marques, avalia-se 16 características para dizer se é maligno ou benigno. “Os resultados são positivos. Para o tumor benigno, a precisão é de 96,9% e para o tumor maligno, 93,7%; numa média geral, a precisão é de 95,3%”, afirmou. Os dados utilizados na criação do sistema foram obtidos por meio de uma parceria com um hospital de São Paulo, que disponibilizou uma base de dados de RNAs.

Essas informações dos ácidos ribonucleicos são importantes porque acredita-se que eles podem influenciar na replicação gênica, podendo assim estar associados a diferentes patologias, como o câncer. Segundo Rafael Marques, nessa primeira fase do estudo, foram avaliados três RNAs que apresentam maiores variações quando há ocorrência de tumor. “A forma como construímos o sistema diminui a taxa de erros. Até o momento, os resultados são promissores. O projeto agora terá uma nova fase de estudo com mais casos de testes”, revelou Rafael Marques. Além dele, participaram do estudo os professores do INF, Anderson da Silva Soares e Celso Gonçalves Camilo Júnior, e a doutoranda Heyde Francielle do Carmo França.

Inclusão Digital

Que atire a primeira pedra quem vive sem as facilidades disponibilizadas pelo smartphone! Com o advento da tecnologia, um aparelho que, antes, era usado apenas para ligações e trocas de mensagens via SMS é, atualmente, portador de funções inimagináveis quando os famigerados “tijolões” foram criados. A dinamicidade foi complementada pelas telas touchscreen, porém, a inovação empregada torna o equipamento inacessível para deficientes visuais que dependem de teclados físicos para digitar. No intuito de trazer acessibilidade a esses usuários, pesquisadores do Instituto de Informática da UFG desenvolveram o BrailleÉcran, método que permite a entrada de informações em celulares sem teclados físicos. Joyce Siqueira, pesquisadora do projeto, explica que o BrailleÉcran “visa a digitação de texto em smartphones, com tela sensível ao toque, utilizando o Sistema Braille”. Para isso, combina o aplicativo Android a uma película tátil, modelada para impressão 3D, que se sobrepõe a tela. As preferências do usuário são ajustadas por meio de um Painel de Configuração que tem, dentre suas funções, uma Central de Ajuda, que disponibiliza um tutorial falado. No total, são três interfaces, em que são identificadas as funções do aplicativo, do painel de configuração e da própria película tátil. Todos os botões são representados na película, na qual foram, também, adicionados “caminhos” que orientam quanto à localização do menu e atalhos, conforme descrito nas figuras da página ao lado.


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Figura 1. Interface do aplicativo

Divulgação

A Figura 1 identifica as seguintes funções do aplicativo: caixa de texto (1), display (11), ponto de apoio (2), confirmação (3), cela braille (4), excluir (5), enviar mensagem (6), teclado numérico (7), modo de letras maiúsculas (8), central de ajuda (9) e painel de configuração (10).

Figura 2. Painel de configuração

Figura 3. Interface da película tátil

O desenvolvimento de uma interface adequada aos deficientes visuais foi possível graças à colaboração de um usuário especialista que participou de todo o processo de construção dos protótipos. Portador de cegueira congênita e alfabetizado em braille, o consultor possui, também, conhecimento avançado em informática e celulares com software leitor de tela. Ao protótipo final foram aplicadas as Diretrizes de Acessibilidade Móvel desenvolvidas pelas W3C – Word Wide Web Consortiun. O método foi avaliado por dez voluntários, todos deficientes visuais e letrados em Braille. Nos testes, foram avaliados itens como velocidade de escrita e respectiva taxa de erros, além de usabilidade e experiência do usuário.

Joyce Siqueira descreve que os resultados finais foram bastante positivos. “Os testes de usabilidade e experiência do usuário apresentaram alta aceitabilidade e satisfação no uso”, comemora a

por base a aplicação de técnicas inspiradas pela biologia evolutiva, tais como mutação, hereditariedade, recombinação e seleção natural.

O diferencial do projeto, de acordo com Airton, reside na classificação de sentimentos para contextos e domínios específicos. “Existem outros classificadores disponíveis, mas, grande parte deles são de contexto geral, o que acaba prejudicando a análise e avaliação das frases – uma palavra ou frase pode ter um significado completamente diferente, dependendo do contexto ao qual está inserida”, esclarece o pesquisador. Tal vertente tem forte utilidade para quem busca informações específicas que, de repente, não seriam obtidas pelos classificadores gerais disponíveis no mercado. Ao analisar o ranking de trabalhos apresentados em competições da área, o projeto goianiense apresentou resultados positivos que ainda devem ser aprimorados com a inclusão de outros algoritmos e abordagens.

O mestrando em Ciência da Computação e desenvolvedor do projeto, Airton Bodin Júnior, explica que a análise de opiniões já é feita por empresas de vários segmentos, além de governos e instituições que dependem dos dados coletados pela web para tomada de decisões. Trata-se de observação valiosa que possibilita identificar áreas críticas que demandam investimentos e melhorias. Além disso, a mineração de opiniões pode ser aplicada, também, no contexto médico, identificando comportamentos de risco, a exemplo da depressão. Para chegar ao modelo proposto, foi utilizada a Programação Genética, método algorítmico que tem

pesquisadora. Ao longo do período de avaliação, foram anotadas sugestões dadas pelos voluntários as quais devem ser implementadas. Também são previstas melhorias no método, como o aprimoramento da película, utilização da cela braille para a realização de chamadas e integração do BrailleÉcran à agenda para envio de mensagens. O trabalho foi orientado pelo professor do INF, Fabrizzio Soares, e teve a participação dos mestrandos Cleyton Silva, Luciana Berreta, Cristiane Ferreira, Igor Félix e Mateus Luna.

Apocalipse de tecnologia? Se, hoje, no mercado, temos máquinas que substituem ou facilitam muitos trabalhos braçais, e cada vez mais a Inteligência Artificial substitui o cérebro humano, o que sobrará para nós, meros mortais, num futuro não tão distante? Será que teremos um futuro de apocalipse da Inteligência Artificial, num cenário de ficção onde os robôs dominarão o mundo, e nós ficaremos reféns de todas essas tecnologias? Brincadeiras e especulações a parte, a IA cada vez mais é responsável por uma revolução das máquinas. Nos Estados Unidos, por exemplo, num processo de automação, 250 mil robôs já executam tarefas que antes eram feitas por humanos. O famoso Facebook é outro exemplo. O próprio criador, Mark Zuckerberg, explicou que a rede utiliza-se da IA para entender o comportamento dos quase dois bilhões de usuários cadastrados, o que significa, aproximadamente, ¼ do mundo.

Inteligência Artificial para uso corporativo

Ao compreender o que gostamos de ver ou interagir, o Facebook é capaz de nos fazer recomendações sobre coisas semelhantes ou coisas que possamos achar interessantes. A IA é capaz de melhorar muitas coisas que precisam ser melhoradas e podem nos trazer inúmeros benefícios, mas ela também é capaz de nos substituir. As duas opções podem caminhar bem próximas. Stephen Hawking, um dos mais proeminentes cientistas do mundo, por exemplo, afirmou em entrevista à BBC que “o desenvolvimento da inteligência artificial total poderia significar o fim da raça humana”. Uma questão complicada, que parece até ficção. Vamos aguardar os próximos capítulos.

Quantas vezes você já se pegou dando sua avaliação sobre algum serviço que não lhe agradou? Ou, pelo contrário, elogiando aquele restaurante que você conheceu e foi muito bem atendido ou achou a comida maravilhosa? Toda essa informação contribui para o aumento de conteúdo inserido nos meios

Passo a passo

VISIBILIDADE

UFG É uma iniciativa da Assessoria de Comunicação em parceria com PRPG/PRPI que divulga, por meio da imprensa, os projetos de ensino, pesquisa, cultura e extensão da UFG.

A partir da pesquisa, a Ascom elabora, em conjunto com o pesquisador, um texto jornalístico chamado release. Este texto é enviado para os veículos de comunicação (TV, Rádio, Jornais, Portais, Revistas) que agendam entrevista com o pesquisador. As notícias publicadas são enviadas ao pesquisador para a inclusão no seu currículo Lattes.

Sua pesquisa

ASCOM

Divulgação nos veículos de comunicação

Mais informações: Assessoria de Comunicação/UFG (62) 3521-1310 / 1706 saladeimprensaufg@gmail.com www.ascom.ufg.br

Amplo alcance social

PROJETO

VISIBILIDADE UFG Aqui seu conhecimento é visto.

Tecnologia

virtuais e se configura como ferramenta valiosa para o empreendedor conhecer, acompanhar e analisar o sentimento dos usuários de seus produtos ou serviços. Com o objetivo de implementar um sistema de criação automatizada de classificadores de sentimentos, pesquisadores da UFG desenvolveram o projeto de mineração de opiniões tendo como base contextos específicos.


Fotos: Mário Braz

Sociedade

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A luta do povo originário Estudantes indígenas fazem a reflexão crítica da luta em defesa do território Por Carolina Melo

E

m tempos de reorganização da agenda ruralista no Congresso, estudantes indígenas da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás (UFG) traçam dois caminhos de luta em defesa do território: a ocupação dos espaços de poder e a conquista do reconhecimento como sujeitos de direito. As alternativas, embora pareçam impossíveis no espaço político e jurídico cada vez mais conservador, dialogam com o sentimento ancestral de resistência. Para Leomar Wainnê Xerente, Leonilson Rocha Kanela e o xavante Geovane Tseredze, o histórico de extermínio do povo originário faz parte da construção identitária indígena. “Nascer para nós é uma resistência. Já nascemos lutando”, afirma Wainnê.

As tentativas institucionais de barrar o avanço dos direitos territoriais indígenas e, mais do que isso, retroceder em termos de conquistas, são identificadas com base em quatro ações: proposições de aparatos legais; decisões judiciais; sucateamento de órgãos representativos; e criminalização de atores sociais e lideranças. Nenhuma delas é novidade. Remontam ações da década de 1990, mas que encontraram o ambiente propício de efetivação nos dois últimos anos, com o atual projeto político do país. Para se ter ideia, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC-215), que atualmente vem sendo debatida como um retrocesso pelos indígenas, foi criada há 17 anos e só agora é retomada, quando em 2015 a bancada ruralista conseguiu colocar a proposta novamente em pauta. De acordo com os seus termos, a PEC passa a decisão final da demarcação de terras indígenas para o Congresso Nacional, composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. Também possibilita a revisão de terrenos já aprovados e garante a indenização aos proprietários. O texto, portanto, suplanta o Estatuto

do Índio, em vigor desde 1973, que afirma que o reconhecimento de terras ocorre via decreto do presidente da República. De outra forma, modifica o entendimento da Constituição, segundo o qual as terras ocupadas pelos povos originários pertencem à União e, portanto, não há compensação para os posseiros quando a demarcação é reconhecida, a não ser o ressarcimento pelas benfeitorias realizadas no local. Recentemente, em julho deste ano, a Advocacia-Geral da União (AGU) anunciou 19 condicionantes que os órgãos do governo federal devem adotar nos processos de demarcação de terras indígenas. Criadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) durante o julgamento da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, no ano de 2009, as regras que agora vão balizar as novas demarcações, afirmam, entre outras coisas, que o exercício de direito indígena à terra não impede a instalação pela União, sem autorização prévia, “de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas, vias de transporte, além de construções necessárias à prestação de serviços públicos”. Entre as condições há ainda a que veda a ampliação da terra indígena já demarcada.

Por sua vez, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), criada em 2016, aprovou o relatório final no primeiro semestre de 2017, prevendo o indiciamento de 67 pessoas, entre lideranças comunitárias, antropólogos e servidores públicos. O documento pede também a reestruturação da Funai, a reanálise da demarcação de terras indígenas e dos processos em andamento. Recomenda, ainda, o indiciamento de mais de 90 pessoas, entre lideranças indígenas, religiosas, procuradores da República, técnicos da Funai e defensores dos direitos dos povos originários, por supostos crimes cometidos durante processos de demarcações.

Na avaliação do advogado e primeiro mestre pelo programa de pós-graduação em Direito Agrário da UFG, Leonilson Kanela, da Aldeia Pukanu, em Mato Grosso, e do acadêmico Wainnê Xerente, do povo Akwiê, da aldeia Mrãwahâ, em Tocantins, essa conjuntura negativa acirra e respalda os conflitos por terra. “De certa forma, o histórico dos direitos indígenas é de exclusão, sendo sempre pautado pelas subalternização, subordinações, expropriações. Entretanto, com a série de retrocessos e tentativas de supressão de conquistas, mais terras indígenas são invadidas, mais direitos indígenas violados, mais mortes e chacinas”, afirma Leonilson. Segundo Wainnê Xerente, nesse cenário, não há instrumentos que consigam barrar o avanço da violência contra os povos originários. “Sem demarcações, há mais conflitos. E os conflitos já vêm do poder, do governo, que está do lado do agronegócio e das empresas. É muito triste ver nossas lideranças assassinadas pelos fazendeiros”. Para eles, o caminho ideal é construção de instrumentos de proteção, sendo necessário, para isso, a ocupação dos espaços de poder. Na interpretação de Wainnê, “enquanto não tiver representantes indígenas nos espaços de decisão e poder, na Funai, entre servidores”, não há perspectiva de melhoras. “Quem tem de falar sobre a realidade indígena é o povo originário”, afirma e sugere, inclusive, um sistema de cotas para indígenas em concursos públicos. “Não é por menos que estamos estudando. Queremos retornar às nossas comunidades e contribuir com a luta”, diz Geovane Tseredze, Xavante do Mato Grosso.

Direitos provisórios?

Além das tentativas institucionais, há ainda uma racionalidade no entendimento do que é ser indígena que reforça a prática do extermínio do povo originário e, por sua vez, contribui para o não reconhecimento de direitos. A avaliação é do advogado Leonilson Kanela, que explica como a formulação colonial se soma aos discursos de supressão do território indígena. De acordo

com ele, a ideia de que o índio é primitivo, de que o índio é selvagem, respalda os enunciados políticos e jurídicos que entendem que somente “o índio puro”, intocado, tem direitos.

“A partir do paradigma de assimilação, a discussão sempre gira em torno do fato de que o índio um dia deixará de ser índio e perderá os seus direitos. Todos os projetos de lei que acompanhamos, todas as ameaças, passam por esse debate. Então vamos pensar um pouco o que é ser índio: qual o papel do índio como sujeito de direito? É transitório? Ele vai deixar de ser? Então ele não é um sujeito de direito. Isso está em debate, não está claro a partir dos enunciados políticos e jurídicos”, afirma.

De acordo com Leonilson, os indígenas não foram constituídos historicamente como sujeitos, mas sim como objetos de gestão territorial do Estado. “Em vários períodos históricos isso pode ser demonstrado, por exemplo, quando o índio foi mandado para a fronteira para demarcar o território brasileiro e, inclusive, quando é utilizado para resguardar territórios ambientais”. Dessa forma, o discurso ambiental, por exemplo, apesar de utilizado em defesa da causa indígena, contribui para deslocar a compreensão dos povos originários como sujeitos de direito. “Esse movimento da ecologização remonta a ideia do índio primitivo que presta um serviço à sociedade de preservação do meio ambiente. Deixa-se de considerar o índio como tendo direitos e se passa a considerar o meio ambiente como argumento central da demarcação”. Deve-se, portanto, dissociar o direito indígena de outros argumentos, sejam quais forem, acredita o advogado. “Devemos nos construir e ser reconhecidos como sujeitos de direitos coletivos. Vincular nossos direitos à nossa identidade. Por sermos indígenas, gozamos de direitos diferenciados, direitos à terra, enfim. Caso contrário, a gente sempre vai ficar à mercê da interpretação de que o índio considerado assimilado - aquele que veste jeans, usa celular, faz faculdade - não tem direitos”.


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Impulsionado por políticas públicas, setor imobiliário faz metrópole se expandir pelas bordas e produz uma “periferização da verticalização”. Entenda o fenômeno e quais suas consequências

Patrícia da Veiga

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ua do Esmalte, n° 494, Parque Oeste Industrial, Região Sudoeste de Goiânia. Em frente ao Condomínio Harmonia começa a ser organizada uma feira de roupas e alimentos. Quem encabeça a iniciativa é uma moradora do lugar, feirante em vários espaços da cidade, que reuniu vizinhos com a vontade de trazer o pequeno mercado para a porta de casa. “Há poucos serviços aqui por perto e alguns moradores já são comerciantes em outros lugares. Fazem doces, tortas, artesanato. Por isso, decidimos nos organizar”, explica Simone Gonçalves de Queiroz, aproveitando para convidar o leitor para a recém-inaugurada feira (seu funcionamento ocorre às quintas-feiras, entre os períodos vespertino e noturno). A reportagem do Jornal UFG encontrou Simone no mesmo espaço em que foram erguidos (ou estão em fase de finalização) outros seis condomínios do empreendimento Eldorado Parque. Assinado por quatro construtoras, o projeto oferece apartamentos de dois ou três quartos, com área em torno de 45 e 65 m² e preço final variando entre R$168 mil e R$240 mil. Além da feira, os moradores do Condomínio Harmonia esperam por uma praça, uma academia de ginástica, um parque e um shopping nas imediações. Desde a década de 1990, a região já conta com infraestrutura básica de transporte, sistema de água e esgoto e rede de energia elétrica. Nessa mesma localidade, em fevereiro de 2005, quase 15 mil pessoas foram despejadas de suas casas por uma

operação da Polícia Militar (PM). Elas compunham a Ocupação Sonho Real, formada em maio de 2004 de maneira espontânea e mediante a notícia de um terreno abandonado e inadimplente, cuja dívida de Imposto Territorial Urbano (ITU) se acumulava desde 1957 e ultrapassava os R$2 milhões. Ancorada em pedido de reintegração de posse emitido pela 10a. Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, com anuência dos poderes Executivo e Legislativo, e respaldada pela mídia e pelos setores empresariais, a Operação Triunfo – como foi nomeada a ação da PM – resultou em duas mortes, mais de 40 feridos graves, 800 presos e 4 mil famílias desabrigadas. Muito embora a Constituição Federal resguardasse o direito social à moradia das pessoas que viviam no território ocupado, o que prevaleceu foi o direito à propriedade privada e os interesses de imobiliárias e construtoras, que já planejavam empreendimentos como o Eldorado Parque para essa e para outras regiões. O caso do Parque Oeste Industrial serve de exemplo para observarmos como a Região Metropolitana de Goiânia (RMG) se transformou na última década. Essa foi a tarefa da gestora governamental Elcileni de Melo Borges, que realizou sua pesquisa de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGeo) da UFG, sob orientação da professora Celene Cunha, do Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa), e co-orientação do professor Aristides Moysés, da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO). Partindo da premissa de que a habitação é um forte vetor de transformações na es-

Por meio de um pesado aporte de recursos de fundos estatais (como o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS), especialmente a partir do lançamento do MCMV, o segmento econômico de imóveis se voltou para a construção massiva de “habitações sociais de mercado”, ou seja, residências construídas em condomínios estruturados (providos de garagens, piscina e áreas de lazer) e destinadas a consumidores com renda de até seis salários mínimos – que, por sua vez, correspondem ao público-alvo das políticas habitacionais. Essa realidade, de acordo com a pesquisadora, fez a metrópole se espraiar, intensificou a conurbação entre municípios vizinhos à capital – como Aparecida de Goiânia, Senador Canedo e Trindade –, e produziu o fenômeno da “periferização da verticalização”. Desse modo, o que se viu em setores como Oeste e Bueno nos anos 1980 e 1990, com a explosão de edifícios planejados para as classes média e alta, e o que ainda se nota ao redor dos parques urbanos, com a “verticalização de alto padrão”, foi perceptível também nos bairros populares, nas zonas limítrofes e até mesmo em áreas rurais da metrópole. Porém, com outra “roupagem”, demarcando ainda mais as diferenças. “Se viu aflorar uma nova periferia e novos padrões de segregação residencial e socioespacial na Grande Goiânia”, constata Elcileni, que acompanhou nossa equipe em visita ao Eldorado Parque e também aos bairros Moinho dos Ventos (também na região Sudoeste, próximo ao anel viário) e Parque América (em Aparecida de Goiânia).

Consequências Na tese de doutorado Habitação e Metrópole: transformações recentes na dinâmica urbana de Goiânia, Elcileni apresenta os resultados de uma pesquisa minuciosa que envolveu análise de dados, produção de mapas e gráficos e também um trabalho de campo que percorreu 20 empreendimentos situados em sete municípios da Região Metropolitana (Goiânia, Aparecida de Goiânia, Trindade, Senador Canedo, Goianira, Guapó e Nerópolis). Ao realizar visitas técnicas a moradias, ela buscou captar, entre outros fatores, o grau de satisfação dos habitantes dos novos bairros e a impressão deles com relação ao lugar. “Muita gente reclamou de se sentir isolada e não ter serviços por perto: escola, supermercado, postos de saúde, pontos de ônibus etc.”, pontua. Com base nos resultados, a pesquisadora revela consequências como a fragmentação do território e o surgimento de novas “manchas urbanas” (espaços vazios em meio a áreas recém-ocupadas), a predominância da construção de moradias populares em áreas isoladas e segregadas, a carência de equipamentos urbanos nos novos bairros e o difícil acesso aos centros econômico e cívico. “A reestruturação da metrópole, vista pela ótica da apropriação desigual do espaço, do padrão de moradia entre as classes sociais e formas de inserção na cidade, evidencia que a desigualdade urbana, funcional e social se aprofunda, gerando uma cidade partida cujos processos de segregação residencial vêm se acentuando paulatinamente”, defende.

Outro aspecto ressaltado por Elcileni diz respeito ao déficit de moradias existente na Grande Goiânia. Mesmo Goiás tendo sido o estado brasileiro que mais recebeu recursos do Crédito Solidário e o sexto na lista dos beneficiários do MCMV (o terceiro na modalidade MCMV Entidades), a produção habitacional do setor privado não solucionou o problema. Sobretudo, como diz a pesquisadora, se considerados os números acumulados do passado e as perspectivas de crescimento populacional do futuro. “A demanda é muito alta e os conflitos não param de crescer. Exemplos disso são as recentes ocupações espontâneas no Parque Atheneu, Santa Rita, Jardim Novo Mundo e Jardim Abaporu”, conclui. Fotos: Carlos Siqueira

Pesquisadora da UFG conhece moradora do Parque Oeste Industrial durante reportagem: empreendimentos transformaram a vida na região

Sete condomínios verticais foram construídos no terreno da histórica Ocupação Sonho Real. Setor imobiliário “venceu” disputa

Pesquisa

Produção habitacional “de mercado” transforma Goiânia

trutura de toda cidade e considerando ainda o contexto global de conversão da moradia em “moeda” de alto valor no sistema financeiro, ela investigou o crescimento da Grande Goiânia entre 2005 e 2016, podendo constatar uma expansão vertiginosa “pelas franjas” da metrópole. Segundo a pesquisadora, o que impulsionou tal realidade foi a implantação de políticas públicas federais e estaduais como Crédito Solidário, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Minha Casa Minha Vida (MCMV) e Cheque Moradia. “Estes programas construíram 101 mil unidades habitacionais entre os 20 municípios da RMG, significando um volume de recursos de R$ 7,4 bilhões em investimentos. Conforme dados da Prefeitura de Goiânia, somente na década de 2000 foram construídos 205 novos bairros na capital e no entorno. Esse foi o maior registro da história”, afirma.

Leia a tese da pesquisadora

Confira mapa da expansão urbana no Jornal UFG on line


Estudantes com deficiência terão cotas na graduação

Ilustração: Thaynara Rabelo

Universidade

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A partir do SiSU 2018, a Universidade deve oferecer pelo menos 700 vagas Angélica Queiroz

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Brasil possui 45 milhões de pessoas com deficiência, quase 24% da população. Mesmo estando determinado na Constituição Federal que a educação é direito de todos e com uma lei específica dizendo que as escolas não podem negar matrícula a alunos com deficiência, o acesso ao ensino ainda é um desafio para essa parcela expressiva da população, especialmente por conta do despreparo das escolas regulares para recebê-las. Nesse contexto, ainda são poucas as pessoas com deficiência que conseguem acessar o ensino superior. Na Universidade Federal de Goiás (UFG), por exemplo, há apenas 219 graduandos e 10 estudantes de pósgraduação que se autodeclaram com deficiência.

Acesse o e-book: www. seinclui.ufg.br

Essas cotas serão incluídas na mesma lei que já garante 50% das vagas para alunos que estudaram em escola pública, com uma porcentagem para estudantes pretos, pardos e indígenas. Dessas vagas garantidas a estudantes de escola pública, 23% serão destinadas a pessoas com deficiência. No ato da inscrição, o candidato com deficiência deve declarar sua condição de pessoa com deficiência (PcD) e encontrará formulário especial, no qual deverá inserir as informações solicitadas sobre suas necessidades específicas no momento do processo seletivo.

E a permanência?

Coordenadora do Núcleo de Acessibilidade da UFG, a professora Vanessa Santana chama a atenção para a diversidade das pessoas abrangidas pela lei: baixa visão, cegos, deficiência auditiva, surdos, deficiência física, deficiência intelectual, transtorno do espectro do autismo, e habilidades/superdotação. “É muito importante e historicamente correto essas pessoas terem direito à entrada, no entanto nos preocupamos com a permanência. Não faz sentido

Preocupados, os núcleos de acessibilidade das universidades federais se juntaram e fizeram um documento encaminhado ao Ministério da Educação atentando para questões essenciais para garantir a permanência dessas pessoas na universidade, como aquisição de equipamentos de tecnologias assistivas, equipe de atendimento educacional especializado e contratação de intérpretes. “Para atender um público tão diferente são muitas especificidades porque o que precisa para um pode ser totalmente diferente para outro”, explica Vanessa Santana.

Universidade Estadual de Goiás e o Instituto Federal de Goiás, preparou um curso de formação docente. Lançado em outubro, com o apoio do Centro Integrado de Aprendizagem em Rede (Ciar) e do Laboratório de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação em Mídias Interativas (Media Lab), o Se Inclui visa qualificar docentes sobre ações inclusivas no ambiente educacional. Disponível gratuitamente em formato de

e-book, o material tem tradução para Libras. “É um curso sobre acessibilidade acessível. Foi um cuidado que tivemos”, destaca. O material fala das dificuldades, mas também das eficiências dessas pessoas. “Precisamos ter pessoas com deficiência em todas as áreas para mudar as concepções das pessoas que vão ser formadas com ela, dos professores que vão formá-la e formar outros profissionais”, afirma.

A coordenadora do Núcleo de Acessibilidade lembra que, na universidade, a sobrecarga já é grande pra quem não tem nenhuma deficiência e que, por isso, é fundamental que esses estudantes recebam apoio das instituições em que irão ingressar. Para isso, na UFG, uma banca interdisciplinar deve receber esses alunos durante a matrícula para avaliar caso a caso. “Precisamos conhecer qual necessidade específica de cada pessoa. Saber quem são os estudantes surdos e de quantos intérpretes precisamos, para onde vão os cadeirantes para garantir acessibilidade arquitetônica, que cursos vão receber estudantes cegos e com baixa visão para avisar aos professores sobre adaptação dos materiais e por aí vai”, exemplifica. Se INCLUI Além de equipamentos, adaptação do espaço físico e contratação de pessoal, é fundamental que o professor tenha conhecimentos básicos sobre as necessidades educacionais desses estudantes. “Nós professores fomos formados para dar aula como se todos os alunos fossem iguais. A gente passa o conhecimento de uma forma só, como se todo mundo entendesse”, lamenta Vanessa Santana. Ela lembra que, para os professores, é um desafio lidar com salas de aula tão heterogêneas e isso se agrava com a falta de formação. “Fizemos uma pesquisa com 40 professores durante o curso de formação e constatamos que 36 deles não tiveram nenhum conteúdo sobre pessoas com deficiência”. Pensando nisso, a UFG, em parceria como o Instituto Federal Goiano, a

Infográfico: Eurípedes Júnior

Saiba mais no site do Governo Federal

No ano passado, o Governo Federal sancionou uma lei que deve ajudar a mudar esses números, tornando as universidades espaços mais acessíveis e diversos: a Lei n° 13.409/16, que determina que as instituições federais públicas de ensino superior devem garantir cotas para estudantes com deficiência. Na UFG, a lei já foi utilizada no processo seletivo no meio do ano para cursos de ensino à distância e será adotada no SiSU 2018, para todos os cursos e turnos, oferecendo cerca de 700 vagas específicas para estudantes com deficiência.

democratizar o acesso se este não for acompanhado de medidas institucionais que garantam a participação efetiva e a acessibilidade em suas diversas dimensões no processo de ensino aprendizagem-avaliação”, observa.

RI – renda inferior / RS – renda superior PPI – preto, pardo e indígena / cD – com deficiência

Diagnosticado com Asperger, estudante conclui mestrado na UFG O estudante Renato Moreira ingressou no curso de Ciências Sociais em 2009, antes de ser diagnosticado com a Síndrome de Asperger – Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD), resultante de uma desordem genética. Ele relata que, diferente do ensino fundamental e médio, recebeu apoio dos colegas e professores, o que foi fundamental para que ele concluísse a graduação e ingressasse no mestrado. Agora ele tentará a seleção para o doutorado e afirma que a nova lei será muito importante para garantir que mais pessoas com deficiência ingressem e permaneçam na universidade. “Sempre defendi as cotas. Reconheço que sou privilegiado porque tive apoio da minha família e minhas dificuldades são mais nas relações com as pessoas e em coisas cotidianas, mas muitas pessoas têm mais dificuldades”, relata.


13 Pesquisa

Aplicativo auxilia pacientes com Alzheimer

Divulgação

Projeto criou também uma estrutura que pode ser aplicada em outros programas que ajudam na conservação da memória e na adesão a terapias

Adriana Silva

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oje, o celular é um minicomputador com capacidade para diversos jogos e aplicativos. Pensando nessas possibilidades e no alto engajamento que elas proporcionam, pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG) criaram uma estrutura para o desenvolvimento de aplicativos destinados a pacientes com Alzheimer. Com ela, é possível que os desenvolvedores criem jogos e programas que ajudem na conservação da memória dos pacientes e em sua adesão ao processo terapêutico, amenizando os sintomas provocados pela doença. Os pesquisadores já testaram a arquitetura gamificada e desenvolveram um aplicativo protótipo.

Idealizada pelo pesquisador do Instituto de Informática da UFG, Alexandre Berndt, com orientação do professor

Eduardo Simões de Albuquerque, a plataforma criada possui ferramentas para o desenvolvimento de aplicativos com interfaces personalizadas, que se adequam às necessidades e limitações do destinatário. “Gamificar uma aplicação não significa produzir um jogo para a diversão do usuário, mas motivá-lo a mudar seus hábitos”, explica Alexandre Berndt.

Protótipo

Os pesquisadores escolheram a terapia de reminiscência para desenvolver um protótipo. Esse tratamento utiliza fotografias, objetos pessoais, vídeos e música para ativar memórias de experiências passadas da vida de uma pessoa, sem a necessidade do uso de medicamentos. No celular, o propósito, segundo o professor, é a criação de desafios de determinados níveis para os usuários, tudo feito de uma forma

Sabe o que são aptâmeros?

A professora Adriana Freitas Neves, do Laboratório de Biologia Molecular da Regional Catalão e coordenadora

De acordo com Adriana, no caso da pesquisa com o vírus da Dengue, nos aspectos funcionais, a caracterização dessas moléculas já foi realizada e o próximo passo é a etapa celular, que consiste em inserir os aptâmeros dentro da célula, o que ainda ocorrerá neste ano. Quanto ao Zika, essa fase de caracterização teve início no final do ano passado e o estudo permitirá conhecer a sequência desses aptâmeros ligantes para testes funcionais já no próximo ano. “A partir dessas etapas, podemos realizar testes, tanto para o diagnóstico, quanto para o tratamento da Dengue e do Zika e, havendo afinidades específicas ao alvo, na etapa terapêutica poderá ser possível buscar o bloqueio do processo de formação de novas partículas virais”, explica a professora. Isso é possível, segundo Adriana, pela inserção das moléculas de aptâmeros dentro das células infectadas, possibilitando o entendimento das alterações que ocorrem em nível celular, no caso de uma infecção por estes vírus. Com as observações será possível propor aptâmeros que podem se tornar medicamentos aplicados ao tratamento.

Divulgação

Fábio Gaio

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O docente alerta que, para o aplicativo funcionar, é necessário o engajamento de parentes e amigos que conheçam a vida do paciente e que sejam capazes de fornecer conteúdos relevantes. A ideia é que o resultado da performance seja encaminhado para a família e para o profissional de saúde responsável pelo paciente, de modo que eles consigam acompanhar a evolução do que está sendo feito. re o metabolismo celular em uma situação de infecção ou não pelos vírus da dengue e do Zika, a fim de propor novas formas de terapia. Além disso, os aptâmeros podem ser utilizados para melhorar a sensibilidade de técnicas diagnósticas por Biologia Molecular, chamada de apta-PCR.

Pesquisas da Regional Catalão mostram que essas moléculas podem ajudar no tratamento de doenças como Dengue e Zika roporcionar melhorias no diagnóstico molecular de doenças e buscar a neutralização do processo de formação de novas partículas virais nas células, impedindo a produção de novos vírus. Essas são algumas das funções desempenhadas pelos aptâmeros, que são moléculas de ácidos nucleicos, cuja utilização apresenta a vantagem de ser economicamente mais viável, se comparado à produção de anticorpos, além de possuir algumas características práticas que facilitam o trabalho de pesquisa. Na Regional Catalão da Universidade Federal de Goiás (UFG), esse tipo de abordagem tem sido utilizada em pesquisas com Dengue e Zika e envolve pesquisadores e estudantes da graduação em Ciências Biológicas, do mestrado em Química e do doutorado em Ciências Exatas e Tecnológicas.

menos intrusiva e mais natural. Por exemplo: se o paciente vai receber a visita de algum conhecido, momentos antes do encontro, o aplicativo fornece fotos, nomes e algumas situações envolvendo a pessoa.

da pesquisa, explica que essas moléculas possuem a importante característica de reconhecer com alta especificidade uma molécula alvo. Com isso, afirma a professora, será possível pesquisar a funcionalidade de um determinado aptâmero dentro de uma célula e, assim, saber como ocor-

A pesquisa de desenvolvimento desses aptâmeros envolve vários pro-

Segundo Alexandre Berndt, em breve serão realizados testes do programa com um grupo de cerca de 50 pacientes em fase inicial da doença. Já a plataforma com a estrutura para o desenvolvimento de outros aplicativos será disponibilizada via web para usuários cadastrados. Os aplicativos construídos a partir desse auxílio funcionarão no sistema operacional Android.

Sobre a doença

O Alzheimer é uma doença de caráter neurodegenerativo e que ataca principalmente pessoas acima de 60 anos. Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz), estima-se que exista cerca de 35,6 milhões de pessoas no mundo com a doença, no Brasil esse número é de um milhão e 200 mil pessoas. cessos em laboratório, por meio de técnicas in vitro, que visam a selecionar ligantes, que posteriormente são analisados por meio de um processo de caracterização, a fim de verificar se eles realmente se relacionam a um determinado alvo. Esses aptâmeros não são naturais e são obtidos por meio de processos de síntese enzimática no laboratório, sendo possível, ainda, realizar modificações químicas em suas moléculas a fim de torná-las mais estáveis no meio celular. Recentemente, o grupo teve dois trabalhos publicados: um artigo na Revista Future Medicinal Chemistry e outro no Bioanalysis Journal, na seção especial sobre Oligonucleotídeos Funcionais. Ambos os jornais fazem parte do “Future Science Group”, possuindo um importante impacto na área científica. De acordo com Adriana, no Brasil os aptâmeros ainda são pouco estudados, com pesquisas restritas a poucas instituições. Nos Estados Unidos, entretanto, já existem, inclusive, aptâmeros liberados sob a forma de medicamentos, como por exemplo, o Pegaptanibe ou Macugen, um composto com base em aptâmero utilizado para tratar a degeneração macular, doença que pode levar à cegueira em idosos. O trabalho realizado em Catalão conta com a parceria do Laboratório de Nanobiotecnologia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), do Instituto de Ciência e Tecnologia Teranano (INCT), também da UFU, e do Laboratório de Genética Molecular e Citogenética da UFG, em Goiânia.


Universidade

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UFG constrói suas políticas institucionais Segurança, Comunicação, Acessibilidade e Preservação de Documentos Arquivísticos Digitais são alguns dos temas que ganharam diretrizes para orientar ações e atividades Luiz Felipe Fernandes

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rganizações de diversas naturezas e segmentos procuram orientar suas ações e atividades com base em políticas institucionais que padronizam posturas e condutas, criam protocolos e estabelecem parâmetros de atuação considerados mais adequados, com a finalidade de cumprir suas missões e atingir seus objetivos. Tais instrumentos são ainda mais importantes nas instituições públicas, pois também representam a busca pela prestação de um serviço de qualidade ao cidadão, com ética e transparência. Nos últimos anos, diversas políticas institucionais foram debatidas, construídas, aprovadas e colocadas em prática na Universidade Federal de Goiás (UFG). Ligadas a diferentes áreas de atuação, elas têm em comum o fato de terem sido amplamente discutidas com a comunidade acadêmica e com a sociedade, cujos integrantes tiveram a oportunidade de participar das discussões e do processo de elaboração dos respectivos documentos.

Segurança

Considerada prioritária, a política de segurança da UFG foi aprovada no Conselho Gestor da Regional Goiânia no primeiro semestre de 2017 e a previsão é de que seja levada ao Conselho Universitário (Consuni) ainda este ano. Historicamente debatido na Universidade, o tema ganhou atenção especial com a criação, em 2015, de uma Comissão de Segurança, composta por professores, estudantes e técnicoadministrativos. Antes disso, já havia sido realizada, a pedido da Reitoria da UFG, a pesquisa Violência, conflitos e crimes nos câmpus universitários: subsídios para uma política de segurança na UFG, desenvolvida pelo Núcleo de Estudos sobre Criminalidade e Violência (Necrivi), da Faculdade de Ciências Sociais.

Algumas das ações propostas pela política de segurança da UFG já são realizadas de forma contínua, a exemplo do reforço na vigilância motorizada, com rondas próximo aos pontos de ônibus; da aquisição de câmeras de videomonitoramento de alta resolução para pontos vulneráveis, como as recentemente instaladas na avenida principal do Câmpus Samambaia; e da ampliação e revisão periódica da iluminação e poda de árvores. A implantação de uma moderna Central de Videomonitoramento no Câmpus Samambaia também integra as ações previstas para a segurança na Universidade.

Entre outras ações estão o treinamento da segurança com armas não letais, o curso de extensão para vigilantes sobre violência, drogas e criminalidade, o desenvolvimento do aplicativo Minha UFG, a contratação de um percentual de vigilantes mulheres e o estabelecimento de cooperação entre a segurança da PUC e a da UFG para a área da Praça Universitária.

Comunicação

A política de comunicação da UFG está em fase avançada de elaboração e com previsão de ser levada ao Consuni ainda em 2017. Ao lado de um esforço conjunto de integração dos órgãos ligados à comunicação na Universidade – Assessoria de Comunicação (Ascom), Rádio Universitária e TV UFG –, em 2014 teve início um processo de pesquisa sobre as experiências de instituições públicas com a construção de políticas de comunicação. No ano seguinte, um Grupo de Trabalho, composto por servidores dos três órgãos, passou a se reunir quinzenalmente para discutir a política de comunicação da UFG, além de ter sido realizado o 1º Seminário de Comunicação Pública e Cidadania. As discussões intensificaram-se em 2016, com a realização de 11 Encontros Temáticos relacionados às diversas áreas ligadas direta ou indiretamente à comunicação na Universidade e do 2º Seminário de Comunicação Pública e Cidadania.

Acessibilidade

Considerada imprescindível não só para cumprir os requisitos legais, mas sobretudo para garantir justiça social, valores democráticos e desenvolvimento sustentável, a política de acessibilidade da UFG já está aprovada em todos os espaços da Universidade. A acessibilidade é entendida na UFG como um valor institucional que colabora para uma universidade plural que respeita a diversidade humana. As diretrizes que compõem o documento foram discutidas e formuladas desde 2008. A política de acessibilidade também foi o primeiro e principal objetivo do Sistema Integrado de Núcleos de Acessibilidade da UFG (SINAce), criado em 2014. A política foi estruturada em oito eixos: acessibilidade: inclusão e permanência; a infraestrutura acessível; a acessibilidade pedagógica e curricular; a acessibilidade comunicacional e informacional; a catalogação das informações sobre acessibilidade; o ensino, a pesquisa e a inovação em acessibilidade; a extensão sobre/ com acessibilidade; recursos humanos e financiamento da política de acessibilidade.

Os temas foram discutidos em Grupos de Trabalho e o documento foi apresentado pelos Núcleos de Acessibilidade das Regionais para alunos com deficiência, tanto da UFG quanto do ensino médio de outras instituições, em rodas de conversa e para professores de diferentes unidades da instituição, que puderam discutir e fazer contribuições ao texto. Foram 35 reuniões e encontros durante dois anos. Após essas adequações, o documento foi integralmente lido e aprovado pelos integrantes do SINAce e apresentado no Consuni e Câmaras da UFG, como forma de validação e conhecimento. Preservação de documentos digitais Outra iniciativa em curso na UFG é a elaboração da política de preservação de documentos arquivísticos digitais. A proposta é resultado das atividades

da Comissão Permanente de Avaliação de Documentos (Copad), que tem trabalhado com o tema desde 2014. Inicialmente, foi realizada uma pesquisa sobre produção e armazenamento de documentos arquivísticos digitais, relativos às atividades de ensino, pesquisa e extensão. Um questionário foi elaborado e disponibilizado para os coordenadores de graduação, coordenadores de pós-graduação lato e stricto sensu, coordenadores de pesquisa de todas as unidades acadêmicas e coordenadores de ações de extensão das unidades e órgãos que executam projetos de extensão. Em 2015, a arquivista do Centro de Informação, Documentação e Arquivo (Cidarq) e membro da Copad, Nathaly Rodrigues da Costa, orientada pela professora Laura Vilela Rodrigues Rezende, da Faculdade de Informação e Comunicação e membro da Copad, defendeu monografia no Curso de Especialização em Gestão e Avaliação da Informação, intitulada A documentação arquivística em meio digital no âmbito da Universidade Federal de Goiás, na qual analisou as informações coletadas pela Copad. Além dessa ação, foram realizados seminários sobre Preservação de Documentos Digitais, organizados pela Copad em parceria com o Cidarq, nos últimos dois anos.

Um grupo de trabalho foi instituído pela Copad em 2017 para elaborar a minuta de resolução que instituirá a política. O documento foi apresentado no II Seminário sobre preservação digital, em 2017, e, após discussão com os participantes, foram acolhidas sugestões. A minuta também foi disponibilizada em consulta pública no primeiro semestre de 2017. O resultado desse trabalho, além da proposta de política de preservação de documentos arquivísticos digitais que está em apreciação pelo Conselho Universitário, é a elaboração de um Plano de Preservação de Documentos Arquivísticos Digitais previsto para 2018.

Tecnologia da Informação

Já a Política de Tecnologia da Informação, cuja resolução também será votada, tem o objetivo de orientar e fornecer as diretrizes básicas para o planejamento, desenvolvimento, gestão e operação dos sistemas e tecnologias da informação, em conformidade com as boas práticas recomendadas pelos órgãos de planejamento e de controle da Administração Pública Federal. Além disso, prevê que todas as unidades executoras de TI da UFG mantenham um processo permanente de divulgação de suas normas e procedimentos técnicos para capacitar, conscientizar e sensibilizar seus usuários à correta conduta na utilização dos ativos de TI. Fotos: Carlos Siqueira

A Comissão iniciou os trabalhos com a realização de audiências públicas e debates em todas as Regionais da UFG, com o objetivo de estabelecer o diálogo e convidar a comunidade universitária a participar efetivamente das estratégias e ações preventivas e inibidoras de ações de vio-

lência. Todo o processo resultou no documento final, que prevê uma série de ações a serem executadas em urgente, curto, médio e longo prazos.

Os encaminhamentos provenientes dos eventos, juntamente com os resultados de uma ampla pesquisa com a comunidade acadêmica, serviram de base para a elaboração, no primeiro semestre deste ano, de uma proposta de política de comunicação para a UFG. O documento apresenta um conjunto articulado de valores, princípios, diretrizes e posturas, com o objetivo de nortear o planejamento, a execução e a avaliação de estratégias, ações, produtos e serviços que promovam uma cultura de comunicação baseada no diálogo permanente com os públicos, fundamentada na comunicação pública e cidadã.


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ARTIGO

M Carlos Siqueira

inha dissertação é sobre música sertaneja. Sob orientação do professor Ricardo Pavan, construo uma análise da série Bem Sertanejo (aquela exibida pelo Fantástico e apresentada pelo Michel Teló) na intenção de compreender como a história do gênero é contada atualmente. Isso porque o gênero que durante anos foi delineado como representante de mau gosto e de baixa cultura por teóricos e parte da mídia que tematizaram sobre ele, está tornando-se cada vez mais popular. Desde meados de 2005, quando surgiu o sertanejo universitário, o consumo da música sertaneja tem se expandido, tanto geograficamente, tornando-se o gênero mais tocado em todo o território nacional, segundo empresas de monitoramento de consumo musical no Brasil, quanto em relação à adesão pelas diversas classes sociais, dentre elas a classe A e B.

*José Alexandre Felizola Diniz Filho

A crise econômica e a pesquisa na Universidade

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s cortes que atingiram as agências de fomento, institutos de pesquisa e instituições de ensino superior (IES), em todas as esferas administrativas, têm sido objeto de muitas reportagens em toda a mídia. São muitos os relatos sobre problemas para o desenvolvimento de novos medicamentos, novas tecnologias agrícolas ou novos processos industriais. Sem dúvida, tudo isso é importante e chama a atenção da opinião pública, indo de encontro à percepção da sociedade sobre o papel do cientista. Infelizmente, há um aspecto mais nefasto dessa crise, menos conhecido e menos divulgado, que é o colapso da própria ciência no contexto acadêmico.

Os cortes no orçamento das IES provocam um impacto indireto na ciência, pois é difícil fazer pesquisa se essas instituições não possuem condições mínimas de manter sua infraestrutura (e isso, obviamente, se torna mais grave se os cortes atingem pagamento de salários, como ocorreu na UERJ). No contexto acadêmico, os recursos para pesquisa, em geral, são repassados aos docentes e seus alunos diretamente pelo CNPq e FAPs, ou para os cursos de pós-graduação “stricto sensu” pela Capes. Com a falência desse sistema, gradualmente os docentes das IES que estão envolvidos em pesquisa podem se desestimular ou não ter condições mínimas de trabalhar. Isso cria um efeito em cascata de proporções desconhecidas, já que é a pesquisa nas IES que mantém os docentes na fronteira do conhecimento em suas áreas e lhes assegura um pensamento crítico e independente. Além da aquisição e manutenção de equipa-

Adrielly Campos e Almeida Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação PPGCOM/FIC-UFG Linha de pesquisa: Mídia e Cultura

Arquivo Pessoal

A posição de destaque do Brasil em Ciência e Tecnologia alcançada nos 20 últimos anos se deve, em grande parte, à ciência básica. De fato, esse destaque aparece no número de publicações científicas, mas quando são considerados outros indicadores (como citações, impacto ou geração de patentes, por exemplo), a posição do Brasil nos rankings internacionais diminui bastante. Isso é esperado em um país onde a ciência é feita predominantemente em áreas básicas, com poucos recursos e muito ligada à formação de recursos humanos, em um ambiente acadêmico.

mentos nas áreas mais aplicadas e tecnológicas, é preciso ter recursos para manter muitas atividades de pesquisa em todas as áreas do conhecimento. Um ponto crucial e geral é a manutenção de bolsas para os alunos, desde a iniciação científica até o pós-doutorado. Como as oportunidades de emprego decresceram consideravelmente, é preciso manter um programa de pós-doutorado bem dimensionado para que os jovens doutores permaneçam atuando em ensino e pesquisa, não perdendo todo o investimento feito ao longo de sua formação profissional. Ao mesmo tempo, esses doutores jamais seriam formados se, desde a sua graduação, não houvesse um forte estímulo à pesquisa. Muito do crescimento da pesquisa no Brasil se deve ao sucesso dos programas de iniciação científica, como o Pibic do CNPq. Fechando o ciclo, se os docentes não forem devidamente valorizados como pesquisadores, quem irá orientar todos esses alunos?

Todas essas mudanças e a presença constante da música sertaneja no dia a dia da sociedade brasileira tornaram imprescindível a existência de investigações sobre ela que buscassem compreender os processos que estavam envolvidos em seu consumo para além de uma questão de degradação cultural, conforme havia sido proposto pelos estudos tradicionais. Dessa forma, procuro reler a história da música sertaneja da perspectiva teórica oferecida pelos Estudos Culturais, compreendendo-a como uma prática cultural que tem muito a dizer sobre a própria formação da nossa sociedade e sobre as maneiras como o povo brasileiro relaciona-se com os processos de modernização, industrialização, midiatização, urbanização, entre outros, que marcaram todo o século XX e início do século XXI. O Bem Sertanejo é o objeto empírico que permite instrumentalizar essa investigação, exatamente porque se propõe a contar a história do gênero.

Em resumo, é importante estar atento a esses impactos mais difusos da crise econômica e política na Ciência, já que não há uma plena compreensão pela sociedade (e às vezes nem mesmo pela própria comunidade universitária) sobre o funcionamento do sistema acadêmico. É preciso ter clareza de que, em última instância, é o componente de pesquisa e produção de conhecimento nas IES que cria as condições para a transformação social, a partir da educação e da inovação tecnológica, com base em uma visão científica do mundo. José Alexandre Felizola Diniz Filho é professor do Departamento de Ecologia do ICB, UFG, pesquisador nível 1A do CNPq e membro da Academia Brasileira de Ciências. É atualmente coordenador do projeto INCT em Ecologia, Evolução e Conservação da Biodiversidade, sediado na UFG.

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Pesquisa

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Cuidado que une e acalma Pesquisa comprova os benefícios de se carregar o bebê no colo Carolina Melo

O

aconchego do colo, o cheiro da mãe, o ritmo do coração no compasso do contato pele a pele. Cada vez mais mulheres e suas redes de apoio vêm se dedicando a construir uma nova relação com a maternidade, mais acolhedora ao tempo de adaptação do bebê ao novo mundo sensorial. Como aliada, a bolsa canguru vem auxiliando as mães, especialmente nos três primeiros meses de vida do recém-nascido, a recriar um ambiente mais próximo ao que tinha quando ainda estava no útero, promovendo uma maior sensação de bem-estar e segurança. Os benefícios da bolsa canguru para bebês a termo – acima de 37 semanas de idade gestacional – e no peso ideal foram comprovados por pesquisa inédita na América Latina, realizada pela Faculdade de Enfermagem (FE) da Universidade Federal de Goiás (UFG). O fortalecimento do contato e do vínculo mãe-bebê, bebês mais calmos, que choram menos e dormem melhor e a melhora das cólicas foram algumas das percepções relatadas pelas mulheres que utilizaram a bolsa canguru. O estudo também encontrou relação entre a bolsa canguru e o aleitamento materno exclusivo.

Outra observação foi o maior grau de autonomia conquistada pela mãe em momentos de atividades e locomoção dentro e fora de casa. “Teve uma que relatou o auxílio da bolsa canguru no transporte coletivo, quando não havia cadeiras para sentar e ninguém sedia o espaço”, afirma Romilda.

A dona de casa Tatiane Ribeiro dos Reis, 35 anos, está entre as mães acompanhadas pela pesquisa que mais utilizaram o pano para carregar o bebê. Ela conta que utilizava a bolsa canguru com sua filha Bruna, hoje com um ano e nove meses,

Nova forma de maternar

A política de humanização das unidades neonatais se direciona para a garantia do fortalecimento do contato mamãe-bebê nas primeiras horas de vida dos bebês saudáveis. “Para recém-nascidos a termo, os cuidados e pesquisas focam no momento do nascimento. Nasceu, põe no peito, estimula a amamentação. Então já temos pesquisas na área sobre os benefícios. Mas e depois?”, questiona a professora da Faculdade de Enfermagem da UFG e orientadora da pesquisa, Thaíla Corrêa Castral.

Culturalmente, assim que nasce, o bebê tem de ser uma espécie de “mini-adulto”, avalia a professora. “Ele tem de ter horário para mamar, para dormir e deve ser colocado no berço. Não se pensa muito em atender às suas necessidades”. Segundo ela, é durante os seis meses de vida que a criança faz “o desmame do corpo da mãe”, numa espécie de gestação extrauterina. “É o período necessário para o bebê tornar-se mais ‘independente’, quando ele estará com a visão formada, o aleitamento não será exclusivo e começará a sentar sozinho. Até os seis meses é um período que o bebê não deveria ser separado do colo da mãe. E a bolsa canguru vem facilitar esse momento”, afirma. De acordo com Thaíla, o uso da bolsa canguru tende a ser mais intenso nos primeiros três meses.

Para a pesquisadora Romilda Godoi, uma grande relevância do estudo foi acompanhar as mudanças na forma de enxergar a maternidade entre as mulheres que usaram o canguru. “Tivemos o prazer de acompanhar mães se sentindo mais fortes no contato com os seus filhos”, relata. Na avaliação da professora Thaíla Corrêa, a pesquisa mostra uma nova proposta de cuidados com os recém-nascidos, diferente do tradicional. “Em vez dos carrinhos, do berço, constata-se que carregar o bebê no colo é bom e isso foi mostrado tanto pelo levantamento de dados qualitativos quanto pelo quantitativo”.

Bebê no pano

A pesquisa acompanhou 98 mães desde a maternidade até o primeiro ou o segundo mês dos bebês. Foi

Parceiro da pesquisa, o Projeto Bebê Canguru dissemina os benefícios da bolsa canguru em hospitais públicos e planos de saúde. na maternidade que elas receberam e foram ensinadas a usar a bolsa canguru. Destas, 39,8% usaram três vezes ou mais por semana em domicílio, 49% utilizaram menos de três vezes por semana e 11% não utilizaram o canguru desde que saíram da maternidade. Na avaliação de Romilda Godoi, os dados refletem uma cultura que não está acostumada a carregar os bebês em panos e, em alguns casos, mostra-se resistente, por inúmeros fatores.

“Fizemos o acompanhamento inicial das mães entre o primeiro e o segundo mês, um momento intenso do pósparto, em que as mães estão adaptando-se a nova rotina e acabam deixando a bolsa de lado. Muitas começaram a lembrar quando o bebê começou a sentir cólicas e, assim, recorreram ao canguru”, conta. Diferentes fatores interferiram na adaptação da mãe à bolsa canguru. “O receio de amarrar o bebê molinho no colo, a dificuldade de manejar a bolsa, e também as que não sentiram confiança quanto ao benefício que o canguru poderia gerar ao bebê”, afirma Romilda.

Helena Raquel Cardoso Silva, 31 anos, dona de casa, compõe o percentual das mães que menos utilizaram a bolsa canguru. Ela conta que quando amarrou a bebê no pano, ela ficou bem aconchegante. “Mas usei muito pouco. Achava difícil colocar a bolsa, isolar o bebê. Também porque minha filha era muito calma, dormia dia e noite. Até cinco meses nem parecia que tinha bebê em casa”, conta.

Das 98 mulheres, 88 ainda estavam amamentando e todas elas utilizaram o canguru pelo menos uma vez. “O contato pele a pele é muito importante para a amamentação, especialmente após o nascimento. Todas que utilizaram a bolsa pelo menos uma vez, que seja na maternidade, tiveram uma boa pontuação na escala de autoeficácia da amamentação”. A escala, formada pelo domínio técnico da amamentação (pega, revezamento das mamas, saciedade do bebê etc) e o domínio intrapessoal (que reflete as percepções, atitudes e crenças quanto à sua amamentação), é utilizada para verificar a confiança das mães em amamentar. Fotos: Carlos Siqueira

De acordo com a pesquisa, a sensação de tranquilidade gerada na criança também favorece o bemestar da mulher. A proximidade corporal e o contato pele a pele propicia à mãe conhecer melhor o seu bebê e as necessidades dele e permite momentos compartilhados de descanso durante o dia e à noite. “Como os bebês dormiam melhor no canguru, as mães aproveitavam para descansar também”, conta a pesquisadora Romilda Rayane Godoi. Com o recém-nascido ali mesmo, no colo, grudadinho no peito da mãe, a amamentação também era facilitada. Sem tirá-lo do canguru, a mãe oferecia o peito e o bebê já ficava na posição adequada para arrotar.

o tempo todo, todos os dias. “Tive uma ajuda extra com os cuidados com a bebê. Sempre que colocava ela no canguru, ela se acalmava. Já na primeira vez que usei, ela se acostumou e dormiu. Amamentava com ela dentro do canguru, e quando precisava estender as roupas em casa, fazia com ela no colo, amarradinha em mim”, relembra.


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